REGULAÇÃO DO EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
FIXAÇÃO DA PENSÃO DE ALIMENTOS
NULIDADE DE SENTENÇA
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
Sumário

I - Ocorre nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, se o tribunal não se pronuncia ali sobre a prática, pelas crianças, de uma modalidade desportiva (patinagem) que executam há anos com o acordo dos pais, designadamente sobre quem e em que medida devem ser suportados os respetivos custos.
II - Na fixação dos alimentos devidos às filhas pelo progenitor, há de encontrar-se o equilíbrio da prestação. Não se deve exigir ao obrigado que, para ela, ponha em perigo a sua própria manutenção de acordo com a sua condição, mas devem sempre os pais proporcionar aos filhos um nível de vida semelhante ao seu.
III - Sendo o pai trabalhador por conta de outrem, com rendimento mensal do trabalho na ordem de €800,00, é adequada a fixação da pensão mensal de alimentos a favor das duas filhas pelo valor de €200,00 e comparticipação, em 50%, nas despesas médicas, medicamentosas, de educação e em atividades extracurriculares acordadas com o outro progenitor, quando a despesa normal e razoável total do obrigado se situa próxima do seu rendimento líquido, podendo mesmo ultrapassá-lo.
IV - O progenitor residente, podendo, não deixa de estar obrigado a contribuir com alimentos para os filhos.
V - A obrigação de pagamento de uma despesa com o ATL das crianças é também, em si, uma prestação de alimentos cujo valor deverá acrescer à obrigação principal daquela natureza na medida que o progenitor obrigado deixar de a realizar, maxime quando o seu valor, ainda que baixo, se mostra significativo para a manutenção ou melhoria de, já de si, contingentes condições de vida das filhos.

Texto Integral

Proc. nº 884/20.6T8GDM-A.P1 (apelação)

Comarca ... – Juízo de Família e Menores ... – J...

Relator: Filipe Caroço
Adj. Desemb. Judite Pires
Adj. Desemb. Aristides Rodrigues de Almeida
Acordam no Tribunal da Relação ...
I.
AA, instaurou ação tutelar cível para regulação do exercício das responsabilidades parentais de suas duas filhas menores BB e CC, contra DD, casado com a Requerente, mecânico de automóveis, com o NIF nº ..., residente na Rua ..., ..., ... ... – ..., alegando essencialmente que as crianças são filhas do casal, que se encontram separados de facto e que está a decorrer ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge, devendo ser fixado judicialmente um regime de regulação do exercício das referidas responsabilidades, sendo que as crianças se encontram a residir com a mãe desde fevereiro de 2020.
Na conferência de pais, não tendo as crianças mostrado recetividade no estabelecimento de um regime de guarda partilhada/alternada, o tribunal fixou o seguinte regime provisório de regulação do exercício das responsabilidades parentais[1]:[2]
1.- As Menores, BB e CC, ficarão entregues aos cuidados da Mãe fixando-se a residência junto delas.
2.- As responsabilidades parentais referentes às questões de particular importância para a vida das Menores, BB e CC, serão exercidas em conjunto por ambos os Progenitores, sem prejuízo do regime estipulado na parte final do artigo 1906º, n.º 1 do C.C.
3.- O exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente das Menores caberá à Progenitora, sem prejuízo da intervenção do Progenitor quando as Menores consigo estejam.
4. O Progenitor estará com as Menores um dia, todos os fins-de-semana, aos sábados ou aos domingos, de forma alternada, tomando uma refeição, almoço ou jantar, com estas.
5. O Progenitor pagará a título de pensão de alimentos, às filhas, a quantia de €200 (duzentos euros), €100 por cada Menor, até ao dia 8 de cada mês, valor que entregará à Progenitora por qualquer meio idóneo de pagamento.
6.- As despesas médicas e medicamentosas, como despesas com óculos, lentes, ortopedia, e as despesas de educação como as de material e livros escolares e salas de estudo serão suportadas em partes iguais por ambos os Progenitores, após a apresentação pela Mãe dos respectivos comprovativos de despesas em nome das Menores, pagando o Pai a sua comparticipação, no mês seguinte ao da apresentação das despesas e em conjunto com a pensão de alimentos. E as partes reencaminhadas para a audição técnica especializada, nos termos dos artigos 38º, al. b) e 23º, ambos do RGPTC, por um período de 2 meses, a realizar junto do Instituto de Segurança Social.
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Foram realizadas diligências instrutórias.
O Ministério Público emitiu parecer.
Realizada audiência técnica especializada, continuou a conferência de pais, onde, não tendo sido possível obter acordo, foi ordenada a realização de perícias médico-legais de psicologia e pedopsiquiatra às crianças, a fim de se averiguar sobre o grau de vinculação destas com cada um dos progenitores, figura de referência, bem como suscetibilidade de serem influenciadas pelos conflitos vivenciados na família, com realização de perícias médico-legais de psicologia e psiquiatra a fim de avaliar as competências parentais de cada um.
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As partes foram notificadas nos termos do disposto no art.º 39º, nº 4, do Regime Geral do Processo Tutelar Cível[3], tendo apresentado as respetivas alegações.
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O tribunal proferiu sentença, tratando e decidindo as seguintes questões:
- Modo de exercício das responsabilidades parentais;
- Residência das crianças;
- Convívios com o progenitor não residente;
- Contributo do progenitor não residente para o sustento das crianças.

Realizada a audiência final, com produção e provas, o tribunal proferiu sentença regulando o RERP relativamente às irmãs BB e CC como se segue, ipsis verbis:
«1.º
As menores ficam confiadas à guarda e cuidados da mãe, fixando-se a residência junto desta, competindo a esta as responsabilidades parentais quanto às questões da vida corrente das menores.
2º.
As responsabilidades parentais relativas a questões de particular importância para a vida das menores são exercidas em comum por ambos os pais, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer deles pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.
3.º
O pai pode visitar as menores nos termos que forem acordados com a mãe, devendo, para o efeito, contactar previamente esta, com 24 horas de antecedência, desde que seja vontade das menores, fixando-se um regime de visitas livre;
4.º
1. O pai contribui mensalmente com a quantia de € 125,00 (cento e trinta euros)[4] para cada menor e para o seu sustento, actualizada anualmente, com início em Janeiro de 2022, de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística com referência ao concelho ...;
2. O pagamento é feito até ao dia 8 do mês a que disser respeito, por qualquer meio idóneo de pagamento.
3. As despesas extraordinárias médicas (não comparticipadas), medicamentosas e escolares, desde que devidamente documentadas serão suportadas por ambos os progenitores em 50%, mediante apresentação dos respectivos recibos com nome e nif das menores, serão pagas no mês subsequente à sua apresentação.-»
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Inconformados com a sentença, dela recorreram a Requerente e o Requerido.
A Requerente, AA, apresentou alegações com as seguintes CONCLUSÕES:
………………………………………..
………………………………………..
………………………………………..
Pretende, assim, o recorrente DD a alteração do ponto 11º do acervo dos factos dados como provados e a redução do valor da pensão de alimentos fixada para a quantia de €100,00 mensais para cada uma das duas filhas.
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O Ministério Público e a Requerente apresentaram contra-alegações relativamente ao recurso do Requerido DD, defendendo a confirmação do julgado.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II.
O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões das duas apelações, acima transcritas, sendo que se apreciam apenas as questões invocadas e relacionadas com o conteúdo do ato recorrido, delas retirando as devidas consequências, e não sobre matéria nova, exceção feita para o que for do conhecimento oficioso (cf. art.ºs 608º, nº 2, 635º e 639º do Código de Processo Civil).
Com efeito, estão para apreciar e decidir as seguintes questões:
A- Da apelação da Requerente AA:
1. Nulidade da decisão por omissão de pronúncia.
B- Da apelação do Requerido DD:
1. Erro de julgamento na decisão proferida em matéria de facto;
2. Erro na aplicação do Direito quanto ao regime relativo ao montante da pensão de alimentos fixada a favor das crianças.
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III.
O tribunal deu como provada e relevante a seguinte matéria de facto[5]:
1) BB e CC, nascidas a .../.../2005 e .../.../2011 respectivamente, sendo ambas ainda menores e são filhas da requerente e do requerido, encontrando-se a filiação estabelecida relativamente a ambos os progenitores – (Cfr. certidões dos assentos de nascimento que se juntam como Docs. nºs 1 e 2, cujo teor se dá por reproduzido para os devidos efeitos legais).
3) Os progenitores das menores são casados um com o outro;
4) A requerente apresentou a respectiva acção de divórcio sem o consentimento do outro cônjuge, contra o aqui requerido, sob o processo nº 884/20...., que corre termos neste tribunal, estando esta acção ainda pendente.
5) No dia 25 de Janeiro de 2020, motivada por uma discussão entre o casal, a requerente deixou de dormir com o Requerido, passando a dormir com uma das suas filhas.
6) Sucede que, no dia 15 de Fevereiro de 2020 a requerente saiu da casa de morada de família, juntamente com as suas filhas.
7) Tal facto foi originado pela violência doméstica que a A. e as suas filhas eram sujeitas por parte do Réu, o que motivou a apresentação de queixa crime por parte da autora contra o réu, com o esclarecimento de que entre outros factos, o pai quis que a mãe preparasse/confeccionasse para a mãe e irmã do réu, não tendo a autora aderido a essa incumbência por parte do réu, o réu seu pai insultou a mãe chamando-a de cabra, víbora, cobra, não vales nada.
8) Para além desse episódio que motivou a queixa, nesse mesmo mês ocorreu um episódio em que a autora foi dormir com as duas filhas do casal, porque o réu discutiu tanto porque queria levar as filhas à patinagem, apesar de estas preferirem ir com a mãe, tendo a autora trancado a porta do quarto e da irmã, sendo que no dia seguinte o pai as queria obrigar a ir ao treino só com ele, sendo certo que era sempre a mãe que as levava, tendo forçado a porta, procurando arromba-la, motivo que levou as mesmas a ligar para a GNR a pedir ajuda, tendo a GNR referido para apenas saírem do quarto quando lá chegassem.
9) Nessa sequência, a A. apresentou queixa na GNR ... no dia 3 de Fevereiro de 2020, por o Réu ter agarrado na cabeça da A. e fazendo bater a cabeça desta contra o chão, bem como a injuriado de cabra, vaca, não vales nada e tentativa de agressão com uma cadeira a uma das suas filhas, bem como estes e outros episódios de extrema agressividade, como o de partir uma porta de um dos quartos da casa de morada de família.
10) O processo de violência doméstica correu termos no Tribunal da Comarca ... no Juízo Local Criminal ... com o processo nº 35/20....
11) No âmbito do aludido processo crime (Proc. N.º 35/20....), por sentença transitada em julgado, o réu veio a ser condenado, como autor material, de um crime de violência doméstica previsto e punido pelo artigo 152º n.º 1 alínea a), n.º 2, 4 e 5 do Código Penal, cuja ofendida era a progenitora.
12) As discussões entre o casal eram frequentes, sendo frequente o progenitor chamar à requerente de cabra, víbora, cobra, badalhoca e filha da puta, não vales nada.
13) A requerente saiu, assim, da casa de morada de família com as suas filhas, no dia 15 de
Fevereiro de 2020, atento o comportamento agressivo e injurioso continuado por parte do requerido, quer com a requerente progenitora, quer com as menores, nomeadamente chamando a requerente de cobra, cabra, não vales nada e chamando constantemente de burras as suas filhas.
14 ) As menores desde o dia 15 de Fevereiro de 2020 passaram só a residir com a mãe, na morada supra identificada, na casa dos avós maternos das mesmas.
15) Foi designada data para a realização de conferência entre os progenitores, e na medida em que as menores não mostraram receptividade no estabelecimento de uma guarda alternada entre os Progenitores, foi determinado, nos termos do artigo 37.º, nº 8 do RGPTC, o seguinte regime provisório de regulação das responsabilidades parentais, com as seguintes cláusulas:
1.- As Menores, BB e CC, ficarão entregues aos cuidados da Mãe fixando-se a residência junto delas.
2.- As responsabilidades parentais referentes às questões de particular importância para a vida das Menores, BB e CC, serão exercidas em conjunto por ambos os Progenitores, sem prejuízo do regime estipulado na parte final do artigo 1906º, n.º 1 do C.C.
3.- O exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente das Menores caberá à Progenitora, sem prejuízo da intervenção do Progenitor quando as Menores consigo estejam.
4.- O Progenitor estará com as Menores um dia, todos os fins-de-semana, aos sábados ou aos domingos, de forma alternada, tomando uma refeição, almoço ou jantar, com estas.
5.- O Progenitor pagará a título de pensão de alimentos, às filhas, a quantia de €200 (duzentos euros), €100 por cada Menor, até ao dia 8 de cada mês, valor que entregará à Progenitora por qualquer meio idóneo de pagamento.
6.- As despesas médicas e medicamentosas, como despesas com óculos, lentes, ortopedia, e as despesas de educação como as de material e livros escolares e salas de estudo serão suportadas em partes iguais por ambos os Progenitores, após a apresentação pela Mãe dos respectivos comprovativos de despesas em nome das Menores, pagando o Pai a sua comparticipação, no mês seguinte ao da apresentação das despesas e em conjunto com a pensão de alimentos.
16) À data da realização da audição técnica especializada, e de acordo com o respectivo relatório, a situação vivencial das menores BB e CC alterou-se pouco depois da Conferência de Pais realizada no passado mês de Julho de 2020, sendo que deixaram de residir com a mãe (em casa dos avós maternos) e fixaram residência junto do pai, em virtude de a mãe ter considerado não existirem condições para que estas permanecessem na casa dos avós maternos.
17) Assim, desde o início de Agosto de 2020, a BB e a CC passaram a residir com o pai e passavam semanalmente o sábado ou o domingo com a mãe.
18) No mês de Agosto de 2020, passaram uma semana de férias com a mãe, mas na maioria dos dias pernoitaram na casa do pai.
19) Para além disso, foram convivendo diariamente com a mãe, uma vez que esta mantém actividade laboral numa empresa sedeada em ..., e ia visitar as filhas após sair do trabalho.
20) As alterações implementadas mereceram a concordância da mãe, por reconhecer que a casa dos avós maternos não reunia as condições necessárias, principalmente em termos de espaço, para o acolhimento adequado das crianças.
21) Era sua intenção arrendar casa em localidade próxima da residência do progenitor tendo em conta o seu local de trabalho, o que também permitiria que as crianças continuem a frequentar os estabelecimentos de ensino onde estavam integradas, bem como a actividade desportiva que praticavam (patinagem artística).
22) Aquando da realização das sessões individuais, os progenitores transmitiram que as dificuldades de comunicação que existiam foram-se esbatendo progressivamente e que já conseguiam dialogar de forma cordial sobre os assuntos respeitantes às filhas.
23) No decurso da sessão conjunta, concordaram na manutenção da residência das filhas junto do pai e do regime de convívios com a mãe, nos mesmos moldes (semanalmente, ao sábado ou ao domingo, com recolha às 9:00 horas e entrega às 22:00 horas), bem como férias e datas festivas alternadas.
24) Ao nível económico, tendo em conta que o regime seria temporário / provisório, ambos aceitaram que não fosse fixada uma pensão de alimentos, comprometendo-se o pai a assumir as despesas com a alimentação e a mãe as despesas com vestuário e calçado e ambos a comparticiparem equitativamente as despesas de saúde, escolares e actividades extraescolares.
25) No que concerne à residência, os progenitores assumiram um posicionamento convergente, traduzido na perspectiva de implementação de um regime de residência alternada, quando a progenitora conseguir concretizar a sua mudança de residência para uma localidade próxima do progenitor e dos estabelecimentos de ensino que as filhas frequentam.
26) No entanto, as circunstâncias alteraram-se desde a elaboração do relatório de audição técnica especializada, dado que a progenitora passou a residir na Rua ... em ....
27) E desde 30 de Setembro de 2020 que as suas filhas menores (que até então se encontravam a residir com o pai), passaram a residir consigo.
28) Esta mudança deveu-se sobretudo ao facto de as filhas menores terem pedido à progenitora para que se mudassem para a casa desta, pois segundo as mesmas “já não aguentavam o suplício do convívio diário com o pai”, devido à forma com que aquele lidava com as mesmas.
29) As menores estiveram cerca de dois meses em casa do Pai, mas regressaram a casa da mãe, dado que o progenitor recorre ao castigo físico, o que ocorria com frequência com a filha mais nova.
30) A menor CC nessa altura teve problemas com o sono, tendo tido pesadelos, e que a Menor, BB, padece de crises de ansiedade, baixa auto-estima e sintomas depressivos, que não são benéficos para a sua saúde.
31) Do teor do relatório de psiquiatria da infância e da adolescência forense realizado à menor BB resulta que a examinanda apresenta um desenvolvimento cognitivo na média. Percepciona adequadamente o ambiente que a rodeia e tem capacidade de prever as consequências do seu comportamento e o de terceiros pelo que tem capacidade para testemunhar. Não apresenta traços de futura perturbação da personalidade. Não foi aparente coacção ou instrumentalização por terceiros. Ao longo da entrevista a examinanda descreveu maus-tratos físicos (palmadas) e emocionais crónicos pelo pai sobre a mãe e as filhas, problemática que levou a sintomatologia depressiva e ansiosa que se encontra em tratamento e que teve repercussões muito significativas sobre o seu rendimento académico e vida de relação.
33) Do teor do mesmo relatório resulta que a examinanda descreveu vínculos afectivos seguros e estruturados com a figura materna, mas esta não é percepcionada como uma figura suficientemente protectora, não tendo descrito vínculos afectivos com a figura paterna, esta é percecionada como uma figura ameaçadora e agressiva em termos físicos e emocionais.
34) A BB não pretende estar com o pai.
35) Por seu turno, do teor do relatório de psiquiatria da infância e da adolescência forense realizado à menor CC, resulta que a examinanda apresenta um desenvolvimento cognitivo na média, pelo que percepciona adequadamente o ambiente que a rodeia e tem capacidade de prever as consequências do seu comportamento e o de terceiros pelo que tem capacidade para testemunhar. Não apresenta traços de futura perturbação da personalidade. Nem foi aparente coacção ou instrumentalização por terceiros.
36) Do teor do aludido relatório resulta ainda que ao longo da entrevista a examinanda descreveu maus-tratos físicos (palmadas) e emocionais crónicos pelo pai sobre si e sobre a sua irmã, não tendo sido aparentes sequelas emocionais desses eventos, a não ser a rejeição da figura paterna.
37) Do teor do aludido relatório a CC descreveu vínculos afectivos seguros e estruturados com a figura materna, mas esta não é percepcionada como uma figura suficientemente protectora, não tendo descrito vínculos afectivos com a figura paterna, sendo esta percecionada como uma figura ameaçadora e agressiva em termos físicos e emocionais.
38) A CC não pretende estar com o pai.
39) Da avaliação psiquiátrica efectuada à progenitora resulta que a mesma não padece de doença mental nem de relevante perturbação de personalidade que lhe altere ou impeça de exercer a parentalidade de forma responsável, tendo capacidades intelectuais e cognitivas que a tornam responsável pela forma como exerce a parentalidade e demonstra ter vinculação afetiva e preocupação com o bem estar das filhas.
40) Por seu turno, da avaliação psiquiátrica efectuada ao progenitor resulta que o mesmo não padece de doença psiquiátrica ou grave anomalia de personalidade que por si lhe alterem as suas competências parentais, possuindo capacidades intelectuais e cognitivas normais, e tem capacidade de exercer as suas competências parentais e é responsável pela forma como as exerce.
41) Da avaliação psicológica da progenitora resulta que não emergem indicadores particularmente carecedores de atenção psicoterapêutica. No que concerne ao apurado em sede de entrevistas no que se refere ao seu perfil de personalidade não se identificam características per si limitativas ou obstaculizantes do exercício da parentalidade, destacando-se unicamente traços como a tendente experienciação de ansiedade ou o facto de se poder mostrar arrogante como potencialmente impactantes, de forma indirecta para as menores, no âmbito da dinâmica com o progenitor –intensificada por alegadas vivências de violência perpetrada pelo progenitor Sr. DD.
42) Do aludido relatório resulta ainda que a narrativa da progenitora denota que se manifesta afectivamente disponível para as filhas, capacidade de as caracterizar e perspectivar as suas necessidades, remetendo ainda para a existência de vínculo afectivo e assinalando-se pressupostos teóricos que se consubstanciam globalmente ajustados quanto às suas crenças e concepções intrínsecas do exercício da parentalidade.
43) Por seu turno, a avaliação formal psicológica da BB identifica sintomatologia clinicamente expressiva no âmbito da sensibilidade interpessoal que se centra em sentimentos de inadequação pessoal e inferioridade, particularmente na comparação com os outros, auto-depreciação, hesitação, desconforto e timidez nas interacções sociais.
44) Nesse âmbito, foi solicitada à BB o preenchimento de um instrumento de avaliação do seu comportamento e funcionamento e da sua análise, não se identificou significância clínica em qualquer das escalas consideradas. A menor assinala, no âmbito do preenchimento do mesmo instrumento, como preocupação “não ser capaz de fazer nada” (sic). Caracteriza-se “sou uma pessoa calma que gosta sempre de ver os outros bem mesmo que eu própria não o esteja” (sic).
45) Em sede de entrevista a menor refere beneficiar de apoio pedopsiquiátrico “estou com a depressão por isto e coisas que se calhar não dei fé que me afectaram…a escola, a minha cadela que morreu há anos…a minha psicóloga na altura disse que eu estaria em depressão há muito tempo, que eu bati no fundo…). Acho que tudo ia piorar. Se me cruzo com ele fico mal psicologicamente, fico com medo, lembro-me do meu passado…a minha tia reparava que se a minha irmã fazia assim (gesticula com a mão levantada) eu fiquei assim (gesticula mostrando-se encolhida) e piscava os olhos…” (sic).
46) Considerando os elementos obtidos no âmbito da avaliação psicológica no que respeita à BB, a avaliação da BB identifica fragilidades no âmbito da sua auto- estima destacando-se uma sensibilidade interpessoal que se centra em sentimentos de inadequação pessoal e inferioridade, particularmente na comparação com os outros, auto- depreciação, hesitação, desconforto e timidez nas interacções sociais.
47) No que respeita à BB, o relatório conclui que deve manter o acompanhamento psicológico de que beneficiará.
48) Decorre da avaliação da BB que a progenitora se constitui a sua figura de referência, com a qual tem estabelecida uma vinculação segura.
49) No que respeita ao progenitor, a menor BB repudia a manutenção de contacto aludindo a práticas educativas pautadas pelo recurso à punição física, recorrente depreciação e agressividade verbal, percepcionando não ser uma prioridade para aquele – que considera não ter potencial de mudança.
50) A menor mostra-se ainda incapaz de identificar memórias positivas com o progenitor. A BB alude identicamente a memórias de alegados comportamentos agressivos do progenitor para com a irmã CC e com a progenitora.
51) Da avaliação psicológica da CC e no que respeita a eventual sintomatologia psicopatológica ou identificação de comportamentos disfuncionais, a avaliação da CC identifica indicadores clinicamente expressivos, nomeadamente no âmbito da ansiedade reactiva às dinâmicas familiares – nomeadamente por parte do progenitor – que relata, pelo que deve manter o acompanhamento psicológico de que terá beneficiado.
52) Decorre da avaliação da menor que a progenitora se constitui a sua figura de referência, com a qual tem estabelecida uma vinculação segura.
53) No que respeita ao progenitor repudia a manutenção de contacto aludindo a práticas educativas pautadas pelo recurso à punição física e agressividade verbal, percepcionando não ser uma prioridade para aquele - que considera egocêntrico.
54) A menor CC mostra-se ainda incapaz de identificar memórias positivas com o progenitor.
55) A CC refere identicamente alegadas memórias de terceiros, nomeadamente da irmã, percebendo-se que conhece mais circunstâncias do que aquelas que terá presenciado no que concerne à conduta do progenitor. Contudo, este conhecimento não se entende como instrumentalização mas enquanto decorrente da partilha de informação e vivências entre irmãs.
56) Da avaliação psicológica do progenitor resulta que não emergem indicadores carecedores de atenção psicoterapêutica, não se identificam características per si limitativas ou obstaculizantes do exercício da parentalidade, considerando-se contudo a impulsividade e o facto de experienciar um leque limitado de emoções como factores potencialmente impactantes na sua leitura das necessidades – nomeadamente afectivas – das menores.
57) Da aludida avaliação psicológica resulta que a narrativa do progenitor denota vínculo afectivo às menores embora se sugira que as características supra-mencionadas interferem com um exercício do papel parental salutarmente orientado para o efectivo perfil e idiossincrasia das filhas.
58) Por seu turno, da avaliação psicológica da progenitora resulta que não emergem indicadores particularmente carecedores de atenção psicoterapêutica, sendo que no que se refere ao seu perfil de personalidade não se identificam características per si limitativas ou obstaculizantes do exercício da parentalidade, destacando-se unicamente traços como a tendente experienciação de ansiedade ou o facto de se poder mostrar arrogante como potencialmente impactantes, de forma indirecta para as menores, no âmbito da dinâmica com o progenitor –intensificada por alegadas vivências de violência perpetrada pelo Sr. DD.
59) da aludida avaliação resulta ainda que a narrativa da progenitora denota que se manifesta afectivamente disponível para as filhas, capacidade de as caracterizar e perspectivar as suas necessidades, remetendo ainda para a existência de vínculo afectivo e assinalando-se pressupostos teóricos que se consubstanciam globalmente ajustados quanto às suas crenças e concepções intrínsecas do exercício da parentalidade.
60) O requerido trabalha como mecânico de automóveis, auferindo a quantia de €800,00 mensais.
61) O progenitor tem como despesas mais significativas a renda de casa no valor de €205,00; combustível no valor de €60,00; ATL das filhas no valor de €32,50;tv/intervnet e telefone no valor de €41,00; água, luz e gás no valor de €120,00; alimentação no valor de €150,00 e pensão de alimentos das filhas no valor de €200,00, e comparticipação na consulta de pedopsiquiatria da filha em €30,00.
62) Como despesas anuais mais significativas o progenitor manifesta as que assume com o IMI, Seguro Automóvel, IUC e Inspeção Automóvel, Seguro de Motorizada e Seguro de Bicicleta, num montante anual de aproximadamente 665€.
63) DD dispõe sempre que necessita de colaboração alimentar e económica por parte da sua mãe e uma irmã.
64)O contador da luza do requerido serve a casa da mãe e a do requerido.
65) DD mantém a sua residência na anterior morada de família que é da sua propriedade, a qual se refere a uma habitação R/C e 1º andar, de tipologia T3.
66) DD exerce a sua atividade laboral como mecânico de Automóveis, desde há aproximadamente 34 anos, realizando um horário laboral de segunda-feira a sexta-feira das 8h45 às 18h00.
67) AA, reside na morada supracitada desde outubro de 2020, no R/C de uma habitação arrendada, de tipologia T2.
68) AA exerce a sua actividade laboral na Empresa X..., desde há aproximadamente 5 anos, realizando um horário laboral de segunda-feira a sexta-feira das 8h00 às 17h00.
69) A progenitora assume deter condições económicas para a satisfação das necessidades das filhas, dispondo ainda de colaboração familiar sempre que necessita para esse efeito.
70) Como despesas anuais mais significativas, a progenitora manifesta as que assume com o Seguro Automóvel, IUC e Inspeção Automóvel num montante anual de aproximadamente 248€.
71) Aufere a quantia de €665,00 mensais, a que acresce a pensão de alimentos das menores no valor de €200,00 e o abono de família no valor de €56,00,e ainda a comparticipação do progenitor no ATL (€32,50) e na consulta de pedopsiquiatria no valor de €30,00.
72) Tem como despesas mais significativas a renda da casa no valor de €300,00 (que inclui água e luz); gás, €15,00; transportes e gasolina €90,00; tv/internet €25,00; telefone €10,00; alimentação do agregado €250,00; e especificas das menores ATL €65,00; medicamentos €13,00; vestuário e calçado €50,00 e consulta de pedopsiquiatria €60,00.
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Quanto à matéria não provada, fez o tribunal constar “mais nenhum facto resultou apurado”.
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IV.
A- Da apelação da Requerente AA
Nulidade da sentença, por omissão de pronúncia
Diz-nos a recorrente que o tribunal não se pronunciou sobre as atividades extracurriculares das duas crianças, sendo o superior interesse delas continuarem a frequentar a modalidade desportiva de patinagem, como vêm fazendo há muitos anos, desde o tempo da vida em comum do casal.
Sendo uma atividade que é paga, o tribunal deveria tê-la reconhecido e fixado o regime de pagamento a cargo de ambos os pais, na proporção de metade.
Entende ainda que as crianças deverão poder frequentar outras atividades extracurriculares no futuro, previamente acordadas pelos progenitores e a pagar por eles na referida medida de 50% por cada um.
É aqui subsidiariamente aplicável o Código de Processo Civil, por força do art.º 33º, nº 1, do RGPTC, segundo o qual, “nos casos omissos são de observar, as devidas adaptações, as regras de processo civil que não contrariem os fins da jurisdição de menores”.
Dispõe o art.º 615º, nº 1, al. d), daquele código processual, que a sentença é nula quando “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
Aquele normativo está em correlação com o art.º 608º, nº 2, do mesmo código. O juiz tem que resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação. Além dessas só aprecia e decide aquelas cujo conhecimento a lei lhe imponha ou permita.
A questão a decidir está intimamente ligada ao pedido da providência e à respetiva causa de pedir[6]. Relevam, de um modo geral, as pretensões deduzidas e os elementos integradores do pedido e da causa de pedir.[7]
Situamo-nos no âmbito de um processo de RERP. Importando realizar através daquela regulação o superior interesse das crianças visadas, deverá o tribunal levar em consideração todos os factos que, uma vez conhecidos, possam contribuir para realização daquele princípio, que passa pelo atendimento do dever de dar prioridade aos interesses e direitos da criança ou do jovem, nomeadamente à continuidade de relações de afeto de qualidade e significativas, mas também a relevância que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes em cada caso concreto, no sentido da promoção e desenvolvimento harmonioso da sua personalidade e bem-estar. Tal realização abrange tudo o que envolve os legítimos anseios, realizações e necessidade da criança nos mais variados aspetos: físico, intelectual, moral, religioso e social. E esse interesse tem de ser ponderado casuisticamente em face de uma análise concreta de todas as circunstâncias relevantes.[8]
Como tal, deve, no caso, considerar-se sobretudo o interesse superior das duas crianças, contribuindo para o seu desenvolvimento integral, através da otimização da regulação das responsabilidades parentais e dos mecanismos inerentes ao seu efetivo cumprimento.
A frequência da modalidade de patinagem, pelas filhas do casal, não é algo que surge agora de novo nas alegações de recurso. Não estando espelhada nos factos dados como provados na sentença, nem abordada na subsequente fundamentação jurídica, ela foi, no entanto, alegada pela Requerente nas alegações que produziu ao abrigo do art.º 39º, nº 4, do RGPTC. Escreveu ali:
«(…)
gggg) Para além das despesas supra descritas acresce a despesa das menores com a frequências nas aulas de patinagem, a Alegante que tem um custo mensal de €32,50 por cada uma das menores, cfr. (doc. 12), e se dá como reproduzido para todos os efeitos legais, sendo que o recibo onde já consta o nome das menores, esta na posse do requerido referente ao mês de Setembro de 2020.»
Juntou a Requerente, também a 8.7.2021, com as ditas alegações, um recibo comprovativo do pagamento da anuidade da frequência da modalidade de patinagem.
Mas já anteriormente, na ata de conferência de pais, em 23.6.2021, o Requerido reconhecera a prática daquela atividade de patinagem pelas filhas, fazendo-o assim:
«(…)
Referiu ainda, que o progenitor pai não tem condições económicas para comparticipar com 50% das despesas extracurriculares, nomeadamente a patinagem que as menores frequentam.
Também nas suas posteriores alegações, o Requerido admitiu a existência de atividades extracurriculares quando propôs, sob o item c), que “as questões especificamente relacionadas com a prática de desportos, demais atividades extracurriculares, formação espiritual e/ou religiosa e valores humanos e intelectuais, serão acordadas por ambos os progenitores” e, sob o item j) que “o pai suportará, também, metade das despesas escolares (livros e outro material escolar), médicas e medicamentosas, mediante apresentação das respectivas facturas, bem como, metade das despesas relativas a outras actividades extracurriculares, desde que o sejam previamente acordadas por ambos os progenitores”.
Resultou ainda da informação técnica especializada, junta a 9.10.2020:
«(…)
As alterações implementadas mereceram a concordância da mãe, por reconhecer que a casa dos avós maternos não reunia as condições necessárias, principalmente em termos de espaço, para o acolhimento adequado das crianças. Por outro lado, tendo em conta o seu local de trabalho, a progenitora pretende arrendar uma casa em localidade próxima da residência do progenitor, o que também permitirá que as crianças continuem a frequentar os estabelecimentos de ensino onde estavam integradas, bem como a atividade desportiva que praticavam (patinagem artística).»
A frequência da modalidade desportiva de patinagem é enriquecedora das crianças, quer no aspeto do desenvolvimento físico e da saúde, quer no aspeto da socialização, pelo relacionamento interpessoal. É uma modalidade que já praticam há anos, nada desabonando, antes se recomendado a sua continuidade, como tem sido, aliás, vontade dos pais. A omissão de qualquer referência a essa atividade em sede de sentença constitui omissão de pronúncia relativa a uma questão deveras importante na vida das duas crianças e que, como tal, gera nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, ao abrigo do art.º 615º, nº 1, al. d), do Código de Processo Civil, deixando os progenitores na indecisão de saber quem pagará os custos daquela atividade extracurricular, e em que medida.
Assim e porque nos situamos no domínio da jurisdição voluntária, em que o tribunal não tem que observar critérios de legalidade estrita, mas zelar primordialmente pela satisfação do interesse das crianças (art.º 12º do RGPTC e art.º 987º do Código de Processo Civil), vamos, também ao abrigo da regra da substituição ao tribunal recorrido (art.º 665º, nº 1, ainda do Código de Processo Civil) levar em atenção, para feito de decisão, a prossecução da prática de patinagem pelas duas irmãs e a necessidade de continuar a ser paga a mensalidade da respetiva frequência, o que deverá acontecer na proporção de ½ para cada progenitor; aliás, como deverá acontecer relativamente a qualquer outra atividade extracurricular das crianças em cuja realização os pais acordem no futuro, como os próprios têm entendido regular.
Voltaremos ao tema quando, adiante, for tratada a questão do valor da pensão de alimentos.
Procede o recurso da Requerida AA.
*
B- Da apelação do Requerido DD
1. Erro de julgamento na decisão em matéria de facto
O recorrente DD reporta-se apenas ao facto dado como provado no ponto 11 da sentença:
«No âmbito do aludido processo crime (Proc. N.° 35/20....), por sentença transitada em julgado, o réu veio a ser condenado, como autor material, de um crime de violência doméstica previsto e punido pelo artigo 152° n.° 1 alínea a), n.° 2, 4 e 5 do Código Penal cuja ofendida era a progenitora.»
O recorrente opõe-se a que seja dado como provado que a sentença condenatória transitou em julgado, mas não nega o julgamento e a condenação.
Indica como meio de prova uma informação prestada no processo pelo Juízo Local Criminal ..., onde aqueles autos correm termos.
De facto, aquele EE informou oficialmente que aquela sentença ainda não tinha transitado em julgado, por ter sido interposto recurso (cf. informação junta aos autos no dia 9 de março de 2021), desconhecendo-se qualquer informação posterior sobre o estado do processo. Juntou à informação cópia da sentença condenatória de onde se extrai condenação na pena de 3 (três) anos de prisão, suspensa na execução pelo período de 3 (três) anos, sujeita a regime de prova e ainda condenação em diveras penas acessórias e em indemnização a favor da vítima.
O ponto 11 do acervo de factos provados passa necessariamente a ter o seguinte teor:
11. «No âmbito do aludido processo-crime (proc. n.° 35/20....), por sentença ainda não transitada em julgado, o réu veio a ser condenado, como autor material de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152°, n.° 1, alínea a), n.°s 2, 4 e 5, do Código Penal, cuja ofendida era a progenitora.»
Procede, assim, a apelação do Requerido quanto à impugnação da decisão em matéria de facto.
*
2. Erro na aplicação do Direito quanto ao regime relativo ao montante da pensão de alimentos fixada a favor das filhas do casal
O apelante discorda do ponto 4.1 da RERP, segundo o qual “o pai contribui mensalmente com a quantia de €125,00 (cento e trinta euros) para cada menor e para o seu sustento, actualizada anualmente, com início em Janeiro de 2022, de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística com referência ao concelho ...”.
Defende o DD que a pensão de alimentos não deve ir além de € 100,00 por cada criança, por não ter possibilidades económicas de a prestar acima daquele valor. Argumenta, sobretudo, com o seu salário líquido e as suas despesas obrigatórias e indispensáveis. Para um salário líquido mensal da ordem dos €770,00 (de €738,26 no ano de 2020, por força do agravamento da taxa de retenção na fonte), invocou as seguintes despesas pessoais a que o tribunal a quo atendeu:
- Mensais: renda da casa, combustível, ATL da filha, tv/internet e telefone, água, luz e gás, alimentação, pensão de alimentos às filhas (€200,00), e comparticipação na consulta de pedopsiquiatria, n o total de €838,50 mensais.
- Anuais: IMI, seguros, IUC, inspeção automóvel, num montante aproximando de €665,00, o que representa uma média mensal de €55,42.
Considera o recorrente que, mesmo atendendo aos pressupostos invocados pelo tribunal (um rendimento mensal de €800,00), a despesa total anual dividida pelos 12 meses do ano (838,50 + 55,42) atinge €893,92, criando, assim, um défice mensal ao Requerido de €93,92.
Acrescenta o recorrente que, devendo ser considerado o seu rendimento mensal líquido de €738,26 (obtido em 2020), então aquele défice ultrapassa mesmo os €150,00, o que não é aceitável, por não dispor de outros rendimentos, nem terem a sua mãe e a sua irmã a obrigação de o sustentar.
Vejamos.
A separação dos pais da criança, sejam eles cônjuges um do outro ou não, gera a necessidade de regular o exercício das responsabilidades parentais, com fixação de um regime determinante da forma como, no futuro, a criança se irá relacionar com os progenitores, designadamente a distribuição das responsabilidades destes relativamente à fixação da sua residência, ao direito de visitas do progenitor com o qual não irá residir e ao dever de prestar alimentos (art.º 1095º, 1096º, 1909º, 1911º, nº 2 e 1912º do Código Civil).
É mais uma vez o superior interesse das crianças que aqui está em causa, ou seja, procurar, pelo conjunto das circunstâncias da sua vida e dos seus familiares mais próximos, o melhor caminho para a sua realização pessoal como ser humano em crescimento; agora, no recurso, apenas na vertente do montante dos alimentos a prestar pelo recorrente, não se levantando qualquer questão relativamente à fixada residência das crianças com a mãe, visitas, atos da vida corrente e questões de particular importância (art.º 1906º do Código Civil).
O interesse de uma criança não é o interesse de uma outra criança e o interesse de cada criança é, ele próprio, suscetível de se modificar. Trata-se, afinal, de uma noção cultural intimamente ligada a um sistema de referências vigentes em cada momento, em cada sociedade, sobre a pessoa do menor, sobre as suas necessidades, as condições adequadas ao seu adequado desenvolvimento e bem-estar cultural e moral.[9]
Encontrando-nos perante uma situação de rutura da vida comum dos progenitores, há de fazer-se um esforço de garantia, tanto maior quanto possível, de manutenção das condições sociais, materiais e psicológicas das duas filhas que possibilitem o seu desenvolvimento estável, agora na vertente dos alimentos de que carecem.
A regra prevista no art.º 1878º, nº 1, do Código Civil, constitui uma emanação do comando constitucional contido nº 5 do art.º 36º, segundo o qual “os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos” que, por sua vez, se coaduna com o que expressa o nº 2 do art.º 27º da Convenção sobre os Direitos da Criança: “Cabe primacialmente aos pais e às pessoas que têm a criança a seu cargo a responsabilidade de assegurar, dentro das suas possibilidades e disponibilidades económicas, as condições de vida necessárias ao desenvolvimento da criança”.
O dever de auxílio e assistência constitui um dos efeitos da filiação, sendo que o último compreende a obrigação de prestar alimentos e a de contribuir, durante a vida em comum, de acordo com os recursos próprios, para os encargos da vida familiar.
Já especialmente, no âmbito das responsabilidades parentais, até à maioridade dos filhos, compete aos pais, no interesse daqueles, velar pela sua segurança e saúde, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens (art.ºs 1877º e 1878º do Código Civil). E só ficam desobrigados daquele dever de sustento e de assumir as despesas relativas à sua segurança, saúde e educação na medida em que os filhos estejam em condições de suportar aqueles encargos pelo produto do seu trabalho ou outros rendimentos, nas condições previstas nos art.ºs 1880º e 1905º, nº 2, ainda do Código Civil.
Salvo o que a lei prevê nesta matéria no âmbito da adoção, os pais não podem renunciar às responsabilidades parentais nem a qualquer dos direitos que aquele regime especialmente lhes confere (art.º 1882º do Código Civil).
No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22.5.2013[10], citando dois outros arestos daquele Alto Tribunal, de 12.7.2011 e de 27.9.2011, refere-se[11] que «[o] fundamento sociológico e jurídico da obrigação de alimentos radica-se na natureza vital e irrenunciável do interesse, juridicamente tutelado, que tem subjacente a responsabilidade dos pais pela concepção e nascimento dos filhos, independentemente da relação afectiva e do convívio, realmente, existente entre o progenitor não guardião e os filhos, a ponto de permanecer intacta, na hipótese do mais grave corte da relação entre ambos, como acontece com a situação de inibição do exercício do poder paternal, que “em nenhum caso isenta os pais do dever de alimentarem o filho”, como decorre do estipulado pelo artigo 1917º, do Código Civil (CC)». Qualificando o dever de alimentos que recai sobre os pais da criança como irrefragável e inafastável, acrescenta-se ali que «a obrigação de alimentos é, igualmente, de interesse e ordem pública, de carácter indisponível, irrenunciável, intransmissível e impenhorável, constituindo preocupação do Estado que quem deles esteja carecido possa recorrer, desde logo, aos seus familiares» e ainda que «a obrigação de alimentos dos pais para com os filhos menores representa um exemplar manifesto da catalogação normativa dos deveres reversos dos direitos correspondentes, dos direitos-deveres ou poderes-deveres, com dupla natureza, em que se assiste à elevação deste dever elementar, de ordem social e jurídico, a dever fundamental, no plano constitucional, de modo a “assegurar, dentro das suas possibilidades e disponibilidades económicas, as condições de vida necessárias ao desenvolvimento da criança”…».
O alcance do dever de alimentos devidos a crianças suplanta a dimensão dos alimentos em geral, já que, para além de englobar tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário, compreende a instrução e educação do alimentado (art.º 2003º, nºs 1 e 2, do Código Civil).
Está em causa não apenas aquilo que é elementar para a sobrevivência da criança, mas também aquilo de que ela precisa para beneficiar de uma vida conforme as suas aptidões, estado de saúde e idade, tendo em vista a promoção do seu desenvolvimento físico, intelectual e emocional.
Porém, a medida dos alimentos não depende apenas da necessidade daquele que houver de recebê-los, devendo também ser proporcional aos meios daquele que houver de prestá-los (art.º 2004º, nº 1, do Código Civil) a aferir no momento da decisão. Pode ser alterada acaso se modifiquem as circunstâncias determinantes da sua fixação, reduzindo-se ou aumentando-se aquela medida (art.º 2012º do Código Civil). Esta obtém-se de acordo com o binómio necessidades/possibilidades.
Há que acatar a regra prevista na conjugação do art.º 2004º, nº 1 com o art.º 2013º, nº 1, al. b), ambos do Código Civil, segundo a qual o devedor responde na medida ou proporção das suas possibilidades, obrigação que cessa apenas quando não puder continuar a prestá-los ou o alimentando deixe de precisar deles.
Há de encontrar-se o equilíbrio da prestação. Não se deve exigir ao obrigado que, para ela, ponha em perigo a sua própria subsistência de acordo com a sua condição, mas devendo sempre os pais proporcionar aos filhos um nível de vida pelo menos semelhante ao seu.
À luz destas regras, analisemos o caso concreto.
Impõe-se desde já referir, face aos argumentos utilizados nas contra-alegações da Requerida, que o tribunal julga conforme os factos provados, sendo de admitir apenas algum esclarecimento dos mesmos com base nos elementos disponíveis nos autos, mas nunca com suposições ou deduções infundadas.
Dos factos provados extrai-se que:
- No regime de regulação provisória ficou estabelecido que o ora apelante pagaria a pensão mensal de alimentos €100,00 a favor de cada uma das duas filhas, a que acrescia metade do valor das despesas médicas, medicamentosas e escolares.
- O requerido trabalha como mecânico de automóveis, auferindo a remuneração mensal de €800,00.
- Tem como despesas mais significativas a renda de casa no valor de € 205,00; combustível no valor de €60,00; ATL das filhas no valor de €32,50; tv/internet e telefone no valor de €41,00; água, luz e gás no valor de €120,00; alimentação no valor de €150,00, pensão de alimentos das filhas no valor de €200,00, e comparticipação na consulta de pedopsiquiatria da filha em €30,00. Total: €838,50.
- Como despesas anuais mais significativas o progenitor manifesta as que assume com o IMI, Seguro Automóvel, IUC e Inspeção Automóvel, Seguro de Motorizada e Seguro de Bicicleta, num montante anual de aproximadamente €665,00; o que, distribuído pelos 12 meses de cada ano, dá uma despesa mensal de €55,40.
Adicionando esta despesa média mensal à supra referida despesa mensal de €838,50, obtém a despesa média mensal total de €893,90.
Dos factos provados não resulta que qualquer daquelas despesas já não existe, designadamente com o ATL, ou que a despesa com a consulta de pedopsiquiatria não representa uma despesa corrente, como defende a Requerida.
Está provado que a despesa com eletricidade e gás, no valor de €120,00 por mês é uma despesa do recorrente, sem qualquer alusão à inclusão do consumo efetuado na habitação de sua mãe. Em todo o caso, um consumo razoável de eletricidade e gás numa habitação normal, onde reside apenas um adulto a título permanente não necessita de ultrapassar uma média mensal anual de €75,00.
Um seguro de bicicleta, ainda que não obrigatório, não é uma despesa, em regra, significativa, estando-nos vedado presumir que se trata, no caso, de uma bicicleta de elevado valor. Não conhecemos a apólice e o que está segurado. Uma bicicleta é um meio de transporte económico e saudável, com utilização de baixo custo.
Não considerando os alimentos devidos às filhas, temos que a despesa corrente mensal do recorrente não deve ultrapassar a quantia de €648,90.
Quanto às despesas da recorrida, se foi dado como provado que gasta €250,00 com a alimentação do agregado familiar, não vemos como pode a recorrida defender - sem impugnação a decisão proferida em matéria de facto - que se trata de despesa realizada apenas com a alimentação das duas filhas (excluindo a própria Requerida).
A quantia de €150,00 que foi dada como provada como aquela que o Requerido necessita para se alimentar durante um mês não é excessiva, pois representa cerca de €5,00 por dia.
O aumento das despesas da recorrida pela consideração da despesa total com a patinagem só faria sentido se fosse de considerar que essa despesa é da sua inteira responsabilidade, o que não ocorre no caso, por dever ser dividida por ambos, em partes iguais.
Não procede a argumentação da recorrida.
Com efeito, mesmo na hipótese de o Requerido pagar uma pensão mensal de alimentos de €200,00, o rendimento mensal de €800,00 considerado pelo tribunal é insuficiente para fazer face ao total da sua despesa mensal razoável que atinge €848,90.
Acresce que os factos provados não referem se aquele rendimento de €800,00 é líquido ou ilíquido.
Nas suas alegações de 8.1.2021, o recorrente propôs-se contribuir com €100,00 por mês de alimentos para cada uma das filhas e suportar ainda metade das despesas escolares (livros e outro material escolar), médicas e medicamentosas, mediante apresentação das respetivas facturas, bem como, metade das despesas relativas a outras atividades extracurriculares, desde que o sejam previamente acordadas por ambos os progenitores. E acrescentou: “De salientar ainda que, o valor da pensão de alimentos referido supra está no limite (ou mesmo além) das capacidades económicas do requerido”. Invocou ali também que aufere um salario mensal de €800,00 e juntou vários recibos de vencimento (meses de agosto, setembro outubro e novembro de 2020, de onde resultam valores líquidos a receber situados entre €772,22 e €816,88, pagos pela sua entidade empregadora, pelo seu trabalho como mecânico de automóveis.
Do relatório social, junto a 4.3.2021, resulta também que o rendimento do trabalho do Requerido é de €800,00 por mês.
Nas alegações que apresentou a 8.7.2021,o apelante referiu:
(…)
28. Com o pagamento das pensões de alimentos às suas filhas, determinadas provisoriamente, de 100,00€ para cada uma, no total de 200,00€, sobram-lhe cerca de 200,00€ mensais, para fazer a sua vida (alimentação, seguros, IMI e outros impostos, combustível, etc.)
29. Tem também de comparticipar em metade das despesas escolares, médicas e medicamentosas, que a experiência do último ano já permitiu concluir que estas despesas vêm ocorrendo praticamente todos os meses…
30. Do que resulta que, ao Requerido, nem 200,00€ mensais lhe restam para fazer a sua vida…
31. O que, facilmente nos leva a perceber que a totalidade do valor mensal que o Requerido vem pagando de pensão às suas filhas está mesmo para além das suas possibilidades económicas!
(…)».
A análise dos documentos fiscais juntos pela Autoridade Tributária em 1.10.2021 não permite negar o rendimento líquido mensal aproximado de €800,00, mesmo superior, como resulta das declarações de rendimentos relativas aos anos de 2018 e 2019, rendimento que o próprio recorrente continuou a auferir no ano de 2021. A alguma variação não é alheia a variação do valor de retenção do IRS na fonte.
Ora, não se conhecendo ao Requerido qualquer rendimento que não seja o rendimento referido, do trabalho por conta de outrem, não vemos como poder ultrapassar os valores que o próprio alega estar em condições de poder disponibilizar mensalmente, com sacrifício, em benefício das duas filhas. É de admitir que já assim conta com o provável reembolso de quantias retidas a título de IRS, podendo até estar a tirar partido da colaboração alimentar e económica de que tem beneficiado da parte da sua irmã e da sua mãe. Como se observou, as suas despesas essenciais, com a pensão mensal de alimentos de €200,00 incluída e despesas de saúde, educação e atividade de patinagem das crianças, ultrapassam o valor dos seus rendimentos pessoais médios mensais.
Não é exigível que disponha da única casa de que é proprietário e onde habita - não lhe são conhecidos outros bens imóveis disponíveis ou indisponíveis - para fazer face a maiores despesas com alimentos.
Com a referida pensão e pagamento de metade das despesas acrescidas, as crianças, com cerca de 10 e 16 anos de idade, terão um nível de viva semelhante aos dos pais, que, sendo baixo, nem por isso as afasta do mínimo de proteção exigível dentro dos padrões da dignidade da vida humana.
A Requerente assumiu ter condições económicas necessárias à satisfação das necessidades das filhas, dispondo ainda de colaboração familiar sempre que necessita para esse efeito. Ao seu baixo salário mensal de €665,00, acresce, no entanto, a quantia mensal de €56,00 de abono de família, totalizando €721,00 por mês.
Paga €300,00 de renda de casa e tem despesas fixas também muito significativas, no que se inclui a alimentação do agregado familiar. Mas conta com a pensão de alimentos prestada pelo recorrente e a sua comparticipação, em metade do valor das despesas médicas, medicamentosas, de saúde e atividades extracurriculares acordadas.
Mas há um pormenor no binómio possibilidade/necessidade que poderá fazer aqui uma grande diferença. O próprio pai aceita poder contribuir, pelas forças do seu orçamento familiar, nas atuais circunstâncias, com a quantia de €32,50 para o ATL das filhas. Trata-se de uma despesa que poderá deixar de existir, em simultâneo ou sucessivamente, por cada uma das filhas, dada a diferença de idade que as separa. Não é previsível que frequentem o ATL até à maioridade, ou mesmo que o continuem a frequentar a partir de uma idade menos infantil. É certamente uma despesa que se pode esgotar a todo o tempo e que, estando dentro das reconhecidas possibilidades do progenitor, ainda que não sendo elevada, é muito relevante para a continuidade da satisfação do interesse das filhas, cuja despesa, aliás, irá aumentar à medida que vão crescendo.
Com efeito, aquela quantia de €32,50 deverá acrescer à pensão mensal de alimentos das crianças na medida e a partir do momento em que a mesma deixar de corresponder a despesa do recorrente com o ATL das filhas, relevando a data do presente acórdão caso a redução ou extinção daquela despesa tenha ocorrido na pendência do processo.
Por conseguinte, fazendo jus às regras acima enunciadas para a determinação do quantum da pensão de alimentos, devem julgar-se a apelação da Requerente procedente e a apelação do Requerido parcialmente procedente, alterando-se, em consequência - seguindo a forma dada na sentença de regulação - o ponto 4.1 e aditando-se os pontos 4.4[12] e 4.5, nos seguintes termos:
4.º
1. O pai contribui mensalmente com a quantia de €100,00 (cem euros) a título de alimentos para cada uma das duas filhas, atualizada anualmente, com início em janeiro de 2022, de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística com referência ao concelho ...;
(…)
4. O pai das crianças suportará ainda 50% das despesas com as suas atividades extracurriculares que sejam acordadas entre os progenitores, atualmente a patinagem, mediante a apresentação dos respetivos recibos com o nome e o NIF das crianças, pagando-as nos 8 dias subsequentes à sua apresentação.
5. A quantia de €32,50 que o Requerido despende com o ATL deverá acrescer à pensão mensal de alimentos das crianças na medida e a partir do momento em que a mesma deixar de corresponder a despesa efetiva do recorrente com aquela ocupação das filhas, relevando a data do presente acórdão caso a redução ou extinção daquela despesa tenha ocorrido na pendência do processo.
*
SUMÁRIO (art.º 663º, nº 7, do Código de Processo Civil):
..........................................................
..........................................................
..........................................................
*
V.
Pelo exposto, acorda-se nesta Relação em julgar ambas as apelações procedentes e, em consequência, altera-se a decisão sentenciada, que passa a ter o seguinte teor:
1.º
As crianças BB e CC ficam confiadas à guarda e cuidados da mãe, fixando-se a residência junto desta, competindo-lhe as responsabilidades parentais quanto às questões da vida corrente das filhas.
2º.
As responsabilidades parentais relativas a questões de particular importância para a vida das crianças são exercidas em comum, por ambos os pais, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer deles pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.
3.º
O pai pode visitar as crianças nos termos que forem acordados com a mãe, devendo, para o efeito, contactá-la com 24 horas de antecedência, desde que seja vontade das filhas, fixando-se um regime de visitas livre;
4.º
1. O pai contribui mensalmente com a quantia de €100,00 (cem euros), a título de pensão de alimentos para cada criança, atualizada anualmente, com início em janeiro de 2022, de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística com referência ao concelho ...;
2. O pagamento é feito, por qualquer meio idóneo, até ao dia 8 do mês a que disser respeito.
3. As despesas extraordinárias médicas (não comparticipadas), medicamentosas e escolares, desde que devidamente documentadas, serão suportadas por ambos os progenitores em 50% cada um, mediante apresentação dos respetivos recibos com nome e NIF das menores e serão pagas no mês subsequente à sua apresentação.
4. O pai das crianças suportará ainda 50% das despesas com as suas atividades extracurriculares que sejam acordadas entre os progenitores, atualmente a patinagem, mediante a apresentação dos respetivos recibos com o nome e o NIF das crianças, pagando-as nos 8 dias subsequentes à sua apresentação.
5. A quantia de €32,50 que o Requerido despende com o ATL deverá acrescer à pensão mensal de alimentos das crianças na medida e a partir do momento em que a mesma deixar de corresponder a despesa efetiva do recorrente com aquela ocupação das filhas, relevando a data do presente acórdão caso a redução ou extinção daquela despesa tenha ocorrido na pendência do processo.
*
Sem custas, por delas estarem isentos o Ministério Público e os pais das crianças (art.º 4º, nº 1, al. i), do Regulamento das Custas Processuais).
*
Porto, 24 de fevereiro de 2022
Filipe Caroço
Judite Pires
Aristides Rodrigues de Almeida
___________________________
[1] Adiante RERP
[2] Por transcrição.
[3] Adiante RGPTC.
[4] Ocorreu aqui um lapso relevante, com contradição na quantificação da pensão.
[5] Por transcrição.
[6] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil anotado, vol. V, pág. 58.
[7] Acórdão da Relação de Coimbra de 21.3.2006, proc. 4294/05, in www.dgsi.pt.
[8] Neste sentido, córdão da Relação ... de 01.04.2004, citado no acórdão da Relação ... de 08.07.2008, proc. 5895/2008-1, in www.dgsi.pt. Sobre o interesse do ... ver também acórdão daquela Relação de 14.06.2007, proc. 2616/..., igualmente disponível in www.dgsi.pt.
[9] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Março de 2007, FF, I, pág. 86, citando GG e A. HH, “...”, 1987, pág. 326.
[10] Proc. 2485/10...., in www.dgsi.pt.
[11] Que, com a devida vénia transcrevemos.
[12] Com a fixação de um prazo mais razoável e compatível com as dificuldades de adiantamento do pagamento da despesa pela ....