EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA
PROVA PERICIAL
Sumário

Uma vez que a peritagem é obrigatória no processo de expropriação, e ainda que essa prova não seja vinculativa, porque estamos perante questões de natureza essencialmente técnica, o tribunal deve aderir, em princípio, ao parecer dos peritos, desde que coincidentes, e, por razões de imparcialidade e independência, optar pelo laudo dos peritos nomeados pelo tribunal quando haja unanimidade neste.

Texto Integral

Processo n.º 3578/18.9T8MTS.P1

Recorrente – AA
Recorrido - Município ...

Relator: José Eusébio Almeida; Adjuntos: Carlos Gil e Mendes Coelho.

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto:

I - Relatório
Ao abrigo do disposto no artigo 51, n.º 1 do Código das Expropriações (CE), o Município ... remeteu ao tribunal recorrido o presente processo de expropriação, relativo a parcela a que foi atribuído o número ..., devidamente descrita, e no qual, processo, figura como expropriado AA.

Mostrando-se o processo devidamente instruído, foi adjudicada ao beneficiário da expropriação a propriedade da parcela em causa, livre de quaisquer ónus ou encargos.

O Município ..., tal como o expropriado, vieram recorrer da decisão arbitral. Aquele, em síntese, defendeu a adoção de um índice de construção de 0,72m2/m2, invocou o disposto no artigo 23, n.º 2, alínea b) do CE/2/b), do CE, referindo-se a empreitada para realização de infraestruturas em rua distinta das que dão acesso à parcela expropriada e conclui pela aplicação da mesma percentagem que o acórdão arbitral utilizou para efeitos do disposto no artigo 26, n.º 7 do CE. Reputa como justa indemnização o valor de 44.362,66€. Por seu turno, o expropriado discorda da consideração da percentagem de 10% para efeitos do disposto no artigo 26, n.º 6 do CE (contrapondo a percentagem de 13%), da aplicação da percentagem de 35% para efeitos do disposto no artigo 26, n.º 9 do CE (sustentando não haver necessidade de reforço de infraestruturas) e, ainda, da consideração da percentagem de 15% a título de fator corretivo, pela inexistência do risco e do esforço inerente à atividade construtiva (defendendo que esta percentagem deve ser fixada em 7,5%). A final, pretende que a justa indemnização seja fixada no valor de 118.629,40€.

Ambos os recursos foram admitidos, e teve lugar a avaliação da parcela, levada a cabo pelos peritos nomeados, indicados pelas partes e pelo tribunal. Os peritos responderam aos quesitos e aos esclarecimentos solicitados pelo expropriado. Tendo o Município prescindido da inquirição da prova testemunhal arrolada e tendo sido (repetidamente) esclarecido pelos peritos que as (volumosas) informações documentais remetidas pela Autoridade Tributária em nada alteravam a perícia, as partes foram notificadas para alegarem. Quer o expropriado [“(...) os Peritos maioritários aplicam uma percentagem de 25 % para reforço das infraestruturas ao abrigo do disposto no art. 26 n.º 9 do C.E. No caso em apreço, preveem a construção de duas moradias, pelo que não há qualquer reforço das infraestruturas já existentes. Aliás, vejam-se os esclarecimentos prestados em 14/11/2019 – nos itens Q6, Q7 e Q8 “as infraestruturas foram inspecionadas no local e verifica-se a necessidade de prolongar as infraestruturas existentes no local para poder aproveitar a globalidade do terreno para o seu aproveitamento urbanístico”. Fará parte da obra do construtor da moradia, fazer a ligação da rede da via pública ao terreno, mas nunca é justificado pelos Srs. Perito “UMA SOBRECARGA INCOMPORTÁVEL” como se prevê no n.º 9 do art. 26. Logo é infundado e ilegal, a percentagem de 25% para “reforço das infraestruturas” com que o valor da parcela foi afetado] quer o Município vieram alegar [“(...) verifica-se ter ocorrido a formação de posição maioritária dos peritos na fixação da indemnização, tendo alguns dos óbices apontados pelo expropriante ao cálculo dos valores que serviram de base para a fixação da indemnização no acórdão arbitral sido acolhidos. É sabido que, não obstante o juiz não estar vinculado ao resultado do laudo, a tecnicidade de que se revestem as questões debatidas no processo expropriativo justifica que se atribua particular relevância a este meio probatório (...) considerando o juízo técnico dos Srs. Peritos que constituem o laudo maioritário, o qual se encontra devidamente fundamentado, não vislumbra qualquer motivo razoável para o Tribunal divergir do valor da justa indemnização devida pela expropriação da parcela em causa].

Veio a ser proferida sentença final, com o seguinte dispositivo: “Face ao exposto e ao abrigo das disposições legais citadas: 1) Julga-se parcialmente procedente o recurso do expropriado e, em consequência, fixa-se em €60.220,80 (sessenta mil, duzentos e vinte euros e oitenta cêntimos) o montante da indemnização que lhe é devido, a atualizar de acordo com os índices de preços do consumidor, com exclusão da habitação, fornecidos pelo INE, relativamente ao local da situação do bem ou da sua maior extensão da forma que na fundamentação da sentença que se profere, se descreveu. 2) Julga-se improcedente o recurso da expropriante. Custas pelas partes, na proporção do decaimento (art. 517 do Código de Processo Civil), fixando-se o valor da acção em €74.266,74 (arts 297 e 549/1, do Código de Processo Civil)”.

II – Do Recurso
Inconformado com o decidido, o expropriado apelou. Pretende que “por erro de interpretação e aplicação do disposto no artigo 26.º n.ºs 6, 7, 8, 9 e 10 do Código das Expropriações, deve a Sentença ser revogada e substituída por outra que fixe o valor da parcela em 113.471,60 €, por ser o valor real”, formulando as seguintes Conclusões:
I - Para se encontrar o valor justo duma parcela expropriada o único critério é o do seu valor real e corrente, em condições normais de mercado.
II - Se o artigo 11 da Base 2.1 do PDM de Matosinhos dispõe que o índice de ocupação da parcela é de 1 m2/m2, não podem os Srs. Peritos maioritários, sem mais, aplicar o índice 0,80 m2/m2.
III - Se os Srs. Peritos só calculam no item 6 e 7 do art. 16.º – 10% para a qualidade ambiental e sendo o máximo de 15%, têm de justificar, com factos sindicáveis, porque existe esta redução, quando a parcela é servida de todas as infraestruturas possíveis e previstas no C.E.
IV - A percentagem de 25% de dedução do valor da parcela, para despesas de reforço das infraestruturas existentes, só deve ocorrer em caso comprovado, de sobrecarga incompatível para as infraestruturas existentes não se bastando com probabilidades da sua existência.
V - Não existindo comprovadamente essa sobrecarga, deve a sua percentagem ser anulada no critério de avaliação e não é caso para existir se só está previsto uma percentagem de 0,80 % do solo, quando o PDM prevê 1 m2/m2 e só se pode construir uma habitação unifamiliar.
VI - Se a Autoridade Tributária prevê uma percentagem de 22% para a percentagem do valor de construção em causa, por não ser um valor especulativo, antes o de valorizar para efeitos de tributação em IMI, cujo beneficiário é afinal a Expropriante, deve ser seguido à falta de outros critérios.
VII - Face à localização, topografia do terreno e excelência do Concelho de Matosinhos para habitação, o risco construtivo deverá ser reduzido para 7,5%.

O beneficiário da expropriação respondeu ao recurso e, defendendo a improcedência deste e a manutenção da decisão recorrida, veio a concluir:
1 - Com a interposição de um recurso, o recorrente fica, automaticamente, sujeito a dois ónus, caso pretenda prosseguir com a impugnação de forma regular e ter êxito a final.
2 - O primeiro, é o ónus de alegar, no cumprimento do qual se espera que o interessado analise e critique a decisão recorrida, refute as incorreções ou omissões de que, na sua ótica, ela enferma, argumentando e postulando, circunstanciadamente, as razões de direito e de facto da sua divergência em relação ao julgado.
3 - O segundo ónus, é o de finalizar essa peça, denominada alegações, com a formulação sintética de conclusões, em que o recorrente resuma os fundamentos que desenvolveu no corpo alegatório e pelos quais pretende que o tribunal de recurso altere ou anule a decisão posta em crise.
4 - Existe ainda um ónus de especificação de cada um dos pontos da discórdia do recorrente com a decisão recorrida, seja quanto às normas jurídicas e à sua interpretação, seja a respeito dos factos que considera incorretamente julgados e dos meios de prova que impunham uma decisão diferente.
5 - Além da sua natureza lógica de finalização resumida de um discurso, as conclusões de uma alegação de recurso têm um papel decisivo, não só no levantamento das questões controversas apresentadas ao tribunal superior, mas também na viabilização do exercício do contraditório.
6 - No caso, dúvidas não existem de que uma simples leitura das sete conclusões apresentadas pelo recorrente, o mesmo não impugna a decisão relativa à matéria de facto provada e não provada, assim como não versa o presente recurso sobre a matéria de direito.
7 - O recorrente não invocou, também, quer no corpo alegatório, quer nas conclusões apresentadas, que a decisão padecesse de qualquer nulidade.
8 - O recorrente não cumpriu com as regras e ónus processuais que sobre o próprio recaía, razão pela qual deverá o recurso, sempre com o devido respeito, ser rejeitado.
Sem prescindir:
9 - A decisão recorrida discrimina com minúcia e clareza, os fundamentos que permitiram solucionar a “vexata quaestio” dos autos, enunciando os factos que considera provados e não provados, tendo sido corretamente apreciado o objeto do litígio, que era o da fixação da justa indemnização devida no âmbito do processo expropriativo analisado, traduzida na análise das várias componentes dessa avaliação.
10 - A justificação relativa à determinação do valor do solo, desdobrada nas suas várias vertentes, não padece de qualquer vício que deva ser declarado nesta sede.
11 - Não existindo unanimidade dos peritos e não existindo razões objetivas e concretas que permitam ao julgador aferir qual o relatório que melhor se adequa aos objetivos que se pretendem atingir, terá que atender às conclusões que reúnem o maior consenso dos peritos ou às conclusões dos peritos do Tribunal, por se dever presumir que as conclusões subscritas por um número maior de peritos terão maior aptidão para atingir aquele objetivo ou que os peritos do tribunal, não tendo sido indicados pelas partes e não tendo com elas qualquer ligação, oferecem melhores garantias de isenção e imparcialidade, estando, por isso, em melhores condições de, com objetividade e isenção, determinar o justo valor da indemnização.
12 - A decisão recorrida, perante o carácter técnico da questão e tendo em conta a maioria da decisão dos Srs. Peritos, não tinha necessidade de se pronunciar de outro modo, já que não apurou que essa decisão tivesse por base critérios legalmente inadmissíveis ou desadequados ou padeces só de qualquer erro ou lapso.
13 - Bem andou o tribunal ao fixar, a título de justa indemnização, a quanta de 60.220,80€, atualizada nos termos da lei.

O recurso foi recebido nos termos legais e os autos correram Vistos, nada se observando que obste ao conhecimento do seu objeto, o qual, tendo em conta as conclusões do apelante, consiste em saber se a decisão recorrida deve ser revogada, uma vez que a mesma erra na interpretação e aplicação do disposto nos n.ºs, 6, 7, 8 e 9 do artigo 26 do CE, e deve ser substituída por outra que fixe em 113.471,60€ o justo valor da parcela expropriada.

III – Fundamentação
III.I – Fundamentação de facto
A sentença recorrente deu como fixados os seguintes factos, provados e não provados[1], os quais se não mostram impugnados na apelação interposta:
A – Factos provados
1 - Por despacho do Sr. Secretário de Estado das Autarquias Locais de 2.02.2017, publicado no D.R., n.º 71, II Série, de 10.04.2017, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da expropriação das parcelas de terreno necessárias à execução da obra de ligação da rua ... à rua ..., ..., nas quais se inclui a parcela a que se refere o presente processo, e à qual foi atribuído o n.º 2.
2 - Em 11 de junho de 2018, foi proferida decisão arbitral que fixava o valor da indemnização pela presente expropriação em 55.760,00€ (correspondentes ao valor do solo).
3 - A parcela expropriada tem a área de 820 m2.
4 - Pertence a um prédio de maiores dimensões com área de 4000m2, com geometria sensivelmente trapezoidal, confrontando a norte com BB e outros, a sul com Câmara Municipal ..., a nascente com CC e a poente com BB.
5 - Este prédio encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos, sob o n.º .../..., com a propriedade aí definitivamente inscrita a favor de AA e inscrito na matriz predial sob o artigo ..., da União das Freguesias ..., ... e ....
6 - A parcela n.º ... tem geometria sensivelmente retangular e fica implantada em toda a frente do extremo norte do prédio.
7 - O seu solo apresenta características areno-siltosas, com camada superficial orgânica, topografia plana e boa exposição solar.
8 - Mostra-se inculto, coberto com herbáceas secas e algumas silvas.
9 - O terreno da parcela está em cota superior à da rua ... e rua ..., em cerca de 1,00m e 0,50m, respetivamente.
10 - Parte do limite poente da parcela coincide com o muro das traseiras das habitações da rua da Paz, que se prolongam por todo o limite poente do prédio.
11 - A parte sobrante tem características equivalentes às referidas em 7 a 9.
12 - A parcela e o prédio situam-se em área classificada pelo Plano Diretor Municipal de Matosinhos como zona urbana e urbanizável, em área predominantemente residencial.
13 - Para o local não existe nenhum plano de urbanização ou de pormenor.
14 - A envolvente norte e nascente da parcela e prédio caracterizam-se por zonas residenciais compostas por moradias de rés do chão e andar.
15 - A sudeste da parcela existe uma área ocupada por edifícios multifamiliares de rés do chão e três pisos.
16 - Na envolvente sul existe uma área destinada a equipamento, onde estão localizados os serviços urbanos da Câmara Municipal ... e uma área de Reserva Ecológica Nacional, classificada no PDM como área verde, de parque e cortina de proteção ambiental.
17 - A parcela confronta a norte com o extremo sul da rua ... e da rua ....
18 - A rua ... caracteriza-se por ser uma via pública composta por passeios dos dois lados, com largura de 0,45m, pavimentados a betonilha esquartelada sem lancil a delimitar e faixa de rodagem com a largura de 4,90m, pavimentada a betuminoso.
19 - Apresenta, junto à parcela, rede de abastecimento de água, rede de saneamento, rede de distribuição de energia elétrica e rede telefónica.
20 - As águas pluviais escorrem superficialmente pela faixa de rodagem até ao extremo sul da rua, seguem posteriormente no sentido nascente-poente pela frente norte da parcela ... e são recolhidas por uma caixa implantada a norte da parcela ... e no alinhamento das habitações da rua ....
21 - A rua ... caracteriza-se por ser uma via pública composta por passeios dos dois lados, com largura de 2,10m, pavimentado com betonilha esquartelada e delimitado por lancil de granito com 20cm de largura, faixas de estacionamento paralelo à faixa de rodagem, com a largura de 2,5m, pavimentadas com cubos de granito e delimitadas por lancil de granito com 11cm de largura, e faixa de rodagem, com largura de 6,50m, pavimentada a betuminoso.
22 - Junto à parcela n.º ..., a rua ... é dotada de um cul-de-sac e marginada a nascente por uma área verde, afeta ao domínio público.
23 - Na frente dessa área verde e fora do cul-de-sac existem lugares de estacionamento perpendiculares à faixa de rodagem, com 4,5m de profundidade e 3m de largura, em número de nove.
24 - A rua ... apresenta, junto à parcela, rede de abastecimento de água, rede de saneamento, rede de distribuição de energia elétrica, rede de drenagem de águas pluviais, rede de distribuição de gás e rede telefónica.
25 - No limite norte da parcela e relativamente à rua ... existe parte de uma vedação materializada por 9 vigotas cravadas no solo, com altura visível de 1,50m (duas estão derrubadas).
26 - O concelho de Matosinhos e a sua cidade situam-se no centro da Área Metropolitana do Porto onde vivem e trabalham mais de 1.500.000 pessoas.
27 - Confronta a norte com Vila do Conde, a nascente com a Maia e a sul com o Porto.
28 - Tem acesso rápido pela ... e av. ... para o Porto, ... para Braga, ... para Vila Real, ... para Viana do Castelo, situando-se a parcela próximo dos nós de acesso à ... e ..., com o que tem acessibilidade para todas as AE e IP da área metropolitana do Porto.
29 - O aeroporto situa-se na extrema norte do Concelho que divide com a Maia.
30 - Alberga o ..., o ... e o ... – ....
31 - O concelho tem grandes superfícies comerciais – ... e ... - bancos, farmácias, bombeiros, PSP e GNR.
32 – É servido por diversos transportes públicos de passageiros, para o Porto e para toda a região, pelos STCP, Gondomarense, VALPI, Resende e Metro de Porto.
33 - Tem um Hospital ... com todas as valências – ... - e diversos Hospitais Privados - ... – para além dos Centros de Saúde em todas as freguesias.
34 - Tem escolas públicas secundárias em todo o concelho, estádios de futebol, pavilhões gimnodesportivos, campos de ténis, grandes parques de lazer – Quinta ... – piscinas em todas as freguesias com a ... em ..., obra de ....
35 - Todo o seu litoral é dotado de excelentes praias, com bandeira azuis, ligadas por passadiço pedonal até ao Concelho a Norte, Vila do Conde, frequentado todo o ano por inúmeras pessoas.
36 - A parcela mostra-se próxima, mas a distância superior a 1 Km, de estabelecimentos de ensino superior e básico, hospitais e centros de saúde.
37 - Tem uma boa exposição solar.

B - Factos não provados
38 - Num estudo da A..., sobre o ranking dos Concelhos em Portugal no TOP 25 Nacional, Matosinhos ocupa o 14.º lugar; para fazer negócios, o 19.º lugar; para visitar, o 13.º lugar, para viver ocupa o 15.º lugar e, no Ranking Regional do Norte, ocupa o 4.º lugar
39 - É um dos concelhos mais procurados para viver e onde as habitações são vendidas aos preços mais altos.

Considerando que a sentença recorrida adota a avaliação constante do laudo maioritário, cumpre deixar expressa a mesma:
C - No laudo pericial foi considerado não haver qualquer desvalorização da parcela sobrante e que, não existem benfeitorias considerar. No mais, e quanto à avaliação do terreno, consideraram [os peritos do tribunal e o indicado pelo Município]:
(...) 4. AVALIAÇÃO DO TERRENO.
4.1 – AVALIAÇÃO DA PARCELA
Passando à avaliação do terreno, os Peritos nomeados entendem discriminá-la do seguinte modo.
4.1.1 – Valor da construção por m2 de terreno
- Construção – 0.80 m27m2 x 680 544,00 m2/m2.
4.1.2 – Percentagem relativa ao n.º 9 do art. 26 do CE – fator 25%, com reforço das infraestruturas existentes – 25%.
4.1.3 – Percentagem relativa ao n.º 10 do art. 26 do CE – fator corretivo pela inexistência do risco e do esforço relativamente à atividade construtiva – 10%.
4.1.4 – Valor unitário do terreno
544,00€ m2 x 20.0 %[2] x 75% x 90% - 73.44€ /m2.
4.1.5 – Valor da área expropriada
820 m2 x 73,44€/m2 – 60.220,80”[3].

III.II – Fundamentação de Direito
Numa primeira nota, suscitada pela resposta do apelado ao recurso interposto pelo expropriado e às conclusões que neste foram formuladas, diremos apenas, de modo sintético, que, sem prejuízo do mérito ou demérito, em concreto, do recurso interposto, não se viram – em sede de despacho do relator – nem se veem – nesta ocasião -, razões para a não admissão do recurso, atenta a existência, desde logo, de conclusões, suficientemente percetíveis, e da invocação das normas jurídicas violadas.

Prosseguindo, podemos também dizer que a sentença apelada faz pertinentes considerações, com fundamento jurídico relevante, sobre a natureza do ato expropriativo e sobre a finalidade primeira do processo judicial, o qual culminará com a atribuição da chamada justa indemnização, enquanto garantia do expropriado e, além disso, requisito de validade do próprio ato expropriativo.

Quanto ao processo judicial, propriamente dito, “o mesmo pode ser sistematizado nos seguintes momento (...) havendo recurso, o mesmo será intentado no tribunal de 1.ª instância do lugar da situação dos bens ou da sua maior extensão, tendo efeito meramente devolutivo (artigo 38.º, n.º 3)”[4]. Em sede de instrução, tem “obrigatoriamente lugar a prova pericial”, ou seja, a avaliação efetuada por cinco peritos, relativamente à qual, “apesar de ser o perito dos peritos, o juiz não dispõe, por regra, dos meios técnicos que lhe permitam infirmar o teor do relatório pericial, pelo que o relatório constitui um prelúdio fortemente condicionador do conteúdo da decisão. Por isso, a livre apreciação do juiz fica normalmente restringida a uma avaliação pericial, o que torna muito difícil que aquele se pronuncie desfavoravelmente à mesma (independentemente do sentido unânime ou maioritário), já que para que o faça terá de invocar elementos técnicos de que normalmente não dispõe”[5].

Abordando a avaliação obrigatória prevista no artigo 61, n.º 2 do CE, Salvador da Costa[6] que essa obrigatoriedade, ao invés do que decorre em relação aos outros meios de prova, deriva essencialmente da sua complexidade técnica da avaliação de várias espécies de bens, e, por isso, da necessidade de colaboração de pessoas com conhecimentos específicos de que a generalidade das pessoas não dispõe”.

A sentença recorrida, concretizando a fundamentação que, no caso presente, justificou a indemnização decidida, escreveu o que ora, com síntese, se transcreve e sublinha: “(...) nos presentes autos não se discute a classificação do solo da parcela: unanimemente a mesma é classificada como integrando uma área apta para construção. Assim, na impossibilidade constatada por todos os Srs. peritos, da aplicação do critério constante do art. 26/2, tem-se que o valor da parcela a expropriar tem que ser determinado de acordo com os critérios consagrados no artigo 26/4, do C. das Expropriações “em função do custo da construção, em condições normais de mercado, nos termos dos números seguintes” de tal norma. Desta forma haverá que partir do custo de construção (atendendo-se como referencial, aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada), fazendo-se corresponder o valor do solo a uma percentagem de tal custo de construção, percentagem esta que varia em função da localização da parcela, da sua qualidade ambiental, dos equipamentos existentes na zona e das infraestruturas que a servem (artigo 26, n.ºs 5 a 7). Mais deve tal valor ser corrigido caso seja necessário proceder-se ao reforço das infraestruturas existentes e com o fator relativo ao risco de construção e ao esforço inerente à atividade construtiva (art. 26, n.ºs 9 e 10) (...) crê-se ser de aceitar os valores encontrados pelos Srs. Peritos nomeados pelo tribunal e indicado pela expropriante. Trata-se de um juízo pericial formulado em conjunto por esses quatro peritos com, afigura-se, adequada ponderação e valoração dos factos a considerar relativamente às características da parcela, designadamente dos que se deram como provadas. O relatório mostra-se adequadamente fundamentado, revelando a experiência e o saber conjunto dos seus subscritores, não havendo qualquer razão para não aceitar como corretos e adequados os parâmetros e valores da indemnização aí fixados, sendo de realçar as particulares garantias de imparcialidade oferecidas pelos Srs. peritos indicados pelo tribunal (isentos de qualquer relação com as partes e assim tendencialmente mais objetivos no seu juízo pericial). Tendo ainda tais peritos, de forma clara e precisa, afastado em sede de esclarecimentos as objeções colocadas pelo expropriado ao seu juízo pericial. Justificando, com as características da envolvente o índice de construção que adotaram, com a necessidade de prolongamento das infraestruturas existentes a percentagem considerada para efeitos do n.º 9 de tal norma e reforçando a existência de risco na atividade de construção em causa (n.º 10). Mais justificaram a percentagem que consideraram para efeitos do disposto nos n.ºs 6 e 7, do art. 26 (focando-se nas infraestruturas existentes e na localização e qualidade ambiental da parcela,), considerando o tribunal que as características da parcela e o lugar onde está inserida, nos moldes que ficaram provados, se adequam à percentagem de 10% que adotaram para efeitos do disposto no art. 26/6, do C. das Expropriações”.

Como decorre da sentença, o valor do solo – unanimemente considerado como “solo apto a construção”, foi calculado nos termos do disposto no artigo 26 do CE, não de acordo com o n.º 2 deste mesmo preceito (pois, não obstante o pedido formulado à Autoridade Tributária e a resposta feita através de centenas de páginas que os autos documentam, foi, também unanimemente, tido por inviável o cálculo do valor feito nesses termos), mas de acordo com os disposto nos seus n.ºs 4 a 10: “4 - Caso não se revele possível aplicar o critério estabelecido no n.º 2, por falta de elementos, o valor do solo apto para a construção calcula-se em função do custo da construção, em condições normais de mercado, nos termos dos números seguintes. 5 - Na determinação do custo da construção atende-se, como referencial, aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada. 6 - Num aproveitamento economicamente normal, o valor do solo apto para a construção deverá corresponder a um máximo de 15% do custo da construção, devidamente fundamentado, variando, nomeadamente, em função da localização, da qualidade ambiental e dos equipamentos existentes na zona, sem prejuízo do disposto no número seguinte. 7 - A percentagem fixada nos termos do número anterior poderá ser acrescida até ao limite de cada uma das percentagens seguintes, e com a variação que se mostrar justificada: a) Acesso rodoviário, com pavimentação em calçada, betuminoso ou equivalente junto da parcela - 1,5%; b) Passeios em toda a extensão do arruamento ou do quarteirão, do lado da parcela - 0,5%; c) Rede de abastecimento domiciliário de água, com serviço junto da parcela - 1%; d) Rede de saneamento, com coletor em serviço junto da parcela - 1,5%; e) Rede de distribuição de energia elétrica em baixa tensão com serviço junto da parcela - 1%; f) Rede de drenagem de águas pluviais com coletor em serviço junto da parcela - 0,5%; g) Estação depuradora, em ligação com a rede de coletores de saneamento com serviço junto da parcela - 2%; h) Rede distribuidora de gás junto da parcela - 1%; i) Rede telefónica junto da parcela - 1%. 8 - Se o custo da construção for substancialmente agravado ou diminuído pelas especiais condições do local, o montante do acréscimo ou da diminuição daí resultante é reduzido ou adicionado ao custo da edificação a considerar para efeito da determinação do valor do terreno. 9 - Se o aproveitamento urbanístico que serviu de base à aplicação do critério fixado nos n.ºs 4 a 8 constituir, comprovadamente, uma sobrecarga incomportável para as infraestruturas existentes, no cálculo do montante indemnizatório deverão ter-se em conta as despesas necessárias ao reforço das mesmas. 10 - O valor resultante da aplicação dos critérios fixados nos n.ºs 4 a 9 será objeto da aplicação de um fator corretivo pela inexistência do risco e do esforço inerente à atividade construtiva, no montante máximo de 15% do valor da avaliação”.

Como também decorre do sentenciado, o tribunal recorrido fundamentou-se no laudo pericial maioritário, concretamente subscrito por quatro dos cinco peritos, naqueles se incluindo os três peritos do tribunal.

A propósito da intervenção pericial no processo de expropriação e do seu valor decisório, transcrevemos alguns sumários elaborados em acórdãos proferidos pelos tribunais da Relação [todos consultáveis em dgsi]. No acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 14.12.2010 [Relator, Desembargador Carvalho Martins, Processo n.º 4714/07.6TBVIS.C1: “Muito embora a força probatória das respostas dos peritos seja fixada livremente pelo julgador - peritus peritorum - o certo é que a força deste princípio esgota-se no poder conferido ao juiz de controlar os critérios utilizados pelos peritos e moldá-los aos legalmente estatuídos; assim, não sendo encontrado pelos peritos um valor indemnizatório único, como regra geral, a prova pericial a que o julgador deve reconhecer mais crédito é aquela que é subscrita pelos peritos nomeados pelo tribunal, por ser a que mais imparcial se apresenta”. No acórdão da mesma Relação, de 7.02.2012 [Relator, Desembargador Jorge Arcanjo, Processo n.º 5/10.3TBGRD.C1]: “Sendo a peritagem obrigatória, ainda que a prova não seja vinculativa, mas tratando-se de um problema essencialmente técnico, o tribunal deve aderir, em princípio, ao parecer dos peritos, dando preferência ao valor resultante desses pareceres, desde que sejam coincidentes, e, por razões de imparcialidade e independência, optar pelo laudo dos peritos nomeados pelo tribunal quando haja unanimidade destes”. No acórdão deste Tribunal da Relação do Porto de 15.11.2018 [Relator, Desembargador Filipe Caroço, Processo n.º 1854/13.6TJPRT.P1]: “I – Na determinação do valor da indemnização, por serem os peritos especialistas na avaliação de bens e deverem também orientar-se pelos critérios de legalidade, objetividade e imparcialidade, com especial destaque para os peritos do tribunal, deve atender-se à sua especial importância (até pela obrigatoriedade da perícia) no âmbito da aplicação do princípio da livre apreciação da prova. II – Não padece de nulidade por omissão de pronúncia nem por falta de fundamentação a sentença proferida no processo de expropriação que, acolhendo o relatório pericial maioritário (subscrito pelos peritos nomeados pelo tribunal e pelos expropriados), não discute as divergências existentes entre as posições assumidas pela perícia, entre estas e o relatório de arbitragem e os argumentos de que a expropriante e os expropriados se serviram, designadamente para discordar ou aceitar a posição arbitral”. No acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 10.09.2020 [Relatora, Desembargadora Albertina Pedroso, Processo n.º 84/18.5T8CCH.E1]: “Muito embora a força probatória das respostas dos peritos seja fixada livremente pelo julgador, atendendo à especial conformação legal da avaliação em processo de expropriação, e aos especiais conhecimentos técnicos exigidos aos peritos nomeados para a efetuarem, caso o relatório pericial seja unânime ou maioritário, o tribunal só deve afastar-se dos valores por aqueles propostos com base em especiais conhecimentos que o mesmo não possui, se verificar a existência de erro ou incumprimento pelos peritos dos critérios legalmente estabelecidos e aos quais estes também se encontram vinculados. IV - O especial valor probatório do relatório pericial apenas será de excluir se outros preponderantes elementos de prova o infirmarem, mormente por padecer de erro grosseiro ou por ser contrário a normas legais vinculativas, caso em que o juiz deve pôr em causa o relatório técnico dos peritos, mas com recurso a argumentação técnica ou científica, eventualmente baseada noutros meios de prova divergentes, de igual ou superior credibilidade, e que podem, por exemplo, decorrer dos relatórios minoritários ou ainda do cotejo deste relatório com o laudo arbitral e o relatório de avaliação, todos efetuados por peritos igualmente integrados na referida lista oficial. V - Verificando-se do laudo pericial e das explicações prestadas que os Senhores Peritos indicados pelo Tribunal explicaram globalmente melhor e mais aprofundadamente no confronto com o que constava no acórdão arbitral, os critérios de valorização da parcela que foram unanimemente adotados, não se vislumbrando que se verifique algum fundamento para a sua pretendida alteração, mormente por existir algum erro, contradição no critério ou ilegalidade na valorização, que determine a adoção de critério diverso, concretamente o proposto pela entidade Expropriada, louvando-se na essência, no acórdão arbitral onde tais cálculos foram afirmados mas sem que ali tivesse sido produzida fundamentação convincente que os suportasse, nada há a censurar ao acolhimento daquele pela sentença recorrida”.

Não obstante a fundamentação da sentença e do laudo maioritário que expressamente acolhe, o recorrente insurge-se contra a avaliação e o decorrente valor indemnizatório fixado. Pensamos, no entanto, que só parcialmente tem razão. Com efeito, mostra-se pericialmente explicado o índice de ocupação da parcela, a qualidade ambiental (10%), a existência de sobrecarga, a percentagem do valor de construção e o risco construtivo. Aliás, as dúvidas suscitadas pelo expropriado, justificativas do seu pedido de esclarecimento, obtiveram resposta dos peritos que subscreveram o laudo maioritário. Com efeito [e transcrevemos] constam dos autos as respostas aos esclarecimentos pretendidos, e que transcrevemos:
“1 - Como é consabido os PDM, como elementos diretores da ocupação do solo em cada Município, tratam cada zona de forma diferenciada, precedido dos respetivos estudos urbanísticos por técnicos credenciados. Ora, se o índice de ocupação para a parcela está previsto no PDM de 1,0 m2/m2, porque só calculam o índice de 0,80 m2/m2 e porque não 0,90 ou 0,95 m2/m2?
R - Os PDM estabelecem, de um modo geral, índices máximos para as diferentes tipologias de ocupação do solo que estabelecem. Estabelecem também, e normalmente com caráter de primazia que as novas operações urbanísticas se devem conformar com as caraterísticas da envolvente, quer nas cérceas quer nos alinhamentos. Os Peritos ao estabelecerem o índice adequado para a parcela tiveram em conta as caraterísticas da envolvente, daí o índice de 0,80m2/m2, que se calculou como índice médio da envolvente.
3 - Se a parcela é dotada de todas as infraestruturas possíveis e previstas no CE., porquê a redução no item 6 do art. 26 para 10 %? Que falta à parcela para atingir outra percentagem superior?
R - O n.º 6 do art. 26 refere-se à localização e qualidade ambiental. O item das infraestruturas é o n.º 7 do artigo 26, onde os peritos fixaram o máximo admitido de 10%, considerando a existência de todas as infraestruturas.
4 - Consideram especulativa e não coincidente com a realidade o fator de 22% que é aplicado na avaliação fiscal? Ou este fator está mal aplicado?
R - O fator de 22% do CIM – artigo 45.º, é um índice num leque de valores entre os 15% e os 45%. Ou seja, os 22% não chegam sequer a metade (50%) do valor máximo previsto. Os Peritos, ao fixarem o valor do solo em 20%, num máximo de 25%, consideraram uma percentagem de 80% do valor máximo.
5 - Na parcela expropriada, quantas habitações poderiam ser construídas, e quantas mais pessoas poderiam vir a ocupá-la?
R - A quantidade de habitações que poderiam ser construídas na parcela, e o número de pessoas que as poderiam habitar, dependeria da vontade do seu proprietário e da tipologia das habitações.
6 - Foram verificar a capacidade das infraestruturas existentes na zona e para quantas pessoas foram dimensionadas? 7 - Quais são as infraestruturas que ficam em sobrecarga? 8 - E quais são, então, as obras necessárias para afastar essa sobrecarga?
R - As infraestruturas foram inspecionadas no local e verifica-se a necessidade de prolongar as infraestruturas existentes no local para poder aproveitar a globalidade do terreno para o seu aproveitamento urbanístico.
9 - Para a adoção de 10% do fator de risco do item 10 do art. 26 do CE quais foram os fatores que utilizaram para esse valor ?
R - O fator de risco é um fator inerente á atividade construtiva e contempla, desde os riscos existentes durante a construção, de acidentes, intempéries, preços dos materiais, até aos riscos de comercialização, com as variações do mercado imobiliário, dificuldades no crédito e outros.
10 - Se calculam o valor de construção em 680,00€/m2 já deduzido de 15% da área útil da Portaria 353/2013 de 4/12, porque no item 4.1.1 voltam a aplicar sobre esse valor 0,80m2?
R - No item 4.4.1, multiplicou-se o custo da construção pelo índice de construção considerado de 0,80m2/m2”.

Mas, como dissemos anteriormente, entendemos que o apelante tem parcial razão no seu desacordo. Referimo-nos à percentagem de 25%, considerada pelos peritos como “reforço das infraestruturas existentes” (artigo 26, n.º 9 do CE). O perito indicado pelo recorrente considerou que, uma vez que a rua ... é uma zona “com todas as infraestruturas recentes e não será uma nova construção do mesmo tipo (moradia) que vai desequilibrar a situação das infraestruturas (...) não é aceitável nem justificável a aplicação de qualquer %”. Acresce, relevantemente, que, nos esclarecimentos supra transcritos, e a este propósito, dizem os peritos subscritores do laudo que a sentença acolhe: “As infraestruturas foram inspecionadas no local e verifica-se a necessidade de prolongar as infraestruturas existentes no local para poder aproveitar a globalidade do terreno para o seu aproveitamento urbanístico” (sublinhado nosso).

Como refere Salvador da Costa[7], o que este preceito prevê é, no cálculo do valor do terreno, a consideração do custo provável resultante de, atento o aproveitamento considerado para a parcela, haver necessidade de reforço das infraestruturas existentes, em razão da sobrecarga que aquele aproveitamento impõe. Tem de haver uma incompatibilidade entre as infraestruturas existentes e as necessárias à implementação do novo aproveitamento da parcela, pois o preceito em causa exige, “comprovadamente, uma sobrecarga incompatível” com as já existentes infraestruturas. E, como dizem os peritos, a necessidade que há é de prolongar as infraestruturas, não, ou daí não resulta, a necessidade do seu reforço.

Assim, o recurso mostra-se procedente, na parte em que deve ser desconsiderada a percentagem de 25% para “reforço das infraestruturas existentes”, mantendo-se no mais o valor considerado no laudo maioritário e na sentença que ao mesmo atendeu, integralmente.

Assim, o valor da parcela do terreno será de (680 x 0,8 x 0,2 x 0,9 x 820) 80.294,40.

As custas do recurso, atento o vencimento e decaimento, são da responsabilidade de recorrente e recorrida, na respetiva proporção.

IV – Dispositivo
Pelo exposto, acorda-se na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto em julgar parcialmente procedente o presente recurso de apelação e, em conformidade, no mais mantendo o decidido [“o montante da indemnização a atualizar de acordo com os índices de preços do consumidor, com exclusão da habitação, fornecidos pelo INE, relativamente ao local da situação do bem ou da sua maior extensão da forma que na fundamentação da sentença se descreveu”] fixa-se em 80.294,40€ (oitenta mil, duzentos e noventa e quatro euros e quarenta cêntimos) o justo valor da parcela.
Custas do recurso pelo apelante e pelo apelado, na proporção do respetivo decaimento.

Porto, 23.05.2022
José Eusébio Almeida
Carlos Gil
Mendes Coelho
______________
[1] Com a seguinte motivação: “A decisão sobre a matéria de facto teve na sua base os documentos e perícias existentes nos autos. Tiveram-se em conta a certidão predial, a certidão matricial e as plantas constantes dos autos. No mais, no que à descrição da parcela concerne, teve-se em conta a vistoria a.p.r.m. e o relatório pericial, unanimemente subscrevido pelos Srs. peritos indicados pelo tribunal e pelas partes, que assim, não merece qualquer reserva, demostrando a imparcialidade e a competência técnica dos seus subscritores. Valendo-se o tribunal, para prova dos factos 26 a 37, particularmente do relatório pericial, nessa parte unanimemente subscrito por todos os Srs. peritos. Quanto ao facto 38 não se julga suficiente para a sua prova a junção dos documentos que acompanham o recurso do expropriado já que, desacompanhados de qualquer outra prova, não se consegue aferir das suas fontes e fiabilidade. Nenhuma prova se fez sobre o facto 39”.
[2] Por maioria, os peritos atribuem 20%, nos termos do disposto n.ºs 6 (10%) e n.º 7 (10%: 1.5% “acesso rodoviário”; 0,5% “passeios”; 1% “rede de abastecimento de água”; 1,5% “rede de saneamento”; 1% “rede de distribuição de energia elétrica”; 0,5% “rede de drenagem de águas pluviais”; 2% “estação depuradora em ligação com a rede de coletores de saneamento com serviço junto à parcela”, 1% “rede de distribuição de gás” e 1% “rede elétrica”] do artigo 26 do CE.
[3] Como consta do mesmo laudo, o perito indicado pelo recorrente considerou: “ – Preço da construção: €680,00 m2; - índice de construção: 1.00 m2/m2: - n.º 6 e 7 do Art. 26 do CE: 22% [“12% do n.º 6 e 10% do n.º 7]; n.º 10 do Art. 26 do CE: 7,5%. Donde resulta: 680 x 1m2/m2 x (1-0,075) – 138,38€ x 820 – 133.471,602”.
[4] Fernanda Paula Oliveira, Direito do Urbanismo – Do Planeamento à Gestão – 4.ª Edição Atualizada e Ampliada, AEDREL, 2021, pág. 222.
[5] Fernando Alves Correia, Manual de Direito do Urbanismo, Volume II, Almedina, 2010, págs. 427 e 431.
[6] Código das Expropriações e Estatuto dos Peritos Avaliadores, Anotados e Comentados, Almedina, 2010, pág. 368.
[7] Código das Expropriações... cit., págs. 184/185.