TAXA DE JUSTIÇA EXCEPCIONAL
DESPACHO DE CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO
Sumário


- A norma do art. 531º do CPC, que prevê a aplicação da taxa sancionatória excecional, pressupõe:
a) a natureza manifestamente improcedente do requerimento ou ato, e
b) a atuação imprudente.
O primeiro pressuposto “natureza manifestamente improcedente” não se confunde com “natureza improcedente”, sendo necessário que dos termos do requerimento ou ato seja manifesta a improcedência.
- Improcedência manifesta é aquela que dispensa uma averiguação probatória ou uma operação intelectual complexa, sendo apreensível externamente através do contexto ou dos termos em que assenta, de tal forma que possa ser percebida de imediato a improcedência.
- Não se verifica essa manifestação quando, o tribunal ordena que o despacho seja aperfeiçoado, podendo o aperfeiçoamento, no caso, trazer-lhe viabilidade.
(Sumário pela Relatora)

Texto Integral


Acordam no Tribunal da Relação de Évora:

I

Em 14-01-2022 deu entrada um requerimento de Acompanhamento de Maior, sendo Requerente Ae Requerida I…, de 70 anos, pedindo que fosse decretado o acompanhamento da Requerida, por doença do foro psicológico desde o nascimento.
Indicou como Acompanhante, a sua própria pessoa, identificando-se como, primo da Requerida.
Mais pediu que fosse decretado o suprimento da autorização da Requerida para a instauração da ação de anulação do testamento celebrado em 13/06/2017, no Cartório Notarial da Dra. M…, por J…, dado que a mesma não tem discernimento para gerir nenhum episódio da sua vida, necessitando de auxílio de terceiros (art.º 141.º, n.º 2 e 3 do CC). Indicando testemunhas e requerendo a realização de exame pericial à Requerida, a efetuar pelo IML.

Em 19-01-2022 foi proferido despacho de convite ao aperfeiçoamento do requerimento inicial.
Do seguinte teor:
«Convite ao aperfeiçoamento:
Decorre do art.º 892.º, n.º 1, als. b), d) e e) do CPC que, no requerimento inicial, o requerente deve, além do mais, requerer as medidas de acompanhamento que reputa adequadas, indicar a publicidade a dar à decisão final e juntar elementos que indiciem a situação clínica alegada. Porém, compulsados os autos, não se vislumbra que tenha sido dado cumprimento ao estipulado nas mencionadas normas legais.
Por outro lado, o requerente refere que não foi instaurada anteriormente ação de maior acompanhado relativamente a I… e invoca ter legitimidade para a propositura da ação, alegando que é primo da requerida, mas não junta as necessárias certidões do assento de nascimento tendentes a demonstrar o alegado – sendo certo que, no que tange à questão da legitimidade, da escritura de habilitação de herdeiros junta não se extrai que o requerente e a requerida sejam sequer parentes (já que da mesma consta que o requerente é filho de um irmão de J…, ao passo que I… é filha de uma irmã da falecida mulher daquele).
Finalmente, o requerente convoca o art.º 141.º, n.º 2 e 3 do Cód. Civil, que prescreve que o acompanhamento de maior pode ser requerido por pessoa diversa do próprio beneficiário mediante autorização e estatui que o pedido de suprimento da autorização do beneficiário pode ser cumulado com o pedido de acompanhamento. Todavia, não formula o pedido de suprimento de autorização do beneficiário para a instauração do presente processo de acompanhamento – como podia e devia ter feito, sob pena de ilegitimidade – e antes peticiona o suprimento da autorização de I… para a instauração da ação de anulação de testamento – pedido que se afigura ilegalmente cumulado nestes autos (art.º 892.º, n.º 2, 555.º, n.º 1 e 37.º, n.º 1 do CPC ex vi do art.º 549.º do mesmo diploma legal e 141.º, n.º 1 a 3 do Cód. Civil).
Assim, afigurando-se que apenas por lapso o requerente não pediu o suprimento da autorização da requerida para a instauração da presente ação, deverá ser-lhe concedida a possibilidade de aperfeiçoar o seu petitório em conformidade com o alegado.
Face ao exposto, e ao abrigo do disposto nos art.ºs 6.º, n.º 1 e 2, 590.º n.º 1 a contrario, 590.º, n.º 2, als. b) e c) e n.º 4 CPC ex vi do art.º 549.º, n.º 1 do mesmo diploma legal, convido o requerente a, no prazo de 10, apresentar novo articulado em que:
- Sendo caso disso, formule expressamente pedido de suprimento de autorização de I… para propor a presente ação de acompanhamento de maior;
- Indique as medidas de acompanhamento que reputa adequadas;
- Indique a publicidade a dar à decisão final;
- Junte certidão do assento de nascimento de I…, bem como certidões que comprovem a relação de parentesco alegada;
- Junte elementos que indiciem a situação clínica alegada.»

Em requerimento de 21-01-2022 veio o Requerente A… deduzir a seguinte resposta:
«[1.] Ponderados, devidamente, os fundamentos constantes do despacho, indicia-se que o Requerente não terá legitimidade para a instauração da ação, porque não é, efetivamente, parente da Requerida.
2. O Mandatário foi induzido em erro por o Requerente e a Requerida se tratarem por primos, por ambos tratarem por tio o falecido, J…. Mas efetivamente não são parentes.
Pelo que, o Requerente irá solicitar ao Ministério Público que requeira, em representação da Requerida, o acompanhamento desta nos termos dos arts.º 138º e ss. do CC e 891º e ss. do CPC
E,
O Requerente desiste da instância (art.º 277.º, alínea d) do CPC).»


Tendo sido proferido o seguinte despacho-sentença que inclui um despacho para exercício do contraditório:

«Requerimento de 21/01/2022:
Antes do oferecimento da contestação, o requerente A… veio desistir da instância.
Por ser válida e eficaz, quer pelo objeto, quer pela qualidade do requerente, homologo em sentença a desistência da instância constante do requerimento junto em 21/01/2022 e, em consequência, declaro cessados os termos do processo e extinta a presente instância (artigos 285.º, n.º 2, 286.º, n.º 1, 289.º a contrario, 290.º, n.º 1 e 277.º, al. d), todos do CPC).
Sem custas, atenta a isenção objetiva prevista para os processos de acompanhamento de maior (art.º 537.º, n.º 1 do CPC e art.º 4.º, n.º 2, al. h) do RCP).
Fixo à ação o valor de €30.000,01 (art.º 303.º, n.º 1 e 306.º, n.º 1 e 2 do CPC). Registe e notifique.
**
Notifique o requerente para, querendo, exercer o contraditório relativamente à eventual condenação em taxa sancionatória excecional, em virtude da dedução de ação manifestamente infundada (art.º 3.º, n.º 3 e 531.º do CPC).
Santarém, d.s.»


No exercício desse contraditório, o Requerente respondeu em 01-02-2022, no essencial,:
«[N]o caso dos autos, inexiste censurabilidade.
4.º- Não só porque o Requerente, laborando em erro, prontamente o assumiu.
5.º- Também, porque o Requerente, nestes autos, nem sequer prosseguia um interesse próprio;
Prosseguia o interesse da Requerida.
E sobretudo, porque,
6.º - O Requerente desconhecia os requisitos de legitimidade da pretensão que deduziu.
7.º - O Requerente, sem ter o referido conhecimento, transmitiu ao Mandatário que era primo da Requerida, o que levou o Mandatário a articular e a julgar como verdadeiro tal facto.
8.º - Nos contactos que o Mandatário manteve com o Requerente, este sempre se referiu à Requerida como sua prima.
9.º- Tal informação, não foi transmitida com má-fé, maxime, com o intuito de “contornar” quaisquer pressupostos processuais.
10.º - Na verdade, o Requerente indicou ao Mandatário que era primo da Requerida, sem ter noção de tal qualidade constituir requisito de legitimidade.
11.º - Com base em tal afirmação e atendendo à urgência na instauração da ação, necessária à tramitação do inventário e à defesa dos interesses da Requerida, o Mandatário articulou como verdadeira a informação que lhe foi prestada, quando juridicamente o Requerente não é “primo” da Requerida.
12.º - Confrontado com o douto despacho que antecedeu a desistência da instância, o Requerente esclareceu o Mandatário que efetivamente não é “primo” da Requerida, porque como bem referiu o Tribunal, o Requerente é sobrinho do falecido e a Requerida sobrinha da mulher deste.»


Foi então proferido o seguinte despacho, ora objeto de recurso:
«Taxa sancionatória excecional:
(…)
Apreciando.
Dispõe o art.º 531.º do CPC:
“Por decisão fundamentada do juiz, pode ser excecionalmente aplicada uma taxa sancionatória quando a ação, oposição, requerimento, recurso, reclamação ou incidente seja manifestamente improcedente e a parte não tenha agido com a prudência ou diligência devida.”
Lida a norma sobredita, podemos asseverar que a aplicação desta sanção processual é excecional e exige a verificação de dois requisitos: (i) a manifesta improcedência da pretensão e (ii) a falta de prudência ou diligência devida no recurso pela parte a determinado meio processual.
A lei não exige que a conduta dê azo a “assinalável atividade processual”, ainda que tal circunstância possa ser valorada pelo intérprete quando se trate de apreciar a intencionalidade e censurabilidade de utilização de expedientes processuais manifestamente improcedentes.
No caso vertente, é patente que ambos os requisitos acima enunciados estão preenchidos:
(i) o requerente A… não é parente sucessível de I… e, como tal, sempre seria improcederia o suprimento da necessária autorização para a instauração da presente ação de maior acompanhado (art.º 141.º, n.º 1 e 2 do Cód. Civil); e
(ii) se tivesse agido com a mínima diligência, certamente o requerente se teria inteirado de que não é sequer parente da requerida.
Ainda que se pudesse conceder que o requerente se referisse à requerida como prima, a respeito da falta de diligência na instauração da ação, não pode deixar de notar-se que o I. mandatário do requerente não se limitou a alegar que aquele era primo da requerida, mas no art.º 1.º do requerimento inicial afirmou ser “parente na linha colateral no 4º grau (primo direito)”. Se o fez foi certamente por ter presente o disposto no art.º 2147.º do Cód. Civil, segundo o qual, “na falta de herdeiros das classes anteriores, são chamados à sucessão os restantes colaterais até ao quarto grau, preferindo sempre os mais próximos.” Ora, quem tem presentes os pressupostos de legitimidade e os invoca pode e deve inteirar-se da sua correspondência com a realidade, sendo ainda mais censurável a conduta de quem não o faz quando tais pressupostos são referentes à sua relação familiar com outrem.
Acrescente-se que entre os documentos juntos com o requerimento inicial se encontrava um testamento de que já se extraía a inexistência da relação de parentesco invocada e, assim como o Tribunal se deu conta de tal circunstância em sede de despacho liminar, também o requerente o podia e devia ter feito antes de propor uma ação em que se arrogava uma qualidade que não detinha.
Finalmente, a censurabilidade da conduta processual do requerente também resulta acrescida por ter invocado facto pessoal desconforme com a realidade apesar de desempenhar o cargo de cabeça-de-casal de herança a que concorre I…, sendo que no exercício de tal cargo teve de prestar declarações a identificar os interessados diretos na partilha e a relação existente entre os sucessores e o falecido J…
Como vem sendo entendido pela doutrina e pela jurisprudência, a taxa sancionatória excecional é um mecanismo de penalização dos intervenientes processuais que não visa sancionar erros técnicos, mas sancionar condutas da parte que não atinja a gravidade pressuposta pela litigância de má-fé, mas, ainda assim, se traduzem na formulação de pretensão ou prática de ato que a parte não teria introduzido em juízo ou praticado no processo caso tivesse atuado com a prudência e diligência que lhe são exigíveis.
1 Acórdãos do TRE de 07/06/2018 e do STJ de 12/05/2016, processos n.º 1267/09.4TBBNV.E1 e n.º982/10.4TBPTL.G1-A.S1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt; na doutrina, vide Abrantes Geraldes, Luís Filipe Sousa e Paulo Pimenta, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 2.ª ed., pág. 606.
Nas palavras de Paula Costa e Silva, o legislador sanciona comportamentos da parte praticados com negligência simples, considerando essas condutas contrárias ao sistema.
Se é certo que o Tribunal deve salvaguardar o direito das partes à defesa dos seus interesses pela via processual e ser criterioso na aplicação da taxa sancionatória excecional –cf. acórdão do STJ de 18/12/2019 –, também o é que não pode deixar de sancionar a dedução de pretensões manifestamente infundadas e ostensivamente reveladoras de falta de prudência ou diligência, ademais, em situações como a dos autos, em que nem sequer haverá lugar ao pagamento de custas pela parte que lançou mão do processo indevidamente, dada a isenção objetiva de que o mesmo goza.
Posto isto, cumpre condenar o requerente em taxa sancionatória excecional.
Atenta a escassa atividade processual desenvolvida, afigura-se justo fixar a taxa sancionatória excecional no mínimo legal de 2UC (art.º 10.º do RCP).
Nestes termos e com os fundamentos que antecedem, condeno o requerente A… em taxa sancionatória excecional no montante correspondente a 2 (duas) UC.
Notifique.»


Inconformado com tal condenação veio o Requerente recorrer, assim concluindo as suas alegações de recurso:
a) O Despacho recorrido não atende ao dever de cooperação, boa fé e verdade na relação entre as partes e o Tribunal.
b) Na sequência de um despacho que convidou ao aperfeiçoamento da Petição Inicial, ordenando a junção de documentos, o mandatário, na sequência das diligências realizadas para ao mesmo dar cumprimento, apercebeu-se de que faltava um requisito de legitimidade, apresentando e desistiu da instância.
c) O Requerente indicou ao Mandatário que era primo da Requerida, sem ter noção de tal qualidade constituir requisito de legitimidade; E com base em tal afirmação e atendendo à urgência na instauração da ação, necessária à tramitação do inventário e à defesa dos interesses da Requerida, o Mandatário articulou como verdadeira a informação que lhe foi prestada, sem a confirmar documentalmente, devido à urgência na instauração da ação.
d) A condenação do Requerente em taxa sancionatória especial, é injusta, porque a factualidade que, aparentemente, motiva a decisão, só chegou ao conhecimento do Tribunal pelo Requerente, que com a maior celeridade, logo que se apercebeu do erro, informou o Tribunal a verdade sobre o ocorrido, desistiu da instância.
e) A condenação funda-se num circunstancialismo causado pelo mero desconhecimento do Requerente sobre os requisitos de legitimidade da pretensão que deduziu, sem que tenha existido má-fé, com o intuito de “contornar” quaisquer pressupostos processuais. Olvida, também, que o Requerente, não prosseguia um interesse próprio; Prosseguia o interesse da Requerida.
f) E sobretudo, porque é pressuposto de aplicação da taxa sancionatória excecional que, de modo genérico, o art. 531º CPC enuncia, que o processado revele a presença de pretensões formuladas por um sujeito processual que sejam manifestamente infundadas, abusivas e reveladoras de violação do dever de diligência que deem azo a assinalável atividade processual, sendo de exigir ao juiz, para essa avaliação, muito rigor e critério na utilização desta medida sancionatória de modo a salvaguardar o direito das partes à defesa dos seus interesses pela via processual.
g) Nada disso ocorreu: nem foi desenvolvida assinalável atividade processual nem (nessa fundamentação, objetivamente tabelar) existe, ao menos, um relatório, omitindo-se qualquer espécie de subsunção dos factos às normas que entendeu aplicar, limitando-se a um excurso tabelar sobre os pressupostos da aplicação da taxa sancionatória especial, terminando esse “não argumento” (dotado de uma única premissa) a que se segue a conclusão, sem qualquer referência à urgência que existia na instauração da ação, ou sequer, ao grau de negligência do Requerente ou à censurabilidade da sua atuação;
h) O despacho recorrido é tabelar, e é nulo, por falta de fundamentação.
i) Somente em situações excecionais em que o sujeito aja de forma patológica no desenrolar normal da instância, ao tentar contrariar ostensivamente a legalidade da sua marcha ou a eficácia da decisão praticando ato processual manifestamente improcedente é que se justifica a aplicação da taxa sancionatória – por isso chamada – excecional.
j) No caso dos autos, inexiste tal censurabilidade, inexistindo fundamento para aplicação de taxa sancionatória excecional. Termos em que deverá o recurso merecer provimento e em consequência, ser a decisão recorrida anulada, ou caso assim não se entenda, revogada, assim se fazendo sã e serena JUSTIÇA!»


Em contra-alegações o Ministério Público concluiu, em abono da confirmação da decisão:

1º- -Vem o presente recurso interposto do despacho judicial que aplica ao requerente a taxa sancionatória excecional, devida pelo facto de o requerente não ter assegurado a sua legitimidade, previamente `a instauração da ação.
2º- O recorrente não dá devido cumprimento ao ónus de invocar as normas jurídicas violadas, mas está subjacente ao seu recurso uma suposta violação do disposto no artº 531º do C.P. Civil, enunciado nas suas conclusões.
3º- Invoca ainda o recorrente, sem citar qualquer fundamento jurídico, a nulidade do despacho recorrido, vicio esse que claramente não se verifica pelo que, em qualquer caso, se dira que não se mostra violado o disposto no artº 154º nº 1 do C. Processo Civil.
4º- Na verdade, o despacho recorrido, supra transcrito, evidencia claramente quer os factos que justificam a aplicação da sanção, quer o enquadramento jurídico que aplica, subsistindo a questão de saber se a factualidade apurada deve efetivamente subsumir-se ao normativo invocado- artº 531º do C. Processo Civil.
5º- E a problemática suscita-se porquanto defende o recorrente que taxa sancionatória excecional apenas poderá/deverá ser aplicada quando o ato processual praticado pela parte revele intencionalidade de prejudicar o processo, para alem de ser manifestamente infundado, assumindo o ato um carácter excecionalmente reprovável, por constituir um incidente anómalo, um desvio acentuado e injustificado à tramitação regular e adequada do processo, que entende não ser o seu caso.
6º- Ou seja, entende o recorrente que a condenação numa taxa sancionatória excecional não lhe deve ser aplicada, alegando que o seu ato não pode ser qualificado como inusitado, abusivo ou imprudente, em termos de constituir perante o seu texto e contexto, uma atitude perversa ou abusiva.
7º- Afastando a litigância de ma fé, o despacho recorrido afasta igualmente uma hipotética mera condenação em custas, seja porque a conduta do requerente se mostra censurável para alem do mero pagamento das custas processuais seja porque in casu esse pagamento não ocorre, por se tratar de processo que, pela sua natureza, beneficia de isenção.
8º- Tal como se acolheu no douto despacho recorrido, existiu por parte do requerente uma manifesta ausência de cuidado em assegurar os pressupostos processuais, designadamente da legitimidade, negligencia essa que, pela sua gravidade, nem a alegada urgência da situação pode justificar.
Assim decidindo, farão Vª Exª a costumada Justiça!

II
A factualidade a relevar contêm-se no Relatório supra

III
É o seguinte o objeto do recurso:
- Se (não) estão verificados os pressupostos de aplicação da taxa sancionatória excecional, prevista no art. 531º do CPC.

Dispõe a norma:
«Taxa sancionatória excecional
Por decisão fundamentada do juiz, pode ser excecionalmente aplicada uma taxa sancionatória quando a ação, oposição, requerimento, recurso, reclamação ou incidente seja manifestamente improcedente e a parte não tenha agido com a prudência ou diligência devida.»

Pressupõe a mesma a necessidade de dois pressupostos:
a) natureza manifestamente improcedente do requerimento, e
b) atuação imprudente
O primeiro pressuposto “natureza manifestamente improcedente” não se confunde com “natureza improcedente”, sendo necessário que dos termos do requerimento ou ato seja manifesta a improcedência.
Improcedência manifesta é aquela que dispensa uma averiguação probatória ou uma operação intelectual complexa, sendo apreensível externamente através do contexto ou dos termos em que assenta, de tal forma que possa ser percebida de imediato a improcedência.

No caso não se verificou essa manifestação. Tanto assim que o tribunal ordenou fosse o despacho aperfeiçoado. Podendo o aperfeiçoamento trazer-lhe viabilidade.
Fosse o requerimento manifestamente improcedente e tal “juízo de aperfeiçoamento” não teria lugar. Mas sim o de indeferimento liminar por manifesta improcedência.
No decurso desse convite o Requerente, face às diligências que a prudência aconselhava, ainda que tardias, anuncia que os laços familiares não são como pensava, desistindo consequentemente da instância, sem insistir minimamente na pretensão, que, se o fizesse, agora sim, seria manifestamente infundada e justificar-se-ia a aplicação da taxa.
Com o requerimento sancionado, verificava-se somente o segundo dos pressupostos da norma punitiva: a atuação imprudente.
O qual desacompanhado do primeiro resulta insuficiente para preencher a sua previsão normativa.
Pelo que, e com todo o respeito, a decisão que condena o Requerente em taxa sancionatória excecional, se mostra infundamentada, devendo ser revogada.
IV
Termos em que se julga procedente a apelação, revogando-se na totalidade a decisão recorrida.
Sem custas.
Évora 12 de maio de 2022

Anabela Luna de Carvalho (relatora)
Maria Adelaide Domingos
José António Penetra Lúcio