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DECLARAÇÃO NEGOCIAL
INTERPRETAÇÃO DA VONTADE
LICENCIAMENTO DE OBRAS
CONDIÇÃO SUSPENSIVA
Sumário
1. O encontro de vontades das partes em alegações e contra-alegações de recurso, é irrelevante, quer para a prova de um facto por acordo, quer para a alteração da sentença na parte que lhe respeita, uma vez que a fixação de factos pertinentes para decisão da causa por acordo das partes litigantes, para além da sua prova por ausência de impugnação, prevista no n.º 1, do art.º 567.º e no n.º 2, do art.º 574.º do C. P. Civil, pode ser feita na audiência prévia estabelecida pelos art.ºs 591.º e 596.º, do C. P. Civil, em ordem a ser considerada aquando da prolação da sentença, nos termos do disposto nos n.ºs 4 e 5, do art.º 607.º, do C. P. Civil, e a alteração da sentença em matéria de facto, só pode ser feita nos termos do disposto nos art.ºs 640.º e 662.º, do C. P. Civil. 2. Uma expressão conclusiva e que encerra uma questão de direito, não constituindo matéria de facto, não deve ser levada, nem aos factos provados, nem aos factos não provados. 3. As partes contratantes não podem definir o instrumento processual legal de urbanismo a que recorrem para prosseguirem as suas pretensões. 4. Se no âmbito de um contrato, as partes acordaram em lançar mão de um Pedido de Informação Prévia para atingir o seu desiderato e posteriormente vieram a verificar que o procedimento que ao caso cabia era um Pedido de Alteração à Licença e Alvará de Loteamento, nos termos do disposto no n.º 1, do art.º 236.º, do C. Civil, deverá interpretar-se ter sido esse o sentido das respectivas declarações negociais. 5. Se o desiderato proposto foi atingido com o Pedido de Alteração à Licença e Alvará de Loteamento deverá considerar-se cumprida a cláusula em que as partes se reportaram ao Pedido de Informação Prévia. (pelo Relator)
Texto Integral
Acordam os Juízes que constituem o Tribunal da Relação de Lisboa.
1. RELATÓRIO.
...-Construção, Compra e Venda de Imóveis, Lda, propôs contra, ...-Sociedade de Investimentos e Consultoria, Lda, esta ação declarativa de condenação, com processo comum, pedindo a sua condenação a entregar-lhe a quantia de € 400.000,00 (quatrocentos mil euros), acrescida de juros vencidos no valor de € 11.879,50 e, vincendos até integral pagamento mais pedindo, a título subsidiário, a nulidade da cláusula contratual relativa a pedido de informação prévia a aprovar por Câmara Municipal, com a consequente nulidade de todo o contrato e a consequente restituição à R da quantia de € 1.200.000,00 por ela entregue e a reversão do direito de propriedade sobre imóvel à A, com fundamento, em síntese, em que celebrou com a R um contrato de cessão de posição contratual relativo à aquisição de um imóvel, no qual consta uma cláusula contratual no sentido de que a R pagaria a quantia de € 400.000,00 desde que fosse assegurada possibilidade de construção de uma residência para estudantes, recusando-se a R a entregar esta quantia.
Citada, contestou a R dizendo, em síntese que a A não cumpriu a condição estabelecida na cláusula que invoca, pelo que lhe não é devida a quantia pedida e que o não cumprimento dessa cláusula não determina a nulidade do contrato, que se deve manter, pedindo a improcedência da ação.
Realizada audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença julgando a ação improcedente, absolvendo a R dos pedidos.
Inconformada com essa decisão a A dela interpôs recurso, recebido como apelação, pedindo a sua revogação e a condenação no pedido, formulando para o efeito as seguintes conclusões:
1 – O presente recurso versa sobre a impugnação de pontos matéria de facto dada como provada e não provada em virtude da prova produzida em julgamento e concatenada com a demais prova documental junta aos autos implicar forçosamente uma decisão de sentido diverso.
2 - Conforme se verá, não se está no domínio da livre apreciação a prova, sem mais, mas sim no domínio da livre apreciação pelo julgador estribada nas regras de experiência comum e prova cabal produzida justamente em sentido contrário.
3 - Serão ainda elencados graves erros na aplicação do direito, mormente no que respeita à aquisição do direito de propriedade da cave esquerda, uma obra ilegal, e a pretensa aquisição originária, por usucapião, quando jamais existiu posse sobre o imóvel ou título donde a mesma se pudesse presumir.
4 – São impugnados os seguintes pontos da matéria de facto dada como não provada:
1“A R. sabia que o Pedido de Informação Prévia ainda vigente, Proc. n.º 47/2018/IP, permitia a edificação acima do arruamento da Rua ... superior a 7.500 m2.
2 A condição estabelecida, determinava aprovação de um Pedido de Informação Prévia;
3 Na sequência da comunicação de 26 de outubro de 2018 da Câmara Municipal de ..., a R. tomou conhecimento que a viabilização da operação urbanística pretendida implicaria “alteração do alvará de licença do loteamento 75/72, quanto ao uso para o lote 53”;
5 - Foi produzida prova bastante em sentido contrário ao decidido, razão pela qual vão expressamente impugnados os factos supra vertidos para todos os devidos e legais efeitos. Vejamos, pois, de per si, cada um dos pontos impugnados:
6 - Ponto 1 e Ponto 3 (os quais justificam tratamento unitário) 3. “A R. sabia que o Pedido de Informação Prévia ainda vigente, Proc. n.º 47/2018/IP, permitia a edificação acima do arruamento da Rua ... superior a 7.500 m2. 3.Na sequência da comunicação de 26 de outubro de 2018 da Câmara Municipal de ..., a R. tomou conhecimento que a viabilização da operação urbanística pretendida implicaria “alteração do alvará de licença do loteamento 75/72, quanto ao uso para o lote 53”;
7 - Como facilmente se verá, os documentos n.ºs 4 e 5 juntos com a p.i. (fls. 24 e seguintes) consistem num Pedido de Informação Prévia (adiante, PIP) que vincula a edilidade nos termos vertidos na motivação do recurso.
8 - Ora, tal documentação foi facultada pela A. à R. como, aliás, foi dado como provado no ponto 13. da matéria de facto provada que não se resiste em transcrever: “13. Nessa reunião o representante legal da A. fez a apresentação do terreno e das suas potencialidades, transmitindo e facultando à R. toda a informação e documentação relativa ao imóvel, designadamente: (…) - o Pedido de Informação Prévia (PIP) apresentado pela “Lus” e que deu origem ao Proc. n.º 417/2018/IP Rua Prof. Dr. ...; Cfr. n.º 15”
9 – Mais: as declarações das testemunhas e do depoimento de parte quanto à plena compreensão de tal por parte pela R. são categóricas, conforme ficou transc....
10 - Ora, como ficou assaz evidenciado, a R. sabia da existência de um PIP que permitia a edificação pretendida.
11 - Tal PIP e sua análise partia necessária e legalmente daquilo que já antes a Câmara Municipal de ... se tinha vinculado a aceitar e que melhor consta no documento n.º 5 junto com a p.i. (cfr. página 2/7): “2.3 Antecedentes processuais: 2.3.1. Analisada a pretensão verifica-se que existe um processo com o n.º 10128/OP, referente a um pedido de licenciamento para construção de um equipamento social/saúde . casa de saúde e repouso com residências assistidas. 2.3.2. O pedido de licenciamento obteve aprovação do projecto de arquitectura para uma volumetria máxima para a ... do Poder Local, de 6 pisos, garantindo o cumprimento do art. 59.º /regra dos 45º) ….”
12 - Ora, em sede de análise, informou a edilidade que: (cfr. fls. 6/7): “4.5.5. Em face da avaliação das volumetrias dominantes e da respectiva moda, a volumetria aceitável para a presente operação urbanística não deverá ultrapassar os 7 pios acima da cota de soleira.”
13 - Ou seja: a possibilidade de edificação de 7 pisos acima da cota de soleira era do conhecimento da R., conforme a transmissão de todas as informações flui, antes e depois, da celebração do contrato entre A. e R. e consta já como provada no ponto 33: “as partes ficaram cientes de tais informações” (neg... da peça).
14 - De igual forma, após a comunicação de 26 de outubro de 2018 feita pela Câmara Municipal de ..., a R. tomou conhecimento que a viabilização da operação urbanística pretendida implicaria “alteração do alvará de licença do loteamento 75/72, quanto ao uso para o lote 53”.
15 - Com efeito, tal deveria já resultar como provado sob pena de flagrante contradição com o que resultara já dado como provado nos pontos 28 a 33 e 39 da matéria de facto dada como provada para cuja transcrição constante da motivação de recurso se remete.
16 - Ponto 2 (matéria de facto não provada e impugnada) A condição estabelecida, determinava aprovação de um Pedido de Informação Prévia;
17 - Na impugnação deste ponto concreto da matéria de facto importa, pois, atender – novamente – a uma contradição com os pontos dados como provados, designadamente quanto às condições contratuais ajustadas foi dado como provado que: 20. Do contrato de cessão da posição contratual celebrado, na sua cláusula sexta, resulta:“(…) Caso a Primeira Outorgante em colaboração com a Segunda Outorgante, consiga aprovar na Câmara de ... um Pedido de Informação prévia (PIP) até ao dia 30 de Junho de 2019, garantindo a mudança do uso do terreno objecto deste contrato para residência de estudantes, com uma área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 metros quadrados, a Primeira Outorgante terá de pagar mais 400 mil euros à Segunda Outorgante; (…)” Cfr. doc.16. 21. A verificar-se a condição acima referida, estabelecia a cláusula sétima do contrato de cessão, que: “(…) Caso se verifique a situação referida na Cláusula anterior, o pagamento ali previsto terá de ser efectuado até 15 dias após a notificação da Câmara Municipal de ... da aprovação do referido PIP. (…)” 22. A R. colocou na redacção do contrato, que foi assinado pela A., que tais possibilidades resultassem da aprovação de um Pedido de Informação Prévia pela edilidade de ....” (neg...s da peça)”
18 - É, pois, inequívoco que a A. e R., designadamente através da redacção da R. pretenderam estabelecer como condição para a alteração de uso a aprovação de um Pedido de Informação Prévia (PIP).
19 - O facto impugnado deve, pois, ser dado como provado.
20 - Como se deixou esc..., os pontos de facto dados como não provados que foram impugnados estão em contradição com a factualidade já dada como provada supra transcrita pelo que havendo ou não alteração dos mesmos o tratamento jurídico das questões abaixo elencadas será o mesmo, isto sem conceder minimamente.
21 – No que respeita às condições contratuais ajustadas: Foi dado como provado que: 20. Do contrato de cessão da posição contratual celebrado, na sua cláusula sexta, resulta: “(…) Caso a Primeira Outorgante em colaboração com a Segunda Outorgante, consiga aprovar na Câmara de ... um Pedido de Informação prévia (PIP) até ao dia 30 de Junho de 2019, garantindo a mudança do uso do terreno objecto deste contrato para residência de estudantes, com uma área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 metros quadrados, a Primeira Outorgante terá de pagar mais 400 mil euros à Segunda Outorgante; (…)” Cfr. doc.16 21. A verificar-se a condição acima referida, estabelecia a cláusula sétima do contrato de cessão, que: “(…) Caso se verifique a situação referida na Cláusula anterior, o pagamento ali previsto terá de ser efectuado até 15 dias após a notificação da Câmara Municipal de ... da aprovação do referido PIP. (…)” 22. A R. colocou na redacção do contrato, que foi assinado pela A., que tais possibilidades resultassem da aprovação de um Pedido de Informação Prévia pela edilidade de ....”
22 - Ou seja: foram ajustadas três condições cumulativas para que o pagamento dos 400.000,00€ pudesse ter lugar: - a garantia a mudança do uso do terreno objecto deste contrato para residência de estudantes; - a área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 metros quadrados; - que tal sucedesse até ao dia 30 de Junho de 2019;
23 - E foi estabelecido que tais condições seriam alcançadas mediante a aprovação de um PIP.
24 - Importa, pois, verificar se as condições (ou parte delas) se poderiam legalmente verificar, designadamente se eram ou não condições impossíveis e qual a actuação das partes no momento subsequente ao conhecimento que não seria possível um PIP para alcançar a alteração de uso pretendida.
25 – No que respeita à garantia a mudança do uso do terreno objecto deste contrato para residência de estudantes é que se verificam as questões mais prementes.
26 - Ora, como inclusivamente ficou esc... na sentença recorrida e para cuja transcrição na peça se remete, o PIP jamais poderia ter a virtualidade de proceder à alteração de uso, o que a R., por desconhecimento, crê-se, fez plasmar na redacção assinada pela A que, por desconhecimento e de boa-fé, assinou.
27 – “Daqui resulta que o PIP não é o instrumento pelo qual se pode obter a alteração de uso, estando essa alteração condicionada, isso sim, à alteração do alvará de licença de loteamento. Isso mesmo resulta do doc. 20 junto aos autos “Informação prévia de obra de edificação” (25.10.2018) no qual também vem referido que a volumetria aceitável para a operação urbanística não deverá ultrapassar 7 pisos acima da cota soleira.” (cfr. sentença recorrida).
28 - Ora, daqui resulta inequívoco que a forma como as partes se obrigaram, designadamente a forma pela qual ficou ajustado que a A. teria que conseguir fazer a alteração de uso, isto é, através do PIP é legalmente inadmissível e, como tal, respeita a uma condição impossível.
29 - Importa então verificar qual a actuação – concertada, diga-se – das partes quando surgiu o conhecimento que a condição estabelecida para alteração de uso implica a alteração do alvará de licença do loteamento 75/72 quanto ao uso para o lote 53:
30 - E tal consta da factualidade dada como provada nos pontos 28 a 44 (cuja transcrição para razões de melhor compreensão da presente peça recursória foram transc...s e para os quais se remete;
31 - Significa isto que a R. teve perfeito conhecimento de que forma de alcançar a condição de alteração de uso mudara e em concertação com a A. desenvolveu os esforços para que tal fosse alcançado.
32 - E importa aqui ressalvar que não sendo, com se viu, possível a aprovação de um PIP para verificação da condição há que atender à vontade das partes sem perder de vista aquilo que deixaram literalmente consagrado e que respeitava, justamente, à obtenção de uma garantia quanto à mudança do uso do terreno objecto do contrato para residência de estudantes e que passou a estar englobada na mais ampla categoria de “acividades económicas”.
33 - E essa garantia surgiu, justamente, com a afixação do edital camarário “onde foi dado conhecimento público da aprovação de alteração do alvará de licença de loteamento n.º 75/72 (Proc. n.º 19687/L) no que respeita à alteração de uso de clínica para actividades económicas e a clarificação quanto à limitação altimétrica do edifício relativamente às construções envolventes com a introdução do número máximo de sete pisos; Cfr. edital-doc. n.º 36; (neg... da peça).
34 - Em suma, e salvo melhor opinião, tendo em conta a impossibilidade de aprovação do PIP como garantia para a condição de alteração de uso as partes diligenciaram concertadamente pela obtenção da garantia de tal aprovação; a afixação do edital camarário.
35 - Recuperando: no novo condicionalismo não contratualmente consagrado foi dada uma garantia que ia de encontro às pretensões da R. e que se veio a verificar. E isto releva decisivamente e milita em favor da pretensão deduzida nos presentes autos.
36 – Quanto à verificação da condição da área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7.500 metros quadrados e tal como se deixou supra referido, esta condição estava já alcançada por força do PIP anteriormente apresentado e foi cabalmente garantida pelas informações camarárias que, por razões de cautela de patrocínio, fomos impelidos a transcrever no texto da motivação de recurso e para a qual se remete.
37 - Como ficou demonstrado, a possibilidade de edificação pretendida de 7.500 m2 acima da cota de soleira estava garantida por força da anterior posição camarária: a “Informação prévia de obra de edificação” (25.10.2018) no qual também vem referido que a volumetria aceitável para a operação urbanística não deverá ultrapassar 7 pisos acima da cota soleira.”
38 - Também esta condição contratual deverá ter-se por verificada em função da admissão camarária expressamente consagrada e que resultou do procedimento administrativo da alteração de uso.
39 – No que concerne à verificação das condições no tempo – o dia 30 de Junho de 2019 – importa evidenciar que na impossibilidade de que fosse aprovado um PIP para alcançar as condições cumulativas pretendidas e no prazo ajustado de 30 de Junho de 2019, a aqui apelante logrou alcançar que: 44. No dia 30 de Maio de 2019, foi afixado o edital camarário onde foi dado conhecimento público da aprovação de alteração do alvará de licença de loteamento n.º 75/72 (Proc. n.º 19687/L) no que respeita à alteração de uso de clínica para actividades económicas e a clarificação quanto à limitação altimétrica do edifício relativamente às construções envolventes com a introdução do número máximo de sete pisos; Cfr. edital-doc. n.º 36;” (neg... da peça).
40 - Ou seja: dentro do prazo contratualmente definido e perante a nova realidade com que as partes se depararam para obter as garantias que valorizavam objectivamente o terreno para construção e que justificavam o pagamento da quantia de 400.000,00€, a A. logrou dar cumprimento à garantia de aprovação da alteração de uso e possibilidade de construção altimétrica com o número máximo de sete pisos, o que, por si só, garantia a construção de 7.500 m2 acima da cota de soleira (cfr. documentos juntos supra referidos).
41 - Temos, pois, como que verificada, no tempo, as condições contratuais atendendo à adaptação das obrigações contratuais inicialmente assumidas sendo que não só a R. obteve tal garantia (com a afixação do edital) como tal se veio a verificar.
42 - A A. e a R. ajustaram contratualmente o pagamento da quantia de 400.000,00€ dependente da verificação da condição temporal de, até 30 de Junho de 2019, ser aprovada a alteração de uso do imóvel de clínica para residência de estudantes e garantida a possibilidade de volumetria de construção mínima de 7.500m2 acima do arruamento da Rua Prof. ....
43 - Foi esta a condição pretendida pelas partes que, objectivamente, garantia a valorização do imóvel pretendida pela R. e que está na base da A. ter aceitado o recebimento da quantia de 400.000,00€ aquando da confirmação de tal possibilidade e dentro do praz contratual ajustado.
44 - A A., em colaboração com a R., logrou alcançar a verificação da condição contratual pelo que lhe é devido o pagamento ajustado de 400.000,00€.
45 - Dispõe o art. 270.º do Código Civil (adiante, CC) que “as partes podem subordinar a um acontecimento futuro e incerto a produção dos efeitos do negócio jurídico ou a sua resolução: no primeiro caso, diz-se suspensiva a condição; no segundo, resolutiva.”
46 - No caso concreto, a A. e a R. ajustaram uma condição suspensiva (cfr. art. 271.º do CC), a qual se teve por verificada e faz surgir a obrigação de cumprimento na esfera jurídica R..
47 - A apelante tem, pois, o direito a receber a quantia contratualmente ajustada dos 400.000,00€, razão pela qual se impõe a revogação da decisão anterior e a sua substituição por uma outra que condena a R. nos termos constantes do petitório inicial.
48 – A sentença recorrida é ainda merecedora de críticas quanto à solução de direito seguida e para cuja parte dispositiva se remete e se transcreveu no corpo da peça recursória.
49 - No fundo, o pensamento vertido pela Exma. Sra. Juíza junto da primeira instância foi este: - as partes não escreveram o que na realidade pretendiam; - as condições alcançadas, na impossibilidade de o serem por via de um PIP, só se verificaram em 3 de Fevereiro de 2020 com o aditamento ao alvará da licença de loteamento;
50 - O tribunal a quo ignorou olimpicamente que: - foi a R. quem colocou na redacção do contrato que a verificação das condições resultasse de um PIP; - que a verificação de tal condição era impossível; - que a vontade das partes na prossecução de tais condições foi ajustada e foi alcançada; - que as pretensões da R, para valorização do terreno para construção adquirido, foram alcançadas; - que a R. beneficiou de tal e a A. não, tendo, respectivamente, enriquecido e empobrecido, como se verá;
51 - Ignorou ainda e de forma chocante que não podendo as condições ajustadas serem alcançadas por força do PIP mas sim por um outro instrumento jurídico que veio a ser conhecido pelas partes e através do qual foi feita a prossecução da verificação das condições pretendidas tal implicou e implicaria sempre a devida alteração das condições, mormente, de prazo inicialmente ajustadas.
52 - Com efeito, desprezar que a alteração do instrumento devido para a verificação das condições contratuais em que as partes fundaram a sua decisão de contratar é vetar ao abandono a modificação das circunstâncias contratuais de uma forma inapelavelmente unilateral e tendenciosa. Não pode ser!
53 - Não pode ser considerada, sem mais, como incumprida a verificação das condições no tempo tendo em conta a alteração ao quadro contratual que ficou demonstrado e que implicou alteração de diligências pelas partes, recurso a arquitectos, novas diligências camarárias e a instrução de um novo procedimento camarário, in casu, a alteração de uso por alteração ao alvará da licença de loteamento.
54 - Isto pois o recurso ao PIP (mecanismo jurídico muito mais célere) ficou prejudicado seja no aproveitamento do PIP existente, seja na propositura de um novo.
55 – O tribunal a quo devia atender à modificação contratual gerada, designadamente na modalidade de erro sobre as circunstâncias que constituem a base do negócio (art. 252, n.º 2 do CC) e que tal acarreta uma modificação do contrato por alteração das circunstâncias com recurso à equidade.
56 – Concretizando, o tribunal deveria atendar à modificação contratual verificada no que respeita à verificação das condições através de um PIP e sua repercussão no tempo.
57 - Ora, como é evidente e ficou demonstrado, estamos perante um erro superveniente.
58 - Mas só é aqui relevante a alteração superveniente dessas circunstâncias. Se a discrepância entre os que as partes queriam / consideravam e a realidade for anterior ou contemporânea da celebração do contrato, se for originária, há erro.
59 - Interessa à nossa exposição o caso em que tal discrepância se verifica após a celebração do negócio, já durante a sua execução / cumprimento.
60 - Esta discordância entre realidade e vontade contratual deve ser objectiva, não pode ter em conta as previsões ou pressuposições individuais dos contraentes: o futuro é, por definição, imprevisível, não há erro sobre o futuro.
61 - Se as partes, logo no momento da celebração do negócio, se baseiam numa situação que não é real, haverá erro sobre a base do negócio (art. 252º, n.º 2 do CC).
62 - Por base do negócio deve entender-se as circunstâncias em que se baseia a vontade negocial. Estas circunstâncias devem ser reconhecidas por ambas as partes e estar patentemente reflectidas no negócio concluído, justamente como se verificou.
63 - Ora, a “base do negócio” é uma abstracção. As circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar devem ser: a) densificadas, mediante estipulação expressa, reflectida, por exemplo e como dissemos, nos Considerandos contratuais; ou b) ser objectivamente avaliáveis, nomeadamente por serem evidentes.
64 - Dispõe o art. 252.º, n.º do CC que “se, porém, recair sobre as circunstâncias que constituem a base do negócio, é aplicável ao erro do declarante o disposto sobre a resolução ou modificação do contrato por alteração das circunstâncias vigentes no momento em que o negócio foi concluído.”.
65 - E este regime manda aplicar as regras da alteração de circunstâncias constante do art. 437.º, n.º 1 do CC, ou seja, “Se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem sofrido uma alteração anormal, tem a parte lesada direito à resolução do contrato, ou à modificação dele segundo juízos de equidade, desde que a exigência das obrigações por ela assumidas afecte gravemente os princípios da boa fé e não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato.”
66 - Há, pois, lugar à resolução do litígio com chamamento à equidade pelo que, neste particular, a apelante entrega-se à sensibilidade judicativa de V. Exas. pois perante os factos demonstrados e a génese do erro sobre as circunstâncias é mister concluir pela modificação do contrato no que respeita ao prazo da verificação das condições, solução e de direito que estava à mercê do tribunal recorrido.
67 - Assim sendo, uma modificação contratual que facultasse um prazo consentâneo à A. e ora apelante constitui uma solução justa e equitativa e na qual se deve atentar que em 30 de Maio de 2019 a A. logrou obter a afixação do edital de publicidade da aprovação do pedido de alteração ao alvará de licença de loteamento e que, sem ser necessária qualquer intervenção posterior, a formalização de tal aditamento camarário apenas teve lugar em 3 de Fevereiro de 2020.
68 - Neste quadro, a modificação contratual do prazo para verificação das condições teria sempre que atender ao prazos e delonga própria do procedimento administrativo que veio a ser seguido e não o PIP inicialmente previsto, razão pela qual se crê que o tribunal poderá seguir esta via e atendendo à modificação da condição no tempo não deixará de condenar a R. nos termos constantes da p.i.., designadamente no pagamento da quantia de 400.000,00€, acrescida dos juros legais comerciais.
69 - Sem conceder minimamente, e por mera cautela de patrocínio, caso não se atenda à modificação contratual em face à alteração de circunstâncias superveniente não poderá deixar de atender-se a que as partes contrataram uma condição impossível, a sua não verificação e a consequente nulidade do negócio.
70 - Isso mesmo foi assumido pela decisão recorrida ao evidenciar que o PIP jamais teria a virtualidade de realizar as condições ajustadas, designadamente a alteração de uso do loteamento.
71 - A verificação da condição da alteração de uso dever ter sido consignada num Pedido de Informação Prévia (PIP) implica que se tenha caído no domínio das chamadas condições impossíveis porque, in casu, juridicamente impossíveis.
72 - Isto pois, como se demonstrou à saciedade, o instrumento jurídico que tinha a virtualidade de proceder à alteração de uso foi aquele que a A. e R. concertadamente adoptaram: a alteração do alvará de licença de loteamento n.º 75/72. Dispõe o art. 271 do CC que: “1. É nulo o negócio jurídico subordinado a uma condição contrária à lei ou à ordem pública, ou ofensiva dos bons costumes. 2É igualmente nulo o negócio sujeito a uma condição suspensiva que seja física ou legalmente impossível; se for resolutiva, tem-se a condição por não escrita.”
73 - Com efeito, “tanto a declaração de nulidade como a anulação do negócio têm efeito retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente.” (neg...s da peça).
74 - Deve, pois, ser reconhecida nulidade do contrato de cessão de posição contratual e consequente destruição retroactiva dos seus efeitos, cabendo à A. restituir à R. a quantia por esta paga (1.200.000,00€) e ser o direito de propriedade da R. transferido para a A., tudo conforme preceitua o art. 289.º, n.º 1 do CC. 75 - Por último – e como passo jurídico intelectual sequencial – importa verificar se a R. não tem o dever de indemnizar a A. com base no instituo residual do enriquecimento sem causa.
76 - Temos por assente as circunstâncias que implicaram a presente vexatia quaestio e por isso aí não voltaremos porque sobejamente revisitadas.
77 - Dispõe o art. 473.º do CC que: “1 - Aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou. 2 - A obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou.”
78 - Como se disse, o enriquecimento sem causa intervém “não há lugar à restituição por enriquecimento, quando a lei facultar ao empobrecido outro meio de ser indemnizado ou restituído, negar o direito à restituição ou atribuir outros efeitos ao enriquecimento.” (cfr. art. 474 do CC).
79 - Preceitua ainda o art. 479.º do CC que: “1. A obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa compreende tudo quanto se tenha obtido à custa do empobrecido ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente. 2. A obrigação de restituir não pode exceder a medida do locupletamento à data da verificação de algum dos factos referidos nas duas alíneas do artigo seguinte.” (neg... da peça).
80 - Ora, no caso concreto, considerar que a A. não cumpriu, no prazo previsto, as condições contratuais previstas significa, indubitavelmente: - um empobrecimento na sua esfera jurídica e patrimonial; - um enriquecimento na esfera jurídica e patrimonial da R.; - havendo nexo causal entre ambos, ou seja, a deslocação patrimonial verificada resulta da desconsideração da verificação das condições previstas e das quais resulta uma valorização do terreno para construção que justificou a vontade das partes contratadas; - sem causa justificativa, isto pois não pode ser atendida uma condição temporal inicialmente prevista quando a forma e veículo jurídico de alcançar as demais condições foi tido como errado de forma superveniente e de forma reconhecida.
81 - Também por esta via se justifica a condenação da apelada na quantia de 400.000,00€, acrescida dos juros legais comerciais peticionados.
A apelada contra-alegou, ampliando o objeto do recurso relativamente à matéria de facto prova sob os números 22 e 39, 44, 45, 48 e 27 e também do facto 2 dos factos julgados não provados, pugnando pela confirmação da sentença recorrida, formulando para o efeito as seguintes conclusões:
A. Nos autos que correram termos no Juízo Central Cível de Lisboa Juiz 13 sob Processo 8172/20.1T8LSB foi proferida douta sentença que julgou improcedente por não provada a acção intentada pela aqui Recorrente absolvendo a aqui Recorrida de todos os pedidos contra si formulados.
B. Como melhor resulta da petição inicial e do relatório da sentença recorrida, a Recorrente peticionara nestes autos a condenação da Recorrente no pagamento da quantia de €400.000,00, assente no alegado cumprimento da cláusula 6º do contrato de cessão da posição contratual que celebrou com a Recorrida, peticionando subsidiariamente o reconhecimento e declaração de nulidade dessa mesma cláusula por respeitar ao cumprimento de uma condição impossível, mais peticionando em consequência deste último pedido o reconhecimento e declaração de nulidade de todo o contrato e restituição à A. aqui Recorrente do direito de propriedade sobre o imóvel objecto do referido contrato mediante a restituição à aqui Recorrida da quantia de €1.200.000,00 .
C. Tendo por referência o objecto do recurso delimitado pelo Recorrente nas conclusões da respectiva alegação, o Recorrente impugna a decisão proferida sobre a os factos julgados como não provados sob números 1, 2 e 3, e tenta pôr em crise a aplicação do Direito pelo tribunal a quo, defendendo, em síntese, que o tribunal a quo deveria ter condenado a Recorrida no pagamento da quantia peticionada, pelo que alega ter sido o cumprimento da condição plasmada no art.6º do referido contrato, ou, em alternativa, declarado nulidade contratual,
D. Ou deveria ter decidido pela condenação da Recorrida, por aplicação de um dos regimes jurídicos que, ao arrepio do processado até aqui, agora invoca como aplicáveis, quais sejam o erro sobre a base do negócio e/ou alteração das circunstâncias, ou o enriquecimento sem causa.
E. Alega o Recorrente que o tribunal a quo deveria ter dado como provado o facto julgado não provado pelo tribunal a quo sob 1 dos factos não provados, isto é que “1. A Ré sabia que o Pedido de Informação Prévia ainda vigente, Proc. nº47/2018/IP, permitia a edificação acima do arruamento da Rua ... superior a 7.500 m2”.
F. O FACTO 1 dos factos julgados não provados só poderia ser provado por documento. Os documentos em que o recorrente pretende suportar a prova de tal facto reportam-se a uma informação prévia da Câmara Municipal de ... proferida sobre um pedido de informação prévia apresentado tendo por objecto, “a viabilidade de construção para empreendimento turístico-hotel 3 estrelas a realizar no Lote 53 do alvará loteamento nº75772 da EDEC como área total de 1.190 m2”,informação prévia essa que foi indeferida pela Câmara Municipal de ....
G. Pedidos de informação prévias desfavoráveis são inaptos, em si mesmos, a vincular a edilidade a pressuposto algum, porque só os Pedidos de Informação Prévia favoráveis são vinculativos, e por tempo determinado.
H. Assim, o Pedido de Infomação Prévia a que se reporta o recorrente, tendo sido indeferido, tendo objecto distinto da operação urbanística pretendida e descrita na cláusula 6º do contrato celebrado entre as partes, não poderia nunca consubstanciar garantia alguma de vinculação da Câmara de ... à viabilização da operação urbanística concreta de edificação de uma “residência de estudantes com área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 metros quadrados” .
I. Termos em que não merece qualquer censura o tribunal ao quo a dar como não provado que “1. A Ré sabia que o Pedido de Informação Prévia ainda vigente, Proc. nº47/2018/IP, permitia a edificação acima do arruamento da Rua ... superior a 7.500 m2”, facto que se impõe ser julgado como não provado.
J. Alega o recorrente que o tribunal a quo não poderia ter deixado de julgar provado que “2. A condição estabelecida, determinava a aprovação de um Pedido de Informação Prévia” sob pena de contradição com os factos julgados como provados sob 20 a 22 dos factos provados.
K. Ambas as partes sabiam ser necessária a alteração do uso do terreno, e por isso expressamente previram na redação da cláusula também essa necessidade, sem que tenham, no entanto, disposto por que instrumento jurídico essa alteração de uso seria efectivada.
L. Nem o argumento puramente literal favorece a tese do recorrente, quando é certo que a condição “garantindo a mudança de uso do terreno objecto deste contrato” se mostra entre virgulas, o que além de não permitir a interpretação de que pretenderam as partes que o uso do terreno fosse alterado através de um PIP, pelo contrário, evidencia que as partes bem sabiam que eram necessários dois procedimentos distintos e autónomos, como aliás clarificaram os legais representantes da Ré e da A. nas declarações prestadas em audiência de Julgamento.
M. Mal andou, porém efectivamente, o tribunal a quo a julgar como não provado que a condição estabelecida pela cláusula 6º do contrato de cessão da posição contratual determinava a aprovação de um Pedido de Informação Prévia, quando é certo que,
N. não só a redação da cláusula é quanto a essa exigência inequívoca, em coerência aliás com o teor da cláusula 7º desse mesmo contrato (nos termos da qual se fixa como termo inicial do prazo do eventual pagamento a notificação da Câmara de ... da aprovação do PIP),
O. Como a correcta valoração da prova produzida em audiência de julgamento impunha que tivesse o tribunal a quo julgado como provado que a condição estabelecida determinava a aprovação de um pedido de informação prévia, na exacta medida em que só o pedido de informação prévia aprovado permitiria garantir a viabilidade da construção de uma “residência de estudantes com uma área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 m2”.
P. Isso mesmo afirmaram unanimemente as testemunhas Arquitectos Francisco ..., António ..., Sérgio ... e Paulo ..., depoimentos gravados respectivamente nos ficheiros 20210623120332_19980128_2871030 (DE MINUTOS 0:04 A 23:46), FICHEIRO20210623142134_19980128_2871030, (DE MINUTOS03:03 A 22:22), FICHEIRO 20210623144943_19980128_2871030, (DE MINUTOS 00:02 A 33:09), E FICHEIRO N.º 20210623152359_19980128_(DE MINUTOS 00:02 A 17:19), cujos excertos mais relevantes se mostram transc...s supra e aqui se dão por reproduzidos.
Q. Da prova produzida em audiência de julgamento resultou claro que a vinculação da Câmara de ... à viabilização da operação urbanística concreta de edificação de uma “residência de estudantes com área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 metros quadrados” descrita na cláusula 6º só poderia ser alcançada mediante a apresentação e consequente aprovação de um Pedido de Informação Prévia com este concreto objecto.
R. As partes estipularam expressamente que só com a aprovação de um PIP que garantisse a viabilidade da operação urbanística descrita na cláusula 6º, se teria por verificada a condição e, em coerência, estipularam expressamente na cláusula 7º que só após a notificação à Recorrida pela Câmara de ... dessa aprovação, concretamente 15 dias depois, seria efectuado o pagamento do montante acordado.
S. Resulta da conjugação do teor da cláusula 6º e 7º do contrato junto com a P.I. como Doc. 16, com a prova produzida em audiência de julgamento, supra explicitada, que o Pedido de Informação Prévia seria o único instrumento urbanístico apto a garantir à aqui Recorrida a viabilidade de construção de uma residência de estudantes com uma área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 m2, e por assim ser, a condição estabelecida determinava inequivocamente a necessidade de aprovação da um PIP.
T. Uma correcta apreciação dos elementos probatórios pelo tribunal a quo impunha que não tivesse sido julgado como não provado que “2. A condição estabelecida determinava a aprovação de um Pedido de Informação Prévia”,
U. termos em que, fazendo a devida apreciação da prova produzida, impõe-se que seja alterada a decisão proferida sobre este ponto da matéria de facto, julgando-se como provado que a condição estabelecida determinava a aprovação de um Pedido de Informação Prévia.
V. Alega o recorrente que o tribunal a quo deveria ter dado como provado o FACTO 3 dos factos não provados, ou seja que “3. Na sequência da comunicação de 26 de Outubro de 2018 da Câmara Municipal de ..., a R. tomou conhecimento que a viabilização da operação urbanística pretendida implicaria “alteração do alvará de licença do loteamento 75/72, quanto ao uso para o lote 53”, alegando para tanto que tal facto não poderia ser julgado como não provado tendo sido dado como provada a factualidade de 28 a 32 e 39 dos factos provados, sob pena do que entende ser uma contradição, e sem contudo invocar qualquer elemento probatório de que pudesse resultar a prova do facto que pretende ver julgado provado.
W. Nos factos provados de 28 a 32, o tribunal a quo reporta-se à pretensão urbanística apresentada pela Lus, a qual não tem qualquer relação com a pretensão urbanística da Recorrida, pelo que inexiste qualquer contradição.
X. Independentemente de ter sido, correcta ou erradamente, julgado provado o facto 39, não resulta qualquer contradição entre ter sido julgado provado o facto 39 e não provado o facto 3 dos factos não provados, na medida em que se reporta o primeiro a Fevereiro de 2019, e o facto 3 dos factos não provados a Outubro de 2018.
Y. Termos em que nenhuma censura merece a decisão do tribunal a quo ao julgar como não provado que “3. Na sequência da comunicação de 26 de Outubro de 2018 da Câmara Municipal de ..., a R. tomou conhecimento que a viabilização da operação urbanística pretendida implicaria “alteração do alvará de licença do loteamento 75/72, quanto ao uso para o lote 53”, devendo em consequência tal facto manter-se julgado como não provado.
Z. Sem impugnar o julgamento da matéria de facto dada como provada ou como não provada, e sem se referir uma única vez ao julgamento de Direito que resulta da sentença a quo, nas conclusões que formula de 20º a 47º, labora num exercício de tentativa de convencimento do tribunal ad quem da bondade da tese que defendeu em primeira instância, e conjugando alguns dos factos julgados provados na sentença a quo, com pretensos “factos” não alegados no momento processual próprio e que como tal não têm o menor reflexo na matéria de facto julgada (provada ou não provada) enquadrados por juízos conclusivos e opinativos.
AA. Na medida em que este exercício de dissertação, sem qualquer reflexo na sentença recorrida, extravasa o âmbito e objecto da sede recursiva não pode o mesmo ser julgado admissível mormente na medida em que aqui se aproveita para desenvolver fundamentos de facto e de direito que em primeira instância sequer alegou, e em consequência, sequer foram discutidos.
BB. Não se destina a instância de recurso a permitir às partes um segundo momento para produzirem alegações alheias à decisão proferida e à respectiva fundamentação de facto e de Direto.
CC. As alegações de recurso têm por objecto a exposição das razões de facto e de Direito que, segundo o Recorrente, imporiam que tivesse sido proferida sentença de conteúdo e sentido diverso, e sempre tendo por referência os fundamentos de facto e direito que foram objecto de discussão em primeira instância.
DD. É inequívoco o sentido em que sobre esta matéria se tem pronunciado a Jurisprudência, recente e mais antiga, de que a título de exemplo se refere o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 9 de Novembro de 2020, disponível em www.dgsi.pt, cujo excerto se deixou transc... supra e aqui se dá por reproduzido.
EE. Afigura-se que o identificado segmento das conclusões (e correspondente motivação) não deve ser admitido ou considerado pelo tribunal ad quem, por não consubstanciarem verdadeiras alegações de impugnação da decisão a quo, mas sim meras alegações, de facto e direito, algumas sequer discutidas em primeira instância, o que manifestamente a lei processual civil não permite, devendo, em consequência ser desconsideradas pelo tribunal ad quem, com as necessárias consequências na delimitação do objecto do recurso.
FF. Sem prescindir, e por cautela de patrocínio não deixa a recorrida de sobre tal segmento apresentar a sua reposta.
GG. Não sendo crível que a Recorrente, de boa fé pelo menos, desconheça que o facto 44 se mostra erradamente julgado pelo tribunal a quo, é, no entanto, precisamente e unicamente dir-se-á, neste facto 44 que a Recorrente suporta afinal a tese de que teria cumprido a condição. Concretamente, HH. Quanto à alteração do uso defendendo que, afinal o cumprimento da condição se bastava com a “garantia” da aprovação da alteração do uso, que entende ter acontecido com a publicitação do edital camarário de 30 de Maio de 2019;
II. E quanto à aprovação do PIP que garantisse a construção de uma residência de estudantes com área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 m2 acontecesse até ao dia 30 de Junho de 2019, defendendo que esse PIP, não era afinal necessário por estar já garantida por PIP anterior (desfavorável e com outro objecto) a vinculação da edilidade à aprovação da construção de uma residência de estudantes com área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 m2.
JJ. Quanto à alteração do uso, é inequívoco que o facto 44 em que o Recorrente se suporta foi erradamente julgado provado porquanto os meios probatórios aptos a produzir a sua prova, concretamente o documento em que o tribunal a quo assenta o julgamento deste facto, impõe, pelo contrário, que se julgue o mesmo como não provado.
KK. Quanto à aprovação, até 30 de Junho de 2019, de Pedido de Informação Prévia que garantisse a construção de uma residência de estudantes com área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 m2, considerando todo o já supra exposto, e que em abono do princípio da economia processual e pelo devido respeito pelo tempo deste Tribunal aqui se dá por reproduzido, resulta claro, em síntese, que:
LL. A garantia da viabilidade da operação urbanística pretendida pela Recorrida, e que a Recorrente conhecia, só poderia ser consubstanciada através da aprovação de um Pedido de Informação Prévia pela Câmara Municipal de ... que se pronunciasse sobre a concreta operação urbanística de construção de uma residência de estudantes com área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 metros quadrados.
MM. É totalmente improcedente qualquer tentativa de confundimento entre os instrumentos jurídico-administrativos Pedido de Informação Prévia e Alteração de Alvará de Loteamento, ou entre os diferentes parâmetros urbanísticos a que a Recorrente indiferenciadamente, se refere como se significassem uma e a mesma coisa.
NN. O pedido de informação prévia em caso algum pode produzir os efeitos que produzirá uma qualquer alteração de alvará de loteamento, e do alvará de loteamento, e suas alterações/aditamentos, não resulta a definição da viabilidade de realização de qualquer operação urbanística concreta, ou da concreta área de construção permitida, como cabal e unanimemente explicitaram as testemunhas ouvidas em julgamento, como supra exposto e aqui se dá por reproduzido.
OO. Só perante uma proposta de realização de operação urbanística concreta, e em face da concreta afectação a que se destine essa operação, a Câmara Municipal emite informação sobre a viabilidade da mesma, respectivos condicionantes e índices urbanísticos, entre as quais a área de construção, informação essa que, nos termos previstos no art. 17º do Decreto-Lei 555/99, e apenas caso seja favorável à operação urbanística concreta em causa, vincula as entidades competentes na decisão sobre um eventual pedido de licenciamento e no controlo sucessivo de operações urbanísticas sujeitas a comunicação prévia, e durante um ano.
PP. Nenhum dos pedidos de informação prévia juntos aos autos obteve despacho favorável, nem teve por objecto a apreciação pela Câmara Municipal de ... de uma operação urbanística de construção de uma residência de estudantes com área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 metros quadrados, pelo que nenhum vincula a edilidade quanto á viabilidade da operação pretendida pela Recorrida.
QQ. Área de construção não é sinónimo, nem equivale ou sequer se confunde com “volumetria”, com “construção altimétrica”, ou com “número de pisos”.
RR. A área de construção possível na edificação naquele lote de uma residência de estudantes, não poderia ser definida se não na sequência de um pedido de informação prévia com esse concreto objeto, como resulta da lei e foi de forma unânime explicitado pelas testemunhas em audiência de julgamento, nos termos supra expostos e que aqui se dá por integralmente reproduzido.
SS. Não tendo sido aprovado até 30 de Junho de 2019 um Pedido de Informação Prévia tendo por objecto a operação urbanística de construção de uma residência de estudantes com área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 metros quadrados, é absolutamente infundada a alegação de que a recorrente cumpriu a condição aposta na cláusula 6º do contrato de cessão da posição contratual que celebrou com a Recorrida.
TT. De 48º a 81º das Conclusões da alegação de recurso, a Recorrente ataca a solução de Direito seguida na sentença recorrida, o que faz, por um lado, imputando ao tribunal a quo ter apenas assente no facto de as condições ínsitas na cláusula 6º não terem sido cumpridas pela Recorrente, e por outro, por não ter aplicado regimes jurídicos que entende aplicáveis, como sejam, alternativamente o regime do erro sobre a base do negócio e/ou alteração das circunstâncias, ou o enriquecimento sem causa.
UU. No que concerne ao enquadramento de Direito em que o Recorrente assentou os pedidos que formulou na sua petição inicial, o tribunal a quo apreciou, mas o recorrente entende não ter apreciado ou ter apreciado mal, e que se reconduz à invocação da nulidade da cláusula, por comportar uma condição alegadamente impossível, em coerência lógica com o que supra se referiu quanto a não terem nunca as partes estipulado o PIP como forma de alteração do uso do lote em causa, carece de qualquer fundamento a invocada nulidade da condição por impossibilidade.
VV. No que concerne ao enquadramento de Direito que a Recorrente nunca antes invocou, sem formular contra a Recorrida qualquer pedido assente em tais institutos, nem trazido aos autos causa de pedir que permita integrar as previsões das normas a que apela, elenca o Recorrente, crê-se que alternativamente, os regimes da alteração das circunstâncias contratuais e/ou erro sobre a base do negócio e o instituto do enriquecimento sem causa.
WW. A causa de pedir alegada pelo A. nos presentes autos, e em consequência a factualidade julgada (provada ou não) pelo tribunal a quo é totalmente omissa quanto a factos que pudessem, em abstrato, e sempre sem prescindir, subsumir-se a qualquer dos regimes jurídicos só agora invocados. XX. Do princípio plasmado no nº3 do art. 5º do CPC não resulta que caiba ao tribunal de segunda instância uma requalificação jurídica com base numa causa de pedir diversa da que foi alegada, estando-lhe, pelo contrário vedado proferir decisão que exceda os limites do pedido que foi formulado, sendo nesta matéria cristalino o Acórdão do Supremo Tribunal e Justiça de 5 de Abril de 2018, disponível em www.dgsi.pt, aqui se dando por reproduzidos os excertos transc...s supra;
YY. É pois inadmissível ao recorrente pretender em sede de recurso ver apreciado um novo objecto que não quis apresentar a juízo em primeira instância, e que, numa inadmissível tentativa de blindagem processual, subtraiu ao basilar contraditório, à produção de prova, e à apreciação em primeira instância, apresentando-a (apenas) agora à segunda instância sob as vestes de pretensa diferente qualificação jurídica de factos que até à sentença não alegou. Sem prescindir,
ZZ. No que concerne à modificação contratual, que aparentemente pretende fazer operar directamente por via do regime da alteração das circunstâncias muito embora, a este propósito, se referira nas conclusões 55, e 61 a 64 afinal aos pressupostos legais do erro sobre a base do negócio como pressuposto para invocar que é por via da remissão deste preceito que entende aplicável o regime da alteração das circunstâncias…
AAA. Inexistem, factos provados na sentença de que possa extrair-se factualidade mínima que permita julgar se o recorrente efectivamente agiu determinado por qualquer erro, se esse putativo erro incidiu sobre a essencialidade do negócio, e em consequência que permita julgar qualquer dos demais requisitos que integram a previsão do art. 252º do CC, nem é admitido ao Recorrente que nesta sede os tente alegar, de forma mais ou menos visível…
BBB. Pelo que em obediência aos normativos e princípios supra invocados, não pode deixar de ser julgada inadmissível a apreciação pelo Tribunal da Relação em sede de apelação de qualquer questão em torno da pretensa modificação do contrato sustentada num agora alegado erro sobre a base do negócio,
CCC. Que sempre seria, aliás improcedente, desde logo porquanto caducado o putativo direito do A. a fazer operar os regimes invocados em face do preceituado nos art. 252º, 437º e 287º todos do Código Civil, em face do decurso de mais de um ano entre o momento em que o recorrente confessa ter tido conhecimento, e assim ter cessado o putativo erro (Outubro de 2018) e da data em que intentou a presente acção (25/03/2020). Em consequência,
DDD. Ficaria sempre igualmente prejudicada qualquer alegação de modificação contratual consequente da alegada aplicação do regime da alteração das circunstâncias por via do alegado erro sobre a base do negócio, como resulta claro, entre muitos outros e a título de exemplo, do decidido no Acórdão do STJ de 2/10/2014, disponível em www.dgsi.pt parcialmente supra transc... e aqui se dá por reproduzido.
EEE. Sempre sem prescindir, diga-se aliás que a verificação dos requisitos de aplicação do regime previsto no art. 437º do Código Civil encontra sempre o seu mais fino crivo na parte final do preceituado no seu nº1 “desde que a exigência das obrigações por ela assumidas afecte gravemente os princípios da boa fé e não esteja prevista pelo riscos próprios do contrato”
FFF. Crivo ao qual não poderia resistir a parte que se arroga credor duma quantia que convencionou ser devida a título de prémio pela alteração do uso do terreno e aprovação de um PIP com o conteúdo supra desc... até 30 de Junho de 2019, sabendo não ter até esta data apresentado qualquer PIP ou sequer sido aprovada a alteração de uso do lote… termos em que se crê serem despiciendas mais longas considerações para que seja liminarmente refutada a aplicação de qualquer instituto que apele às exigências de equilíbrio interno do contrato e de boa fé.
GGG. No que concerne á invocação do regime do enriquecimento sem causa, e dando aqui por reproduzido o que supra se referiu quanto à total ausência de causa de pedir que o sustente, sempre importará sublinhar que, como resulta da leitura conjugada do clausulado dos contratos juntos como doc 2, 3 e 16 da petição inicial,
HHH. Se por um lado a Recorrente, obteve, com o negócio em causa um ganho patrimonial imediato de €450.000€ que lhe foram pagos pela Recorrida, e que corresponde a mais de 30% sobre o valor que havia fixado com o anterior proprietário do imóvel ser o valor de mercado do imóvel, a Recorrida viu o capital que investiu, no montante de €1.200.000,00, forçosamente estagnado, custeou todas as despesas, encargos e honorários de arquitectos e não logrou obter no prazo estabelecido a garantia da viabilidade da operação urbanística pretendida.
III. Crê-se também neste ponto que, em face da total ausência de matéria de que pudesse extrair-se em qualquer medida um alegado enriquecimento da recorrida e correspondente empobrecimento da recorrente sem causa, se mostram despiciendas mais longas considerações sobre a total improcedência da invocação de uma possível aplicação do instituto jurídico do enriquecimento sem causa. Sendo certo que não vislumbra sequer a Recorrida em que medida poderia ter havido empobrecimento da Recorrente.
JJJ. Sem prejuízo da manifesta improcedência do recurso apresentado, por inaptidão mínima das alegações do Recorrente para pôr em crise a sentença recorrida, admitindo-se por mera cautela de patrocínio como em abstrato possível essa procedência, vem a Recorrida, a título subsidiário e ao abrigo do disposto no nº2 do art. 636º do Código do Processo Civil, requerer a ampliação do objecto do recurso no sentido de impugnar a decisão proferida pelo tribunal a quo sobre matéria de facto com relação com as questões suscitas pelo recorrente, concretamente os factos dados como provados sob 22 e 39, 44, 45, 48 e 27 dos factos provados, e por cautela de patrocínio, porquanto distinta a fundamentação da impugnação que sobre este facto faz o Recorrente, também do facto 2 dos factos julgados não provados
KKK. Da prova produzida em audiência de julgamento resultam claramente infirmados os facto que o tribunal a quo julgou como provados sob 22 e 39 dos factos provados.Com efeito,
LLL.A literalidade da cláusula 6º não permite a interpretação de que dessa redação resulte “que tais possibilidades resultassem da aprovação de um Pedido de Informação Prévia”, sendo ainda que resulta claro das declarações prestadas em audiência de julgamento pelo legal representante da Ré e da A. que, desde o primeiro momento foi clara a necessidade de promover alteração do uso para uso distinto do então permitido pelo alvará de loteamento, e posteriormente obter aprovação de um Pedido de Informação Prévia que garantisse a edificação de uma residência de estudantes com uma área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 4500 m2.
MMM. Atento o teor inequívoco das declarações do legal representante da parte da Ré e sem que haja sido produzida qualquer prova em diferente sentido, impunha-se que tivessem sido julgados como não provados os factos sob 22 e 39 dos factos provados, termos em que deve a decisão proferida sobre a prova deste facto ser modificada pelo tribunal ad quem no sentido de serem julgados não provados, o facto “ 22. A R. colocou na redação do contrato, que foi assinado pelas A. que tais possibilidades resultassem da aprovação de um Pedido de Informação Prévia pela edilidade de …” e o facto “39. “A R. ficou então ciente e esclarecida que a alteração de uso pretendida teria que ser feita mediante a alteração à licença de loteamento já existente”.
NNN. O tribunal a quo deu como provado sob facto 44 dos factos provados que “No dia 30 de Maio de 2019, foi afixado edital camarário onde foi dado conhecimento público da aprovação da alteração do alvará de licença de loteamento nº75/72 (Proc. nº19687/L) no que respeita à alteração de uso de clínica para actividades económicas e a clarificação quanto à limitação altimétrica do edifício relativamente às construções envolventes com a introdução do número máximo de sete piso; Cfr. edital doc nº36” (que corresponde a uma reprodução do facto 72 da petição inicial),
OOO. A Recorrida, impugna a decisão proferida pelo tribunal a quo sobre a prova do facto 44 dos factos provados que se entende incorrectamente julgado pelo tribunal a quo porquanto a correcta apreciação dos meios probatórios aptos a produzir a sua prova impõem que se dê o mesmo como não provado. Com efeito,
PPP. O facto julgado como provado sob 44 dos factos provados foi incorrectamente julgado pelo tribunal a quo porquanto é facto susceptível de ser provado exclusivamente por documento, e na medida em que da prova documental em que assentou o tribunal, a fls. 121, não só não resulta prova do mesmo como resulta tal facto totalmente infirmado quer pelo teor deste documento, quer pelo teor do documento a fls. 136 que faz prova de facto contrário, em coerência aliás com o facto provado sob 50 dos factos provados.
QQQ. Termos em que se impunha que o tribunal a quo tivesse julgado este facto como não provado, impondo-se, face a todo o exposto que, admitindo a ampliação do objecto do recurso, por este Venerando Tribunal seja julgado como não provado que “No dia 30 de Maio de 2019, foi afixado edital camarário onde foi dado conhecimento público da aprovação da alteração do alvará de licença de loteamento nº75/72 (Proc. nº19687/L) no que respeita à alteração de uso de clínica para actividades económicas e a clarificação quanto à limitação altimétrica do edifício relativamente às construções envolventes com a introdução do número máximo de sete pisos”.
RRR. Impugna a Recorrida a decisão proferida sobre o FACTO 45 dos factos provados “45. A A. deu conhecimento à R. da verificação da condição contratual ajustada em face de alteração de uso que permite a edificação de residências para estudantes e a possibilidade de volumetria de edificação superior a 7500 m2 acima do arruamento da Rua ...” (que corresponde ipsis verbis ao teor do alegado em 75º da petição inicial),o qual foi incorrectamente julgado pelo tribunal a quo.
SSS. Não se discute que a A. enviou à Ré a comunicação que constitui documento junto com a Petição inicial como documento 37. Porém, tendo por base essa prova documental, apenas podia o tribunal a quo julgar provado que tinha sido enviada uma comunicação nos termos da qual o A. entendia encontrar-se verificada a condição, não permitindo pelo contrário o referido elemento probatório que tivesse o tribunal julgado como provado o facto 45 nos termos em que se mostra redigido, termos em que se impõe que, admitida a ampliação do objecto do recurso nos termos requeridos, seja modificada a decisão proferida quanto a este a facto, devendo ser o mesmo julgado como não provado.
TTT. O FACTO 48 dos factos provados “48. A R. respondeu à A. alegando não ter qualquer notificação formal por parte da Câmara Municipal de ... relativa à aprovação do Pedido de Informação Prévia (PIP) que garantisse a mudança de uso do imóvel e a possibilidade de edificação mínima de 7500 m2 acima do arruamento da Rua ...; cfr. Doc. nº 39” (que corresponde ipsis verbis ao teor do alegado em 76º da petição inicial) foi incorrectamente julgado pelo tribunal a quo. UUU. O tribunal a quo julgou provado este facto assente num documento e aparentemente em prova testemunhal, quando a prova deste facto só poderia ser produzida documentalmente.
VVV. No documento junto com a PI como Doc 39 não há qualquer referência à falta de notificação de um “PIP que que garantisse a mudança de uso do imóvel”, mas sim e apenas a referência a que “até à data de hoje, 1 de Julho de 2019, a ... Lda. não recebeu nenhuma notificaçâo da Câmara Municipal de ... referente à aprovação do PIP previsto na cláusula 6º do contrato”.
WWW. Assente no doc.9 junto com a PI, apenas podia o tribunal a quo julgar provado que tinha sido enviada uma comunicação, nos termos da qual a Recorrida respondeu à Recorrente que “até à data de hoje, 1 de Julho de 2019, a ... Lda. não recebeu nenhuma notificaçâo da Câmara Municipal de ... referente à aprovação do PIP previsto na clásula 6º do contrato”, pelo que não podia o tribunal a quo ter julgado como provado o facto 48 nos termos em que se mostra redigido, impondo-se que seja modificada a decisão proferida quanto a este a facto, devendo o mesmo ser julgado como não provado.
XXX. A recorrida impugna a decisão do tribunal a quo sobre o ponto 2 da matéria de facto dada como não provada porquanto mal andou o tribunal a quo ao julgar como não provado que a condição estabelecida pela cláusula 6º do contrato de cessão da posição contratual determinava a aprovação de um Pedido de Informação Prévia.
YYY. Errou o tribunal a quo no jugamento deste facto como não provado quando é certo que, não só a redação da cláusula é quanto a essa exigência inequívoca, em coerência aliás com o teor da cláusula 7º desse mesmo contrato, como a correcta valoração da prova produzida em audiência de julgamento impunha que tivesse o tribunal a quo julgado como provado que a condição estabelecida determinava a aprovação de um pedido de informação prévia.
ZZZ. Da prova produzida em audiência de julgamento, concretamente do depoimento das testemunhas Arquitectos Nelson ..., Francisco ..., António ..., Sérgio ... e Paulo ..., nos termos supra transc...s que aqui se dão por reproduzidos, resultou inequívoco que só o pedido de informação prévia permitiria garantir à aqui Recorrrida a viabilidade da construção de uma “residência de estudantes com uma área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 m2”.
AAAA. A vinculação da Câmara de ... à viabilização da operação urbanística concreta de edificiação de uma “residência de estudantes com área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 metros quadrados” descrita na cláusula 6º só poderia ser alcançada mediante a apresentação de um Pedido de Informação Prévia com este concreto objecto.
BBBB. E por assim ser as partes estipularam expressamente que só com a aprovação de um PIP que garantisse a viabilidade da operação urbanística descrita na cláusula, se teria por verificada a condição e, em coerência, estipularam expressamente na cláusula 7º que só após a notificação à Recorrida pela Câmara de ... dessa aprovação, concretamente 15 dias despois, seria efectuado o pagamento do montante acordado.
CCCC. Resulta da conjugação do teor da cláusula 6º e 7º do contrato junto com a P.I. como Doc. 16, com a prova produzida em audiência de julgamento supra explicitada que o Pedido de Informação Prévia seria o único instrumento urbanístico apto a garantir à aqui Recorrida a viabilidade de construção de uma residência de estudantes com uma área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 m2, e por assim ser, deve ser julgado provado que a condição estabelecida determinava inequivocamente a necessidade de aprovação da um PIP.
DDDD. Uma correcta apreciação dos elementos probatórios referidos pelo tribunal a quo impunha que não tivesse sido julgado como não provado que “2. A condição estabelecida determinava a aprovação de um Pedido de Informação Prévia”, termos em que, fazendo a devida apreciação dos mesmos nos termos expostos, impõe-se que, admitida ampliação do objecto do recurso, seja alterada a decisão proferida sobre este ponto da matéria de facto, julgando-se como provado que a condição estabelecida determinava a aprovação de um Pedido de Informação Prévia.
EEEE. Tendo por base a fundamentação que se deixa exposta e pela qual se entende erradamente julgado o facto 2 dos factos não provados, que se dá por reproduzida sem repetição, impugna a recorrida a decisão que julgou provado o facto 27 dos factos provados porquanto, da apreciação conjunta e coerente do teor dos documentos juntos sob Doc 9 com os depoimentos supras transc...s resulta notório o erro em que incorreu o tribunal a quo ao julgar este facto provado,
FFFF. Não resulta de qualquer dos documentos juntos sob “Doc.9” a prova do facto julgado como provado sob 27 dos factos provados, termos em que se impunha que tivesse o tribunal a quo dado como não provado o facto 27 dos factos provados, impondo-se, em face do exposto que alteração a decisão proferida quanto à prova deste facto, julgando-se o mesmo não provado.
2. FUNDAMENTAÇÃO.
A) OS FACTOS.
O Tribunal a quo julgou:
A.1. provados os seguintes factos:
1. A A. é uma sociedade comercial que, entre outras, desenvolve a sua actividade no âmbito da compra, venda e revenda de imóveis; Cfr. Doc. 1.
2. A ... Lda., aqui R., é uma sociedade que desenvolve a sua actividade, através da compra e venda de bens imobiliários, nomeadamente para construção de residências para estudantes; Cfr. doc. nº6.
3. Em 20 de Junho de 2018, a A. e a sociedade “Val” celebraram um contrato promessa de compra e venda com eficácia real mediante o qual a A. se obrigava a comprar o lote de terreno para construção, denominado lote 53, sito na ... do Poder Local, ... de Quinta Nova – Zona A, freguesia e concelho de ..., com a área de 1.190 m2, propriedade da segunda, pelo valor de 850.000,00€ (oitocentos e cinquenta mil euros; Cfr. doc. n.º 2 (fls.19 v. e ss.).
4. Da cláusula nona do referido contrato consta: “O promitente comprador pode ceder a sua posição no presente contrato ou indicar um terceiro para a outorga da escritura pública de compra e venda”; Cfr. doc. n.º 2.
5. O contrato promessa de compra e venda foi objecto de um aditamento pelas partes tendo sido acordado novo prazo para outorga da escritura pública; Cfr. doc. nº3 (fls.23 e ss.).
6. Enquanto decorria o prazo para outorga da escritura pública, referido em 5, a A. tomou conhecimento que a sociedade “Lus – Empreendimentos Imobiliários, S.A.”, a qual pretendia a aquisição do imóvel para edificação de um empreendimento turístico, no caso, um hotel de três estrelas;
7. Para tal objectivo, a sociedade “Lus” deu entrada de um Pedido de Informação Prévia (PIP), o qual deu origem ao Proc. n.º 417/2018/I, para indagar da viabilidade de construção do pretendido empreendimento para fins turísticos; Cfr. docs. nº 4 e 5 (fls.24 e ss).
8. A A. tinha já negociações praticamente concluídas com a sociedade “Lus” quando travou conhecimento com a R. que podia estar interessada na aquisição do imóvel tendo como finalidade a construção de residências para estudantes;
9. A escritura de compra e venda do imóvel pela A. ou pela sociedade cessionária “Lus” estava marcada para o dia 19 de Outubro de 2018, pelas 10h00;
10. A A. informou a Ré que tinha uma reunião marcada para o dia 16 de Outubro de 2018 com a sociedade “Lus”, a qual serviria para ultimar os termos negociais pois esta reunião seria – como foi – precedida de uma reunião dos responsáveis da “Lus” com os técnicos da Câmara Municipal de ... para fazer um ponto de situação sobre o estado do Pedido de Informação Prévia (PIP);
11. Em 17 de Outubro de 2018, pelas 10h00 ocorreu reunião entre a A., representada pelo Dr. ... Silva, o Sr. Manuel ... ..., José ..., e a R., representada pelo Dr. ... Antunes.
12. O interlocutor Manuel ... ... tinha conhecimento das potencialidades de edificação do imóvel (lote 53), tendo em conta o Pedido de Informação Prévia pendente pois acompanhara já a A. em reuniões junto da Câmara Municipal de ... e atestou todas essa informação à R., na pessoa do Dr. ... Antunes;
13. Nessa reunião o representante legal da A. fez a apresentação do terreno e das suas potencialidades, transmitindo e facultando à R. toda a informação e documentação relativa ao imóvel, designadamente: - as imagens de localização e do levantamento fotográfico; (doc.n.º 7) - as plantas de localização do Plano Director Municipal (PDM); Cfr. doc. nº8 - o alvará de loteamento n.º 75/72; Cfr. doc. nº9 - a Informação n.º 139/7/DAU/FF/96.07.01; Cfr. doc. n.º 10 - o processo 10128/OP, aprovado em 18/09/2009; Cfr. doc. n.º 11 e 12 - a informação técnica da Câmara Municipal de ..., de 18 de Junho de 2009, dirigida à sociedade então proprietária “Val”; Cfr. n.º 13 - o estudo volumétrico e a memória descritiva efectuada pelo Arq. Luísa ..., o qual apontava para a possibilidade de edificação de 8.341,00 m2 acima do arruamento da Rua Prof. Dr. ...; Cfr. n.º 14; - o Pedido de Informação Prévia (PIP) apresentado pela “Lus” e que deu origem ao Proc. n.º 417/2018/IP Rua Prof. Dr. ...; Cfr. n.º 15.
14. A R. manifestou então o seu interesse na aquisição do imóvel mediante a cessão da posição contratual da A.
15. A R. questionou se a A. tinha em seu poder algum documento emitido pela Câmara Municipal de ... que garantisse a possibilidade de alteração de uso do imóvel a edificar, de clínica para residências de estudantes, tendo o representante legal da A. dito que não dispunha de nenhum documento esc... que o previsse mas que tal alteração resultava da lei;
16. E informou ainda que tal lhe tinha sido já assegurado pelo Sr. Vereador, o Dr. Paulo ... ... e pelo Director do Urbanismo, o Arq. António ... pelo que a possibilidade de edificação pretendida estava já assegurada e a alteração de uso também seria admitida;
17. A A. comunicou à R. que pretendia o valor de 2.500.000,00€ (dos quais 750.000,00€ seriam para entregar à sociedade “Val” enquanto proprietária do imóvel, tendo a R. contraposto o valor de 1.600.000,00€, proposta que teria de ser aceite até às 14h00 do dia 18 de Outubro de 2018;
18. A A. e a R. ajustaram que, pelo preço de 1.200.000,00€ (um milhão e duzentos mil euros), a R. assumia a posição de promitente compradora do imóvel pertencente à “Val”; cfr. doc. n.º 15.
19. Pode ler-se no contrato de cessão de posição contratual na sua cláusula quinta o seguinte: “(…) A Primeira Outorgante paga pela cessão da posição contratual referida na Cláusula anterior o preço de 1 200 000 euros (um milhão e duzentos mil euros), da seguinte forma: 1) 750 mil euros no acto da escritura pública de compra e venda a realizar no dia 19 de Outubro às 10 horas, valor que será pago à empresa Val Lda, actual dona do terreno; 2) 250 mil euros no acto da escritura referida no número anterior à ordem da ... 2 Lda. 3) Os restantes 200 mil euros serão pagos a ... Lda até ao dia 26 de Outubro de 2018. (…)”.
20. Do contrato de cessão da posição contratual celebrado, na sua cláusula sexta, resulta:
“(…) Caso a Primeira Outorgante em colaboração com a Segunda Outorgante, consiga aprovar na Câmara de ... um Pedido de Informação prévia (PIP) até ao dia 30 de Junho de 2019, garantindo a mudança do uso do terreno objecto deste contrato para residência de estudantes, com uma área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 metros quadrados, a Primeira Outorgante terá de pagar mais 400 mil euros à Segunda Outorgante; (…)” Cfr. doc.16.
21. A verificar-se a condição acima referida, estabelecia a cláusula sétima do contrato de cessão, que: “(…) Caso se verifique a situação referida na Cláusula anterior, o pagamento ali previsto terá de ser efectuado até 15 dias após a notificação da Câmara Municipal de ... da aprovação do referido PIP. (…)”.
22. A R. colocou na redacção do contrato, que foi assinado pela A., que tais possibilidades resultassem da aprovação de um Pedido de Informação Prévia pela edilidade de ....
23. A R. e a sociedade “Val” celebraram a escritura de compra e venda do imóvel acima desc... e tal aquisição foi efectuada, no dia 19 de Outubro de 2018; Cfr. docs. nº18 e 19.
24. Logo após a aquisição do imóvel feita pela R., esta e a A., em concertação de esforços como ajustado, trataram de encetar as diligências necessárias com vista a alcançar a verificação da condição negocial pois da mesma resultaria valorização do prédio para a R. e a A. poderia receber o pagamento devido;
25. Tais diligências tinham em conta, todo o histórico documentado junto da Câmara Municipal de ... e do qual foi dado prévio e pleno conhecimento pela A. à R.;
26. No momento em que a A. celebrou o contrato promessa de compra e venda com a “Val”, o lote de terreno para construção estava autorizado para uso de clínica e tinha sido apresentado o pedido de licenciamento n.º 10128/OP para fim compatível de equipamento social (casa de saúde e casa de saúde com residências assistidas) (cfr. docs. n.ºs 11 e 12).
27. Em 4 de Junho de 2009, no imóvel (terreno para construção) era possível a construção de edifício com seis pisos acima da cota de soleira e quatro em cave para estacionamento com a volumetria de 7.860,33 m2; Cfr. doc. n.º 9.
28. Em 26 Outubro de 2018, a Câmara Municipal de ... informou, a propósito do Pedido de Informação Prévia (PIP) apresentado pela “Lus”, que “o uso definido para o lote 53 (clínica) não é compatível com o uso proposto”; Cfr. doc. n.º 20.
29. A edilidade informou ainda que “a viabilidade da presente operação urbanística ficará sempre condicionada à alteração do alvará de licenciamento do loteamento n.º 75/72 quanto ao uso definido para o Lote 53, devendo essa avaliação ser aferida no âmbito do respectivo procedimento administrativo.”; Cfr. doc. nº 20.
30. Ou seja: a Câmara Municipal de ... informou que para a alteração de uso era necessário proceder ao pedido de alteração da licença do loteamento n.º 75/72; cfr. doc n.º 20
31. O município de ... referiu ainda que em relação à volumetria de construção “a volumetria aceitável para a presente operação urbanística não deverá ultrapassar 7 pisos acima da cota de soleira” (cfr. doc. n.º 20) sendo que, de forma cumulativa…;
32. “deverá ser garantido o cumprimento do art. 59.º do RGEU, quanto à definição do n.º de pisos e altura da fachada e edificação através do cumprimento da regra dos 45.º prevista nesta norma”; cfr. doc. n.º 20.
33. As partes ficaram cientes de tais informações;
34. A A. e a R., recorreram aos serviços do gabinete de arquitectos “... Criativo” a fim de iniciar o procedimento de alteração do alvará de licença de loteamento, conforme consta da troca de emails entre A. e R.; Cfr. docs. nº 21 a 31.
35. Para tal, A. e R. ficaram cientes que a alteração de uso pretendida e para salvaguardar a hipótese de edificação de empreendimento hoteleiro ou de residências para estudantes coadunava-se melhor com o pedido de alteração para uso de actividades económicas; Cfr. doc. n.º 32.
36. Advertiu ainda o Arq. Sérgio ..., por parte da edilidade, que deveria ser mencionado o número máximo de pisos (7) e que quanto à área de construção deveria ser mencionado que “a edificabilidade para o lote 53 será determinada pelo n.º máximo de pisos e pela aplicação dos artigos 59.º e 60.º do RGEU, quanto à relação volumétrica do edifício com os edifícios dos lotes 10 ,16, 17 e 18.”; cfr. doc. n.º 32.
37. Terminou ainda sugerindo que fosse apresentado o respectivo estudo volumétrico e de implantação, “com base no estudo realizado pelos Serviços Técnicos no âmbito do processo n.º 417/2018/IP”(cfr. doc. n.º 32), ou seja…
38. …tendo por base a prévia avaliação da viabilidade de construção de sete pisos acima da cota de soleira e que garantia a volumetria de construção contratualmente estabelecida como condição (cfr. doc. n.º 20).
39. A R. ficou então ciente e esclarecida que a alteração de uso pretendida teria que ser feita mediante a alteração à licença de loteamento já existente.
40. Assim, em 25 de Fevereiro de 2019, a R., em concertação de esforços com a A., deu entrada na Câmara Municipal de ... do pedido de alteração à licença de loteamento n.º 75/72 para efeitos de alteração de uso de “clínica” para “actividades económicas”; Cfr. doc. nº33.
41. Na apreciação liminar de tal pedido, foi considerado que havia sido apresentado um PIP -Proc. n.º 47/2018/IP-sobre a viabilidade de construção de uma edificação para construção de um edificação para empreendimento turístico-hotel 3 *, conforme documento junto a fls.112 e ss. (fls113);
42. Em adenda à memória descritiva apresentada, a R., em concertação de esforços com a A., no dia 15 de Abril de 2019 efectuou a rectificação quanto ao número de pisos a edificar; Cfr. doc. n.º 35.
43. O pedido apresentado ficou instruído, aguardando apenas a decisão camarária quanto à pretendida alteração de uso e fixação da limitação altimétrica de construção de 7 pisos acima de cota de soleira.
44. No dia 30 de Maio de 2019, foi afixado o edital camarário onde foi dado conhecimento público da aprovação de alteração do alvará de licença de loteamento n.º 75/72 (Proc. n.º 19687/L) no que respeita à alteração de uso de clínica para actividades económicas e a clarificação quanto à limitação altimétrica do edifício relativamente às construções envolventes com a introdução do número máximo de sete piso; Cfr. edital-doc. n.º 36;
45. A A. deu conhecimento à R. da verificação da condição contratual ajustada em face da alteração de uso que permite a edificação de residências para estudantes e a possibilidade de volumetria de edificação superior a 7.500 m2 acima do arruamento da Rua ....
46. A A. interpelou formalmente a R. quanto à verificação da condição contratual prevista e consequente pagamento ajustado; Cfr. carta registada com aviso de recepção junta como doc. n.º 37 47. A A. enviou igualmente idêntica interpelação à R., através de email remetido ao sócio-gerente, Dr. ... Antunes; Cfr. doc. nº 38.
48. A R. respondeu à A. alegando não ter qualquer notificação formal por parte da Câmara Municipal de ... relativa à aprovação do Pedido de Informação Prévia (PIP) que garantisse a mudança de uso do imóvel e a possibilidade de edificação mínima de 7.500 m2 acima do arruamento da Rua ...; Cfr. doc.n.º 39.
49. O procedimento para alteração de uso não era o Pedido de Informação Prévia (PIP) mas sim – como sucedeu – o pedido de alteração do alvará de licença de loteamento;
50. O aditamento ao alvará de loteamento alterando a especificação do uso de “clinica” para “actividades económicas” data de 3 de Fevereiro de 2020. Cfr. fls.136.
A. 2. Não provados os seguintes factos:
1. A R. sabia que o Pedido de Informação Prévia ainda vigente, Proc. n.º 47/2018/IP, permitia a edificação acima do arruamento da Rua ... superior a 7.500 m2.
2. A condição estabelecida, determinava aprovação de um Pedido de Informação Prévia;
3. Na sequência da comunicação de 26 de outubro de 2018 da Câmara Municipal de ..., a R. tomou conhecimento que a viabilização da operação urbanística pretendida implicaria “alteração do alvará de licença do loteamento 75/72, quanto ao uso para o lote 53”;
4. Em 30 de Maio de 2019, foi aprovada a alteração do uso do imóvel.
B) O DIREITO APLICÁVEL.
O conhecimento deste Tribunal de 2.ª instância, quanto à matéria dos autos e quanto ao objecto do recurso, é delimitado pelas conclusões das alegações das recorrentes como, aliás, dispõem os art.ºs 635.º, n.º 2 e 639.º 1 e 2 do C. P. Civil, sem prejuízo do disposto no art.º 608.º, n.º 2 do C. P. Civil (questões cujo conhecimento fique prejudicado pela solução dada a outras e questões de conhecimento oficioso).
Atentas as conclusões das apelações, supradescritas, as questões submetidas ao conhecimento deste Tribunal pelas apelantes consistem em saber se:
B. 1. A apelação da A.
1) O número 1 dos factos não provados da decisão em matéria de facto deve ser declarado provado (conclusões 1 a 5 e 6 a 15).
2) O número 2 dos factos não provados da decisão em matéria de facto deve ser declarado provado (conclusões 1 a 5 e 16 a 19).
3) O número 3 dos factos não provados da decisão em matéria de facto deve ser declarado provado (conclusões 1 a 5 e 6 a 15).
4) O pedido principal da A deve preceder por se ter concretizado a condição contratual de que dependia (conclusões 21 a 47).
5) O tribunal a quo devia atender à modificação contratual gerada, na modalidade de erro sobre as circunstâncias que constituem a base do negócio (art. 252, n.º 2 do CC) e que tal acarreta uma modificação do contrato por alteração das circunstâncias com recurso à equidade (conclusões 48 a 58).
6) O acordo das partes no que respeita ao Pedido de Informação Prévia (PIP) se configura como erro sobre a base do negócio, previsto no n.º 2, do art.º 252.º, do C. Civil, a que deve aplicar-se o disposto no art.º 427.º, n.º 1, do C. Civil, devendo o litígio ser decidido com chamamento à equidade (conclusões 59 a 68).
7) As partes contrataram uma condição impossível devendo ser reconhecida a nulidade do contrato de cessão de posição contratual e consequente destruição retroactiva dos seus efeitos, nos termos do disposto nos art.ºs 280.º e 289.º, n.º 1, do C. Civil (conclusões 69 a 74).
8) A apelada deve ser condenada a entregar à apelante a quantia de 400.000,00€, acrescida dos juros legais comerciais peticionados, a título de enriquecimento sem causa, nos termos dos art.ºs 473.º e 479.º, do C. Civil (conclusões 77 a 81).
B. 2. A ampliação do recurso.
1) O n.º 2 dos factos não provados da decisão em matéria de facto deve ser declarado provado (conclusões M a U e XXX a DDDD).
2) Os números 22 e 39, 44, 45, 48 e 27 dos factos provados devem ser declarados não provados (conclusões JJJ a MMM, NNN a QQQ, RRR a SSS, TTT a WWW e TTT a WWW).
B. 3. CONHECENDO
O conhecimento das questões da apelação e ampliação será feito sequencialmente, pela ordem processual comum, primeiramente as questões relativas à decisão em matéria de facto, seguidas das questões de direito.
Vejamos, pois.
1) Quanto à primeira questão, a saber, se o número 1 dos factos não provados da decisão em matéria de facto deve ser declarado provado.
Sob o n.º 1 dos factos não provados o tribunal de primeira instância declarou não provado que “1. A R. sabia que o Pedido de Informação Prévia ainda vigente, Proc. n.º 47/2018/IP, permitia a edificação acima do arruamento da Rua ... superior a 7.500 m2”.
Na motivação da sua decisão aduz a sentença que não foi feita prova bastante.
Pretende a apelante que este facto resulta provado pelo depoimento das testemunhas José ... e Manuel ..., pelo depoimento de parte de ... Silva e pelo documento n.º 5, junto com a petição.
Analisados os depoimentos, declarações e documento em causa, tendo presente a motivação da decisão recorrida, constatamos que a testemunha José ... foi ouvida a essa matéria tendo, além do mais, declarado “…passei os olhos por um processo que tinha o timbre da Câmara, em que dizia que já estava de alguma forma aprovada a construção para 7.800. Portanto, essa questão …para mim era um dado adquirido”.
Por sua vez, a testemunha Manuel ..., depois de ter referido “tinha um dossier completo…ele viu-o…mas o essencial foi-lhe dito ali…e eu percebi que o Dr. ... Antunes era uma pessoa que se apercebe facilmente e que está habituado a todo este conjunto de trâmites das Câmaras e leu rapidamente a documentação…”, reportando-se à quantia e € 400 000,00, refere também que “Era a garantia de que a área de construção tinha de ter pelo menos 7.500 m2”.
O declarante ... Silva, depois de referir que “Eu apresentei toda a documentação, porque eu tinha andando a tratar de todos os aspetos burocráticos e … e todas as viabilidades de construção, seja com o vereador, seja com o diretor do urbanismo, seja com os técnicos da Câmara. E, portanto, sabia tudo acerca da Câmara e fiz uma apresentação como deve ser, porque eu tinha aquilo na ponta da língua…”, acrescenta que “…Eu passei a informação … que a Câmara estava a elaborar um estudo volumétrico, estava a responder a um PIP para um hotel … e que, propriamente, ele já sabia, a Lus, que iria admitido com os sete pisos…”, e concluiu “…foi isso que eu pedi sempre ao vereador e ao diretor do urbanismo, veio, ele veio-me dizer que mais de sete pisos que não era possível. Portanto, que a Câmara tinha parado nos sete pisos”.
Por sua vez, o documento n.º 5 junto com a petição, relativo ao Proc. n.º 417/2018/IP, reporta em 4.5.5 que “Em face da avaliação das volumetrias dominantes e da respectiva moda, a volumetria aceitável para a presente operação urbanística não deverá ultrapassar 7 pisos acima da quota de soleira”, e em 5.3 que “A presente informação prévia poderá ser revista, podendo viabilizar-se a presente operação urbanística desde que seja alterado o alvará de licenciamento do loteamento n.º 75/72 quanto ao uso permitido para o Lote 53, nos termos do disposto no ponto 4.5.1, e o projeto garanta o cumprimento dos pontos 4.5.5, 4.5.8., 4.6 e 4.7.1, deste parecer técnico”.
As citadas declarações, depoimentos e documento, não permitem declarar provado o facto sob o n.º 2 dos factos não provados em toda a sua dimensão e complexidade, mas também não permitem corroborar o julgamento a 1ª instância e sua motivação, de que não foi feita prova bastante, desde logo porque esse julgamento entra em contradição ou, pelo menos, em dislexia com os factos provados sob os números 7,11, 12, 13, 15, 16, 29, 31, 32, 38 e 41 a 44 da sentença.
Não foi feita prova de que o Pedido de Informação Préviaem causa estivesse “vigente” porque foi atendido e consequentemente não foi feita prova de que o mesmo permitia edificação acima do arruamento da Rua ... superior a 7.500 m2, mas foi feita prova de que o Município se tinha proposto aceitar a construção de sete pisos acima da cota de soleira, que isso se traduzia em edificação acima do arruamento da Rua ... superior a 7.500 m2 e que a R ficou a saber isso na reunião de 17 de outubro de 2018, a que se reportam os factos provados sob os n.ºs 11 e 12.
Ou seja, em relação ao facto não provado sob o n.º 1, articulado em 15 a 18 e 92 da petição, impugnados na contestação, os factos tidos como assentes sob os números 7,11, 12, 13, 15, 16, 29, 31, 32, 38 e 41 a 44 da sentença e as declarações, depoimentos, documento n.º 5 e restantes documentos reportados nos indicados números da matéria de facto, determinam que resulta provado apenas que:
“1. A R. sabia que a Câmara Municipal permitia a edificação acima do arruamento da Rua ... superior a 7.500 m2”,
Procede, pois, nesta exacta medida esta primeira questão, devendo a decisão recorrida ser alterada em conformidade, mantendo-se o facto não provado n.º 1 na parte em que se não prova, a saber, “1. O Pedido de Informação Prévia ainda vigente, Proc. n.º 47/2018/IP, permitia a edificação acima do arruamento da Rua ... superior a 7.500 m2”, devendo aditar-se aos factos provados um facto com o seguinte conteúdo:
“51. A R. sabia que a Câmara Municipal permitia a edificação acima do arruamento da Rua ... superior a 7.500 m2”.
2) Quanto à segunda questão, a saber, se o n.º 2 dos factos não provados da decisão em matéria de facto deve ser declarado provado.
O facto não provado sob o n.º 2 da sentença tem o seguinte conteúdo:
“2. A condição estabelecida, determinava aprovação de um Pedido de Informação Prévia”.
Insólita e inusitadamente, não só a apelante e a apelada estão de acordo em que a decisão recorrida deve ser alterada e este “facto” ser declarado provado, como a apelada eleva essa sua pretensão à ampliação da apelação, em uso do disposto no n.º 2, do art.º 636.º, do C. P. Civil.
Este encontro de vontades é irrelevante neste momento processual, quer para a prova do “facto” por acordo, quer para a alteração da decisão recorrida na parte que lhe respeita.
Com efeito, no que respeita à fixação de factos pertinentes para decisão da causa por acordo das partes litigantes, para além da sua prova por ausência de impugnação, prevista no n.º 1, do art.º 567.º e no n.º 2, do art.º 574.º do C. P. Civil, a mesma pode ser feita na audiência prévia estabelecida pelos art.ºs 591.º e 596.º, do C. P. Civil, em ordem a ser considerada aquando da prolação da sentença, nos termos do disposto nos n.ºs 4 e 5, do art.º 607.º, do C. P. Civil.
E no que respeita à alteração da decisão recorrida em matéria de facto, a mesma só pode ser feita nos termos do disposto nos art.ºs 640.º e 662.º, do C. P. Civil.
Não obstante essa impossibilidade de natureza processual legal, importa, ainda assim, analisar a questão, em ordem a acautelar qualquer réstia de relevância do “facto” não provado sob o n.º 2 para decisão da causa.
A matéria da cláusula a que se reporta este facto, que é a cláusula sexta do contrato entre as partes, foi levada ao facto provado sob o n.º 20, com o seguinte conteúdo:
“20. Do contrato de cessão da posição contratual celebrado, na sua cláusula sexta, resulta: “(…) Caso a Primeira Outorgante em colaboração com a Segunda Outorgante, consiga aprovar na Câmara de ... um Pedido de Informação prévia (PIP) até ao dia 30 de Junho de 2019, garantindo a mudança do uso do terreno objecto deste contrato para residência de estudantes, com uma área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 metros quadrados, a Primeira Outorgante terá de pagar mais 400 mil euros à Segunda Outorgante; (…)” Cfr. doc.16”.
Ora, não só o conteúdo da cláusula contratual se encontra completo e explícito sob este n.º 20, como o próprio ainda remete para o documento em que a mesma cláusula se encontra exarada.
O “facto” não provado sob o n.º 1 é, pois, inútil para decisão da causa.
Para além de incompleto e inútil, esse “facto” não provado é também impreciso e conclusivo quando refere que a cláusula determinava aprovação.
E por último, ainda, mas essencialmente, esse “facto” encerra uma questão de direito, qual seja, a de saber se a cláusula sexta “determinava aprovação de um Pedido de Informação Prévia”, a qual deverá ser abordada e decidida na altura própria, aquando do conhecimento das questões de direito que, como será óbvio, não podem ser decididas como se de factos se tratasse.
Por todo o exposto, na pureza dos princípios, o “facto” sob o n.º 1 os factos não provados não deveria ter sido considerado como matéria de facto, nem provada nem não provada.
Não obstante, uma vez que a sua (im)pertinência para decisão da causa se mantém a mesma, quer se considere não provado ou inexistente, mantemos inalterada a decisão recorrida, indeferindo as pretensões em contrário, quer da apelação, quer da ampliação.
3) Quanto à terceira questão, a saber, se o n.º 3 dos factos não provados da decisão em matéria de facto deve ser declarado provado.
O facto não provado sob o n.º 3 da sentença tem o seguinte conteúdo:
“3. Na sequência da comunicação de 26 de outubro de 2018 da Câmara Municipal de ..., a R. tomou conhecimento que a viabilização da operação urbanística pretendida implicaria “alteração do alvará de licença do loteamento 75/72, quanto ao uso para o lote 53”;
Pretende a apelante que “Foi produzida prova bastante em sentido contrário ao decidido, razão pela qual vão expressamente impugnados os factos supra vertidos para todos os devidos e legais efeitos”, como exarado na conclusão 5 da sua apelação.
Acontece, todavia, que a impugnação para efeitos de alteração da decisão da 1ª instância em matéria de facto, se não basta com a negação pura e simples e a afirmação de que foi produzia prova bastante, antes exigindo a demonstração do desacerto da decisão recorrida e do acerto da decisão que se pretende se lhe substitua, como dispõem as als, b) e c), do n.º 1, o art.º 641.º, do C. P. Civil e o n.º 1, do art.º 662.º, do mesmo código.
Atento este quadro legal, apesar de a apelante ter impugnado a decisão relativa ao facto não provado n.º 3, em conjunto com a impugnação da decisão relativa ao facto provado n.º 1, já apreciada, a mesma não demonstra quanto a este facto n.º 3, nem o desacerto da decisão recorrida nem o melhor acerto da decisão que pretende seja proferida.
Com efeito, o conhecimento da R/apelada relativamente ao procedimento urbanístico adequado decorre já dos factos provados sob os números 34 a 39 da matéria de facto da sentença.
O que o facto não provado n.º 3 acrescenta de novo é que tal conhecimento lhe advenha “Na sequência da comunicação de 26 de outubro de 2018 da Câmara Municipal de ...”.
Sobre esta origem do conhecimento não demonstra a apelante que o mesmo tenha sido provado por prova pessoal ou documental, pelo que a sua pretensão não pode proceder.
Improcede, pois, esta terceira questão.
4) Quanto à quarta questão, relativa à ampliação do recurso, a saber, se os números 22 e 39, 44, 45, 48 e 27 dos factos provados da sentença devem ser declarados não provados.
Em relação à ampliação do objeto da apelação, por pertinente e imprescindível, não podemos deixar de reproduzir aqui o que em traços largos foi expendido no âmbito da questão segunda da apelação relativamente ao paradigma legal da impugnação da decisão em matéria de facto.
É que, apesar de discorrer longamente sobre a sua discordância relativamente aos factos que indica, a apelada não cumpre o ónus que sobre ela impende de demonstrar que tais fatos não resultaram provados, começando por reportar-se, como devia, à motivação da decisão recorrida, que mais não fosse na síntese em que refere que “…a prova dos pontos 1 a 5, 7, 18 a 23, 26 a 32, 34 a 38, 40 a 42, 44, 46, 47, 48, resultam da prova documental referenciada em cada um, conjugada com o depoimento das testemunhas ouvidas”.
Para além desta síntese lapidar, a motivação da decisão recorrida reporta o depoimento de cada uma das testemunhas em termos muito concretos, que a apelante ignora de todo na sua apelação, como a título de mero exemplo acontece com o facto sob o n.º 39, facto pessoal da apelada, e sobre o qual o Director do Departamento do Urbanismo da Câmara Municipal de ..., declarou “…ter intervindo no processo de alteração do uso constante do alvará de loteamento de “clínica” para actividades económicas. Referiu que este pedido de alteração foi apresentado pela Ré e veio a dar origem ao aditamento ao alvará de loteamento que se mostra junto a fls.136” e que a apelada silencia, apesar de se reportar longamente ao depoimento da testemunha.
Nestas condições, não tenho a apelada cumprido o ónus que sobre ela decorre das als, b) e c), do n.º 1, do art.º 641.º, e do n.º 1, do art.º 662.º, ambos do C. P. Civil, não pode deixar de improceder a sua pretensão de alteração da decisão em matéria de facto.
5) Quanto à quinta questão, a saber, se o pedido principal da A deve preceder por se ter concretizado a condição contratual de que dependia.
Esta questão tem na sua base a cláusula sexta do contrato celebrado entre a apelante e a apelada, cujo cumprimento ocorreu pacificamente, exceto no que respeita a esta mesma cláusula.
Como consta sob o número 20 dos factos provados da sentença, a cláusula sexta tem o seguinte conteúdo. “(…) Caso a Primeira Outorgante em colaboração com a Segunda Outorgante, consiga aprovar na Câmara de ... um Pedido de Informação prévia (PIP) até ao dia 30 de Junho de 2019, garantindo a mudança do uso do terreno objecto deste contrato para residência de estudantes, com uma área de construção acima do arruamento da Rua ... mínima de 7500 metros quadrados, a Primeira Outorgante terá de pagar mais 400 mil euros à Segunda Outorgante; (…)”.
A primeira questão interpretativa que a cláusula suscita, longamente presente nos articulados e no julgamento da 1ª instância, mas até agora incorretamente abordada, porque analisada em perspectivas laterais, desviantes, tem a ver com o acordado Pedido de Informação Prévia.
Sobre o pedido de informação Prévia a que as partes contratantes se reportam duas asserções são pacíficas nos autos.
A primeira é que o Pedido de Informação Prévia, é um instrumento processual do urbanismo, previsto
no art.º 14.º do Regime Jurídico da ... e Edificação (RJUE) aprovado pelo Dec. Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, e nos termos do n.º 1 desse preceito legal tem o seguinte espectro de utilização:
“1 - Qualquer interessado pode pedir à câmara municipal, a título prévio, informação sobre a viabilidade de realizar determinada operação urbanística ou conjunto de operações urbanísticas diretamente relacionadas, bem como sobre os respetivos condicionamentos legais ou regulamentares, nomeadamente relativos a infraestruturas, servidões administrativas e restrições de utilidade pública, índices urbanísticos, cérceas, afastamentos e demais condicionantes aplicáveis à pretensão”.
A segunda é que, para atingir o fim em vista pelas partes contratantes, qual seja, a mudança do uso do prédio urbano e a área de construção, o instrumento processual a utilizar perante o órgão competente não era esse, mas sim um Pedido de Alteração à Licença e Alvará de Loteamento, como decorre dos factos sob os números 39 e 40 da sentença e do disposto nos art.ºs 27.º e 74.º do RJUE.
A estas duas asserções podemos, desde já, acrescentar uma outra, que delas decorre e que é pacífica entre as partes nestes autos, fazendo aliás parte dos conhecimentos de qualquer cidadão médio bem informado, e esta é que as partes não podem definir o instrumento processual de urbanismo a que recorrem para prosseguirem as suas pretensões.
A primeira entropia na interpretação e aplicação desta cláusula sexta consiste, pois, em saber, o que é que as partes quiseram na realidade acordar e em termos técnico jurídicos, qual foi o sentido das respectivas declarações negociais, como imposto pelo n.º 1, do art.º 236.º, do Código Civil, o qual, inserido na Subsecção do Código Civil relativa a Interpretação e integração, sob a epígrafe “Sentido normal da declaração” dispõe que:
“1. A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele”.
Em face da cláusula sexta em que as partes contratantes exararam o seu desiderato e indicaram, aliás erradamente, o instrumento processual para o atingir, um declaratário normal colocado na posição de qualquer dos contraentes tomaria necessariamente o entendimento de que as partes quiseram atingir o fim em vista com o instrumento processual legal relativa ao urbanismo adequado, fosse ele o episodicamente referido Pedido de Informação Prévia (PIP) ou qualquer outro.
A controvérsia relativa ao PIP fica, pois, aqui e nestes termos, ou seja, na cláusula sexta do contrato as partes contratantes propuseram-se atingir a mudança do uso do prédio urbano e a área de construção a que se reportam, com o recurso ao instrumento processual legal de urbanismo que para esses fins se impunha.
Se alguma réstia de dúvida interpretativa houvesse, cuja razoabilidade não vislumbramos, a mesma resulta esclarecida pelo próprio comportamento das partes em execução do contrato, como decorre dos números 29 a 44 da matéria de facto da sentença.
Não obstante a clareza da interpretação em causa, importa ainda referir que no âmbito do quadro legal aplicável, onde pontifica o citado art.º 236.º, do C. Civil, o facto sob o n.º 22, segundo o qual, “A R. colocou na redacção do contrato, que foi assinado pela A., que tais possibilidades resultassem da aprovação de um Pedido de Informação Prévia pela edilidade de ...”, se configura como lateral e inócuo, atento também o disposto no n.º 1, do art.º 217.º, do C. Civil, não se vislumbrando qualquer fundamento para chamar aqui à colação a figura jurídica da reserva mental a que se reporta o art.º 244.º, do C. Civil.
Assim definido o sentido e conteúdo das declarações dos contratantes, importa agora aquilatar do seu cumprimento.
Como decorre dos números 24 a 44 da matéria de facto da sentença, o desiderato das partes relativo à alteração de uso do prédio urbano e à área de construção que nele podia ser feita foi atingido em pleno, com o recurso ao meio processual legal de urbanismo adequado, que era e foi a Alteração à Licença e Alvará de Loteamento.
Impõe-se agora averiguar se a cláusula foi cumprida na sua totalidade.
Com efeito, as partes acordaram em que o citado desiderato relativo à alteração de uso e área de construção fosse atingido até ao dia 30 de Junho de 2019.
Não sendo controversa a data acordada e colocado o PIP no seu lugar legal acima referido, importa, todavia, precisar o desiderato em causa, ao qual se reportam as expressões “consiga aprovar” e “garantindo”.
Atentas tais expressões e também o disposto no n.º 1, do art.º 17.º do RJUE, o que as partes tiveram em vista não foi a própria aprovação da alteração de uso e da área de construção, mas apenas que essa aprovação ficasse assegurada/garantida.
Ora, essa garantia de aprovação foi dada com o edital da entidade competente a que se reporta o facto sob o n.º 44 da sentença, não na perspectiva em que a edilidade se tenha vinculado a uma aprovação futura, porque não é esse o efeito do processo de Alteração à Licença e Alvará de Loteamento, mas na perspectiva em que a publicação do edital pressupõe a conformidade técnica da alteração a que o mesmo se reporta.
E é, aliás, neste sentido que se deve interpretar o facto sob o n.º 44 quando o mesmo se reporta a “aprovação” de alteração do Alvará.
A aprovação técnica vincula a deliberação subsequente, a qual só poderá divergir com fundamentação técnica melhor, a qual se não vislumbra porque nem alegada foi.
Podemos, pois, concluir que, em 30 de maio de 2019, tanto a aprovação da alteração de uso, como a área de construção estão já “garantidas”, tal como contratualmente estipulado pelas partes.
Como decorre do facto provado sob o n.º 50 da sentença e do documento de fls. 136, que reproduz, intitulado “4º Aditamento ao Alvará de Licença de Loteamento N.º 75/1972”, o aditamento/alteração ao Alvará de loteamento, operando já as alterações prosseguidas pelas partes contratantes, foi decidido por deliberação tomada na 18ª Reunião Ordinária (pública nos termos do disposto no art.º 49.º Regime Jurídico as Autarquias Locais, aprovado pela Lei n.º 75/2013, de 12 de Setembro) de 18/09/2019 e só foi publicado em 3 de Fevereiro de 2020.
Nos termos desse 4º Aditamento, as alterações que as partes se propuseram apenas “garantir” foram “aprovadas” por deliberação camarária de 18/9/2019.
Sendo insofismável que nesta data de 18/9/2019 as alterações a que se reporta a cláusula sexta estão, não apenas “garantidas”, como até aprovadas, pode suscitar-se a dúvida sobre se em 30 de maio essas alterações já estavam “garantidas”, tanto mais que, apesar de se tratar de matéria técnica da área do urbanismo e de os edis incorrerem em perda de mandato caso contrariem sem fundamento a respectiva proposta técnica, em teoria, poderão fazê-lo.
E neste âmbito, a sentença recorrida, não destrinçando entre “garantir” a aprovação e a “aprovação” ela mesma, decidiu com base no entendimento de que a condição a que se reporta a cláusula sexta apenas ocorreu em 3 de fevereiro de 2020.
Como decorre do antes exposto e da exegese dos factos provados sob os números 44 e 50 da sentença, não sancionamos esse entendimento, mas porque a sentença em sindicância decidiu nesse sentido, não podemos deixar de abordar a questão de sabermos se, no caso de a “garantia” de aprovação não se ter consolidado em 30 de maio de 2019, mas apenas em 18 de setembro de 2019, com a aprovação, a condição se deve considerar como não cumprida uma vez que as partes acordaram a data de 30 de junho de 2019.
Sem embargo de se tratar de uma obrigação de prazo certo, a análise desta proposição deve ser feita na perspectiva do interesse do credor porque esta é a única que nos permite valorar a questão da relevância ou irrelevância da data no âmbito da própria cláusula.
Ora, nesta perspectiva, não podemos deixar de considerar que o interesse do credor na prestação se mantém mesmo após 30 de junho e que o mesmo foi satisfeito, por excesso (aprovação mais que garantia) em 18 de setembro, nada tendo sido aduzido em contrário, nomeadamente no que poderia respeitar à essencialidade da data acordada.
Nestas circunstâncias, tendo sido atingido e até ultrapassado o desiderato prosseguido pelas partes, tendo o prédio urbano em causa sido valorizado com a alteração de uso e aumento de área de construção, assim se encontrando plenamente assegurado o interesse do credor e encabeçando a apelada esse acréscimo de valor, conseguido também com a ação da apelante, a invocação de data excedida, só por si, não deixaria de se reconduzir à figura do abuso de direito por não corresponder a um interesse digno de proteção legal, assim excedendo manifestamente os limites impostos pela boa-fé, como dispõe o art.º 334.º, do C. Civil.
Temos, pois, que concluir que também por esta via a condição a que se reporta a cláusula sexta teria ocorrido, embora apenas em 18/09/2019.
Não obstante, como também já referimos, nesta data o que ocorreu foi a própria aprovação, a qual já se encontrava garantida desde 30 de maio, portanto, desde data anterior àquela que foi estipulada pelas partes.
Procede, pois, esta quinta questão e com ela a apelação.
O conhecimento das restantes questões da apelação fica prejudicado pelo decidido relativamente a esta questão
Atenta a procedência das questões primeira e quinta, alterando-se a decisão em matéria de facto, deverá revogar-se a sentença e condenar-se a R/apelada em conformidade.
C) SUMÁRIO
1. O encontro de vontades das partes em alegações e contra-alegações de recurso, é irrelevante, quer para a prova de um facto por acordo, quer para a alteração da sentença na parte que lhe respeita, uma vez que a fixação de factos pertinentes para decisão da causa por acordo das partes litigantes, para além da sua prova por ausência de impugnação, prevista no n.º 1, do art.º 567.º e no n.º 2, do art.º 574.º do C. P. Civil, pode ser feita na audiência prévia estabelecida pelos art.ºs 591.º e 596.º, do C. P. Civil, em ordem a ser considerada aquando da prolação da sentença, nos termos do disposto nos n.ºs 4 e 5, do art.º 607.º, do C. P. Civil, e a alteração da sentença em matéria de facto, só pode ser feita nos termos do disposto nos art.ºs 640.º e 662.º, do C. P. Civil.
2. Uma expressão conclusiva e que encerra uma questão de direito, não constituindo matéria de facto, não deve ser levada, nem aos factos provados, nem aos factos não provados.
3. As partes contratantes não podem definir o instrumento processual legal de urbanismo a que recorrem para prosseguirem as suas pretensões.
4. Se no âmbito de um contrato, as partes acordaram em lançar mão de um Pedido de Informação Prévia para atingir o seu desiderato e posteriormente vieram a verificar que o procedimento que ao caso cabia era um Pedido de Alteração à Licença e Alvará de Loteamento, nos termos do disposto no n.º 1, do art.º 236.º, do C. Civil, deverá interpretar-se ter sido esse o sentido das respectivas declarações negociais.
5. Se o desiderato proposto foi atingido com o Pedido de Alteração à Licença e Alvará de Loteamento deverá considerar-se cumprida a cláusula em que as partes se reportaram ao Pedido de Informação Prévia.
3. DECISÃO.
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação procedente, alterando a decisão em matéria de facto nos termos acima definidos, revogando a sentença e condenando a apelada a entregar apelante a quantia de € 400 000,00, acrescida de juros vencidos e vincendos, como peticionado, até integral pagamento.
Custas pela apelada.
Lisboa, 10-03-2021,
Orlando Santos Nascimento
Maria José Mouro
José Maria Sousa Pinto