REVISTA EXCECIONAL
OPOSIÇÃO DE JULGADOS
Sumário


I- Há contradição entre dois acórdãos da Relação, para efeitos do disposto no art. 672º, n.º 1, c), do CPC, quando, interpretando a mesma cláusula de uma convenção coletiva, tendo em vista calcular a diferença de benefícios a suportar pelo empregador: (i) um dos acórdãos da Relação atendeu apenas ao tempo e não ao valor das contribuições efetuadas (atentando exclusivamente num critério de proporcionalidade, em função do tempo de trabalho dentro e fora da instituição de crédito, portanto sem recorrer a qualquer fator de ponderação associado ao valor das contribuições efetuadas); (ii) enquanto o acórdão fundamento atendeu ao tempo e ao valor de tais contribuições.
II- O facto de o acórdão recorrido seguir a jurisprudência recente e reiterada do STJ não obsta - na ausência de um acórdão de uniformização de jurisprudência – à admissibilidade da revista excecional.

Texto Integral




Processo n.º 842/21.3T8VFX.L1.S1 (revista excecional)

MBM/JG/RP

Acordam na Formação prevista no artigo 672.º, n.º 3, do CPC, junto da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça

1.1. Réu/recorrente: BANCO BPI, S.A.

1.2. Autora/recorrida:  AA BB.

X X X
2. O BANCO BPI, S.A. veio interpor recurso de revista excecional do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12.01.2022, com fundamento no art. 672º, nº 1, c), do CPC (contradição com o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10.10.2016, proferido no processo n.º 4150/15.0T8MTS.01, transitado em julgado), alegando, essencialmente:

- Está em causa a mesma questão de direito e os mesmos pressuposto de facto, porquanto ambos os arestos decidiram sobre como apurar o benefício pago pelo regime geral de segurança social para o efeito da aplicação do disposto na Cláusulas 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho do sector bancário (BTE n.º 3 de 22/01/2011), quando, além da carreira contributiva ao serviço do Banco, o pensionista tem carreira contributiva anterior;

- Trata-se de decisões expressas e opostas, pois no Acórdão recorrido decidiu-se, confirmando a sentença proferida pelo Tribunal da 1.ª Instância, reconhecer à Autora o direito a pensão completa do CNP, deduzindo o valor a liquidar correspondente aos 3 anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhadora bancária, a calcular por aplicação de uma “regra de três simples pura”, enquanto que no Acórdão proferido no processo 4150/15.0T8MTS.P1, já transitado em julgado, se decidiu julgar totalmente improcedente a ação e absolver a Ré do pedido, o qual correspondia, entre o mais, a reconhecer ao Autor o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzido o valor correspondente à percentagem de 13%, correspondente aos 2 anos e 7 meses de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário, numa “regra de três simples pura”;

- No Acórdão recorrido seguiu-se no sentido da aplicação da “regra de três simples pura”, condenando-se o Réu nesses termos, e no Acórdão proferido no processo 4150/15.0T8MTS.P1, já transitado em julgado, decidiu-se exatamente o contrário.

3. A recorrida respondeu, pugnando pela inadmissibilidade da revista excecional (por a jurisprudência, mormente no STJ, se encontrar sedimentada em sentido contrário) e, caso venha a ser admitida, pela sua improcedência.

4. No despacho liminar, considerou-se estarem verificados os pressupostos gerais de admissibilidade do recurso.

5. Está em causa a questão de saber se há contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento (transitado em julgado), os quais, no domínio da mesma legislação, incidem sobre a mesma questão fundamental de direito: interpretação da cláusula 136ª do Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) para o sector bancário, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE) n.º 3, de 22.01.2011, (entretanto substituída, com redação similar, pela cláusula 94.ª do ACT do sector bancário publicado no TE n.º 29, de 08.08.2016), para efeitos de determinação da diferença de valor a que alude a parte final do n.º 1 destas duas cláusulas.

6. É manifesto que in casu se verifica a contradição invocada pelo recorrente, bem como os demais requisitos estabelecidos pelo art. 672º, nº 1, c), do CPC.

Com efeito, fundamentalmente, interpretando a mesma cláusula de uma convenção coletiva e tendo em vista calcular a diferença de benefícios a suportar pelo empregador: (i) o acórdão recorrido atendeu apenas ao tempo e não ao valor das contribuições efetuadas (atentando exclusivamente num critério de proporcionalidade, em função do tempo de trabalho dentro e fora da instituição de crédito, portanto sem recorrer a qualquer fator de ponderação associado ao valor das contribuições efetuadas); (ii) enquanto o acórdão fundamento atendeu ao tempo e ao valor de tais contribuições.

No sentido da verificação da assinalada contradição, v.g., os Acs. desta Secção Social do STJ de 13.01.2022, Proc. 598/20.7T8MTS.P1.S2, de 13.01.2022, Proc. 3817/19.9T8MTS.P1.S2, de 23.11.2021, Proc. 831/20.5T8VLG.P1.S1, de 08.06.2021, Proc. 23235/19.8T8LSB.L1.S1, e de 27.01.2021, Proc. 74/19.0T8MTS.P1.S1.

7. Ao contrário do sustentado pela recorrida, também não oferece dúvida que o facto de o acórdão recorrido seguir a jurisprudência recente e reiterada do STJ não obsta - na ausência de um acórdão de uniformização de jurisprudência – à admissibilidade da revista excecional.

8. Nestes termos, acorda-se em admitir a recurso de revista excecional em apreço.

Custas pela parte vencida a final.

Lisboa, 01 de junho de 2022


Mário Belo Morgado (Relator)

Júlio Manuel Vieira Gomes

Ramalho Pinto