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HERANÇA VAGA A FAVOR DO ESTADO
FASE DE RECURSO
INCIDENTE DE HABILITAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Sumário
I - Face à junção na fase recursiva, da certidão da sentença que declarou vaga para o Estado a herança, não pode a acção prosseguir sem que seja também habilitado o Ministério Público para que a decisão final possa produzir o seu efeito útil normal, fazendo pois, caso julgado contra o Estado, atento o disposto no art.1134º do anterior CPC e o disposto no art. 940º nº 4 do novo CPC. II – Impõe-se, assim, ordenar a suspensão da instância por 10 dias, a fim de ser deduzido o incidente de habilitação do Ministério Público. III – A habilitação do Ministério Público não prejudicará o que já foi processado até ao presente. (Pelo Relator)
Texto Integral
Acordam na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
A) Em 29/03/2022 foi proferido o seguinte despacho pela relatora:
«Nesta acção declarativa que A…. instaurou em 23/02/2007 contra B.., falecida em 08/12/2009, foi proferida sentença no incidente de habilitação dos seus sucessores no apenso C.
Nos recursos interpostos pelos habilitados V.. e Ar… foi invocada a excepção de ilegitimidade passiva por preterição de litisconsórcio necessário passivo.
Sustenta o apelante V.., em resumo:
- foi declarada vaga para o Estado a herança da ré B….,
- decorre do nº 1 do art. 2091º do Código Civil que os direitos relativos à herança têm de ser exercidos contra todos os herdeiros,
- pelo que se impunha a intervenção espontânea ou provocada do Estado por ser herdeiro da falecida ré.
Sustenta o apelante Ar.., em resumo:
- o Estado Português é o único herdeiro da falecida ré e por isso, beneficia de 15% da quota disponível da herança de L… deixada por testamento à ré,
- no respeitante a eventuais responsabilidades da herança, respondem em primeira linha os herdeiros, só sendo chamados os legatários se for o caso, esgotada que seja a quota que caiba àqueles,
- é imperativa a exigência da intervenção do Estado Português como parte demandada, pois não sendo parte nesta acção é impossível responsabilizá-lo por via do património herdado de B.. (os 15% da quota disponível que T…lhe deixou por testamento),
- sendo nulo todo o processado posterior ao falecimento da ré B…,
- a sentença de habilitação, chamando a atenção do litisconsórcio necessário, deixou em aberto a possibilidade de ser suprida a situação de ilegitimidade passiva, se e quando o Estado, reconhecido como herdeiro, viesse a intervir, o que não aconteceu, sendo que a autora, a quem compete a necessária iniciativa e impulso processuais, tenha provocado, como devia, tal intervenção.
Vejamos:
. a) Na sequência do falecimento da ré foi requerida pela autora a habilitação dos seus herdeiros em 01/03/2010 (apenso C), tendo sido proferida sentença em 17/02/2011, transitada em julgado.
. b) Nessa sentença lê-se, além do mais:
«(…)
Considera-se assente, mercê de prova documental, o seguinte:
(…)
A) … (…) faleceu no dia 8 de Dezembro no estado de viúva (…)
(…)
F) No âmbito do processo de inventário que por óbito de L… corre os seus termos pelo 1º juízo cível de Lisboa, 1ª secção, sob o nº 68/2001, foi exarada pelo Magistrado do Ministério Público a seguinte promoção: "Foi instaurado um processo administrativo com o nº 1189/10-B visando a eventual instauração de um processo de liquidação de herança declarada vaga para o Estado, relativamente a ... A acção ainda não foi proposta, encontrando-se o processo na fase de recolha de elementos. Posto isto, P. se aguarde pela instauração de tal acção e uma vez instaurada pelo trânsito em julgado da respectiva sentença". cfr. fls. 229).
A única questão que importa decidir consiste em saber quem deve ser habilitado para, como sucessor e em representação da falecida Ré , prosseguir com a requerente a acção principal.
Todos os requeridos que são, pacificamente, legatários da herança de Ré?
Ou o Estado?
Comecemos por este último: Para que o Estado seja considerado herdeiro de …, é necessário que assim seja declarado judicialmente (através do processo especial previsto nos artºs 1132º e segs. do CPC).
É o que resulta do disposto no artº 2155º do Código Civil: a herança só é declarada vaga para o Estado depois de, em meio processual próprio, seja proferida sentença que, reconhecendo a inexistência de outros sucessíveis legítimos, assim o decida.
Inexistindo (ainda tal acção (cfr. F), impõe-se que sejam habilitados como sucessores da falecida os que, neste momento, se devam considerar como tal, sem embargo de posteriormente ser admitida a intervenção do Estado como litisconsorte dos ora requeridos (cfr. artº 374º nº2 do CPC).
Resulta, assim, face ao exposto que os requeridos, na qualidade de legatários e perante a ausência de herdeiros legitimários da falecida … e desconhecimento da existência de outros sucessores, são, por força do disposto no art.º 2277º do Código Civil, quem pode ser habilitado a, como sucessores e em representação da mesma, a prosseguir com a requerente a acção principal na qual se discute a (in)existência de uma dívida da cujus à herança de ….
Termos em que declaro habilitados Ar.. …….. e Instituto de Oncologia de Lisboa para, nos moldes assinalados, prosseguirem com a requerente a acção principal.
Custas pelos requeridos que deduziram oposição, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC (artº16ºdo CCJ)
Registe e notifique.
Transitada em julgado a presente decisão, abra conclusão no processo principal e dê conhecimento do seu teor ao processo administrativo identificado a fls. 229.».
. c) Os requeridos recorreram dessa sentença, mas o recurso foi julgado deserto por falta de alegação.
. d) Em 12/04/2011 foi proferido o seguinte despacho no apenso C:
«Requerimento do requerido Ar..:
Não obstante não ter contestado a habilitação, vem o requerido arguir a nulidade da decisão que julgou procedente o incidente, com fundamento no facto do Estado não ter sido citado para os termos do incidente, ou que se aclare a decisão sobre tal questão.
A requerente pugnou pela improcedência do requerido.
Vejamos.
O Tribunal pronunciou-se circunstanciadamente acerca da razão pela qual o Estado não pode ser habilitado como herdeiro de …. Como se colhe claramente do disposto no nº2 do artº 374º do CPC, a citação dos "potenciais" herdeiros só tem lugar quando os mesmos disputem a herança.
Ora, como resulta da alínea F) da matéria de facto assente, o Estado não disputa a herança de ….. Não se arroga herdeiro de …. Não está também pendente qualquer acção para declaração de herança vaga para o Estado.
Consequentemente não tinha de ser citado para os termos da habilitação.
Como explica o Conselheiro Salvador da Costa (in os Incidentes da Instância, pag. 228)" (..) embora a qualidade de herdeiro ainda não esteja definida, devem os que dela se arrogam ser chamados à habilitação (...).
E acrescenta: "Este normativo tem essencialmente a ver com o facto de ao tempo da decisão do incidente de habilitação ainda estar pendente a causa de cujo desfecho depende a qualidade de herdeiro, pois se nessa altura a referida acção já houver atingido o seu termo, então a habilitação tem de ser decidida de harmonia com o disposto no nº1, ou seja, em termos definitivos.
Visa-se evitar a discussão simultânea no incidente e na acção própria da mesma questão se saber se uma pessoa é herdeira de outra, e daí que só seja aplicável quando aquela acção esteja proposta, i.e., pendente ao tempo da dedução do incidente de habilitação provisória." (sublinhados nossos).
Temos assim, que improcede sem necessidade de ulteriores considerações o requerido.
Custas do incidente pelo requerido com taxa de justiça que fixo em 2 UCS (artº 16º do CCJ).».
. e) Por ofício de 14/11/2011 (cfr certificação citius de 11/11/2011) foi dado conhecimento da referida sentença com indicação de que transitou em julgado em 05/05/2011, ao Ministério Público/Procuradoria dos Juízos Cíveis com referência ao Proc. Administrativo 1189-A.
. f) No ofício do Ministério Público datado de 24/01/2012 junto a fls. 330 do apenso C consta a seguinte:
«PA nº 1189/10-B
. Herança Jacente (…)
(…) no âmbito dos autos administrativos acima referenciados foi proposta acção judicial de liquidação de herança jacente, em 12/1/2012, a qual foi distribuída à 10ª Vara – 1ª Secção, onde tomou o nº 1646/12.0TJLSB».
. g) em 7/11/2011 foi proferido despacho nesta acção principal, em que se lê, na parte que ora interessa:
«(…)
Compulsando os autos constata-se o seguinte:
(…)
F) Por decisão proferida em 15 de Fevereiro de 2011 foram habilitados Ar……. e Instituto de Oncologia de Lisboa para como sucessores e em representação da falecida Ré prosseguirem com a Autora a acção principal (cfr. fls. 256 apenso C);
G) Ar… veio, designadamente, requerer a aclaração da decisão, o que lhe foi negado por despacho proferido em 12.4.2011 e notificado em 18 de Abril de 2011 ( durante as férias judiciais).
(…)
I) Por requerimento entrado em juízo em 6.5.2011, veio o habilitado Ar… requerer que se reitere os despachos de admissão dos recursos de agravo e que se notifique às partes os mesmos (por forma a correr novo prazo para alegarem) e bem assim que se lhes conceda novo prazo para apresentarem os respectivos requerimentos probatórios, e que nessa notificação não se deve esquecer o Estado apesar de não estar habilitado como herdeiro, nem desencadeada a acção para o seu reconhecimento como tal, (…)
Atento o que consta em G) , a sentença de habilitação transitou em julgado em 5 de Maio de 2011 e a partir de então a suspensão da instância cessou.
(…)
A questão da (des) necessidade de intervenção do Estado no processo já foi sobejamente apreciada na sentença de habilitação e na aclaração que se lhe seguiu, como é do conhecimento dos habilitados.)
2.Temos assim que a suspensão da instância em virtude do falecimento de … produziu os seus efeitos a partir de 31.12.2009 (data em que foi junta aos autos fotocópia da certidão de óbito) e cessou em 5 de Maio de 2011 (com o trânsito em julgado da sentença de habilitação).
(…)».
. h) Em 06/12/2011, a autora expôs:
«(…) vem, ao abrigo do princípio de cooperação previsto no artigo 266.º do Código de Processo Civil, expor o seguinte:
1. Tendo sido referido no Despacho de 07.11.2011 a questão da intervenção do Estado, vem a Autora informar aos presentes autos que se encontra a correr Processo Administrativo para recolha de elementos com vista à propositura de acção de liquidação de herança jacente a favor do Estado sobre Processo Administrativo n.º 1 109/2010 – C no âmbito do incidente de habilitação de herdeiros que corre termos na 3.ª Vara Cível, 1.ª Secção, sob o n.º 4872/07.0TVLSB-C (cfr. Documento n.º 1 que se junta e cujo conteúdo se dá por reproduzido para todos os efeitos legais).
2. Ademais, informa ainda a Autora que no processo de inventário que corre termos na 2.ª Secção do 1.º Juízo do Tribunal de Lisboa, sob o n.º 68/2001, foi requerida a habilitação do Estado e, nessa sequência, instaurado um processo administrativo com o nº 1189/10-B visando a eventual instauração de um processo de liquidação da herança declarada vaga para o Estado (cfr. Documento n.º 2 que se junta e cujo conteúdo se dá por reproduzido para todos os efeitos legais).».
. i) sobre essa exposição, foi proferido o seguinte despacho em 18/01/2012:
«Fls. 1292 : Visto. Nada a ordenar. O Tribunal já se pronunciou expressamente nos autos de habilitação apensos sobre a (des) necessidade imediata de intervenção do Ministério Público em representação da falecida Ré.
Aliás, determinou-se no âmbito da decisão aí proferida que se desse dela conhecimento ao Ministério Público.»
. j) A sentença recorrida foi proferida em 14/10/2021, nela nenhuma referência sendo feita ao Estado Português.
. l) O apelante V… juntou com a alegação recursiva certidão da sentença que declarou vaga para o Estado a herança aberta por óbito de … proferida em 13/09/2012, com menção de que transitou em julgado em 31/10/2012, no âmbito do Proc. 1646/12.0TJLSB - Juízo Central Cível de Lisboa – Juiz 10
*
O art. 374º nº 2 do CPC (Código de Processo Civil) que esteve em vigor até 30/08/2013 (ao qual corresponde com redacção similar o art. 354 nº 2 do novo CPC aprovado pela Lei 41/2013 de 26/06) dispunha:
«Quando a qualidade de herdeiro esteja dependente da decisão de alguma causa ou questões que devam ser resolvidas noutro processo, a habilitação será requerida contra todos os que disputam a herança e todos são citados, mas o tribunal só julga habilitadas as pessoas que, no momento em que a habilitação seja decidida, devam considerar-se como herdeiras; os outros interessados, a quem a decisão é notificada, são admitidos a intervir na causa como litisconsortes dos habilitados, observando-se o disposto nos artigos 322º e seguintes.».
Sobre este normativo, explicou Eurico Lopes Cardoso, designadamente:
«161. Quando tem lugar a habilitação provisória
(…)
Suspensa a causa por falecimento duma das partes, se os herdeiros dessa parte estiverem a discutir em outro processo, como questão principal, o direito à herança, a pessoa interessada mo prosseguimento da causa não poderia, muitas vezes, aguardar que (…) aquele processo fossem decididos para então, munida da respectiva sentença, promover o incidente de habilitação documental. A espera, prolongando a suspensão da instância, poderia levar à interrupção dela (…)
Para evitar tal espera e fazer cessar a suspensão, o nº 2 do artigo 374º faculta um processo incidental que se pode apelidar de habilitação provisória, mediante o qual passam a intervir na causa as pessoas que, no momento de decidir o incidente, estejam em condições de substituir a parte falecida.
Do exposto é consequência só ser aplicável o processo do aludido nº 2 à hipótese de haver processo pendente onde se discuta, como questão principal, o direito de sucessão dos habilitandos. Se ainda não tiver sido proposta nenhuma acção para tal fim, a habitação incidental não terá justificação e, portanto, deverá deduzir-se habilitação definitiva, nos termos do nº 1 do artigo.
Um caso típico de habilitação provisória é o de pender acção e investigação de paternidade ilegítima cuja procedência implique o reconhecimento de um terceiro como filho e, consequentemente, sucessor da parte falecida.
De tal procedência poderá resultar, ficar a haver mais um sucessor (…)
(…)
Infere-se ainda do nº 2 do artigo 374º que, estando em curso processo do qual dependa a qualidade de herdeiro que legitime os habilitandos como sucessores da parte falecida, não é permitido requerer habilitação definitiva pelo meio do nº 1 do mesmo artigo. Proíbe-o, senão explicitamente, ao menos implicitamente, o dito nº 2.
(…)
162. Processo de habilitação provisória – Dispõe o nº 2 do artigo 374º que a habilitação provisória tem de ser «requerida contra todos os que disputem a herança».
Trata-se, é claro, daqueles que disputem a herança na «causa» ou no «processo» referidos imediatamente antes.
(…)
163. Efeitos da habilitação provisória - A habilitação provisória, se for julgada antes de estarem determinados definitivamente os herdeiros, não tem só o efeito de habilitar as pessoas às quais nesse momento se deva atribuir tal qualidade, para substituírem na causa principal a parte falecida. O final do nº 2 do artigo 374º, copiando a disposição correspondente do Código de 1939 manda notificar a sentença de habilitação aos «outros interessados» e declara que eles «são admitidos a intervir na causa como litisconsortes dos habilitados, observando-se o disposto nos artigos 353º e seguintes».
Esses «outros interessados» são, evidentemente, os demais pretendentes que disputem a herança no pleito a que se refere a primeira parte do nº 2 do artigo 374º: - as restantes partes desse pleito.
O projecto da disposição dizia:
«Os outros interessados, a quem será notificada a decisão, considerar-se-ão chamados, por esta notificação, para requererem intervenção principal, nos termos dos artigos 363º (actual 358º) e seguintes»
A revisão Ministerial porém, manteve, com levíssima modificação de forma, o preceito do Código de 1939.
Justificou a manutenção nos seguintes termos:
«Não nos pareceu razoável aplicar aos interessados abrangidos pelo nº 2 deste artigo e que ficam na simples posição de litisconsortes o regime da intervenção provocada, tal como vinha proposto pela Comissão.
O interesse posto no desenvolvimento da causa é, compreensivelmente, muito diferente por parte de quem tem uma pura expectativa de sucessão, em relação a qualquer dos litigantes e de que, pelo contrário, já viu judicialmente definida a sua posição de sucessor. Só para estes se poderia julgar aceitável a aplicação das consequências próprias da intervenção provocada.
Continuou-se pois, a atribuir aos interessados não julgados habilitados, o direito de intervirem na causa para a qual a habilitação é deduzida mas não se lhes impôs a intervenção. Esta só pode ser espontânea.
A razão pela qual o projecto impunha a intervenção principal, considerando-a provocada pela mera notificação da sentença proferida no incidente, era querer sujeitar os interessados notificados às consequências determinadas pelo artigo 359º, nº 2; querer que a sentença que viesse a ser proferida na causa principal produzisse caso julgado quanto aos que não deduzissem a intervenção.
Tal como a lei ficou, pode pôr-se em dúvida se tal sentença produz, ou não semelhante efeito quanto a eles.
Parece não poder deixar-se de entender que sim, ao menos quando o não interveniente tenha sido citado ou deva considerar-se citado na sua própria pessoa, para o incidente de habilitação. A razão é a mesma que, no caso de intervenção propriamente provocada.
De qualquer maneira, também na hipótese de que se trata há efectivamente uma provocação. O interessado não considerado herdeiro é primeiro citado para a habilitação e depois notificado da decisão que julgou habilitado outrem.
Assim se lhe dá conhecimento de que existe a causa principal e de que esta vai prosseguir com o habilitado na posição de herdeiro da parte falecida. Assim se lhe faculta a intervenção principal, para defender os seus interesses.
Se não intervém, se abandona essa defesa, sujeita-se ao que, sem sua intervenção, seja decidido na causa.
Quando intervenha, a intervenção principal, porque é espontânea e em litisconsórcio, pode ser deduzida em qualquer altura, até definitivo julgamento da causa.
(…)
164. repetição da habilitação, por virtude de caso julgado posterior – É natural que a habilitação provisória seja decidida antes de findar o processo de cujo desfecho depende a determinação da qualidade de herdeiro.
Nesse caso, terão de julgar-se habilitas, como atrás se disse, as pessoas que, no momento de decidir, de «devam considerar-se como herdeiras».
Pode, todavia, suceder que o dito processo venha a findar depois de decidida a habilitação mas pendendo ainda a causa em que o incidente foi deduzido, e venha a findar pela atribuição da referida qualidade a pessoas diferentes das que foram julgadas habilitadas, ou a outras pessoas além dessas.
Seria absurdo que a causa continuasse com os herdeiros provisoriamente habilitados ou só com eles; seria inaceitável que os verdadeiros sucessores, como tais reconhecidos no processo a isso destinado, ficassem impedidos de intervir naquela causa, com a posição que lhes compete.
Não pode deixar-se de admitir segunda habilitação, agora destes sucessores e geralmente nos termos do artigo 373º, ou seja, meramente documental.
E não só quando a habilitação julgada procedente por sentença transitada tenha sido provisória,é possível segunda habilitação.
Pode acontecer que o processo de cuja decisão depende a qualidade de herdeiro, nos termos do artigo 374º nº 2, não tenha sido instaurado sequer, na altura em que a habilitação definitiva foi julgada, mas venha a ser instaurado e decidido mais tarde e ainda na pendência da causa a que a habilitação respeitou, de modo a atribuir a aludida qualidade a outras ou a mais pessoas do que as habilitadas.
Como no caso que oportunamente se referiu (2), de a açção ter sido, logo de início, proposta por ou contra herdeiros do originário titular do direito ou obrigação, mas depois, na pendência dela, virem a ser judicialmente reconhecidas como herdeiras mais pessoas ou pessoas diferentes, não pode deixar-se de admitir segunda habilitação, com base nesse reconhecimento.
Posto, perante a Comissão Revisora do Código de 1939, o problema de saber se os herdeiros posteriormente conhecidos ou reconhecidos tinham de impugnar a sentença da habilitação definitiva mediante recurso de revisão, já Alberto dos Reis dizia que não considerava próprio nem necessário esse meio, visto que tal sentença não constituía caso julgado para os novos herdeiros. O meio de que dispunham era o de deduzirem a sua habilitação.
Tanto neste caso como no anteriormente tratado, é claro que a habilitação não prejudica nada do que na causa principal se tiver processado com os primeiros habilitados.
(…)». (in “Incidentes da Instância”, pág. 333 a 337).
A nota (2) refere-se ao exposto por este autor no ponto «150. Aplicabilidade do processo incidental de habilitação por sucessão a outros casos», onde explica, designadamente:
«(…)
É igualmente figurável a hipótese de, proposta a acção por ou contra os herdeiros do originário titular, surgir outro herdeiro que o não era à data da proposição, mas foi judicialmente declarado posteriormente.
(…)
Surgirá um novo interessado com legitimidade para intervir na causa pendente, não em substituição dos autores ou dos réus, mas a par uns dos outros. Caso haja lugar a litisconsórcio necessário, a sua presença será até indispensável para que se mantenha a legitimidade das partes primitivas.
Com menor esforço se pode considerar aplicável a esta hipótese o meio incidental de habilitação por sucessão. O novo herdeiro vai substituir, não qualquer das partes primitivas, mas o falecido credor ou devedor originário, como sucessor deste. A hipótese difere da prevista no artigo 371º em pouco mais do que não ter tido lugar o falecimento na pendência da causa mas antes da proposição.
Em qualquer das duas hipóteses que acabam de ser referidas, a habilitação não prejudicará o que, antes dela, se tiver processado na causa principal, com a presença das partes que então eram legítimas. É óbvio.
Parece curial, todavia, que a instância seja suspensa logo que do processo conste, documentalmente, terem essas partes perdido a legitimidade ou haver outra pessoa que a adquiriu.
Embora, com toda a evidência, não seja aplicável o artigo 271º, a suspensão terá «motivo justificado» e deverá, portanto, ser decretada ao abrigo do nº 1 do artigo 279º» (ob cit, pág. 307 a 309).
*
Voltando ao caso concreto, importa ter em consideração ainda o seguinte.
O Estado não foi citado no incidente de habilitação, pelas razões expostas nas várias decisões proferidas pela 1ª instância.
Mas o art. 2068º do Código Civil estatui:
«A herança responde pelas despesas com o funeral e sufrágios do seu autor, pelos encargos com a testamentaria, administração e liquidação do património hereditário, pelo pagamento das dívidas do falecido, e pelo cumprimento dos legados.».
E o art. 2070º prevê:
«1. Os credores da herança e os legatários gozam de preferência sobre os credores dos herdeiros, e os primeiros sobre os segundos.
2. Os encargos da herança são satisfeitos segundo a ordem por que vêm indicados no artigo 2068º.
(…)».
Portanto, a herança da ré …, da qual é herdeiro o Estado Português, responde pelas eventuais dívidas da falecida, designadamente a que vem alegada nesta acção, e só depois poderão ser cumpridos os legados.
Por sua vez, o nº 4 do art. 1134º do CPC (Código de Processo Civil) que estava em vigor quando foi proferida a sentença que declarou vaga para o Estado a herança da ré :
«Se algum credor tiver pendente acção declarativa contra a herança ou contra os herdeiros incertos da pessoa falecida, esta prosseguirá no tribunal competente, habilitando-se o Ministério Público para com ele seguirem os termos da causa (…)».
De igual teor é o nº 4 do art. 940º do novo CPC, aprovado pela Lei 41/2013 de 26/06.
Portanto, face à junção nesta fase recursiva, da certidão da sentença que declarou vaga para o Estado a herança, não pode a acção prosseguir sem que seja também habilitado o Ministério Público para que a decisão final possa produzir o seu efeito útil normal, fazendo pois, caso julgado contra o Estado.
Sufragando o entendimento de Eurico Lopes Cardoso acima exposto, a habilitação do Ministério Público não prejudicará o que já foi processado até ao presente, devendo ser agora suspensa a instância a fim de ser deduzido o incidente de habilitação.
O incidente será deduzido neste tribunal superior, pois só na fase recursiva foi dada a conhecer nos autos a sentença que declarou vaga a herança a favor do Estado, como decorre do art. 357º nº 1 do CPC.
Assim, ao abrigo do disposto nos art. 6º nº 2 e 272º nº 1 – parte final do CPC ordeno a suspensão da instância por 10 dias, a fim de ser deduzido o incidente de habilitação do Ministério Público.
A habilitação será requerida e processada nestes autos como prevê o nº 1 do art. 353º do CPC, e poderá ser promovida tanto pelos apelados como pelos apelantes.».
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B) Em cumprimento desse despacho foi deduzido incidente de habilitação pelos recorridos em 26/04/2022.
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C) Porém, em 26/04/2022 veio o recorrente Ar… requerer que sobre a matéria do despacho recaia um acórdão, expondo as razões da sua discordância.
A recorrida respondeu concluindo pela manutenção da decisão sob reclamação.
*
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
Contrariamente ao que diz o reclamante neste seu requerimento – «Ora, como os presentes autos foram intentados pela herança de T.., para alegada cobrança de quantia de que a herança da R. seria responsável (…)» (sic) -, a acção foi instaurada contra …e não contra a sua herança.
Diz também o reclamante, designadamente:
«3.Todavia a questão arrasta, ao tempo, um problema de personalidade judiciária (e eventualmente também de capacidade judiciária), ou seja, como acautelar, de imediato, no âmbito do presente processo, os interesses da Herança aberta por óbito da R. , enquanto não viessem a estar definidos os seus herdeiros»
«5.Ora, estávamos perante uma entidade com personalidade judiciária, a designada “entidade jacente” que deveria, desde logo, ter sido citada para a presente acção, a requerimento da A., proporcionando-se-lhe o direito de se defender e de exercer as suas prerrogativas processuais nestes autos, o que não aconteceu e deveria ter acontecido, por força dos art.s 12º al. a) e 270º do CPCivil e art. 2046º do CCivil.»
6. Sendo insanável a falta de personalidade judiciária, insanável é, também, a total ausência da “Herança jacente” aberta por óbito da R. , em todo o longo período em que os autos tramitaram, após o falecimento adquela R. sem tal acautelamento (…).»
«9. Se é certo que a r. foi, em vida, citada para a acção, está bom de ver que, com a sua morte, surgindo em seu lugar a “herança jacente”, entidade com personalidade judiciária, a falta de citação (notificação) desta implica a nulidade de todo o processado.
10. O mesmo, aliás, acontece, uma vez reconhecido o Estado como único herdeiro da R., com a falta de citação deste, através do MP, para efeitos de intervenção nos autos, sem prejuízo do disposto nos nºs 3 e 4 do art. 270º do CPC.»
«11. Isto só não seria assim se, nos autos, se tivesse começado já a audiência de discussão oral ou se o processo já estivesse inscrito em tabela para julgamento.
13. Não sendo esse o caso dos autos e pelas razões que adiante se explanará importa que recaia Acórdão da Conferência, a declarar a nulidade de todo o processado posterior ao falecimento da R. , por não ter sido demandada, de imediato, a “Herança jacente”
14. A isto acresce a circunstância de, reconhecido o Estado como seu herdeiro, e não tendo sido suscitada a sua intervenção nos autos, deverá ainda a Conferência, no mesmo Acórdão, determinar a absolvição dos RR da instância por preterição da personalidade judiciária da “Herança jacente” e ilegitimidade passiva, por falta de intervenção do Estado, reconhecido que está há dez anos, por sentença transitada em julgado, como único herdeiro da falecida R. ;
«Ora, o único herdeiro da Ré é o Estado e é exactamente o que não foi demandado, ou seja, não foi habilitado nesta acção, nem foi chamado por via de qualquer incidente de intervenção.».
Porém, a sentença que julgou habilitados o ora reclamante e outros para com eles prosseguir a causa transitou em julgado, pois como se refere no despacho reclamado (cfr al. c) desse despacho), os requeridos recorreram mas o recurso foi julgado deserto por falta de alegação. Além disso, como se refere no despacho da relatora, o despacho proferido em 12/04/2011 indeferiu requerimento do ora reclamante (cfr al. d) do despacho da relatora).
Mais argumenta o reclamante, designadamente:
«Como se decidiu, e bem, na sentença de habilitação, para tal efeito teria de haver lugar no processo próprio, previsto então, nos art. 1132º e segs do CPCivil (actualmente art. 938º e segs do mesmo Código).
Tal sentença de habilitação dos legatários, que há muito transitou em julgado, não deixou de salvaguardar, atento o litisconsórcio necessário, a oportuna intervenção do Estado.
Na verdade, uma vez que, tendo dada informação, pelo MºPº, de que estava a ser preparada ação no sentido de ser declarada a herança da falecida vaga a favor do Estado, só depois de reconhecida essa qualidade, o Estado, poderia vir a intervir nos autos.
A sentença de habilitação, chamando a atenção do litisconsórcio necessário, deixou em aberto a possibilidade de ser suprida a situação de ilegitimidade passiva, se e quando o Estado, reconhecido com herdeiro, viesse a intervir, o que não aconteceu, sem que a A., a quem compete a necessária iniciativa e impulso processuais, tenha provocado, como devia, tal intervenção.
(…)
Entendeu, porém, a Meretíssima Juíza, preocupada que estava com o andamento do processo, que, apesar de assim ser a acção deveria prosseguir, no que contou com a anuência da A., tramitando, assim, os autos sem a intervenção e o contraditório do Estado, que não pôde, assim, assegurar a sua defesa
(…)
Ora, não sendo parte nesta acção, o Estado – o único herdeiro da falecida R. – é, de todo, impossível, responsabilizá-lo, por via do património herdado da Ré (os 15% da quota disponível que o T… lhe deixou por testamento).
Como, por sua vez, os legatários, como é o caso do R, ora recorrente, também não podem ser responsabilizados por quaisquer encargos decorrentes da pretensa acção, por não se haver esgotado (nem podem esgotar) o património herdado pelo Estado (…)
24. Mais elucidativo não podia, pois, ser a posição da A. a este respeito (de recusa de chamar o Estado aos autos), não se compreendendo que já depois da 1ª instância ter advertido as partes para o litisconsórcio necessário e para a iniciativa do incidente de intervenção do Estado (máxime a A.), este Venerando Tribunal em vez de proferir decisão de absolvição a instância, venha invocar o nº 2 do art. 6º do CPCivil que as partes recusam fazer uso.».
Mas, olvida o reclamante - que tanto insiste com o dever de iniciativa processual dos recorridos - que também podia promover a intervenção do Estado logo que teve conhecimento da sentença que declarou vaga para o Estado a herança da falecida ré . Basta ler o disposto no art. 351º do CPC e ter em consideração a parte final do despacho reclamado.
De notar ainda, que a alegada recusa da recorrida …. em promover a habilitação não tem sustentação face à dedução do incidente na sequência do despacho reclamado.
Afirma o apelante que o despacho reclamado viola o caso julgado, sustentando:
«46. Acontece, assim, que o douto despacho sobre o qual se requer que recaia Acórdão em Conferência, além do mais, viola caso julgado, de forma manifesta, como enferma de nulidade, por contradição entre os fundamentos e o decidido.
47. Na verdade, invoca-se a sentença proferida no incidente de habilitação (apenso C), transitada em julgado, mas decide-se, de forma diversa ao nela fixado.
48. Efectivamente, foi ali decidido que a situação de litisconsórcio necessário em relação ao Estado, reconhecido que este fosse como único herdeiro da R. , como o foi, por sentença de 13-09-2012 junta a fls. , por imperativo legal. Daria lugar a incidente de intervenção (art. 322º e segs do CPCivil então vigente, ex vi do art. 374º do mesmo Código e art. 313º e segs, ex vi do art. 354º, nº 2, ambos do actual Código de Processo Civil) sem que ninguém, depois de tal clara decisão e sucessivas posteriores advertências, agora, esta 2ª instância, tenha de pegar na mão das partes para tal efeito!
49. Ora, o despacho sobre o qual se requer recaia Acórdão da Conferência contraria e viola o trânsito em julgado, na medida em que determina a suspensão a instância, para ser deduzido (ilegalmente e contar caso julgado), incidente de habilitação o Estado, quando a referida sentença de habilitação de 17-02-2011, transitada em julgado em 05-05-2011, é clara no sentido de que a forma de fazer intervir o Estado, nos presentes autos ser, tão só, por via do incidente de intervenção dos art. 313º e segs do CPCivil, estando totalmente excluído, por sentença transitada em julgado, o recurso a incidente de habilitação.
50.Claro que, nem a A. poderá fazê-lo, porquanto renunciou expressis verbis, a tal (…)».
A alegação de violação de caso julgado não tem fundamento. O que consta nos fundamentos da sentença de 15/02/2011 (apenso C) foi que havia que habilitar «como sucessores da falecida os que, neste momento, se devam considerar como tal, sem embargo de posteriormente ser admitida a intervenção do Estado como litisconsorte dos ora requeridos (cfr art. 374º nº 2 do CPC).».
O art. 374º nº 2 do então vigente CPC dispunha:
«Quando a qualidade de herdeiro esteja dependente da decisão de alguma causa ou de questões que devam ser resolvidas noutro processo, a habilitação ser requerida contra todos os que disputam a herança e todos são citados, mas o tribunal só julga habilitadas as pessoas, que, no momento em que a habilitação seja decidida, devam considerar-se como herdeiras; os outros interessados, a quem a decisão é notificada, são admitidos a intervir na causa como litisconsortes dos habilitados, observando-se o disposto nos artigos 322º e seguintes.».
Ora, o Estado Português nunca interveio espontaneamente. Por isso, como se explica no despacho reclamado, impõe-se dar cumprimento ao disposto no art. 1134º nº 4 do anterior CPC e art. 940º nº 4 do actual CPC.
Lembremos que o art. 7º do CPC estabelece:
«Na condução e intervenção no processo. Devem os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio».
E também o art. 8º desse diploma legal prevê:
«As partes devem agir de boa fé e observar os deveres de cooperação resultantes do preceituado no artigo anterior.».
Não podemos crer que o reclamante pretenda que o processo termine com absolvição a instância ao final de todos estes anos e actos processuais, ou que fique num impasse aguardando a intervenção espontânea do Estado Português, pois faz questão de dizer que o Estado Português deve ter intervenção nos autos e «está à vontade sobre esta matéria, pois, foi sucessivamente, chamando a atenção do tribunal para tal questão essencial, sob pena de ilegitimidade passiva».
Aliás, deixamos aqui a chamada de atenção para o art. 261º do CPC:
«1. Até ao trânsito em julgado da decisão que julgue ilegítima alguma das partes por não estar em juízo determinada pessoa, pode o autor ou reconvinte chamar essa pessoa a intervir nos termos dos artigos 316º e seguintes.
2. Quando a decisão prevista no número anterior tiver posto termo ao processo, o chamamento pode ter lugar nos 30 dias subsequentes ao trânsito em julgado; admitido o chamamento, a instância extinta considera-se renovada, recaindo sobre o autor ou reconvinte o encargo do pagamento das custas em que tiver sido condenado.».
Portanto, no despacho reclamado, acolhendo o ensinamento de Lopes Cardoso, concluiu-se sobre o meio processual adequado a fazer intervir o Ministério Público, tendo os recorridos procedido em conformidade.
Mas admitamos que o reclamante esteja preocupado em zelar pelos interesses do Estado Português ao dizer:
«32. Aliás, diga-se que a posição do Estado é compreensível, pois se a A. vier a intentar uma acção na sequência da absolvição dos RR da instância, por não ter sido demandada a “Herança Jacente” (personalidade judiciária), nem ter tido intervenção nos autos, tem de ser decretada.
33. Nesse caso, sempre poderá vir a apresentar a sua contestação e não entrar num processo desta dimensão e responsabilidade, em fase de recurso de apelação, ou seja, prestes a ser proferida decisão em segunda instância, sem ter podido assumir a sua defesa e intervir em todo o processado, imediatamente subsequente à morte da R. e até à presente data.
34. Aliás, no que ao Estado diz respeito e com a devida consideração, o despacho em causa afigura-se como um “presente envenenado”, pois, sendo o Estado titular dos interesses que lhe advêm da herança da falecida R., acabam por estar em causa elevados valores que, a serem reconhecidos, o que se não admite, assumem natureza pública, ou seja, de todos nós, sendo que nos termos do artigo 2068º do CCivil cabe ao Estado como herdeiro em primeira linha de responsabilidade relativamente aos valores reclamados nestes autos.».
Porém, o Exmo Procurador Geral Adjunto neste Tribunal da Relação e eventualmente o Exmo Procurador Geral Adjunto no Supremo Tribunal de Justiça, saberá defender os interesses do Estado Português, pelo que é por demais impertinente a preocupação do reclamante, como que receando inépcia de Ilustres Magistrados.
Além disso, o Estado Português só poderá responder na medida dos bens que receba da herança, como decorre dos art. 2068º e 2071º do Código Civil.
Mais diz o apelante, designadamente:
«56. No presente caso o uso do disposto no art. 6º do CPCivil (já esgotado na 1ª instância) subverte seus fins e objectivos, que são os de assegurar um processo equitativo, uma vez que não pode a 1ª instância e agora, e inusitada repetição, este Venerando Tribunal da Relação, andar sistematicamente atrás da A,. que já assumiu recusar fazê-lo, como é de seu direito.
57. Está em causa a preterição da personalidade judiciária (“Herança jacente”) e a ilegitimidade passiva dos RR que constituem excepções dilatórias (alíneas c) e e) do art. 577º do CPCivil) que, além de alegadas são de conhecimento oficioso (art. 578º do CPCivil) o que conduz à absolvição da instância».
Porém, o tribunal não anda “a reboque” de nenhuma das partes nem “trás ao colo” nenhuma das partes.
O que sucede é que está, até, reforçada no CPC actual, a imposição ao juiz do dever de gestão processual e de cooperação com vista à descoberta da verdade material e justa composição do litígio, como resulta, designadamente dos art. 5º nº 2, 6º, 7º, e 590º nº 2, 3 e 4 do CPC.
Além disso, decorre tanto do art. 940º nº 4 do CPC actual, como do art. 1134º nº 4 do CPC anterior, a imposição de habilitação do Ministério Público, como se explica no despacho reclamado.
Afirma ainda o reclamante que o despacho reclamado é uma decisão surpresa, pois não foram ouvidas as partes. Porém, só o reclamante o alega. E a verdade é que os autos estão repletos de peças processuais, designadamente do reclamante, sobre a questão da intervenção do Ministério Público. Ora, lembramos ao reclamante que o nº 3 do art. 3º do CPC prevê a audiência das partes «salvo caso de manifesta desnecessidade». É o caso presente. Em suma, não tem razão.
Por quanto se disse e sem necessidade de mais esmiuçar os argumentos espraiados no arrazoado do reclamante ao longo de 35 paginas do processo físico com vista a obter uma decisão de absolvição da instância, mantem-se integralmente o despacho reclamado e que já foi cumprido pelos recorridos.
Custas pelo reclamante/recorrente Ar….
Lisboa, 09 de Junho de 2022
Anabela Calafate
António Manuel Fernandes dos Santos
Ana de Azeredo Coelho