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CONTRATO DE TRABALHO A TERMO CERTO
MOTIVO JUSTIFICATIVO
ACRÉSCIMO EXCEPCIONAL DE ACTIVIDADE DA EMPRESA
Sumário
1. Na hotelaria, a aplicação de programas turísticos e as flutuações sazonais de procura (nas épocas balneares e festivas), integra o padrão normal de actividade. 2. Logo, tais fenómenos não constituem acréscimo excepcional de actividade, para os fins do art. 140.º n.º 2 al. f) do Código do Trabalho, pelo que não justificam a aposição de termo certo ao contrato de trabalho. (Sumário pelo Relator)
Texto Integral
Acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
No Juízo do Trabalho de Portimão, J.C.S.C. demandou Fundação INATEL, invocando ser inverídica a motivação do termo aposto ao seu contrato de trabalho e peticionando a declaração de ilicitude do despedimento, o pagamento das retribuições devidas desde o despedimento e até ao trânsito em julgado da decisão final, e o pagamento de uma indemnização correspondente a 45 dias de retribuição base por cada ano completo ou fracção de antiguidade, caso não opte pela reintegração na empresa.
Após contestação, realizou-se julgamento e a sentença julgou a acção parcialmente procedente, declarando que o contrato era sem termo, que foi ilícito o despedimento promovido pela Ré e condenando-a a reintegrar a A. e a pagar-lhe as retribuições que esta deixou de auferir, à razão da quantia ilíquida de € 730,54, e proporcionais das férias, subsídio de férias e subsídio de Natal por mês, desde 10.11.2020 e até ao trânsito em julgado.
Introduz a Ré a instância recursiva e formula as seguintes conclusões:
I. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida aos 24 de Junho de 2021 nos autos supra referenciados que decidiu julgar parcialmente procedente os pedidos formulados pela Autora, declarando ilícito o despedimento de que foi alvo e, em consequência, declarar que o contrato que ligava as partes era um contrato sem termo, que foi ilícito o despedimento promovido pela ré, condenando a ré a reintegrar a autora e a pagar-lhe as retribuições que esta deixou de auferir e proporcionais das férias, subsídio de férias e subsídio de Natal por mês, desde 10/11/2020 até ao trânsito em julgado da presente decisão.
II. O presente recurso tem por objecto, como se disse, a reapreciação da prova gravada, visando a impugnação da decisão da matéria de facto por considerar incorrectamente julgada a matéria de facto no que respeita à decisão de não considerar provados determinados factos constantes do contrato de trabalho e das duas renovações, e que comprovam o acréscimo temporário de actividade esperado pela Ré nessas datas e que motivaram essas contratações, factos alegados pela Ré e que têm interesse para a decisão da causa e que, no entender da Recorrente, deveriam ter sido considerados provados face à prova testemunhal produzida em audiência de julgamento conjugada com a prova já assente nos autos, sendo esses os pontos de facto concretos que se considera incorrectamente julgado.
III. Concretamente, face aos testemunhos prestados por (…), (…), (…), (…), (…) e (…), registados nas passagens das respectivas gravações acima identificadas e que se dão por reproduzidos, impunha-se dar como provados os seguintes factos: a. Em Maio de 2017 a ré estava a implementar uma estratégia agressiva de penetração no mercado do turismo, com os programas referidos no 1º contrato de trabalho da Autora e a abertura a operadores estrangeiros. b. E sentia um retorno dessa estratégia no aumento de reservas e em consequência na ocupação das Unidades Hoteleiras, em particular na Unidade Hoteleira de Albufeira, c. Onde era portanto necessário assegurar um reforço no serviço de recepção aos clientes enquanto esse aumento se verificasse. d. Em Maio de 2017 verificava-se já desde o início do ano um aumento excepcional nas reservas na referida Unidade Hoteleira de Albufeira. e. A partir de Abril a taxa de ocupação recuperou e a partir de Julho de 2018 e até ao final do ano ultrapassou constantemente os valores do ano anterior, f. Também em Março de 2019 as taxas de ocupação voltavam a ser de crescimento, mantendo-se superiores às do ano anterior nesse e nos meses seguintes. g. O estimado aumento de reservas deixou de se verificar a partir de Maio de 2019, mantendo-se no resto do ano a taxa de ocupação na referida Unidade Hoteleira sempre abaixo das taxas de ocupação homólogas de 2018. h. Também a taxa de ocupação em Janeiro de 2020 foi inferior à taxa de ocupação de Janeiro de 2019. i. Pelo que – atenta a motivação e justificação do termo do contrato da Autora - a Ré decidiu opor-se à renovação contratual da Autora, o que fez nos termos e pela forma exigida legalmente.
IV. Considerando os factos provados supra conjugados com os restantes factos já provados nos autos e supra referidos em 3, a conclusão necessária é a de que o contrato de trabalho assinado entre A e Ré era um contrato a termo, mantendo esse carácter aquando das duas renovações, em cumprimento fiel ao exigido na lei, em particular no artº 140º nº 2 f) CT, sendo o motivo indicado no contrato, e nas renovações, fiel à realidade e suficientemente concretizador, além de cumprir os demais requisitos formais legais.
V. Pelo que a cessação do contrato por oposição à renovação operada pela Ré foi inteiramente legítima e legal, tendo ademais sido pagas à Autora todas as quantias devidas a esse título.
Termos em que deve a douta sentença proferida pelo tribunal a quo ser alterada e substituída por outra que julgue totalmente improcedente o pedido formulado pela Autora, por não provado, confirmando-se a licitude do termo aposto ao contrato de trabalho assinado entre Autora e Ré, e a licitude da cessação contratual por oposição à renovação do contrato de trabalho a termo da Autora, e que em consequência absolva a Ré do pedido.
Não foi oferecida resposta.
Já nesta Relação, a Digna Magistrada do Ministério Público emitiu o seu parecer.
Dispensados os vistos, cumpre-nos decidir.
Iniciando pela análise da impugnação da matéria de facto, reconhecendo previamente que se encontram reunidos os requisitos necessários ao seu conhecimento, previstos no art. 640.º n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, e consignando que se procedeu à audição da prova gravada, vejamos se deveria considerar-se provada a matéria de facto alegada pela Ré na sua conclusão III, alíneas a), b), e c), relativas à implementação em Maio de 2017 de uma “estratégia agressiva de penetração no mercado do turismo, com os programas referidos no 1.º contrato de trabalho da Autora e a abertura a operadores estrangeiros”, e consequente “retorno dessa estratégia no aumento de reservas e em consequência na ocupação das Unidades Hoteleiras, em particular na Unidade Hoteleira de Albufeira”, onde seria “necessário assegurar um reforço no serviço de recepção aos clientes”.
A primeira instância argumentou não se ter demonstrado que os mencionados programas tenham tido início em 2017, pelo que declarou não provado que “em Maio de 2017 a ré estava a implementar uma estratégia agressiva de penetração no mercado do turismo, com os referidos programas e a abertura a operadores estrangeiros.”
E concordamos em absoluto com tal raciocínio. Para além de se ter atentado, na audição de todos os depoimentos, que a A. foi efectivamente contratada para substituir na recepção outra trabalhadora – (…) – que cessou o seu contrato de trabalho em Maio de 2017 (facto revelado nos depoimentos das testemunhas (…), (…), (…) e (…), todas recepcionistas nos dois estabelecimentos da Ré em Albufeira), também foi revelado que os programas de turismo sénior e turismo social, bem como com operadores estrangeiros, não se iniciaram em Maio de 2017, já existiam há vários anos, e os programas de turismo social desde sempre.
De resto, nenhuma testemunha revelou o estabelecimento de algum plano que, por algum modo, seja possível enquadrar no conceito de “estratégia agressiva de penetração no mercado do turismo”, ou sequer que tal plano tenha sido iniciado ou implementado em Maio de 2017 – nem foi apresentado qualquer documento que, por algum modo, demonstrasse o planeamento e implementação de tal estratégia. O que existia era apenas a aplicação dos programas decorrentes da actividade normal da Ré e a evolução decorrente da sazonalidade do turismo, embora, no que respeita à Ré, mitigado pelos programas de turismo sénior e social, que permitem o funcionamento das suas unidades de Albufeira durante todo o ano, ao contrário do que sucede em várias unidades hoteleiras no Algarve, que encerram no Inverno.
Quanto à evolução das taxas de reserva e ocupação ao longo dos anos de 2017, 2018 e 2019 – invocada, em parte, pela Ré nas alíneas d), e), f) e g) da sua conclusão III – a sentença recorrida já deu como provada essa matéria, de forma pormenorizada, nos pontos 7 a 14, 17, 20 e 21. As conclusões a retirar dessas taxas serão adiante efectuadas, aquando da análise jurídica do pleito.
Quanto à taxa de ocupação em Janeiro de 2020 – alínea h) da conclusão III – não foi junto qualquer documento demonstrando essa matéria (o documento que apresentou com o seu requerimento de 14.05.2021 não inclui o ano de 2020), nem qualquer testemunha revelou exactamente qual foi, pelo que bem se considerou não provada na sentença recorrida.
Finalmente, a redacção proposta na alínea i) é conclusiva e o facto relevante já foi lançado no ponto 22 do elenco fáctico: o contrato não foi renovado conforme escrito entregue à A. em 18.12.2019, comunicando a caducidade do contrato de trabalho no dia 10.01.2020.
Em resumo, a impugnação fáctica improcede na totalidade.
Fica assim estabelecida a matéria de facto:
1. A autora foi admitida ao serviço da ré através de escrito denominado contrato de trabalho a termo certo, com início a 15 de Maio de 2017 e termo a 14 de Março de 2018, para sob a autoridade desta, direcção e fiscalização, lhe prestar os seus serviços de recepcionista escalão 1.
2. Nesse escrito ficou a constar, além do mais e na sua cláusula sexta, que: “o motivo justificativo da estipulação de termo do presente contrato é subsumível no n.º 1 e na alínea f) do n.º 2, ambos do art.º 140.º do Código do Trabalho, e consiste no acréscimo excepcional de actividade decorrente do aumento das reservas directas efectuadas pelos beneficiários associados e não associados da Fundação Inatel e de grupos, devido à realização de programas de “Turismo Sénior”, “Turismo para Todos”, “Turismo Social”, de operadores turísticos, operador francês Prodintur, época balnear 2017 e épocas festivas do Natal e Fim de Ano 2017”.
3. A autora exerceu a sua actividade no estabelecimento propriedade da ré denominado “Inatel Albufeira”, sito em Albufeira.
4. No desempenho das suas funções competia à autora ocupar-se do serviço de recepção, do acolhimento dos hóspedes e da contratação de alojamento, assegurar a respectiva inscrição nos registos do estabelecimento, atender os desejos e reclamações mesmos, proceder ao lançamento dos consumos ou despesas, emitir, apresentar e receber as respectivas importâncias.
5. Como contrapartida do trabalho prestado auferia a autora a retribuição mensal de 730,54€.
6. A autora é associada no Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Algarve, com o número 36638.
7. Na Unidade Hoteleira de Albufeira, em Janeiro de 2017 e comparando com o mês de Janeiro de 2016, o número de dormidas havia subido de 2.534 para 3.387, o número de quartos ocupados de 1.377 para 1.917 (taxa de ocupação de 15,26% para 19,76%).
8. Em Fevereiro de 2017 e comparando com o mês de Fevereiro de 2016, o número de dormidas havia subido de 2.373 para 4.152, o número de quartos ocupados de 1.479 para 2.342 (taxa de ocupação de 17,19% para 27,21%).
9. Em Março de 2017 e comparando com o mês de Março de 2016, o número de dormidas havia subido de 5.644 para 6.746, o número de quartos ocupados de 2.900 para 3.838 (taxa de ocupação de 30,11% para 39,08%).
10. Em Abril de 2017 e comparando com o mês de Abril de 2016, o número de dormidas havia subido de 6.176 para 9.443, o número de quartos ocupados de 3.263 para 4.601 (taxa de ocupação de 34,93% para 49,67%).
11. E em Maio de 2017, comparando com o mês de Maio de 2016, o número de dormidas subiu de 12.276 para 13.194, o número de quartos ocupados de 6.414 para 6.867 (taxa de ocupação de 66,98% para 71,09%).
12. A taxa de ocupação dos meses de Junho a Outubro de 2017 foi de 78,11%, 85,56%, 93,09%, 81,01% e 52,52%, quando nos mesmos meses de 2016 havia sido de 82,63%, 89,88%, 93,39%, 87,72% e 61,48%.
13. No mês de Novembro de 2017 a taxa de ocupação foi de 14,68% por comparação com 37,31% em Novembro de 2016.
14. A partir de Dezembro de 2017 e até Fevereiro de 2018 a taxa de ocupação foi de 23,73%, 15,21% e 20,01% respectivamente, quando em Dezembro de 2016 a Fevereiro de 2017 a taxa de ocupação havia sido de 24,73%, 19,76% e 27,21%, respectivamente.
15. No dia 15 de Março de 2018 foi acordada a renovação do contrato de trabalho da Autora por um período adicional de 1 ano, com início em 15 de Março de 2018 e termo em 14 de Março de 2019.
16. No escrito que denominaram de aditamento, datado de 15 de Março de 2018, as partes deram nova redacção à cláusula sexta do contrato de trabalho nos seguintes termos: “o motivo justificativo da estipulação de termo do presente contrato é subsumível no n.º 1 e na alínea f) do n.º 2, ambos do art.º 140º do Código do Trabalho, e consiste no acréscimo excepcional de actividade na Unidade Hoteleira decorrente do aumento das reservas directas efectuadas pelos beneficiários associados e não associados da Fundação Inatel, dos programas de turismo organizados pelos serviços centrais da Fundação, por operadores turísticos, época balnear 2018, épocas festivas, Páscoa 2018, Natal e fim de ano 2018/2019, Carnaval de 2019”.
17. Na referida Unidade de Albufeira, a taxa de ocupação em Março de 2018 foi de 25,09%, em Abril de 2018 foi de 41,94%, em Maio de 2018 foi de 70,24%, em Junho de 2018 foi de 77,26%, em Julho de 2018 foi de 85,92%, em Agosto de 2018 foi de 89,67%, em Setembro de 2018 foi de 82,89%, em Outubro de 2018 foi de 62,99%, em Novembro de 2018 foi de 21,55%, em Dezembro de 2018 foi de 22,04%, em Janeiro de 2019 foi de 18,24%, em Fevereiro de 2019 foi de 16,73% e em Março de 2019 foi de 26,37%.
18. Em 15 de Março de 2019 as partes voltaram a renovar o contrato de trabalho, desta vez até 10 de Janeiro de 2020.
19. Nesse escrito, que denominado de aditamento, datado de 15 de Março de 2019, as partes deram nova redacção à cláusula sexta do contrato de trabalho nos seguintes termos: “o motivo justificativo da estipulação de termo do presente contrato é subsumível no n.º 1 e na alínea f) do n.º 2, ambos do art.º 140º do Código do Trabalho, e consiste no acréscimo excepcional de actividade na Unidade Hoteleira decorrente do aumento das reservas directas efectuadas pelos beneficiários associados e não associados da Fundação Inatel, dos programas de turismo organizados pelos serviços centrais da Fundação, por operadores turísticos, nomeadamente Sunspot, Sudio, Proditur, época festiva da Páscoa 2019, época balnear 2019, época festiva do Natal Fim de Ano”.
20. Em Abril de 2019 a taxa de ocupação na Unidade de Albufeira foi de 52,08%, em Maio de 2019 foi de 65,30%, em Junho de 2019 foi de 76,00%, em Julho de 2019 foi de 81,22%, em Agosto de 2019 foi de 85,28%, em Setembro de 2019 foi de 77,48%, em Outubro de 2019 foi de 51,69%, em Novembro de 2019 foi de 20,92% e em Dezembro de 2019 foi de 21,04%.
21. O número de quartos ocupados, na Unidade de Albufeira, foi de 60.116 em 2016, de 60.426 em 2017, de 57.419 em 2018 e de 52.320 em 2019.
22. Por escrito entregue à autora em 18 de Dezembro de 2019 a ré comunicou a esta que o contrato de trabalho celebrado em 15 de Maio de 2017 cessaria por caducidade em 10 de Janeiro de 2020.
23. Posteriormente a Janeiro de 2020 foram celebrados pela ré 3 contratos de trabalho, todos a termo resolutivo incerto, para substituição temporária de 3 trabalhadores dos quadros da Ré: a) (…) – Termo incerto, com início a 22.07.2020, para substituir a trabalhadora do quadro (…) por baixa médica; b) (…) - Termo incerto, com inicio a 13.06.2020, para substituir o trabalhador do quadro (…) que estava a exercer funções sindicais; e c) (…) – Termo incerto, com inicio a 03.07.2020, para substituir a trabalhadora do quadro (…) que estava de baixa de seguro.
APLICANDO O DIREITO Da motivação do termo
Impõe o art. 141.º n.º 1 al. e) do Código do Trabalho, na celebração de contrato de trabalho a termo, o dever de indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo, esclarecendo o n.º 3 que «a indicação do motivo justificativo do termo deve ser feita com menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.»
A lei não se basta, assim, com a mera descrição de conceitos de direito, ou fórmulas genéricas, sob pena da exigência legal de justificação da aposição de termo poder ser facilmente iludida e proporcionar a precarização da relação laboral. Exige-se que a motivação do termo aposto ao contrato permita a verificação externa da conformidade da situação concreta com uma efectiva necessidade temporária da empresa, bem como a adequação da justificação invocada face à duração estipulada para o contrato.[1]
Apenas será considerado motivo justificativo do termo a necessidade do empregador que seja concretizada no texto contratual, através da “menção expressa dos factos” que integram o aludido motivo. As razões determinantes da forma do negócio opõem-se a que a vontade real dos contraentes possa ter relevância na afirmação da validade da estipulação do termo, se essa vontade não estiver expressa no texto do contrato. Por outro lado, ao impor a necessidade de relacionar a justificação invocada e o termo estipulado, a lei pretende que o nexo causal entre o motivo invocado e a duração do contrato resulte da apreciação formal da cláusula contratual de motivação do termo, não bastando, pois, a mera descrição da justificação e a indicação do prazo.[2]
Como já se referiu, a cláusula de motivação do termo tem por função permitir a verificação externa – por parte do trabalhador, dos serviços de inspecção do trabalho e do próprio Tribunal – da conformidade da situação concreta com as tipologias legais e a realidade e a adequação da própria justificação invocada face à duração estipulada para o contrato. Deste modo, a entidade patronal não pode suprir insuficiências na motivação do termo, com recurso a outros factos, não transcritos no contrato mas que pretenda trazer a juízo – a verificação externa da conformidade legal do termo aposto, faz-se através da análise dos fundamentos de facto constantes do próprio texto do contrato, sendo irrelevantes outros motivos determinantes da vontade dos contraentes, se a mesma não estiver expressa no texto contratual.[3]
Está em causa, pois, uma formalidade ad substantiam, sendo certo, de todo o modo, que cabe sempre ao empregador a prova dos factos que justificam a celebração do contrato a termo – art. 140.º n.º 5 do Código do Trabalho.
A cláusula de motivação do termo aposta no contrato de trabalho celebrado no dia 15.05.2017, para a trabalhadora prestar a actividade de recepcionista escalão 1, invoca o art. 140.º n.º 2 al. f) do Código do Trabalho, relativo ao acréscimo excepcional de actividade decorrente do aumento das reservas directas efectuadas pelos beneficiários associados e não associados da Fundação Inatel e de grupos, devido à realização de programas de “Turismo Sénior”, “Turismo para Todos”, “Turismo Social”, de operadores turísticos, operador francês Prodintur, época balnear 2017 e épocas festivas do Natal e Fim de Ano 2017.
É desde logo notório que tal cláusula de motivação não efectua qualquer relação entre a justificação invocada e o termo aposto ao contrato – até 14 de Março de 2018 – e tal nexo também não é estabelecido nas renovações ocorridas em 15.03.2018 e em 15.03.2019.
Do texto dos contratos não transparece o nexo causal entre o invocado acréscimo excepcional e a necessidade específica de contratar a trabalhadora, inicialmente por dez meses, depois por um período de um ano e finalmente por outro período de quase dez meses (de 15.03.2019 a 10.01.2020), o que desde logo conduz à conclusão de insuficiência da motivação aposta, para os fins do art. 141.º n.º 3, in fine, do Código do Trabalho.
Acresce que igualmente não se vislumbra em que medida os factos invocados nos textos contratuais motivam a aposição do termo certo. Não se identifica qual o aumento de reservas resultante dos programas identificados nos contratos, para além que as épocas balneares e festivas referidas nos contratos são sazonais, por ocorrerem em datas específicas de todos os anos, não se enquadrando assim na categoria de excepcionalidade a que se refere a al. f) do n.º 2 do art. 140.º, mas sim na respectiva al. e) – e certo é que a trabalhadora foi contratada para também desenvolver a sua actividade fora dessas épocas sazonais.
De todo o modo, não se deixará de anotar que a aplicação de programas turísticos e as flutuações sazonais da procura, integram o padrão normal de actividade da Ré, pois só assim garante as necessárias condições para desenvolver o seu objecto social. Logo, os fundamentos invocados não constituem, prima facie, fundamento de acréscimo excepcional de actividade, mas antes o seu desenrolar normal e coerente.
Ademais, como bem se anota na sentença recorrida, os factos apurados também não demonstram qualquer aumento excepcional de actividade.
Na verdade, se entre Janeiro e Maio de 2017 ocorreu um aumento ligeiro de reservas por comparação com idêntico período do ano anterior, nos meses seguintes (e até final de 2017) o que se observa é uma redução. Na renovação de Março de 2018, não ocorria qualquer aumento em relação ao ano anterior, e o número total de quartos ocupados nesse ano de 2018 é até inferior ao de 2017, fenómeno que se mantém no ano de 2019, que atinge um total de quartos ocupados igualmente inferior ao do ano anterior.
Como bem se observa na sentença recorrida, “não só não se provou a veracidade das justificações apresentadas (sobretudo aquando das renovações), como resultaram provados factos que atestam a não conformidade do motivo com a realidade (a diminuição, sucessiva, do número de quartos ocupados, sobretudo aquando das renovações).”
Considerando-se vaga, imprecisa e genérica a justificação aposta ao contrato de trabalho e suas renovações, para além de desconforme à realidade, a consequência é a consideração do mesmo como sem termo – art. 147.º n.º 1 als. b) e c) do Código do Trabalho – pelo que bem decidiu a primeira instância.
DECISÃO
Destarte, nega-se provimento ao recurso e confirma-se a decisão recorrida.
Custas pela Ré.
Évora, 24 de Março de 2022
Mário Branco Coelho (relator) Paula do Paço Emília Ramos Costa __________________________________________________ [1] Neste sentido, António Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 13.ª ed., 2006, págs. 318/9. [2] Luís Miguel Monteiro e Pedro Madeira de Brito, in Código do Trabalho Anotado, 4.ª ed., 2006, págs. 285/6. [3] Neste sentido, cfr. os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 18.06.2008 (Proc. 08S936), de 28.04.2010 (Proc. 182/07.0TTMAI.S1), de 09.06.2010 (Proc. 1389/07.6TTPRT.S1), de 02.12.2013 (Proc. 273/12.6T4AVR.C1.S1) e de 17.03.2016 (Proc. 2695/13.6TTLSB.L1.S1), todos disponíveis em www.dgsi.pt.