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SIGILO DAS TELECOMUNICAÇÕES
DEVER DE COLABORAÇÃO PARA A DESCOBERTA DA VERDADE
REGULAMENTO GERAL DE PROTECÇÃO DE DADOS(-RGPD)
DEVER DE CONFIDENCIALIDADE
Sumário
Sumário (artigo 663.º, n.º 7, do CPC):
I)– O sigilo das telecomunicações é uma das dimensões do direito à reserva da vida privada e familiar e do direito à inviolabilidade do domicílio e correspondência, com consagração autónoma na Constituição.
II)– Em matéria de telecomunicações, há que distinguir os dados de base (elementos de suporte técnico e de conexão estranhos à própria comunicação em si mesma), os dados de tráfego (elementos que se referem já à comunicação, mas não envolvem o seu conteúdo) e os dados de conteúdo (elementos que se referem ao conteúdo mesmo da comunicação).
III)– Os elementos referentes a aspectos administrativamente recolhidos na contratação do serviço de telecomunicações, não se referem à privacidade da vida da pessoa ou à sua esfera íntima em termos de encontrarem protecção no contexto dos bens jurídicos protegidos pela Constituição.
IV)– A Constituição, ao proibir a ingerência das autoridades nas telecomunicações salvaguardado o regime estabelecido quanto aos processos judiciais de natureza criminal, não se refere aos elementos ou dados de base de natureza de suporte técnico ou administrativo que as empresas operadoras possuam em razão do contrato estabelecido.
V)– Um dado como a morada do consumidor contraente não é um dado informativo que beneficie do especial regime de acesso estabelecido para as telecomunicações, estando a operadora apenas vinculada a um dever de confidencialidade.
VI)– Nem o regime específico aplicável às operadoras de telecomunicações, nem o regime geral de protecção de dados pessoais instituem as obrigações genéricas de protecção que consagram como deveres de sigilo profissional.
VII)– As operadoras de telecomunicações estão sujeitas a um dever de confidencialidade quanto à morada dos clientes, mas tal não configura um dever de sigilo profissional nem integra o âmbito de proibição de ingerência nas telecomunicações fora do estabelecido em processo penal.
VII)– O artigo 418.º do Código de Processo Civil não distingue entre serviços administrativos de entidades públicas e/ou de entidades privadas. (AAC)
Texto Integral
ACORDAM na 6ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
I)–RELATÓRIO
Nos autos de injunção, a prosseguir como acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias, que NOS COMUNICAÇÕES, S.A. instaurou contra B....., o Ex.mo Senhor Juiz de primeira instância suscitou incidente de levantamento do dever de sigilo a que está obrigada e que invocou VODAFONE PORTUGAL COMUNICAÇÕES PESSOAIS, SA (doravante Vodafone).
O incidente foi suscitado por a Vodafone, notificada pelo tribunal para prestar informação sobre a morada do Requerido em ordem à citação deste, ter invocado dever de sigilo profissional, acrescentando entender que, no caso de sigilo de telecomunicações, o mesmo não cede perante a necessidade de obtenção de informação em acções judiciais de natureza civil como é a presente.
Frustraram-se todas as tentativas de, por outros meios, nomeadamente junto de entidades públicas, ser apurada morada do Requerido diversa daquela em que não foi possível citá-lo, pelo que foi solicitada informação a operadoras de telecomunicações.
A Vodafone veio requerer como segue:
A Vodafone Portugal Comunicações Pessoais, S.A., (Vodafone) vem, ao abrigo do disposto nas alíneas b) e c) do n° 3 do artigo 417.º do Código de Processo Civil (alterado pela Lei n° 41/2013, de 26 de Junho), apresentar a V. Exa. o pedido de escusa na prestação da informação requerida no Vosso ofício n° 148834078, datado de 09/06/2021, nos termos e com os fundamentos que seguidamente se expõem: 0 cliente da Vodafone de nome B… solicitou a confidencialidade dos seus dados aquando da subscrição do serviço telefónico, pelo que as informações referentes ao seu nome, morada ou número de telefone encontram-se cobertas, quer pelo sigilo das comunicações, quer pelo sigilo profissional. Enquanto Operadora de redes e prestadora de serviços telefónicos acessíveis ao público, a Vodafone encontra-se vinculada ao sigilo das comunicações nos termos do disposto no artigo 34°, n° 1, da Constituição da República Portuguesa e no artigo 4.º, n° 1, da Lei n° 41/2004, de 29 de Agosto 18/08, (alterada e republicada pela Lei n°46/2012 de 29/08), que regula o Tratamento dos Dados Pessoais e a Proteção da Privacidade no Sector das Comunicações Eletrónicas. Para além disso, à Vodafone incumbe, ainda, assegurar a proteção dos dados pessoais e da privacidade no domínio específico das comunicações eletrónicas, em conformidade com o disposto na supra citada Lei n° 41/2004, de 18/08. Também com a preocupação de salvaguardar, precisamente, o respeito pela privacidade dos utilizadores de serviços de comunicações eletrónicas, o artigo 48°, n°1, alínea i), da Lei n° 5/2004, de 10/02 (que estabelece o regime jurídico aplicável às redes e serviços de comunicações eletrónicas e aos recursos e serviços conexos) vem prever a necessidade de indicação expressa da vontade do utilizador sobre a inclusão ou não dos respetivos elementos pessoais nas listas de utilizadores e a sua divulgação através de serviços informativos envolvendo ou não a sua transmissão a terceiros. Por sua vez, o Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, nos seus Pareceres n.º 16/94 e n.º 21/2000, veio considerar que os elementos que identificam o cliente, como sejam o seu nome, morada e número de telefone estão cobertos pelo sigilo das comunicações e pelo sigilo profissional, sempre que este requeira a confidencialidade dos seus dados, o que, conforme se referiu, se verificou no caso em apreço. Ora, ao abrigo do artigo 34°, n°4, da Constituição da República Portuguesa apenas se prevêem restrições ao sigilo das comunicações no âmbito de processos de natureza criminal, o que não corresponde ao caso vertente. É nosso entendimento que ao admitir esta restrição somente para os casos previstos na lei em matéria de processo criminal, o legislador fixou, desde logo, um critério para a resolução de conflitos que venham a ocorrer entre o valor do sigilo das comunicações e outros direitos ou princípios constitucionais. Assim sendo, destinando-se a informação requerida a instruir autos de ação cível, não se reportando, portanto, a matéria de natureza criminal, para efeitos do disposto no artigo 34°, n° 4, da Constituição da República Portuguesa, e encontrando-se estes dados cobertos pelo sigilo profissional, entendemos que não deverá esta informação ser disponibilizada. Ainda neste contexto importa referir que o disposto no artigo 418°, do Código de Processo Civil, relativo à dispensa da confidencialidade de certas categorias de informação que se encontrem na posse de serviços administrativos, não tem aplicação no caso vertente. Com efeito, a este propósito considerou o Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, no aludido Parecer 21/2000, que aqueles serviços administrativos devem entender-se como as unidades orgânicas ou funcionais que integram as pessoas coletivas públicas, não abrangendo aquela disposição legal, a recolha e o tratamento de dados pessoais que tenha sido efetuado por empresas privadas, como sejam os Operadores de redes e prestadores de serviços telefónicos acessíveis ao público. Nestes termos, e pelos motivos acima expostos, consideramos que neste caso em particular é legítima a recusa uma vez que a prestação da informação solicitada importaria a violação do sigilo das comunicações e do sigilo profissional.
O Tribunal de primeira instância julgou legítima a escusa e suscitou o incidente de seu levantamento, nos termos que seguem:
Resulta do oficio com a ref.ª 11328299 que a sociedade “Vodafone” confirmou que o Réu é seu cliente, mas recusou prestar qualquer tipo de informação adicional invocado sigilo profissional e das telecomunicações, nos termos do disposto nos artigos 34.º, n.º 1, da CRP, 4.º, n.º 1, da Lei 41/2004, de 18-08 e 48.º, n.º 1, al. i), da Lei 5/2004, de 10-02. Não obstante o dever de cooperação previsto no artigo 417.º do C.P.C., as alíneas b) e c) do n.º 3 desta disposição preveem que a recusa será legitima sempre que esteja em causa a intromissão na vida privada ou familiar, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações e/ou a violação do sigilo profissional ou de funcionários públicos, ou do segredo de Estado. Nestas situações, nada obstará a que o Tribunal espolete o mecanismo previsto no processo penal acerca da verificação da legitimidade da escusa e da dispensa do dever de sigilo invocado (artigo 135.º do Código de Processo Penal) – cf. n.º 4 do artigo 417.º do C.P.C.. No caso em apreço, verificamos que apurar a concreta morada do Réu é relevante e essencial para o prosseguimento da causa, como permitirá ainda um pleno exercício do direito de defesa. Por outro lado, é de considerar que a recusa da sociedade “Vodafone” é legitima, nos termos previstos nos artigos 4.º, n.º 1, da Lei 41/2004, de 18-08 e 48.º, n.º 1, al. i), da Lei 5/2004, de 10-02. Atento o exposto, cabendo ao Tribunal da Relação proceder à ponderação dos interesses envolvidos no presente caso, suscito oficiosamente a intervenção do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 135.º, n.º 3, do Código de Processo Penal (cf. ainda artigo 417.º, n.º 4, do Código de Processo Civil).
Correram os vistos legais, cumprindo decidir já que a tal nada obsta.
II)– OBJECTO DO INCIDENTE
O incidente suscitado convoca a apreciação da verificação dos pressupostos de levantamento do sigilo invocado.
III)–FUNDAMENTAÇÃO
1.–FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Com pertinência, encontram-se assentes os factos constantes do relatório supra.
3.–FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO 1.–O incidente de quebra de sigilo é suscitado no contexto do artigo 417.º do Código de Processo Civil, epigrafado “dever de cooperação para a descoberta da verdade”, e nos termos do seu n.º 4.
Invocou a recusante sigilo de telecomunicações e sigilo profissional.
O sigilo das telecomunicações é uma das dimensões do direito à reserva da vida privada e familiar e do direito à inviolabilidade do domicílio e correspondência que encontram protecção com igual nível de consagração nos artigos 26.º, n.º 1, 33.º a 35.º da Constituição da República Portuguesa. De entre estes, ressalta por especialmente pertinente à questão em apreciação, a consagração da garantia da não ingerência de terceiros nas telecomunicações consagrada no artigo 34.º, n.º 4.
Deste modo, a Constituição Portuguesa autonomiza o direito ao sigilo das telecomunicações no indicado artigo 34.º, n.º 4, no e do conjunto dos direitos referentes a reserva e privacidade da vida privada, da correspondência e dos dados pessoais[1].
Estatui o artigo 34.º: 1.-O domicílio e o sigilo da correspondência e dos outros meios de comunicação privada são invioláveis. 2.-A entrada no domicílio dos cidadãos contra a sua vontade só pode ser ordenada pela autoridade judicial competente, nos casos e segundo as formas previstos na lei. 3.-Ninguém pode entrar durante a noite no domicílio de qualquer pessoa sem o seu consentimento, salvo em situação de flagrante delito ou mediante autorização judicial em casos de criminalidade especialmente violenta ou altamente organizada, incluindo o terrorismo e o tráfico de pessoas, de armas e de estupefacientes, nos termos previstos na lei. 4.-É proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal.
2.–A legitimidade formal da invocação do dever de sigilo, no aspecto adjectivo de diferir à Relação a apreciação do acolhimento da recusa ou da prestação da informação, não está em causa neste momento, uma vez que foi já decidida em primeira instância, sendo, aliás, pressuposto do incidente. É o que resulta dos artigos 417.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, e 135.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, este por força daquele.
Configura-se no caso uma invocação de recusa de colaboração com o enquadramento de segredo profissional e fundamento material de violação de sigilo de telecomunicações que conflitua com a pretensão de o Tribunal chamar o Réu a defender-se no processo contra ele movido.
3.–O dever de sigilo de uma operadora de telecomunicações envolve (i) aspectos gerais relacionados com a protecção de dados pessoais de terceirose (ii) aspectos específicos relacionados com a natureza dos meios que opera e da utilização dos mesmos por terceiros.
Na primeira vertente rege o Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho de 27 de abril de 2016 (doravante Regulamento Geral de Protecção de Dados - RGPD) e a Lei 58/2019, de 8 de Agosto, que o executa.
O artigo 1.º, n.º 1, do RGPD, define ser seu objecto estabelecer as regras relativas à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados.
Por seu turno, o artigo 4.º, ponto 1), enuncia o que deve entender-se por dados pessoais para os efeitos do regulamento.
Fá-lo como segue: Para efeitos do presente regulamento, entende-se por: 1)- «Dados pessoais», informação relativa a uma pessoa singular identificada ou identificável («titular dos dados»); é considerada identificável uma pessoa singular que possa ser identificada, direta ou indiretamente, em especial por referência a um identificador, como por exemplo um nome, um número de identificação, dados de localização, identificadores por via eletrónica ou a um ou mais elementos específicos da identidade física, fisiológica, genética, mental, económica, cultural ou social dessa pessoa singular.
Recordemos que no caso se trata de obter informação sobre a morada do Réu, que é uma pessoa singular identificada e identificável, face ao que esse conteúdo informativo tem de entender-se como integrando o domínio dos dados pessoais do Réu, sendo que está excluída a possibilidade de inclusão desse dado entre os dados sensíveis a que se refere o artigo 9.º, que convocam um regime especial de protecção.
Constitui pressuposto de análise dever entender-se por tratamento de dados pessoais (artigo 4.º, 1), do RGPD): uma operação ou um conjunto de operações efetuadas sobre dados pessoais ou sobre conjuntos de dados pessoais, por meios automatizados ou não automatizados, tais como a recolha, o registo, a organização, a estruturação, a conservação, a adaptação ou alteração, a recuperação, a consulta, a utilização, a divulgação por transmissão, difusão ou qualquer outra forma de disponibilização, a comparação ou interconexão, a limitação, o apagamento ou a destruição. No caso, estando em causa a divulgação.
Por outro lado, no ponto 7) do mesmo artigo 4.º, o RGPD define o que deve entender-se por responsável pelo tratamento - a pessoa singular ou coletiva, a autoridade pública, a agência ou outro organismo que, individualmente ou em conjunto com outras, determina as finalidades e os meios de tratamento de dados pessoais; sempre que as finalidades e os meios desse tratamento sejam determinados pelo direito da União ou de um Estado-Membro, o responsável pelo tratamento ou os critérios específicos aplicáveis à sua nomeação podem ser previstos pelo direito da União ou de um Estado-Membro – do que resulta deter a Vodafone essa qualidade em relação com o dado em causa.
Vejamos então o que decorre do regime geral de protecção de dados pessoais quanto à licitude do tratamento de dados pessoais, a que se refere o artigo 6.º. 1.– O tratamento só é lícito se e na medida em que se verifique pelo menos uma das seguintes situações: a)- O titular dos dados tiver dado o seu consentimento para o tratamento dos seus dados pessoais para uma ou mais finalidades específicas; b)- O tratamento for necessário para a execução de um contrato no qual o titular dos dados é parte, ou para diligências pré-contratuais a pedido do titular dos dados; c)- O tratamento for necessário para o cumprimento de uma obrigação jurídica a que o responsável pelo tratamento esteja sujeito; d)- O tratamento for necessário para a defesa de interesses vitais do titular dos dados ou de outra pessoa singular; e)- O tratamento for necessário ao exercício de funções de interesse público ou ao exercício da autoridade pública de que está investido o responsável pelo tratamento; f)- O tratamento for necessário para efeito dos interesses legítimos prosseguidos pelo responsável pelo tratamento ou por terceiros, exceto se prevalecerem os interesses ou direitos e liberdades fundamentais do titular que exijam a proteção dos dados pessoais, em especial se o titular for uma criança. O primeiro parágrafo, alínea f), não se aplica ao tratamento de dados efetuado por autoridades públicas na prossecução das suas atribuições por via eletrónica. 2.– Os Estados-Membros podem manter ou aprovar disposições mais específicas com o objetivo de adaptar a aplicação das regras do presente regulamento no que diz respeito ao tratamento de dados para o cumprimento do n.º 1, alíneas c) e e), determinando, de forma mais precisa, requisitos específicos para o tratamento e outras medidas destinadas a garantir a licitude e lealdade do tratamento, inclusive para outras situações específicas de tratamento em conformidade com o capítulo IX. 3.–O fundamento jurídico para o tratamento referido no n.º 1, alíneas c) e e), é definido: a)- Pelo direito da União; ou b)-Pelo direito do Estado-Membro ao qual o responsável pelo tratamento está sujeito. A finalidade do tratamento é determinada com esse fundamento jurídico ou, no que respeita ao tratamento referido no n.º 1, alínea e), deve ser necessária ao exercício de funções de interesse público ou ao exercício da autoridade pública de que está investido o responsável pelo tratamento. Esse fundamento jurídico pode prever disposições específicas para adaptar a aplicação das regras do presente regulamento, nomeadamente: as condições gerais de licitude do tratamento pelo responsável pelo seu tratamento; os tipos de dados objeto de tratamento; os titulares dos dados em questão; as entidades a que os dados pessoais poderão ser comunicados e para que efeitos; os limites a que as finalidades do tratamento devem obedecer; os prazos de conservação; e as operações e procedimentos de tratamento, incluindo as medidas destinadas a garantir a legalidade e lealdade do tratamento, como as medidas relativas a outras situações específicas de tratamento em conformidade com o capítulo IX. O direito da União ou do Estado-Membro deve responder a um objetivo de interesse público e ser proporcional ao objetivo legítimo prosseguido. 4.– Quando o tratamento para fins que não sejam aqueles para os quais os dados pessoais foram recolhidos não for realizado com base no consentimento do titular dos dados ou em disposições do direito da União ou dos Estados-Membros que constituam uma medida necessária e proporcionada numa sociedade democrática para salvaguardar os objetivos referidos no artigo 23.º, n.º 1, o responsável pelo tratamento, a fim de verificar se o tratamento para outros fins é compatível com a finalidade para a qual os dados pessoais foram inicialmente recolhidos, tem nomeadamente em conta: a)-Qualquer ligação entre a finalidade para a qual os dados pessoais foram recolhidos e a finalidade do tratamento posterior; b)-O contexto em que os dados pessoais foram recolhidos, em particular no que respeita à relação entre os titulares dos dados e o responsável pelo seu tratamento; c)-A natureza dos dados pessoais, em especial se as categorias especiais de dados pessoais forem tratadas nos termos do artigo 9.º, ou se os dados pessoais relacionados com condenações penais e infrações forem tratados nos termos do artigo 10.º; d)-As eventuais consequências do tratamento posterior pretendido para os titulares dos dados; e)-A existência de salvaguardas adequadas, que podem ser a cifragem ou a pseudonimização.
O consentimento do titular dos dados (n.º 1, alínea a) e 5.º, n.º 1, da Lei 41/2004, de 18 de Agosto), está afastado pelo pedido específico de confidencialidade[2].
Nos termos do n.º 1, alínea c), o tratamento é lícito se for necessário para o cumprimento de uma obrigação jurídica a que o responsável pelo tratamento esteja sujeito. No que ao caso diz respeito, poderia concluir-se que o tratamento é lícito uma vez que a Vodafone, responsável pelo tratamento, está obrigada a cooperar com o tribunal nos termos do artigo 417.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, já citado.
Ora, nos termos do n.º 3, alínea b), o direito do Estado-Membro define o fundamento jurídico para o tratamento referido no n.º 1, alíneas c) e e), definição que o regime jurídico português faz em diversos lugares nomeadamente no artigo 417.º, n.º 1.
O ponto é saber se se verifica alguma das exclusões dessa obrigação, o que nos devolve ao artigo 417.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.
Invoca a Vodafone o regime decorrente do artigo 34.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, que restringe o acesso aos processos de natureza criminal, e do artigo 4.º, n.º 1, da Lei 41/2004, como contrariando a obrigação que decorreria da leitura isolada do artigo 417.º, do Código de Processo Civil. Entende que de tais normas decorre ser a situação de dever de sigilo de telecomunicações e de dever de sigilo profissional.
4.–Lembremos que o artigo 34.º, n.º 4, já transcrito, proíbe toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal.
A autonomização do direito a não ingerência nas telecomunicações feita no direito português como acima dissemos, explicita a importância dada pelo legislador a este domínio da vida social e ao seu potencial de devassa, mas não o exclui do âmbito de protecção que é o seu: reserva da vida privada e correspondência.
Nestes como naquele, o bem jurídico protegido é a esfera de privacidade de uma pessoa face ao Estado e face às outras pessoas, no caso, no que respeita às comunicações que constituem a sua interacção pessoal e privada com terceiros[3]. Protege-se o direito a não ingerência nas telecomunicações que não é o mesmo que dizer, como veremos, que se protegem quaisquer dados detidos pelas empresas de telecomunicações em razão de terem contratado com o titular dos dados.
Distinção que encontramos transparente no voto lavrado pelo Conselheiro Henriques Gaspar no Parecer 16/94 de 7 de Julho, do Conselho Consultivo da PGR, ao distinguir entre elementos de base, elementos de comunicação e elementos de conteúdo[4]. A que o Parecer 21/2000, de 21 de Junho, já referido, denomina seguindo o parecer 16/94, complementar, de dados de base (os dados relativos à conexão à rede), dados de tráfego (funcionais necessários ao estabelecimento de uma ligação ou comunicação e os dados gerados pela utilização da rede(...)e dados de conteúdo (dados relativos ao conteúdo da comunicação ou da mensagem).
No primeiro caso estão em causa informações estranhas à própria comunicação em si mesma, referindo-se antes aos seus elementos de suporte técnico e de conexão, no segundo, elementos que se referem já à comunicação, mas não envolvem o seu conteúdo, como os que respeitam aos intervenientes ou à duração e/ou frequência, e no terceiro caso, os que se referem ao conteúdo mesmo da comunicação.
Distinção que, quanto às duas últimas sub-espécies, resulta hoje do artigo 2.º da Lei 41/2004: d)- «Dados de tráfego» quaisquer dados tratados para efeitos do envio de uma comunicação através de uma rede de comunicações eletrónicas ou para efeitos da faturação da mesma; e)- «Dados de localização» quaisquer dados tratados numa rede de comunicações eletrónicas ou no âmbito de um serviço de comunicações eletrónicas que indiquem a posição geográfica do equipamento terminal de um utilizador de um serviço de comunicações eletrónicas acessível ao público.
Os elementos referentes a aspectos administrativamente recolhidos na contratação do serviço de telecomunicações, não se referem à privacidade da vida da pessoa ou à sua esfera íntima em termos de encontrarem protecção no contexto dos bens jurídicos protegidos pelo artigo 34.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa. A morada indicada à operadora com pedido de confidencialidade não é assim um elemento informativo de cuja divulgação ou conhecimento decorra ingerência na comunicação. Ora, é esta ingerência que o artigo 34.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa proíbe[5] fora dos processos de natureza criminal e que a alínea b), do n.º 3, do artigo 417.º consagra como qualificando a recusa de colaboração como legítima (sem integrar o incidente a que alude o n.º 4 do artigo com previsão restrita à alínea c) do n.º 3).
Aliás, cremos mesmo que este dado informativo nem sequer pode ser considerado como um dado de base suporte da telecomunicação, como o é o posto telefónico, mas apenas como um dado pessoal recolhido no contexto do contrato.
Tiramos então uma primeira conclusão, qual seja, a de que o artigo 34.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, ao proibir a ingerência das autoridades nas telecomunicações salvaguardado o regime estabelecido quanto aos processos judiciais de natureza criminal, não se refere aos elementos ou dados de base de natureza de suporte técnico ou administrativo que as empresas operadoras possuam em razão do contrato estabelecido. O mesmo é dizer que um dado como a morada do consumidor contraente não é um dado informativo que beneficie do especial regime de acesso estabelecido para as telecomunicações.
5.–A Vodafone, todavia, invocou também a obrigação que resulta do disposto no artigo 4.º, n.º 1, da Lei 41/2004: as empresas que oferecem redes e ou serviços de comunicações eletrónicas devem garantir a inviolabilidade das comunicações e respetivos dados de tráfego realizadas através de redes públicas de comunicações e de serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público.
Congruentemente com o regime que se expôs entender-se como decorrente da Constituição, a norma em causa estabelece um dever específico de as operadoras de telecomunicações garantirem os dados de tráfego e os dados de conteúdo e nada refere quanto aos dados de base ou aos dados administrativos.
Menos ainda instituiu um dever de sigilo com esse alcance, como resulta da revogação do artigo 17.º, n.º 1, da Lei 67/98, de 26 de Outubro[6], pela Lei 58/2019, de 8 de Agosto, sendo que o artigo 10.º, n.º 2, da Lei 58/2019[7], consagra apenas um genérico dever de confidencialidade do responsável pelo tratamento de dados, não um dever de sigilo.
Podemos então retirar uma segunda conclusão, a de que nem a Lei de Protecção de Dados Pessoais e Privacidade nas Telecomunicações, nem a Lei de Protecção de Dados Pessoais estabelecem um dever de sigilo profissional das operadoras de telecomunicações quanto a dados respeitantes às moradas das pessoas singulares com quem contratam.
Na verdade, o regime específico das telecomunicações estabelece o indicado dever de confidencialidade e o regime de protecção de dados pessoais não institui as obrigações genéricas de protecção que consagra como deveres de sigilo profissional, como resulta a contrario do seu artigo 90.º.
Recolhendo as duas conclusões parcelares, entendemos que a questão em apreciação não se configura como uma situação de violação de sigilo de telecomunicações ou de violação de sigilo profissional.
O que se verifica é uma situação de confidencialidade da informação por o Réu, cliente da Vodafone, ter exigido tal confidencialidade nos termos do artigo 48.º, n.º 1, alínea l), da Lei 5/2004, e o artigo 10.º, n.º 2, da Lei 58/2019 o consagrar.
6.–Como inicialmente referimos, tendo sido decidido em primeira instância, sem impugnação, diverso enquadramento para efeitos de diferimento da competência de apreciação a esta Relação, a qualificação a que chegámos tem apenas implicações em sede de direito aplicável à ponderação do confronto entre a obrigação de cooperação com o tribunal e o dever de confidencialidade invocado: já não o conflito de direitos, a dilucidar nos termos do artigo 335.º, n.º 1, do Código Civil, mas antes a dispensa de confidencialidade, a resolver por aplicação dos critérios do artigo 418.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
A requisição de informações pelo tribunal restringe-se às respeitantes à morada do Réu e destina-se a possibilitar a sua citação para que possa defender-se na acção contra ele proposta. O que convoca o direito de acesso ao direito e aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efectiva – artigo 20.º, da Constituição da República Portuguesa, máxime, os n.º 1 e 5 - que se concretiza, no que agora interessa, no direito de exercer em juízo defesa face a pretensões contra si dirigidas.
Este é um direito fundamental num Estado de Direito que encontra consagração ao mais alto nível normativo, sendo um dos pilares do princípio da tutela jurisdicional efectiva, do direito ao juiz e do princípio do contraditório.
O dever de confidencialidade que decorre do artigo 10.º, n.º 2, da Lei 58/2019, e da declaração feita pelo Réu em termos contratuais conforme artigo 48.º, n.º 1, alínea l), da Lei 5/2004, visa a protecção da sua privacidade numa dimensão não essencial desta[8] e com os limites protectivos da sua utilização pelo tribunal apenas para salvaguarda do direito do titular dos dados à defesa e a um processo justo.
A informação solicitada é essencial ao regular andamento do processo e à justa composição do litígio,dizendo respeito à residência, pelo que a Vodafone está adstrita a prestar tal informação ao tribunal nos termos do artigo 418.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
Na sua escusa a Vodafone expressamente exclui a aplicabilidade deste incidente invocando a indicação no já referido Parecer 21/2000 de que o âmbito de aplicação do pretérito artigo 519.º-A, do Código de Processo Civil (antecessor do actual 418.º), se aplicar apenas a serviços administrativos de entidades públicas.
Fá-lo na perspectiva de caber a esta Relação a apreciação, o que já dissemos estar estabelecido no processo, sendo a esse título despicienda a alegação. No entanto, a alegação inclui a rejeição do regime substantivo de ponderação de valores.
Antecipe-se que não entendemos ser de acolher a objecção.
É certo que a redacção dos dois preceitos (antigo artigo 519.º-A e actual artigo 418.º)é idêntica e que o parecer faz essa afirmação[9]. No entanto, fá-la num contexto em que a mesma surge a latere do assunto que está em apreciação, sem fundamentação autónoma e num contexto em que o Parecer coloca a questão das operadoras de telecomunicações como sendo de dever de sigilo por via do artigo 17.º, n.º 1, da Lei 67/98, de 26 de Outubro (aliás revogado no dia seguinte ao da emissão do parecer).
A norma do artigo 418.º não distingue entre serviços administrativos de entidades públicas e/ou de entidades privadas. As razões subjacentes à dispensa de confidencialidade não permitem distinguir entre umas e outros, não cabendo ao intérprete distinguir onde o legislador entendeu não o fazer.
Nesse sentido, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa[10]: o preceito abarca os serviços administrativos de qualquer entidade pública ou privada detentores de elementos que traduzam dados pessoais. Não podendo estes ser libertados indiscriminadamente, cumpre ao tribunal quebrar a confidencialidade dos mesmos quando se revelas a sua essencialidade quer para a prossecução da lide, quer para a resolução do conflito ou tutela do interesse juridicamente protegido.
Em conclusão, deve ser prestada a informação.
IV)–DECISÃO
Pelo exposto, ACORDAM em determinar que a VODAFONE PORTUGAL COMUNICAÇÕES PESSOAIS, SA, preste a informação solicitada pelo Tribunal de primeira instância, a saber, a indicação da morada ou moradas do Réu que constem dos seus sistemas.
Valor do incidente: o indicado à acção (artigo 307.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).
Custas pelo Réu – artigo 535.º, n.º 3, do Código de Processo Civil – com taxa de justiça que se fixa no mínimo.
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Data constante das assinaturas electrónicas (Ana de Azeredo Coelho) (Eduardo Petersen Silva) (Manuel Rodrigues)
[1]Sobre esta autonomização veja-se Cristina Máximo dos Santos in As novas tecnologias da informação e o sigilo das telecomunicações, RMP, n.º 99, p.93: (…) em Portugal, ao invés do que ocorre com outros países europeus, o sigilo das telecomunicações tem um tratamento específico na Constituição, consagrado no artigo 34.º. [2]Em cumprimento do disposto no artigo 48.º, n.º 1, alínea l, da Lei 5/2004 (na redacção da Lei 51/2011, de 13 de Setembro que é a em vigor quanto a esta alínea): indicação expressa da vontade do assinante sobre a inclusão ou não dos respectivos elementos pessoais nas listas telefónicas e sua divulgação através dos serviços informativos, envolvendo ou não a sua transmissão a terceiros, nos termos da legislação relativa à protecção de dados pessoais. [3]O caminho de protecção seguido pelo legislador e o âmbito da mesma estão descritos no seu itinerário histórico no Parecer do Conselho Consultivo da PGR n.º 21/2000, de 21 de Junho, publicado no DR II Série, de 28 de Agosto de 2000. [4]Parecer 16/94 de 7 de Julho: O serviço de comunicações telefónicas, - seja o serviço público geral, seja algum dos serviços complementares, como o designado serviço móvel terrestre - pressupõe a existência da vários elementos que se poderão designar como elementos de base, de comunicação, e de conteúdo da comunicação. Os elementos de base serão os que se referem ao próprio suporte da comunicação - o posto, a ligação, ou seja os elementos apenas referentes ao número de utilização e identificação. Elementos de comunicação são todas as indicações que se refiram à existência e direcção da comunicação - quem comunicou, com quem e quando. Finalmente o conteúdo da comunicação refere-se à própria mensagem, e aos seus termos. 2. O segredo das comunicações é tendencialmente absoluto. No entretanto, na ponderação com outros valores e interesses, o legislador assumiu um critério próprio, no que se refira às exigências de processo penal, aceitando, em determinadas circunstâncias, e em relação a determinadas crimes ("crimes de catálogo"), a admissibilidade de interferência nas comunicações - escutas telefónica (artigo 117º do CPP) e na correspondência (artigo 179º do CPP).. Estabelecendo adequadas garantias, com a intervenção do juiz, o legislador fixou o seu próprio critério de ponderação axiológica no conflito entre o valor do sigilo das comunicações e as necessidades de investigação em processo penal relativamente a certos crimes de particular gravidade e danosidade social. E isto logo quanto ao próprio elemento de protecção máxima - o conteúdo da comunicação, cuja tutela, fundamental, se liga com a protecção de valores tão essenciais com o direito à palavra e à reserva da vida privada. Não pode valer disciplina diferente para tudo quanto respeite ao serviço móvel terrestre. As comunicações efectuadas através deste serviço terão de estar sujeitas aos mesmos princípios e aos mesmos critérios de ponderação axológica estabelecidos pela lei, em geral, quando estejam em causa comunicações telefónicas efectuadas através do serviço geral. É dificilmente compreensível que, estando em causa comunicações efectuadas através do sistema móvel terrestre, o juiz pudesse ordenar escutas telefónicas (pressupondo que o sistema permita tecnicamente efectuá- las, ou quando tal for possível) e nas mesmas circunstâncias e relativamente aos mesmos crimes não possa solicitar um elemento (v.g. a factura detalhada) que apenas refere o número e a direcção das comunicações efectuadas. Aplicaria, assim, quanto aos elementos de comunicação (que, em termos de direitos afectados, se revela de muito menor gravidade quando comparados com o acesso ao conteúdo da própria comunicação) o regime definido no artigo 187º do CPP. 3. Não aceito também que os elementos relativos à base (ao número do posto), que devem constar da lista publicada se o interessado o solicitar, estejam cobertos por qualquer dever do sigilo assimilado a qualquer espécie de sigilo profissional. O segredo tutelado, e penalmente tutelado, pressupõe a existência e a ponderação de valores que se prendem com o relevante interesse público ligado ao exercício de certas profissões e da confiança que o público deve depositar nesse exercício. Nada de semelhante se passa quanto aos elementos de base, em que se não vislumbra qualquer interesse público que imponha a respectiva protecção, mas apenas um interesse, legitimo, do respectivo titular na reserva quanto a tais elementos. Mas este interesse apenas particular, e que se esgota nas relações entre o operador de serviço e o utilizador, sem a tutela dos segredos profissionais, deve ceder perante o interesse público da colaboração com a justiça, a solicitação de autoridade judiciária competente. [5]Neste sentido o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12 de Abril de 2018, proferido no processo 18479/16.7T8LSB-A.L1-2 (Jorge Leal), do Tribunal da Relação do Porto de 6 de Fevereiro de 2021, proferido no processo 42003/20.8YIPRT-A.P1 (Ana Paula Amorim) ou, quanto à interpretação, mas a respeito de seguradora, desta Relação, de 6 de Fevereiro de 2020, proferido no processo 18479/16.7T8LSB-B.L1-2 (Carlos Castelo Branco). Ou nas expressivas palavras do Tribunal da Relação de Évora em acórdão de 13 de Junho de 2002, proferido no processo 220/02-3 (Gaito das Neves): Não restam dúvidas quanto ao sigilo das telecomunicações. Mas, por telecomunicações haverá que entender, muito especificamente, “transmissão, recepção ou emissão de sinais, representando símbolos, escrita, imagens, sons ou informações de qualquer natureza por fios, por sistemas ópticos por meios radioeléctricos e por outros sistemas electromagnéticos”, como acima vimos. Ora, pretender aqui incluir o domicílio dum assinante é algo que ultrapassa o pensar do Legislador, transformando o sigilo numa força impeditiva de administração da Justiça. Há, pois, que ponderar os interesses em jogo e a detentora da informação fica obrigada a prestá-la, quando isso se mostre necessário para que um outro interesse, mais válido, dela necessite. [6]Os responsáveis do tratamento de dados pessoais, bem como as pessoas que, no exercício das suas funções, tenham conhecimento dos dados pessoais tratados, ficam obrigados a sigilo profissional, mesmo após o termo das suas funções. [7]O encarregado de proteção de dados, bem como os responsáveis pelo tratamento de dados, incluindo os subcontratantes, e todas as pessoas que intervenham em qualquer operação de tratamento de dados, estão obrigados a um dever de confidencialidade que acresce aos deveres de sigilo profissional previsto na lei. [8]A respeito da especificidade da revelação da morada e do menor valor da protecção veja-se o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12 de Abril de 2018 já citado. [9]Não tem aqui qualquer aplicação o regime de dispensa de confidencialidade a que se refere o artigo 519.º-A do CPC. A previsão desse preceito abarca certas categorias de informação que se encontrem na posse de serviços administrativos – entendendo-se como tais as unidades orgânicas ou funcionais que integram as pessoas colectivas públicas -, não abrangendo a recolha e o tratamento de dados pessoais que tenha sido efectuado por entidade que, como a TMN e as restantes operadoras de telecomunicações, pertencem ao sector privado. [10]In Código de Processo Civil Anotado, Almedina, 2.ª edição, p. 513.