REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
GUARDA DE MENOR
SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA
Sumário

I. Resulta do disposto no artigo 1906.º do CC, preceito nuclear no que respeita à regulação do exercício das responsabilidades parentais, que o superior interesse do menor cumpre-se com a manutenção de uma relação de grande proximidade com os dois progenitores que inclua a partilha de responsabilidades entre eles (cfr. o n.º 8), impondo ao tribunal que aceite acordos ou tome decisões que favoreçam esse convívio.
II. Nessa medida, ao decidir sobre a residência e visitas, o tribunal, conforme impõe o n.º 5 do preceito, deverá atender a todas as circunstâncias relevantes, designadamente, a disponibilidade manifestada por cada um dos progenitores para promover relações habituais do filho com o outro.
III. Comprovado nos autos que desde a separação do casal, ocorrida no ano de 2015, a progenitora vem conseguindo bloquear o convívio regular do progenitor com a filha – situação que se vem agravando, recusando a menor as visitas ao pai –, convivência que não valoriza, não reconhecendo a importância equiparada do papel dos progenitores e a necessidade de estabelecer uma relação próxima, com manutenção de contactos regulares, com o não residente, é de confirmar a decisão de alterar a residência da criança, actualmente com 8 anos de idade, fixando-a junto do progenitor, por ser aquele que assegura o convívio com ambos os progenitores e a partilha de responsabilidades e, nessa medida, melhor satisfaz o superior interesse da menor sua filha.
(Sumário da Relatora)

Texto Integral

Processo: 3190/15.4T8FAR-E.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Faro
Juízo de Família e Menores de Faro - Juiz 3


I. Relatório
(…), progenitor da criança (…), nascida em 8/3/2014, veio requerer a alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais, sendo requerida a progenitora (…), pedindo a final que lhe seja atribuída a guarda exclusiva da identificada filha de ambos, com fixação de adequado regime de visitas a favor da requerida, contactos que, todavia, deverão ser supervisionados.
Alegou em fundamento do seu pedido que o acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais, devidamente homologado por sentença proferida em 14 de janeiro de 2019, tem vindo a ser reiteradamente incumprido pela requerida no que respeita às visitas ao requerente, à semelhança do que ocorria com o anterior regime fixado, vindo aquela a manipular maliciosamente a menor, denegrindo a imagem do progenitor, de modo que a (…) rejeita a presença e companhia deste, com prejuízo para o seu sadio desenvolvimento.
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Citada a requerida, apresentou alegações nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 42.º do RGPTC, refutando a imputação de que vem incumprindo o regime de visitas fixado e afirmando que sempre promoveu o contacto do progenitor com a menor apesar da firme recusa desta em manter tais convívios, o que se deve à inabilidade e falta de motivação do próprio requerente para estabelecer com a filha relação adequada, a que acresce a sua incapacidade para lhe providenciar os cuidados necessários ao nível da alimentação, higiene e supervisão parental durante os fins-de-semana de convívios.
Concluiu pela manutenção da residência da criança junto de si, devendo os convívios com o progenitor serem monitorizados, a fim de ser avaliada a interacção que se estabelece entre ambos.
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Teve lugar conferência de pais em 30/10/2019 (cfr. fls. 123) e nela, não tendo sido possível aos progenitores chegarem a acordo, foi determinada a alteração provisória do regime de convívios da criança, tendo ficado estabelecido que um fim-de-semana por mês o pai se deslocaria ao Algarve, recolhendo a filha no jardim-de-infância à sexta-feira e entregando-a no mesmo local à segunda-feira no início das actividades escolares, sendo que, no fim-de-semana em que a entrega da criança deveria ocorrer em Setúbal, a mesma seria assegurada pelo Ilustre Mandatário da progenitora e sem a presença desta, respectivamente às 10h00 de sábado e às 19h00 de domingo, devendo, em todo o caso, nos convívios em férias, as entregas e recolhas da filha pelo progenitor serem efectuadas através de terceira pessoa da confiança da progenitora, não estando esta igualmente presente. Foi, finalmente, suspensa a instância por 3 meses a fim de se verificar o cumprimento ou não dos convívios assim estabelecidos.
Foi ainda determinada (fls. 148) a realização de nova perícia de avaliação psicológica à criança, tendo o respectivo relatório sido elaborado em 24/6/2020.
Havendo notícia nos autos de que os convívios com o progenitor não estavam a ser assegurados, em 4/3/2021 foi determinado que as recolhas da criança nos fins-de-semana em que o pai se deslocava ao Algarve seriam efectuadas nas proximidades da esquadra da PSP local, não devendo a progenitora acompanhar a filha e sendo o horário da recolha o final das actividades escolares (fls. 258).
Na sequência da realização da audição técnica especializada (cfr. o respectivo relatório a fls. 253 e ss.) teve lugar em 13/5/2021 segunda conferência de pais, na qual foi mantido o regime provisório em vigor e notificados os progenitores para alegarem, querendo, nos termos do n.º 4 do artigo 39.º do RGPTC (cfr. fls. 342 e seguintes).
Requerente e requerida apresentaram alegações (cfr. fls. 344 e 377).
Em 8/11/2021, e perante nova notícia de que os convívios do progenitor com a criança não estavam a ser cumpridos, o Tribunal determinou que, ocorrendo a entrega no Algarve, o pai recolhesse a criança na escola à sexta-feira, sendo que nos convívios com entrega em Setúbal a mãe entregaria a criança ao pai no CAFAP da Moita.
Realizou-se audiência final, no decurso da qual, a requerimento da progenitora, foi ouvida a criança no dia 20/12/2021, audição que teve lugar nos termos do n.º 1 do artigo 5.º do RGPTC.
Finda a audiência foi proferida douta sentença que, na procedência da acção, decretou como segue:
“1. A residência da criança é fixada junto do seu pai no concelho de Setúbal.
2. As questões de particular importância na vida da (…) serão decididas de comum acordo entre os pais, salvo em caso de emergência manifesta, hipótese essa em que o progenitor que estiver com a criança poderá tomar a decisão sozinho, comunicando-a logo que possível ao outro progenitor.
3. Entendem-se por questões de particular importância, designadamente, as seguintes:
Mudança de residência da criança para fora de um raio de 30 quilómetros da sua residência actual junto do progenitor;
Mudança do ensino público para o ensino privado ou vice-versa;
Sujeição da criança a intervenções cirúrgicas dos quais resulte perigo grave para a sua vida ou integridade física;
Prática de desportos radicais da qual resulte perigo grave para a sua vida ou integridade física;
A educação religiosa até aos 16 anos de idade;
A participação em programas televisivos;
A administração de bens da criança que implique a sua alienação ou oneração;
A autorização para casamento;
A autorização para obtenção de licença de ciclomotores;
A representação em juízo.
4. As questões da vida corrente da criança em matéria de educação e saúde serão decididas em exclusivo pelo progenitor, tendo a progenitora direito a ser informada das mesmas, caso o requeira. O pai exercerá o cargo de encarregado de educação na escola, tendo a progenitora direito a obter informações sobre a evolução escolar da filha da parte do novo estabelecimento de ensino por esta frequentado.
5. As demais questões da vida corrente da criança serão decididas pelo pai nos momentos em que esteja com a criança, sendo decididas pela mãe nos períodos em que a progenitora conviva com a filha, devendo esta respeitar as orientações educativas mais relevantes decididas pelo progenitor.
6. Até final do mês de Janeiro de 2022, os convívios da criança com a progenitora ficarão suspensos nos termos do n.º 3 do artigo 40.º do RGPTC, podendo esta, no entanto, contactar a filha por telefone ou video-chamada com periodicidade trissemanal em horário acordado entre os pais ou, na impossibilidade de tal acordo, às terças, quintas e sábados entre as 19h00 e as 20h00, sem prejuízo igualmente da possibilidade de contactar a filha por essas vias no aniversário desta ou no aniversário da mãe, no dia da mãe, domingo de Páscoa, Consoada e dia Natal, caso tais datas festivas ocorram durante o período de suspensão de convívios ou no período convívios supervisionados infra fixado. Durante esse período de suspensão de visitas, o CAFAP reunirá com o pai e a criança, explicando a esta última o sentido da intervenção aludida no ponto 7) da presente sentença.
7. Para além dos contactos por telefone com periodicidade trissemanal referidos em 6), a partir do início do mês de Fevereiro de 2022, a mãe conviverá com a filha em convívios supervisionados pelo CAFAP da Moita com periodicidade quinzenal e duração não inferior a 1 hora (podendo tal duração ser superior de 2 horas ou mais horas, caso tal entidade assim o entenda e contar com a participação de outros familiares do lado materno nos termos que tal entidade entenda convenientes) pelo período de 5 meses (sem prejuízo de o CAFAP poder informar o Tribunal da desnecessidade da supervisão de tais visitas em período temporal mais curto, caso em que este poderá decidir mais cedo a modificação do regime de convívios nos termos infra estabelecidos). Para o efeito, o CAFAP informará até final de Março, bem como até 10/6/2022, mediante parecer fundamentado, se existem ou não condições para que os convívios deixem de ser supervisionados, o que dependerá da avaliação do cumprimento dos convívios, da relação estabelecida entre mãe e filha, da ausência de sinais de comportamentos alienantes por parte da progenitora e da condição emocional da criança. Não havendo decisão favorável no final do referido período de 5 meses, os convívios continuarão a ser supervisionados nos termos supra-referidos, sendo a situação reavaliada de 2 em 2 meses, mediante novas informações prestadas pelo CAFAP no final desses períodos.
8. Findo o período de convívios supervisionados e caso exista decisão favorável do Tribunal nesse sentido, a mãe conviverá com a filha sem supervisão nos seguintes termos:
Em fins-de-semana com periodicidade quinzenal, deslocando-se a progenitora 1 vez por mês a Setúbal e convivendo com a filha entre as 10h00 de sábado e as 19h00 de domingo, para o efeito, recolhendo a criança em casa do progenitor e entregando-a no mesmo local, sendo que 1 vez por mês o pai deslocar-se-á a Tavira com a filha entregando-a à progenitora entre as 17h00 e as 18h00 de sexta-feira e recolhendo-a entre as 18h00 e as 19h00 de domingo.
Nos meses de Julho e Agosto de cada ano, com excepção do ano de 2022, em 2 períodos de 15 dias, um em cada mês, ocorrendo, na falta de acordo em sentido contrário por parte dos pais, tais convívios nas primeiras quinzenas de cada mês. Sem prejuízo, no ano de 2022, a mãe poderá conviver com a criança por 2 períodos de 1 semana em cada um dos referidos meses, ocorrendo tais convívios, na falta de acordo em sentido contrário entre os pais, nas segundas semanas de cada um dos referidos meses.
Nas férias escolares do Natal, a criança passará, em 2022, a semana que inclui o Natal (entre 19/12, pelas 10h00, a 26/12, pelas 10h00) com a mãe, passando a semana que inclui a passagem de ano (entre 26/12, pelas 10h00 e 2/1) com o pai. No ano seguinte, a criança passará a semana que inclui o Natal com o pai, passando a semana que inclui a passagem de ano com a mãe.
E assim sucessivamente, de forma alternada.
Nas férias escolares da Páscoa de 2023 (atento os convívios supervisionados previstos para esse período em 2022), a criança passará a semana de férias que inclui o domingo de Páscoa com a mãe, passando a outra semana de férias escolares com o pai.
As entregas nos períodos de férias do Verão, do Natal e da Páscoa serão realizadas na residência do pai, deslocando-se a progenitora para o efeito a Setúbal, sendo as recolhas efectuadas em Tavira, junto da residência da progenitora, deslocando-se, nesse caso, o progenitor. O horário das recolhas e entregas, na falta de acordo em sentido contrário dos pais, será às 10h00 de cada dia de recolha ou de entrega.
No aniversário da criança, a mesma poderá fazer uma refeição com cada um dos progenitores, sendo que, no ano de 2023, o pai almoçará com a criança e a mãe jantará com a filha, alternando no ano seguinte, jantando a (…) com o progenitor e almoçando a criança com a mãe. E assim sucessivamente de forma alternada. Para esse efeito, os horários de almoço e de jantar são fixados, na falta de acordo em contrário, entre as 11h00 e as 15h00 e entre as 17h30 e as 21h30.
No aniversário dos pais, cada progenitor aniversariante poderá jantar com a criança entre as 17h30 e as 21h30.
No dia do pai, a criança jantará com o progenitor, sendo que, no dia da mãe, a criança jantará com a progenitora, sendo o horário entre as 17h30 e as 21h30.
Em todos os períodos de convívios não supervisionados entre a mãe e a filha, a criança deverá fazer-se acompanhar dos seus documentos, devendo a progenitora entregar tais documentos ao progenitor no final do período de convívio.
9. Enquanto durarem os convívios supervisionados, a mãe pagará, a título de alimentos devidos á criança a quantia mensal de € 150,00, a qual será liquidada por transferência bancária para a conta do progenitor que este indicará à progenitora no prazo de 48 horas, até ao dia 25 de cada mês com início em Janeiro de 2022. A partir do início dos convívios não supervisionados, a prestação de alimentos será aumentada para o valor de € 220,00. Sem prejuízo, a prestação de alimentos será actualizada anualmente à razão de € 4,00 ao ano.
10. As despesas médicas, medicamentosas e escolares de valor igual ou superior a € 20,00 serão repartidas entre os pais, devendo o progenitor que liquidar o encargo comunicá-lo por escrito (sms ou e-mail) ao outro no prazo de 15 dias após o pagamento, juntando recibo comprovativo. O progenitor devedor deverá proceder ao pagamento de metade do valor da despesa no prazo de 15 dias após tal comunicação.
11. Fica totalmente revogado o anterior regime de regulação do exercício das responsabilidades parentais estabelecido no acordo de 14/1/2019 homologado por sentença no processo principal.
12. O cumprimento do presente regime será fiscalizado a partir da presente data e pelo período de 1 ano pela ATT / EMAT de Setúbal, juntando tal entidade, para o efeito, relatórios trimestrais que darão conta do cumprimento ou não do presente regime e da evolução da situação de vida da criança (cfr. artigo 40.º, n.º 6 e 7, do RGPTC).
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Inconformada, apelou a requerida e, tendo desenvolvido nas alegações apresentadas as razões da sua discordância com o decidido, formulou a final as seguintes conclusões:
1.ª A ora recorrente sempre diligenciou pela entrega da menor sua filha, mesmo quando afastada pelo Tribunal a pedido do requerente.
2.ª Informou sempre atempadamente e justificando a ocorrência de qualquer impossibilidade junto do requerido.
3.ª A menor tem sido entregue ao Pai dentro dos moldes plasmados pelo tribunal até ao limite do possível por terceiros.
4.º A entrega da menor ao pai tem ocorrido junto da casa de morada da menor, o que foi uma decisão do pai, como consta dos autos.
5.ª Posteriormente, a pedido do requerente, a menor passou a ser entregue na escola.
6.ª O vídeo junto aos autos pelo progenitor encontra-se manipulado nas suas propriedades; no entanto, o Tribunal acolheu o mesmo, mas tal vídeo não prova que a menor tenha dito que a mãe lhe dizia para não ir com o pai, antes o oposto é dito pela menor.
7.ª Neste sentido, o Tribunal andou mal, pois tem uma suposta prova manipulada de que tem conhecimento, Pen, e também pelo áudio é percetível o oposto do que a douta sentença menciona sobre a verbalização da menor.
8.ª O Tribunal, o MP e a assessoria técnica do ISS têm conhecimento do pai bater na menor, mas ainda assim nada fazem.
9.ª O Tribunal, ao longo de toda a sentença, omite factos e provas por as mesmas serem inconvenientes ao pai da menor.
10.ª A sentença não invoca o relatório pericial de 4/4/2018 junto aos autos, no qual o pai, na pág. 12, é impelido a fazer ajuda especializada quanto à eventual tendência ao predomínio das variáveis de funcionamento da personalidade (…) com recurso a enquadramento em ajuda especializada com acompanhamento em serviço de saúde.
11.ª Não existe qualquer ruptura na relação da menor com o pai, que continua a passar fins de semana com a filha.
12.ª O Tribunal, na douta sentença, anula toda a prova médica, não a reconhecendo, muito embora a mesma seja variada e só de instituições públicas, assumindo conhecimentos clínicos sobre o que é uma doença ou não.
13.ª A recorrente nunca quis incumprir com as visitas ao pai, tendo inclusive sugerido a possibilidade, aquando da interrupção por via da tramitação processual, do progenitor ver a menor sem restrições de horas ou dias na localidade onde esta reside, sem que o mesmo tivesse aceitado.
14.ª Mesmo com relatórios de pedo psicologia do SNS, onde a menor vem sendo acompanhada desde tenra idade, que o medo de a menor ficar na escola deve-se ao pai, tal não foi considerado, logo, pressupõe-se que o tribunal tem conhecimentos de psicologia, o que não se aceita.
15.ª Com o comportamento de que vem acusada a recorrente nunca previu que tal imputação pudesse ser uma consequência necessária da sua conduta, conduta que é no sentido de salvaguardar a menor de perigos/saúde/pandemia, e se fosse acautelada pelo pai, nas mesmas circunstâncias, não deveria ser merecedor de tal imputação.
16.ª Nunca a recorrente previu, com toda a factualidade descrita e junta aos autos, como possível realizar qualquer facto ilícito de que vem acusada, sempre se norteou no interesse da criança e deu alternativas viáveis para compensar o pai no convívio com a menor.
17.ª A recorrente nunca impediu o convívio da menor com o pai, inclusive, tendo sugerido em diálogos diversas soluções para tal, o que consta dos autos.
18.ª Em momento algum se verifica um único aponte ao comportamento ou incumprimento do pai na decisão de que se recorre, embora os autos tenham matéria e prova documental que o prova.
19.ª Por todo o exposto, mostra-se claro a indignação da recorrente à imputação inferida pelo Tribunal “a quo”, pois, salvo melhor e mais esclarecida ponderação, não foram atendidos todos os factos e provas juntas aos autos, motivo pelo qual se recorre.
20.ª Quando na douta sentença se faz menção à audição da menor em 20/12/2021, que a mesma tenha autorizado/aceite passar as férias de natal com o pai, manifestando espontaneamente querer conhecer a irmã.
21.ª Também não se aceita que o tribunal diga que conhece muito bem o pai, portanto o mesmo tem de justificar a que nível surge tal conhecimento, sob pena de suspeita de favorecimento em sede da decisão de que se recorre.
22.ª Considerou o Tribunal na douta sentença de que se recorre que as testemunhas de sangue do pai da menor são mais credíveis do que as restantes testemunhas, porquanto sabe-se que não foram apresentadas mais nenhumas testemunhas por parte do pai.
23.ª É falso que a depoente(...), técnica da ATT, ou os relatórios do CAFAP tenham mencionado ou provem que a progenitora tenha exercido qualquer influência sobre a menor e o seu comportamento de rejeição em ficar com o pai, porquanto foram inquiridas todas as testemunhas e as mesmas sempre disseram que nunca ouviram qualquer menção em desfavor do pai pela mãe da menor.
24.ª A percepção do perito quanto à alienação parental foi desmentida a requerimento da requerente, dizendo o Juiz que tal não resultava da perícia, factos registados em áudio em 14/10/2020 na conferência de pais.
25.ª O requerente pede desde o início do processo a guarda da menor para a avó paterna e depois para ele.
26.ª Admitir a transferência da residência da menor para o progenitor não securizante contraria todos os estudos existentes sobre o papel das relações afectivas privilegiadas no desenvolvimento da menor e resulta numa regressão desta, como ser humano com direito à sua opinião e reconhecimento da sua progressiva autonomia.
27.ª Assim, não se aceita a douta sentença, que se impugna, porquanto contém erros manifestos e graves na apreciação da prova, o que torna nula a sentença proferida, o que se requer”.
Conclui pedindo a revogação da sentença recorrida e sua substituição por decisão que atribua a guarda da menor à recorrente e fixe junto de si a residência da mesma no concelho de Tavira, mantendo em vigor quanto ao mais o acordo formalizado em 14/1/2019, devendo o convívio do progenitor com a menor ser avaliado pelo Gasmin (avaliações trimestrais até a menor perfazer 12 anos).
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Contra-alegaram o requerente e o MP, defendendo ambos a manutenção do decidido, tendo suscitado a título prévio a impossibilidade de ser conhecida a impugnação que pela recorrente foi deduzida contra a decisão da matéria de facto, por incumprimento dos ónus prescritos no artigo 640.º do Código de Processo Civil.
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Assente que pelo teor das conclusões se fixa e delimita o objecto do recurso, são as seguintes as questões submetidas à apreciação deste Tribunal:
i. indagar do cumprimento dos ónus consagrados no artigo 640.º do CPC;
ii. determinar se a sentença é nula.
iii. conhecer da impugnação da decisão de facto e
iv. determinar se a regulação do exercício das responsabilidades parentais assegura o superior interesse da criança (…).
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i. Do cumprimento dos ónus consagrados no artigo 640.º do CPC
Dispõe o artigo 32.º do RGPTC que os recursos são processados e julgados como em matéria cível, sendo o prazo de alegações e resposta de 15 dias (cfr. n.º 3), donde ser aplicável a estes recursos o disposto no artigo 640.º do CPC (o que de algum modo justifica a necessária intervenção de advogado nesta fase, como imposto pelo n.º 1 do artigo 18.º daquele primeiro diploma).
Resulta do disposto no n.º 1 do citado artigo 640.º que, sendo impugnada a decisão sobre a matéria de facto, o recorrente está vinculado ao cumprimento de três requisitos formais, cuja inobservância conduz à rejeição do recurso nesta parte, a saber: i. terá necessariamente de especificar os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; ii. terá ainda de especificar os concretos meios probatórios, constantes do processo ou registo da gravação, que impunham uma decisão diversa sobre os pontos de facto objecto da impugnação, ónus cujo cumprimento demanda a reapreciação crítica dos meios de prova e, estando em causa prova gravada, a exacta indicação das passagens em que o recorrente funda a sua discordância (podendo ainda, se assim o entender, proceder à respectiva transcrição); iii. terá finalmente de enunciar a decisão alternativa.
Por outro lado, sabendo-se que é pelas conclusões que se define o objecto do recurso (cfr. artigo 635.º do CPC), delimitando os poderes de cognição do tribunal superior, havendo impugnação da matéria de facto é de exigir ao impugnante que nelas especifique os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e, bem assim, o sentido da decisão que sobre eles, em seu entender, diligência processual mínima a cumprir pelo recorrente para que a impugnação possa ser conhecida. Assim o entendeu o STJ no acórdão do STJ de 9 de Junho de 2021 (processo 10300/18.8 T8SNT.L1.S1, em www.dgsi.pt), no qual concluiu que
“I- Os ónus processuais de alegação recursiva previstos no artigo 640.º, 1 e 2, do CPC, relativos à impugnação da decisão sobre a matéria de facto, conjugam-se com o ónus de formulação de conclusões, cominado, em caso de incumprimento, com o indeferimento do recurso.
II. A rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve verificar-se quando (i) falte nas conclusões a referência à impugnação da decisão sobre a matéria de facto (artigos 635.º, 2 e 4, 639.º, 1, 641.º, 2, alínea b), CPC); (ii) quando falte nas conclusões, pelo menos, a menção aos «concretos pontos de facto» que se considerem incorrectamente julgados (artigo 640.º, 1, alínea a)), sendo de admitir que as restantes exigências das alíneas b) e c) do artigo 640.º, 1, em articulação com o respectivo n.º 2, sejam cumpridas no corpo das alegações.
III- Se as conclusões recursivas são totalmente omissas quanto à matéria da impugnação da decisão da matéria de facto, verifica-se o manifesto incumprimento da diligência processual mínima do recorrente, resultante da relação intersistemática do artigo 640.º com os artigos 635.º, 2 a 4, e 639.º, 1 e 2, espoletando a sanção cominada, em coordenação, pelo corpo do artigo 640.º, 1, e pelo artigo 641.º, 2, alínea b), do CPC – a rejeição do recurso (neste caso, da revista normal interposta a título principal)”.
No caso presente verifica-se que a recorrente, ao longo das alegações que apresentou, identificou vários pontos da matéria de facto que, em seu entender, contêm incorrecções (erro na data ou identificação do estabelecimento de saúde onde a criança foi levada pela progenitora) ou mesmo erros de julgamento, isto pese embora na maior parte dos casos sem individualizar e localizar os meios de prova que impunham uma decisão diversa, tendo-se limitado a apresentar a sua versão, num arrazoado frequentemente de difícil compreensão, remetendo para SMS e documentos “já juntos aos autos”. Não obstante, nas conclusões que a final formulou omitiu em absoluto a indispensável indicação dos factos elencados na sentença que tem por erradamente julgados e qual o sentido da decisão por si preconizado, limitando-se a fazer afirmações contrárias às conclusões que pelo Tribunal foram extraídas dos factos julgados provados (caso das conclusões 1.ª a 5.ª., 11.º, 13.ª e 17.ª), com a identificada excepção dos pontos 54. e 83., uma vez que questiona a validade dos meios de prova que os fundamentam.
Tal omissão, e com a única ressalva dos acima identificados pontos, tem por efeito a rejeição do recurso na parte respeitante à impugnação da matéria de facto, sem que tenha lugar convite ao aperfeiçoamento das conclusões, o que se decide.
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ii. Da nulidade da sentença
A apelante invoca a final a nulidade da sentença, efeito que retira dos “erros manifestos e graves na apreciação da prova”, que alegadamente contém.
Ora, os vícios que acarretam a nulidade da sentença são os taxativamente previstos nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, visando, todos eles “o erro na construção do silogismo judiciário e não o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão ou a não conformidade dela com o direito aplicável” (acórdão do STJ de 03-10-2017, Revista n.º 2200/10.6TVLSB.P1.S1, da 1.ª secção). Mesmo a nulidade e falsidade dos meios de prova que no corpo das alegações vem invocada pela recorrente no que se refere à gravação do episódio referido no ponto 54. e audição da criança que fundamentou o ponto 83., podendo afectar o julgamento da matéria de facto, não é susceptível de afectar a legalidade formal da sentença, termos em que improcede a arguida nulidade.
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Iii. Da impugnação da matéria de facto no que respeita aos pontos 54. e 83.
Invoca a recorrente que a gravação do episódio relatado em 54. foi manipulada, o que seria do conhecimento do Tribunal, impugnando que a criança tenha referido quanto se encontra vertido em 83., dizendo ainda não aceitar “que o tribunal diga que conhece muito bem o pai, portanto o mesmo tem de justificar a que nível surge tal conhecimento, sob pena de suspeita de favorecimento em sede da decisão de que se recorre”.
No que se refere ao relato que é feito no ponto 54. do episódio ocorrido no dia 15/11/2019, não pode deixar de se assinalar a contradição da alegação da recorrente que, se por um lado afirma ter sido a gravação manipulada, por outro lado defende que, conforme se pode ouvir na mesma, a criança disse o contrário do que lhe é imputado o que, obviamente, suscita a questão de saber no que é que consistiu a alegada manipulação e qual o propósito da mesma.
Sem embargo, sempre se dirá que, vista a gravação, e apesar da habilidosa transcrição, mediante introdução de enganosa pontuação, daquilo que pela criança foi dito no que respeita àquela passagem essencial, a verdade é que a criança afirmou quanto se reproduziu no ponto impugnado, inexistindo quaisquer indícios de manipulação do registo em causa. Aliás, a reacção imediata do requerente, assinalando e repetindo o que pela criança havia sido dito, afasta tal asserção.
Mantém-se, pelo exposto, o ponto impugnado nos seus precisos termos.
Quanto ao também impugnado ponto 83., arguiu a recorrente a nulidade da audição da menor por terem sido alegadamente cometidas irregularidades no seu decurso, apontando a recusa em autorizar que a menor tivesse sido acompanhada por pessoa da sua confiança, conforme previamente solicitara.
A este respeito, faz-se notar que a audição da criança foi determinada para ter lugar nos termos do artigo 5.º do RGPTC, tendo sido agendado para o efeito o dia 29/12/2021.
Na data agendada, foi efectivamente proferido despacho a autorizar, nos termos do artigo 4.º, alínea c), do RGPTC, a presença de pessoa da confiança da menor durante a sua inquirição, sem prejuízo, ficou então consignado, do poder/dever do tribunal verificar a identidade de tal pessoa tendo em vista assegurar-se que, em razão da sua proximidade com o conflito, não devesse estar presente na diligência (cfr. fls. 756 destes autos).
Constata-se ainda da acta de fls. 757 que, aquando da inquirição, se encontravam presentes apenas, para além do Sr. Juiz, da Sr.ª Procuradora e da Sr.ª escrivã Auxiliar, os Ilustres Mandatários de requerente e requerido, a menor e a consultora técnica, Dr.ª (…), sem que tivesse sido então arguida qualquer irregularidade.
Por requerimento entrado em juízo no dia 24/12 veio a requerente invocar ter a menor solicitado ser acompanhada pelo tio, na ocasião em que, em momento prévio à diligência, foi convidada a acompanhar a Sr.ª Técnica e a Sr.ª Escrivã Auxiliar, o que não lhe foi concedido, causa da nulidade que agora invoca em sede de recurso.
Nos termos do artigo 33.º do RGPTC, nos casos não expressamente previstos são aplicáveis as regras do processo civil que não contrariem as finalidades da jurisdição de menores, logo, as normas gerais atinentes à nulidade dos actos praticados no processo – artigos 195.º e seguintes do Código de Processo Civil.
Resulta do artigo 195.º que a prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou formalidade que a lei prescreve, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou decisão da causa (vide o n.º 1). Em qualquer caso, não se tratando de nulidade de conhecimento oficioso, as nulidades só serão conhecidas se reclamadas pelos interessados, nos termos e prazos prescritos nos artigos 196.º, 198.º e 199.º.
No caso em apreço, ainda a admitir que foi cometida irregularidade – não deixando todavia de se assinalar que a presença do tio da menor, pelo envolvimento no processo e intervenção em episódios pretéritos de conflito com o requerido e familiares deste, dificilmente seria de admitir – encontra-se absolutamente por demonstrar que tivesse valor de nulidade. Com efeito, e como se verifica pela audição da gravação, uma vez ultrapassados natural timidez e embaraço iniciais, a menor manteve diálogo com o Sr. Juiz e com a técnica, respondendo ao que lhe foi perguntado, não denotando constrangimento, o qual, aliás, a ter-se verificado, teria sido seguramente notado pelo Il. Mandatário da requerente, que não deixaria então de suscitar a questão.
Mas ainda que estivéssemos perante uma nulidade, encontrando-se presente na diligência o Il. Mandatário da requerente, a mesma teria que ser arguida até ao final do acto; não o tendo sido – ainda a ter ocorrido, o que se afigura não ser o caso – , sempre teria de se considerar sanada.
Inexistindo, pelo exposto, fundamento para recusar a validade da audição da criança como meio de prova, analisada a transcrição que pela própria recorrente é feita, torna-se evidente que a frase destacada e com a qual pretende pôr em causa a imparcialidade do julgador surge como absolutamente descontextualizada, o que não é inocente. Com efeito, face à afirmação da criança de que “o pai iria matar a Mãe e que ela (mãe) iria presa”, e sem comentar a evidente contradição que tal afirmação encerra, o Sr. Juiz sossegou-a, assegurando-lhe que conhecia o pai e que ele não faria uma coisa dessas, para completar de seguida com “Ele nunca faria isso (…) eu já falei muitas vezes com o teu pai e conheço a história, porque a tua situação já foi há muitos anos no Tribunal (…) o teu pai nunca faria isso”.
No assinalado contexto, como parece evidente, o Sr. Juiz apelou ao conhecimento que tem do requerente pelo facto de ser o titular de um processo que se arrasta há anos no Tribunal, pretendendo tranquilizar a criança, tal e qual como seguramente faria caso a criança afirmasse que a Mãe queria matar o Pai, surgindo como manifestamente injusta e injustificada a suspeição que a recorrente pretende lançar sobre o Sr. Magistrado.
Não deixará por último de se sublinhar que a grande questão que tal audição coloca é antes a de saber o que é que terá levado a criança a fazer tão gravosa afirmação, algo a que a recorrente não dá resposta. Tal como não responde ao facto de a menor declarar que ficava doente por causa do Pai, mas quando perguntada pelo Sr. Juiz sobre o motivo de tal afirmação, se ter limitado a responder “não sei”.
Por outro lado, e resultando evidente da transcrição que a Sr.ª técnica tinha feito uma prévia explicação à criança dos termos em que iria decorrer a sua audição e que tinham então falado da conveniência de estar com o pai e de que tinha uma irmã que com certeza gostaria de conhecer, ao que a criança, segundo a informação por aquela prestada, teria acedido, não se detectou na audição que fizemos da gravação qualquer indício de que o tribunal tenha “sobreposto a sua própria vontade à da menor”, tenha feito considerações sobre a idoneidade do pai “no sentido de convencer a menor” a acompanhá-lo, “estando a menor indefesa”, trazendo exemplos próprios “para justificar o sofrimento que a menor irá passar, o que é inadmissível e vergonhoso”, afirmações ousadas e de todo infundamentadas – e isto é o mínimo que a respeito das mesmas se pode dizer.
Não existindo, pelo exposto, razão para duvidar das declarações da Sr.ª técnica, que naturalmente nenhum interesse tem no processo, salvo o de favorecer o bem-estar da criança, e porque nenhuma das imputações da recorrente obtiveram confirmação, mantém-se nos seus precisos termos também o ponto 83.
Finalmente, pretende a recorrente que “O Tribunal, o MP e a assessoria técnica do ISS têm conhecimento do pai bater na menor, mas ainda assim nada fazem”, imputando ao Tribunal a omissão “ao longo de toda a sentença” de “factos e provas por as mesmas serem inconvenientes ao pai da menor”, não tendo sido considerados “o relatório pericial de 4/4/2018 junto aos autos, no qual o pai, na pág. 12, é impelido a “fazer ajuda especializada quanto à eventual tendência ao predomínio das variáveis de funcionamento da personalidade”, tendo ainda o Tribunal procedido “à anulação de toda a prova médica, não a reconhecendo, muito embora a mesma seja variada e só de instituições públicas, assumindo conhecimentos clínicos sobre o que é uma doença ou não”, aqui reportando-se, ao que consegue alcançar-se do alegado, aos “relatórios de pedo psicologia do SNS, onde a menor vem sendo acompanhada desde tenra idade”, dos quais resultaria que “o medo de a menor ficar na escola deve-se ao pai”, tendo finalmente e de forma injustificada considerado “que as testemunhas de sangue do pai da menor são mais credíveis do que as restantes testemunhas”.
No que respeita à alegação de que o Tribunal, o MP e a assessoria técnica têm conhecimento de que o pai bate na criança, há que reputá-la com firmeza. Com efeito, para além da verbalização feita pela (…) de que o pai, numa ocasião não identificada, “do nada” lhe teria batido ao pé da … (a avó paterna, cujo nome, porém, a menor diz desconhecer, o que não deixa de ser significativo, quando identifica correctamente a avó materna como tal) e da … (a actual companheira do progenitor), trata-se de episódio que, para lá do próprio relato não fazer sentido – no dizer da criança o pai ter-lhe-ia batido “do nada” – não obteve qualquer confirmação, não existindo nos autos o menor indício de que o pai não tenha para com a filha um comportamento adequado, isto num contexto em que, não será por demais sublinhá-lo, decorreram 31 visitas supervisionadas entre pai e filha. Trata-se, pois, de uma afirmação absolutamente gratuita e sem suporte factual por parte da recorrente.
Quanto à alegada omissão de factos e provas por, alegadamente, “serem inconvenientes ao pai da menor”, imputação grave e, nessa medida, carecida de concretização, a recorrente indica a, em seu entender indevida, desconsideração do relatório pericial de 4/4/2018 junto aos autos. Trata-se, no entanto, de elemento do qual não se retira que o progenitor não detenha competências parentais, nem a recorrente tão pouco indica com precisão em que medida é que tal elemento de prova deveria ser repercutido na decisão.
A dita “anulação” pelo tribunal das provas médicas, nomeadamente os relatórios elaborados pela psicóloga clínica Dr.ª (…), que vem acompanhando a criança, não corresponde com rigor à verdade do processo. Tais elementos probatórios foram apreciados, encontrando-se detalhada e claramente explicado na motivação elaborada o motivo pelo qual tais elementos foram preteridos quando confrontados com outros, nomeadamente os relatos das visitas supervisionadas, testemunhos das técnicas que acompanharam o processo e destacadamente os relatórios das perícias a que a menor foi sujeita em 2017 e, posteriormente, em 2020 (fls. 109 a 112 verso a 197 a 200 verso), juízo valorativo que aqui se secunda inteiramente. De todo o modo, é claramente excessiva a ilação que a recorrente retira desses elementos no sentido de que deles resultaria que “o medo de a menor ficar na escola deve-se ao pai”, sendo certo ainda, aspecto da maior relevância, que nada se adianta quanto aos motivos para esse medo.
Não merece nenhuma referência suplementar a afirmação de que “as testemunhas de sangue do pai da menor são mais credíveis do que as restantes testemunhas”, uma vez que na motivação da decisão se dá conta detalhada e exaustivamente do processo de formação do tribunal, apontando-se com clareza quais os meios de prova que foram determinantes para a prova de cada facto e porquê e quais os elementos probatórios que foram preteridos e justificação para tal, argumentos que a apelante nem sequer tenta contrariar.
Em suma, sendo insubsistentes os fundamentos invocados em suporte da impugnação deduzida, julga-se a mesma totalmente improcedente, mantendo-se a decisão proferida sobre a matéria de facto, procedendo-se, no entanto, à rectificação do ponto 78. em conformidade com os docs. de fls. 668/669.
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II. Fundamentação
De facto
São os seguintes os factos a considerar:
1. O Requerente, (…), e a Requerida, (…), casaram-se em 18 de Setembro de 2010.
2. Na constância do referido casamento, nasceu, em 8/3/2014, a criança (…).
3. Os pais da (…) separaram-se em Julho de 2015, tendo a progenitora nessa data decidido sair de casa, levando a criança consigo para casa da sua mãe no Algarve, onde passou a residir temporariamente com a filha.
4. Até arrendar casa em Tavira a partir de 15/11/2015, altura em que ambas, mãe e filha, passaram a residir juntas na referida habitação arrendada.
5. Em 10/11/2015, no âmbito do processo de divórcio nº 13279/15.4T8LRS que correu termos na Instância Central Secção de Família e Menores (J1) de Loures, Requerente e Requerida alcançaram acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais relativamente à sua filha (…), nos termos do qual:
- A criança ficava confiada à guarda e cuidados da sua mãe, com quem residiria, competindo em comum aos pais da criança o exercício das responsabilidades parentais no que respeita às questões de particular importância para a sua filha, nomeadamente, no que respeita às mais relevantes atinentes à sua segurança, saúde, educação e formação.
- A (…) passaria na companhia do pai fins-de-semana alternados, devendo o pai, até concluir um curso de formação que se encontrava a frequentar, recolher a criança em casa da mãe às 20h00, entregando-a novamente pelas 19h00 do domingo seguinte.
- A criança passaria em regime de alternância na companhia do pai e da mãe as datas festivas correspondentes à véspera de Natal, dia de Natal, noite de passagem do Ano, dia do Ano Novo, dia de Carnaval e domingo de Páscoa, sendo que estaria com o progenitor na noite de Consoada do ano de 2015, passando com a progenitora o dia de Natal, com aquele na noite de passagem de ano e com esta no dia de Ano Novo, com o pai no dia de Carnaval em 2016 e na companhia da mãe de 2016, alternando as datas com cada progenitor no ano seguinte.
- No dia de aniversário da criança, os pais fariam uma refeição cada com a criança, alternando de ano para ano quem jantaria com a filha e passando esta os dias de aniversários dos progenitores com o progenitor aniversariante;
- Devendo ainda os períodos de férias ser repartidos, passando a criança igual tempo com cada progenitor, sendo que, nas férias de Verão, a (…) passaria um período de 15 dias com o pai, período esse que seria acordado entre os progenitores quanto às datas em concreto até ao último dia do mês de Março de cada ano.
- O progenitor pagaria a quantia mensal de € 125,00 a título de alimentos, actualizada anualmente por referência à taxa de inflação publicada pelo INE a partir de 2017, sendo tal pagamento efectuado até ao dia 25 de cada mês por transferência bancária para a conta da progenitora e sendo as demais despesas de saúde e de educação repartidas entre os progenitores, o mesmo acontecendo com as despesas com actividades extracurriculares relativamente às quais ambos estivessem de acordo, devendo, em todo o caso, a progenitora apresentar recibos comprovativos de tais encargos.
- A partir do momento em que o progenitor obtivesse emprego e deixasse de estar desempregado, a prestação de alimentos aumentaria para o montante de € 150,00.
6. No dia 14/11/2015, o primeiro fim-de-semana de convívio da criança com o seu pai após a referida regulação do exercício das responsabilidades parentais, o progenitor foi buscar a filha para passar o fim-de-semana, entregando a criança à progenitora no dia 15/11/2015.
7. Em 17/11/2015, já depois de ter levado a criança à (…) e, depois, à urgência do Hospital de Faro para que a filha fosse sujeita a exames, a progenitora deslocou-se às instalações da PJ em Faro, apresentando denúncia contra o progenitor por alegado abuso sexual perpetrado por este contra a filha de ambos, na altura, com 1 ano e 8 meses de idade, não obstante já aquando da entrega da criança ao progenitor em 14/11/2015 e, portanto, enquanto estava com a Requerida, a menor apresentar leves assaduras da fralda e de os referidos exames terem dado um resultado “inconclusivo” relativamente a quaisquer possibilidades de ocorrência do aludido mau trato sexual por parte do Requerente.
8. Aquando da referida denúncia, a progenitora referiu ainda que o progenitor seria uma pessoa “instável, consumidora de álcool e temperamental”.
9. Nessa sequência, a partir do fim-de-semana de 14/11 e 15/11, a progenitora não mais entregou a criança ao pai para que esse passasse o fim-de-semana com a filha.
10. A referida denúncia deu origem ao inquérito criminal n.º 353/15.6JAFAR, o qual correu termos na Secção de Albufeira do DIAP da Comarca de Faro, tendo sido objecto de decisão de arquivamento datada de 11/1/2017.
11. Nessa sequência, por referência à referida denúncia aludida em 7), 8) e 10), o progenitor apresentou queixa criminal por denúncia caluniosa contra a progenitora, queixa essa a qual deu origem ao processo criminal n.º 1275/16.9T9FAR, nesse âmbito tendo deduzido ainda pedido de indemnização civil, mediante o qual requereu a condenação da progenitora, ali arguida, no pagamento da quantia de € 4.000,00.
12. No âmbito do processo identificado em 11. a aqui requerida veio a ser condenada pela prática de tal ilícito criminal de denúncia caluniosa, previsto e punível pelo artigo 365.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 6 meses de prisão, suspensa pelo período de 1 ano, bem como no pagamento de indemnização civil ao progenitor no valor de € 2.500,00, acrescido dos juros moratários desde a sentença até efectivo e integral pagamento.
13. Tal sentença foi confirmada pelo acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Évora datado de 5/6/2018.
14. A progenitora cumpriu a pena que lhe foi aplicada mencionada em 12) e 13), tendo esta sido julgada extinta.
15. A progenitora não pagou voluntariamente a indemnização civil devida ao progenitor, não tendo este instaurado execução para obtenção do pagamento coercivo de tal quantia.
16. Paralelamente à denúncia criminal por abuso sexual aludida em 7), 8) e 10) deduzida pela progenitora contra o progenitor e pelo mesmo motivo, em 23/12/2015, a Requerida requereu a alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais, processo este que correu termos sob o n.º 3190/15.4T8FAR neste Juízo de Família e Menores de Faro (J3), aí peticionando que até aos 3 anos de idade da filha o pai pudesse conviver com a criança na presença da progenitora e que, a partir dessa idade, o mesmo pudesse conviver com a menor aos sábados ou aos domingos, de forma quinzenal, entre as 10h00 e as 19h00, só a partir dos 5 anos de idade ocorrendo convívios com pernoita, de forma quinzenal, entre os sábados às 10h00 e os domingos às 19h00..
17. No mesmo sentido, a progenitora requereu, em 23/11/2015, à CPCJ de Tavira a instauração de processo de promoção e protecção, admitindo no requerimento por si apresentado que o médico do INML lhe havia dito – com base na observação e referindo-se a eventuais indícios físicos de abuso sexual – que “a criança não tinha nada e que devia resolver os conflitos com o progenitor”, o que se mostra consonante com a conclusão do INML, segundo o qual, aquando da observação da criança, “não haviam sido observados sinais ou indícios da existência de qualquer tipo de lesão traumática ou de suas sequelas”.
18. A CPCJ remeteu os autos de processo de promoção e protecção ao Ministério Público junto deste Tribunal por decisão de 27/11/2015.
19. Entre 17/11/2015 e 23/2/2016 não ocorreram convívios entre o progenitor e a criança por decisão unilateral da progenitora antes de haver intervenção judicial que suspendesse os referidos convívios.
20. Em 23/2/2016, aquando da conferência de pais realizada no processo de alteração de regulação aludido em 16., foi determinada a suspensão de convívios entre o progenitor e a criança até à conclusão das diligências probatórias aí ordenadas pelo Tribunal, tendo em vista o apuramento da credibilidade da denúncia de alegado abuso sexual da criança.
21. Em 17/5/2016 foi fixado regime provisório, nos termos do qual o pai poderia conviver com a filha em convívios supervisionados no CAFAP em Tavira um dia por semana, de quinze em quinze dias.
22. Em 7/7/2016, o Ministério Público junto deste Tribunal instaurou processo de promoção e protecção, alegando, em síntese, que a criança estava em perigo em razão do comportamento da progenitora, impeditivo de quaisquer convívios da filha com o progenitor. Tal processo foi arquivado sem aplicação de qualquer medida de promoção e protecção por decisão datada de 10/1/2017.
23. Estando prevista a realização de conferência de pais no processo de alteração de regulação no proc. 3190/15.4T8FAR para o dia 13/6/2016, foi determinada a realização de um convívio entre o progenitor e a criança para esse mesmo dia, não tendo tal convívio ocorrido porquanto a progenitora alegava estar muito sol e calor, o que prejudicaria a sua filha.
24. Não tendo a progenitora, mais uma vez, comparecido no dia 27/6/2016, aquando de novo agendamento do primeiro convívio do pai com a criança no CAFAP de Tavira, alegando que a filha estaria doente (com febre), do que só deu conhecimento pelas 9h00 do referido dia, depois de levar a criança ao Hospital de Faro no dia anterior.
25. Nestes termos, como admitido pela progenitora nas suas alegações no referido proc. 3190/15.4T8FAR apresentadas em 28/6/2016, a essa data, o pai não via a criança há 7 meses consecutivos.
26. Novamente, no dia 1/9/2016, o convívio supervisionado não foi realizado em virtude de doença da criança.
27. Durante esse período, dos 6 convívios programados, foram realizados 3, tendo, para além das situações referidas em 24) a 26), o progenitor faltado numa ocasião por ter tido um furo no pneu, conforme documento comprovativo que apresentou.
28. Nas ocasiões referidas em 24) e 26), a progenitora apresentou atestados médicos comprovativos da situação de doença da filha.
29. Nos 3 primeiros convívios supervisionados pelo CAFAP, o progenitor respondeu adequadamente às solicitações da filha, respeitando os seus ritmos e gostos, tendo esta permitido o contacto físico, não evidenciando qualquer constrangimento e demonstrando satisfação nas brincadeiras.
30. Logo após a referida primeira visita, a progenitora questionou a formação técnica dos técnicos do CAFAP, solicitando que estivesse presente um técnico de psicologia para poder assistir aos convívios, tendo sido esclarecida de que a equipa técnica de tal entidade possuía tal técnico.
31. Nos primeiros convívios, a progenitora opôs-se a que o pai mudasse a fralda da criança e lhe desse lanche durante as referidas visitas, tendo após solicitação do CAFAP nesse sentido, o Tribunal determinado que o progenitor poderia mudar as fraldas à filha sempre que tal fosse necessário, bem como dar-lhe lanche, fazendo-o no primeiro caso sob supervisão dos técnicos. A progenitora opôs-se ainda a que o progenitor tirasse fotografias à criança e lhe desse prendas, argumentando que este já havia colocado fotos da filha nas redes sociais e que a criança não gostaria de receber presentes do pai.
32. Até 21 de Julho de 2017 ocorreram 23 visitas, demonstrando sempre a criança à vontade na relação com o progenitor, não revelando quaisquer constrangimentos, permitindo o contacto físico deste e respondendo o progenitor de forma adequada às solicitações da filha, evidenciado o decurso de tais convívios uma evolução “extremamente positiva” em termos de interacção e partilha de afecto, sendo visível a satisfação da (…) com a presença do pai e em nenhum momento tendo sido verificado qualquer mal-estar da criança no contacto ou na presença do mesmo, apesar de, em alguns momentos, a filha ter verbalizado “o papá é mau”, fazendo-o, no entanto, de forma descontextualizada e em contexto lúdico.
33. No decurso do referido período de convívios, o agregado paterno (designadamente, a avó paterna e a bisavó paterna) revelou insatisfação por não poder estar com a criança por imposição da progenitora, tendo sido alertado para não mencionar tal facto na presença da (…).
34. Concluiu o CAFAP, na referida data de 21/7/2017, que inexistia necessidade de continuação de convívios supervisionados, podendo o progenitor ter convívios não supervisionados com a criança, num primeiro fim-de-semana, sem pernoita, mas posteriormente com pernoita, sem prejuízo de os progenitores continuarem a ter acompanhamento da referida entidade a fim de trabalharem estratégias de parentalidade e reflectirem sobre as consequências do seu comportamento para o bem-estar da filha.
35. Por sua vez, no decurso do referido período de convívios, a progenitora questionou a idoneidade da equipa do CAFAP, especificamente, da directora técnica do mesmo, Dra. (…), entendendo que tal equipa não estava a agir de forma imparcial.
36. Mais concretamente, a progenitora entendia que no convívio supervisionado ocorrido em 25/8/2017 teria acontecido algo de errado, porquanto a filha teria chorado compulsivamente ao ponto de fazer “febre” aquando da chegada a casa, revelando ainda que lhe tinham recusado plasticina para brincar, ao que a Directora do CAFAP, Dra. (…), respondeu que a criança não apresentava febre durante o convívio e à saída, não estando “apática” ou “triste” a seguir à realização do mesmo, tendo apenas chorado por breves momentos uma vez que não havia plasticina na sala, o que foi resolvido por via da disponibilização de outros brinquedos.
37. No referido e-mail a progenitora, perante a disponibilidade do CAFAP para fazer novo atendimento de forma a esclarecer as aludidas dúvidas, referiu ainda o seguinte:
“Da mesma forma que os vossos atendimentos para mim não acrescentam nada. Já ouvi todas as vossas explicações e quanto chegamos ao ponto de eu no último atendimento voltar a ouvir “é a sua palavra, vale o que vale”, “é a minha palavra contra a sua”, e quando lhe coloquei a si, Dra. (…), a questão: Dra. E o que acha quanto ao facto de a (…) continuar a chamar-me sempre que precisa ir ao WC? Nunca pede para ir com o pai? Não acha estranho? E a Sra. me responde que não há nada de relevante quanto a esse facto apesar de que gostaria muito de observar uma ida do pai com a menina ao WC e na visita seguinte (no dia a seguir) “forçou” a (…) a ir ao WC com o pai e depois mais uma vez não tem nada para me informar porque para vós desde sempre que tudo é normal para a idade da (…) e ela interage desde sempre muito bem com todos. Por mim ao momento não há necessidade de nenhum atendimento, pois iria-me repetir que eu posso sempre mudar de instituição se estou descontente com o vosso desempenho profissional”.
38. Sem prejuízo do referido em 34) quanto ao parecer do CAFAP no que concerne à desnecessidade de tal supervisão, e porque os autos aguardavam os relatórios de avaliação psicológica relativamente a ambos os progenitores, prosseguiram os convívios supervisionados, tendo até 9/2/2018 sido realizados 31 convívios supervisionados.
39. Tais convívios, no período entre 21/7/2017 e 9/2/2018, continuaram a decorrer de forma satisfatória para a criança, não revelando esta qualquer constrangimento na presença do pai e evidenciando a relação de ambos, na senda do que já havia sido constatado em 21/7/2017, uma evolução muito positiva em termos de interacção e de partilha de afecto, não exibindo a (…) qualquer receio ou angústia quando, por vezes, verbalizava que o “pai era mau”, nem se verificando quaisquer indícios de mal-estar da criança na presença ou no contacto com o seu progenitor.
40. Concluiu o CAFAP novamente pela existência de condições para a ocorrência de convívios não supervisionados entre o pai e a criança, sem prejuízo da intervenção de tal entidade na mediação do conflito parental.
41. Aquando da sua audição em sede de avaliação psicológica pelo INML no âmbito da perícia requisitada no referido proc. n.º 3190/15.4T8FAR, a progenitora queixou-se que teria sido vítima de violência doméstica a nível psicológico por parte do progenitor já depois da separação, designadamente, aquando do baptizado da criança, altura em que o progenitor havia aparecido sem aviso prévio e acordado a criança “à bruta” e tendo a avó paterna tentado agredir o seu irmão, tendo apresentado várias queixas, mas tendo estas sido arquivadas; esclareceu ainda que tal violência passava por esperas e perseguições que o pai da criança lhe faria no período imediatamente subsequente à separação parental.
42. Apesar do referido em 7) e 41), aquando do pedido de alteração de regulação deduzido pela progenitora em 23/12/2015 e como referido em 16), a mesma requereu que os convívios do progenitor até aos 3 anos da criança fossem feitos na presença da mãe mediante pré-aviso desta.
43. Em 14/1/2019, aquando do início do julgamento no referido processo n.º 3190/15.4T8FAR, foi obtido novo acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais homologado por sentença, nos termos do qual (cfr. acta de conferência de pais com a mesma junta no processo principal a fls. 409 e ss. que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos):
A residência da criança era fixada junto da progenitora, competindo a esta o exercício das responsabilidades parentais relativamente a todos os actos da vida corrente, nomeadamente, dirigir a instrução, educação e saúde da filha;
As decisões de particular importância seriam tomadas de comum acordo entre os pais;
A criança conviveria com o pai de 15 em 15 dias, sendo que, num fim-de-semana o progenitor recolheria a filha à sexta-feira depois das actividades escolares e extracurriculares no jardim de infância, entregando-a no mesmo local à segunda-feira, e sendo que no outro fim-de-semana a progenitora se deslocaria a Setúbal, entregando a criança ao pai até às 10h00 de sábado e recolhendo-a no domingo até às 19h00, em conformidade com o horário dos transportes públicos disponíveis.
Todas as terças-feiras o pai poderia contactar a filha através de qualquer meio audiovisual a partir das 19h00;
Nos dias da mãe e do pai, a criança passaria o dia, respectivamente, com a progenitora ou com o progenitor, sendo que, no caso de o dia do pai não coincidir com o fim-de-semana, este poderia fazer uma refeição com a criança;
No aniversário da criança, caso tal dia coincidisse com dia de escola, o pai poderia ir ao estabelecimento de ensino para estar presente na festa de aniversário da criança, sendo que, caso tal dia coincidisse com fim-de-semana passado com o progenitor, a mãe poderia estar presente na festa de aniversário da criança, o mesmo acontecendo inversamente, caso tal dia coincidisse com fim-de-semana em que a (…) estivesse com a mãe.
Nas férias escolares, cada progenitor poderia passar um período ininterrupto de 15 dias com a criança, iniciando-se em Julho com o progenitor e sendo a entrega da filha feita pelas 10h00 em casa da progenitora ao passo que a recolha seria efectuada pelas 20h00 em casa do progenitor.
Nas férias do Natal e da Páscoa, a criança passaria alternadamente uma semana de férias escolares com cada progenitor.
Nas férias do Carnaval, o progenitor que passasse com a criança o fim-de semana antecedente poderia ficar com a filha até à terça-feira de Carnaval.
Quando um dos progenitores não conseguisse cumprir o regime de convívios, deveria avisar o outro com antecedência mínima de 48 horas através de e-mail ou sms;
A criança deveria fazer-se acompanhar dos seus documentos de identificação, bem como de saúde, aquando dos convívios previstos no acordo, devendo ainda trazer passaporte em caso de realização de viagens.
O pai pagaria prestação de alimentos no valor de € 150,00 mensais até ao dia 25 de cada mês, sendo o pagamento efectuado por transferência bancária para a conta da progenitora e sendo a quantia em causa actualizada anualmente de acordo com os índices de inflação publicados pelo INE relativamente ao ano anterior;
As despesas médicas, medicamentosas e escolares, bem como os encargos com actividades extra-curriculares, desde que, neste caso, previamente acordadas entre os pais, seriam repartidas entre os progenitores, devendo o progenitor credor apresentar o respectivo recibo / factura com a indicação do NIF da criança e devendo o pai, no caso de ser devedor, efectuar o pagamento da sua metade da despesa conjuntamente com a prestação de alimentos no mês seguinte ao da apresentação do recibo / factura.
44. O regime de regulação referido em 43) foi, no essencial, cumprido entre Janeiro e início de Maio de 2019, altura em que os convívios da criança com o progenitor deixaram novamente de ocorrer em razão, a partir dessa data, de a filha se recusar sistematicamente a ficar com o pai, o que ocorreu nos fins-de-semana de 11 e 12 de Maio de 2019, de 8 de Junho do mesmo ano, aquando dos fins-de-semana em que a progenitora se deslocou a Setúbal, e de 21 de Junho do mesmo ano, aquando de fim-de-semana em que o progenitor se deslocou a Tavira, sendo certo que tal situação já havia ocorrido igualmente em Março de 2019 e Abril do mesmo ano, tendo, nessa altura, tal recusa sido resolvida por via da troca de fim-de-semanas no primeiro caso e por via da deslocação da progenitora a Setúbal no segundo.
45. Tendo o progenitor apresentado participação ao Comando Regional da PSP quanto à referida situação ocorrida em 21 de Junho, denunciando, na referida ocorrência, que a criança se recusava a ir com o mesmo, comportamento esse que o pai da (…) atribuía ao facto de a criança ser sujeita a uma “lavagem cerebral”, de que a mesma estaria a ser alvo por parte da progenitora, e referindo esta à PSP que desconhecia o motivo de recusa da filha em estar com o progenitor.
46. De novo, aquando de nova recolha em Tavira em 1 de Julho de 2019, a criança recusou – Não quero ir! Não quero ir”, enquanto chorava compulsivamente e se escondia atrás da mãe, referindo novamente o progenitor em nova participação à PSP que a sua filha estaria a ser sujeita a lavagem cerebral por parte da mãe, o que poria em causa a sanidade mental da criança. Tendo a PSP entrado em contacto com a progenitora, a mesma confirmou o sucedido, referindo desconhecer o motivo da recusa da criança em estar com o pai.
47. No mesmo período, correspondente ao ano lectivo de 2018/2019, a criança apresentou uma assiduidade muito irregular no jardim-de-infância, sendo as faltas justificadas, na maioria dos casos, por doença e sendo tal situação trabalhada por parte das educadoras com a progenitora.
48. Apesar disso, sempre que comparecia nas aulas, a (…) continuava a interessar-se por participar nas actividades realizadas, revelando capacidade de atenção e progressos no desenvolvimento de competências e de aprendizagens.
49. No referido período de Janeiro a Maio de 2019, a progenitora mencionou nas suas alegações, apresentadas nos termos do artigo 42.º, n.º 3, do RGPTC no âmbito dos presentes autos, que a criança teria apresentado um hematoma no olho esquerdo e um derrame na vista aquando do primeiro fim-de-semana passado com o progenitor em Janeiro de 2019 e um hematoma no queixo no convívio com o pai ocorrido em 4 de Março do mesmo ano, sendo tais alegadas situações significativas de falta de supervisão parental da filha durante os referidos convívios com o progenitor e explicando as mesmas possivelmente a razão pela qual a criança não queria estar com o pai, apesar de tal explicação não ter sido dada pela Requerida aquando das intervenções da PSP aludidas em 43) e 44).
50. De novo em 7/9/2019, aquando da deslocação da criança a Setúbal com a mãe, a (…) manifestou resistência a ficar com o progenitor, tendo este declarado que não a obrigava a ficar contra a sua vontade, razão pela qual a progenitora regressou a Tavira com a filha.
51. Nessa sequência, a progenitora apresentou denúncia à PSP, alegando que o pai havia incumprido o acordo de regulação em vigor.
52. Tendo em conta o incumprimento dos convívios na referida altura, em 30/10/2019, em sede de primeira conferência de pais, os pais acordaram em alterar provisoriamente tal regime nos seguintes termos: a) 1 vez por mês, o progenitor deslocar-se-ia ao Algarve para recolher a criança à sexta-feira no jardim de infância depois das actividades escolares e extracurriculares, entregando a criança à segunda-feira no mesmo local; b) 1 vez por mês, a progenitora deslocar-se-ia a Setúbal até às 10 horas de sábado, entregando a criança ao pai nesse horário e recolhendo-a no domingo até às 19h00, sendo, no entanto, as recolhas e entregas, nessa ocasião, feitas pelo Ilustre Mandatário da Requerida e sem a presença da mesma; c) nos períodos de férias, as recolhas e entregas seriam feitas através de 3ª pessoa da confiança da progenitora, não devendo esta estar presente no local.
53. Em 15/11/2019, altura em que o progenitor deveria ir buscar a criança ao jardim de infância à sexta-feira, conforme previsto no regime provisório aludido em 50), a progenitora pediu a uma pessoa da sua confiança, a testemunha (…), que acompanhasse a filha na entrega, apesar de tal não se encontrar previsto no referido regime nos fins-de-semana em que o progenitor se deslocava a Tavira.
54. Aquando da chegada do progenitor, a criança, enquanto dava a mão à referida depoente (…), manifestou não querer ir com o pai, recusando ir com este para o carro, chorando e dizendo, quando questionada pelo progenitor e pela avó paterna sobre a razão pela qual não queria ir com eles, que “a Mãe dizia para que ela não fosse com eles”, altura em que o Pai bateu 2 ou 4 palmas, virando-se para a testemunha e dizendo: “Vê?”. Desta feita, o pai colocou a filha no automóvel apesar da resistência desta, o que motivou a referida testemunha, (…), a denunciar tal situação à PSP e, pro sua vez, o progenitor a apresentar queixa criminal pelos crimes de denúncia caluniosa e difamação contra a referida depoente e por maus tratos contra a progenitora, queixas essas que vieram a ser objecto de despacho de arquivamento em 16/2/2021 no âmbito do inquérito criminal n.º 283/20.0T9FAR, por se entender que a matéria em investigação não constituía qualquer ilícito criminal no que se refere ao comportamento da referida testemunha e por se crer que inexistiam indícios do crime de violência doméstica no caso do comportamento da progenitora.
55. A progenitora justificou a presença da referida (…) com a necessidade de não deixar a criança sozinha no estabelecimento de ensino à espera do pai, caso em que poderia ser acusada de não supervisionar devidamente a filha.
56. No referido fim-de-semana a criança conviveu com o progenitor em Setúbal, tendo sido entregue no jardim-de-infância na segunda-feira.
57. Na sequência do referido episódio e na referida segunda-feira após a entrega da (…) na escola pelo pai, ou seja, no dia 18/11/2019, a progenitora levou a criança ao Centro de Saúde de Tavira pelas 15:20 h, com a queixa de “dor generalizada, mas sem febre”, referindo ao médico que a atendeu que a criança recusara ir com o pai e desde que este a havia levado à força da escola a filha recusaria ir à escola; nessa ocasião, a criança verbalizou ao médico que “o pai a havia levado à força para sua casa porque ela só gosta de dormir um dia e o pai a enganou e teve de ficar 3 dias!”, referindo ainda que “brinco sozinha com as bonecas e que não saiu, mas teve saudades da mãe”.
58. No dia 13/12/2019, pelas 10h30, data em que novamente o progenitor deveria ir buscar a criança à escola no final do período escolar, a progenitora levou a filha ao Centro de Saúde de Tavira, apresentando esta sinais de vómitos acompanhados de diarreia, referindo a mãe nessa ocasião que tal seria o dia em que o pai iria buscar a criança, tendo esta imediatamente à referência do progenitor começado a vomitar e a referir que se sentia maldisposta.
59. No dia 19/12/2019, a psicóloga da criança, Dra. (…), a qual acompanha a (…) desde Dezembro de 2015, elaborou e assinou informação clínica na qual referia haver recusas constantes por parte da criança em ir ao jardim de infância, apesar do bom relacionamento com os pares e com a educadora, ficando a (…) frequentemente doente e fazendo crises ansiosas sempre que se aproximava o dia em que o pai a ia buscar à escola.
60. Nessa sequência, em 20/12/2019, a progenitora requereu a alteração do regime provisório no sentido de os convívios passarem a ser feitos no CAFAP de Tavira, argumentando com a falta de resposta a tal pedido o não cumprimento do convívio do progenitor com a criança nesse Natal.
61. Ainda na referida ocasião do dia 13/12 a progenitora posteriormente, em requerimento apresentado nos autos em Março de 2020, acusou o progenitor de não ter ido buscar a criança nesse dia, não tendo justificado a falta.
62. Aquando da audição da criança em sede de nova avaliação psicológica, a (…), quando questionada sobre o seu relacionamento com o progenitor, tentou evadir as questões colocadas, não apresentando motivo para o não relacionamento actual com o pai, verbalizando como justificação “Ele só me dá bolachas” e “Ele é mau”, não esclarecendo igualmente esta última afirmação.
63. Durante a avaliação da interacção entre o progenitor e a criança no decurso da referida avaliação psicológica, esta demonstrou comportamentos de acentuada resistência inicial, tendo sido necessárias algumas técnicas de descentramento na figura paterna (com a ajuda da progenitora) para que a (…) entrasse na sala de avaliação, tendo, após um período de securização de 10 minutos e a pedido do perito, a criança permitido a presença do pai; após um período de adaptação de cerca de 10 minutos, ambos iniciaram uma interacção baseada numa tarefa em conjunto (desenho), passando a criança a aceitar a presença do pai e permitindo a este uma proximidade física demonstração de afecto), sendo o tipo de relacionamento dentro do normativo. O progenitor colocou algumas questões relativas à filha que esta entendeu como intrusivas, não lhes respondendo, mas mantendo a actividade em conjunto e demonstrando estar a gostar da mesma. A interacção manteve-se durante cerca de 60 minutos, sendo que, no tempo restante, a criança e o progenitor demonstraram estar a ter uma experiência positiva, com solicitações espontâneas, riso e uma interacção positiva. Ao ver a progenitora na saída do IML, a criança evitou ostensivamente o contacto com o progenitor que estava presente no caminho de saída, não mantendo qualquer interacção com este assim que verificou a presença da mãe.
64. Em 14/10/2020, teve lugar a continuação da conferência de pais, na qual não foi possível obter acordo, tendo os progenitores sido encaminhados para a audição técnica especializada e tendo sido mantido o regime provisório estabelecido em 30/10/2019.
65. Aquando da audição da criança em sede de audição técnica especializada a propósito dos convívios com o pai, a (…) referiu “O pai deveria ser bom…dar brinquedos, estar na mesma casa”, “ele só finge”, “eles estavam a falar que iam matar a mãe, ele e a ...” (companheira do pai), “o pai mentiu para mim”, esclarecendo, quando questionada sobre o conteúdo de tal “mentira”: “ele disse que o restaurante era dele e não é… foi a mãe que me disse” e “eu não gosto dele”, “ele é muito mau”, “ele bateu-me”. Solicitada a esclarecer esta última afirmação, referiu “do nada, eu estava a desenhar e de repente… a … e a … (avó paterna) estavam lá ao pé…bateu na cara e no rabo”. Esclareceu que não estava com o pai há muito tempo, desde antes do Natal (referindo-se ao último convívio, ocorrido em Novembro de 2020, cerca de 4 meses antes por referência à data da inquirição (1/2/2021) e, quanto ao seu desejo secreto, que “o pai fosse bom e eu não ter que estar aqui”.
66. Na referida audição técnica especializada, a progenitora justificou a não ocorrência dos convívios com factores exógenos: doenças da criança, situação pandémica, isolamento profilático devido a Covid (referente ao Natal de 2020, altura em que a progenitora apresentou tal justificação, decorrendo o período de isolamento entre os dias 18/12/2020 e 25/12/2020, altura em que a criança devia ter estado com o progenitor de acordo com o regime em vigor), desinteresse do pai em estar com a filha, recusas da (…) em estar com o pai, recusando ter qualquer responsabilidade na não ocorrência daqueles.
67. Nos fins-de-semana em que se deveria deslocar a Setúbal (30/10/2020, 27 ou 28/11/2020, 30/1/2021), a progenitora não efectuou tal deslocação, argumentando nas duas primeiras situações com o facto de as limitações de deslocação entre concelhos e a as dificuldades acrescidas de transporte (atenta a redução de horários de comboio) e de estadia em Setúbal a impedirem de o fazer e, no terceiro caso, com a doença da criança.
68. Novamente, no dia 9/4/2021, o progenitor deslocou-se a Tavira para estar com a filha, estando a progenitora presente, apesar de impedida pelo Tribunal de o fazer, tendo, nessa circunstância, a (…) recusado mais uma vez ir com o pai e decidindo este não forçar a criança a fazê-lo.
69. Em 13/5/2021, este Tribunal determinou manter o regime provisório, alterando-o, no entanto, quanto ao local das entregas e recolhas da criança, devendo estas ser feitas junto à porta da PSP. Foram ainda as partes notificadas para alegações.
70. Ainda em 13/5/2021, o Tribunal condenou a progenitora por incumprimento dos convívios da criança com o progenitor em multa de 3 UC, tendo a progenitora recorrido de tal decisão e tendo o Venerando Tribunal da Relação de Évora recentemente anulado tal decisão por falta de fundamentação.
71. No fim-de-semana de convívio entre o pai e a criança em Setúbal nos dias 19 e 20 de Junho de 2021, o Ilustre Mandatário da Requerida deslocou-se até à residência do progenitor, tendo a criança começado a resistir à entrega, desprendendo-se daquele e começado a correr em direcção à progenitora, a qual se encontrava localizada em sítio próximo, razão pela qual a entrega não ocorreu. Aquando da comparência da autoridade policial a criança estava agarrada às pernas da mãe, dizendo que “não queria ir” e chorando, razão pela qual ficou com a progenitora, tendo-se o progenitor, nessa circunstância, queixado à PSP que a mãe não cumpria o estabelecido no regime em vigor, mantendo-se por perto quando as entregas deviam ser feitas sem a sua presença.
72. Em 8/7/2021, mais uma vez, desta feita na presença de … (tio materno da …), a quem incumbia fazer a entrega da criança, a (…) recusou-se a ir com o pai, agarrando-se à cintura do referido familiar materno, tendo-se iniciado uma altercação entre aquele e o progenitor, bem como com a avó paterna, na sequência do que a criança, mais uma vez, não ficou com o pai.
73. No fim-de-semana de 2/10/2021, a progenitora comunicou mais uma vez ao pai que não se deslocaria a Setúbal, uma vez que a criança teria começado a vomitar quando já estava de saída para aquela localidade, referindo que estava com diarreia e que lhe doía a cabeça. Nessa sequência, a progenitora levou a criança ao médico, o qual atestou a presença da criança e sua avaliação, mas não juntou nos autos comprovativo clínico da doença que a (…) então apresentaria.
74. No fim-de-semana de 15/10/2021, novamente a criança recusou ir com o pai, escondendo-se por detrás do tio paterno, (…), e chorando, o que levou o progenitor a dizer a tal familiar que podia levar a criança embora.
75. No fim-de-semana de 12/11/2021, apesar de o progenitor se ter deslocado novamente a Tavira para estar com a filha, esta recusou-se a acompanhá-lo.
76. Na última avaliação escolar datada de 12/11/2021, refere-se que a criança se encontra bem adaptada à escola (E.B. 1 de Tavira), tendo feito amigos e sido assídua durante o primeiro mês do ano lectivo de 2020/2021, sendo que, após tal período, deixou de ser assídua, revelando grande instabilidade emocional revelado através do choro, o que comprometeria o seu nível de compreensão e de concentração nas tarefas propostas. É também mencionado que, segundo a progenitora, o número de faltas da criança no primeiro trimestre do referido ano lectivo se deveria ao aparecimento de febre repentina e pelo facto de a (…) se recusar a entrar no espaço da escola no início das actividades lectivas, o que foi constatado pela sua professora, (…), tendo-se tal situação modificado com o ensino online em relação ao qual a criança foi muito participativa e no terceiro período lectivo, no decurso do qual a mesma foi novamente assídua e pontual, o que se mantinha no primeiro trimestre do ano lectivo 2021/2022, evidenciando a criança grande empenho nas tarefas escolares e um comportamento exemplar.
77. No fim-de-semana de 2/12/2021, já depois de o Tribunal ter fixado como local de entrega aquando das idas da progenitora a Setúbal o CAFAP da Moita, esta entidade comunicou ao Tribunal que o convívio com o progenitor não havia sido realizado em razão da comunicação pela mãe da criança de que esta estaria doente, apesar do progenitor ter comparecido no referido local à hora agendada.
78. Antes da referida data, em 27/11/2021, pelas 11h30, a progenitora compareceu na ULS do Baixo Alentejo, Beja (cfr. fls. 668/669), alegando que a criança apresentava vómitos e diarreia desde a manhã, esclarecendo a progenitora que tal ocorrera igualmente nos últimos fins-de-semana que a (…) tinha de ir com o pai.
79. Segundo a médica que a atendeu, a criança tolerou bem a medicação oral que lhe foi dada, mostrando-se muito bem-disposta, melhorando visivelmente assim que soube que não precisaria de ir para o pai, não tendo sido observado durante esse período qualquer episódio de diarreia ou vómitos.
80. Na sessão de julgamento ocorrida em 6/12/2021, depois de determinar a audição da criança, na sequência de solicitação nesse sentido da progenitora, o Tribunal decidiu que a (…) passaria as férias escolares de Natal entre os dias 20/12/2021 e 4/1/2022 com o pai, sendo a entrega efectuada no Tribunal na sequência da referida audição designada para o dia 20/12/2021.
81. Finalmente, no dia 10/12/2021, a progenitora comunicou à professora que a criança chorava e não queria entrar na escola, porque era dia de ser recolhida pelo pai, tendo a criança estado, apesar de tudo, no estabelecimento de ensino até às 15h00, hora a que, segundo a Mãe, a criança “rejeitou a escola2, sugerindo que a (…) fosse recolhida em frente à PSP de Tavira (apesar de o Tribunal ter estabelecido que a recolha seria na escola). O progenitor respondeu que não iria buscar a criança e que o faria no dia 20/12 como estabelecido pelo Tribunal.
82. A progenitora comunicou ao Tribunal o incumprimento por parte do progenitor do referido convívio.
83. Aquando da sua audição pelo Tribunal em 20/12/2021, precedida de diálogo entre a (…) e a técnica de Segurança Social designada para o efeito, a criança manifestou, por um lado, interesse em conhecer a sua meia-irmã do lado paterno, que ainda não conhecia e que possuía à data 7 meses, aceitando aparentemente conviver com o pai para esse efeito durante as referidas férias do Natal, mas, por outro, quando questionada por que razão havia faltado no ano lectivo anterior tantas vezes às aulas, referiu que era por ficar doente e que tal doença não tinha origem em algum problema de saúde por si conhecido, mas “no pai”; referiu ainda que “o pai mataria a mãe”, sendo tranquilizada pelo tribunal que tal não aconteceria e que ambos os progenitores gostavam dela e não lhe fariam mal.
84. Após a audição, a criança esteve com a técnica da Segurança Social e com o pai durante cerca de 30 a 40 minutos a conversar e a brincar, período findo o qual a (…) aceitou ir com o progenitor de férias.
85. No último ano, por referência à data do início de julgamento (em Novembro de 2021), não ocorreram quaisquer convívios da criança com o pai em Setúbal, tendo ocorrido, pelos motivos supra descritos, apenas 4 convívios em Tavira.
Das condições de ambos os progenitores:
86. O progenitor é licenciado em gestão de empresas pelo ISCTE, tendo trabalhado ao serviço do Banco (…) entre 2007 e 2014 e estando actualmente a gerir um restaurante em Setúbal, auferindo salário mensal de € 850,00 líquidos, que junta ao salário da companheira, a qual aufere, com comissões, cerca de € 770,00 mensais.
87. Paga, para além da pensão de alimentos devida à filha (…), ainda € 300,00 de empréstimo para aquisição da habitação e € 150,00 de amortização de empréstimo para aquisição de viatura.
88. Reside com a companheira, a testemunha (…), bem como com a filha de ambos, com 7 meses de idade, em apartamento de tipologia T3 em Setúbal, apartamento esse com quarto individual para a (…), equipado com mobiliário e material lúdico-educativo adaptado à sua faixa etária, evidenciando a habitação boas condições de higiene, organização e conforto.
89. Tem o apoio, para além da sua companheira, da avó paterna da criança, a qual reside actualmente em Setúbal.
90. Trabalha, enquanto gerente de restaurante, entre as 10h00 e as 15h20, bem como entre as 19h00 e as 22h30, podendo ser substituído pela companheira, a qual cumpre horário das 9h00 às 18h00, ou pela avó paterna nos períodos em que não possa estar com a (…), caso esta venha a residir consigo.
91. A progenitora reside com a criança em apartamento T2, mobilado e equipado de forma adequada, apresentando boas condições de higiene e de conforto.
92. A criança dispõe de quarto individual, mobilado e equipado de acordo com o seu nível etário.
93. A progenitora é professora de expressão artística, ensinando alundos do 1º ao 4º ano do básico, a que acrescenta trabalho também numa agência de viagens, auferindo, por via de tais empregos, ordenado mensal na ordem dos € 1.300-1.400,00.
94. Trabalha diariamente entre as 9h30 e as 12h30, bem como entre as 14h00 e as 18h00, contando com o apoio da avó materna e do tio materno que vivem igualmente em Tavira.
Sobre a criança:
95. A (…), com 7 anos de idade (tendo por referência a data do encerramento da ausência), apresenta-se habitualmente cuidada em termos de alimentação, higiene e vestuário.
96. Manifesta-se, nos momentos em que, de facto, convive com o progenitor aos fins-de semana, meiga com este e com a companheira do mesmo, o que sucede logo que se afasta da progenitora e já não está perto desta, ocorrendo a rejeição do pai unicamente nos momentos da entrega.
97. Demonstra vinculação com ambos os pais (no caso do progenitor, quando este consegue conviver com a filha), apesar de, por força da ausência prolongada de convívios com o pai, mostrar maior proximidade à progenitora.
98. Mostra-se empenhada nas actividades escolares, revelando uma evolução positiva na aquisição de conhecimentos, apesar de ter faltado 37 vezes no ano lectivo de 2020/2021 pelas razões supra descritas, o que não sucedeu este ano (2021/2022), apenas tendo somado até agora 3 faltas.
99. Segundo a professora da criança e testemunha, (…), a (…), apesar de revelar boas qualidades como aluna, não se encontra actualmente bem em termos psicológicos, havendo momentos em que se alheia das aulas e se fecha, mostrando nessas alturas grande instabilidade emocional, chegando a levantar-se durante a aula, dizendo que está muito nervosa e começando a chorar.
*
Com relevância para a decisão a proferir, não se provaram os seguintes factos:
a) Que, aquando da denúncia apresentada pela progenitora contra o progenitor por alegado abuso sexual da filha, aquela tivesse dito ao pai da criança que este nunca mais veria a filha.
b) Que a (…), apesar de ter apenas 1 ano e 8 meses de idade aquando do episódio que deu origem à referida denúncia de alegado abuso sexual, já tenha dito ao “Eu não gosto do pai porque a mãe diz que, quando eu era bebé, ele fez dói-dói no meu pipi e no meu cu”.
c) Convencendo assim a progenitora a criança de que o progenitor havia praticado os factos em causa, apesar de o inquérito criminal ter sido arquivado e de aquela ter sido condenada em pena de prisão suspensa pelo crime de denúncia caluniosa.
d) Que a Requerida nunca tenha exercido qualquer actividade profissional remunerada ao longo de mais de 10 anos, nunca dispondo de qualquer outra fonte de rendimento para além do vencimento do Requerente.
e) Que o Requerente, ao longo de 6 anos, entre 2015 e 2021, tudo tenha feito para afrontar a Requerida com queixas e processos em Tribunal;
f) Não assumindo a sua incapacidade para criar elos de ligação com a filha;
g) Sendo evidente que a criança não pretende estar próxima do pai, só estando com este pelo facto de ser obrigada pelo Tribunal.
h) Que a criança só sofra instabilidade emocional quando pensa que está a chegar o momento de ter de ir para o pai ou de este a vir buscar.
i) Que o facto de o Tribunal e de o pai insistirem no cumprimento dos convívios se traduza em traumas psicológicos e emocionais para a criança.
j) Que tivesse sido a circunstância de o Tribunal ter determinado que as recolhas da criança no fim-de-semana mensal em que o progenitor se deslocava a Tavira fossem efectuadas no estabelecimento de ensino que determinou que a (…) deixasse de querer frequentar a escola.
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De Direito
Da regulação das responsabilidades parentais
O progenitor da criança (…), ora apelado, veio requerer a alteração do regime em vigor relativo à regulação das responsabilidades parentais da filha, pretendendo que lhe seja atribuída a guarda da mesma e esta fique a residir junto de si, face à impossibilidade de conviver regularmente com a filha, o que ocorre desde a separação do casal e por motivos que imputa à requerida. A sua pretensão foi atendida, vindo questionado pela progenitora que tal solução seja a que melhor atenda aos interesses da menor.
Para o que ora releva, dispõe o, nesta matéria nuclear, artigo 1906.º do CC (aqui aplicável por força da remissão operada pelo n.º 2 do artigo 1911.º):
“1. As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.
2. Quando o exercício em comum das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho for julgado contrário aos interesses deste, deve o tribunal, através de decisão fundamentada, determinar que essas responsabilidades sejam exercidas por um dos progenitores.
3. O exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente do filho cabe ao progenitor com quem ele reside habitualmente, ou ao progenitor com quem ele se encontra temporariamente; porém, este último, ao exercer as suas responsabilidades, não deve contrariar as orientações educativas mais relevantes, tal como elas são definidas pelo progenitor com quem o filho reside habitualmente.
4. O progenitor a quem cabe o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente pode exercê-las por si ou delegar o seu exercício.
5. O tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro.
6. Quando corresponder ao superior interesse da criança e ponderadas todas as circunstâncias relevantes, o tribunal pode determinar a residência alternada do filho com cada um dos progenitores, independentemente de mútuo acordo nesse sentido e sem prejuízo da fixação da prestação de alimentos.
7. Ao progenitor que não exerça, no todo ou em parte, as responsabilidades parentais assiste o direito de ser informado sobre o modo do seu exercício, designadamente sobre a educação e as condições de vida do filho.
8. O tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles (…)”.
À luz do assim preceituado, afigura-se relevante destacar que o critério do superior interesse do menor cumpre-se, no dizer da lei, com a manutenção de uma relação de grande proximidade com os dois progenitores que inclua a partilha de responsabilidades entre eles (cfr. o n.º 8), impondo ao tribunal que aceite acordos ou tome decisões que favoreçam esse convívio. Nessa medida, ao decidir sobre a residência e visitas, o tribunal, conforme impõe o n.º 5 do preceito, deverá atender a todas as circunstâncias relevantes, designadamente, a disponibilidade manifestada por cada um dos progenitores para promover relações habituais do filho com o outro.
É assim o superior interesse da criança o critério que orienta o tribunal na procura da melhor solução, estando absolutamente arredada do objecto do processo qualquer pretensão punitiva de um dos progenitores, com eventual favorecimento do outro, plano em que a recorrente, de forma completamente equivocada, coloca a questão, conforme resulta das alegações que apresentou.
Feito tal prévio esclarecimento, revelam no entanto os factos apurados que a progenitora recorrente vem conseguindo bloquear o convívio regular do progenitor com a filha do casal, o que se vem verificando desde que decidiu sair daquela que era a casa de morada de família, levando a (…) consigo quando contava cerca de 16 meses, deslocando-se da região de Lisboa (…), onde então residia, para Tavira, inicialmente para casa da mãe, tendo depois mudado para uma outra casa, onde passou a residir com a menor.
No âmbito do processo de divórcio requerente e requerido chegaram a acordo quanto ao exercício das responsabilidades parentais, mas na sequência do 1.º fim-de-semana de convívio com o pai nos termos do regime em vigor, a recorrente participou criminalmente deste, imputando-lhe a prática de abusos sexuais à criança, denúncia na sequência da qual o requerente ficou durante 7 meses privado do convívio com a filha, primeiro por iniciativa da progenitora e depois por decisão do Tribunal, que suspendeu as visitas.
Aqui chegados, cumpre sublinhar que não tem razão de ser o lamento feito pela recorrente a este respeito nas alegações que apresentou, nas quais, em citação da Sr.ª Conselheira Clara Sottomayor, faz notar que “a mãe que [denuncia a suspeita de abusos] fica colocada num beco sem saída ou num conflito de soma zero: ou denuncia, mas corre o risco de perder a criança…”
Ora, no caso em apreço, o que se verificou foi a condenação da recorrente, confirmada por Tribunal Superior, pela autoria de um crime de denúncia caluniosa, ou seja, por se ter provado no âmbito do processo crime, garantístico por excelência, que bem “sabia que os factos que denunciou perante as autoridades de investigação criminal eram falsos” e que, ao denunciar os factos e pedir a alteração da regulação das responsabilidades parentais na sequência da denúncia, “agiu com o propósito de afastar a criança da família paterna”, situação esta que em nada se confunde com a suspeita séria de um dos progenitores que não logra obter validação probatória em juízo.
Tendo entretanto ocorrido 31 visitas supervisionadas, o que implicou a deslocação do progenitor de Setúbal a Tavira, e pese embora tais visitas, na avaliação das técnicas do CAFAP, tenham decorrido em termos gratificantes para a criança e para o progenitor, tendo desenvolvido adequada interacção, foram diversos os entraves colocados pela recorrente, como revelam os factos apurados, não se abstendo de colocar em causa a competência e idoneidade das técnicas que garantiam o acompanhamento, ou levantar sobre elas infundamentadas suspeitas (cfr. por ex. os artigos 14.º e 15.º das alegações apresentadas ao abrigo do disposto no artigo 39.º, n.º 4). E conforme ficou a constar no relatório da audição técnica especializada que teve lugar, justificou sempre a não ocorrência dos convívios com factores exógenos: doenças da criança, situação pandémica, isolamento profilático devido a Covid, desinteresse do pai em estar com a filha, recusas da (…) em estar com o pai, recusando qualquer responsabilidade na não ocorrência daqueles. Aliás, seguindo esse comportamento padrão, a recorrente imputa agora ao Tribunal e ao MP, como se vê das alegações, a culpa da menor em recusar-se a acompanhar o pai e não ser assídua na escola, tendo aquelas entidades, em seu dizer, potenciado “a escalada da recusa da menor” e “nada fizeram, continuando a causar enorme constrangimento e repulsa à menor”.
Os factos, contudo, revelam uma versão diferente.
Resulta evidente do acervo factual apurado que desde a separação a recorrente não valoriza a relação da menor com o progenitor e familiares próximos deste. Note-se que, segundo o seu relato, após a separação do casal, este terá surgido “sem aviso prévio” no dia do baptizado da filha, o que suscita a dúvida sobre se terá sequer sido convidado.
Segue-se a lamentável denúncia de suspeita de abusos sexuais, que bem sabia ser falsa, e que motivou o afastamento do progenitor durante sete meses. No período que se seguiu de visitas supervisionadas, que se estendeu por cerca de 2 anos, a recorrente revelou-se frequentemente um entrave, com destaque para a série desculpas sem consistência para evitar ou perturbar as visitas, chegando a afirmar que a filha “não gosta de receber presentes do pai” para recusar um brinquedo que afinal até teria sido oferecido à criança pela técnica (tratando-se de afirmação em todo o caso abertamente contrariada pelas regras da experiência: as crianças gostam de receber presentes, seja qual for a sua origem, o que até constitui um perigo para o qual os progenitores alertam os filhos), opondo-se à presença da avó paterna, assinalando-se ainda o facto, consignado no relatório de audição técnica especializada, de nas poucas vezes em que o progenitor logrou ter a menor consigo durante o fim-de-semana, aquela não fazer referência “a qualquer gratificação da menor pela estadia junto do pai” – teria sido tudo mau, desde a comida que lhe foi servida à roupa que vestiu e cama onde dormiu.
Ora, conforme salientou o Sr. Perito que subscreveu os relatórios juntos aos autos, foi nítida a postura, por banda da criança, de “inquirição não verbal à mãe, acerca do que é esperado dela, regulando o seu comportamento de acordo com as indicações desta”, acrescentando ser expectável, atenta a idade da (…), “uma elevada permeabilidade a sugestionamento por adulto (frequentemente figuras de referência) (…) a quem atribuem, por valores culturais, poder, e a quem são ensinados a corresponder positivamente, com o que é por eles percepcionado como expectativa do seu desempenho, mesmo que de uma forma não perceptível para estes mesmos adultos”, destacando ainda “a diferente postura da examinada quando sozinha ou quando acompanhada pela mãe, claramente securizante” (relatório de 15 de Janeiro de 2018).
O mesmo Sr. Perito, no relatório datado de 24 de Junho de 2020, reiterou as suas anteriores conclusões, tendo ainda consignado que a criança demonstrou, “após um período de adaptação adequado, manter um relacionamento saudável e positivo com progenitor, mantendo contacto e solicitações livres e frequentes, demonstrando uma interacção normativa com este”, salientando no entanto que “na saída do GNL, e ao ver a progenitora, a menor evitou ostensivamente o contacto com o progenitor, que estava presente no caminho de saída, não mantendo qualquer interação com este assim que verificou a presença da progenitora” (é nosso o destaque).
Tais elementos revelam claramente a influência que a progenitora exerce na menor, de quem é a figura de referência dada a maior proximidade entre ambas desde a separação dos progenitores, quando contava apenas 16 meses, maneira que, sabendo a (…) que não é do agrado da mãe – ainda que esta, por motivos óbvios, não o verbalize publicamente, antes pelo contrário – que mostre satisfação em estar com o pai, recusa os contactos com este num exercício de lealdade para com a progenitora.
No entanto, tal visão desfocada da parentalidade por parte da recorrente e a sua evidente resistência em reconhecer a importância equiparada do papel de ambos os progenitores, com a consequente necessidade da criança passar mais tempo com o pai, porque revertem em prejuízo relevante para a criança não podiam/não podem ser ignoradas pelo Tribunal, estando em causa o direito fundamental da (…) em conviver com o Pai e com a Mãe. A menor, felizmente, não é filha única de um só progenitor: tem um pai que a ama, e cujas competências parentais não se questionam, uma irmã germana e uma avó paterna de cujo convívio não pode ser privada.
Reconhecendo-se embora que a situação registou uma evolução negativa, criando as visitas uma ansiedade generalizada na criança com somatização, ou seja, desencadeando sintomas físicos, não pode, ainda assim, conduzir à amputação do progenitor e da família paterna da vida da (…). Claro que a situação poderia ser mais facilmente ultrapassada caso os progenitores superassem as suas divergências e se concentrassem no interesse da filha, cientes do impacto negativo que os conflitos geram no seu desenvolvimento e crescimento sadios; todavia, decorridos quase 7 anos de litígio, no decurso do qual se procedeu a diversas alterações do regime de visitas, verificou-se um agravamento e o risco era a supressão dos convívios com o pai e família paterna, o que, como se referiu, resultaria em sério prejuízo para a menor.
Deste modo, sabendo-se que a recusa da criança não é atribuível ao comportamento do progenitor que, conforme se assinalou na decisão recorrida, revelou nos convívios supervisionados e perante diferentes entidades capacidade e competências parentais para se relacionar com a filha de forma saudável – o que é nítido também nas gravações que fez juntar aos autos –, mostrando-se mais razoável e flexível do que a recorrente, a qual se revela incapaz de reconhecer qualquer responsabilidade na situação criada e, sobretudo, a importância da participação efectiva e paritária do pai na vida da filha, afigura-se que a solução encontrada é aquela que poderá garantir que ambos os progenitores terão uma relação de proximidade com a (…), conforme é do seu superior interesse (cfr. n.ºs 5 e 8 do citado artigo 1906.º do Código Civil).
Em face do exposto, e remetendo quanto ao mais para a fundamentação da sentença recorrida, que aqui se secunda, mantém-se o regime nela fixado.

Sumário: (…)

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III. Decisão
Acordam os juízes da 2.ª secção cível do Tribunal da Relação de Évora em julgar improcedente o recurso interposto pela recorrente (…), mantendo a sentença recorrida.
Custas a cargo da recorrente, sem prejuízo da isenção conferida pela protecção jurídica pedida, caso lhe tenha sido, ou venha a ser, concedida.
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Évora, 28 de Abril de 2022
Maria Domingas Alves Simões
Ana Margarida Pinheiro Leite
Vítor Sequinho dos Santos