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DESPEDIMENTO COLECTIVO
ASSESSOR TÉCNICO
SUSPEIÇÃO
RECURSOS INTERLOCUTÓRIOS COM SUBIDA A FINAL
RETENÇÃO DE RECURSO
Sumário
1. No processo de impugnação de despedimento colectivo, é irrecorrível o despacho que aprecia matéria relativa a impedimentos e suspeições dos assessores qualificados nomeados para os fins do art. 157.º n.º 1 do Código de Processo do Trabalho. 2. O despacho que indefere arguição de nulidade na nomeação de assessores qualificados e de técnicos designados pelas partes (estes para os fins do art. 157.º n.º 3 do mesmo diploma), apenas pode ser impugnado com o recurso interposto da decisão final, pois a sua retenção não o torna absolutamente inútil.
Texto Integral
Acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
No Juízo do Trabalho de Faro, correm autos de impugnação de despedimento colectivo onde são AA. S.P., T.I.M.G., e outros trabalhadores, e Rés CREWLINK IRELAND, LTD. e RYANAIR DAC.
As Rés apresentaram reclamação de despacho de 06.09.2021 que não admitiu recurso por si apresentado. Vejamos o iter processual que conduziu à reclamação apresentada:[1]
· Por despacho de 25.05.2021 foi nomeado assessor técnico, para os fins do art. 157.º n.º 1 do Código de Processo do Trabalho;
· Foram também notificadas as partes para indicarem mais dois assessores qualificados na matéria;
· Por requerimento de 04.06.2021, as AA. S.P. e T.I.M.G., patrocinadas pelo Ministério Público, indicaram como assessora, nos termos do art. 157.º n.º 2 do Código de Processo do Trabalho, a Dr.ª S.P.F., licenciada em Direito, Inspectora de Trabalho;
· Por requerimento de 07.06.2021, as Rés designaram, nos termos do n.º 3 do art. 157.º do Código de Processo do Trabalho, um técnico para assistir o assessor nomeado pelo Tribunal;
· Por despacho de 15.06.2021, foi ordenada a notificação dos restantes autores para informarem se aceitavam a assessora indicada pelo Ministério Público;
· Por requerimentos de 24 e 30.06.2021, nove outros trabalhadores intervenientes no processo declararam aceitar essa assessora;
· Por despacho de 06.07.2021, foi decidido o seguinte: “Nos termos do artigo 157.º n.º 2 do Código de Processo do Trabalho, nomeiam-se como assessores técnicos indicados pelas partes a licenciada S.P.F. e o economista (…), melhor identificados nos requerimentos datados de 04 e 07 de Junho de 2021 como qualificados na matéria.”
· Em requerimento de 07.07.2021, as AA. S.P. e T.I.M.G., patrocinadas pelo Ministério Público, indicaram como perita a Dr.ª M.F.S.C.S.C., licenciada em Gestão de Empresas, Inspectora Superior da Segurança Social;
· Por despacho de 27.07.2021, apreciando o dito requerimento, foi decidido nomear “como técnico para assistir o assessor no desempenho das suas funções M.F.S.C.S.C., aí melhor identificada, nos termos do artigo 157.º n.º 3 do Código de Processo do Trabalho”;
· Por requerimento de 04.08.2021, as Rés alegaram que a Dra. S.P.F., sendo jurista e inspectora da ACT, não podia exercer funções no processo como técnica para assistir o assessor, face ao art. 22.º do respectivo estatuto profissional; acresce que também não podia ser aceite a nomeação de um assessor adicional, no caso a Dr.ª M.F.S.C.S.C., quer por ter sido excedido o respectivo prazo, quer porque os assessores adicionais não são técnicos das partes, quer porque é Inspectora da Segurança Social e tendo sido sugerida por uma das partes do litígio, a sua independência está comprometida;
· Por despacho de 06.09.2021, foi decidido o seguinte: “mantém-se a técnica nomeada, concedendo-se às RR. o prazo de 10 dias para, querendo, indicarem ou designarem técnico para assistir os assessores”;
· Em requerimento de 07.09.2021, as Rés solicitaram a reforma do aludido despacho;
· Por despacho de 09.09.2021, foi decidido o seguinte: “Mantém-se o despacho que antecede no seu ponto 1., tendo o mesmo deixado bem claro os prazos em causa e o entendimento que assumiu, com excepção da parte final onde se determina a notificação das RR. para indicarem técnico que resulta prejudicada face o esclarecimento a que se procedeu.”
Inconformada, as Rés recorreram e concluíram: A. Da recorribilidade
a) O despacho de fls. ..., com a ref.ª 121343862 é recorrível ao abrigo do disposto no artigo 79.º, n.º 2 alíneas k) do CPT, dado que sem reapreciação, a sua recorribilidade a final seria completamente inócua pois, a essa data, já o dano se teria materializado na esfera da recorrente
b) No caso em apreço caso, materializar-se-á nos autos a apreciação dos elementos auxiliares da fundamentação do despedimento por assessores e peritos que não podem desempenhar tal tarefa.
c) Está, pois, claramente demonstrado que a execução da decisão recorrida materializará um dano que não pode depois ser revertido, dado que após uma prolação de decisão final em primeira instância o relatório dos assessores não poderá ser refeito, instruindo nova decisão sobre o mesmo caso,
d) O dano e imposição emergentes do despacho em crise são irreversíveis e insusceptíveis de ser reparados. B. Do efeito suspensivo
e) As RR. se encontram a suportar encargos com o seu técnico de Parte que seriam redobradas caso, em caso de procedência da apelação como se espera, venha a ser ordenada nova nomeação dos assessores pelo tribunal.
f) Acresce, ainda, que causará um enorme transtorno a continuação dos trabalhos dos assessores e prossecução do processo que, a proceder o recurso, terá de ser repetida.
g) Assim, as RR. requerem a atribuição de efeito suspensivo ao presente recurso, oferecendo-se para prestar caução caso necessário, embora se deva notar que no caso a decisão não tem uma materialidade económica que beneficie qualquer das RR. pelo que a caução deveria ser dispensada. C. Das alegações
h) O despacho aqui em crise indeferiu requerimento das RR. onde se pedia:
a. A revogação da nomeação da assessora indicada pelos AA., cuja designação por uma das Partes é totalmente contrária à Lei;
b. A revogação da designação do que foi apelidado pelas AA. como “perita”, mas que era executada ao abrigo do artigo 157.º n.º 2 do CPT referente aos assessores.
i) Ora, andou mal o Tribunal a quo pois com a sua decisão – ora recorrida – deferiu a nomeação de um assessor nomeado pelos AA. Ora, os assessores do processo especial de impugnação do despedimento colectivo são nomeados pelo Tribunal a requerimento das Partes e não por estas designados.
j) Assim, a nomeação de uma assessora por uma das Partes viola expressamente o artigo 157.º n.º 2 do CPT, pelo que deve ser revogada a nomeação da assessora indicada pelos AA.
k) Por outro lado, os AA. indicaram uma técnica em 07.07.2021.
l) Ora, o prazo para a indicação de uma técnica por qualquer uma das partes é de 10 dias a contar da notificação do assessor nos termos do artigo 157.º n.º 1, tal como estabelece peremptoriamente o n.º 3 da mesma norma.
m) Considerando que a notificação do assessor, nos termos do artigo 157.º n.º 1, foi efectuada às Partes no dia 25.05.2021, deverá ser revogada a nomeação da técnica indicada pelos AA. em 07.07.2021 - 41 dias depois.
n) Noutro plano, não se poderia, em todo o caso, aceitar a indicação como assessora da Dr.ª S.P.F., dado que esta é uma jurista sem qualquer formação que possa assistir o Tribunal na sua avaliação da fundamentação económica ou de gestão do despedimento.
o) Mas mais, a mesma é Inspectora da ACT e ao ser designada pelos próprios trabalhadores é-lhe vedada pelo próprio Estatuto da Inspecção do Trabalho a execução de tarefas que comprometam a sua independência futura, o que é óbvio quando a mesma aceita ser indicada.
p) Acresce que a assessora em causa está sujeita ao princípio administrativo da legalidade – apenas podendo assumir tarefas no seio da sua relação laboral que se encontrem expressamente previstas na lei. A assunção do papel de assessora em processo especial de impugnação do despedimento colectivo não está entre qualquer das atribuições destes profissionais.
q) Assim, também pela total incompatibilidade das funções de assessora neste processo com as de Inspectora do Trabalho, deve a nomeação da Dr.ª S.P.F. ser revogada.
Após convite para o efeito dirigido pelo tribunal, as Rés apresentaram requerimento esclarecendo que o seu recurso se refere ao despacho datado de 06.09.2021, por entenderem o despacho datado de 09.09.2021 como mera aclaração, “sendo que o mesmo apenas complementa, e bem, o entendimento do despacho anterior, sendo que o recurso das RR. já aborda o despacho original sob a perspectiva da aclaração em causa.”
Por despacho de 21.12.2021, o recurso não foi admitido, motivo pelo qual as Rés reclamaram como segue:
1. As RR. apresentaram recurso do despacho datado de 06.09.2021, aclarado por despacho de 09.09.2021.
2. Tais despachos, admitiram que não só pessoas que se entendem impedidas fossem designadas como assessores e técnico de Parte, no âmbito do artigo 157º do CPT.
3. Mas, e principalmente, admitiu que uma das Partes (os AA.) nomeasse um dos assessores que, segundo o artigo 157.º n.º 1 e n.º 2 do CPT, deveria ser nomeado de forma independente pelo Tribunal, o que desde logo representa um óbvio condicionamento ilegal do Relatório que deveria ser independente.
4. Ao que acresce que, nesses despachos, o Tribunal a quo aceita a indicação de um técnico de Parte, indicado em clara violação do prazo peremptório previsto no artigo 157.º n.º 3 do CPT.
5. Sucede que o Tribunal a quo entende que tais despachos são de mero expediente não interferindo nos direitos das Partes.
6. Mas não podia, salvo o devido respeito por opinião diversa, que é muito, estar mais equivocado.
7. Com efeito, o despacho que não admite o recurso, e do qual ora se reclama, entende que os despachos recorridos são: “(…) despachos de meros expediente…
8. Mas tal não pode ser acolhido, pois não é correcto afirmar que se determinou parecer equivalente a perícia e nomeação de especialista por se entender indispensável à boa decisão.
9. A nomeação de assessor é uma obrigação legal, sendo que a requerimento das Partes, o Tribunal (e não qualquer das Partes) nomeia dois assessores adicionais.
10. Ora, tanto a indicação de um assessor adicional designado por uma das Partes (os AA.) como a indicação de um técnico fora de prazo afectam os direitos das RR. e violam expressamente a lei.
11. Desde logo, porque as RR. não podem legitimamente contar com um Relatório independente quando um dos assessores responsável pelo Relatório é indicado pela parte contrária.
12. Depois porque existe uma óbvia proximidade e veleidade de influência entre o Técnico de Parte nomeado fora de prazo pelos AA. e o assessor também nomeado pelos AA.
13. A assessoria técnica ao Tribunal é um elemento central do procedimento especial de impugnação do despedimento colectivo que, neste caso, se encontra completamente “balanceado” a favor dos AA.
14. É, por isso, óbvio que os direitos dos AA. são colocados em causa quando os despachos recorridos (aqui em causa) dispõem sobre o seu direito legal à igualdade de armas e a um processo equitativo que, desde logo, cumpra os ditames legais.
15. Colocando-se em causa o cumprimento dos ditames legais processuais, nomeadamente os dispostos no artigo 157.º do CPT, o despacho que discorre e decide sobre este tema é naturalmente recorrível e não pode alguma vez ser classificado como de mero expediente ou como simplesmente decidindo sobre impedimentos, até porque não são apenas os impedimentos que estão que estaria em causa.
16. Conforme coloca a melhor jurisprudência e doutrina: (…);
17. Ora, os despachos recorridos influem directamente nos direitos processuais das RR., não se reconduzindo a qualquer dos casos acima descritos, pelo que não são despachos de mero expediente.
Na respectiva resposta, as AA. patrocinadas pelo Ministério Público, concluíram o seguinte:
A. As decisões sobre impedimentos, suspeições e escusas de assessores ou técnicos nomeados pelo Tribunal, ou sobre as reclamações sobre ela apresentadas, são irrecorríveis – art. 157º nº 5 do CPT e 471º nº 3 do CPC.
B. Não são susceptíveis de apelação autónoma, os recursos cujo objecto seja atacar decisão tomada pelo juiz, com respeito pelos princípios da igualdade e do contraditório, para adequação e correcção da marcha dos autos, pois essa decisão assume a natureza de decisão interlocutória inserida no seu poder discricionário – art. 6º nº 1 e 2 primeira parte e 630º nº 1 e 2 do CPC, aplicável por força do disposto no art. 1º nº 2 al. a) do CPT.
C. A impugnação de tais decisões tem obrigatoriamente que ser feita no recurso sobre o despacho saneador, ou com o que for interposto a final ou mesmo em recurso autónomo após trânsito - art. 160º nº 4, 79º A. nº 3 e 5 do CPT e 644º nº 3 e 4 do CPC.
D. O legislador quis restringir, no máximo possível, a possibilidade de se recorrer autonomamente e sem os autos estarem julgados de tais despachos, evitando-se assim o entorpecer do processo, a cada passo ou despacho, e o eternizar-se a chegada do momento em que se possa conhecer de fundo.
E. Não corresponde a um dano irreversível e irreparável a manutenção da assessora e da técnica nomeadas, e que viram essa nomeação confirmada pelo Tribunal, já que o relatório, em cuja elaboração devem participar, está sujeito à livre apreciação do juiz e é apenas um elemento a ter em conta no julgamento do feito, que abarca questões e temas para além do âmbito desse parecer, mesmo quanto aos fundamentos jurídico-económicos - art. 488º do CPC, aplicável por força do disposto no art. 1º nº 2 al. a) do CPT e 160º nº 3 parte final do CPT.
F. Só após se conhecer o conteúdo do parecer é que as partes podem tomar posição sobre o mesmo, conformando-se ou não, com as respectivas conclusões.
G. Daí que a impugnação não se possa fazer por apelação autónoma mas, em eventual recurso sobre o despacho saneador, ou com o que for interposto a final ou mesmo em recurso autónomo após trânsito (art. 160º nº 4, 79º A. nº 3 e 5 do CPT e 644º nº 3 e 4 do CPC), representando o actual recurso instrumento dilatório, a cujo combate o juiz está vinculado (art. 6º nº 1 do CPC, aplicável por força do disposto no art. 1º nº 2 al. a) do CPT) e um atraso injustificado para os autos, urgentes por natureza (Art. 26º nº 1 al. d) do CPT.).
H. Os recorrentes não requereram a prestação de caução, o que desde logo obstaculiza a atribuição do efeito suspensivo – art. 83º nº 2 do CPT.
I. Após a junção do relatório e a realização de audiência prévia, é proferido despacho saneador, que quanto ao cumprimento dos requisitos e à existência de fundamento do despedimento colectivo tem efeito de sentença e é recorrível (art. 160º do CPT) – bem maior seria o tempo de espera por decisão do Tribunal “ad quem”.
J. Como prejuízos consideráveis para a não atribuição do efeito suspensivo, alegam as recorrentes as despesas com o técnico que nomearam e a duplicação do trabalho, resultante da eventual procedência da impugnação – sempre aquelas despesas são recuperáveis a título de conta de custas/custas de parte e grande parte do trabalho seria aproveitável, pelo que os prejuízos são nulos ou irrisórios.
K. Enorme, em contrapartida, seria o prejuízo dos AA. – apesar de o processo ser urgente, decorre há mais de ano e meio (iniciou-se em 17 de Fevereiro de 2020), sendo que os direitos reclamados por cada um rondam, em média, os €50.000,00, e traduzem-se em retribuições e indemnizações que não lhes foram pagas, apesar de terem prestado o trabalho que contratado.
L. A lei permite que qualquer das partes sugira a nomeação de um concreto perito, devendo o juiz nomeá-lo, ouvida a contraparte, se não existirem razões que ponham em causa a sua idoneidade ou competência – art. 157º nº 5 do CPT e 467º nº 2 do CPC.
M. Pelo seu percurso profissional, a assessora nomeada é idónea e competente, profissional e pessoalmente, estando habituada a ser justa, razoável, imparcial, respeitadora dos ditames legais, a prosseguir o interesse público e a tratar de forma igual todos os que integram os conflitos que funcionalmente tem de resolver, pois esses deveres resultam dos princípios que balizam o exercício quotidiano das suas funções (Art. 3º, 4º, 8º., 9º e 10º do CPA), a que não é estranha a intervenção na fase administrativa dos procedimentos de despedimento colectivo, matéria que conhece e onde bem se movimenta, pelo que não havia qualquer razão para que não fosse nomeada.
N. Não existe qualquer incompatibilidade estatutária que afecte a Sr.ª Assessora, chamada a prestar colaboração a Órgão de Soberania, dever cívico que a todos se impõe.
O. Ao corrigir um erro de notificação, que restringia a notificação feita à nomeação de assessores, respeitando o contraditório e a igualdade entre as partes, a Mª Juiz “quo” limitou-se a exercer poder discricionário de conformação da marcha dos autos, o que é perfeitamente legal e a única forma de remover grave prejuízo para uma das partes, que de outra forma se verificaria.
Recebida a reclamação nesta Relação de Évora e distribuída ao relator, este proferiu decisão singular de não admissão do recurso.
Dessa decisão requerem as Rés que recaia Acórdão, afirmando o seguinte:
1. Antes de mais, relembre-se que o despacho de primeira instância de que se reclamou, entendia que as decisões aqui em causa seriam de mero expediente e logo não recorríveis, algo que naturalmente não conheceu acolhimento no Tribunal da Relação.
2. Já a decisão singular que se impugna considerou que o recurso das RR. não seria recorrível por dois motivos:
a. Na parte em que se refere ao impedimento/suspeição, a decisão seria irrecorrível nos termos do artigo 471.º n.º 3 do CPC; e
b. Na parte em que se refere à ilegalidade da nomeação da Assessora e da Técnica em causa, não se estaria perante uma decisão que cuja impugnação com o recurso a final seria absolutamente inútil, nos termos do artigo 79.º-A n.º 2, k), do CPC.
3. Apesar de as RR. poderem compreender a conclusão descrita acima em a), mesmo que continuem a reputar de errada a decisão da Primeira Instância sobre esta matéria, não se podem, com o devido respeito, conformar com a conclusão de Direito acima descrita sob a alínea b).
4. Com efeito, desde logo, não se vislumbra na decisão singular, qualquer recondução dos factos à conclusão de que o recurso apresentado não seria absolutamente inútil se fosse efectuado no final do processo juntamente com eventual recurso da decisão final.
5. Apesar do enorme respeito pelo douto Relator, o ónus de fundamentação da decisão tem de ser executado por referência aos motivos que suportam a conclusão da decisão, algo que não ocorre in casu, onde o Sr. Juiz Relator refere apenas “…o despacho não está ao abrigo dessa norma, face aos termos limitados que o uso do advérbio «absolutamente» impõe”.
6. Mas a decisão nunca refere porquê que o despacho não se reconduz a essa norma, sendo que este foi o principal ponto de recorribilidade alegado no recurso das RR. é precisamente o artigo 79.º-A n.º 2, k), do CPC.
7. Veja-se o que está em causa: a assessora do Tribunal, posição supostamente independente para a execução de um Parecer técnico obrigatório no processo de despedimento colectivo, foi nomeada por uma das Partes (os AA.) ao invés de designada pelo Tribunal como seria obrigatório.
8. Acresce que a Técnica de Parte designada pelos AA. foi nomeada fora de prazo e não deveria ser permitida a sua participação no processo, de acordo com os termos legais.
9. Ora, a participação destas pessoas, ilegalmente nomeadas, na execução e contradição do Parecer obrigatório, ocorre uma única vez e este Parecer não pode ser substituído por outro (pensa-se).
10. Assim, a sua execução por pessoas ilegalmente nomeadas e a sua influência sobre a instância consumar-se-á com a sua emissão, sem possibilidade de que o recurso a final “apague” tal relatório.
11. A não ser que se admita que um eventual recurso com a decisão final, que obtenha provimento sobre esta matéria, tenha o condão de fazer o processo regressar à Primeira Instância para repetição de toda a fase relacionada com a assessoria técnica prevista nos artigos 157.º e 158.º do CPT (com todo prejuízo que tal causaria ao processo e que agora pode ser facilmente evitado), nem se percebe qualquer utilidade desse recurso.
12. Caso não se aprecie agora o recurso em crise, materializar-se-á nos autos a apreciação dos elementos auxiliares da fundamentação do despedimento cuja execução está ferida de ilegalidade notória e patente.
13. A assessoria técnica ao Tribunal é um elemento central do procedimento especial de impugnação do despedimento colectivo que, neste caso, se encontra completamente “balanceado” a favor dos AA., ferindo o seu direito a um processo equidistante e em igualdade de armas, sem que um recurso a final possa repor convenientemente e de forma eficaz a legalidade.
14. Com bem coloca a doutrina, relativamente à possibilidade de apelação aqui em causa: “A forma adverbial implica que a inutilidade corresponda ao próprio resultado do recurso, não se confundido com a mera possibilidade de anulação ou de inutilização de um segmento do processado (…)”
15. Como se aflorou já, que tal dano e imposição são irreversíveis e insusceptíveis de ser reparados pois que não será possível alguma vez às RR. solicitar nova execução do relatório dos assessores neste processo, dano esse emergente de uma decisão sem amparo legal.
16. Veja-se, nesse mesmo sentido, o Acórdão do TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA, de 08.05.2018: “Esta inutilidade verifica-se sempre que o despacho recorrido produza um resultado irreversível (cfr. RC 5/5/1981, BMJ 310, 345), de tal modo que, seja qual for a decisão do tribunal ad quem, ela será completamente inútil (cfr. RL - 29/11/1994, BMJ 441, 390), mas não quando a procedência do recurso possa conduzir à eventual anulação do processado posterior à sua interposição (RL - 30/6/1992, CJ 92/3, 254).”
17. É notório que o eventual provimento a final do recurso da ilegalidade da nomeação da assessoria técnica do Tribunal e da assessoria dos AA. seria não mais do que a proverbial “vitória de pirro”, a que a própria decisão singular faz referência
18. Em face do exposto, dúvidas não subsistem de que o despacho em crise é apelável ao abrigo do disposto no artigo 79.º, n.º 2 alínea k) do CPT.
Em consequência, o Colectivo de Juízes desta Secção Social procede agora ao julgamento da reclamação, em conferência – art. 652.º n.º 3 do Código de Processo Civil.
Os factos a ponderar na decisão constam do relatório.
Aplicando o Direito.
Os termos da decisão do relator que não admitiu o recurso são os seguintes:
«De acordo com o 79.º-A n.º 2 do Código de Processo do Trabalho, na versão actualmente em vigor – conferida pela Lei 107/2019, de 9 de Setembro – cabe recurso de apelação autónoma, entre outros casos: “d) Do despacho de admissão ou rejeição de algum articulado ou meio de prova; (…) k) Da decisão cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil; l) Nos demais casos especialmente previstos na lei.”
Acrescenta o n.º 3 que as restantes decisões proferidas pelo tribunal de 1.ª instância podem ser impugnadas no recurso que venha a ser interposto das decisões previstas no n.º 1.
A primeira instância entendeu que o despacho de 06.09.2021 integrava a categoria de “mero expediente ou proferido no uso legal de um poder discricionário”, e ainda que estava abrangido pela regra da irrecorribilidade a que se refere o art. 471.º n.º 3 do Código de Processo Civil.
Importa desde já notar que o despacho de 06.09.2021 limitou-se a apreciar o requerimento das Rés de 04.08.2021, onde alegaram que uma jurista e inspectora da ACT não podia exercer funções no processo como técnica, por estar impedida face ao seu estatuto profissional, e ainda que não podia ser aceite a nomeação de um assessor adicional, por estar afectada a sua independência.
Ora, os despachos de nomeação da assessora e da técnica, a requerimento das AA., foram proferidos em 06.07.2021 e em 27.07.2021.
Se as Rés pretendiam impugnar a nomeação de tais pessoas para os aludidos cargos, esses eram os despachos que deveria impugnar – e depois discutir-se-ia se o recurso de apelação autónomo era ou não admissível.
Pretenderam as Rés contornar a circunstância da primeira instância ter esgotado o seu poder jurisdicional – art. 613.º n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Civil – quanto à nomeação da assessora e da técnica, a requerimento das AA., através da utilização de um requerimento avulso, apresentado a 04.08.2021, alegando vários obstáculos à nomeação, que se reportam, em parte, à ilegalidade da nomeação, e noutra parte à sua suspeição para o exercício do cargo.
Quanto à matéria que originaria a suspeição daquelas pessoas para o exercício do cargo – obstáculos relativos ao seu estatuto profissional e à sua imparcialidade – o despacho de 06.09.2021 é irrecorrível, porque assim o determina o art. 471.º n.º 3 do Código de Processo Civil.
Quanto à ilegalidade da nomeação, poderá entender-se que o referido requerimento se enquadra na categoria de arguição de nulidade processual, pelo que se poderá discutir a recorribilidade daquele despacho, face à al. k) do n.º 2 do art. 79.º-A do Código de Processo do Trabalho.
No entanto, o despacho não está ao abrigo dessa norma, face aos termos limitados que o uso do advérbio “absolutamente” impõe.
Como se escreveu no Acórdão desta Relação de Évora de 15.12.2016[2], «o uso do advérbio absolutamente marca bem o nível de exigência imposto pelo legislador (…). Deste modo, não basta que a transferência da impugnação para um momento posterior comporte o risco de inutilização de uma parte do processado, ainda que nesta se inclua a sentença final. Mais do que isso, é necessário que imediatamente se possa antecipar que o eventual provimento do recurso não passará de uma “vitória de Pirro”, sem qualquer reflexo no resultado da acção ou na esfera jurídica do interessado. De facto, a inutilidade há-de produzir um resultado irreversível quanto ao recurso, retirando-lhe toda a eficácia dentro do processo, não bastando, por isso, uma inutilização de actos processuais para justificar a subida imediata do recurso. Dito de outro modo: o significado deste preceito não pode ser outro senão o de que (…) só pode ter lugar quando a retenção do recurso o torna absolutamente inútil para o recorrente, e não por qualquer outra razão, como a economia processual ou a perturbação que possa provocar no processo onde o mesmo recurso foi interposto.»
Acresce que o despacho de 06.09.2021 também não se enquadra na categoria de “admissão ou rejeição de algum articulado ou meio de prova” – art. 79.º-A n.º 2 al. d) do Código de Processo do Trabalho – pois a assessoria técnica, prevista no art. 157.º n.º 1 do Código de Processo do Trabalho, já havia sido determinada em despacho anterior.
Numa situação semelhante, a Relação de Coimbra já decidiu, em Acórdão de 27.09.2016[3], que: «I – O procedimento probatório da prova pericial comporta as fases da sua proposição, da sua admissão, da sua preparação (fixação do objecto da perícia) e da sua produção e assunção, sendo que as reclamações contra o relatório pericial e a decisão que sobre as mesmas recaírem inscrevem-se na fase da produção e assunção. II – A decisão de indeferimento de uma reclamação apresentada contra um relatório pericial com fundamento na insuficiência deste por alegada ausência de resposta a alguns dos quesitos formulados, por se considerar que o relatório em questão não padece de tal insuficiência, não envolve qualquer rejeição de qualquer meio de prova, especialmente nos casos em que o reclamante não demonstra e não desenvolve qualquer esforço argumentativo no sentido de que existem realmente quesitos formulados e incidindo sobre matéria passível de prova pericial que não foram objecto de resposta no mencionado relatório. III – Tal decisão de indeferimento também não se conta entre aquelas cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil.»
Em suma, porque a matéria da suspeição da assessora e da técnica nomeadas não é passível de recurso, face ao disposto no art. 471.º n.º 3 do Código de Processo Civil, e porque a restante matéria alegada no requerimento de 04.08.2021 e decidida no despacho de 06.09.2021 não podia ser objecto de recurso autónomo, impõe-se a rejeição da reclamação.»
Na reclamação para a conferência, as Rés insistem que o recurso deve ser admitido, ao abrigo do art. 79.º-A n.º 2 al. k) do Código de Processo do Trabalho, já que a sua retenção causaria danos “irreversíveis e insusceptíveis de ser reparados pois que não será possível alguma vez às RR. solicitar nova execução do relatório dos assessores neste processo.”
Porém, as próprias Rés apresentam o argumento que invalida a sua tese: “A forma adverbial implica que a inutilidade corresponda ao próprio resultado do recurso, não se confundido com a mera possibilidade de anulação ou de inutilização de um segmento do processado.”
O art. 79.º-A n.ºs 3, 4 e 5 do Código de Processo do Trabalho dispõe o seguinte: “3 – As restantes decisões proferidas pelo tribunal de 1.ª instância podem ser impugnadas no recurso que venha a ser interposto das decisões previstas no n.º 1. 4 – No caso previsto no número anterior, o tribunal só dá provimento às decisões impugnadas conjuntamente com a decisão final quando a infracção cometida possa modificar essa decisão ou quando, independentemente desta, o provimento tenha interesse para o recorrente. 5 – Se não houver recurso da decisão final, as decisões interlocutórias que tenham interesse para o apelante independentemente daquela decisão podem ser impugnadas num recurso único, a interpor após o trânsito da referida decisão.”
O despacho que nomeou a assessoria técnica poderá eventualmente ser irregular ou nulo, como as Rés alegam, mas os seus efeitos não são, de todo, irreversíveis.
O tribunal de recurso, ao abrigo das mencionadas disposições, avaliará: (1.º) se a infracção ocorreu; (2.º) se esta modificou a decisão final; e, (3.º) adoptará as providências que couberem, inclusive com anulação ou inutilização de parte do processado.
Poderá suceder que a irregularidade ou nulidade não tenha consequências relevantes na decisão final, pelo que o recurso não se justificará e será inútil, como poderá suceder que tal infracção tenha influência relevante na decisão final, impondo a solução correctiva que couber ao caso.
Mas o que não se pode afirmar é que o recurso, apresentado com o que possa ser interposto com alguma das decisões mencionadas no art. 79.º-A n.º 1 do Código de Processo do Trabalho, se torne “absolutamente” inútil.
Os remédios processuais, por via de recurso, existem e serão os adequados à eventual infracção cometida, pelo que não se vislumbra – por modo algum – a irreversibilidade que as Rés alegam.
O recurso não poderia, pois, ser admitido.
DECISÃO
Destarte, mantém-se a decisão do relator que rejeitou a reclamação do despacho de 21.12.2021 que não admitiu o recurso apresentado pelas Rés.
Custas pelas Rés.
Évora, 28 de Abril de 2022
Mário Branco Coelho (relator) Paula do Paço Emília Ramos Costa
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[1] Consigna-se que, para o efeito, todo o processo pendente da 1.ª instância foi consultado pelo Relator, através do sistema informático de suporte à actividade dos tribunais – art. 15.º n.º 2 al. b) e n.º 3 da Portaria 280/2013, de 26 de Agosto, na versão actualmente em vigor.
[2] Relatora: Albertina Pedroso, Proc. 301/09.2TBVNO-A.E1, publicado em www.dgsi.pt.
[3] Proferido no Proc. 26/11.9TBMDA-A.C1 e publicado no mesmo endereço.