RECURSO DE ACÓRDÃO DA RELAÇÃO
DUPLA CONFORME
REJEIÇÃO PARCIAL
PENA ÚNICA
MEDIDA DA PENA
Sumário


I - Face ao disposto nos art. 400.º, n.º 1, al. f) e 432.º, n.º 1, al. b), do CPP, o acórdão do tribunal da Relação é irrecorrível na parte em que a sua decisão confirmou a condenação da 1.ª instância (princípios da dupla conforme condenatória e da legalidade), quanto aos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão.
II - Esse juízo confirmativo garante o duplo grau de jurisdição consagrado pelo art. 32.º, n.º 1, da CRP, não havendo violação do direito ao recurso, nem dos direitos de defesa do arguido (art. 32.º, n.º 1 e 20.º, n.º 1, da CRP).
III - Tal irrecorribilidade determina que, no âmbito das penas parcelares inferiores a 8 anos, as questões que lhes dizem respeito, sejam questões de facto, questões processuais, questões de direito (como sucede, nomeadamente, com as relativas ao enquadramento jurídico dos factos, sobre as quais o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa já se pronunciou e decidiu definitivamente, mas que no recurso para o STJ o recorrente volta a colocar) não podem ser conhecidas, nem sindicadas por este STJ.

Texto Integral





Proc. n.º 1/20.2PJSNT.L1.S1

Recurso

    

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça

I-Relatório

1. No processo comum (tribunal coletivo) n.º 1/20.... do Juízo Central Criminal ..., Juiz ..., comarca ..., por acórdão de 21.10.2021, o arguido AA foi, além do mais (no que aqui interessa),

- condenado:

a. pela co-autoria material de um crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 203.°, n.° 1, e 204.°, n° 1, al. h), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e (6) meses de prisão (Nuipc 10/20);

b. pela co-autoria material de um crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 203.°, n.° 1, e 204.°, n° 1, al. h), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e (6) meses de prisão (Nuipc 14/20);

c. pela co-autoria material de um crime de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 203.°, n.° 1, 204.°, n° 1, al. h), e n.° 2, al. g), 22.°, 23.° e 73.°, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e (6) meses de prisão (Nuipc 27/20);

d. pela co-autoria material de um crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 203.°, n.° 1, 204.°, n° 1, al. h), e n.° 2, al. g), do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão (Nuipc 36/20);

e. pela co-autoria material de um crime de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 203.°, n.° 1, 204.°, n° 1, al. h), e n.° 2, al. g), 22.°, 23.° e 73.°, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e (6) meses de prisão (Nuipc 89/20);

f. pela co-autoria material de um crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 203.°, n.° 1, 204.°, n° 1, al. h), e n.° 2, alíneas e) e g), do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão (Nuipc 218/20);

g. pela co-autoria material de um crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 203.°, n.° 1, 204.°, n° 1, al. h), e n.° 2, al. g), do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão (Nuipc 264/20);

h. pela co-autoria material de um crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 203.°, n.° 1, 204.°, n° 1, alíneas f) e h), e n.° 2, al. g), do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão (Nuipc 300/20);

i. pela co-autoria material de um crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 203.°, n.° 1, 204.°, n° 1, al. h), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão (Nuipc 548/20);

j. pela co-autoria material de um crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 203.°, n.° 1, 204.°, n° 1, al. h), e n.° 2, al. g), do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão (Nuipc 568/20);

k. pela co-autoria material de um crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 203.°, n.° 1, 204.°, n° 1, al. h), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão (Nuipc 818/20);

i. em cúmulo jurídico das penas aplicadas foi condenado na pena única de 10 (dez) anos de prisão;

- e, absolvido, no mais que lhe era imputado na pronúncia deduzida nos autos.

2. Inconformado com essa decisão, recorreu o mesmo arguido AA (assim como o co-arguido BB, que tinha sido condenado na pena única de 6 anos de prisão), para o Tribunal da Relação ..., o qual por acórdão de 25.01.2022, negou provimento aos recursos dos dois arguidos, confirmando o acórdão recorrido.

3. Inconformado com essa decisão, veio o arguido AA interpôs recurso para este Supremo Tribunal de Justiça, apresentando as seguintes conclusões:

1. Da panóplia de condenações de que o arguido recorrente AA foi alvo, questionamos em particular, aquelas situações em que foi condenado pelas qualificativas das alíneas h) do n.º 1 do art.º 204º e de igual forma as situações em que foi condenado pela alínea g) do n.º 2 do mesmo normativo.

2. De facto, só de uma interpretação rebuscada do texto legal daquelas alíneas, e /ou de uma interpretação mega extensiva do teor das mesmas, se poderá considerar como correcta e assertiva a subsunção dos factos ao direito, constante do acórdão de que ora se recorre.

3. Com efeito, se convocarmos o conceito de bando e tentarmos encaixar os factos pelos quais o arguido foi condenado no âmbito da globalidade da sua actuação criminosa, no âmbito do normativo referido, doravante, todas e quaisquer actuações num quadro de um crime do art.º 203º do Cód. Penal também poderão ser subsumidas à alínea h) do n.º 1 do art.º 204.º

4. Impugnamos igualmente a subsunção dos factos dados como provados ao direito que permite estribar condenações por furto qualificado nos termos da alínea g) do n.º 2 ainda e sempre do art.º 204º do Cód. Penal.

5. Quer o acórdão da 1ª instância, quer o douto acórdão do Tribunal da Relação ..., no elenco dos factos dados como provados concedem que o arguido durante a pendencia da ocorrência dos ilícitos – furtos qualificados – auferia proventos do exercício de actividades licitas.

6. Tal realidade é na nossa perspectiva incompaginavel com fazer da prática criminosa modo de vida.

7. Destes enquadramentos legais com os quais estamos em total desacordo, resultam quantuns penais para as penas parcelares de per si insuflados.

8. E, ainda que isso não sucedesse no que tange a essas penas parcelares, a aplicação ao arguido, pela comissão de furtos qualificados, de componentes de automóveis e materiais de construção civil, não pode ser traduzida numa pena de prisão com dois dígitos.

9. Sob pena de, e em termos de justiça relativa, para quem pratique uma pluralidade de crimes de roubo, vide a nobreza e a importância dos bens jurídicos que a punição deste ilícito visa tutelar, poderia em nome dessa justiça relativa, “rebentar” com os limites máximos das penas a aplicar pela prática de ilícitos desta natureza.

10.O mesmo sucederia a indivíduos que praticassem homicídios dolosos e/ou trafico de substâncias estupefacientes ilícitas.

11. Há, na nossa perspectiva linhas que não podem em circunstância alguma ser ultrapassadas na determinação do quantum penal concreto de cada pena.

12.E, se, o bom senso, é indiscutivelmente uma dessas linhas, a outra, vem traduzida em forma de lei no n.º 1 do art.º 71º do Cód. Penal.

13.Assim, pedimos a V. Exc., que diminuindo o peso da pena única de dez anos cominada ao recorrente AA, façam com que tal pena possa ser justa.

Normas violadas: Art. 40º, 77º do Cód. Penal

Art. 204º n.º 1 alínea h) e alínea g) do n.º 2 CP

Termina pedindo que o recurso seja julgado procedente.

4. O recurso foi admitido, por despacho de 8.03.2022, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo.

5. O Ministério Público junto do Tribunal da Relação respondeu ao recurso, apresentando as seguintes conclusões:

1 - O Recorrente, AA, vem interpor o presente recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão proferido em 25 de janeiro de 2022 pela ... Secção do Tribunal da Relação ... que, negando provimento ao recurso por ele interposto, confirmou integralmente o acórdão condenatório proferido pelo Juízo Central Criminal ....

2 - Com o presente recurso, o Recorrente vem apresentar perante o Supremo Tribunal de Justiça motivação e conclusões praticamente idênticas às que apresentara perante o TR.…, no recurso que interpôs do acórdão proferido pela 1ª Instância.

3 - Com o que o Arguido/Recorrente não vem suscitar ao Venerando Supremo Tribunal de Justiça quaisquer questões que não tenha já colocado e sido objeto de conhecimento e decisão no Tribunal da Relação, o que integra "falta" de motivação conducente à rejeição do recurso, nos termos do disposto nos arts. 412° n.° 1, 414° n.° 2 e 420° n.° 1 al. b), todos do C. de Processo Penal.

4 - Com o presente recurso, o Recorrente vem impugnar perante o Venerando Supremo Tribunal de Justiça a decisão do tribunal sobre a matéria de facto provada, invocando que o acórdão proferido pelo TR.… padece do vício do erro notório (erro esse que não se verifica e que o Recorrente nem sequer concretizou).

5 - Ora, conforme dispõe o art 434° do C. de Processo Penal, o Supremo Tribunal de Justiça conhece apenas matéria de direito, sendo as questões de facto decididas definitivamente pelo Tribunal da Relação.

6 - Assim, não pode constituir fundamento de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a aludida invocação do Recorrente de que o acórdão proferido pelo TR.… se encontra inquinado de vício de erro notório, o que constitui causa de rejeição da respetiva apreciação, nos termos dos arts. 414° n.° 2, primeira parte, e 420° n.° 1 al. b), do C. de Processo Penal.

7 - Invoca ainda o Recorrente que a pena de 10 anos de prisão aplicada é exagerada.

8 - Consideramos que o Recorrente não tem razão, pois não se alcança qualquer desproporcionalidade por excesso na aplicação da referida pena nem qualquer insuficiência na respetiva fundamentação.

9 - Na verdade, e como se vê da respetiva fundamentação, que é clara, congruente e abundante, o Tribunal da Relação ... considerou, com ponderação e bom senso, todas as circunstâncias suscetíveis de interferir na determinação da medida da pena, tendo valorado, na determinação da medida da pena, todas as circunstâncias que, não fazendo parte do crime, depunham a favor e contra o Arguido, tendo considerado os factos e a personalidade do agente.

10 - A pena aplicada (penas parcelares e pena única) mostra-se adequada, justa e proporcional, não deixando transparecer a violação de qualquer norma atinente à determinação da medida da pena, nem de qualquer princípio jurídico aplicável.

11 - Deve, pois, ser mantido o douto acórdão proferido pelo TR....

12 - Em face de todo o exposto, o presente recurso deve ser rejeitado; a não se entender assim, deverá ser julgado improcedente, confirmando-se o douto acórdão recorrido.

Termina, assim, pedindo a rejeição do recurso e, assim não se entender, ser julgado improcedente, confirmando-se o acórdão da Relação impugnado.

6. Subiram os autos a este Supremo Tribunal de Justiça e, o Sr. PGA emitiu parecer no sentido de concordar com a resposta apresentada na Relação, que o acórdão ali proferido pronunciou-se sobre todas as questões colocadas e que a pena única aplicada era ajustada e adequada, pelos motivos que indicou, devendo ser mantida, não merecendo provimento o recurso em apreciação.

7. No exame preliminar a Relatora ordenou que fossem cumpridos os vistos legais com o envio das peças processuais que fossem solicitadas, tendo-se realizado depois a conferência e, dos respetivos trabalhos, resultou o presente acórdão.

Cumpre, assim, apreciar e decidir.

II. Fundamentação

Factos


8. Resulta do acórdão da 1ª instância a seguinte decisão sobre a matéria de facto, que foi confirmado pelo Ac. do TR.… de 25.01.2022:

A) FACTOS PROVADOS

Discutida a causa, provaram-se os seguintes factos com relevância para a decisão final:

1. Pelo menos, entre início de Janeiro de 2020 e Julho de 2020, os arguidos apoderarem-se de componentes de partes de veículos, ferramentas e materiais de construção em locais onde ocorriam obras de construção, contra a vontade dos respectivos donos.

2. Os arguidos apoderaram-se de pneus, jantes, ópticas, retrovisores e para-choques de veículos, pelo menos, das marcas ..., ..., ... e ..., bem como materiais de construção, tais como cimentos, azulejos, ferramentas e outros, os quais os arguidos usavam em seu proveito, nomeadamente em veículos próprios ou de familiares.

3.Para execução de tais actos os arguidos faziam-se transportar em veículos vários, conduzidos pelo AA e seguindo o BB no lugar do “pendura”, nomeadamente, nos veículos marca:

ü ..., modelo ..., matrícula ..-JQ-.., de cor ... registada em nome de CC;

ü ..., modelo ..., matrícula ..-..-LT, registada em nome de BB;

ü ..., modelo ..., matrícula ..-VH-.., registada em nome de DD;

ü ..., modelo ..., matrícula ..-..-TU, modelo ..., de cor ..., pertença de BB.

4.A fim de escolherem os veículos e os locais de obras em construção, dos quais pretendiam retirar os componentes e objectos supramencionados, os arguidos aproveitavam o cair da noite.

5.Cerca das 19 horas, ambos saíam da residência do AA situada na Rua ..., ..., ..., ..., ... e este conduzia os veículos pelo menos até cerca das 4 horas do dia seguinte

6.Juntamente com o arguido AA seguia quase sempre o arguido BB.

7.Aliás, os arguidos circulavam nos veículos durante períodos, de tal forma longos, que acabavam por ter que abastecer o veículo nos postos de combustível que iam encontrando pelo caminho que percorriam

8.Deste modo, durante esses períodos, os arguidos circulavam por vários bairros residenciais, em velocidade lenta, o que lhes permitia observar os vários veículos que se encontravam estacionados e cujos componentes lhes interessassem e por eles fossem susceptíveis de serem retirados.

9.Igualmente observavam os locais onde se encontravam a decorrer obras, nomeadamente moradias, onde pudessem existir materiais dos quais se pudessem apropriar, nos casos em que necessitavam de tais materiais para si ou para outrem.

10.Iam munidos de ferramentas próprias para desapertar jantes e levantar os veículos de forma a retirarem pneus.

11.Caso não as tivessem, compravam-nas tal como sucedeu no dia 8 de Janeiro de 2020, cerca das 20h e 07m, no ..., em ..., onde os arguidos compraram um macaco hidráulico para o usarem logo de seguida num veículo.

NUIPC 4387/19.... (Apenso II)

12.No dia 5 de Dezembro de 2019, cerca das 2h50m, dois indivíduos não identificados, fazendo-se transportar numa viatura ..., modelo ..., de matrícula, de cor ..., dirigiram-se à Rua ..., em ....

13.Os referidos indivíduos sabiam bem que na referida artéria se encontrava estacionado o veículo ..., modelo ..., de matrícula ..-XO-.., na posse de EE e pertencente à empresa “A... SA”.

14.Pretendiam, assim, apoderar-se das rodas do veículo, cujo valor é de cerca de 4504,60 euros.

15.Chegados junto do veículo, pararam a viatura em que seguiam e dirigiram-se para o veículo de matricula ..-XO-...

16.Após, retiraram e fizeram suas as quatro rodas que colocaram no veículo ... puseram-se em fuga do local.

17.Ao procederem da forma descrita, agiram ambos conluiados e em conjugação de esforços e intentos, bem como deliberada, livre e consciente, com o intuito de fazerem suas as referidas rodas, bem sabendo que agiam contra a vontade do dono.

18. Bem sabiam que a suas condutas eram proibidas por lei.

NUIPC 10/20.... (Apenso III)

19. No dia 3 de Janeiro de 2020, cerca das 19h e 30m, o arguido AA e outro indivíduo não identificado, fazendo-se transportar na viatura ..., modelo ..., de cor ..., matrícula ..-JG-.., marca, conduzida pelo arguido AA, iniciaram uma volta por várias artérias a fim de visualizar veículos cujos componentes lhes interessassem.

20. Cerca das 22h22m passaram pela Rua ..., em ..., na qual demoraram cerca de dez minutos, observando os veículos que ali se encontravam.

21. Nessa altura viram o veículo de matrícula ... modelo ... ..., de matrícula ..-ZO-.., pertença de FF.

22. No dia 5 de Janeiro de 2020, entre as 2h48m e as 3h25m, AA e outro indivíduo não identificado, fazendo-se transportar na mesma viatura de viatura de matrícula ..-JG-.., marca ..., dirigiram-se à referida Rua ... em ....

23. Os arguidos sabiam que naquela rua estava estacionado o referido veículo de matricula ... modelo ... ..., de matrícula ..-ZO-...

24. Pretendiam apoderar-se das rodas do veículo, no valor de 2300 euros.

25. Chegados junto do veículo, pararam a viatura em que seguiam e dirigiram-se para o veiculo de matricula ..-ZO-...

26. De seguida retiraram e fizeram suas as quatro rodas, que colocaram no veículo em que se faziam transportar e puseram-se em fuga do local.

27. Ao procederem da forma descrita, agiram o arguido AA e o outro indivíduo conluiados e em conjugação de esforços e intentos, bem como deliberada, livre e consciente, com o intuito de fazerem suas as referidas jantes, bem sabendo que agiam contra a vontade do dono.

28. Agiram bem sabendo que a suas condutas eram proibidas por lei.

NUIPC 14/20.... (Apenso IV)

29. No dia 3 de Janeiro de 2020, após saírem da Rua ..., em ..., cerca das 22h35m, o arguido AA e outro indivíduo não identificado, sempre fazendo-se transportar na viatura de viatura de matrícula ..-JG-.., marca ..., modelo ..., de cor ..., conduzida pelo arguido AA, continuaram a percorrer várias artérias a fim de visualizar mais veículos, cujos componentes lhes interessassem.

30. Cerca das 23h e 15m entraram no Bairro ... em ... onde circularam durante alguns minutos observando os veículos que ali se encontravam.

31. Nessa altura e quando passavam na Praceta ... viram o veículo de matricula ..-XT-.., pertença de GG, que se encontrava estacionado na referida ....

32. De imediato decidiram ali voltar posteriormente e apoderarem-se das rodas do veículo no valor de 200 euros.

33. Assim, no 5 de Janeiro de 2020, pelas entre as 2h e 48m e as 3h e 25m, AA e outro indivíduo não identificado, fazendo-se transportar na mesma viatura de viatura de matrícula ..-JG-.., marca ... dirigiram-se à referida Praceta ....

34. Os arguidos já sabiam que naquela ... estava estacionado o referido veículo de matricula ..-XT-.. de 2013.

35. Pararam a viatura em que seguiam e dirigiram-se para o veiculo de matricula ..-XT-...

36. Chegados junto do veículo retiraram e fizeram suas as quatros rodas.

37. De seguida colocaram as rodas no veículo em que se faziam transportar e puseram-se em fuga do local.

38. Ao procederem da forma descrita, agiram os arguidos conluiados e em conjugação de esforços e intentos, bem como deliberada, livre e consciente, com o intuito de fazerem suas as referidas rodas, bem

sabendo que agiam contra a vontade do dono.

39. Agiram bem sabendo que a suas condutas eram proibidas por lei.

NUIPC 27/20.... (Apenso V)

40. No dia 9 de Janeiro de 2020, cerca das 01h35m, AA e BB, fazendo-se transportar na viatura, marca ..., modelo ..., já anteriormente descrita, dirigiram-se à Rua ... em ....

41. Os arguidos iam munidos de um macaco hidráulico que tinham adquirido, no “HH”, em ..., no dia 8 do mesmo mês, pelas entre as 20h e as 20h30m, com o fim de o utilizarem nessa noite para retirarem rodas de veículos.

42. Os arguidos sabiam que na Rua ... em ... estava estacionado o veículo de matricula ..-HS-.. marca ..., modelo ..., pertença de II.

43. De imediato decidiram apoderar-se das rodas do veículo, no valor de 3444 euros.

44. Chegados junto do veículo, pararam a viatura em que seguiam e dirigiram-se para o referido veiculo.

45. De seguida retiraram as porcas que prendem as rodas e, quando se propunham retirar as rodas, surgiu o ofendido GG que gritou, pelo que os suspeitos, acto contínuo, introduziram-se no veículo ... e puseram-se em fuga do local sem conseguirem concretizar os seus intentos.

46. Ao procederem da forma descrita, agiram os arguidos deliberada, livre e conscientemente, bem como agiram conluiados e em conjugação de esforços e intentos, com o intuito de fazerem suas as referidas rodas, bem sabendo que agiam contra a vontade do dono.

47. Os arguidos só não lograram apoderarem-se das referidas jantes pelo facto de ter surgido o ofendido GG.

48. Bem sabiam que as suas condutas eram proibidas por lei.

NUIPC 36/20.... (Apenso VI)

49. No dia 19 de Janeiro de 2020, cerca das 03h30m, AA e BB, fazendo-se transportar na viatura ... já descrita, dirigiram-se à Calçada ..., em ....

50. Os arguidos sabiam que naquela rua estava estacionado o veículo de matricula ..-ZB-.., marca ..., pertença de JJ.

51. Pretendiam apoderar-se dos dois “espelhos retrovisores” do veiculo, no valor de 938 euros.

52. Chegados junto do veículo, pararam a viatura em que seguiam e dirigiram-se para o referido veiculo.

53. De seguida desmontaram os “espelhos retrovisores” da viatura.

54. Na posse de tais objectos introduziram-se na viatura ... e saíram do local.

55. Ao procederem da forma descrita, agiram ambos de forma deliberada, livre e consciente, bem como conluiados e em conjugação de esforços e intentos, com o intuito de fazerem seus os referidos espelhos retrovisores, bem sabendo que agiam contra a vontade do dono.

56. Bem sabiam que as suas condutas eram proibidas por lei.

NUIPC 89/20.... – Apenso VII

57. No dia 19 de Janeiro de 2020, pelas 4h44m, AA e BB, fazendo-se transportar na viatura marca ..., modelo ..., de matrícula ..-JG-.., dirigiram-se à Rua ... em ....

58. Os arguidos sabiam que naquela rua, junto ao nº 28, estava estacionado a viatura marca ... de matrícula ..-AU-.. pertença de KK.

59. O valor da viatura era superior a 1000 euros.

60. Pretendiam apoderar-se da viatura.

61. Chegados junto da viatura ... rebentaram com a fechadura da porta.

62. Após entrarem foi accionado um alarme sonoro pelo que, com receio de serem interceptados, puseram-se em fuga do local sem conseguirem concretizar os seus intentos.

63. Ao procederem da forma descrita, agiram ambos os suspeitos de forma deliberada, livre e consciente, bem como conluiados e em conjugação de esforços e intentos, com o intuito de fazerem sua a viatura acima referida, bem sabendo que agiam contra a vontade do dono.

64. Bem sabiam que a suas condutas eram proibidas por lei.

NUIPC 218/20.... – Apenso VIII

65. No dia 18 de Fevereiro de 2020, cerca das 22h e 50m, AA e BB dirigiram- se à Rua ..., em ....

66. Desta vez fizeram-se transportar no veículo ..., modelo ... de matrícula ..-VH-...

67. No n.º 40 da referida artéria existe uma obra de construção de uma casa com um estaleiro anexo à casa, vedado com painéis de madeira de forma a impedir que qualquer um ali entrasse.

68. A casa era pertença de LL e a obra estava a ser executada por MM.

69. Chegados ao local os arguidos arrombaram o painel da madeira colocado na porta existente nas traseiras da área anexa à casa ainda em construção e entraram.

70. Do seu interior retiraram e fizeram seus vários objectos.

71. Parte deles carregaram-nos ambos para a referida viatura marca ... a qual conduziram de seguida em direcção à residência do arguido AA sita em ..., na Rua ....

72. De seguida introduziram-se ambos numa outra viatura, sendo esta da marca ... modelo ... de matrícula ..-..-LT, conduzida novamente pelo arguido AA e dirigiram-se outra vez para o nº 40 da Rua ..., em ... a fim de carregarem o restante material que dali retiraram.

73. Assim, os arguidos apoderaram-se e fizeram seus os seguintes objectos:

Ø Uma marreta marca ..., no valor de 6 euros;

Ø Uma mala da marca ..., no valor de 45 euros;

Ø Três chaves “entorta ferros”, marca ..., no valor total de 45 euros;

Ø Dois martelos no valor total de 15 euros;

Ø Três turquesas no valor de 15 euros;

Ø Uma colher de pedreiro, no valor de 10 euros;

Ø Uma fita de 20 metros, marca ..., no valor de 32 euros;

Ø Quatro alicates de pressão, em “C”, no valor total de 75 euros;

Ø Dois grampos pequenos no valor total de 16 euros;

Ø Dois grampos grandes no valor total de 15 euros;

Ø Um grampo de aperto, no valor de 23 euros;

Ø Uma bomba de água subterrânea, no valor de 120 euros;

Ø Duas malas de ferramentas no valor de 70 euros;

Ø Duas espátulas no valor de 34 euros;

Ø Uma liçosa no valor de 25 euros;

Ø Três extensões no valor total de 180 euros; e,

Ø Quinze varões de ferro no valor de 45 euros;

74. Os arguidos apoderaram-se ainda de um gerador eléctrico marca ..., modelo ... de cor ..., no valor de 3444 euros, na altura alugado à empresa “F..., Ldª”, da qual é legal representante LL, dona da casa em construção.

75. Ao procederem da forma descrita, agiram os arguidos de forma deliberada, livre e consciente, bem como conluiados e em conjugação de esforços e intentos, com o intuito de fazerem seus todos os objectos que estivessem no interior do espaço fechado acima referido e por eles fossem susceptíveis de serem transportados nos referidos veículos, bem sabendo que agiam contra a vontade do respectivo dono.

76. Bem sabiam que tal conduta era proibida por lei.

NUIPC 264/20.... (Apenso IX)

77. No dia 28 de Fevereiro de 2020, entre as 20h e as 21h e 30m, AA e BB, fazendo-se transportar na viatura marca ... de matrícula ..-JG-.., dirigiram-se à Rua ..., em ....

78. Os arguidos sabiam que naquela rua estava estacionado o veículo de matricula ..-NB-.., marca ..., modelo ..., pertença de NN.

79. Pretendiam retirar, e fazer seus, o para-choques frontal, óptica esquerda frontal e chapa de matrícula frontal, objectos estes no valor de 3448,90 euros.

80. Os arguidos tinham o intuito de se apoderarem de tais peças a fim de as colocarem no veículo em que seguiam, no qual tais peças estavam danificadas, o que aliás veio a acontecer.

81. Chegados junto do veículo, pararam a viatura em que seguiam.

82. De seguida, enquanto o arguido AA aguardava na viatura em vigilância, o arguido BB dirigiu-se para o veiculo acima descrito, no qual desmontou os objectos supra descritos que colocou na viatura onde o AA aguardava, após o que saíram ambos do local.

83. Ao procederem da forma descrita, agiram os arguidos conluiados e em conjugação de esforços e intentos, com o intuito de fazerem seus os referidos objectos, bem sabendo que agiam contra a vontade do dono.

84. Assim, agiram deliberada, livre e consciente, bem sabendo que a suas condutas eram proibidas por lei.

NUIPC 300/20.... (Apenso X)

85. No dia 6 de Março de 2020, cerca das 22h e 10m, fazendo-se transportar na viatura marca ... de matrícula ..-JG-.., os arguidos AA e BB, dirigiram-se à Rua ... em ....

86. Nos lotes ... e ... da referida rua estavam a ser efectuadas, por OO, obras de construção de duas moradias.

87. Os arguidos pretendiam apoderar-se de todos os materiais de construção que encontrassem e por eles fossem susceptíveis de serem transportados no veículo acima referido.

88. Chegados junto às referidas moradias pararam a viatura em que seguiam e entraram.

89. Do seu interior retiraram, e fizeram seus, alguns azulejos, réguas e sacos de cimento.

90. Na posse de tais objectos, os arguidos colocaram-nos no veículo e saíram do local.

91. Posteriormente e já entre as 22h e 56m e as 23h e 13 m do mesmo dia, o AA e o BB, fazendo-se transportar no mesmo veículo, novamente voltaram às moradias acima referidas.

92. Mais uma vez entraram e, do seu interior, retiraram mais azulejos e réguas que ali se encontravam e eram susceptíveis de serem transportados no veículo, os quais levaram para o veículo.

93. Pouco mais tarde, cerca das 23h e 37m, novamente os arguidos voltaram à referida obra da qual retiram mais materiais de construção, nomeadamente sacos de cimento e mosaicos, dos quais se apoderaram, colocando-as no interior da viatura ... onde seguiam.

94. Os materiais retirados pelos arguidos - nomeadamente 52m2 de azulejos e 15 réguas –, no valor total de 1609,84 euros, foram descarregados pelos arguidos em casa do arguido AA.

95. Ao procederem da forma descrita, agiram sempre os arguidos de forma deliberada, livre e consciente, bem como conluiados e em conjugação de esforços e intentos, com o intuito de fazerem seus todos os objectos que estivessem no interior das casas acimas referida e por eles fossem susceptíveis de serem transportados no referido veículo, bem sabendo que agiam contra a vontade do dono e que as suas condutas eram proibidas por lei.

NUIPC 412/20.... (Apenso XI)

96. No dia 11 de Março de 2020, cerca das 20h e 19m, AA e BB, dirigiram-se à Rua ... em ... (fls. 455 e 456 do processo principal).

97. Os arguidos faziam-se transportar na viatura marca ..., de matrícula ..-JG-...

98. No n.º 20 da referida rua existe uma moradia pertença de PP.

99. Na moradia estavam a decorrer obras.

100. Os arguidos pretendiam apoderar-se de todos os materiais de construção que ali se encontrassem e por eles fossem susceptíveis de serem transportados.

101. Chegados junto à referida moradia, pararam a viatura em que seguiam.

NUIPC 548/20.... – Apenso XII

102. No dia 9 de Maio de 2020, cerca das 00h e 10m, AA e um indivíduo não identificado, fazendo-se transportar numa viatura marca ..., modelo ..., de matrícula ..-JG-.., dirigiram-se ao cruzamento da Rua ... com a Rua ..., em ....

103. Ambos sabiam que naquele local se encontrava estacionada a viatura de matrícula ..-..-ZX, marca ..., pertença de QQ.

104. Pretendiam apoderar-se do para-choques frontal da viatura e faróis de nevoeiro.

105. Chegados junto do veículo, pararam a viatura em que seguiam e dirigiram-se para o referido veiculo.

106. De seguida e utilizando uma serra não identificada, arrancaram o para-choques do veículo, as grelhas frontais, sensores de estacionamento e dois faróis de nevoeiro, no valor de, pelo menos, 1850 euros.

107. Na posse de tais objectos, introduziram-se novamente no veículo ... e puseram-se em fuga do local.

108. Ao procederem da forma descrita, agiram o arguido AA e o outro indivíduo de forma deliberada, livre e consciente e também em conjugação de esforços e intentos, bem como de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que agiam contra a vontade do dono e que a sua conduta era proibida por lei.

NUIPC 568/20.... (Apenso XIII)

109. No dia 13 de Maio de 2020, cerca das 23h e 50m, AA e BB dirigiram-se à Rua ..., em ..., fazendo-se transportar na já referida viatura marca ....

110. Os arguidos sabiam que ali se encontrava estacionado o veículo ..., de matricula ..-..-ZC pertença de RR.

111. Chegados junto do veículo, arrancaram toda a parte frontal da viatura e apoderaram-se do para-choques frontal, da grelha frontal e ainda de um farol de nevoeiro, tudo no valor de 450 euros, os quais fizeram seus.

112. Ao procederem da forma descrita agiram ambos deliberada, livre e consciente, conluiados e em conjugação de esforços, com o intuito de fazerem seus tais objectos e bem sabendo que as suas condutas eram proibidas por lei.

NUIPC 818/20.... (Apenso XIV)

113. No dia 3 de Julho de 2020, cerca das 02h, os arguidos AA e outro indivíduo não identificado, fazendo-se transportar no veículo ..., de matrícula ..-..-TU, dirigiram-se à Alameda ..., ....

114. Este veículo ... é pertença do arguido BB.

115. O arguido AA e o outro indivíduo sabiam que naquela artéria estava estacionada a viatura marca ..., modelo ..., de matrícula ..-XS-.., pertença de SS e pretendiam apoderar-se das rodas e do limpa-para-brisas da viatura, no valor de 700 euros.

116. Chegados junto do veículo, pararam a viatura em que seguiam e dirigiram-se para o referido veiculo.

117. De seguida, retiraram deste o limpa para-brisas e três das rodas.

118. Quando se preparavam para retirar a quarta roda, ouviu-se um estrondo no local, pelo que o arguido e o outro indivíduo pegaram nas rodas e no limpa para-brisas que já tinham em seu poder, colocaram-nos dentro do veículo ... e puseram-se em fuga do local, sem conseguirem retirar a quarta roda do lado dianteiro direito.

119. Ao procederem da forma descrita, o arguido e o outro indivíduo agiram deliberada, livre e conscientemente, bem como agiram conluiados e em conjugação de esforços e intentos, com o intuito de fazerem seus os referidos objectos, bem sabendo que agiam contra a vontade do dono.

120. Bem sabiam que as suas condutas eram proibidas por lei.

BUSCAS

121. Foram realizadas buscas às residências de ambos os arguidos, tendo sido encontrados os seguintes objectos:

Na residência sita na Rua ..., ..., ...

PISO INFERIOR

No quarto do arguido BB:

Ø Um para-choques de uma viatura de marca ..., de cor ... localizada por cima de um estrado da cama;

Ø Uma televisão de marca ..., com o número de série intencionalmente rasurado, localizada no chão do quarto;

Na despensa:

Ø Uma prancha hoverboard de cor ..., com o número de série intencionalmente rasurado, localizado na parte inferior da dispensa;

Uma aparafusadora da marca ... de cor ..., localizada na prateleira central;

Ø Dois espelhos retrovisores pertencentes a uma viatura ainda por apurar, localizados na prateleira central;

Ø Um difusor traseiro, pertencente a uma viatura ainda por apurar, localizado na despensa;

Ø Uma serra eléctrica tico-tico, de marca ..., modelo ..., localizada no chão;

Ø Uma rebarbadora da marca ..., lote ..., localizada no chão;

Na sala principal:

Ø Um vidro do pilar C, de uma viatura ..., localizado junto ao sofá;

Ø Uma arma de classe G, do tipo pressão de ar da marca ..., modelo ..., localizada junto ao móvel aparador;

Ø Duas grelhas frontais de uma viatura ..., localizadas junto ao sofá;

Ø Uma consola de videojogos da marca ..., modelo ..., com o ...-CE... localizada no interior do móvel aparador;

Ø Uma consola de videojogos da marca da marca ..., modelo ..., com o número de série ...61­- CE... localizada no interior do móvel aparador;

Ø Uma consola de videojogos da marca ..., modelo ..., com o ...-CE... localizada no interior do móvel aparador;

Ø Uma consola de videojogos da marca da ..., modelo ..., sem número de série visível;

Ø Um auto-rádio da marca ..., com o número de série ...81, localizadas junto ao sofá;

Ø Um computador portátil, da marca ..., de cor ..., modelo ..., com o número de série ..., localizado no interior do móvel aparador;

Ø Um computador portátil da marca ..., de cor ..., modelo ..., com o número de série ..., localizado no interior do móvel aparador;

Ø Um computador portátil da marca ..., de cor ..., modelo ..., com o número de série ..., localizado no interior do móvel aparador;

Ø Uma consola de videojogos da marca da ..., modelo ..., com o número de série ...57, localizada no interior do móvel aparador;

Ø Uma consola de videojogos da marca da ..., modelo ..., com o número de série ...33, localizada no interior do móvel aparador;

Ø Uma consola de videojogos da marca da ..., modelo ... com o número de série ...73 localizada no interior do móvel aparador.

Na cozinha:

Ø Um medidor a laser da marca ..., modelo ..., com o número de série ...85, localizado em cima do móvel despenseiro;

Ø Um tablet da marca ..., modelo ... com o número de série ..., com capa, localizado no móvel aparador na cozinha;

Ø Documentação referente a diversas viaturas ... (constante do anexo documentação) localizado no móvel aparador na cozinha;

Ø Um tablet da marca ..., modelo ... com o número de série ..., sem capa, localizado no móvel aparador na cozinha;

Anexo:

Ø Três portas interiores em madeira de cor ..., localizadas no interior da sala de arrumos;

Ø Uma rebarbadora desprovida de bateria, da marca ..., localizadas no interior da sala de arrumos;

Ø Um termoacumulador com capacidade para 97 litros com o número de série ...59, localizado no interior da sala de arrumos;

Ø Um chuveiro de duche, localizado no interior da sala de arrumos;

Ø Um alicate de cravar tubagem, localizado no interior da sala de arrumos

No Logradouro (páteo exterior entre o anexo e a casa principal):

Ø Uma régua de alumínio;

Ø Um martelo pneumático, da marca ..., modelo ...;

Ø Um martelo pneumático, com a inscrição Special Edition, modelo ...;

Ø Um martelo pneumático, de marca ..., de cor ...;

Ø Um maçarico da marca ..., com a respectiva mangueira e redutor de pressão;

Ø Um martelo pneumático, de marca ..., modelo ...;

Ø Vinte e nove peças de azulejo, rectangulares cinza escuro;

Ø Duas janelas em PVC, da marca ...;

Ø Três alicates de pressão em C;

Ø Dois grampos médios;

Ø Um grampo grande da marca ...;

Ø Um grampo grande;

Ø Uma caixa de ferramentas da marca ..., contendo diversas ferramentas;

Ø Cinco talochas;

Ø Um extensor em ferro de escora;

Ø Uma colher de pedreiro;

Ø Sessenta peças de azulejo de cor ...;

Ø Duas espátulas;

Ø Sete peças de azulejos (duas delas partidas de cor ...);

Ø Vinte e quatro peças de azulejos, de cor ...;

Ø Quatro azulejos tipo calacata;

Ø Um nível da marca ...;

Ø Seis latas de tinta acrílica para exterior;

Ø Oito rolos de tela asfáltica;

Ø Uma bomba submersível de cor ...;

Ø Vinte e nove peças de azulejo rectangular de cor ...;

PISO SUPERIOR

No quarto do arguido AA:

Ø Um Tablet de marca ... de cor ..., com o número de série: ... de 16 g e respectiva capa de protecção;

Ø Um tablet de marca ... de cor ...;

Um telemóvel da operadora ..., de cor ...;

Ø Um telemóvel de marca ... de cor ... e ...;

Ø Uma chave da viatura de marca ..., matricula ..-DJ-..;

Ø Uma cópia de certificado de matrícula do veículo de marca ..., com a matrícula ..-HR-..; e,

Ø Uma porta interior de madeira de cor ....

No quarto de TT (filho do arguido AA):

Ø Uma porta interior de madeira de cor ....

No exterior (junto ao muro da residência):

Ø Um pára-choques de cor ... de uma viatura de marca ....

No terraço da residência lado direito:

Ø Um macaco hidráulico de cor ...;

Ø Dois corrimões em inox;

Ø Um capôt de cor ... de um veículo de marca ...;

Ø Um amplificador de som de marca ...;

Ø Uma motobomba de cor ... de marca ... com o número ....

No vão debaixo das escadas de acesso ao piso superior da moradia:

Ø Uma Motosserra de marca ..., com o número ... de cor ...;

Ø Uma rebarbadora de marca ... com o número ...;

Ø Uma máquina de cortar azulejo de marca ..., modelo ...;

Ø Uma máquina para trabalhar madeira (tupia) de marca ... de cor ...;

Ø Uma bomba de água eléctrica (submersa) de marca ... de cor ...;

Ø Uma bomba de água eléctrica (submersa) de cor ...;

Ø Um secador/aquecedor eléctrico de marca ... de cor ...; e,

Ø Um Para-choques de cor ... de uma viatura marca ... modelo ....

122. Os arguidos tinham os objectos anteriormente descritos na sua posse sem justificarem a sua proveniência.

123. Os arguidos agiram sempre de forma deliberada livre e consciente, bem como de forma organizada e metódica, com tarefas distribuídas, de molde a conseguirem concretizar os factos a que se propunham, sempre sabendo que as suas condutas eram proibidas por lei.

124. Por sua vez o arguido AA agiu, não obstante já ter sido julgado e condenado em pena de prisão, que cumpriu parcialmente, por se ter apoderado de objetos alheios contra a vontade dos respectivos donos.

Mais se provou:

125. Os arguidos não indemnizaram total ou parcialmente as vítimas dos presentes autos até à presente data.

*

Mais se provou (arguido AA):

126. O arguido AA prestou declarações no final do julgamento, negando integralmente os factos dados como provados na parte que lhe respeitam.

127. O arguido encontra-se cautelarmente preso preventivamente à ordem dos presentes autos desde 21 de Agosto de 2020.

(CONDENAÇÕES CRIMINAIS)

128. No processo n.º 85/02...., mediante decisão transitada em julgado em 5 de Fevereiro de 2002, o arguido foi condenado na pena de multa, pela prática, em 10 de Janeiro de 2002, de um crime de condução sem habilitação legal;

A referida pena foi julgada extinta por prescrição.

129. No processo n.º 471/12...., mediante decisão transitada em julgado em 30 de Setembro de 2014, o arguido foi condenado na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa na execução por igual período de tempo, pela prática, em 23 de Agosto de 2007, de um crime de falsificação de documento.

A referida pena foi julgada extinta por prescrição.

130. No processo n.º 70/12...., mediante decisão transitada em julgado em 12 de Novembro de 2014, o arguido foi condenado na pena única de 2 anos e 9 meses de prisão, suspensa na execução por igual período de tempo, com sujeição a regime de prova, pela prática, em ? de ? de 2012, de um crime de furto qualificado, um crime de introdução em lugar vedado ao público e de um crime de detenção de arma proibida.

A referida pena foi julgada extinta, sem revogação da suspensão.

131. No processo n.º 477/12...., mediante decisão transitada em julgado em 4 de Dezembro de 2014, o arguido foi condenado na pena de multa, pela prática, em 6 de Maio de 2012, de um crime de receptação. A referida pena foi julgada extinta por prescrição.

132. No processo n.º 181/13...., mediante decisão transitada em julgado em 18 de Maio de 2015, o arguido foi condenado na pena única de 8 anos e 6 meses de prisão, pela prática, em 10 de Julho de 2013, de dois crimes de furto qualificado, um crime de roubo agravado e de um crime de detenção de arma proibida.

No âmbito do cumprimento desta pena, o arguido sofreu privação da liberdade a partir de 26 de Julho de 2013 e beneficiou da concessão da liberdade condicional desde dia 15 de Abril de 2019 até 25 de Janeiro de 2022.

(RELATÓRIO SOCIAL)

133. O arguido AA nasceu em .../.../1987.

134. AA nasceu no seio de uma família de características socioculturais específicas (comunidade ...), sendo o mais novo de uma fratria de três elementos.

135. Os pais separaram-se pouco tempo depois do seu nascimento, tendo a progenitora abandonado o agregado para iniciar um relacionamento com uma pessoa que não pertencia à comunidade ....

136. Esta situação terá conduzido a alguma rejeição por parte dos familiares, condicionando a relação da progenitora com os filhos.

137. O pai terá tido contactos com o sistema judicial, tendo cumprido pena de prisão efectiva.

138. O arguido informou que o progenitor nunca registou os filhos com o seu nome.

139. Neste contexto, o arguido e os irmãos ficaram a cargo da família alargada, tendo AA e a sua irmã mais velha sido criados pelos avós maternos, figuras que terão sido securizantes e que lhe terão propiciado um meio familiar afectuoso.

140. Os avós desenvolviam a actividade profissional de vendedores ambulantes, não havendo referência à existência de dificuldades económicas significativas.

141. AA frequentou o sistema escolar até aos 13 anos de idade, tendo concluído o 4.º ano de escolaridade; todavia, veio a abandonar a escola em idade precoce (contra a vontade da família) para iniciar actividade profissional na área da ..., como ....

142. Mais tarde concluiu o 6.º ano de escolaridade.

143. Aos 16 anos de idade, AA contraiu matrimónio (pela lei ...), tendo tido três filhos com aquela que continua a ser a sua companheira.

144. Inicialmente, o jovem casal ficou a residir em casa dos sogros do arguido; contudo, posteriormente, AA veio a adquirir um terreno, construindo aí uma habitação, passando a residir na morada indicada nos presentes autos.

145. Apresenta um percurso, aparentemente isento de problemas de consumos de drogas ou álcool.

146. AA trabalhou na área da ..., na ... (...) e na venda e lavagem de ..., tendo o seu percurso sido marcado pelo cumprimento de uma pena de prisão em momento anterior.

147. Antes de ser sujeito à medida de coação de prisão preventiva, AA coabitava com a família nuclear (companheira e três filhos) na residência habitual, sendo de referir que o filho mais novo do casal tem cerca de 15 meses de idade.

148. O ambiente familiar é descrito como positivo, sendo evidente a ligação afectiva do arguido à família.

149. Realizava trabalhos para um ... de ... (sem vínculo) na venda e lavagem de ..., auferindo um rendimento variável, mas que facilmente ultrapassava os mil euros mensais.

150. No local de trabalho é percecionado como alguém dedicado e trabalhador, não havendo aí registo de qualquer problema, pelo que quando a situação jurídica o permitir, AA poderá voltar àquele trabalho.

151. A companheira e os filhos do arguido beneficiavam de rendimento social de inserção que, segundo o reportado rondaria os 400 euros mensais, pelo que apresentariam uma situação económica capaz de fazer face às despesas de subsistência.

152. As repercussões da situação jurídica parecem ter incidido na esfera pessoal, associadas à privação da liberdade e ao afastamento físico dos familiares, denotando o arguido dificuldades em aceitar a sua situação jurídico-penal, não se revendo na situação de que é acusado.

Mais se provou (arguido BB):

153. O arguido BB prestou declarações no final do julgamento exclusivamente sobre a sua intervenção nos factos relativos ao NUIPC 818/20 – para a negar –, recusando-se a prestar declarações relativamente aos demais factos.

(CONDENAÇÕES CRIMINAIS)

154. O arguido não apresenta quaisquer condenações averbadas no respectivo certificado de registo criminal.

(RELATÓRIO SOCIAL)

155. O arguido nasceu no dia .../.../1999.

156. BB é natural de ... - ....

157. O agregado do arguido é constituído pelos progenitores, sendo o pai vendedor ... e comerciante ..., e a mãe ajuda o marido na venda... e dedica-se às tarefas domésticas e a cuidar dos filhos.

158. BB faz parte de uma fratria de quatro elementos germanos, sendo uma irmã mais velha e independente e os dois irmãos mais novos que continuam a residir com os pais.

159. O agregado reside numa habitação propriedade da Câmara Municipal ..., em ..., na morada constante do presente processo, com condições de habitabilidade.

160. Em termos de relações no seio do agregado, as mesmas são descritas como gratificantes e pautadas pela harmonia e entreajuda entre os diversos membros que a compõem.

161. BB foi educado de acordo com as normas e cultura da ... a que pertence.

162. O agregado, apesar de enfrentar algumas dificuldades económicas, sempre conseguiu suprir as suas necessidades básicas.

163. BB iniciou o percurso escolar em idade apropriada, concluindo o 6.º ano de escolaridade com 18 anos de idade, referindo ter dificuldades de aprendizagem e desmotivação pelas matérias escolares.

164. Com 18 anos de idade, iniciou ocupação laboral, trabalhando com os progenitores na área da venda....

165. Em agosto de 2019, BB iniciou a vivência em comum com a sua atual companheira (filha do seu coarguido no presente processo), sendo que o casal tem um filho, atualmente com cerca de 16 meses de idade.

166. A companheira foi residir para o agregado do arguido.

167. À data dos factos subjacentes à presente acusação, o arguido residia em casa dos progenitores em companhia dos mesmos, dos dois irmãos mais novos e da sua companheira e filho.

168. Em meio prisional o arguido não tem registos disciplinares interagindo normativamente com os pares.

169. Não tem ocupação laboral nem frequenta qualquer programa.

170. BB é visitado regularmente pela companheira, filho e progenitores, tendo o apoio dos mesmos.

171. O arguido é acompanhado pelos serviços clínicos do EP ... em consultas de psicologia, fazendo medicação para um quadro de ansiedade.

172. BB vive a sua atual situação jurídico-penal com ansiedade, manifestando amargura relativamente ao facto de não estar presente no crescimento do seu filho, que à data da reclusão tinha um mês de idade.

173. BB aparenta ser um indivíduo imaturo, influenciável, denotando lacunas ao nível do pensamento consequencial bem como na escolha das melhores opções de vida.

B) FACTOS NÃO PROVADOS

Não resultaram provados os seguintes factos com relevância para a decisão final:

1. Os arguidos dedicaram-se à subtracção de componentes de veículos e materiais de construção entre Outubro e Dezembro de 2019.

2. Os arguidos não exerciam qualquer actividade remunerada.

3. Para execução dos factos sob julgamento, os arguidos faziam-se transportar nos seguintes veículos:

a. ..., modelo ..., matrícula ..-..-XE registada em nome de UU conforme fls. 288 do processo principal (nuipcs 354/19....);

b. ..., matrícula ..-..-XT, registada em nome de UU (fls. 292 do processo principal);

c. ..., matrícula ..-SO-.., de cor ..., pertença de VV;

d. ..., modelo ..., matrícula ..-..-CS, de cor ..., pertença de WW.

4. Juntamente com o arguido AA seguia sempre o arguido BB.

NUIPC 4387/19.... (Apenso II)

5. No dia 5 de Dezembro de 2019, cerca das 2h50m, os arguidos AA e BB, fazendo-se transportar na viatura ..., modelo ..., de matrícula ..-JG-.., de cor ..., então registada em nome de CC dirigiram-se à Rua ..., em ....

6. Chegados junto do veículo, pararam a viatura em que seguiam e dirigiram-se para o veículo de matricula ..-XO-...

7. Após, retiraram e fizeram suas as quatro jantes que colocaram no veículo de matrícula ..-JG-.. e puseram-se em fuga do local.

8. NUIPC 10/20.... (Apenso III)

9. No dia 3 de Janeiro de 2020, cerca das 19h e 30m, o arguido BB acompanhou o arguido arguido AA até à Rua ..., em ...

10. No dia 5 de Janeiro de 2020, entre as 2h48m e as 3h25m, o arguido BB seguia na viatura de marca ..., matrícula ..-JG-...

11. As rodas do veículo ... valiam 2500 euros.

12. NUIPC 14/20.... (Apenso IV)

13. No dia 3 de Janeiro de 2020, pelas 20h35m, o arguido BB seguia na viatura ..., matrícula ..-JG-.., conduzida pelo arguido AA,

14. Assim, no 5 de Janeiro de 2020, pelas entre as 2h e 48m e as 3h e 25m, o arguido BB seguia na viatura de marca ..., matrícula ..-JG-...

15. NUIPC 300/20.... (Apenso X)

16. Os materiais subtraídos valiam o total 1842 euros.

17. NUIPC 412/20.... (Apenso XI)

18. No dia 11 de Março de 2020, cerca das 20h e 19m, AA e BB, dirigiram-se a uma porta nas traseiras da casa, cuja fechadura rebentaram,

19. De seguida entraram.

20. Do seu interior retiraram e fizeram seus, uma pega de chuveiro e três portas, tudo no valor de, pelo menos, 938 euros.

21. Na posse de tais objectos, colocaram-nos no veículo e saíram do local.

22. Ao procederem da forma descrita, agiram sempre os arguidos de forma deliberada, livre e consciente, bem como conluiados e em conjugação de esforços e intentos, com o intuito de fazerem seus todos os objectos que estivessem no interior da casa acima referida e por eles fossem susceptíveis de serem transportados no referido veículo, bem sabendo que agiam contra a vontade do dono e que as suas condutas eram proibidas por lei.

23. NUIPC 548/20.... – Apenso XII

24. No dia 9 de Maio de 2020, cerca das 00h e 10m, BB, fazia-se transportar na viatura ..., modelo ..., de matrícula ..-JG-...

25. O pára-choques do veículo, as grelhas frontais, sensores de estacionamento e dois faróis de nevoeiro valiam 2000 euros.

26. NUIPC 568/20.... (Apenso XIII)

27. O pára-choques frontal, a grelha frontal e farol de nevoeiro valiam 750 euros.

28. NUIPC 818/20.... (Apenso XIV)

29. No dia 3 de Julho de 2020, cerca das 02h, o arguido BB fazia-se transportar no veículo ..., de matrícula ....-TU­

30. Os arguidos usavam também na prática dos factos sob julgamento as seguintes viaturas:

a) A viatura marca ..., matrícula ..-OE-..;

b) A viatura marca ... de matrícula ..-DJ-..;

c) A viatura marca BMW ..3 D de matrícula ..-FA-..; e,

d) A viatura marca ... de matrícula ..-NR-...

Direito

9. Como sabido, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação que apresentou (art. 412.º, n.º 1, do CPP).

Os  poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça restringem-se exclusivamente ao reexame da matéria de direito (art. 434.º do CPP), sem prejuízo do conhecimento oficioso dos vícios previstos no art. 410.º, n.º 2 do CPP ou, na redação introduzida pela Lei n.º 94/2021, de 21.12, visto o disposto no art. 5.º do CPP (ou seja, desde que da aplicabilidade imediata da lei nova não haja um agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do arguido ou quebra da harmonia e unidade dos vários atos do processo), sem prejuízo do disposto nas alíneas a) e c) do n.º 1 do art. 432.º

Vejamos, então, o recurso do arguido AA.

Analisadas as conclusões do recurso apresentado pelo arguido AA para o STJ, verifica-se que coloca as seguintes questões:

- errado enquadramento jurídico-penal dos factos dados como provados (por terem sido consideradas preenchidas as qualificativas previstas ora no art. 204.º, n.º 1, al. h) do CP por um lado, ora no art. 204.º, n.º 2, al. g), do mesmo código, por outro lado);

- ser excessiva e desproporcionada a pena única que lhe foi imposta, tendo sido violado o disposto nos arts. 40.º e 77.º do CP.

De notar que, no recurso que o mesmo arguido apresentara da decisão da 1ª instância para o Tribunal da Relação, formulou as seguintes questões, conforme ali foram identificadas:

- apreciação da prova;

- qualificação jurídica dos factos;

- medida da pena e suspensão da sua execução.

Pois bem.

Compulsado o teor do acórdão do Tribunal da Relação sob recurso verifica-se que o mesmo analisou e decidiu (além do mais), as questões acima referidas colocadas pelo recorrente AA no recurso para o STJ e, inclusivamente, confirmou integralmente a decisão da 1ª instância.

Portanto, resulta do acórdão do TR... sob recurso que existe dupla conforme, isto é, houve um duplo juízo condenatório quanto às questões de facto e de direito que a defesa entendeu colocar no seu recurso, sendo inclusivamente mantida a pena única que lhe foi imposta.

A existência de dupla conforme, significa (como sucede neste caso) que a decisão da Relação confirma o acórdão da 1ª instância, não tendo alterado a situação do condenado.

Esse juízo confirmativo garante o duplo grau de jurisdição consagrado pelo art. 32.º, n.º 1 da CRP, não havendo, assim, violação do direito ao recurso, nem tão pouco dos direitos de defesa do arguido (arts. 32.º, n.º 1 e 20.º, n.º 1, da CRP).

Isto significa, visto o disposto nos arts. 400.º, n.º 1, al. f) e 432.º, n.º 1, al. b), do CPP, que o acórdão do Tribunal da Relação é irrecorrível na parte em que confirma a condenação da 1ª Instância (princípios da dupla conforme condenatória e da legalidade), salvo quanto à pena única que lhe foi imposta por ser superior a 8 anos de prisão.

Considerando o disposto no art. 400.º n.º 1, als. e) e f) do CPP, a não admissibilidade do recurso vale separadamente para as penas parcelares e para a pena conjunta, podendo acontecer que não sejam recorríveis todas ou algumas daquelas, mas já o seja a pena única[1].

Aliás, decidiu-se no Ac. do TC (plenário) n.º 186/2013, “Não julgar inconstitucional a norma constante da alínea f), do n.º 1, do artigo 400.º, do Código de Processo Penal, “na interpretação de que havendo uma pena única superior a 8 anos, não pode ser objeto do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a matéria decisória referente aos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão.”

Portanto, não pode o recorrente pretender uma terceira apreciação das questões colocadas, nos casos em que há limitações legais.

Se o recorrente pretendia impugnar o acórdão do Tribunal da Relação, deveria ter apresentado as razões pelas quais discordava dessa decisão, na parte em que era suscetível de recurso, de forma a que as questões que suscitasse pudessem ser apreciadas por este Tribunal (e não repetir questões e argumentação -reproduzindo até, na quase totalidade, a motivação do recurso apresentada ao Tribunal da Relação, ainda que com outra ordem- que estavam já definitivamente decididas, por haver dupla conforme - por se verificar o condicionalismo previsto nos arts. 400.º, n.º 1, al. f) e 432.º, n.º 1, al. b), do CPP).

Com efeito, o Acórdão da Relação ... é definitivo quanto às questões que apreciou e que o recorrente volta a colocar no recurso para o STJ (relativas à qualificação jurídico-penal dos factos dados como provados), salvo quanto à reapreciação da medida da pena única que lhe foi imposta, por ser superior a 8 anos de prisão.

Assim, as questões de facto, as questões processuais, as questões de direito, suscitadas nesse âmbito em que não é admissível o recurso para o STJ (como sucede com as questões relativas ao enquadramento jurídico dos factos, sobre as quais o acórdão do TR.… já se pronunciou e decidiu definitivamente) não podem ser conhecidas, nem sindicadas por este Supremo Tribunal.

Em conclusão: nessa parte, não se toma conhecimento do recurso, por inadmissibilidade legal, uma vez que há dupla conforme.

Improcedem, pois, as questões acima referenciadas que o recorrente pretende ver reapreciadas.

De seguida vamos analisar a questão relativa à medida da pena única imposta no acórdão da Relação sob recurso, que pode ser sindicada por este STJ, tendo presente que, não ocorrendo os vícios previstos no art. 410º, nº 2, do CPP, nem nulidades ou irregularidades de conhecimento oficioso, considera-se definitivamente fixada a decisão proferida sobre a matéria de facto acima transcrita, a qual se mostra devidamente sustentada e fundamentada.

Pois bem.

A esse propósito escreveu-se no acórdão do TR.… sob recurso (ainda que sobre os dois arguidos e quanto às penas individuais e únicas):

“Quanto à medida concreta da pena, a sua determinação faz-se em função da culpa do agente e entrando em linha de conta com as exigências de prevenção de futuros crimes.

A culpa é um referencial que o julgador nunca pode ultrapassar. Até ao máximo consentido pela culpa, é a medida exigida pela tutela dos bens jurídicos que vai determinar a medida da pena, criando-se uma moldura de prevenção geral, cujo limite máximo é a proteção máxima pensada para os bens jurídicos da comunidade e cujo limite mínimo é aquele abaixo do qual já não há proteção suficiente dos bens jurídicos. Dentro destes limites intervêm, para a concretização, a prevenção geral e a ideia de ressocialização[2].

Quanto às exigências de prevenção geral, dizem as mesmas respeito à confiança da comunidade na ordem jurídica vigente que fica sempre abalada com o cometimento dos crimes, têm a ver com a proteção dos bens jurídicos, com o sentimento de segurança e a contenção da criminalidade, em resumo, visam a defesa da sociedade.

Já as exigências de prevenção especial se prendem com a capacidade do arguido de se deixar influenciar pela pena que lhe é imposta, estão ligadas à reintegração do agente na sociedade.

No caso, o grau da ilicitude e da culpa são elevados, apresentando-se prementes as necessidades de prevenção geral e especial, em particular em relação ao recorrente AA, atenta a sua reincidência.

Perante este quadro, é manifesto que a medida concreta das penas não pode ser graduada próximo dos limites mínimos, o que se apresentaria insuficiente para uma adequada proteção dos bens jurídicos violados.

A medida abstrata da pena pelo crime de furto do art. 204, nº 1, CP, é de prisão de 1 mês até 5 anos, dos crimes de furto qualificado do art. 204.°, n.° 2, do Código Penal, de pena de 2 anos a 8 anos de prisão e dos crimes de furto qualificado na forma tentada, dos arts.204.°, n.° 2, 22.°, 23.° e 73.° do Código Penal, de prisão de 1 mês até 5 anos e 4 meses, sendo os limites mínimos em relação ao recorrente AA agravados pela sua reincidência, respetivamente, para prisão de 1 mês e 10 dias, 2 anos e 8 meses e 1 mês e 10 dias.

Em relação ao AA, o tribunal recorrido graduou as penas dos crimes de furto qualificado do nº 1, do art. 204, CP, em dois anos e seis meses de prisão, as dos crimes de furto qualificado do nº 2, do art. 204, CP, entre os quatro anos e os quatro anos e seis meses de prisão e as dos crimes de furto qualificado na forma tentada em um ano e seis meses de prisão.

Quanto ao BB graduou as penas pelos crimes de furto qualificado entre os dois anos e seis meses de prisão e os três anos de prisão, fixando a pena pelos crimes tentados em um ano de prisão.

Assim, não ultrapassou o tribunal recorrido em relação a nenhum dos crimes o ponto médio na medida abstrata da pena, não se afastando mesmo muito do limite mínimo quanto aos crimes praticados pelo BB, o que é revelador de muita moderação e séria preocupação com as necessidades de reinserção social dos agentes.

Quanto à pena única, com limites abstratos (art. 77, nº 2, CP), quanto ao AA, entre os 4 anos e 6 meses de prisão e os 24 anos e 9 meses de prisão e quanto ao BB entre os 3 anos de prisão e os 15 anos e 3 meses de prisão, o tribunal recorrido graduou a do AA em dez anos de prisão e a do BB em seis anos de prisão, o que se apresenta adequado e proporcional a uma avaliação global dos factos e da personalidade de cada um dos arguidos, ambas as penas únicas bem abaixo do ponto médio da medida abstrata, o que confirma a já reconhecida moderação.

A medida da pena única, só por si, afasta a possibilidade de suspensão da sua execução (art. 50, do CP).”

Ora, como se referiu anteriormente, importa apreciar a questão da pena única, que o recorrente AA considera excessiva e desproporcionada.

Vejamos então.

Pressuposto essencial do concurso superveniente de penas (tal como decorre do disposto nos arts. 77.º, n.º 1 e 78.º, n.º 1, do CP) é a prática de diversos crimes pelo mesmo arguido antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles.

O designado “cúmulo jurídico de penas” não é uma forma de execução de penas parcelares, mas antes um caso especial de determinação da pena[3].

A exigência de realização de cúmulo jurídico em caso de conhecimento superveniente de concurso tem a sua explicação: basta atentar no disposto no art. 77.º, n.º 1, do CP, sobre as regras de punição do concurso, onde se estabelece um regime especial de punição, que consiste na condenação final numa única pena, considerando-se, “na medida da pena, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”.

A justificação para este regime especial de punição radica nas finalidades da pena, exigindo uma ponderação da culpa e das razões de prevenção (prevenção geral positiva e prevenção especial), no conjunto dos factos incluídos no concurso, tendo presente a personalidade do agente[4].

Na determinação da pena única a aplicar, há que fazer uma nova reflexão sobre os factos em conjunto com a personalidade do arguido, pois só dessa forma se abandonará um caminho puramente aritmético da medida da pena para se procurar antes adequá-la à personalidade unitária que nos factos se revelou (a pena única é o resultado da aplicação dos “critérios especiais” estabelecidos no mesmo art. 77.º, n.º 2, não esquecendo, ainda, os “critérios gerais” do art. 71.º do CP[5]).

O recorrente AA tendo sido condenado pela 1ª instância na pena única de 10 anos de prisão, a qual foi confirmada pela Relação, argumenta, em resumo, que lhe foi aplicada pena única excessiva, pugnando, como forma de não comprimir os seus direitos de arguido e de cidadão, mais do que o estritamente necessário, e de ser respeitado o teor do disposto nos arts. 40.º e 71º do Cód. Penal, em termos de bom senso e de justiça relativa (até por comparação com outro tipo de criminalidade mais grave), fazer uma correção, reduzindo de forma sensível a pena única.

Neste caso concreto, a pena aplicável (a moldura abstrata do concurso de penas) tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos crimes em concurso (por força do disposto no art. 77.º, n.º 2, do CP, não pode ultrapassar 24 anos e 9 meses de prisão) e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos mesmos crimes em concurso (neste caso 4 anos e 6 meses de prisão), o que significa que a pena única terá de ser encontrada na moldura abstrata entre 24 anos e 9 meses de prisão e 4 anos e 6 meses de prisão.

Repare-se que em causa está o concurso de 11 crimes de furto qualificados (dos quais 2 tentados e os restantes 9 consumados), sendo o recorrente condenado como reincidente, o que revela (olhando igualmente para os seus antecedentes criminais) que as condenações anteriores sofridas o não motivaram a alterar o seu comportamento (tanto mais que cometeu os crimes em causa nestes autos no período em que estava em liberdade condicional).

O desvalor das condutas do arguido, o seu desprezo perante pautas mínimas de convivência societária, o facto de ter cometido o conjunto dos crimes em apreciação nestes autos no período indicado nos factos provados (entre 5.01.2020 e 3.07.2020), a sua postura de não interiorização das condutas delituosas, apesar do que se apurou quanto às suas condições de vida, revelam bem como o ilícito global agora em apreciação foi determinado por alguma propensão ou tendência criminosa.
De facto, apesar da sua idade (nasceu em .../.../1984), vista a natureza e quantidade dos crimes cometidos (como decorre da globalidade dos factos em conjunto) podemos afirmar que há uma adequação da sua personalidade aos factos cometidos, manifestada igualmente na indiferença que revelou pelos bens jurídicos violados, reveladora de uma certa tendência para a prática dos tipos de ilícitos criminais cometidos.
De resto, não se extrai da matéria de facto apurada que o recorrente tivesse interiorizado o desvalor das condutas que praticou, revelando sentido crítico.

A conexão entre os crimes cometidos, é grave, tendo de ser vistos no seu conjunto, considerando o espaço de tempo da sua atuação e a personalidade do arguido (avessa ao direito), que se mostra adequada aos factos cometidos, revelando uma certa tendência para a prática dos tipos de ilícitos criminais cometidos, bem como não esquecendo, relativamente ao ilícito global, as elevadas exigências de prevenção geral (para reafirmar, perante a comunidade, a validade das normas violadas) e de prevenção especial (considerando todo o seu percurso de vida, apesar das oportunidades que foi tendo, mas que foi desaproveitando).
E, no juízo de prognose a fazer pelo tribunal não se vê que haja razões para reduzir a pena única que lhe foi imposta, considerando as suas carências de socialização e tendo presente o efeito previsível da mesma (pena única aplicada) sobre o seu comportamento futuro, a qual não é impeditiva da sua ressocialização, quando chegar o momento próprio, sendo conveniente e útil que no EP vá interiorizando o desvalor da sua conduta, adote uma postura socialmente aceite e cumpra as regras da instituição (o que, por certo, se tal se justificar, poderá a seu tempo contribuir para beneficiar de medidas flexibilização que o vão preparar para a liberdade, medidas essas a determinar pelo tribunal competente para o efeito).
Da consideração global de todos os factos apurados e da personalidade do arguido/recorrente não se extrai que se possa formular um juízo mais favorável ou que se justifique efetuar qualquer correção e, por isso, se conclui que não é caso de reduzir a pena única que lhe foi aplicada.

Na perspetiva do direito penal preventivo, julga-se na medida justa, sendo adequado, ajustado e proporcionado manter a pena única de 10 anos de prisão (que não ultrapassa a medida da sua culpa, que é elevada), assim contribuindo para a sua futura reintegração social e satisfazendo as finalidades das penas.

A pretendida redução da pena mostra-se desajustada e comprometia irremediavelmente a crença da comunidade na validade das normas incriminadoras violadas, não sendo comunitariamente suportável aplicar pena única inferior à que lhe foi imposta.

Em conclusão: improcede o recurso do arguido AA na parte que era possível analisar, sendo certo que não foram violados os princípios e as disposições legais respetivas invocadas pelo recorrente.

                                               *

III - Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes desta Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em:

- não tomar conhecimento do recurso, por inadmissibilidade legal, na parte em que é impugnado o Acórdão da Relação, quanto à condenação do Recorrente AA, pelos crimes e nas penas parcelares (face ao disposto nos arts. 399º, 400º, n.º 1, als. e) e f), 432º, n.º 1, al. b), 420º, n.º 1, al. b), e 414º, n.ºs 2 e 3, do CPP);

- no mais, negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA.

Custas pelo recorrente/arguido, fixando-se a taxa de justiça em 6 UC`s.

*

Processado em computador e elaborado e revisto integralmente pela Relatora (art. 94.º, n.º 2 do CPP), sendo assinado pela própria, pelo Senhor Juiz Conselheiro Adjunto e pelo Senhor Juiz Conselheiro Presidente.

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Supremo Tribunal de Justiça, 28.04.2022

Maria do Carmo Silva Dias (Relatora)

Cid Geraldo

Eduardo Almeida Lourenço

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[1] Ver Ac. TC (Plenário) n.º186/2013, acessível no site do Tribunal Constitucional.
[2] Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, 1993, págs.227 e segs.
[3] Ver Ac. do TC nº 3/2006, DR II Série de 7/2/2006.
[4] Neste sentido, Germano Marques da Silva, Direito Penal Português, Parte Geral, III, Teoria das Penas e das Medidas de Segurança, Editorial Verbo, 1999, p. 167 e Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português, Parte Geral, II, As consequências jurídicas do crime, Editorial Notícias, 1993, p. 291. Acrescenta este último Autor que “tudo se deve passar como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão só, a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).
[5] Ver Jorge de Figueiredo Dias, ob. cit., p. 291.