REVISTA EXCECIONAL
Sumário


Afirmando o Acórdão recorrido que as deduções a que se refere a cláusula 136.º do ACT aplicável apenas têm como único critério o tempo de descontos para a Segurança Social, ao passo que o Acórdão fundamento atende expressamente tanto ao tempo, como ao valor das retribuições, existe oposição de respostas quanto à mesma questão de direito, admitindo-se a revista excecional.

Texto Integral




Processo n.º 629/21.3T8CSC.L1.S1

Acordam na Formação prevista no artigo 672.º, n.º 3 do CPC junto da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça,


AA intentou contra Banco Santander Totta, S.A. ação declarativa, sob a forma de processo comum, peticionando que se condene o Réu:
a) a reconhecer ao Autor o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 46,66 %, correspondente a 7 anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
b) a pagar ao Autor o valor € 3.147,21, acrescida de juros de mora legais no montante de € 97,59, num valor total global de € 3.244,80 Euros, correspondente ao valor excessiva e ilegalmente descontado, valor onde se encontram englobados os respetivos subsídios de férias e de Natal, acrescida dos juros vencidos até integral pagamento do valor em divida.
c) a aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do CNP a entregar ao Banco, respeitante aos descontos efetuados pelo Autor para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
d) a pagar ao Autor todas as quantias que ilicitamente venha a reter da pensão do CNP pela não aplicação da regra descrita em c) do pedido, desde Junho de 2020 até trânsito em julgado da mesma ou efetivo e real pagamento do devido, acrescidas de juros de mora vincendos, a liquidar em execução de sentença.

O Réu contestou.

Foi proferido saneador-sentença com o seguinte dispositivo:

“Face ao exposto julgo a ação procedente e, em consequência:

a) Condeno a ré Banco Santander Totta, S.A, a reconhecer ao autor AA o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 46,666%, correspondente aos 7 anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;

b) Condeno a ré a pagar ao autor a quantia de € 3.147,21 (três mil cento e quarenta e sete euros e vinte e um cêntimos), correspondente ao valor excessivamente descontado entre maio de 2019 e março de 2021, valor onde se encontram englobados os respetivos subsídios de férias e de Natal, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento;

c) Condeno a ré a aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do Centro Nacional de Pensões a entregar ao Banco/ré, respeitante aos descontos efetuados pelo autor para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;

d) Condeno a ré a pagar ao autor todas as quantias que tenha retido da pensão do Centro Nacional de Pensões, desde março de 2021, pela não aplicação da regra descrita em c), e venha a reter até trânsito em julgado da mesma, acrescidas de juros de mora vincendos, a liquidar em incidente de liquidação.”

O Réu interpôs recurso de apelação.

Por Acórdão do Tribunal da Relação de 9.03.2022 foi decidido “negar provimento ao recurso, mantendo a sentença da 1.ª Instância”.

O Réu interpôs recurso de revista excecional, tendo invocado para o efeito a alínea c) do n.º 1 do artigo 674.º do CPC e apresentado como fundamento o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto de 10/10/2016, proferido no processo 4150/15.0T8MTS.P1 já transitado em julgado, conforme certidão junta.

O Autor contra-alegou.

A respeito da contradição invocada disse o Recorrente:

“I. Trata-se da mesma questão de direito com os mesmos pressupostos de facto, porquanto ambos os arestos decidiram sobre como apurar o benefício pago pelo regime geral de segurança social para o efeito da aplicação do disposto na cláusula 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho do setor bancário (BTE n.º 3 de 22/01/2011 - Data de Distribuição: 24/01/2011) – atualmente cláusula 94ª do ACT do Setor Bancário - quando, além da carreira contributiva ao serviço do Banco, o pensionista tem carreira contributiva fora do setor bancário;

II. Trata-se de decisões expressas e opostas, pois o Acórdão recorrido decidiu, confirmando a sentença proferida pelo Tribunal da Primeira Instância, reconhecer ao Autor o direito a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzido do valor a liquidar a calcular por aplicação de uma “regra de três simples pura”, enquanto no Acórdão proferido no processo 4150/15.0T8MTS.P1, já transitado em julgado, se decidiu, confirmando igualmente a sentença proferida pelo Tribunal da Primeira Instância, julgar totalmente improcedente a ação e absolver a Ré do pedido, o qual correspondia, designadamente, a reconhecer ao Autor o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzido do valor correspondente à percentagem de 13%, correspondente aos 2 anos e 7 meses de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário, numa “regra de três simples pura”;

III. A oposição dos julgados concretiza-se, manifestamente, no sentido da decisão tomada em cada um deles, pois no Acórdão recorrido seguiu-se no sentido da aplicação da “regra de três simples pura”, condenando-se o Réu nesses termos e no Acórdão fundamento proferido no processo 4150/15.0T8MTS.P1, já transitado em julgado, decidiu-se exatamente o contrário, ou seja, absolver o Réu do pedido de condenação a aplicar uma “regra de três simples pura”.


Ora, a contradição efetivamente existe.
Os dois Acórdãos incidem sobre a mesma questão de Direito, a saber, a forma de cálculo de parte da pensão atribuída ao Autor pelo CNP, que o Réu tem direito a deduzir, em face do prescrito na cláusula 136.º do Acordo Coletivo de Trabalho do sector bancário (BTE n.º 3 de 22/01/2011) cláusula que veio a ser substituída, com idêntica redação, pela cláusula 94.º do ACT para o Sector Bancário, publicado no BTE n.º 29, 1ª série, de 08/08/2016.
E dão-lhe respostas claramente distintas:
Para o Acórdão recorrido, “as expressões utilizadas na cláusula 136.ª do ACT do sector bancário de 2011, e bem assim da cláusula 94ª do ACT para o sector bancário de 2016, com expressões similares – “a diferença entre o valor desses benefícios”, “benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou Serviços de Segurança Social” e “benefícios da mesma natureza” –, se referem tão só às pensões na parte proporcional ao tempo de contribuições para a Segurança Social, não resultando dos respetivos textos a introdução de um qualquer outro fator de ponderação que tenha a ver com o valor das contribuições nesse tempo efetuadas”, enquanto o Acórdão fundamento, proferido no processo 4150/15.0T8MTS.P1, atende expressamente tanto ao fator tempo, como ao valor das retribuições.
Pese embora o Acórdão recorrido corresponda à jurisprudência pacífica e reiterada desta Secção Social, que, aliás, invoca expressamente, não existe jurisprudência uniformizada, pelo que a presente revista excecional é admitida.

Decisão: Admite-se a presente revista excecional.
Lisboa, 14 de julho de 2022

Júlio Gomes (Relator)

Ramalho Pinto

Mário Belo Morgado