PATENTE EUROPEIA
REVOGAÇÃO
CADUCIDADE
PROVIDÊNCIAS CAUTELARES
Sumário

Direito à patente – Caducidade das providências cautelares – Revogação da patente europeia – Decisão não transitada – Artigos 345.º do Código da Propriedade Industrial e 373.º do Código de Processo Civil – Protecção conferida pela Convenção sobre a Patente Europeia

Texto Integral

Acordam em conferência, na Secção da Propriedade Intelectual e da Concorrência, Regulação e Supervisão, do Tribunal da Relação de Lisboa

1. A recorrente/requerida na providência cautelar ordenada no apenso A (providência cautelar n.º 332/20.1YHLSB-A), pediu a extinção da providência aí decretada invocando como fundamento, a revogação das patentes europeias EP 335, EP 962 e EP 172 cuja titularidade/exclusivo de exploração foi alegada pelas requerentes como fundamento do direito que visou acautelar com a providência.
2. O Tribunal da Propriedade Intelectual (doravante também Tribunal de primeira instância ou Tribunal a quo), por despacho de 27.1.2022, com a referência citius 469932, após contraditório, indeferiu a pretensão da recorrente acima mencionada, pelo facto de a revogação das patentes (duas delas) não ter ainda caracter definitivo.
3. É desse despacho que a recorrente/requerida vem interpor o presente recurso formulando os seguintes pedidos:
a) Deve o presente procedimento cautelar ser extinto e as providências cautelares serem declaradas caducas, ao abrigo do disposto no artigo 373.º, n.º 1, alínea e) do CPC;
b) Caso se entenda que obsta à caducidade das providências cautelares o facto de estar em curso o prazo para interposição de recurso, para o Board of Appeal do EPO, das decisões que revogaram a EP 962 e a EP 172, devem as providências cautelares decretadas ser revogadas;
c) Caso assim não se entenda, deverá a manutenção das providências cautelares ficar sujeita à condição de as Recorridas virem informar os presentes autos da interposição do recurso para a Câmara de Recurso do EPO, quanto às decisões de revogação da EP 962 e EP 172 da Divisão de Oposição, no prazo legal que dispõem conforme o disposto no art. 108.º da CPE, pelo que, não logrando fazê-lo, deverá o tribunal decretar oficiosamente a caducidade das providências decretadas e, consequentemente, a extinção do procedimento cautelar
4. Com relevo para a decisão, a recorrente invoca, em síntese, nas conclusões:
- Após o trânsito em julgado da decisão que decretou a providência cautelar, as circunstâncias alteraram-se e deixou de existir fumus boni iuris, uma vez que, as três patentes europeias em que se baseia o direito cuja violação a providência visou acautelar, foram revogadas pelo Ofício Europeu de Patentes;
- A EP 335 foi revogada por decisão definitiva da Câmara de Recurso do Ofício Europeu de Patentes de 10.9.2020;
- A EP 962 foi revogada por decisão de 6.12.2021 da Divisão de Oposição do Ofício Europeu de Patentes, não transitada;
- A EP 172 foi revogada por decisão de 7.12.2021, da Divisão de Oposição do Ofício Europeu de Patentes, não transitada;
- Existe forte probabilidade de as decisões de revogação das patentes EP 962 e EP 172, virem a ser confirmadas pela Câmara de Recurso do Ofício Europeu de Patentes por motivos idênticos aos que levaram à revogação definitiva da patente EP 335, pelo que, deve ser declarada a caducidade da providência cautelar ao abrigo do disposto no artigo 373.º n.º 1 – e) do Código de Processo Civil (CPC);
- Ainda que assim não se entenda, com base no disposto nos artigos 345.º n.º 6 do Código da Propriedade Industrial (CPI), 368.º n.º 3 do CPC e 124.º n.º 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), a providência cautelar deve ser revogada, atenta sua a natureza provisória e a sua modificabilidade;
- A providência cautelar em vigor inibe a recorrente de participar em contratos públicos plurianuais para fornecimento de medicamentos a entidades públicas e permite às recorridas manterem o monopólio das patentes, apesar de revogadas, uma por decisão definitiva e as outras duas por decisões não transitadas, mas cujo recurso está votado ao insucesso;
- O que infringe o disposto no artigo 61.º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP);
- Caso não seja revogada a providência cautelar, devem as recorridas ser notificadas para informar se interpuseram recurso das decisões que revogaram as patentes EP 962 e EP 172 e, se o não fizeram, deve ser decretada a caducidade da providência cautelar.
5. As recorridas contra-alegaram, pugnando pela improcedência do recurso, invocando, em síntese:
- O recurso para a Câmara de Recurso do Ofício Europeu das Patentes tem efeito suspensivo por força do artigo 106.º n.º 1 da Convenção sobre a Patente Europeia;
- Já há decisão com trânsito em julgado que indeferiu o levantamento da providência cautelar com base na revogação definitiva da EP 335;
- O direito acautelado pela providência não se extingue para efeitos do disposto no artigo 373.º n.º 1 – c) do CPC, enquanto se mantiverem em vigor a EP 962 e a EP 172, que gozam da presunção de validade prevista no artigo 4.º n.º 2 do CPI, até que seja proferida decisão de revogação definitiva dessas patentes;
- A alteração ou redução da providência prevista no artigo 372.º n.º 3 do CPC só seria possível no caso de não ter havido contraditório prévio, o que não sucedeu;
- Não é possível modificar ou revogar a decisão que decretou a providência cautelar ao abrigo do disposto nos artigos 368.º n.º 3 do CPC e 345.º n.º 6 do CPI;
- Apenas é possível a sua substituição por caução, que já foi autorizada, estando  pendente o respectivo apenso para prestação de caução (332/20.1YHLSB-C);
- O disposto no artigo 124.º n.º 1 do CPTA não se aplica ao presente processo;
- O mérito da decisão que decretou a providência cautelar não pode ser reapreciado como se extrai dos artigos 613.º e 666.º do CPC.
6. Por requerimento com a referência citius 573170 as recorridas vieram informar ter interposto recurso, para a Câmara de Recurso do Ofício Europeu de Patentes, das decisões proferidas pela Divisão de Oposição quanto à EP 172 e à EP 962, respectivamente em 29.3.2022 e 31.3.2022, o que pode ser consultado no website do Ofício Europeu de Patentes.
Delimitação do âmbito do recurso
7. Tem relevo para a decisão do recurso a seguinte questão suscitada nas conclusões:
A. Extinção, caducidade ou revogação das medidas provisórias decretadas e protecção conferida às patentes pela Convenção sobre a Patente Europeia
Factos que o Tribunal leva em conta para decidir o recurso, resultantes dos termos e autos processuais a seguir indicados e admitidos por acordo das partes nas alegações
8. Por acórdão do Tribunal da Relação de 7.7.2020 (referência citius 478296), já transitado, proferido no apenso A, cujo teor se dá por reproduzido, foram impostas à recorrente/requerida as seguintes medidas cautelares:
IV – Dispositivo
Por todo o exposto, acorda-se nesta Secção de Propriedade Industrial, Concorrência,
Supervisão e Regulação do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar provido o recurso
interposto e, consequentemente revogar a decisão recorrida substuindo-a por outra que julga parcialmente procedente o pedido formulado e assim:
(i) Condena a recorrida a abster-se de introduzir no mercado português o produto farmacêutico actualmente designado por Clift® 40 mg e abrangido pelo número de registo 5752829 no Infarmed I.P., bem como quaisquer outros produtos com a mesma composição, enquanto qualquer das Patentes se mantiver em vigor em Portugal;
(ii) Condena a recorrida a abster-se de fabricar, oferecer, armazenar, importar, possuir ou utilizar em Portugal os produtos farmacêuticos referidos no parágrafo anterior, bem como de os promover ou divulgar, enquanto qualquer uma das patentes se mantiver em vigor em Portugal;
(iii) Condena a requerida a retirar do mercado qualquer dos produtos farmacêuticos acima referidos que a requerida já tenha introduzido no mercado português;
(iv) Condena a requerida a abster-se de transferir a AIM relativa ao Clift 40 mg enquanto qualquer uma das patentes estiver em vigor em Portugal;
(v) Fixa uma sanção pecuniária compulsória no montante de 10.000 € (dez mil euros), a pagar pela recorrida por cada dia de incumprimento das providências atrás decretadas.
9. Por decisão definitiva do Ofício Europeu de Patentes de 10.9.2020, a patente europeia EP 335 foi revogada (referência citius 478296-Acta Doc 11 e Doc 33 cujo teor se dá aqui por reproduzido).
10. Por despacho proferido em 30.12.2020 no apenso A, o Tribunal de primeira instância indeferiu o pedido de levantamento da providência cautelar apresentado pela recorrente/requerida, com base na revogação definitiva da patente EP 335, assim como a sua substituição por caução (referência citius 478296, cujo teor se dá aqui por reproduzido).
11. Por decisão do Tribunal de Primeira instância proferida no apenso A, em obediência ao acórdão do Tribunal da Relação proferido no apenso B, foi reapreciado e decidido o pedido de substituição da providência cautelar por caução, apresentado pela recorrente/requerida, como se segue (referência citius 478296 que aqui se dá por reproduzida):
Pelo exposto, julga-se procedente este incidente de caução e, em consequência, autoriza-se a aqui requerente, requerida do procedimento Cautelar, Mylan, SA, a prestar caução, no valor de 667.208,56 euros, em substituição das providências decretadas.
12. Por decisão de 6.12.2021 foi revogada a EP 962 estando pendente o recurso dessa decisão perante o Ofício Europeu de Patentes (referência citius 478296 Doc 22, Doc 55 e referência citius 573170)
13. Por decisão de 7.12.2021 foi revogada a patente EP 172 estando pendente o recurso dessa decisão perante o Ofício Europeu de Patentes (referência citius 478296 Doc 22, Doc 44 e referência citius 573170)
Quadro legal relevante
14. Têm relevo para a decisão os seguintes preceitos legais:
Constituição da República Portuguesa ou CRP
Artigo 61.ºn. º 1
Iniciativa privada, cooperativa e autogestionária
1. A iniciativa económica privada exerce-se livremente nos quadros definidos pela Constituição e pela lei e tendo em conta o interesse geral. (...)
Convenção sobre a Patente Europeia
Artigo 63.º
Duração da patente europeia
1 - A duração da patente europeia é de 20 anos a contar da data do depósito do pedido.
2 - Nada no parágrafo precedente poderá limitar o direito de um Estado Contratante a prorrogar o prazo de uma patente europeia nas mesmas condições que as aplicáveis às suas patentes nacionais, a fim de ter em conta um estado de guerra ou um estado de crise comparável que afecte o dito Estado.
Artigo 64.º
Direitos conferidos pela patente europeia
1 - Sob reserva do parágrafo 2, a patente europeia confere ao seu titular, a contar do dia da publicação da menção da sua concessão e em cada um dos Estados Contratantes em relação aos quais foi concedida, os mesmos direitos que lhe conferiria uma patente nacional concedida nesse Estado.
2 - Se o objecto da patente europeia é um processo, os direitos conferidos por essa patente estendem-se aos produtos obtidos directamente por esse processo.
3 - Qualquer contrafacção da patente europeia é apreciada em conformidade com as disposições da legislação nacional.
Artigo 67.º
Direitos conferidos pelo pedido de patente europeia após a sua publicação
1 - A contar da sua publicação de acordo com o artigo 93.º, o pedido de patente europeia assegura provisoriamente ao requerente, nos Estados Contratantes designados no pedido de patente tal como publicado, a protecção prevista no artigo 64.º
2 - Cada Estado Contratante pode determinar que o pedido de patente europeia não confere a protecção prevista pelo artigo 64.º Contudo, a protecção atribuída à publicação do pedido de patente europeia não pode ser inferior àquela que a legislação do Estado considerado atribui à publicação obrigatória dos pedidos de patente nacional não examinados. Em qualquer caso, cada Estado Contratante deve, pelo menos, prever que, a partir da publicação do pedido de patente europeia, o requerente pode exigir uma indemnização razoável, determinada segundo as circunstâncias, de qualquer pessoa que tenha explorado nesse Estado Contratante a invenção que constitui o objecto do pedido de patente europeia, em condições que, segundo o direito nacional, poriam em jogo a sua responsabilidade se se tratasse de uma contrafacção de uma patente nacional.
3 - Cada Estado Contratante que não tenha como língua oficial a língua do processo pode determinar que a protecção provisória especificada nos parágrafos 1 e 2 só seja assegurada a partir da data em que uma tradução das reivindicações, quer numa das línguas oficiais desse Estado, à escolha do requerente, quer, na medida em que o Estado em questão impuser a utilização de uma língua oficial
determinada, nesta última língua:
a) For tornada acessível ao público, nas condições previstas pela legislação nacional; ou
b) For comunicada à pessoa que explora a invenção no dito Estado.
4 - Os efeitos do pedido de patente europeia previstos nos parágrafos 1 e 2 são reputados nulos e não adquiridos quando o pedido de patente europeia for retirado, ou considerado retirado, ou for recusado em consequência de uma decisão passada com força de caso julgado. O mesmo acontece com os efeitos do pedido de patente europeia num Estado Contratante cuja designação foi retirada ou considerada retirada.
Artigo 68.º
Efeitos da revogação da patente europeia
O pedido de patente europeia assim como a patente europeia à qual deu lugar são considerados não ter tido desde a origem, total ou parcialmente, os efeitos previstos nos artigos 64.º e 67.º, conforme a patente tiver sido revogada no todo ou em parte no decurso de um processo de oposição.
Artigo 106.º n.º 1
Decisões susceptíveis de recurso
1 - As decisões da Secção de Depósito, das divisões de exame, das divisões de oposição e da Divisão Jurídica são susceptíveis de recurso. O recurso tem efeito suspensivo. (...)
Artigo 105b n. º3
Limitação ou revogação da patente europeia
(...)
3- A decisão de limitar ou revogar a patente europeia é aplicável à patente europeia em todos os Estados Contratantes em relação aos quais foi concedida. Produzirá efeitos na data em que a menção da decisão for publicada no Boletim Europeu de Patentes.
Directiva 2004/48/CE relativa ao respeito dos direitos da propriedade intelectual
Considerando (22)
É igualmente indispensável prever medidas provisórias que permitam a cessação imediata da violação sem aguardar uma decisão relativa ao mérito, respeitando os direitos da defesa, velando pela proporcionalidade das medidas provisórias em função das especificidades de cada caso em apreço e acautelando as garantias necessárias para cobrir os danos e perdas causados ao requerido por uma pretensão injustificada. Estas medidas justificam-se, designadamente, sempre que esteja devidamente estabelecido que qualquer atraso pode implicar um prejuízo irreparável ao titular do direito. É igualmente indispensável prever medidas provisórias que permitam a cessação imediata da violação sem aguardar uma decisão relativa ao mérito, respeitando os direitos da defesa, velando pela proporcionalidade das medidas provisórias em função das especificidades de cada caso em apreço e acautelando as garantias necessárias para cobrir os danos e perdas causados ao requerido por uma pretensão injustificada. Estas medidas justificam-se, designadamente, sempre que esteja devidamente estabelecido que qualquer atraso pode implicar um prejuízo irreparável ao titular do direito.
Artigo 4.º
Legitimidade para requerer a aplicação das medidas, procedimentos e recursos
1.  Os Estados-Membros reconhecem legitimidade para requerer a aplicação das medidas, procedimentos e recursos referidos no presente Capítulo, às seguintes pessoas:
a) Titulares de direitos de propriedade intelectual, nos termos da legislação aplicável,
b) Todas as outras pessoas autorizadas a utilizar esses direitos, em particular os titulares de licenças, na medida do permitido pela legislação aplicável e nos termos da mesma,
c) Os organismos de gestão dos direitos colectivos de propriedade intelectual regularmente reconhecidos como tendo o direito de representar os titulares de direitos de propriedade intelectual, na medida do permitido pela legislação aplicável e nos termos da mesma.
d) Os organismos de defesa da profissão regularmente reconhecidos como tendo o direito de representar os titulares de direitos de propriedade intelectual, na medida do permitido pela legislação aplicável nos termos da mesma.
Artigo 9.º n.º 7
Medidas provisórias e cautelares
(...)
7.  Quando as medidas provisórias tenham sido revogadas ou deixem de produzir efeitos por força de qualquer acto ou omissão do requerente, bem como nos casos em que se venha a verificar posteriormente não ter havido violação ou ameaça de violação de um direito de propriedade intelectual, as autoridades judiciais deverão ter competência para ordenar ao requerente, a pedido do requerido, que pague a este último uma indemnização adequada para reparar qualquer dano causado por essas medidas.
Código da Propriedade Industrial ou CPI
Artigo 342.º
Causas de extinção e caducidade
1 - Às medidas de obtenção e de preservação da prova são aplicáveis as causas de extinção e de caducidade previstas no Código de Processo Civil, salvo quando elas se configurem como medidas preliminares de interposição de providências cautelares nos termos do artigo 345.º
2 - Para além das causas de extinção a que se refere o número anterior, quando esteja em causa a alegada violação de segredo comercial as medidas deixam de produzir efeitos, mediante pedido da parte requerida, se deixar de preencher os requisitos previstos no artigo 313.º por motivos não imputáveis àquela parte.
Artigo 343.º
Responsabilidade do requerente
1 - A aplicação das medidas de preservação de prova pode ficar dependente da constituição, pelo requerente, de uma caução ou outra garantia destinada a assegurar a indemnização prevista no n.º 3.
2 - Na fixação do valor da caução deve ser tida em consideração, entre outros fatores relevantes, a capacidade económica do requerente.
3 - Sempre que a medida de preservação da prova aplicada for considerada injustificada ou deixe de produzir efeitos por facto imputável ao requerente, bem como nos casos em que a mesma tenha sido requerida de modo abusivo ou de má-fé, se verifique não ter havido violação ou ser infundado o receio de que outrem calesão grave e dificilmente reparável de um direito de propriedade industrial ou de segredo comercial, pode o tribunal ordenar ao requerente, a pedido da parte requerida ou de um terceiro lesado, o pagamento de uma indemnização adequada a reparar qualquer dano causado pela aplicação das medidas.
Artigo 345.º
Providências cautelares
1 - Sempre que haja violação ou fundado receio de que outrem calesão grave e dificilmente reparável do direito de propriedade industrial ou de segredo comercial, pode o tribunal, a pedido do interessado, decretar as providências adequadas a:
a) Inibir qualquer violação iminente; ou
b) Proibir a continuação da violação.
2 - O tribunal exige que o requerente forneça os elementos de prova para demonstrar que é titular do direito de propriedade industrial ou do segredo comercial, ou que está autorizado a utilizá-lo, e que se verifica ou está iminente uma violação.
3 - As providências previstas no n.º 1 podem também ser decretadas contra qualquer intermediário cujos serviços estejam a ser utilizados por terceiros para violar direitos de propriedade industrial ou segredos comerciais.
4 - Pode o tribunal, oficiosamente ou a pedido do requerente, decretar uma sanção pecuniária compulsória com vista a assegurar a execução das providências previstas no n.º 1.
5 - Ao presente artigo é aplicável o disposto nos artigos 341.º a 343.º
6 - A pedido da parte requerida, as providências decretadas a que se refere o n.º 1 podem ser substituídas por caução, sempre que esta, ouvido o requerente, se mostre adequada a assegurar a indemnização do titular.
7 - Na determinação das providências previstas no presente artigo, deve o tribunal atender à natureza dos direitos de propriedade industrial ou do segredo comercial, salvaguardando, nomeadamente, a possibilidade de o titular continuar a explorar, sem qualquer restrição, os seus direitos.
Artigo 358.º
Direito subsidiário
Em tudo o que não estiver especialmente regulado na presente secção, são subsidiariamente aplicáveis outras medidas e procedimentos previstos na lei, nomeadamente no Código de Processo Civil.
Código de Processo Civil ou CPC
Artigo 372.º
Contraditório subsequente ao decretamento da providência
1 - Quando o requerido não tiver sido ouvido antes do decretamento da providência, é-lhe lícito, em alternativa, na sequência da notificação prevista no n.º 6 do artigo 366.º:
a) Recorrer, nos termos gerais, do despacho que a decretou, quando entenda que, face aos elementos apurados, ela não devia ter sido deferida;
b) Deduzir oposição, quando pretenda alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinem a sua redução, aplicando-se, com as adaptações necessárias, o disposto nos artigos 367.º e 368.º.
2 - O requerido pode impugnar, por qualquer dos meios referidos no número anterior, a decisão que tenha invertido o contencioso.
3 - No caso a que se refere a alínea b) do n.º 1, o juiz decide da manutenção, redução ou revogação da providência anteriormente decretada, cabendo recurso desta decisão, e, se for o caso, da manutenção ou revogação da inversão do contencioso; qualquer das decisões constitui complemento e parte integrante da inicialmente proferida.
Artigo 373.º
Caducidade da providência
1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 369.º, o procedimento cautelar extingue-se e, quando decretada, a providência caduca:
a) Se o requerente não propuser a ação da qual a providência depende dentro de 30 dias contados da data em que lhe tiver sido notificado o trânsito em julgado da decisão que a haja ordenado;
b) Se, proposta a ação, o processo estiver parado mais de 30 dias, por negligência do requerente;
c) Se a ação vier a ser julgada improcedente, por decisão transitada em julgado;
d) Se o réu for absolvido da instância e o requerente não propuser nova ação em tempo de aproveitar os efeitos da proposição da anterior;
e) Se o direito que o requerente pretende acautelar se tiver extinguido.
2 - Quando a providência cautelar tenha sido substituída por caução, fica esta sem efeito nos mesmos termos em que o ficaria a providência substituída, ordenando-se o levantamento daquela.
3 - A extinção do procedimento ou o levantamento da providência são determinados pelo juiz, com prévia audiência do requerente, logo que se mostre demonstrada nos autos a ocorrência do facto extintivo.
Apreciação da questão colocada pelo recurso
A. Extinção, caducidade ou revogação das medidas provisórias decretadas e protecção conferida às patentes pela Convenção sobre a Patente Europeia.
15. A principal questão que importa resolver é a de saber se, à luz do regime legal aplicável, é possível ordenar a modificação, a redução, a extinção ou a caducidade de uma providência cautelar decretada ao abrigo do disposto artigo 345.º do CPI, quando os direitos de propriedade intelectual – neste caso o direito a três patentes europeias – cuja violação a providência visava acautelar, foram revogados, num caso por decisão definitiva do Oficio Europeu de Patentes  e nos outros dois casos, por decisões não transitadas, estando pendentes recursos das mesmas no Oficio Europeu de Patentes.
16. Para esse efeito, o Tribunal começa por levar em conta o disposto no artigo 345.º do CPI, nos artigos 341.º a 343.º do CPI, aplicáveis por força do disposto no artigo 345.º n.º 5 do CPI, assim como os artigos 372.º e 373.º do CPC, aplicáveis subsidiariamente, por força do artigo 358.º do CPI, a Directiva 2004/48/CE em conformidade com a qual devem ser interpretados os preceitos nacionais mencionados e a protecção de que gozam as patentes europeias à luz do regime consagrado na Convenção sobre a Patente Europeia.
17. Fazendo uma interpretação correctiva do disposto no artigo 358.º do CPI, o Tribunal julga que, em tudo o que não estiver regulado nas secções I e II do capítulo IV do CPI, onde se inclui o artigo 345.º sob a epígrafe “Providências Cautelares”, aplica-se subsidiariamente o CPC e não o CPTA (cf. Código da Propriedade Industrial Anotado, Coordenação: Luís Couto Gonçalves, Almedina, página 1292). Motivo pelo qual, contrariamente ao que defende a recorrente, fica excluída a aplicação, neste caso, do disposto no artigo 124.º do CPTA.
18. Feito este enquadramento, importa levar em conta que, tanto o artigo 345.º do CPI, como o artigo 368.º do CPC, admitem que as providências cautelares aqui em causa sejam substituídas por caução, cuja prestação já foi autorizada pelo Tribunal, a requerimento da recorrente/requerida na providência cautelar.
19. Quanto às causas de extinção e caducidade das providências cautelares, aqui em crise, as mesmas devem ser apreciadas à luz do disposto no artigo 342.º do CPI. O artigo 342.º n.º 1 remete para o Código de Processo Civil, devendo aplicar-se, neste caso, o artigo 373.º do CPC. Não se tratando aqui de violação de segredo comercial, fica excluída a causa de extinção adicional prevista no artigo 342.º n.º 2 do CPI.
20. Dito isto, o que está aqui em causa é saber se a providência cautelar ordenada, deve caducar ou ser revogada, por se ter extinguido um dos direitos à patente e se encontrar pendente contencioso que acarreta o risco de revogação das outras duas patentes, cuja violação se pretendia acautelar. A recorrente defende que sim porque as medidas cautelares são provisórias, modificáveis e deixou de existir fumus boni iuris. Vejamos se assim sucede.
21. Os direitos que a providência aqui em crise pretende acautelar prendem-se essencialmente com a introdução no mercado, fabrico e comercialização de um medicamento produzido com base nas patentes europeias EP 335, EP 962 e EP 172 cuja exploração exclusiva o Tribunal julgou caber recorridas, na data em que decretou a providência. Porém, posteriormente tiveram lugar as seguintes alterações: relativamente à EP 335, o direito à patente, entretanto extinguiu-se por a mesma ter sido revogada por decisão definitiva do Ofício Europeu de Patentes; já os direitos que derivam das restantes patentes, a EP 962 e a EP 172, foram revogados, mas dessas decisões foi interposto recurso com efeito suspensivo, como resulta do artigo 106.º n.º 1 da Convenção sobre a Patente Europeia.
22. Importa apreciar se, à luz do regime legal vigente, estas alterações podem constituir fundamento para levantar a providência cautelar. Para isso, o Tribunal começa por sublinhar que se extrai da decisão que ordenou a providência cautelar que a mesma não dissociou a medida em que cada uma das três patentes contribui para o fabrico do mesmo medicamento, cuja introdução no mercado está aqui em causa. Pelo que, apesar da revogação definitiva de uma das patentes não é possível concluir que o direito que a providência visa acautelar se extinguiu, para efeitos de aplicação do artigo 373.º n.º 1 – e) do CPC. Quanto às outras duas patentes, não só o recurso interposto das respectivas decisões de revogação tem efeito suspensivo, como a decisão de revogação, se vier a ser confirmada, só produzirá efeitos nos Estados parte na Convenção sobre a Patente Europeia a partir da data da publicação da decisão definitiva no Boletim da Patente Europeia, como resulta do artigo 105b.º n.º 3 da Convenção sobre a Patente Europeia.
23. Do que acaba de ser exposto extrai-se que, não obstante ser forçoso reconhecer que o direito acautelado assenta agora em menos um fundamento, devido à revogação definitiva de uma das patentes, e que o contencioso que tem por objecto a revogação das outras duas patentes europeias, EP 962 e EP 172, em que assenta o direito ao exclusivo do fabrico e comercialização do medicamento em causa, acarreta o risco de extinção desse direito, o certo é que estas duas patentes continuam a gozar da protecção prevista nos artigos 63.º, 64.º e 67.º da Convenção sobre a Patente Europeia, enquanto não for publicada uma decisão definitiva de revogação. Pelo que, não é possível concluir que o direito emergente dessas duas patentes se extinguiu ou que a protecção que lhes é conferida pela Convenção sobre a Patente Europeia diminuiu em resultado do contencioso pendente. Em consequência, afigura-se que não pode ter lugar a caducidade da providência cautelar à luz do artigo 373.º n.º 1 – c) do CPC. A esse propósito, o regime é idêntico se a pretensão deduzida for julgada improcedente na acção principal em curso perante o Tribunal a quo, pois também nesse caso, a providência cautelar só se extinguirá com o trânsito em julgado da decisão que venha a ser proferida, como prevê o artigo 373.º n.º 1- c) do CPC.
24. Este regime não prejudica o disposto no artigo 68.º da Convenção sobre a Patente Europeia que prevê que, em caso de revogação da patente, se considera que a mesma não produziu, desde a origem, os efeitos previstos nos artigos 64.º e 67.º dessa Convenção.
25. Acresce que, não só as patentes cuja revogação ainda pende de recurso continuam a gozar da mesma protecção, na pendencia do recurso, devido ao efeito suspensivo do mesmo, como também o direito nacional não prevê a possibilidade de o Tribunal extinguir, declarar a caducidade, modificar ou revogar, a providência cautelar ordenada por decisão transitada, fora dos casos previstos nos artigos 372.º n.º 3 e 373.º do CPC, que aqui não se verificam.
26. Por último, afigura-se que o artigo 343.º n.º 3 do CPI prevê as garantias necessárias para cobrir os danos e perdas que a recorrente/requerida alega estarem a ser-lhe causados por uma pretensão injustificada das recorridas/requerentes da providência cautelar. Na verdade, afigura-se que o regime previsto no artigo 343.º n.º 3 do CPI é conforme aos deveres impostos pela Directiva 2004/48/CE, em particular ao disposto no considerando (22) acima citado e no artigo 9.º n.º 7 que prevê que, nos casos em que se venha a verificar posteriormente não ter havido violação ou ameaça de violação de um direito de propriedade intelectual, as autoridades judiciais deverão ter competência para ordenar ao requerente, a pedido do requerido, que pague a este último uma indemnização adequada para reparar qualquer dano causado por essas medidas.
27. Afigura-se assim que, contrariamente ao que defende a recorrente, o quadro legal acima exposto garante a protecção do direito à iniciativa privada previsto no artigo 61.º n.º 1 da CRP, na medida em que, por um lado, prevê que possam ser adoptadas medidas provisórias para protecção dos direitos à propriedade intelectual enquanto os mesmos estão vigentes e, por outro lado, prevê que possam ser ordenadas medidas para indemnizar o requerido quando se verifique que, o mesmo sofreu danos devido ao carácter injustificado das medidas cautelares. Pelo que, afigura-se que não existe violação do artigo 61.º n.º 1 da CRP.
28. Ou seja, fora dos casos previstos nos artigos 372.º e 373.º do CPC, nem o regime nacional vigente, nem a Directiva 2004/48/CE, nem a Convenção sobre a Petente Europeia, prevêem a possibilidade ou o dever de o Tribunal declarar a caducidade das medidas cautelares ordenadas ou de as revogar, enquanto duas das patentes em causa beneficiarem da protecção que lhes é conferida pelos artigos 63.º a 67.º daquela Convenção. Em contrapartida, quer a Directiva 2004/48/CE, quer o artigo 343.º do CPI estabelecem remédios no caso de medidas provisórias injustificadas, que serão ordenados mediante a alegação e prova dos respectivos pressupostos. Pelo que, não existe infracção ao direito à iniciativa privada consagrado no arrigo 61.º n.º 1 da CRP.
Em síntese
29. Os direitos cuja violação a providência ordenada no apenso A visou acautelar, tiveram por fundamento três patentes europeias. Dessas três patentes europeias, uma foi revogada por decisão transitada, mas as outras duas continuam a gozar da protecção conferida pelos artigos 64.º a 67.º da Convenção sobre a Patente Europeia, atento o efeito suspensivo do recurso interposto da decisão de revogação dessas patentes, previsto no artigo 106.º da Convenção sobre a Patente Europeia.
30. Fora dos casos previstos nos artigos 342.º do CPI, 372.º e 373.º do CPC, que aqui não se verificam, não pode haver lugar à extinção, caducidade, modificação ou revogação das medidas cautelares ordenadas por decisão transitada. Pelo que improcedem todas as pretensões da recorrente.
31. No caso em análise, o regime legal vigente prevê um remédio para as medidas cautelares injustificadas no artigo 343.º n.º 3 do CPI, que transpõe o artigo 9.º n.º 7 da Directiva 2004/48/CE, desde que se verifiquem os respectivos pressupostos, pelo que, neste contexto não se afigura existir violação do direito à iniciativa privada previsto no artigo 61.º n.º 1 da CRP.

Decisão
Acordam as Juízes desta secção em:
I. Julgar improcedente o recurso.
II. Condenar a recorrente nas custas – artigo 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC.

Lisboa, 15 de Junho de 2022
Paula Pott
Eleonora Viegas
Ana Mónica Pavão