COMPETÊNCIA INTERNACIONAL
PACTO PRIVATIVO DE JURISDIÇÃO
Sumário

I - As situações jurídicas plurilocalizadas e transnacionais podem ser objeto de pactos atributivos de jurisdição, nos termos do art.º 25º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012.
II - O referido regime prevalece sobre as regras de direito interno que fixem requisitos formais mais exigentes para os pactos de jurisdição.
III - A validade de tais pactos é independente de qualquer conexão entre o objeto do litígio e o tribunal designado, não sendo valoráveis, designadamente, os hipotéticos inconvenientes, para uma das partes, da localização do foro convencionado a que o direito interno confira relevo.
IV - Entre os requisitos essenciais para que um pacto de jurisdição concluído ao abrigo do art.º 25º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012 seja substantivamente válido está o de que designe, com suficiente determinação, a relação jurídica e o tribunal em que as questões emergentes da relação jurídica designada hão-de ser apreciadas e decididas.
V - No comércio internacional, ao estipular uma cláusula atributiva de jurisdição, o que as partes procuram é precisamente atribuir a um determinado foro, desde logo por razões de segurança jurídica, a competência para a resolução dos litígios conexionados com o relacionamento contratual que entre si estabeleceram.

Texto Integral


Relator: Fonte Ramos
Adjuntos: Alberto Ruço
Vítor Amaral

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

            I. Em 01.7.2020, A..., Unipessoal, Lda., instaurou a presente ação declarativa comum contra E... Ltd, pedindo:

            «Nestes termos e nos mais de direito requer-se a V. Exa se digne: (i) Anular os contratos celebrados entre a A. e a R. declarando a A. desvinculada de qualquer obrigação neles assumida; (ii) Condenar a R. a indemnizar a A. pelos prejuízos causados pela sua conduta dolosa, nomeadamente, pelos lucros cessantes emergentes da não disponibilização do software encomendado à R., a liquidar em execução de sentença.

            Caso assim não se entenda: (iii) Declarar licitamente resolvidos os contratos denominados “...” e “...”. (iv) Condenar a R. a indemnizar a A. pelos prejuízos causados pela sua conduta inadimplente, nomeadamente, pelos lucros cessantes emergentes da não disponibilização do software encomendado à R., a liquidar em execução de sentença.»

            Alegou, em síntese: foi celebrado um memorando de entendimento (“MoU”) entre a A., o D...1), no ... e a Secretaria de Estado da Agricultura de ..., no ..., nos termos do qual, pretenderam formalizar as diligências para estabelecer uma aliança comercial destinada a promover mutuamente os respetivos Estados como destinos de investimento; tanto o Emirado do ... como o Estado de ... visaram com a celebração deste “MoU” encorajar e promover o estabelecimento de uma cooperação entre as suas comunidades de investidores; a missão estabelecida para a A. no âmbito do “MoU” foi a de enveredar esforços no sentido de capturar e gerir potenciais investidores e fazer o acompanhamento, sempre que necessário, das transações que viessem a ser geradas no âmbito da parceria; no âmbito das atividades levadas a cabo ao abrigo do “MoU”, e após a sua assinatura, as partes naquele documento entenderam ser relevante para alcançar os objetivos propostos que fosse experimentada e colocada em funcionamento uma plataforma de trading digital que permitisse o estabelecimento de relações comerciais entre os diversos agentes económicos dos setores agrícolas de cada um dos estados envolvidos e no seio da qual pudessem ocorrer efetivas transações comerciais, à distância; por isso as partes referidas contactaram a Ré no sentido de apresentar uma proposta de solução de software que permitisse concretizar os objetivos pretendidos; a Ré não forneceu o software pronto a ser usado, pelo que a A. veio a declarar resolvido o contrato celebrado com a Ré com fundamento em incumprimento desta.

            A Ré contestou, invocando, além do mais, a exceção dilatória de incompetência internacional dos tribunais portugueses para julgar a presente ação, por violação do pacto de jurisdição, pedindo a sua absolvição da instância.

            Na sequência dos requerimentos da A. de 08.7.2021 e 12.11.2021[1], o Mm.º Juiz do Tribunal a quo proferiu, a 18.01.2022, o seguinte despacho: «ADEQUAÇÃO FORMAL: / Considerando a matéria de exceção invocada na Contestação (cf. art.º 576º, n.º 3, do CPC) e apesar do disposto no art.º 3º, n.º 4, do CPC, para melhor gestão processual, impõe-se adequar formalmente o processo permitindo à Autora, desde já, responder por escrito à matéria de exceção, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 3º, n.º 3, 6º, n.º 1, 547º e 593º, n.º 2, alínea b), do CPC. / Termos em que convido a Autora para, no prazo de 15 dias, responder por escrito à matéria de exceção invocada na Contestação. (...)»

            A A. reiterou o afirmado naqueles anteriores requerimentos, mas veio a pronunciar-se sobre a dita exceção (de incompetência internacional dos tribunais portugueses), aduzindo, designadamente, que o único aspeto da relação contratual estabelecida entre as partes que foi objeto de conversa e negociação foi o preço, tendo o mais resultado da imposição pela Ré à A. dos seus clausulados contratuais gerais.

            De seguida, por decisão de 28.02.2022, o Mm.º Juiz do Tribunal a quo dispensou a realização da Audiência Prévia ao abrigo do disposto no art.º 547º, do Código de Processo Civil (CPC) - considerando exercido o contraditório relativamente às exceções - e julgou verificada a exceção dilatória de incompetência internacional dos tribunais portugueses para julgar a presente causa, absolvendo a Ré da instância.

            Inconformada, a A. apelou formulando as seguintes conclusões:

            1ª - Pese embora o Tribunal a quo, anteriormente à prolação da Sentença, tenha convidado a Recorrente a exercer o contraditório relativamente à invocada exceção de incompetência internacional dos Tribunais Portugueses, o mesmo não sucedeu quanto à dispensa da Audiência Prévia, cuja intenção não foi previamente manifestada.

            2ª - Tal libelo decisório constitui, consequentemente, uma decisão-surpresa, violando o princípio do contraditório, disposto no art.º 3º do CPC.

            3ª - A decisão assim proferida constitui ainda uma nulidade processual, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 195º, n.º 1, do CPC, por consubstanciar a omissão de um ato que a lei expressamente prevê, com manifesta influência na decisão da causa, como é disso espelho a prolação da sentença recorrida.

            4ª - Nos termos do disposto no art.º 591º, n.º 1 do CPC, a Audiência Prévia é uma diligência processual de realização obrigatória e a sua dispensa apenas será permitida quando se encontrem verificados os pressupostos do art.º 593º do CPC, especialmente, a manifestação expressa da intenção da dispensa e o convite expresso às partes para se pronunciarem sobre essa mesma intenção, e, bem assim, a recolha do assentimento expresso das partes à referida dispensa.

            5ª - Nos presentes autos, a propósito das insistências da Recorrida para que o Tribunal a quo conhecesse de imediato da exceção de incompetência absoluta deduzida na contestação, a Recorrente pronunciou-se nos autos, por diversas vezes, manifestando a sua oposição à dispensa da Audiência Prévia.

            6ª - Ao proferir uma decisão que conhecia de exceção dilatória de incompetência absoluta, fixando ainda matéria de facto provada, não poderia o Tribunal a quo deixar de ter realizado a Audiência Prévia, sem a qual o prosseguimento dos autos estaria vedado.

            7ª - Posto o que deve ser revogada a sentença recorrida e ordenar-se a realização da Audiência Prévia, nos termos previstos no art.º 591º do CPC.

            8ª - O conhecimento da exceção de incompetência absoluta dos tribunais portugueses, tal como a ação se encontra configurada pelas partes, pressupunha, necessariamente, o conhecimento pelo Tribunal a quo de matéria de facto alegada nos articulados e, consequentemente, de produção das respetivas provas que as Partes indicaram e poderiam ainda vir a carrear para os autos, em sede de audiência prévia, e até ao final da discussão causa.

            9ª - Em particular, no que concerne à alegação da Recorrente de que a cláusula atributiva de competência, não resultou da sua vontade livre, consciente e esclarecida, mas de uma imposição da Recorrida que lhe coartou a liberdade negocial - alegação que determina a necessidade e a essencialidade para o thema decidendum do apuramento da factualidade alegada relativamente às circunstâncias da celebração do contrato objeto dos autos.

            10ª - Quando proferiu a decisão recorrida, o Tribunal a quo não dispunha de todos os elementos essenciais para poder decidir, tendo a tal decisão, sido, inevitavelmente prematura.

            11ª - O Tribunal a quo estava impedido de concluir, sem mais, pela existência e validade de um pacto atributivo de competência celebrado entre as partes, e consequentemente, pela incompetência internacional dos tribunais portugueses para julgar a presente ação.

            12ª - Nessa medida, a decisão proferida violou o direito de defesa e ao contraditório da Recorrente; e viola o disposto no art.º 595º, n.º 1 do CPC, na medida em que, não se encontra provada nos autos toda a matéria de facto relevante para o conhecimento de todas as soluções plausíveis de direito aplicáveis ao caso vertente, e, bem assim, o disposto no art.º 5º, n.º 2, al. b) do CPC, na medida em que, face ao alegado nos autos deveria o Tribunal a quo proceder à recolha dos factos da causa que se mostrem dotados de relevância jurídica.

            13ª - Pese embora a Recorrente tenha reiterado nos autos que a exceção de incompetência absoluta carecia de conhecimento de matéria de facto pelo Tribunal a quo, sem a qual não seria possível conhecer da referida exceção, a decisão recorrida não se pronunciou sobre tal questão, o que determina a nulidade da sentença, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 615º, n.º 1, alínea d), do CPC, o que se requer, também, seja declarado.

            14ª - Ainda que assim não se entenda, sempre se dirá que, pese embora os contratos celebrados entre a Recorrente e a Recorrida, e que servem de fundamento à presente ação, contenham uma cláusula de foro e de escolha de lei que apontam para os Tribunais do Reino Unido, mais concretamente os tribunais da cidade de Londres, as mesmas devem ser consideradas nulas.

            15ª - A Recorrente subscreveu tais contratos sem que lhe tivesse sido facultada pela Recorrida a oportunidade de negociação do seu conteúdo, i. é., de forma que não pode ser tida por uma manifestação livre e consciente da sua vontade.

            16ª - Resulta por isso aplicável aos referidos contratos o RCCG, que prevê, no seu art.º 1º, n.º 2, que o mesmo “aplica-se igualmente às cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pode influenciar”.

            17ª - Sendo que, no seu n.º 3, é referido que o “ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo”, o que não sucedeu, uma vez que não foi feita qualquer prova, por parte da Recorrida, de que as cláusulas, nomeada e concretamente as referentes ao foro e lei aplicável, tenham sido objeto de negociação e acordadas entre as Partes.

            18ª - A escolha de um foro situado em Londres resulta financeiramente incomportável para a Recorrente resultando a sua posição manifestamente em desequilíbrio face à posição da Recorrida, que, pese embora com sede em Singapura, tem meios financeiros que lhe permitem litigar em Londres, se necessário.

            19ª - Negar à Recorrente o recurso à jurisdição portuguesa, redundaria na violação do seu direito ao acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva, tal como consagrado no art.º 20º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP).

            20ª - Ao decidir pela validade do referido pacto, o Tribunal a quo violou o disposto no art.º 9º al. g) do RCCG, pelo que a cláusula em questão é nula.

            21ª - Sendo os tribunais portugueses competentes para julgar a presente ação, nos termos do disposto no art.º 62º al. a), ex vi do art.º 80º, n.º 3, do CPC, que resultaram assim, também eles violados na decisão recorrida.

            22ª - A igual conclusão, de invalidade do pacto privativo de jurisdição, deverá chegar-se pela aplicação do Regulamento Bruxelas I a que alude a Sentença recorrida, já que na celebração de tal “pacto” a Recorrida vedou à Recorrente, pela imposição que fez dos seus clausulados gerais onde incluiu ao dito “pacto”, a possibilidade de manifestar de forma livre esclarecida a sua vontade contratual, o que resulta abusivo.

            23ª - É requisito essencial da celebração dos referidos pactos, também à luz do disposto no art.º 25º n.º 1 do Regulamento, a inexistência de qualquer vício da vontade que os enferme de validade, sob pena de, de outro modo, resultar violado o princípio da autonomia da vontade das partes, princípio orientador do referido preceito legal – o que sucedeu nos presentes autos e sempre seria demonstrado através da prova da matéria alegada pela Recorrente.

            24ª - Por este motivo, a Sentença recorrida violou, também, e caso se entenda aplicável, o disposto no próprio art.º 25º do Regulamento Bruxelas I.

            25ª - Quanto à cláusula de escolha de lei, que aponta para a lei inglesa, também a mesma foi imposta pela Recorrida à Recorrente, coartando-se-lhe qualquer possibilidade de negociação e manifestação livre da sua vontade contratual, pelo que também esta cláusula padece de nulidade, desde logo, à luz do disposto no art.º 18º als. b), c) e d) do RCCG.

            26ª - A disposição de escolha de lei aplicável, viola ainda o princípio da liberdade contratual previsto no art.º 405º do Código Civil (CC) porquanto não foi negociada com a Recorrente e não corresponde a uma escolha livre e consciente desta.

            27ª - Violando, ainda, o disposto no art.º 41º n.º 2 do CC, porquanto não corresponde a uma lei que tenha qualquer conexão com algum dos elementos do negócio jurídico, nomeadamente a do domicílio das partes, circunstância da qual resulta uma evidente conexão com a lei portuguesa, que deverá ser tida como a aplicável.

            28ª - Igual conexão resulta do facto de, pese embora alojado em nuvem, o software se destinar a ser mantido e gerido pela Recorrente, a partir da sua sede em Portugal, e portanto, destinando-se o fornecimento ao território nacional.

            29ª - Pelo que, por também violar as disposições elencadas supra, deve a sentença recorrida ser revogada.

            A Ré respondeu concluindo pela improcedência do recurso.

            Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa apreciar/decidir, sobretudo: a) (não) realização de audiência prévia; b) se as partes estabeleceram validamente, nos contratos que celebraram, um pacto privativo de jurisdição (a favor dos tribunais ingleses), em razão do qual resulta a incompetência internacional dos tribunais portugueses.


*

            II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos:[2]

            1) A A. intentou a presente ação nos tribunais portugueses.

            2) A A. tem sede em Portugal e a Ré em Singapura.

            3) Foi estabelecida entre as partes uma cláusula nos contratos em causa [denominados de “...” e “...”, redigidos em língua inglesa e aludidos no relatório - ponto I., supra] que estabelece como competentes para conhecer de qualquer litígio deles emergente os Tribunais do Reino Unido, mais concretamente os tribunais da cidade de Londres [vide cláusulas 9 (c) do Doc. 4].[3]

            4) Foi trocada comunicação entre as partes previamente à celebração dos contratos.[4]

            2. Releva ainda:

            a) A Ré, na contestação, alegou, nomeadamente: a competência internacional deve ser aferida à luz dos Regulamentos Comunitários da União Europeia e não nos termos da legislação nacional, atento o primado dos primeiros; a cláusula não é inválida, não viola o direito da A. ao acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva; a validade da cláusula de escolha de foro deve ser avaliada ao abrigo do Regulamento (UE) n.º 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12.12.2012 [Regulamento de Bruxelas I], sendo válida ao abrigo dessas regras; à data em que os contratos foram concluídos, o Reino Unido ainda era um Estado-Membro da União Europeia; a cláusula de escolha de lei é válida (tanto formal, como substantivamente) à luz da Lei inglesa; a escolha desta Lei teve por subjacente um interesse sério dos declarantes, designadamente, remeter para a lei de um país terceiro, neutral à relação, lei essa que não só corresponde à lei do lugar cujos tribunais são competentes para conhecer dos litígios emergentes dos Contratos, como corresponde a uma lei para que as partes remetem comummente no âmbito do comércio internacional, sendo Londres, consabidamente, um dos principais centros mundiais de resolução de litígios comerciais internacionais; existiram negociações demoradas sobre vários aspetos dos contratos – muito em particular, acerca do preço e da estrutura de preço – e, após chegada a acordo quanto aos aspetos centrais dos contratos, as respetivas minutas foram enviadas para o Sr. AA por várias vezes, tendo-lhe sido inclusivamente (e expressamente) pedido que revisse e comentasse as minutas, inexistindo, por outro lado, qualquer comunicação que ateste uma qualquer imposição rígida e unilateral dos termos; da análise conjugada destas comunicações resulta que existiram negociações quanto ao teor dos contratos e que a A. teve várias oportunidades de analisar o conteúdo das minutas enviadas pela Ré, e que, querendo, poderia ter sugerido a introdução de modificações nas minutas, pelo que se impõe concluir que as partes tinham igual poder negocial; é perfeitamente justificável (e, de resto, prática comum) a escolha de um fórum neutral para adjudicação de litígios no quadro do comércio internacional; não basta invocar a maior onerosidade de litigar num país terceiro para estar verificado o requisito da grave inconveniência, sob pena de se permitir a uma sociedade comercial eximir-se a uma estipulação a que aderiu voluntariamente apenas em face da maior onerosidade, que também para a Ré seria menos oneroso litigar nos tribunais de Singapura, mas nem por isso se pretende eximir à jurisdição acordada; desconhece quais os meios financeiros de que a A. dispõe, e, por conseguinte, desconhece se é ou não é financeiramente incomportável para si litigar no Reino Unido e se, a tal nível, as partes estão em desequilíbrio ou não; o Regulamento de Bruxelas I aplica-se na presente situação atento o disposto no seu art.º 25º; o Reino Unido era um Estado-Membro da União Europeia, e é irrelevante a saída que, entretanto, se efetivou, porque, nos termos do art.º 67º, n.º 1, alínea a), do Acordo de saída do Reino Unido da União Europeia, o Regulamento de Bruxelas I aplica-se aos processos judiciais intentados antes do termo do período de transição e que terminou no dia 31.12.2020 (art.º 126º do referido Acordo); os Tribunais portugueses são internacionalmente incompetentes, e não está aqui em causa matéria da exclusiva competência dos tribunais portugueses.

            b) Em resposta, a A. reportou-se ao aludido na p. i. antevendo a invocação da exceção de incompetência (art.ºs 77º a 94º) e acrescentou: limitou-se a subscrever os contratos objeto dos autos não lhe tendo sido facultada oportunidade de negociação do seu conteúdo, com a justificação de que eram os contratos-tipo da Ré, usados no fornecimento e prestação de serviços a todos os seus clientes; se a A. tivesse tido oportunidade de se pronunciar e de negociar a dita cláusula (de foro), jamais a teria aceite; a imposição da mesma à A. constitui uma forma de pressionar a A. ao pagamento de uma qualquer quantia para evitar o custo da litigância no estrangeiro; o único aspeto da relação contratual que foi objeto de conversa e negociação entre as partes foi o preço; a cláusula em questão é nula na medida em que a escolha dos tribunais de Londres para dirimir um litígio emergente dos contratos envolve enormes e desproporcionais inconvenientes à A., sendo os tribunais portugueses competentes para julgar a presente ação.

            3. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão.

            A audiência prévia não se realiza: a) Nas ações não contestadas que tenham prosseguido em obediência ao disposto nas alíneas b) a d) do artigo 568º; b) Quando, havendo o processo de findar no despacho saneador pela procedência de exceção dilatória, esta já tenha sido debatida nos articulados (art.º 592º, n.º 1 do CPC). Nos casos previstos na alínea a) do número anterior, aplica-se o disposto no n.º 2 do artigo seguinte (n.º 2).

            Nas ações que hajam de prosseguir, o juiz pode dispensar a realização da audiência prévia quando esta se destine apenas aos fins indicados nas alíneas d), e) e f) no n.º 1 do artigo 591º (art.º 593º, n.º 1 do CPC). No caso previsto no número anterior, nos 20 dias subsequentes ao termo dos articulados, o juiz profere: a) Despacho saneador, nos termos do n.º 1 do artigo 595º; b) Despacho a determinar a adequação formal, a simplificação ou a agilização processual, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 6º e no artigo 547º; c) O despacho previsto no n.º 1 do artigo 596º; d) Despacho destinado a programar os atos a realizar na audiência final, a estabelecer o número de sessões e a sua provável duração e a designar as respetivas datas (n.º 2). Notificadas as partes, se alguma delas pretender reclamar dos despachos previstos nas alíneas b) a d) do número anterior, pode requerer, em 10 dias, a realização de audiência prévia; neste caso, a audiência deve realizar-se num dos 20 dias seguintes e destina-se a apreciar as questões suscitadas e, acessoriamente, a fazer uso do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 591º (n.º 3).

            4. A A. diz que era obrigatório realizar a audiência prévia, “o que fere a decisão de nulidade”.

            Pronunciando-se, o Mm.º Juiz do Tribunal a quo considerou “não ter existido qualquer nulidade, uma vez que foi concedido efectivamente o contraditório adequando-se formalmente o processo (despacho de 18/01/2022) e o mesmo foi efectivamente exercido pela Autora (Requerimento de 08/02/2022) para efeitos do disposto no art.º 547º, do CPC, bem como, foi dispensada a audiência prévia com o mesmo fundamento, tal como consta da sentença em crise”. 

            Salvo o devido respeito por opinião em contrário, afigura-se que a A. não tem razão.

            A exceção dilatória de incompetência internacional foi amplamente debatida nos articulados.

            Posteriormente, o Mm.º Juiz, previamente à decisão daquela matéria de exceção, decidiu notificar a A. para uma derradeira pronúncia.

            A A. pronunciou-se, de novo, entendendo, porém, que o processo não forneceria os elementos necessários para decidir.

            É irrecusável que o Mm.º Juiz do tribunal a quo adequou e simplificou o processado (art.º 547º do CPC[5]), sem beliscar o princípio do contraditório.[6]

            Ademais, a A. não reclamou/impugnou (formalmente, como se prevê no n.º 3 do art.º 593º do CPC)[7] na sequência do despacho de 18.01.2022 (cf. ponto I., supra) e, como se verá, os autos continham os elementos necessários e suficientes para conhecer da exceção de incompetência internacional dos tribunais portugueses, sendo, assim, inútil a prática de quaisquer outros actos.

            Daí que se conclua pela inexistência de qualquer vício ou irregularidade.

            5. Sem prejuízo do que se encontre estabelecido em regulamentos europeus e em outros instrumentos internacionais, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando se verifique algum dos elementos de conexão referidos nos artigos 62º[8] e 63º ou quando as partes lhes tenham atribuído competência nos termos do artigo 94º (art.º 59º do CPC).

            As disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das suas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático (art.º 8°, n.° 4, da CRP).

            O Regulamento (UE) n.º 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12.12.2012 / “Regulamento de Bruxelas I” (relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial/reformulação), cujas normas têm aplicação direta na ordem jurídica interna, no seu art.º 25º, sob a epígrafe “Extensão de competência”, dispõe o seguinte:

            1. Se as partes, independentemente do seu domicílio, tiverem convencionado que um tribunal ou os tribunais de um Estado-Membro têm competência para decidir quaisquer litígios que tenham surgido ou que possam surgir de uma determinada relação jurídica, esse tribunal ou esses tribunais terão competência, a menos que o pacto seja, nos termos da lei desse Estado-Membro, substantivamente nulo. Essa competência é exclusiva, salvo acordo das partes em contrário. O pacto atibutivo de jurisdição deve ser celebrado: a) Por escrito ou verbalmente com confirmação escrita; b) De acordo com os usos que as partes tenham estabelecido entre si; ou c) No comércio internacional, de acordo com os usos que as partes conheçam ou devam conhecer e que, em tal comércio, sejam amplamente conhecidos e regularmente observados pelas partes em contratos do mesmo tipo, no ramo comercial concreto em questão.

            2. Qualquer comunicação por via eletrónica que permita um registo duradouro do pacto equivale à «forma escrita».

            5. Os pactos atributivos de jurisdição que façam parte de um contrato são tratados como acordo independente dos outros termos do contrato.

            A validade dos pactos atributivos de jurisdição não pode ser contestada apenas com o fundamento de que o contrato não é válido.

            6. O Mm.º Juiz do Tribunal a quo considerou e ponderou, nomeadamente: a validade da cláusula de escolha de foro deve ser avaliada ao abrigo do Regulamento (UE) n.º 1215/2012, de 12.12.2012, sendo válida ao abrigo dessas regras, não devendo ser avaliada nos termos do direito substantivo interno de qualquer das leis das várias jurisdições potencialmente aplicáveis;  considerando a sede da A. em Portugal e que a Ré tem a sede em Singapura (Ásia), não se vê como a fixação do foro aos tribunais de Londres pode ser mais oneroso para a A., antes pelo contrário, se tivesse sido fixado como foro competente os tribunais de Singapura (a sede da Ré) ainda se poderia questionar a onerosidade para a A., mas não, no caso concreto os tribunais ingleses estão bastante mais próximos da sede da A. (Portugal) do que se fosse em Singapura, pelo que a A. sai beneficiada com a fixação dos tribunais competentes em Londres e existe um interesse sério, justificado e não arbitrário, na escolha dos tribunais ingleses como competentes, tratando-se de um país neutro relativamente a ambas as partes; a A. não é um consumidor individual, mas uma sociedade comercial tal como a Ré; o mencionado Regulamento aplica-se na presente situação atento o disposto no seu art.º 25º, do qual resulta que se aplica mesmo em situações em que nenhuma das partes do contrato está domiciliada na União Europeia, bastando que tenham convencionado como competentes os tribunais de um Estado-Membro, caso em que serão internacionalmente competentes os tribunais desse Estado-Membro; à data da conclusão dos Contratos e da interposição da presente ação, o Reino Unido era um Estado-Membro da União Europeia, destacando-se que para estes efeitos, é irrelevante a saída do Reino Unido da União Europeia, nos termos do art.º 67º, n.º 1, alínea a), do Acordo sobre a saída do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte da União Europeia e da Comunidade Europeia da Energia Atómica (2019/C 384 I/01); o referido Regulamento aplica-se aos processos judiciais intentados antes do termo do período de transição (que decorreu até 31.12.2020/art.º 126º do referido Acordo); analisando a referida cláusula à luz do disposto no Regulamento (UE) n.º 1215/2012, na medida em que a cláusula não é substantivamente nula nos termos da lei inglesa e corresponde a uma estipulação escrita que se encontra de acordo com os usos do comércio internacional, regularmente observados em contratos celebrados entre partes domiciliadas em países diferentes, dever-se-á concluir que a cláusula de escolha de foro é válida e eficaz, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 25º do citado Regulamento e por isso, os Tribunais ingleses são internacionalmente competentes para julgar o presente litígio e os Tribunais portugueses são internacionalmente incompetentes; relevando o princípio do primado do direito da União Europeia sobre o direito interno dos Estados-Membros, também inexiste qualquer violação de disposições fundamentais e estruturantes do Estado Português.

            Rematou concluindo pela verificação da exceção dilatória de incompetência internacional dos tribunais portugueses para julgar o presente caso, o que implica a absolvição da Ré da presente instância, ao abrigo das disposições conjugadas dos art.ºs 96º, alínea a), 97º, 99º, n.º 1, 576º, n.º 2 e 577º, alínea a), do CPC.

            7. A competência do tribunal constitui um pressuposto processual a aferir perante a relação material controvertida e o pedido formulado pelo autor, na p. i., e as normas de competência internacional são aquelas que atribuem a um conjunto de tribunais de um Estado, o complexo de poderes para o exercício da função jurisdicional em situações transnacionais.

            In casu, estamos perante uma situação jurídica transnacional, em que há elementos de estraneidade, mormente os domicílios das partes contratantes/litigantes; como situação jurídica plurilocalizada, com pontos de contacto relevantes com mais de um ordenamento jurídico, ter-se-ão de ponderar as regras da competência internacional, em particular o direito da competência internacional da União Europeia, sopesando a sua prevalência face às regras internas/regra do primado do direito da União Europeia e da sua prevalência sobre o direito nacional (cf. art.ºs 8º, n.º 4, da CRP e 59º, do CPC[9]).

            Importa assim considerar a aplicabilidade do Regulamento (UE) n.º 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12.12.2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, diretamente aplicável (vigente desde 10/01/2015 - art.ºs 66º e 81º), que reformulou, no espaço da União Europeia, as regras relativas à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, constantes do Regulamento (CE) n.º 44/2001.

            8. Releva igualmente a jurisprudência do TJCE que considerou, a propósito da norma similar constante do art.º 17º da Convenção de Bruxelas - jurisprudência extensível aos art.ºs 23º do Regulamento n.º 44/2001 e 25º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012 - que a noção de pacto de jurisdição é autónoma relativamente aos direitos nacionais dos Estados-Membros (cf. Acórdão do TJCE Powell Doffryn v. Wolfang Petereit, de 10/03/1992).[10]  

            Ainda segundo a jurisprudência do TJUE, lapidar para a uniformização do Direito da União Europeia, é ponto assente que o dito art.º 23º Regulamento n.º 44/2001 assume carácter exclusivo na apreciação da validade dos pactos de jurisdição submetidos à aplicação do Regulamento n.º 44/2001, entendimento, naturalmente, aplicável à norma similar do 25º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012; a orientação do TJUE é, pois, categórica no sentido dos requisitos de validade do pacto de jurisdição só serem aqueles que estão vertidos nos mencionados art.ºs.[11]

            Por conseguinte, é irrelevante para esse efeito fazer qualquer tipo de apreciação da validade do pacto de jurisdição à luz do direito interno do respetivo Estado-Membro.

            E, assim sendo, para que a escolha do tribunal seja válida é desnecessário que exista qualquer conexão entre o objeto do litígio e o tribunal designado[12], não sendo valoráveis, designadamente, os hipotéticos inconvenientes, para uma das partes, da localização do foro convencionado.

            De resto, é evidente que sempre que as partes atribuem, através de um pacto de jurisdição, competência a um tribunal estrangeiro, o qual se situa forçosamente noutro Estado-Membro, ocorrerá sempre o inconveniente, pelo menos para uma delas, de esse tribunal ser distante da respetiva sede; e mesmo que se pondere que nos deparamos com uma cláusula contratual geral, tem se atender ao facto de a A./recorrente ser uma sociedade comercial, uma entidade com natureza empresarial e não um mero consumidor individual[13], sendo que - na situação em análise - a validade do pacto de jurisdição constante de uma cláusula contratual geral integrada num contrato celebrado entre um empresário ou entidade equiparada é analisada, exclusivamente, segundo o disposto no art.º 25º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012.

            9. Decorre do exposto:

            - As disposições do Regulamento n.º 1215/2012, incluindo a disposição do art.º 25º, têm prioridade sobre as normas do Código de Processo Civil;

            - As situações jurídicas plurilocalizadas, desde que transnacionais, podem ser objecto de pactos atributivos de jurisdição, nos termos do art.º 25º do Regulamento n.º 1215/2012;

            - A validade dos pactos atributivos de jurisdição concluídos ao abrigo do art.º 25º do Regulamento é independente de qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, não sendo valoráveis, designadamente, os hipotéticos inconvenientes, para uma das partes, da localização do foro convencionado a que o direito interno confira relevo.

            A aplicação do art.º 25º do Regulamento n.º 1215/2012 permite uma derrogação dos critérios gerais em matéria de competência, em homenagem ao princípio da autonomia da vontade das partes e, da derrogação dos critérios gerais em matéria de competência, decorre que as partes, independentemente do seu domicílio, e não se colocando qualquer vício ou imperfeição formal relativamente ao pacto atributivo de jurisdição, podem convencionar que um tribunal (ou tribunais) de um Estado-Membro da União Europeia tenha competência para decidir quaisquer litígios surgidos ou a surgir entre elas de uma determinada relação jurídica, em termos tais que à luz do Regulamento, não cabe aferir da eventual aplicação do disposto em normas de direito nacional.[14]

            10. Entre os requisitos essenciais para que um pacto de jurisdição concluído ao abrigo do art.º 25º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012 seja substantivamente válido está o de que designe, com suficiente determinação, duas coisas: a relação jurídica e o tribunal em que as questões emergentes da relação jurídica designada hão-de ser apreciadas e decididas.[15] Mas não está, em todo o caso, o de que o tribunal designado tenha alguma conexão objetiva com a relação jurídica designada, com os seus sujeitos ou com o seu objecto.

            11. Interpretar-se o conceito de invalidade substancial do art.º 25º do Regulamento n.º 1215/2012 em termos de abranger a invalidade por violação das regras de competência interna seria condicionar o exercício da autonomia privada à existência de uma conexão objetiva, de uma ligação do litígio à ordem jurisdicional portuguesa[16] - “(…) qualquer interpretação, desproporcionadamente exigente, que levasse a condicionar o exercício da autonomia da vontade à existência de uma ligação profunda do litígio à ordem jurisdicional a que se atribui competência para dele conhecer, estabelecida apenas com base na verificação dos elementos típicos que normalmente (não havendo pacto de jurisdição) relevam no estabelecimento do tribunal internacionalmente competente, implicaria uma desproporcional restrição ao princípio da autonomia da vontade, condicionando-a muito para lá do que seria razoável e adequado”.[17]

Ademais, no comércio internacional, ao estipular uma cláusula atributiva de jurisdição, o que as partes procuram é precisamente atribuir a um determinado foro, desde logo por razões de segurança jurídica, a competência para a resolução dos litígios conexionados com o relacionamento contratual que entre si estabeleceram.[18]

            12. Na situação em análise, tendo em conta a factualidade descrita em I. e II. 1. (e respetivas “notas”) - além do mais, é irrecusável que uma das partes está domiciliada num Estado-Membro da U.E. e o pacto de jurisdição atribuiu a competência aos tribunais de um (então) Estado-Membro (tribunais ingleses) - e o descrito enquadramento (normativo, doutrinário e jurisprudencial), podemos considerar, por um lado, que as partes fizeram constar num dos contratos em causa uma claúsula de foro (atribuindo competência aos tribunais ingleses para conhecer de qualquer litígio emergente dos contratos, mais concretamente os tribunais da cidade de Londres) observando as exigências de forma previstas no art.º 25º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012, e, por outro lado, que será de afirmar a validade do pacto atributivo de jurisdição, desde logo, porquanto a cláusula atributiva de jurisdição respeita a uma relação jurídica específica, claramente definida nos contratos celebrados entre as partes[19], tudo, à luz da assinalada prevalência do direito comunitário e dos princípios supra descritos, sendo que à data da conclusão dos Contratos e da interposição da presente ação o Reino Unido era um Estado-Membro da União Europeia, aplicando-se, pois, o Regulamento (UE) n.º 1215/2012 [cf., v. g., art.ºs 67º, n.º 1, alínea a) e 126º, do ACORDO sobre a saída do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte da União Europeia e da Comunidade Europeia da Energia Atómica 2019/C 384 I/01[20]], quedando inaplicável a legislação nacional (adjetiva e substantiva), mormente a do Regime das Cláusulas Contratuais Gerais / RCCG (aprovado pelo DL n.º 446/85, de 25.10).

            13. Acresce que não foram alegados e/ou não ficaram comprovados factos que levem a considerar, v. g., estarmos perante cláusula contratual geral incluída no contrato sem prévia negociação das partes[21] ou que corporize posição (da A.) manifestamente em desequilíbrio face à Recorrida, sendo que - como se expôs - para que a escolha do tribunal seja válida não é necessário que exista uma qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, não sendo valoráveis, consequentemente, hipotéticos inconvenientes para uma das partes (no caso, para a A.) decorrentes da localização do foro convencionado.[22]

            De resto, prevalecendo o art.º 25º do Regulamento (com a autonomia e exclusividade melhor explicitadas em II. 8., supra), sempre ficaria prejudicada a apreciação da validade do pacto de jurisdição em apreço à luz de normas de direito interno português (v. g., as dos art.ºs 94º do CPC e 19º, al. g), do RCCG).

            14. Assim, nenhuma censura merece a decisão recorrida ao afirmar a validade do pacto atributivo de jurisdição em discussão nos autos, e, consequentemente, a incompetência internacional dos Tribunais Portugueses para conhecer e decidir o litígio.

            15. Soçobram, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso, não se mostrando violadas quaisquer disposições legais.


*

            III. Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.      

            Custas pela A./apelante.  

                                                                    *


                 11.10.2022            



[1] Nos quais se concluiu e requereu: «(...) não prescindindo a Autora da realização de audiência prévia e da produção de prova dos factos constitutivos dos direitos que, devem os presentes autos prosseguir a sua normal tramitação e, nessa sede, ser facultado às partes a discussão de facto e de direito sobre as exceções alegadas pela Ré, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 591º, n.º 1, alínea b), o que desde já se requer.»; «(...) é possível antecipar que a referida exceção [de incompetência internacional dos tribunais portugueses] carecerá de conhecimento de matéria de facto por esse (...) Tribunal, pelo que, não se antevê que o exercício imediato do direito de resposta às exceções pela ora A., venha a colocar esse (...) Tribunal em situação de poder conhecer da referida exceção

[2] Por acordo das partes ou documentos não impugnados.

[3] Contratos a que respeita a tradução de fls. 296 e 316 verso (cujos originais se encontram reproduzidos a fls. 16 e 28), assinados pela A. a 26.9.2019 e pela Ré a 27.9.2019, constando da alínea c), do ponto “9.Geral” do denominado “Contrato de Subscrição de Serviço de Software”: «Lei aplicável; Local. As leis da Inglaterra e do País de Gales (sem dar efeito aos seus princípios de conflito de leis) regem todas as matérias decorrentes ou relacionadas com este Contrato e as transações nele contempladas. Quaisquer reclamações ou ações relativas ou decorrentes do presente Contrato devem ser apresentadas exclusivamente num tribunal de jurisdição competente com sede em Londres, Reino Unido, e cada parte do presente Contrato submete a jurisdição desses tribunais para efeitos de todas as ações e processos decorrentes ou relacionados com o presente Contrato.»  (sublinhado nosso)
[4] Cf. as comunicações eletrónicas das partes de 23.9.2019, reproduzidas a fls. 196 verso, 197 e 282, onde se refere, nomeadamente: «(...) Conforme discutido, envio em anexo os nossos contratos finais, que são praticamente idênticos às versões preliminares que já tinha revisto, apenas completadas com dados relevantes onde necessário. / Ficaria muito grato se conseguisse ter os contratos assinados assim que possível para que possamos mobilizar os nossos recursos e dar início ao trabalho (...)» (pelas 9.12 horas); «(...) Como discutimos, em anexo encontram-se os nossos contratos finais, que são praticamente idênticos às versões preliminares que analisou anteriormente, tendo sido concluídos com detalhes relevantes sempre que necessário. / Ficaria muito grato se os pudesse assinar o mais rapidamente possível, para que possamos utilizar os nossos recursos e iniciar o trabalho, uma vez que o tempo já é muito curto (...)» (pelas 12.12 horas); «(...) Estou agora a entrar para o avião. Vou rever durante o voo e envio de volta...» (pelas 21.24 horas). (sublinhado nosso)
[5] Que preceitua: «O juiz deve adotar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos atos processuais ao fim que visam atingir, assegurando um processo equitativo

[6] Mormente na formulação do art.º 3º, n.º 3 do CPC: «O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem
[7] Vide Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Código de Processo Civil, Os artigos da reforma, 2ª edição, Vol. I, Almedina, 2014, pág. 539.

[8] Que estabelece: «Os tribunais portugueses são internacionalmente competentes: a) Quando a ação possa ser proposta em tribunal português segundo as regras de competência territorial estabelecidas na lei portuguesa; b) Ter sido praticado em território português o facto que serve de causa de pedir na ação, ou algum dos factos que a integram; c) Quando o direito invocado não possa tornar-se efetivo senão por meio de ação proposta em território português ou se verifique para o autor dificuldade apreciável na propositura da ação no estrangeiro, desde que entre o objeto do litígio e a ordem jurídica portuguesa haja um elemento ponderoso de conexão, pessoal ou real

[9] Perante a norma do art.º 61º do CPC de 1961, comentava Lebre de Freitas (Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1º, 2ª ed., pág. 130) que “Além de receberem competência do art.º 65º, para a qual o preceito anotado remete, os tribunais portugueses recebem-na também de regulamentos comunitários e convenções internacionais que, no seu campo específico de aplicação, prevalecem sobre as normas processuais portuguesas, nomeadamente sobre as normas reguladoras da competência internacional constantes do código”.

   Cf. ainda, nomeadamente, o acórdão do STJ de 27.5.2008-processo 08B278, publicado no “site” da dgsi.
[10] Proc. n.º C-214/89, Coletânea 1992/I-1745, n.ºs 13 e 14.

[11] Cf., nomeadamente, o Acórdão do TJCE Trasporti Castelletti Spedizioni Internazionali SpA v. Hugo Trumpy SpA, de 16/03/1999/Proc. n.º C-159/97, acessível em texto integral em http://curia.europa.eu., sobre a norma paralela do art.º 17º da Convenção de Bruxelas, inúmeras vezes citado, inclusive, na jurisprudência do STJ – cf., sobretudo, o acórdão do STJ de 11.02.2015-processo 877/12.7TVLSB.L1-A.S1, publicado no “site” da dgsi e seguido de perto (e reproduzido) noutros arestos do STJ.

   Assim, também, Sofia Henriques, in Os Pactos de Jurisdição no Regulamento (CE) n.º 44/2001, 2006, págs. 81 e seguinte: “O Regulamento comunitário, tal como acontecia na Convenção de Bruxelas, não exige, nos pactos de jurisdição, qualquer conexão entre o tribunal escolhido pelas partes e a relação litigiosa, nem a adequação ou justificação da escolha do tribunal. / Na verdade, diferentemente do que acontece no nosso direito interno, (…) o Regulamento não exige o controlo dos fundamentos da atribuição de competência ao tribunal escolhido, pelo que as partes poderão escolher um qualquer foro competente, independentemente das razões que fundamentam essa escolha.

  Miguel Teixeira de Sousa, no estudo Aspectos gerais do Reg. 1215/2012 (Reg. Bruxelas Ia) - Parte I - disponível em https://blogippc.blogspot.com/2014/04/aspectos-gerais-do-reg-12152012-reg.html -, destaca, nomeadamente: «Art.º 25º, n.º 1: alargamento do âmbito de aplicação do regime relativo aos pactos de jurisdição; em comparação com o art.º 23º Reg. 44/2001 deixa de ser necessário que, pelo menos, uma das partes tenha domicílio num Estado-membro; portanto, o art.º 25º é aplicável sempre que seja designado (por quaisquer partes) o tribunal de um Estado-membro do Reg. 1215/2012; o regime torna ainda mais residual o âmbito de aplicação do art.º 94º  do CPC, que só pode ser aplicado a acordos que retirem competência internacional a um tribunal português e a atribua aos tribunais de um Estado que não seja membro do Reg. 1215/2012; o estabelecido no art.º 25º segue, em alguns aspectos, o disposto na Convenção sobre os Acordos de Eleição do Foro (Haia, 30/6/2005), cuja aprovação está em preparação pela União Europeia (cf. COM(2014) 46 final); (...)»             

[12] Vide, por exemplo, Miguel Teixeira de Sousa, no artigo publicado em 26.4.2014, sob o título «Pactos de jurisdição e swaps: demasiado “nacionalismo” e pouco “europeísmo”?» (in http://blogippc.blogspot.pt/2014/04/pactos-de-jurisdicao-e-swaps-demasiado.html.), sustentando: «(i) os requisitos de validade da convenção de competência só podem ser aqueles que constam do art.º 17º CBrux (agora do art.º 23º Reg. 44/2001 e, a partir de 10/1/2015, do art.º 25º Reg. 1215/2012), pelo que o direito dos Estados-membros não pode acrescentar outros requisitos de validade a essa convenção; (ii) para que a escolha do tribunal seja válida não é necessário que exista uma qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado».
[13] Vide L. Lima Pinheiro, Direito Internacional Privado – Competência Internacional e Reconhecimento de Decisões Estrangeiras, Vol. III, 2012, 2ª edição, págs. 308/309, ao salientar que nas relações com consumidores justifica-se um limite à validade ou eficácia dos pactos de jurisdição, podendo o tribunal nacional apreciar oficiosamente a questão do carácter abusivo da cláusula atributiva de competência, em face da Diretiva 93/13/CEE do Conselho de 5/04/1993 relativa às cláusulas abusivas em contratos celebrados entre profissionais e consumidores - o consumidor é protegido como parte economicamente e contratual mais fraca e negocialmente menos experiente.

[14] Com este entendimento, cf., de entre vários, os acórdãos do STJ de 11.02.2015-processo 877/12.7TVLSB.L1-A.S1 [seguido de perto, e reproduzido, noutros arestos do STJ; consta do sumário: «III - Perante uma situação jurídica plurilocalizada e transnacional, tem de se atender às regras da competência internacional e, particularmente, quando envolva Portugal e algum dos Estados-Membros da União Europeia, ao direito da competência internacional da União Europeia, constante do Regulamento (CE) n.º 44/2001, e desde 10/01/2015, do Regulamento (UE) n.º 1215/2012) – cf. art.º 8º, n.º 4, da CRP. (...) V - O Regulamento n.º 44/2001 não exige qualquer solenidade especial para a atribuição de competência judiciária e o regime do seu art.º 23º prevalece sobre as regras de forma de direito interno que fixem requisitos formais mais exigentes para os pactos de jurisdição. VI - A noção de pacto de jurisdição vertida no Regulamento n.º 44/2001 é autónoma relativamente aos direitos nacionais dos Estados-Membros e deve ser interpretada como um conceito autónomo. VII - Perante o regime do Regulamento n.º 44/2001, para que a escolha do tribunal seja válida é desnecessário que exista qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, não sendo valoráveis, designadamente, os hipotéticos inconvenientes, para uma das partes, da localização do foro convencionado. (...) IX - A validade do pacto de jurisdição, constante de uma cláusula contratual geral, integrada num contrato celebrado entre um empresário ou entidade equiparada, é analisada, exclusivamente, segundo o disposto no art.º 23º, do Regulamento n.º 44/2001, sendo inaplicável o regime jurídico interno das cláusulas contratuais gerais.»], 19.11.2015-processo 2864/12.6TBVCD.P1.S1 [concluindo-se: «1. Perante o regime do Regulamento n.º 44/2001, para que a escolha do tribunal seja válida é desnecessário que exista qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, não sendo valoráveis, designadamente, os hipotéticos inconvenientes, para uma das partes, da localização do foro convencionado a que o direito interno confira relevo. 2. A validade do pacto de jurisdição, constante de uma cláusula contratual geral, integrada num contrato celebrado entre um empresário ou entidade equiparada, é analisada, exclusivamente segundo o disposto no art.º 23º do Regulamento n.º 44/2001, sendo inaplicável o regime jurídico interno das cláusulas contratuais gerais.»], 26.01.2016-processo 540/14.4TVLSB.S1 [sumariando-se: «II - Segundo jurisprudência pacífica do TJUE, os requisitos de validade e de convenção de competência apenas são aqueles que constam do art.º 23º do Regulamento n.º 44/2001, pelo que o direito dos Estados-Membros não pode acrescentar outros; e ainda para que a escolha do tribunal seja válida não é necessário que exista uma qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, não sendo valoráveis, consequentemente, hipotéticos inconvenientes para uma das partes (no caso, para a recorrente), decorrentes da localização do foro convencionado. III - Em função da autonomia e exclusividade do normativo inserto no art.º 23º do Regulamento n.º 44/2001, não cabe aquilatar, por estar prejudicado, da eventual aplicação do disposto em normas de direito nacional, nomeadamente, as vertidas nos art.ºs 94º do CPC e 19º, n.º 1, al. g), da LCCG.»], 04.02.2016-processo  536/14.6TVLSB.L1.S1 [com o sumário: «1. Considera-se claro e evidente, face ao relevo que o Direito Comunitário e a jurisprudência do TJ vêm conferindo à autonomia da vontade das partes na estipulação da competência internacional, que bastam como elementos de estraneidade do litígio sujeito a pacto de jurisdição o local possível de cumprimento de obrigações contratuais, a submissão, no exercício da autonomia da vontade das partes, da substância do litígio a um direito material estrangeiro e a conexão - senão jurídica, ao menos funcional e económica - dos contratos de derivados financeiros celebrados por contraentes sediados em Portugal a contratos de mútuo bancário de contexto claramente internacional - determinando a ponderação global de todos esses elementos de internacionalidade que a relação contratual em litígio não possa qualificar-se como relação puramente interna, suscetível de obstar à aplicação da disciplina contida no art.º 23º do Regulamento 44/2001. 2. Na verdade, qualquer interpretação, desproporcionadamente exigente, que levasse a condicionar o exercício da autonomia da vontade à existência de uma ligação profunda do litígio à ordem jurisdicional a que se atribui competência para dele conhecer, estabelecida apenas com base na verificação dos elementos típicos que normalmente (não havendo pacto de jurisdição) relevam no estabelecimento do tribunal internacionalmente competente, implicaria uma desproporcional restrição ao princípio da autonomia da vontade, condicionando-a muito para lá do que seria razoável e adequado: mesmo que se entenda que não deve bastar, como elemento exclusivo de estraneidade, a mera celebração de um pacto de jurisdição, este ficará sujeito à disciplina do art.º 23º desde que a relação controvertida, valorada globalmente, apresente indícios minimamente consistentes de transnacionalidade, que obstem à sua qualificação como relação jurídica meramente interna. (...) 4. Perante o regime do Regulamento n.º 44/2001, para que a escolha do tribunal seja válida é desnecessário que exista qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, não sendo valoráveis, designadamente, os hipotéticos inconvenientes, para uma das partes, da localização do foro convencionado a que o direito interno confira relevo. 5. A validade do pacto de jurisdição, constante de uma cláusula contratual integrada num contrato de swap celebrado entre uma empresa pública regional e determinado banco, em que foi aquela a propor ao banco as cláusulas que integram os contratos em litígio, objecto, aliás, de um específico procedimento negocial, em que a dita empresa foi coadjuvada por outra entidade bancária, é analisada, exclusivamente segundo o disposto no art.º 23º do Regulamento n.º 44/2001, sendo inaplicável o regime jurídico interno das cláusulas contratuais gerais.»], 16.02.2016-processo 135/12.7TCFUN.L1.S1, 06.9.2016-processo 1386/15.8T8PRT-B.P1.S1 [referindo-se no sumário: «III - Em questões de competência internacional, a nossa lei processual reconhece a prioridade de que gozam os regulamentos europeus e outros instrumentos internacionais (art.º 59°), sendo pacificamente aceites entre nós o efeito directo e o primado do direito da União Europeia (cf. art.º 8°, n.º 4 da CRP), bem como a proeminência que o direito comunitário e a jurisprudência do TJUE vem conferindo a liberdade contratual, enquanto emanação do princípio da autonomia da vontade das partes na estipulação da competência internacional, que, aliás, vem claramente explicitado nos considerandos 19º e 20º do Regulamento (UE) 1215/2012, de 12-12. IV - Como decorrência desses princípios, têm sido acolhidas a independência da noção e a prevalência do regime do pacto (convenção) atributivo de jurisdição constante do art.º 25° já citado Regulamento (...), face a requisitos formais eventualmente mais exigentes que lhe sejam impostos pelos direitos nacionais dos estados-membros. Nessa senda, não cabe aferir da eventual aplicação do disposto em normas de direito nacional, como as vertidas no CPC (nomeadamente a do art.º 94°) ou da LCCG (cláusulas contratuais gerais) e completamente irrelevante a pretensão de se submeter ou condicionar o exercício da autonomia da vontade a existência de uma conexão estreita do litígio a ordem jurisdicional a que se atribui competência para dele conhecer, sendo, por isso, desnecessário que tal pacto se mostre justificado por um interesse sério de, pelo menos, uma das partes e sendo, consequentemente, desconsideradas as eventuais vantagens ou desvantagens que daí advenham.»], 09.02.2017-processo 1387/15.6T8PRT-B.L1.P1-A, 13.11.2018-processo 6919/16.0T8PRT.G1.S1 [tendo-se sumariado: «I - A jurisprudência do Tribunal de Justiça (TJ) é clara quanto ao entendimento de que a noção de pacto atributivo de jurisdição (art.º 25º do Regulamento (UE) 1215/2012 do Parlamento e do Conselho, de 12 de dezembro de 2012) é autónoma, relativamente ao direito interno de cada Estado-Membro – a validade do pacto de jurisdição deve ser, exclusivamente aferida (preenchida) à luz da própria disposição do Regulamento, ficando excluída a convocação, no caso e designadamente, do art.º 94º CPC e do Regime das Cláusulas Contratuais Gerais (DL 446/85, de 25 de Outubro). II - A existência de um documento escrito, de teor constitutivo ou confirmativo, que consagre o acordo de vontades na celebração de um pacto atributivo de jurisdição, nos precisos termos constantes da al. a) do n.º 1 do art.º 25º, cit., constitui formalidade ad substantiam. (...)»], 19.12.2018-processo 2312/16.2T8FNC.L1.S1, 07.3.2019-processo 13688/16.1TBPRT.P1.S1 [com o sumário: «I - A aferição do pressuposto processual da competência, nomeadamente da competência internacional, deve ser equacionada em função dos contornos da pretensão deduzida tal como se encontre configurada na petição inicial. II - As normas dos regulamentos europeus prevalecem sobre as normas processuais portuguesas e têm aplicação directa na ordem interna. III - Uma situação jurídica plurilocalizada e transnacional pode ser objecto de pacto atributivo de competência nos termos do art.º 25º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012. (...)»], 09.5.2019-processo 3793/16.0T8VIS.C1.S1 [sumariando-se: «I. As disposições do Regulamento (UE) n.º 1215/2012, incluindo a disposição do art.º 25º, têm prioridade sobre as disposições do Código de Processo Civil. II. As situações jurídicas plurilocalizadas, desde que transnacionais, podem ser objecto de pactos atributivos de jurisdição, nos termos do art.º 25º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012. III. A validade dos pactos atributivos de jurisdição concluídos ao abrigo do art.º 25º do Regulamento é independente de qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, “não sendo valoráveis, designadamente, os hipotéticos inconvenientes, para uma das partes, da localização do foro convencionado a que o direito interno confira relevo”. IV. Entre os requisitos essenciais para que um pacto de jurisdição concluído ao abrigo do art.º 25º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012 seja substantivamente válido está o de que designe, com suficiente determinação, duas coisas - a relação jurídica e o tribunal em que as questões emergentes da relação jurídica designada hão-de ser apreciadas e decididas. V. Entre os requisitos essenciais para que um pacto de jurisdição seja substantivamente válido não está, em todo o caso o de que o tribunal designado tenha alguma conexão objectiva com a relação jurídica designada, com os seus sujeitos ou com o seu objecto. VI. O conceito de invalidade substancial do art.º 25º do Regulamento n.º 1215/2012 deve interpretar-se em termos de não abranger a invalidade por violação das regras de competência interna e, designadamente, das regras de competência interna dos arts. 94º, 95º e 104º do CPC.»] e 07.10.2021-processo 448/18.4T8FAR.E1.S1, publicados no site da dgsi.

[15] Vide Rui Dias, Pactos de jurisdição societários, Livraria Almedina, Coimbra, 2018, pág. 216.
[16] Cf. o cit. acórdão do STJ de 09.5.2019-processo 3793/16.0T8VIS.C1.S1.
[17] Cf. o cit. acórdão do STJ 04.02.2016-processo 536/14.6TVLSB.L1.S1.
[18] Vide Rui Moura Ramos, Revista de Legislação e de Jurisprudência (RLJ), anos 147º, pág. 274 e 148º, págs. 123 e seguinte.
[19] Cf., designadamente, os acórdãos do Tribunal de Justiça citados no comentário do mesmo Professor na RLJ, ano 148º, pág. 121, e notas (16) e (17) e o cit. acórdão do STJ de 07.10.2021-processo 448/18.4T8FAR.E1.S1.
[20] Consta do referido Acordo, designadamente:

               - No Reino Unido, bem como nos Estados-Membros em situações que envolvam o Reino Unido, são aplicáveis os atos ou disposições a seguir enumerados, no que respeita a processos judiciais intentados antes do termo do período de transição e a processos ou ações relacionados com esses processos judiciais nos termos dos artigos 29o, 30o e 31o do Regulamento (UE) n.o 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, do artigo 19o do Regulamento (CE) n.o 2201/2003 ou dos artigos 12o e 13o do Regulamento (CE) n.o 4/2009 do Conselho: As disposições do Regulamento (UE) n.o 1215/2012 relativas à competência (art.º 67º, n.º 1, alínea a)).

               - É estabelecido um período de transição ou de execução, com início na data de entrada em vigor do presente Acordo e termo em 31 de dezembro de 2020 (art.º 126º).

[21] Cf., principalmente, II. 1. 3) e “nota 3”, supra.

    Porém, mesmo admitindo que pudesse revestir tal natureza – e estando em causa litígio entre entidades coletivas, emergente do desenvolvimento das respetivas atividades empresariais – não pode convocar-se a proibição constante do art.º 19º, alínea g) do DL n.º 446/85, de 25.10, para criar um obstáculo adicional à validade dos pactos de jurisdição, tal como emerge do estatuído no art.º 25º do Regulamento em causa - cf., nomeadamente, os referidos acórdãos do STJ de 11.02.2015-processo 877/12.7TVLSB.L1-A.S1 e de 04.02.2016-processo  536/14.6TVLSB.L1.S1.
[22] Cf., por exemplo, o cit. acórdão do STJ de 26.01.2016-processo 540/14.4TVLSB.S1.