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PROVA DIGITAL
CRIME DE FURTO QUALIFICADO
LOCALIZAÇÃO CELULAR CONSERVADA
Sumário
I – No caso específico de obtenção de prova por «localização celular conservada», isto é, de obtenção dos dados previstos no artigo 4º, n.º 1 da Lei 32/2008, de 17 de julho, o regime processual aplicável assume especialidade nos artigos 3º e 9º desta lei que se mantêm em vigor. II – Para estes casos ganhando relevo o conceito de «crime grave», já que, nos termos do artigo 3º, nº 1, daquele diploma, a obtenção de prova da localização celular conservada só é prevista para crimes que caibam em tal conceito. III – Foi esta a opção do legislador e é com ela que neste momento o aplicador do direito tem de se confrontar e conformar.
Texto Integral
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães
(Secção Penal)
I. RELATÓRIO
No processo de inquérito nº 57/21.0GAMCD, da Procuradoria do Juízo de Competência Genérica de Macedo Cavaleiros, da comarca de Bragança, em que se investigam factos suscetíveis de integrarem a prática, por pessoa(s) ainda não determinada(s), de um crime de furto qualificado, previsto e punível pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, o Exmo. Senhor Juiz de Instrução não autorizou a obtenção dos dados de tráfego/localização celular requeridos pelo Ministério Público, por despacho datado de 21 de janeiro de 2022 (ref.ª citius 23964475), com o seguinte teor:
«Nos presentes autos de inquérito, em que se investiga, por um ainda indeterminado número de pessoas, a prática de factos suscetíveis de integrar a prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea a) do Código Penal, alegadamente ocorridos entre os dias 05 e 06/04/2021, no Lugar ..., ..., em ..., veio o Ministério Público requerer a obtenção, junto das operadoras de telecomunicações, da faturação detalhada “online” referente às comunicações “recebidas e efetuadas” (registo trace-back), e localizações celulares relativas às comunicações estabelecidas a partir dos locais (eventos de rede) que, no período indicado, utilizaram as antenas telefónicas elencadas nos autos e assim obter dados que levem à identificação do(s) autor(es) do ilícito.
Cumprindo apreciar e decidir, sempre salvo o devido respeito, desde já se anuncia que não poderemos autorizar a obtenção de tais dados.
Com efeito, dispõe o artigo 187.º, n.º1, alínea a) do Código de Processo Penal, que a interceção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas só podem ser autorizadas durante o inquérito, se houver razões para crer que a diligência é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter, por despacho fundamentado do juiz de instrução e mediante requerimento do Ministério Público quanto a crimes puníveis com pena de prisão superior, no seu máximo, a 3 anos.
Por outro lado, decorre do n.º 4, alínea a) da mesma norma legal que a interceção e a gravação previstas nos números anteriores podem ser autorizadas, independentemente da titularidade do meio de comunicação utilizado, contra suspeito ou arguido (ou seja, pode o telemóvel não pertencer ao visado).
E estatui o n.º2 do artigo 189.º do Código de Processo Penal que “a obtenção e junção aos autos de dados sobre a localização celular ou de registos da realização de conversações ou comunicações só podem ser ordenadas ou autorizadas, em qualquer fase do processo, por despacho do juiz, quanto a crimes previstos no n.º 1 do artigo 187.º e em relação às pessoas referidas no n.º 4 do mesmo artigo.”
Em termos similares, também prescreve o artigo 3.º, n.º2 da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, que transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2006/24/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março, relativa à conservação de dados gerados ou tratados no contexto da oferta de serviços de comunicações eletrónicas publicamente disponíveis ou de redes públicas de comunicações, que: “A transmissão dos dados às autoridades competentes só pode ser ordenada ou autorizada por despacho fundamentado do juiz, nos termos do artigo 9.º”.
Logo prevendo o artigo 9.º, n.ºs 1 e 3 do mesmo diploma que: “A transmissão dos dados referentes às categorias previstas no artigo 4.º só pode ser autorizada, por despacho fundamentado do juiz de instrução, se houver razões para crer que a diligência é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter no âmbito da investigação, deteção e repressão de crimes graves” relativamente a “suspeito ou arguido”.
No caso, é preciso notar que não se pretende a obtenção de dados de tráfego em tempo real, mas sim de dados referentes a comunicações ou ativações ocorridas no passado, mais concretamente entre os dias 05 e 06/04/2021.
Assim, o regime a aplicar é o da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, que é mais restritivo quanto aos crimes de catálogo do que o Código de Processo Penal (artigo 187.º, n.º1)1, sendo necessário averiguar se o crime de furto qualificado é um “crime grave”, conforme exige o citado artigo 9.º, n.º1 daquela Lei.
Crimes graves, segundo o artigo 2.º, n.º1 alínea g) da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, são “crimes de terrorismo, criminalidade violenta, criminalidade altamente organizada, sequestro, rapto e tomada de reféns, crimes contra a identidade cultural e integridade pessoal, contra a segurança do Estado, falsificação de moeda ou títulos equiparados a moeda e crimes abrangidos por convenção sobre segurança da navegação aérea ou marítima.”
No que respeita ao conceito de criminalidade violenta e altamente organizada, dispõe o artigo 1.º, alíneas j) e m) do Código de Processo Penal, que são, respetivamente, “as condutas que dolosamente se dirigirem contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou a autoridade pública e forem puníveis com pena de prisão de máximo igual ou superior a 5 anos” e “as condutas que integrarem crimes de associação criminosa, tráfico de órgãos humanos, tráfico de pessoas, tráfico de armas, tráfico de estupefacientes ou de substâncias psicotrópicas, corrupção, tráfico de influência, participação económica em negócio ou branqueamento.”
Descendo, novamente, ao caso concreto, concitadas as normas legais que se transcreveram, não se pode concluir que o crime de furto qualificado em investigação se insere no catálogo de crimes graves que habilitam a obtenção de dados nos termos da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho2, pelo que, por falta desse primeiro requisito, terá de se indeferir a diligência de obtenção de prova pretendida pelo Ministério Público.
Nestes termos e ao abrigo do exposto, não autorizo a obtenção dos dados de tráfego/localização celular requeridos pelo Ministério Público.
Devolva novamente.
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1 A propósito, atente-se no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 07-03-2017 (Des. Artur Vargues, Proc. n.º 1585/16.5PBCSC-A, disponível em www.dgsi.pt), cujo sumário, aqui, parcialmente, se transcreve: “I–O regime dos artigos 187º a 189º, do CPP, aplica-se aos “dados sobre a localização celular”, obtidos em tempo real e intercepção das comunicações entre presentes, enquanto o consagrado na Lei nº 32/2008, de 17/07, tem como âmbito de aplicação os dados que concernem a comunicações relativas ao passado, ou seja, arquivadas.”.
2 Cf. Acórdãos do Tribunal da Relação de Évora, de 08-10-2019, relatado pelo Des. José Proença da Costa, Proc. n.º 180/19.1GHSTC e do Tribunal da Relação de Coimbra, de 10-01-2018, relatado pelo Des. Inácio Monteiro, Proc. n.º388/17.4JACBR-A - “À luz dos art. 2.º, n.º 1, al. g) e 3.º, n.º 1, da Lei 32/2008 de 17/07, estão excluídos do elenco dos “crimes graves”, os crimes de furto qualificado (…)”, ambos disponíveis em www.dgsi.pt»
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Inconformado o Ministério Público interpôs recurso, apresentando a competente motivação que remata com as seguintes conclusões:
«1. Vem o presente recurso interposto do douto despacho proferido pelo Mmo. Juiz de Instrução Criminal proferido nestes autos a 21/01/2022 (Ref. Citius 23964475), que indeferiu a realização das diligências probatórias junto das operadoras de serviços de comunicações eletrónicas a operar em Portugal, nos termos requeridos pelo Ministério Público a 13/01/2022 (Ref. Citius 23944011).
2. Mais concretamente, a obtenção da factura detalhada “online” referente às comunicações “recebidas e efetuadas (registo trace -back), e localizações celulares relativas às comunicações estabelecidas a partir dos locais (eventos de rede) que utilizaram as antenas telefónicas melhor identificadas a fls. 20 a 25, no dia 06/04/2021, entre as 00:40 horas e as 03:40 horas.
3. O Ministério Público não se conforma com o douto despacho proferido pelas razões de direito, que a seguir vão expostas.
4. Nos presentes autos são investigados factos suscetíveis de integrar, em abstrato, a prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.º 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 1, al.ª a), ambos do Código Penal.
5. Respeitosamente, não se sufraga o entendimento jurídico dado à questão pelo Mmo. Juiz de Instrução Criminal, pois, considera-se que o regime a aplicar é aquele que se encontra previsto no disposto no Código de Processo Penal, e não o regime que se encontra previsto na Lei n.º 32/2008, de 17 de julho.
6. A questão da prova digital está regulada no Código de Processo Penal, na lei 32/2008 de 17.07 e na lei 109/2009 de 15.09. Estes três diplomas, porque aparentemente se sobrepõem, excluem, convergem, divergem, tornam difícil a tarefa de interpretação, dada a duplicação ou triplicação de regimes, geradores de um caos normativo.
7. Sendo o objetivo da Diretiva, que a Lei 32/2008 transpôs, harmonizar a obrigação de conservação de dados entre Estados Membros, não se deve fazer a interpretação que o regime constante do disposto no art.º 189.º, n.º 2 do Código de Processo Penal só se aplica aos dados sobre a localização celular obtidos em tempo real.
8. Aliás, é a própria lei 32/2008 que no nº 2 do art. 1º ressalva a possibilidade de aplicação da legislação processual penal. E se a ressalva abrange a interceção e gravação, portanto, o conteúdo das comunicações, muito mais se tem de entender que abranja a obtenção de dados de localização celular, meio de obtenção de prova muito menos intrusivo da intimidade e da privacidade das pessoas, uma vez que se trata de meros registos de localização (aproximada) obtidos independentemente da utilização de telefones, por força do acionamento de células de rede (BTS- Base Transfer Station), menos intrusivo até que as tradicionais vigilâncias policiais.
9. Do que fica exposto, conclui-se que a diligência probatória requerida não se encontra excluída da aplicação do disposto no art.º 189.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, e que o crime em investigação nos presentes autos cabe no catálogo do art.º 187 do Código de Processo Penal.
10. Em suma, o douto despacho recorrido violou o disposto nos artigos 26.º, 32.º e 34.º da Constituição da República Portuguesa, e art.ºs 187.º, 188.º e 189.º, n.º 2, do Código de Processo Penal e art.º 1.º, n.º 2 da Lei n.º 32/2008, de 17 de Julho.
Termos em que se requer a revogação do douto despacho proferido pelo Mmo. JIC nestes autos, que indeferiu a realização das diligências requeridas pelo Ministério Público, e, em conformidade, a substituição por outro que determine a obtenção dos dados informáticos em causa que se encontram na disponibilidade das operadoras de telecomunicações, …, … e ….»
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O recurso foi admitido para este Tribunal da Relação de Guimarães, com o regime e efeito próprios.
Nesta Relação, o Exmo. Senhor Procurador-Geral adjunto emitiu douto parecer, sustentando a procedência do recurso.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
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II. FUNDAMENTAÇÃO
Conforme é jurisprudência assente, o âmbito do recurso delimita-se pelas conclusões extraídas pelo recorrente a partir da respetiva motivação, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer (1).
1. Questão a decidir
Apreciar se estão reunidos os requisitos legais do levantamento do sigilo das comunicações, que permitem autorizar as operadoras de telecomunicações móveis a fornecerem a faturação detalhada online referente às comunicações recebidas e efetuadas (registo trace-back), e localizações celulares relativas às comunicações estabelecidas a partir dos locais (eventos de rede) e período de tempo indicados pelo Ministério Público, com vista à obtenção de dados que levem à identificação do(s) autor(es) do ilícito investigado (furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal).
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3. APRECIAÇÃO DO RECURSO
Nos presentes autos de inquérito investigam-se factos suscetíveis de integrarem a prática, por pessoa(s) não determinada(s), de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, alegadamente ocorridos entre os dias 5 e 6 de abril de 2021, no Lugar ..., ..., em ....
O Ministério Público, com o fundamento de que tais diligências configuram a única possibilidade de se conseguir chegar à identificação dos autores dos factos em investigação, requereu ao Juiz de Instrução Criminal a obtenção, junto das operadoras de telecomunicações, da faturação detalhada online referente às comunicações recebidas e efetuadas (registo trace-back), e localizações celulares relativas às comunicações estabelecidas a partir dos locais (eventos de rede) que, no período indicado, utilizaram as antenas telefónicas elencadas nos autos a fls. 20 a 25.
O que foi indeferido pelo despacho recorrido (já supra transcrito), contra o qual se insurge o recorrente, argumentando que o regime a aplicar à sua pretensão é o previsto nos artigos 187.º e 189.º, nº 2, do Código de Processo Penal, que permitem a diligência probatória requerida, e não o da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, invocado naquele despacho.
Vejamos.
A diligência probatória requerida pelo Ministério Público reconduz-se à recolha de dados de tráfego armazenados por operadoras de telecomunicações e, como tal, respeita a um meio de prova digital.
O enquadramento jurídico da prova digital é atualmente constituído por três diplomas essenciais: a Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro (Lei do Cibercrime), complementada (em tudo o que a contrarie) com o Código de Processo Penal; e a Lei n.º 32/2008, de 17 de julho (2).
A Lei do Cibercrime, como o legislador fez questão de nela proclamar expressamente – no artigo 11.º, nº 2 – é cumulativa com a Lei nº 32/2008, de 17 de julho (3).
A Lei nº 32/2008 transpôs para a ordem jurídica portuguesa a Diretiva nº 2006/24/CE, do Parlamento e do Conselho, de 15 de março, relativa à conservação de dados gerados ou tratados no contexto da oferta de serviços de comunicações eletrónicas publicamente disponíveis ou de redes públicas de comunicações. Com a sua entrada em vigor o regime o regime processual das comunicações telefónicas previsto nos artigos 187.º a 190.º do Código de Processo Penal deixou de ser aplicável à recolha de prova por «localização celular conservada», respeitante à localização de comunicações relativas ao passado, ou seja, arquivadas, o que é uma das formas de recolha de prova eletrónica.
Situação que se mantém atualmente, tanto que na Lei do Cibercrime, que é posterior àquela, o legislador fez questão de proclamar expressamente (no já citado artigo 11º, nº 2) não ficar prejudicado o regime da Lei nº 32/2008, de 17de julho.
O que significa que no caso específico de obtenção de prova por «localização celular conservada», isto é, a obtenção dos dados previstos no artigo 4º, n.º 1 da Lei 32/2008, o regime processual aplicável assume especialidade nos artigos 3º e 9º desta lei. Para estes casos ganhando relevo o conceito de «crime grave», já que nos termos do artigo 3º nº 1, do mesmo diploma, a obtenção de prova da localização celular conservada só é prevista para crimes que caibam em tal conceito.
Sendo por sua vez o artigo 2.º, n.º 1, al. g), igualmente da Lei nº 32/2008, que explicita a definição de crime grave nos seguintes termos:
«g) “Crime grave”, crimes de terrorismo, criminalidade violenta, criminalidade altamente organizada, sequestro, rapto e tomada de reféns, crimes contra a identidade cultural e integridade pessoal, contra a segurança do Estado, falsificação de moeda ou títulos equiparados a moeda e crimes abrangidos por convenção sobre segurança da navegação aérea ou marítima».
À luz das disposições citadas, o crime de furto qualificado em investigação no presente inquérito está pois excluído do elenco dos «crimes graves» e, como tal, da obtenção dos dados previstos no artigo 4º, n.º 1 da Lei 32/2008. (4)
Foi esta a opção do legislador (5) e é com ela que neste momento o aplicador do direito tem de se confrontar e conformar.
Pode-se criticar o elenco dos «crimes graves» e concedemos que também não vislumbramos razão que justifique a restrição do acesso a prova por «localização celular conservada» apenas aos crimes do catálogo previsto na Lei n.º 32/2008 e não a todos os previstos no artigo 187.º do Código de Processo Penal, mas tal só admite discussão a nível de iureconstituendo,que não deve ser feita nesta sede.
Nenhuma censura nos merecendo assim a decisão recorrida.
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III. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desta secção penal do Tribunal da Relação de Guimarães, em negar provimento ao recurso do Ministério Público.
Sem tributação, por dela estar isenta o recorrente.
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Guimarães, 7 de março de 2022
(Elaborado e revisto pela relatora)
Fátima Furtado
Armando Azevedo
1. Cfr. artigo 412.º, n.º 1 do Código de Processo Penal e Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª edição revista e atualizada, Editorial Verbo, 2000, pág. 335, V.
2. Que, por sua vez, se cumulam ainda com o Dec. Lei nº 7/2004, de 07 de janeiro (Lei do Comércio Eletrónico).
3. Sendo que todas as medidas, gerais ou excecionais, e obrigações previstas na Lei nº 109/2009, cumulam-se ainda, em tudo o que as não contrarie, com as estabelecidas no CPP
4. Neste sentido se tem vindo a pronunciar de forma praticamente unânime a jurisprudência, de que são exemplo, entre outros, o ac. do TRP de 20.11.2019, proc. 54/19.6GDSTS-A.P1; o ac. do TRL de 07.03.2017, proc. 1585/16.5PBCSC-A.L1-5; e o ac. do TRE de 25.10.2016, proc. 223/16.0GBLLE.E1; todos disponíveis em www.dgsi.pt.
5. Note-se que, como salienta o acórdão do TRP de 20.11.2019, proc. 54/19.6GDSTS-A.P1 (disponível em www.dgsi.pt), o legislador português poderia ter seguido outra via, como sucedeu com «a correspondente lei espanhola [que] não estabeleceu um catálogo de crimes graves (ver, disponível no Google, Ley n.º 25/2007, de 18 de Octubre, particularmente o art.º 1.º: delitos graves contemplados en el Codigo Penal o en las leys penales especiales). Enquanto o legislador português estabeleceu uma norma de reserva dos crimes que se deveriam considerar graves para o efeito da lei, o espanhol deixou a respectiva concretização para os juízes. Como se pode ler em comentário ao diploma, in “Investigación Tecnológica e Derechos Fundamentales, Javier Ignacio Zaragoza Tejada e Outros, Ed. Aranzadi, 2017, a pag. 120, o legislador espanhol, a nosso ver desde uma perspectiva plenamente acertada, inclinou-se por considerar, em primeira linha, e seguindo a doutrina antes assinalada, que a gravidade do delito não depende exclusivamente da pena prevista, em abstracto, para uma determinada conduta, mas também de outros factores, como a transcendência social do facto, a natureza dos bens protegidos ou a perigosidade da actividade investigada, aspectos estes que em seu conteúdo e alcance dificilmente podem ser pré definidos – pelo menos rigidamente, com carácter geral, antes devem ser analisados em cada caso concreto»