PEDIDO DE NOMEAÇÃO DE PATRONO
INTERRUPÇÃO DO PRAZO
INJUNÇÃO
Sumário

I - O requerente de apoio judiciário, na modalidade de nomeação do patrono, só está em condições de beneficiar da interrupção do prazo processual que estiver em curso se juntar aos autos documento comprovativo da apresentação do requerimento.
II - O procedimento de injunção é meio processual adequado para obter o cumprimento de obrigação pecuniária de valor não superior a €15.000,00, respeitante a um contrato de “Mútuo”/“revolving”, do qual subsiste por pagar um capital de € 3.413,65, juros e  demais acréscimos contratuais.

Texto Integral


Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de ...[1]

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            1 – RELATÓRIO

            P...” instaurou em 30.06.2020 contra AA procedimento de injunção para obter a condenação desta a pagar-lhe o valor total de € 15.102,00, tendo como causa contrato de “Mútuo” pelo fornecimento de bens e serviços contratados em 15.11.2007, alegando não se tratar de “Obrigação emergente de transação comercial”, nem de “Contrato com consumidor[2], sendo mais concretamente nos seguintes termos:

«1. A 02.04.2008, foi celebrado entre a C... (...) e a ora Requerida o contrato de crédito Conta Certa com o nº...00, cuja proposta de adesão tem aposta a referência ...33_...V2_..08.

2. A 13.05.2008, foi celebrado entre a C... (...) e a ora Requerida o contrato de crédito Vida Livre com o nº ...00, cuja proposta de adesão tem aposta a referência ...32_...V2-...08.

3. Por Cessão de Créditos em 25 de Julho de 2014, foram os créditos – decorrentes dos contratos de crédito Conta Certa com o nº...00, cuja proposta de adesão tem aposta a referência ...33_...V2_..08 e o contrato de crédito Vida Livre com o nº ...00, cuja proposta de adesão tem aposta a referência ...32_...V2-...08 – cedidos pela C... (...) à A..., O....

4. No dia 1 de Fevereiro de 2015, cedeu a A..., O... à P..., ..., empresa do grupo, os créditos decorrentes dos referidos contratos.

5. Tais cessões foram notificadas à ora Requerida.

6. Quanto ao contrato Conta Certa com o nº...00, cuja proposta de adesão tem aposta a referência ...33_...V2_..08, a ora Requerida contratou inicialmente um valor de € 4.000 (quatro mil euros), cujo pagamento devia ocorrer em prestações mensais no valor de € 120,00 (cento e vinte euros).

7. O contrato supra referido, enquadrando-se na tipologia de contratos de “revolving”, foi sujeitos aos seguintes refinanciamentos:

a) No dia 15.08.2008, refinanciamento no valor de € 545,00 (quinhentos e quarenta e cinco euros);

b) No dia 17.09.2008, refinanciamento no valor de € 15,00 (quinze euros);

c) No dia 03.01.2009, refinanciamento no valor de € 549,00 (quinhentos e quarenta e nove euros);

d) No dia 07.04.2009, refinanciamento no valor de € 45,00 (quarenta e cinco euros);

e) No dia 12.05.2009, refinanciamento no valor de € 515,00 (quinhentos e quinze euros);

8. Contudo, a ora Requerida deixou de efectuar os pagamentos a que estava obrigada a 28.10.2011, ficando nessa data em dívida no valor de € 7.061,18 (sete mil e sessenta e um euros e dezoito cêntimos).

9. Assim, ao valor em dívida, no valor de € 7.061,18 (sete mil e sessenta e um euros e dezoito cêntimos) acrescem:

a) Juros de mora calculados à taxa legal de 4,00 %, no valor de € 2483,18 (dois mil quatrocentos e oitenta e três euros e dezoito cêntimos), desde a data do incumprimento, a 31.10.2011, até à data de entrada do requerimento de injunção.

b) Comissão de entrada em incumprimento definitivo, no valor de € 530,08 (quinhentos e trinta euros e oito cêntimos).

10. Quanto ao contrato de crédito Vida Livre com o nº ...00, cuja proposta de adesão tem aposta a referência ...32_...V2-...08, a ora Requerida contratou inicialmente um valor de € 2.000 (dois mil euros), cujo pagamento devia ocorrer em prestações mensais no valor de € 80,00 (oitenta euros).

11. O contrato supra referido, enquadrando-se na tipologia de contratos de “revolving”, foi sujeitos aos seguintes refinanciamentos:

a) No dia 17.09.2008, refinanciamento no valor de € 121,00 (cento e vinte e um euros);

b) No dia 22.10.2008, refinanciamento no valor de € 527,00 (quinhentos e vinte e sete euros);

c) No dia 30.01.2009, refinanciamento no valor de € 27,00 (vinte e sete euros);

d) No dia 10.02.2009, refinanciamento no valor de € 506,00 (quinhentos e seis euros);

e) No dia 07.04.2009, refinanciamento no valor de € 23,00 (vinte e três euros);

e) No dia 09.06.2009, refinanciamento no valor de € 516,00 (quinhentos e dezasseis euros);

Contudo, a ora Requerida deixou de efectuar os pagamentos a que estava obrigada a 28.10.2011, ficando nessa data em dívida no valor de € 3.413,65 (três mil quatrocentos e treze euros e sessenta e cinco cêntimos).

12. Assim, ao valor em dívida, no valor de € € 3.413,65 (três mil quatrocentos e treze euros e sessenta e cinco cêntimos) acrescem:

a) Juros de mora calculados à taxa legal de 4,00 %, no valor de € 1078,02 (mil e setenta e oito euros e dois cêntimos), desde a data do incumprimento, a 31.10.2011, até à data de entrada do requerimento de injunção, a 02.01.2020;

b) Comissão de entrada em incumprimento definitivo, no valor de € 331,89 (trezentos e trinta e um euros e oitenta e nove cêntimos).

c) Taxa de justiça paga quanto à presente acção executiva, no valor de € 51,00 (cinquenta e um euros);

d) Juros de mora que se vençam desde a data do requerimento executivo até integral e efectivo pagamento, custas, custas de parte, procuradoria, despesas e honorários de A.E., e em tudo o que mais for de Direito.»

                                                                       *

            Em 9 de Novembro de 2020 foi apresentado pela Ré junto da Segurança Social requerimento de proteção jurídica, nomeadamente na modalidade de nomeação e pagamento faseado da compensação de patrono.

Contudo, de tal pedido não foi o presente processo informado pela própria, sendo certo que só em 5/01/2021 foi remetido aos presentes autos, pelo Conselho Regional de ... da Ordem dos Advogados, o comprovativo de nomeação de Exma. Advogada na qualidade de patrona da Ré e, a 18/01/2021, foi remetido aos mesmos a decisão da Segurança Social de atribuição do benefício de apoio judiciário, tendo sido concedido na modalidade de nomeação e pagamento de honorários a patrono oficioso.

                                                                       *

Como a Ré, que havia sido citada em 2.11.2020, não apresentou contestação, no dia 26/11/2020 foi aberta conclusão e, em seguida, foi no processo proferida sentença com o seguinte teor literal:

«Nos presentes autos de ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos instaurados por P..., contra AA, verificando-se que a ré, citada, não apresentou contestação, nos termos do art. 2.º do Regime anexo ao Dec. Lei nº 269/98, de 1 de Setembro de 1998, confiro força executiva à petição.

Custas pela ré (art. 527.º do Código de Processo Civil).

Valor da ação: € 15.000 (quinze mil euros).

Registe e notifique.»

                                                           *

            Inconformada, apresentou a Ré recurso de apelação contra a mesma no dia 27/01/2021, o que teve lugar na sequência da nomeação de patrono que teve lugar em 4/01/2021, recurso esse subscrito pela Exma. Patrona que lhe foi nomeada nesse contexto, sendo que as alegações terminam com as seguintes conclusões:

«I - Da nulidade processual cometida por prolação de sentença ainda do prazo possível para apresentação da contestação

1º - Em 02/11/2020, a aqui Recorrente foi citada, no âmbito dos presentes autos para, no prazo de 20 dias, contestar, querendo a injunção que lhe foi movida por P....

2º - No dia 26/11/2020 foi aberta conclusão e, em seguida, foi proferida sentença, constando da mesma que, não tendo a recorrente, sido citada, apresentado contestação, nos termos do art. 2º do regime anexo ao DL n.º 269/98, de 1 de Setembro, foi conferida força executiva à petição, sentença essa da qual a aqui recorrente foi notificada.

3º - Verifica-se que, aquando da prolação da sentença, ainda decorria o prazo possível para apresentar contestação.

4º - Embora o prazo terminasse a 23 de Novembro, o n.º 5 do artigo 139º do CPC permite ainda a prática do ato, independentemente de justo impedimento, até ao 3º dia útil seguinte, ou seja, neste caso até dia 26/11/2020.

5º - Pelo que foi cometida uma nulidade processual, nos termos do disposto no artigo 195º, n.º 1 do CPC, que pode influenciar na decisão da causa, já que coartou o período de defesa da aqui recorrente,

6º - que deve ser invocada em sede de recurso já que está a coberto da decisão recorrida, devendo a mesma ser anulada.

II – Do erro na forma de processo e da nulidade da sentença proferida por o não ter apreciado

7º - O art. 2º do regime anexo ao DL n.º 269/98, de 1 de Setembro determina que «Se o réu, citado pessoalmente, não contestar, o juiz, com valor de decisão condenatória, limitar-se-á a conferir força executiva à petição, a não ser que ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias ou que o pedido seja manifestamente improcedente.»

8º - O citado diploma legal foi criado no domínio do cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos que não excedam o valor da alçada dos tribunais de 1.ª instância, num espírito de desjudicialização e de consensualidade dum certo tipo de litígios, de simplificação, de remoção de obstáculos processuais, em consonância com a normal simplicidade desse tipo de ações.

9º - Porém, o DL n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro, revogado pelo atual DL n.º 62/2013, de 10 de Maio, aplicável aos contratos celebrados a partir da entrada em vigor do mesmo (01/07/2013), veio estabelecer, no seu artigo 10º a possibilidade de o credor, em caso de atraso de pagamento em transações comerciais, previstas nesse diploma, poder recorrer à injunção, independentemente do valor da dívida,

10º - Determinando, o seu n.º 2 que, para valores superiores a metade da alçada da Relação, a dedução de oposição e a frustração da notificação no procedimento de injunção determinam a remessa dos autos para o tribunal competente (que foi o que sucedeu nos presentes autos), aplicando-se a forma de processo comum.

11º - Assim, as ações para cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais, nos termos previstos no presente diploma, seguem os termos da ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos apenas quando o valor do pedido não seja superior a metade da alçada da Relação, conforme determina o seu n.º 5.

12º - No caso dos autos, o valor do pedido no requerimento de injunção é de 15.102,00€.

13º - Pelo que, aquando da distribuição, deveria ter sido distribuído sob a forma de processo comum e não sob a forma de processo especial do DL 269/98, de 1 de Setembro,

14º Pelo que, nos termos do disposto no artigo 193º, n.º 1 do CPC, devem anular-se todos os atos praticados, inclusive a citação, dado que o prazo de defesa é inferior na forma de processo especial o que diminui as garantias da ré.

15º - Sendo tal erro de conhecimento oficioso, nos termos do disposto no artigo 196º do CPC, impunha-se ter sido apreciado pelo tribunal, aquando da prolação da decisão, atento igualmente o disposto nos artigos 576º, n.º 2 e 578º do CPC, o que não sucedeu, sendo, por isso, nula a sentença proferida, nos termos do disposto no artigo 615º, n.º 1, al. d) do CPC.

III – Do erro na escolha do meio processual (injunção) e da nulidade da sentença proferida por o não ter apreciado

16º - Na esteira do alegado supra, impunha-se igualmente ao Tribunal verificar que a injunção não é o meio idóneo nem legal para reclamar o crédito em causa nos autos.

17º - Efetivamente, o artigo 7º, n.º 1 do regime anexo ao DL 269/98, de 1 de Setembro determina que se considera injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1.º do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro, diploma esse que foi quase integralmente revogado pelo supra citado DL n.º 62/2013, de 10 de Maio, o qual determina, no seu artigo 2º, n.º 1 que se aplica a todos os pagamentos efetuados como remuneração de transações comerciais.

18º - Considera-se transação comercial (al. b) do artigo 3º do DL n.º 62/2003, de 10 de Maio) uma transação entre empresas ou entre empresas e entidades públicas destinadas ao fornecimento de bens ou à prestação de serviços contra remuneração.

19º Sendo excluídos do âmbito da sua aplicação os contratos celebrados com consumidores (al. a) do n.º 2 do mesmo diploma).

20º - No caso dos autos estão em causa contratos de crédito ao consumo, na modalidade de contratos de “revolving”, que a Autora classificou como “contratos de mútuo”, através dos quais, segundo alega, foi concedido à Ré financiamento pela C..., celebrados certamente ao abrigo do disposto no DL 359/91, de 21 de Setembro.

21º - E, apesar de ter sido aposto pela Autora, no formulário injuntivo, que o contrato data de 02/07/2020, e que se refere ao período de 28/06/2020 a 30/06/2020, a verdade é que tal informação contraria o alegado na parte da exposição dos factos do requerimento injuntivo,

22º - Onde claramente é referido que os contratos em causa remontam ao ano de 2008, tendo um sido celebrado em Abril e outro em Maio desse ano, e ambos com a C....

23º - Foi alegada uma eventual cessão de créditos a uma entidade denominada A... PORTEFOLIO AS; O..., em 25/07/2014, tendo esta entidade, por sua vez, a 01/02/2015, alegadamente cedido os mesmos créditos à aqui Autora.

24º Do supra exposto resulta que para reclamação do crédito de que se arroga titular, a injunção não é meio idóneo nem legalmente admissível.

25º - Pelo que, igualmente nos termos do disposto no artigo 193º, n.º 3 do CPC, tendo ocorrido erro na qualificação do meio processual usado pela parte, este deveria ter sido corrigido oficiosamente, determinando-se que sigam os termos processuais adequados.

26º - No caso aqui em apreço, dado que a Autora praticou um ato que a lei não admite, lançando mão de um expediente que não é possível para reclamar o crédito que pretende, teria de ter sido considerado nulo todo o processado, nos termos do disposto no artigo 195º do CPC,

27º Por ser de conhecimento oficioso, nos termos do disposto no artigo 196º, 576º, n.º 2 e 577º, al. b) do CPC,

28º Não tendo sido apreciado na sentença proferida, a mesma é nula, nos termos do disposto no artigo 615º, n.º 1, al. d) do CPC.

IV – Da (i)legitimidade da Autora, da nulidade da sentença proferida por ausência da sua apreciação, e do (não) uso do requerimento de injunção europeu

29º - A Autora alegou diversas cessões de créditos que não documentou (dado ter lançado mão do procedimento de injunção) e muito menos se encontra comprovada nos auto a sua comunicação à aqui recorrente.

30º - Com o segmento final do art. 2º do regime anexo ao DL n.º 269/98, de 1 de Setembro pretendeu o legislador permitir ao juiz o conhecimento de mérito em caso de revelia operante, por falta definitiva de contestação.

31º - Nessa conformidade, cabe ao juiz, verificada a regularidade da citação, analisar a petição inicial para aferir se se verificam exceções dilatórias e se o direito invocado deve ser reconhecido.

32º - E, se da análise da petição inicial resultar a convicção de que o autor não tem o direito que se arroga, deve julgar o pedido improcedente, ainda que a construção jurídica defendida pelo autor seja defensável.

33º - Na verdade, pela circunstância de inexistir contestação às pretensões deduzidas em juízo não se impõe necessária e automaticamente que o julgador confira a mencionada força executiva à petição.

34º - Não decorre da norma em análise um regime cominatório pleno e automático pela falta de defesa do réu, já que pode ocorrer recusa da fórmula executória, caso se verifiquem, de forma evidente, exceções dilatórias ou se o pedido for manifestamente improcedente.

35º - A decisão, ainda que se limite a conferir força executiva à petição inicial, é igualmente uma decisão judicial, com valor de sentença.

36º - Nesta situação, há um controlo jurisdicional (ou deve haver), cabendo ao juiz verificar a regularidade da citação, a ocorrência de exceções dilatórias e se o direito invocado deve ser reconhecido.

37º - Daí que, no artigo 729º do CPC, se restringem os fundamentos da oposição quando a execução for fundada em decisão judicial que conferiu força executiva à petição, ao equipará-la a uma decisão condenatória, pois o legislador visou impedir a repetição da apreciação de questões que já foram ou deveriam ter sido invocadas em sede declarativa, salvaguardando-se ainda o respeito pela certeza e segurança jurídica em termos de evitar, até, a prolação de decisões judiciais contraditórias.

38º - No caso aqui em apreço, a notificação da cessão ao devedor – ou a sua aceitação – corresponde a uma condição de eficácia da cessão relativamente ao devedor, uma vez que, sem essa notificação ou aceitação, a cessão não produz qualquer efeito em relação ao devedor.

39º - Significa isso, portanto, que, antes dessa notificação ou aceitação, o cessionário não pode exigir o crédito ao devedor, nem este está obrigado a satisfazer-lhe a prestação, importando notar que – como resulta do disposto no artigo 583º, nº 2, do CC –, a não ser que o devedor tenha conhecimento da cessão (facto que o cessionário terá o ónus de provar), tem eficácia liberatória e é oponível ao cessionário o pagamento que o devedor faça ao cedente.

40º - Assim, sendo, deveria o tribunal, antes de ter proferido a decisão, ter ordenado a notificação da Autora para juntar aos autos prova escrita da comunicação à Ré das cessões de créditos que invoca, a fim de se aferir da sua legitimidade nos presentes autos, o que não sucedeu.

41º - Pelo que o Tribunal não verificou da sua legitimidade para a reclamação do crédito em causa, nem verificou da existência da referida cessão, condições absolutamente necessárias para a eficácia da sua pretensão,

42º - Sendo igualmente nula a decisão proferida, por não ter verificado tais questões, ao abrigo do disposto no artigo 615º, n.º 1, al. d) do CPC, o que se impunha, já que são de conhecimento oficioso, nos termos do disposto nos artigos 576º, n.º 3, 577º, al. e), 578º do CPC e 576º e 568º, al. d) do mesmo diploma legal, aplicável por analogia.

43º - Por outro lado, a Autora é uma sociedade, com sede em Espanha e NIF emitido nesse estado membro.

44º - Nos termos do disposto no artigo 33º, n.º 1 do Código Civil, as pessoas coletivas têm como lei pessoal a lei do Estado onde se encontra a sua sede principal e efetiva da sua administração.

45º - Tratando-se de uma sociedade com sede num estado membro da União Europeia, em vez de ter recorrido ao requerimento de injunção em causa nos autos, caso se verificassem os pressupostos da sua aplicação, teria de ter lançado mão do requerimento de injunção de pagamento europeu, criado pelo REGULAMENTO (CE) N.o 1896/2006 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO de 12 de Dezembro de 2006.

46º - Nos termos do disposto no artigo 3.º desse Regulamento, o requerimento é aplicável a todos os processos transfronteiriços, ou seja, aqueles em que pelo menos uma das partes tem domicílio ou residência habitual num Estado-Membro distinto do Estado-Membro do tribunal demandado.

47º - E o domicílio ou residência habitual das partes são determinados com base nas informações fornecidas pelo requerente no formulário, bastando verificar se o endereço indicado de uma das partes se encontra num Estado-Membro diferente daquele onde se encontra o tribunal em que a questão foi apresentada, como é o caso.

48º - Pelo que, também por este motivo a Autora não é parte legítima nos presentes autos e a injunção não é o meio legalmente admissível para a reclamação do crédito por ela pretendido, sendo nula a douta sentença proferida por não ter apreciado questões que devesse apreciar, nos termos do disposto no artigo 615º. N.º 1, al. d) do CPC.

V – Do valor da causa

49º - A douta sentença ora recorrida fixou à ação o valor de 15.000,00€.

50º - Nos termos do disposto no artigo 297º, n.º 1 do CPC, se pela ação se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa e, nos termos do n.º 2, cumulando-se vários pedidos o valor é a quantia correspondente à soma de todos eles.

51º - Dúvidas não restam, pela leitura da exposição de factos do requerimento injuntivo, que a Autora pede a condenação da Ré no pagamento de valores de capital, juros, comissão de entrada em incumprimento e taxa de justiça paga, no montante de 102,00€, o que perfaz a soma de 15.102,00€ que consta no pedido.

52º - Portanto, o valor da ação terá de ser 15.102,00€ e não de 15.000,00€ como fixou o tribunal na sentença proferida.

53º - Devendo, em consequência, ser anulada a sentença proferida nessa parte, substituindo-a por outra que considere que o valor fixado à causa seja o de 15.102,00€ tal como consta do pedido do requerimento injuntivo.

VI – Da (não) preclusão do direito de defesa da Ré por falta de junção de documento comprovativo de que foi requerido o benefício de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono oficioso – nulidade processual cometida com a prolação da sentença

54º - Consta da sentença proferida que, a Ré, citada, não apresentou contestação.

55º - Verifica-se, porém, que a 5 de Janeiro corrente foi remetido aos presentes autos, pelo Conselho Regional de ... da Ordem dos Advogados, o comprovativo de nomeação da aqui subscritora na qualidade de patrona da Ré e, a 18/01/2021, foi remetido aos mesmos a decisão da Segurança Social de atribuição do benefício de apoio judiciário, tendo sido concedido na modalidade de nomeação e pagamento de honorários a patrono oficioso.

56º - Mais consta da notificação da Segurança Social que o requerimento de proteção jurídica foi apresentado pela Ré junto daquela edilidade no dia 9 de Novembro de 2020, isto é, ainda decorria o prazo para apresentação de contestação.

57º - Compulsados os presentes autos verifica-se, contudo, que a Requerente não deu cumprimento ao que determina o artigo 24º, n.º 4 da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, isto é, a não procedeu à junção nos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento de proteção jurídica a fim de interromper o prazo que estiver em curso até que lhe seja nomeado o patrono.

58º - Nesse caso, a falta dessa junção não deve ter como consequência a preclusão do direito de defesa, considerando-se operada a revelia absoluta da Ré, nos termos do disposto no artigo 566º do CPC.

59º - O recentíssimo acórdão do Tribunal da Relação de ..., datado de 26/10/2020, no âmbito do Processo n.º 511/19.5T8CBR-A.C1 (3ª Secção), defendeu posição diversa da jurisprudência dominante, que segue no sentido da preclusão do direito de defesa como consequência da inobservância da junção de tal comprovativo, à qual aderimos.

60º - Defendeu-se nesse aresto que «interpretada devidamente a norma do nº 4 do art 24º da L 34/2004 de 29/7, se deve ter o conteúdo da mesma, em certas circunstâncias, como ineficaz, nenhum sentido lhe devendo ser dado, e noutras, ultrapassado por um modelo de processo civil não compatível com o referido ónus».

61º - Na verdade, o problema não está na exigência da junção aos autos de tal documento, em si mesma: reside ele em que tal interpretação, imposta sempre e em qualquer caso, por um lado, exige, na prática, que tal junção seja feita pelo interessado, nessa altura então ainda desprovido de acompanhamento por advogado; por outro lado, revela-se indiferente à circunstância de o juiz, no momento em que recebe o processo, ter neste o referido documento, entretanto entregue – fora de prazo, na interpretação normativa em causa – pelo mandatário judicial juntamente com a contestação.

62º - Desta interpretação resulta uma consequência intolerável: o interessado, que precisa e obtém apoio judiciário, muitas vezes uma pessoa com menor instrução ou discernimento, vê-se irremediavelmente lesado nos seus direitos pela imposição de um ónus, porventura justificado, mas cujo incumprimento gera consequências absolutamente desproporcionadas,

63º - Considerando-se abusiva e inaceitável, num Estado de direito respeitador dos cidadãos, a imposição a estes da obrigação de recolherem a prova de uma situação certificada por um serviço público e procederem à sua entrega noutro serviço público.

64º - Do nosso ponto de vista o legislador exprimiu-se desadequadamente nessa norma quando (parece) fazer depender a interrupção do prazo em curso do acto da junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo.

65º - É que a (única) razão de ser da imposição deste ónus – que se tem vindo a entender incindir sobre o requerente do apoio judiciário por ser, indiscutivelmente, ele, quem sofre a corresponde consequência desvantajosa - está no objectivo de se evitar dispêndio processual.

66º - A interrupção do prazo em curso deve entender-se que se dá, em qualquer caso, apenas em função do pedido atempado da nomeação de patrono.

67º - A um processo civil cooperativo, como o nosso pretende, inequivocamente, ser, não quadra minimamente que, afinal, para meramente se evitar a anulação de actos processuais, se retire à parte que não juntou atempadamente aos autos o comprovativo de que requerera apoio judiciário, o efeito interruptivo do prazo em curso e, por essa via, as mais das vezes, lhe resulte suprimido o direito a defender-se.

68º - Por isso, se impõe, em função de uma interpretação ab-rogante valorativa dessa norma, concluir que dela não resulta qualquer conteúdo útil – é que ela existe para evitar anulações processuais e nessas situações nada há a anular. O mais que se obtém, nessas situações, da aplicação da referida norma, é o efeito necessariamente perverso de se impedir a defesa de quem à partida se apresenta como vulnerável do ponto de vista económico e do ponto de vista técnico.

69º - Quanto às situações, em que a vigilância dos prazos pelas secções conduza a que o processo venha concluso findo o prazo da apresentação da defesa sem que esta se mostre apresentada, a dúvida a respeito de uma pendente nomeação de patrono que atempadamente tenha interrompido o prazo para a sua apresentação, implicará que numa interpretação correctiva da referida norma do art 24º/4 da L 34/2004, se imponha ao juiz, que tenha o cuidado de oficiar primeiro à Segurança Social no sentido desta informar a respeito daquela possível pendência, comportamento a que a secção poderá, por ordem do juiz, proceder oficiosamente.

70 º - Deste modo, mantém-se o que é suposto que não se deva perder – o efeito interruptivo que o requerimento da nomeação de patrono implica no prazo em curso – e obvia-se ao inconveniente de se vir a ter que anular processado em função da falta de cuidado - ou de instrução ou discernimento - de quem, tendo requerido atempadamente o benefício do apoio judiciário naquela modalidade, não o informou em tempo nos autos.

71º - Assim sendo, e uma vez que, nos presentes autos, a Ré, por estar desacompanhada de advogado, não ter anterior experiência de pedido de proteção jurídica, não lhe ter sido indicado pelo Serviço de Segurança Social que lhe aceitou o pedido que o deveria fazer, não juntou aos presentes autos o comprovativo de que havia requerido tal benefício, na modalidade de nomeação de patrono,

72º- Terá de se considerar interrompido o prazo de apresentação da contestação que estava em curso aquando da apresentação do pedido de proteção jurídica na modalidade de nomeação de patrono.

73º - Pelo que, terá assim de se considerar que foi violado o direito de defesa da Ré, sendo prematura a prolação de sentença, uma vez que ainda decorria o prazo de apresentação de contestação,

74º - Verificando-se, desse modo, a prática de um ato que a lei não admite e a omissão de um acto que a lei prescreve, o que constitui uma nulidade processual, nos termos do disposto no artigo 195º, n.º 1 do CPC, capaz de influenciar a decisão da causa,

75º - Pelo que deve ser anulada a sentença proferida, reconhecendo-se que se interrompeu a 9 de Novembro o prazo de contestação em curso,

76º - o qual deve reiniciar não com a nomeação de patrono, conforme determina a al. a) do n.º 5 do artigo 24º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, mas sim com a notificação da decisão de revogação da sentença ora recorrida,

77º - dado que, no caso em apreço, aquando da referida nomeação, uma vez que se encontrava proferida sentença nos autos e em curso o prazo de recurso - estando por isso esgotado o poder jurisdicional do juiz, nos termos do disposto no artigo 613º, n.º 1 do CPC -, se impunha recorrer da sentença e não apresentar a contestação, o que se requer.

Nestes termos e nos melhores de direito, deve ser dado provimento ao presente recurso, considerando-se verificadas as nulidades supra invocadas, revogando-se a douta sentença proferida, com as consequências ali indicadas.»

                                                                       *

            Apresentou, por sua vez, a A. contra-alegações, das quais extraiu as seguintes conclusões:

«I. Vem o recurso interposto da decisão do Tribunal de 1ª Instância que conferiu força executiva à petição inicial, dado que a Ré não apresentou contestação.

II. Desde já se invoca expressamente a extemporaneidade do recurso interposto pela Ré;

Com efeito,

III. Conforme consta dos autos, a Recorrente foi citada em 02/11/2020;

IV. De acordo com o estipulado no art. 1º nº2 do Decreto-Lei nº 269/98, de 1 de Setembro, a Recorrente dispõe do prazo de 20 dias para deduzir oposição,

V. O que não sucedeu, pelo que o prazo precludiu em 22/11/2020.

VI. Com pagamento de multa estipulada no art. 139º nº5 do C.P.C., o prazo terminou em 25/11/2020, de acordo com o previsto no art. 138,º, n.º 1 do CPC, dado que a contagem de prazos e dilações é efetuada de forma contínua.

VII. Por não ter sido apresentada a oposição em prazo legal, em 26/11/2021 o Douto Tribunal proferiu sentença condenatória judicial.

VIII. Assim, se não foi apresentada oposição, a Recorrente não se pode socorrer do presente recurso para deduzir a sua defesa – cfr. art. 635.º do CPC.

IX. Encontrando-se vedada a possibilidade de invocar matéria que é de defesa e que não foi deduzida tempestivamente nos autos.

X. Assim, é pois fácil concluir que todos os prazos legais foram ultrapassados, porquanto à data não vigorava qualquer carácter excecional de suspensão de prazos.

XI. Prevê o disposto no artigo 638º do C.P.C que é possível recorrer para instância superior no prazo de 30 dias a contar da data da sentença proferida em 1ª instância.

XII. Atento ao aí disposto, o prazo da Recorrente para interposição de recurso terminou em 9 de Janeiro de 2021, contudo, como se tratava de um sábado transferiu-se para o 1º

dia útil dia 11 de janeiro de 2021.

XIII. Se atendermos ao prazo de interposição de recurso com o acréscimo do prazo de interposição acréscimo da multa devida, o prazo terminava dia 12 de janeiro de 2021, data da sentença de trânsito em julgado.

XIV. Ora o recurso foi apresentado dia 27 de Janeiro de 2021;

XV. Já o prazo legal para recurso se encontrava precludido.

XVI. Acresce ainda salientar que, quanto ao pedido de apoio judiciário, apenas opera a interrupção do decurso dos prazos quando é junto aos autos o documento comprovativo de apresentação do Requerimento junto da Segurança Social, nos termos do disposto no nº4 da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho.

XVII. No caso aqui em apreço, o pedido de apoio judiciário não foi junto aos autos conforme refere o disposto do no nº4 do Art. 24º da Lei nº34/2004 de 29 de Julho.

XVIII. Esta posição vem espelhada no Acórdão proferido pelo STJ em 17.04.2018 pela   (disponível em www.dgsi.pt) e que aqui parcialmente se reproduz: «…o sentido do entendimento que fica exposto, cite-se o acórdão da Relação de Guimarães de 8 de Março de 2012 (processo nº 579/11.1TBFLG:G1, disponível em www.dgsi.pt), assim sumariado: “1. O efeito interruptivo do prazo em curso na acção, consagrado no nº 4 do

artigo 24º da Lei do apoio judiciário, só releva com a junção aos autos do comprovativo

da apresentação do pedido de nomeação de patrono aos autos dentro do prazo respectivo. 2. O prazo de três dias em que independentemente de justo impedimento se pode praticar o acto, mediante pagamento de uma penalidade, consagrado no nº 5 do artigo 145 do CPC, constitui uma mera tolerância e não uma extensão do prazo. 3. A junção do comprovativo da apresentação do pedido de nomeação de patrono deve ocorrer antes de esgotado o prazo, não se verificando o efeito interruptivo se a junção ocorre num dos três dias posteriores, em que o ato poderia ser praticado mediante o pagamento de uma penalidade”. Ou ainda o acórdão da Relação de ... de 10 de Março de 2015 (processo nº 20/14.8T8PNH-C.C1, disponível em www.dgsi.pt), assim sumariado: “1. Incumbe ao requerente de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, na pendência de uma acção judicial, o ónus de juntar ao processo o comprovativo da apresentação do requerimento em que se peticiona a concessão de tal benefício, para que se interrompa o prazo que estiver em curso, designadamente para deduzir contestação/oposição. 2. A junção aos autos do documento comprovativo do aludido pedido no 1.º dia útil posterior ao termo do prazo de que o recorrente dispunha para deduzir oposição à acção de insolvência que contra si foi instaurada, não interrompe o prazo, por este já se haver extinguido, não sendo de aplicar o disposto no artigo 139.º, n.º 5 do NCPC”.

XIX. Acresce que o disposto no art. 139º do CPC não deixa dúvidas quanto à não assimilação do prazo legal à prática do ato para além do prazo legal, aí onde, no respetivo nº 5, se reporta aos “três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo.

XX. Sendo obrigação do intérprete atender à letra da lei e presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art. 9º, nºs 2 e 3 do CC), não vemos como se possa defender que o que é subsequente ao termo do prazo ainda faça parte do próprio prazo.

XXI. Esta última situação funciona apenas como remédio, não como criação ou formação de um novo prazo a acrescer (diz bem o Recorrente quando significa - aludindo, por reporte a jurisprudência do Supremo, às palavras de Antunes Varela - que a opção legal agora prevista no nº 5 do art. 139º do CPC se fundou no reconhecimento de uma velha pecha da nossa maneira coletiva de agir, e que mais não visou que minimizar as consequências do hábito condenável de guardar para a última hora todo o ato que tem um prazo para ser validamente praticado).

XXII. Assim, é fácil de concluir que o recurso não foi apresentado tempestivamente, ao contrário do propugnado pela aqui Recorrente.

XXIII. Acresce ainda que a suspensão excecional dos prazos apenas operou, com efeito a partir de 22/01/2021, nos termos do disposto da Lei n.º 4-B/2021, de 1 de Fevereiro, que alterou a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março.

XXIV. Ainda que assim, não se entendesse, sempre se dirá o seguinte quanto à matéria de facto, não obstante o presente recurso ter fundamento legal para alegações quanto a essa matéria.

XXV. Efectivamente, inexiste qualquer erro na forma de processo em 1ª Instância, porquanto,

XXVI. A relação entre Recorrente e a ora Recorrida não provém de uma transacção comercial porque a Recorrente/Ré não é uma empresa ou entidade pública.

XXVII. O meio destinado a exigir o cumprimento da obrigação pecuniária emergente do contrato supra é através de requerimento de injunção, conforme dispõe o artigo 1º do diploma preambular do DL nº269/98 de 1 de Setembro ex vi 1ª parte do art 7º do DL

nº269/98 de 1 de Setembro.

XXVIII. A Recorrente entende que usou o meio destinado a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a (euro) 15 000,00., o que de facto sucedeu.

XXIX. Como é fácil de verificar, a Recorrida intentou injunção com o valor de 15.000,00 euros, sendo que o valor de 102,00 euros que excede o limite legal se reporta à taxa devida pela entrada do referido requerimento.

XXX. Acresce que a legitimidade da Recorrente, assim como o interesse em agir por parte da aqui Recorrida, está devidamente comprovado.

XXXI. Não obstante, uma vez que tal matéria não foi alegada nos autos, a aqui Recorrida não juntou a respectiva prova documental, nem o fará neste momento, por não ser o meio processual adequado.

XXXII. Em face do exposto, cabe concluir pela falta manifesta, completa e absoluta de fundamento do presente recuso que assim deve ser julgado improcedente.

Nestes termos e nos mais de Direito, que V.Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado improcedente por não provado e em consequência ser confirmada a decisão proferida pelo Tribunal recorrido, com todos os efeitos legais, fazendo-se assim a Costumada Justiça!»

                                                                       *

A Exma. Juíza de 1ª instância proferiu oportunamente um despacho a sustentar a não verificação das nulidades arguidas.       

                                                           *

            Colhidos os vistos e nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso[3] cumpre apreciar e decidir.

                                                                       *

            2QUESTÕES A DECIDIR, tendo em conta o objecto do recurso delimitado pela Recorrente nas conclusões das suas alegações (arts. 635º, nº4 e 639º, ambos do N.C.P.Civil), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608º, nº2, “in fine”, do mesmo N.C.P.Civil):

- Da nulidade processual cometida por prolação de sentença ainda dentro do prazo possível para apresentação da contestação / Da (não) preclusão do direito de defesa da Ré por falta de junção de documento comprovativo de que foi requerido o benefício de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono oficioso – nulidade processual cometida com a prolação da sentença;

            - Do erro na forma de processo e da nulidade da sentença proferida por o não ter

Apreciado / Do erro na escolha do meio processual (injunção) e da nulidade da sentença proferida por o não ter apreciado;

            - Da (i)legitimidade da Autora, da nulidade da sentença proferida por ausência da sua apreciação, e do (não) uso do requerimento de injunção europeu;

- Do valor da causa.

                                                                       *

3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Os factos a ter em conta para a presente decisão são os que decorrem do Relatório supra.

                                                                       *

            4 - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

4.1 -  A primeira questão que com precedência lógica cumpre apreciar é a da alegada nulidade processual cometida por prolação de sentença ainda dentro do prazo possível para apresentação da contestação, o que vamos fazer no confronto e articulação com a questão da (não) preclusão do direito de defesa da Ré por falta de junção de documento comprovativo de que foi requerido o benefício de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono oficioso – nulidade processual cometida com a prolação da sentença.

Que dizer?

Muito inequivocamente que com a resposta negativa à segunda questão deste binómio, improcede fatalmente o suscitado no primeiro binómio.

Senão vejamos.

Argumenta enfaticamente a Ré/recorrente que teria de se considerar interrompido o prazo de apresentação da contestação que estava em curso aquando da apresentação do pedido de proteção jurídica na modalidade de nomeação de patrono, pois que, sendo certo que ela Ré/recorrente não deu cumprimento ao que determina o artigo 24º, nº 4 da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho [isto é, não procedeu à junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento de proteção jurídica a fim de interromper o prazo que estava em curso até que lhe fosse nomeado o patrono], contudo a falta dessa junção não deve ter como consequência a preclusão do direito de defesa.[4]

Sucede que, salvo o devido respeito, não é esse o entendimento por nós perfilhado.

Por força do disposto no nº 4 do art. 24º da Lei nº 34/2004[5], o requerente do benefício de apoio judiciário, que se encontre em situação de carência económica, encontra-se onerado com a obrigação de dar conhecimento ao tribunal de que deu início, por sua iniciativa, a um processo administrativo de proteção jurídica destinado a garantir o seu patrocínio judiciário, requerendo a nomeação de patrono.

Sendo que face ao estatuído nesta matéria, tem-se defendido que os prazos em curso só se interromperiam, nos termos do art. 24º nº 4 da Lei nº 34/2004, com a manifestação da vontade do interessado nesse sentido, através da junção aos autos principais de comprovativo do requerimento que havia sido apresentado junto da Segurança Social a solicitar a concessão do benefício de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, com vista ao exercício do direito de defesa.[6]

De referir que o Tribunal Constitucional já decidiu, por inúmeras vezes, que não existe inconstitucionalidade na interpretação deste normativo no sentido de incumbir ao requerente do apoio judiciário o ónus de prova na causa principal de que apresentou requerimento a instaurar o processo administrativo destinado a solicitar a concessão do benefício de nomeação de patrono, com vista a, desse modo, obter a interrupção do prazo, considerando-se que tal oneração não compromete de forma desproporcionada o direito de acesso à justiça por parte de cidadãos economicamente carenciados.[7]

É de ponderar decisivamente para este efeito que normalmente a citação adverte o requerente de apoio judiciário que deve juntar o comprovativo aos autos e que no requerimento de apoio judiciário consta uma declaração de que tomou conhecimento de que no prazo para contestar deve apresentar no processo esse documento comprovativo, e bem assim que a imposição desse cuidado não envolve particulares conhecimentos jurídicos e é uma exigência que envolve apenas um dever de diligência mínima, sem grande complexidade ou esforço, equiparável à própria obrigação de formalizar o pedido de concessão de apoio judiciário junto da Segurança Social.

Por assim ser, parece-nos que não deve beneficiar de interrupção de prazo o requerente de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, que não comprova nos autos a apresentação do respetivo requerimento de proteção judiciária junto da Segurança Social, não podendo as partes beneficiar da ignorância da lei (art. 6º do C.Civil), nem sendo tal exigência desproporcionada, violadora do processo equitativo ou constituindo uma limitação excessiva ao direito de acesso aos tribunais.

Assim sendo – e em sintonia com a jurisprudência claramente dominante/maioritária nesta matéria[8] – é nosso entendimento que os prazos em curso só se interrompem com a junção aos autos, pelo requerente de apoio judiciário que pretende a nomeação de patrono, do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o respetivo procedimento administrativo.

Pelo que, revertendo tal entendimento ao caso ajuizado, no qual a Ré ora recorrente foi citada a 2.11.2020 e requereu proteção jurídica em 9.11.2020, mas disso não deu conhecimento nos autos, apesar de ter sido advertida que tinha de comprovar esse facto para poder beneficiar da interrupção do prazo de oposição à injunção[9], temos que, só tendo em 5/01/2021 sido remetido aos presentes autos, pelo Conselho Regional de ... da Ordem dos Advogados, o comprovativo de nomeação de Exma. Patrona à Ré e apenas a 18/01/2021 tendo sido remetido aos mesmos a decisão da Segurança Social de atribuição do benefício de apoio judiciário [tendo sido concedido na modalidade de nomeação e pagamento de honorários a patrono oficioso], isto é, quando já haviam decorrido há muito os 15 dias estabelecidos para pagar ou impugnar o pedido injuntivo, encontrava-se plenamente consolidado no processo que a injunção não tivera oposição, quando em 26.11.2020 nela foi proferida sentença.

Encontrando-se, assim, efetivamente precludido o direito de defesa da Ré por falta de junção de documento comprovativo de que foi requerido o benefício de apoio judiciário, não se pode dar qualquer acolhimento à invocação de que foi prolatada a sentença ainda dentro do prazo possível para apresentação da contestação.

Deste modo, não foi cometida qualquer nulidade com a prolação da sentença, improcedendo manifestamente a argumentação recursiva expendida a propósito desta temática.

                                                           *

4.2 - Vejamos, agora, do invocado erro na forma de processo e da nulidade da sentença proferida por o não ter apreciado, e bem assim do erro na escolha do meio processual (injunção) e da nulidade da sentença proferida por o não ter apreciado.

Salvo o devido respeito, também não assiste qualquer razão à Ré/recorrente quanto ao que suscita a este propósito.

Na verdade, olvida ostensivamente a Ré/recorrente a correta interpretação do quadro normativo nesta matéria.

Com efeito, o art. 1º do DL nº 269/98, de 01/09 - diploma preambular que aprovou o regime dos procedimentos para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior à alçada do tribunal de 1ª instância -, prevê a aprovação do «regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a (euro) 15 000, publicado em anexo, que faz parte integrante do presente diploma».

Por sua vez, o artº. 7º de tal regime define o conceito de injunção, no sentido de ser «a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1.º do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro».

A providência injuntiva é, deste modo, aplicável:

- A requerimento destinado a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a € 15.000,00 (cf., o citado art. 1º do Diploma Preambular – DL nº 269/98, na redação do art. 6º do DL nº 303/2007, de 24/08 – e os artigos 1º a 5º do anexo ao mesmo Decreto-Lei) ;

- A obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo DL nº. 32/2003, de 17/02.

Dispunha o art. 2º deste diploma, ser o mesmo aplicável «a todos os pagamentos efectuados como remunerações de transacções comerciais.

2 - São excluídos da sua aplicação:

a)- Os contratos celebrados com consumidores;

b)- Os juros relativos a outros pagamentos que não os efectuados para remunerar transacções comerciais;

c)-Os pagamentos efectuados a título de indemnização por responsabilidade civil, incluindo os efectuados por companhias de seguros.»

Procedendo às definições, as alíneas a) e b) do art. 3º, prescrevem dever entender-se, para efeitos da regulação em causa, por transação comercial «qualquer transacção entre empresas ou entre empresas e entidades públicas, qualquer que seja a respectiva natureza, forma ou designação, que dê origem ao fornecimento de mercadorias ou à prestação de serviços contra uma remuneração», enquanto que por empresa dever-se-á entender «qualquer organização que desenvolva uma actividade económica ou profissional autónoma, mesmo que exercida por pessoa singular».

Enquanto o art. 7º, na redação conferida pelo DL nº 107/2005, de 01/07, prescrevia que

«1- O atraso de pagamento em transacções comerciais, nos termos previstos no presente diploma, confere ao credor o direito a recorrer à injunção, independentemente do valor da dívida.

2- Para valores superiores à alçada da Relação, a dedução de oposição e a frustração da notificação no procedimento de injunção determinam a remessa dos autos para o tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum.

3- Recebidos os autos, o juiz pode convidar as partes a aperfeiçoar as peças processuais.

4- As acções destinadas a exigir o cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transacções comerciais, nos termos previstos no presente diploma, de valor não superior à alçada da Relação seguem os termos da acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos.» (sublinhado nosso)

Entretanto, foi publicado o DL nº 62/2013, de 10/05, prevendo acerca de medidas contra os atrasos no pagamento de transacções comerciais, que, no seu artigo 13º, revogou o DL nº 32/2003, com exceção dos artigos 6º e 8º, mantendo ainda este em vigor «no que respeita aos contratos celebrados antes da entrada em vigor do presente diploma», ou seja, celebrados até 30/06/2013 – cf., o art. 15º.

Acrescentou, ainda, que «as remissões legais ou contratuais para preceitos do Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de fevereiro, consideram-se efetuadas para as correspondentes disposições do presente diploma, relativamente aos contratos a que o mesmo é aplicável nos termos do artigo seguinte».

Este último diploma transpôs para a ordem jurídica nacional a Directiva nº 2011/7/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16/02/2011, prevendo no seu artigo 2º acerca do seu âmbito de aplicação e procedendo igualmente à definição de transação comercial e de empresa nas alíneas b) e d), do art. 3º, nos termos já equacionados pelo DL nº 32/2003, de 17/02.

Por sua vez, o art. 10º, prevendo acerca dos procedimentos especiais, referencia que:

«1 - O atraso de pagamento em transações comerciais, nos termos previstos no presente diploma, confere ao credor o direito a recorrer à injunção, independentemente do valor da dívida.

2 - Para valores superiores a metade da alçada da Relação, a dedução de oposição e a frustração da notificação no procedimento de injunção determinam a remessa dos autos para o tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum.

3 - Recebidos os autos, o juiz pode convidar as partes a aperfeiçoar as peças processuais.

4 - As ações para cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais, nos termos previstos no presente diploma, seguem os termos da ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos quando o valor do pedido não seja superior a metade da alçada da Relação.» (sublinhado nosso)

Resulta, assim, desta breve enunciação legal que, «desde que o art 8º do DL 32/2003 alterou a redacção do art 7º do DL 269/98, o procedimento da injunção passou a ser utilizável no caso do cumprimento das obrigações a que se refere o art 1º do diploma preambular – obrigações pecuniárias emergentes de contrato – e a obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo DL 32/2003 de 17/2, aqui independentemente do valor» (sublinhado nosso)[10]

Sucede que «no que concretamente respeita ao pedido de cumprimento de obrigações pecuniárias (dado que, na espécie, não releva a situação das obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo DL n.º 32/2003 ou pelo DL nº 62/2013), verifica-se que a lei não faz qualquer limitação do seu campo de aplicação, posto que não especifica nem restringe a sua aplicabilidade a um específico tipo de contratos, nem faz quaisquer exigências quanto à menor ou maior complexidade das questões que hajam de ser discutidas no processo.»[11]

Ora se assim é, quanto está em causa um pedido de cumprimento de obrigações pecuniárias, o âmbito material do procedimento é apenas delimitado em função da matéria – “obrigação pecuniária emergente de contrato” – e do valor – “obrigação pecuniária não superior a € 15.000,00” – isto é, não se encontra estabelecido (nem se exigindo) qualquer outro pressuposto substantivo, designadamente um requisito autónomo de exigência de uma complexidade diminuta das questões controvertidas.

Revertendo estes ensinamentos ao caso ajuizado, não se pode deixar de concluir que estava em causa o cumprimento de obrigação pecuniária de valor não superior a €15.000,00 – respeitante a um contrato de “Mútuo”/“revolving”, do qual subsiste alegadamente por pagar um parcial de capital de € 3.413,65, a que acrescem juros e demais acréscimos contratuais – pelo que o recurso ao procedimento de injunção deve ser considerado meio processualmente adequado para fazer valer uma pretensão desse tipo.

Dito de outra forma: não estava em causa na situação ajuizada uma qualquer transação comercial, à qual fossem aplicáveis os requisitos específicos às mesmas respeitantes, como seja o de não ser tal procedimento aplicável aos contratos celebrados com consumidores.

Improcede assim manifestamente toda a argumentação recursiva exposta com base nesses pressupostos e ponderação.

O que tudo serve para dizer que não se verificou qualquer erro na forma de processo, ou de meio processual, a que seja de dar acolhimento.

Assim improcedendo também as nulidades que nessa base estavam deduzidas.

    

4.3 - Da (i)legitimidade da Autora, da nulidade da sentença proferida por ausência da sua apreciação, e do (não) uso do requerimento de injunção europeu

Estes argumentos recursivos, s.m.j., só se compreendem como fruto de um qualquer equívoco ou deficiente compreensão das temáticas em causa.

Senão vejamos.

Quanto à alegada (i)legitimidade da Autora, enquanto fundamentada na argumentação de que «A Autora alegou diversas cessões de créditos que não documentou (dado ter lançado mão do procedimento de injunção) e muito menos se encontra comprovada nos auto a sua comunicação à aqui recorrente», temos que a Ré/recorrente posterga estar em causa a habilitação requisito de legitimidade.

Consabidamente, «A habilitação legitimidade é a que se faz através da petição inicial da acção e dos actos de prova subsequentes, como elo de demonstração da titularidade da situação jurídica invocada, ou seja, quando numa acção ou execução se alega que o autor ou o réu, exequente ou executado, sucederam na posição jurídica que pertencia a outra pessoa.»[12]

Dito de outra forma: a dita habilitação legitimidade é a que tem lugar, por exemplo na petição inicial de uma ação declarativa, no caso do autor haver sucedido na relação jurídica controvertida que se pretende fazer valer, através da invocação, além do mais, dos factos consubstanciadores da sucessão e da respetiva prova.[13]

Ora se assim é, tendo em conta o que concretamente foi alegado no requerimento injuntivo a esta luz e para este efeito, manifestamente improcede esta questão recursiva, aqui se incluindo o aspeto da alegada nulidade pela ausência da sua apreciação.

O que idem se diga quanto à questão do (não) uso do requerimento de injunção europeu.

É que um breve confronto do invocado REGULAMENTO (CE) N.o 1896/2006 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO de 12 de Dezembro de 2006, que criou um procedimento europeu de injunção de pagamento, permite insofismavelmente concluir que se trata de um procedimento optativo e não de utilização obrigatória.

Na verdade, para além de outras razões[14], conforme ficou bem enunciado nos “considerandos” constantes do preâmbulo do mesmo,  «O presente regulamento tem por objectivo simplificar, acelerar e reduzir os custos dos processos judiciais em casos transfronteiriços de créditos pecuniários não contestados, através da criação de um procedimento europeu de injunção de pagamento, e permitir a livre circulação das injunções de pagamento europeias em todos os Estados-Membros, através do estabelecimento de normas mínimas cuja observância torne desnecessário qualquer procedimento intermédio no Estado-Membro de execução anterior ao reconhecimento e à execução.»[15]

Acresce que se encontra claramente expresso no nº2 do art. 1º do Regulamento em referência essa natureza optativa a que aludimos, a saber, quando se estatuiu que «O presente regulamento não obsta a que um requerente reclame um crédito na acepção do artigo 4.o através da instauração de outro procedimento previsto na legislação de um Estado-Membro ou no direito comunitário.»

Do vindo de dizer decorre, sem necessidade de maiores considerações, a total improcedência das questões recursivas ora em apreciação, eventual nulidade incluída.

                                                           *

4.4 - Do valor da causa

Cremos que quanto a este aspeto, a resposta já inteiramente se adivinha.

Na verdade, sustentou a Ré/recorrente quanto a este particular que a sentença ora recorrida fixou à ação o valor de € 15.000,00, sucedendo que cumulando-se na circunstância vários pedidos, à luz do disposto no art. 297º, nº 2 do n.C.P.Civil, «o valor é a quantia correspondente à soma de todos eles», pelo que, na medida em que a A. pede a condenação da Ré no pagamento de valores de capital, juros, comissão de entrada em incumprimento e taxa de justiça paga, no montante de € 102,00€, tal perfaz a soma de € 15.102,00 que consta no pedido, «Portanto, o valor da ação terá de ser 15.102,00€ e não de 15.000,00€».

Será assim?

Entendemos que o “valor da causa” não releva para os efeitos do erro na forma de processo, ou de meio processual, donde, ainda que não estivesse correto o “valor da ação” fixado na decisão recorrida, tal é perfeitamente irrelevante e inócuo na circunstância.

Sendo certo que é por esta razão que já supra se aludiu a que nos presentes autos «(…) estava em causa o cumprimento de obrigação pecuniária de valor não superior a €15.000,00», donde termos começado por referir que a resposta a esta questão «já inteiramente se adivinha».

Com efeito, o valor da taxa de justiça paga pela Autora ora recorrida aquando da apresentação do requerimento de injunção, no montante de € 102, encontrando-se incluído nas custas de parte, não integra o âmbito do pedido para efeitos de determinação da forma de processo aplicável.

Atente-se que já foi doutamente sublinhado neste particular que dispondo o art. 18º do regime publicado em anexo ao DL n.º 269/98, de 01-09, que «o valor processual da injunção e da ação declarativa que se lhe seguir é o do pedido, atendendo-se, quanto aos juros, apenas aos vencidos até à data da apresentação do requerimento», importa concluir que o valor da taxa de justiça paga pelo requerente igualmente não integra o valor processual da ação.[16]

Sem embargo do vindo de dizer, também já foi sustentado que «Tratando-se de ações para cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transações  comerciais em que haja o direito de recorrer à injunção, certo é que é em função do valor do pedido (e não do valor da ação) que se define o regime processual aplicável»[17].

Como quer que seja, afigura-se-nos incontornável que «O valor da taxa de justiça paga aquando da apresentação do requerimento de injunção, encontrando-se incluído nas custas de parte, não integra o âmbito do pedido para efeitos de determinação da forma de processo aplicável»[18].

Improcede assim, decisivamente pela sua irrelevância, também esta questão recursiva.

                                                           *

Nestes termos improcedendo in totum as alegações e o recurso.

                                                           *

(…)                                                                *

6 – DISPOSITIVO

Pelo exposto, decide-se a final julgar totalmente improcedente o recurso, com a consequente manutenção da sentença recorrida.

Custas do recurso pela Ré ora recorrente.

            Coimbra, 26 de Abril de 2022

Luís Filipe Cravo

Fernando Monteiro

Carlos Moreira



[1] Relator: Des. Luís Cravo
   1º Adjunto: Des. Fernando Monteiro
   2º Adjunto: Des. Carlos Moreira
[2] Através da aposição do vocábulo “Não” nas quadrículas a tanto destinadas.
[3] De referir que por despacho prévio do Relator, aquando da admissão do recurso, foi decidido que «(…)
 improcede a arguida intempestividade do recurso.».
[4] Recorde-se que a sentença recorrida considerou ser consequência dessa falta de junção a revelia absoluta dela Ré/recorrente, nos termos do disposto no artigo 566º do n.C.P.Civil…
[5] A saber, «Quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de ação judicial e o requerente pretende nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo».
[6] Neste sentido, SALVADOR DA COSTA, in “O Apoio Judiciário”, 7.ª Edição Atualizada e Ampliada, a págs. 172-173.
[7] Vide, inter alia, os acórdãos T.C. nº 98/2004, nº 57/2006, nº 285/2005, nº 117/2010, nº 350/2017 e nº 585/16.
[8] Cf. a cuidadosa recensão da jurisprudência dos Tribunais da Relação de Lisboa, Porto, Coimbra e Guimarães neste sentido, constante do acórdão do TRL de 24.09.2019, proferido no proc. nº 8309/16.5T8LRS-B.L1-7, acessível em www.dgsi.pt/jtrl, no qual se procede, ainda, à crítica negativa do acórdão do mesmo TRL de 8.06.2017, proferido no proc. nº 13177/10.8T2SNT-A.L1-2 (também ele acessível no mesmo site), que foi invocado para fundamentar as alegações recursivas quanto a este ponto, crítica essa que subscrevemos inteiramente. De referir que a citada jurisprudência maioritária ressalva desse entendimento situações em que o tribunal vem a obter conhecimento, durante a pendência do prazo de defesa, de que fora pedido apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, o que não sucedeu no caso ajuizado.  
[9] Como se encontra expresso literalmente na nota de citação operada, que consta de fls. 2-3 destes autos…
[10] Assim no acórdão do TRL de 17/12/2015, proferido no proc. nº 122528/14.9YIPRT.L1-2, também ele acessível em www.dgsi.pt/jtrl .
[11] Assim foi doutamente sublinhado no recente acórdão do TRP de 21.02.2022, proferido no proc. nº 52737/21.4YIPRT.P1, acessível em www.dgsi.pt/jtrp.
[12] Citámos agora o acórdão do TRE de 07.12.2006, proferido no proc. nº 2074/06-3, acessível em www.dgsi.pt/jtre.
[13] Neste sentido, vide SALVADOR DA COSTA, in “Os Incidentes da Instância”, 5ª Edição Actualizada e Ampliada, Livª Almedina, Coimbra, 2008, a págs. 243.
[14] Como seja a de que o caso ajuizado não configura um “caso transfronteiriço” para efeitos deste regime, pois que para isso não basta a Autora ser uma sociedade de direito espanhol.
[15] Cf. “considerando(9) do mesmo.
[16] Neste sentido SALVADOR DA COSTA, in “A Injunção e as Conexas Acção e Execução”, Livª Almedina, Coimbra, 2004, a págs. 234.
[17] Cfr. acórdão do TRE de 30/05/2019, proferido no proc. nº 81643/18.8YIPRT-A.E1, acessível em www.dgsi.pt/jtre.
[18] Assim no acórdão do TRE de 8.10.2020, proferido no proc. nº 99770/19.2YIPRT-A.E1, também ele acessível em www.dgsi.pt/jtre.