INDISPONIBILIDADE DOS CRÉDITOS DA SEGURANÇA SOCIAL
PAGAMENTO NA TOTALIDADE
PAGAMENTO EM PRESTAÇÕES
Sumário

I – No âmbito do PER, o juiz pode oficiosamente, à luz do artigo 215.º do CIRE ex vi do artigo 17.ºF n.º 7, recusar a homologação do acordo, nos casos em que, ainda que aprovado em assembleia de credores, se verifique uma violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo.
II - O plano de revitalização deve respeitar o princípio da igualdade dos credores, com a salvaguarda de este último admitir tratamento diferente para situações, também elas, distintas e desde que assente em critérios objectivos e justificáveis.
III – O princípio da indisponibilidade a que estão sujeitos os créditos da Segurança Social, decorrente do n.º 2 do artigo 30.º da LGT ex vi do artigo 3.º, al. a), do CRCSPSS, impede que sejam os mesmos extintos ou reduzidos fora das situações legalmente previstas para o efeito, impedimento esse que vigora também em sede de PER.
IV – Contudo, tal proibição não abrange as situações nas quais o plano de revitalização assuma o pagamento total da dívida contributiva (capital e juros), pese embora acompanhado da sua regularização em prestações a autorizar no âmbito de execução fiscal, desde que respeitados os limites abstractamente consignados nos artigos 189.º e 190.º do CRCSPSS, bem como no artigo 81.º do Decreto Regulamentar n.º 1-A/2011 de 03/01.
V – Na hipótese mencionada no ponto anterior, tendo o plano sido aprovado com respeito pelas maiorias legalmente exigíveis (sendo que, entre os credores que assim votaram, se inclui a AT), apenas com o voto desfavorável da Segurança Social, prevendo-se quanto ao crédito desta última, a sua regularização através de plano prestacional a autorizar em 122 prestações mensais e sucessivas, no âmbito da execução fiscal (sem extinção ou redução da dívida), não ocorre violação do referido princípio da indisponibilidade, configurando uma violação negligenciável que não obsta à sua homologação e vinculação.
(Pela Relatora)

Texto Integral

Acordam os juízes na Secção do Comércio do Tribunal da Relação de Lisboa.

I - RELATÓRIO
LS…, Lda. veio intentar o presente processo especial de revitalização, ao abrigo do disposto nos artigos 17.º-A e ss. do CIRE.
Procedeu-se à nomeação de administrador judicial provisório (AJP) – artigo 17.º-C, n.º 4 do CIRE -, o qual veio juntar a lista provisória de créditos em 07/06/2021.
A esta última foi apresentada impugnação pela credora Sociedade TDM …, SA – artigo 17.º-D, n.º 3 do CIRE -, a qual foi decidida por despacho proferido em 16/07/2021.
O prazo para conclusão das negociações foi prorrogado por um mês, mediante acordo prévio e escrito entre o AJP e a devedora - art. 17.º-D, n.º 5 do CIRE.
A devedora depositou a versão final do plano nos termos do n.º 1 do artigo 17.º-F do CIRE, depósito esse publicitado no portal Citius em 19/10/2021.
Foi apresentada nova versão do plano pela devedora em 22/10/2021 e, no dia 25 do mesmo mês, foi publicado no portal Citius o respectivo anúncio.
Concluídas as negociações, em 07/11/2021, o AJP juntou o mapa de votação (com anexação dos votos emitidos e da acta de abertura dos mesmos) e requereu a homologação do plano, o qual foi aprovado por credores representativos das maiorias legalmente exigidas, apenas com o voto contra da recorrente (cujo crédito ascende ao montante global de 40.543,95€, correspondente a 16,18% do total dos créditos inscritos) – artigo 17.º-F, n.º 5, al. a), do CIRE.
Nenhum credor veio pedir a não homologação do plano – arts. 17.º, n.º 3, in fine, e 216.º do CIRE.
Por sentença proferida em 16/11/2021 foi homologado o plano especial de revitalização, na mesma se podendo ler:
Nos termos do disposto no artigo 17.º-F, n.º 5, do CIRE, não se tratando de um caso de aprovação unânime de um plano de recuperação «(…)».
No caso concreto, não há créditos subordinados.
O total dos créditos relacionados ascende a € 400.336,04.
O quórum de votação foi de 62,59% correspondente a créditos no montante de € 250.562,55.
Foi emitido um total de votos correspondente a € 250.562,55, sendo que, destes, foram favoráveis os equivalentes a € 210.018,60 (83,82%).
Assim, nos termos do art.º 17º-F, n.º 5, al. a) o plano foi aprovado.
*
Não ocorre violação não negligenciável de normas procedimentais ou aplicáveis ao conteúdo do plano que impeçam a sua homologação, não prevendo este quaisquer condições suspensivas ou quaisquer atos ou medidas que devem preceder a homologação (artigo 215º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa aplicável ex vi artigo 17.º-F n.º 7 in fine do mesmo diploma).
Assim sendo, nada obstando, e tendo em conta o disposto no artigo 17.º-F, n.º 7 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa, deverá o plano de revitalização ser homologado.
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Pelo exposto, homologo por sentença, nos termos do artigo 17.º-F, n.º 5 e 7 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa, o plano de revitalização da LS … LIMITADA, depositado nos autos a 25-10-2021 e com publicação no portal Citius da indicação do respetivo depósito no mesmo dia.
*
A presente decisão vincula todos os credores, mesmo que não hajam participado nas negociações – artigo. 17.º-F, n.º 10, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa. (…)
Resulta do plano aprovado e homologado, o seguinte:
CRÉDITOS PRIVILEGIADOS
I. Créditos ao Estado
1.1 Instituto da Segurança Social:
- a dívida à Segurança Social reconhecida no presente PER será regularizada através de plano prestacional a autorizar em 122 prestações mensais e sucessivas, no âmbito da execução fiscal;
- o pagamento da primeira prestação deverá ocorrer em datas idênticas para os credores Segurança Social e AT;
- taxa de juros de mora aplicáveis às dívidas ao Estado e outras entidades públicas;
- isenção da prestação de garantia, nos termos do n.º 13 do artigo 199.º do CPPT;
- as acções executivas pendentes para cobrança de dívida à Segurança Social não são extintas mantendo-se suspensas após aprovação e homologação do plano de revitalização até integral cumprimento do plano de pagamentos que venha a ser autorizado.
1.2 Autoridade Tributária:
a dívida será enquadrada nos termos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 30.º e n.º 3 do artigo 36.º da LGT e artigos 196.º e 199.º do CPPT, e irá receber os seus créditos, isto é, a quantia exequenda, custas e juros de mora, em regime prestacional, o que, de acordo com o regime legal aplicável aos créditos tributários a regularização dos mesmos deve obedecer, cumulativamente: 
- pagamento em regime prestacional, nos termos do artigo 196.º do CPPT, ou seja:
a) as prestações são mensais, iguais e sucessivas, vencendo-se a primeira até ao final do mês seguinte à data da sentença homologatória do plano,
b) número máximo de prestações: até 122 prestações mensais, não podendo nenhuma delas ser inferior a 10 UCs (1020€),
c) a redução dos créditos fiscais só se dará por juros de mora vencidos e vincendos, nos termos do Dec.-Lei n.º 73/99 de 16/03, aceitando-se as taxas praticadas para os créditos da Segurança Social, face à renúncia dos demais credores e às garantias constituídas;
d) não haver lugar à redução de coimas e custas,
e) não haver lugar a qualquer moratória,
f) manutenção das garantias existentes, nos termos do artigo 199.º n.º 13 do CPPT,
g) para os efeitos previstos no n.º 1 do artigo 17.º-E do CIRE, determina-se, nos termos da sua parte final, que a extinção dos processos fiscais só se dará nos termos do CPPT.
II. Créditos Salariais
- amortização da dívida em 122 prestações mensais, iguais e sucessivas,
- a primeira prestação ocorrerá até ao final do mês seguinte ao términus do prazo previsto no n.º 5 do artigo 17.º-D do CIRE,
- não haver lugar a qualquer moratória,
- pagamento de juros, à taxa estabelecida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, definida anualmente por Portaria.
CRÉDITOS COMUNS
- perdão de juros vencidos e vincendos,
- 12 meses de carência para o início de pagamento do capital em dívida,
- amortização do capital em dívida, em 96 prestações mensais, iguais e sucessivas, vencendo-se a primeira no 13.º mês subsequente ao trânsito em julgado da sentença que homologar o plano
CRÉDITOS SUBORDINADOS
- perdão integral de capital e juros vencidos e vincendos.
(sendo que não existem créditos subordinados).
Mais se consignou em tal proposta:
4.4. Cláusula de regresso de melhor fortuna com alocação de resultados
Caso no período que medeia o início e o términus do presente Plano os resultados líquidos da sociedade forem superiores aos resultados estimados, o excesso será distribuído pelos credores no sentido de se proceder ao pagamento dos valores ainda em dívida.
4.5. Preceitos legais derrogados
A aprovação do Plano de Recuperação implica a derrogação dos seguintes preceitos do CIRE:
- Derrogação do princípio da igualdade – artigo 194º do CIRE, no que se refere aos créditos da Fazenda Nacional e do Instituto de Gestão Financeira e da Segurança Social, IP, atento ao princípio da “indisponibilidade dos créditos tributários imperatividade da não violação das o normas imperativas”, designadamente o n.º 3 do artigo 30º da LGT, que depois de definir, no seu n.º 1, o objeto da relação jurídica tributária dispõe no seu n.º 2 que (…) o crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária (…). Por sua vez o artº 36º, n.º 3 daquela lei que (…) a administração tributária não pode conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias, salvo nos casos expressamente previstos na lei (…).”.
*
Inconformado com tal sentença, veio o Instituto da Segurança Social, IP interpor RECURSO de apelação, tendo formulado as respectivas CONCLUSÕES, que aqui se transcrevem:
- O presente recurso vem interposto da Sentença que homologou o PER de LS …, Lda, aprovado pelos Credores, porquanto a mesma viola o disposto nos art°s 195° e 215.º do CIRE, 190.º e sgts do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro (alterado pela Lei n.º 119/2009, de 30 de dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 140-B/2010, de 30 de dezembro, pela Lei n.º 55-A/2010) e n.ºs 2 e 3 do art.º 30.º da Lei Geral Tributária.
- É à Lei que cabe a regulação da obrigação contributiva e não a uma vontade coletiva de Credores, o que permite a concessão de benefícios, moratórias, perdões fiscais, conseguidos não nos precisos e excecionais termos da Lei, mas em resultado de uma vontade coletiva, o que constitui uma violação ao princípio da igualdade e da legalidade.
- A alteração introduzida pela Lei 55-A/2010, de 31 de Dezembro, que aditou um n.º 3 ao art.º 30.º da Lei Geral Tributária (LGT), aprovada pelo DL 398/98, de 17de Dezembro, nos termos do qual “o disposto no n.º anterior [n. 2 do art.º 30.º da LGT “O crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária.”] prevalece sobre qualquer legislação especial, sendo certa a aplicabilidade da norma, designadamente aos processos especiais de revitalização.
- Qualquer autorização da regularização da dívida à Segurança Social deveria ser feita de acordo com as referidas normas, e implicaria sempre o acordo da Segurança Social.
- À auto-regulação, consagrada no CIRE, impõe-se normas, em vigor no nosso ordenamento jurídico, que fixam limites e exigências formais e materiais que cremos não terem sido respeitados com a homologação do Plano em análise.
- Nestes termos a sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz a quo fez uma incorreta interpretação e aplicação da Lei, violando as disposições legais aplicáveis.
- Pois, o Meritíssimo Juiz a quo, ao homologar o referido plano de revitalização, observaria que o mesmo era ineficaz relativamente aos créditos reconhecidos e verificados ao Instituto da Segurança Social, IP.
- Sobre esta temática vejam-se os Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16 de Novembro de 2010 (Proc. n.º 103/09.6 TYLSB.L1-1 E), de 15 de Dezembro de 2011 (Proc. n.º 1407/09.3 TYLSB-G.L 1) e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de Fevereiro de 2014 (1786/12.5TBTNV.C2.S1), disponíveis em www.dgsi.pt.”.
Conclui pugnando pela revogação da decisão recorrida, seguindo o processo os ulteriores termos legais.
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Pelo Ministério Público foi apresentada RESPOSTA, na qual defendeu a manutenção da sentença recorrida e a improcedência do recurso.
Pela devedora LS …,Lda. foram apresentadas CONTRA-ALEGAÇÕES, formulando as seguintes conclusões:
A. Vem o Credor Instituto da Segurança Social IP, ora Recorrente, alegar que o plano de revitalização não deveria ter sido homologado pelo Tribunal, sem o seu necessário acordo [do Recorrente], uma vez que os demais credores não formam uma vontade suficiente para alterar as condições de pagamento, tudo o quanto é violador de disposições imperativas, concluindo, independentemente da homologação do plano, pela ineficácia do mesmo quanto si, Recorrente.
B. Ora, incumbe à Recorrente no seu recurso indicar as normas jurídicas violadas e o sentido com que, no seu entender, as normas que constituem fundamento da decisão, deveriam ter sido interpretadas e aplicadas.
C. In casu, a Recorrente motiva o recurso com a violação de algumas normas e nas conclusões alega a violação de outras normas, na sua grande maioria não coincidentes.
D. O recurso é delimitado pelas conclusões, pelo que só as normas identificadas nas conclusões como normas violadas poderiam ser atendíveis… não fosse o incumprimento do ónus de alegação. I.É,
E. A Recorrente limita-se a alegar a violação de normas, de forma manifestamente vaga e genérica, não explicando em que medida as normas foram violadas e em que sentido deveriam ter sido interpretadas e aplicadas.
F. Em face do exposto, o recurso não cumpre o ónus do n.º2 do art.º 639.º do Código Processo Civil, pelo que a matéria alegada não deve ser atendida.
Adiante,
G. Em termos muito simplistas, entende a Recorrente que tem um direito de voto especial ou qualificado acima de todos os outros credores, ou então um direito de veto, que lhe permite inviabilizar a recuperação de uma empresa, na medida em que nenhum plano de recuperação, onde esteja prevista a regularização de dívida à Segurança Social, poderia ser aprovado sem o seu acordo.
H. Não é esse o entendimento que extraímos da consagração da indisponibilidade dos créditos tributários, nem poderemos compreender tal entendimento, que seria desde logo, violador da igualdade entre credores.
 I. Compulsado o plano de revitalização apresentado, donde resulta a regularização da dívida perante a S. Social, através de plano prestacional, a autorizar, em sede de execução fiscal, entendemos que a especificidade prevista no plano quanto a estes créditos encontra plena justificação à luz do regime exposto, não sendo violador de qualquer preceito legal ou princípio.
J. Assim, inexistem razões, formais ou substantivas, que justifiquem a não homologação do plano de revitalização ou a sua ineficácia perante a Recorrente, devendo a sentença manter-se nos seus precisos termos.
Conclui no sentido de dever ser recusada a apreciação do recurso, com fundamento no incumprimento do ónus do artigo 639.º do CPC, ou, caso assim se não entenda, dever ser negado provimento ao recurso, confirmando-se in totum a sentença de homologação do PER.
*
O recurso foi admitido pelo tribunal a quo e subiu como de apelação, imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo.
Nesta Relação, por despacho proferido pela relatora em 09/02/2022, foi afastado o invocado incumprimento do ónus a que alude o artigo 639.º do CPC.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II – DO OBJECTO DO RECURSO
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões no mesmo formuladas, salvo no que concerne à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas pertinentes ao caso concreto e quando estejam em causa questões que forem de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido apreciadas com trânsito em julgado - artigos 5.º, n.º 3, 635.º, n.º 4, e 639.º, n.ºs 1 e 2, todos do CPC.
Assim, a questão a decidir traduz-se em saber se a sentença que homologou o plano de revitalização deverá ser revogada por o mesmo violar, quanto ao crédito da Segurança Social, o princípio da igualdade e/ou lei imperativa referente ao regime legal de regularização da obrigação contributiva, bem como por esta credora ter votado desfavoravelmente à sua aprovação (levando à eventual ineficácia do plano quanto à mesma).
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III – FUNDAMENTAÇÃO
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos e ocorrências processuais relevantes para a decisão do presente recurso são os que resultam do relatório supra enunciado, o qual, por brevidade, se dá aqui por reproduzido.
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FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
O procedimento especial de revitalização (PER) tem como destinatários devedores que se encontrem em situação de crise financeira (seja por se encontrarem com sérias dificuldades no cumprimento das respectivas obrigações por falta de liquidez ou crédito, seja por se encontrem numa situação de insolvência iminente), mas ainda susceptíveis de viabilização/recuperação. Visa, pois, facilitar e promover a recuperação efectiva de empresas economicamente viáveis.
Aprovado o plano, diz-nos o artigo 17º-F, nº 7 do CIRE, que “O juiz decide se deve homologar o plano de recuperação, nos 10 dias seguintes à receção da documentação mencionada nos números anteriores, aplicando, com as necessárias adaptações, as regras previstas no título IX, em especial o disposto nos artigos 194.º a 197.º, no n.º 1 do artigo 198.º e nos artigos 200.º a 202.º, 215.º e 216.º”.
Dos artigos mencionados neste preceito, passar-se-á a transcrever os que assumem relevância para o conhecimento do presente recurso.
- Artigo 194.º: “1 - O plano de insolvência obedece ao princípio da igualdade dos credores da insolvência, sem prejuízo das diferenciações justificadas por razões objectivas. 2 - O tratamento mais desfavorável relativamente a outros credores em idêntica situação depende do consentimento do credor afectado, o qual se considera tacitamente prestado no caso de voto favorável. 3 – (…)“. [i]
- Artigo 195.º: “1 - O plano de insolvência deve indicar claramente as alterações dele decorrentes para as posições jurídicas dos credores da insolvência. 2 - O plano de insolvência deve indicar a sua finalidade, descreve as medidas necessárias à sua execução, já realizadas ou ainda a executar, e contém todos os elementos relevantes para efeitos da sua aprovação pelos credores e homologação pelo juiz, nomeadamente: (…) e) A indicação dos preceitos legais derrogados e do âmbito dessa derrogação.”;
- Artigo 196.º: “1 - O plano de insolvência pode, nomeadamente, conter as seguintes providências com incidência no passivo do devedor: a) O perdão ou redução do valor dos créditos sobre a insolvência, quer quanto ao capital, quer quanto aos juros, com ou sem cláusula ‘salvo regresso de melhor fortuna’; b) O condicionamento do reembolso de todos os créditos ou de parte deles às disponibilidades do devedor; c) A modificação dos prazos de vencimento ou das taxas de juro dos créditos; d) A constituição de garantias; e) A cessão de bens aos credores. 2 – (…).[ii]
Já segundo o artigo 215.º, “O juiz recusa oficiosamente a homologação do plano de insolvência aprovado em assembleia de credores no caso de violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo, qualquer que seja a sua natureza, e ainda quando, no prazo razoável que estabeleça, não se verifiquem as condições suspensivas do plano ou não sejam praticados os actos ou executadas as medidas que devem preceder a homologação”.
O juiz pode, ainda, recusar a homologação caso algum credor (que tenha já manifestado nos autos a sua oposição) assim o solicite – artigo 216.º.
No caso sub judice, a recorrente não efectuou qualquer solicitação nesse sentido, pelo que apenas relevará o artigo 215.º, ou seja, saber se o plano incorre em violação não negligenciável de normas aplicáveis ao seu conteúdo (dispositivo do plano de revitalização e princípios imperativos que lhe devam estar subjacentes).
Conforme salientam Carvalho Fernandes e João Labareda, “(...) não são negligenciáveis todas as violações de normas imperativas que acarretem a produção de um resultado que a lei não autoriza. Diversamente, são desconsideráveis as infrações que atinjam simplesmente regras de tutela particular que podem, todavia, ser afastadas com o consentimento do protegido. (...) O que importará é, pois, sindicar se a nulidade observada é suscetível de interferir com a boa decisão da causa, o que significa valorar se interfere ou não com a justa salvaguarda dos interesses protegidos ou a proteger – nomeadamente, no que respeita à tutela devida à posição de credores e do devedor nos diversos domínios em que se manifesta -, tendo em conta o que é, apesar de tudo, livremente renunciável”. [iii]  
Importa, pois, aferir se, como defende a apelante, as medidas constantes do plano de revitalização desrespeitam o princípio da igualdade e da legalidade - violando alguma norma imperativa ou que apenas com o consentimento do afectado possa ser derrogada.          
Ocorrerá violação do princípio da igualdade caso o plano preveja um tratamento desfavorável de um ou mais credores face aos demais e sem que tal medida (tratamento diferenciado) esteja assente em razões objectivas.
Na presente situação não vislumbramos que o princípio da igualdade tenha sido violado, não se concordando com a alegação de que o crédito da Segurança Social tenha obtido um tratamento desfavorável em relação ao crédito da Autoridade Tributária (e menos ainda, com relação aos créditos salariais e aos créditos comuns).
Como resulta do plano de revitalização, não ocorreu qualquer extinção ou redução da dívida reclamada pela recorrente (seja quanto ao capital, seja quanto a juros), apenas tendo sido previsto o seu pagamento fraccionado a autorizar pela própria em sede de execução fiscal (pelo que será a recorrente a negociar a forma como deverá ser definido o pagamento) – “plano prestacional a autorizar em 122 prestações mensais e sucessivas, no âmbito da execução fiscal”.
O número de prestações previstas para o pagamento da dívida da Segurança Social é exactamente o mesmo que foi previsto para liquidação dos créditos da AT e dos créditos salariais. E, embora tenha sido previsto, para os créditos comuns, um plano de 96 prestações mensais, para estes últimos vigorará um período de carência de 12 meses (o que não ocorre para o crédito da recorrente).
As datas de vencimento das prestações devidas à Segurança Social serão idênticas às devidas à AT e a taxa de juros de mora será a “aplicável às dívidas ao Estado e outras entidades públicas”.
As execuções que se encontrem pendentes manter-se-ão suspensas até integral cumprimento do plano de pagamentos que venha a ser autorizado.
A única divergência entre os créditos da Segurança Social e os da AT prende-se com o facto de, para os primeiros ter sido prevista isenção de garantia, enquanto que, com relação aos segundos, manter-se-ão as garantias existentes – sendo que o artigo 199.º n.º 13 do CPPT ex vi artigo 190.º, n.º 1 do CRCSPSS dispõe que a admissibilidade do pagamento em prestações em sede de PER não depende da prestação de quaisquer garantias (a este artigo voltaremos mais à frente). [iv]
Acresce que a recorrente, quer em sede de motivação, quer em sede de conclusões de recurso, nenhuma razão avança para justificar qualquer violação do princípio da igualdade, qualquer tratamento desfavorável relativamente aos demais credores.
Mas violará o plano homologado alguma norma imperativa, designadamente, como invocado pela recorrente, os artigos 30.º, n.º 2 e 36.º, n.º 2 e 3 da LGT? [v] [vi]
No que concerne aos créditos tributários, consagra a primeira destas normas o chamado princípio da indisponibilidade, ao dispor que “O crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e legalidade tributária”.
Já o seu n.º 3 (aditado pelo artigo 123.º da Lei n.º 55-A/2010 - Lei do Orçamento do Estado para o ano de 2011), acrescenta que “O disposto no número anterior prevalece sobre qualquer legislação especial”. [vii]
O invocado princípio encontra-se, ainda, reflectido no artigo 36.º, o qual prescreve: “(…) 2 - Os elementos essenciais da relação jurídica tributária não podem ser alterados por vontade das partes. 3 - A administração tributária não pode conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias, salvo nos casos expressamente previstos na lei. (…)”. [viii]
Entende, então, a recorrente ter sido violado o princípio da indisponibilidade dos créditos do Estado, enfatizando que apenas poderá ocorrer qualquer alteração da obrigação contributiva – inclusive quanto às condições de pagamento - nas circunstâncias legalmente previstas no CRCSPSS (e não através de uma vontade colectiva manifestada através de um plano de revitalização) e desde que tenha sido concedido para o efeito o acordo da Segurança Social (acordo esse que a recorrente não concedeu). [ix]
Argumenta a recorrente que, caso não sejam respeitadas as normas que regulam a obrigação contributiva, estar-se-á a permitir que, por acção de uma maioria colectiva, sejam obtidos “verdadeiros benefícios, moratórias, perdões fiscais”. Como tal, defende que “nunca a decisão dos credores poderia acarretar alterações à obrigação contributiva, nem ao conteúdo e prazos de pagamento desta”, o que sempre configurará um “benefício não autorizado e, portanto, ilegal” - por violação dos referidos artigos 30.º, n.º 2 e 36.º, n.º 2 e 3 da LGT, bem como do CRCSPSS (embora, no que concerne a este último diploma, se limite a invocar os artigos “190.º e sgts”).
Conclui, assim, que a derrogação ao disposto no CRCSPSS e na LGT acarreta a ineficácia do plano relativamente aos créditos da Segurança Social.
Será assim?    
A tutela do crédito tributário apresenta-se, sem dúvida, munida de natureza imperativa, obstando a que o tribunal homologue um PER quando o mesmo implique afectação, pela modificação restritiva do seu conteúdo, dos créditos tributários reclamados e reconhecidos.[x]
Como refere Suzana Tavares da Silva, não se justifica “afastar do processo de insolvência a aplicação dos artigos 30.º, n.º 2 e 36.º, n.º 3 da LGT, e do artigo 85.º do CPPT, o que seria não só ilegal, por violar directamente os preceitos legais acabados de mencionar, mas ainda violador dos mais elementares critérios de juridicidade que informam o direito tributário (princípio da igualdade na contribuição para os encargos públicos) e o direito económico europeu (princípio da concorrência e da proibição de auxílios de Estado). (…)  Em nosso entender, o aditamento do n.º 3 ao artigo 30.º à LGT não trouxe qualquer conteúdo inovador, devendo mesmo considerar-se uma norma de carácter interpretativo, pois a solução nele vertida defluía já dos princípios jurídicos fundamentais ordenadores no nosso sistema jurídico e dos princípios constitucionais que conformam o Estado fiscal.  (…) Aliás, a nosso ver, o regime da indisponibilidade do crédito tributário, por consubstanciar uma expressão legal do princípio fundamental da igualdade na contribuição para os encargos públicos é, em si, um regime tendencialmente indisponível para o próprio legislador, que apenas se encontra legitimado para estipular excepções a ele na medida em que circunstâncias excepcionais de conjuntura económica assim o justifiquem.[xi]
No entanto, o facto de a Segurança Social ter votado contra a aprovação do plano, por si só, não acarreta a ilegalidade do mesmo. [xii]
Apenas ocorrerá ilegalidade do plano caso o mesmo não respeite os legais requisitos e limites impostos em matéria de extinção e redução das dívidas fiscais e contributivas. [xiii]
Vejamos, então, se as medidas aprovadas pelo plano (o qual, com excepção da recorrente, foi aprovado por todos os credores, inclusive pela AT), violam os limites dos requisitos atinentes à regularização de dívidas ao Estado.
Para tanto, impõe-se trazer à colação as seguintes normas do CRCSPSS: [xiv]
- artigo 186.º: “1 - A dívida à segurança social é regularizada através do seu pagamento voluntário, nos termos previsto no presente Código, no âmbito da execução cível ou no âmbito da execução fiscal. (…)
- artigo 189.º: “1 – O diferimento do pagamento da dívida à segurança social, incluindo os créditos por juros de mora vencidos e vincendos, assume a forma de pagamento em prestações. (…)”.
- artigo 190.º: “1 - A autorização do pagamento prestacional de dívida à Segurança Social, a isenção ou redução dos respetivos juros vencidos e vincendos, só é permitida nos termos do presente artigo, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte e das regras aplicáveis ao processo de execução fiscal. 2 - As condições excepcionais previstas no número anterior só podem ser autorizadas quando, cumulativamente, sejam requeridas pelo contribuinte, sejam indispensáveis para a viabilidade económica deste e desde que o contribuinte se encontre numa das seguintes situações: a) Processo de insolvência, de recuperação ou de revitalização; (…). 3 - Para efeitos do disposto no número anterior, o incumprimento do pagamento das contribuições mensais desde a data de entrada do requerimento constitui indício da inviabilidade económica do contribuinte. (…) 6 – (…) a autorização a que se refere o n.º 1 do presente artigo é concedida por deliberação do conselho directivo do Instituto de Gestão Financeira, I.P. (IGFSS,I.P.). (…)
- artigo 191.º: “As condições de regularização da dívida à segurança social não podem ser menos favoráveis do que o acordado para os restantes credores.”
Bem como o artigo 81.º do Decreto Regulamentar n.º 1-A/2011 de 03/01 [xv]: “1 - O diferimento do pagamento da dívida à segurança social, incluindo os créditos por juros de mora vencidos e vincendos, assume a forma de pagamento em prestações mensais, iguais e sucessivas, com o limite máximo de 150. 2 - O número de prestações autorizado para o pagamento depende: a) Da capacidade financeira do contribuinte; b) Do risco financeiro envolvido; c) Das circunstâncias determinantes da origem das dívidas; d) Do grau de liquidez da garantia. 3 - A taxa de juros vincendos a aplicar no âmbito de pagamentos prestacionais autorizados pode ser reduzida em função da idoneidade da garantia. (…).”
- artigo 203.º: “As dívidas à segurança social podem ser garantidas através de qualquer garantia idónea, geral ou especial, nos termos dos artigos 601.º e seguintes do Código Civil”.
E, por fim, as seguintes normas do CPPT: [xvi]
- artigo 196.º (redacção conferida pela Lei n.º 100/2017 de 28/08, aqui aplicável): ”1 - As dívidas exigíveis em processo executivo podem ser pagas em prestações mensais e iguais, mediante requerimento a dirigir, até à marcação da venda, ao órgão da execução fiscal. 2 - O disposto no número anterior não é aplicável às dívidas de recursos próprios comunitários e às dívidas resultantes da falta de entrega, dentro dos respectivos prazos legais, de imposto retido na fonte ou legalmente repercutido a terceiros, salvo em caso de falecimento do executado. 3 - É excepcionalmente admitida a possibilidade de pagamento em prestações das dívidas referidas no número anterior, sem prejuízo da responsabilidade contra-ordenacional ou criminal que ao caso couber, quando: a) O pagamento em prestações se inclua em plano de recuperação no âmbito de processo de insolvência ou de processo especial de revitalização, ou em acordo sujeito ao regime extrajudicial de recuperação de empresas em execução ou em negociação, e decorra do plano ou do acordo, consoante o caso, a imprescindibilidade da medida, podendo neste caso haver lugar a dispensa da obrigação de substituição dos administradores ou gerentes, se tal for tido como adequado pela entidade competente para autorizar o plano; ou b) Se demonstre a dificuldade financeira excecional e previsíveis consequências económicas gravosas, não podendo o número das prestações mensais exceder 24 e o valor de qualquer delas ser inferior a 1 unidade de conta no momento da autorização. 4 - O pagamento em prestações pode ser autorizado desde que se verifique que o executado, pela sua situação económica, não pode solver a dívida de uma só vez, não devendo o número das prestações em caso algum exceder 36 e o valor de qualquer delas ser inferior a 1 unidade de conta no momento da autorização. 5 - Nos casos em que se demonstre notória dificuldade financeira e previsíveis consequências económicas para os devedores, poderá ser alargado o número de prestações mensais até 5 anos, se a dívida exequenda exceder 500 unidades de conta no momento da autorização, não podendo então nenhuma delas ser inferior a 10 unidades da conta. 6 - Quando, para efeitos de plano de recuperação a aprovar no âmbito de processo de insolvência ou de processo especial de revitalização, ou de acordo a sujeitar ao regime extrajudicial de recuperação de empresas do qual a administração tributária seja parte, se demonstre a indispensabilidade da medida, e ainda quando os riscos inerentes à recuperação dos créditos o tornem recomendável, a administração tributária pode estabelecer que o regime prestacional seja alargado até ao limite máximo de 150 prestações, com a observância das condições previstas na parte final do número anterior. (…).“
- artigo 198.º: “(…). 3 - Caso o pedido de pagamento em prestações obedeça a todos os pressupostos legais, deve o mesmo ser objecto de imediata autorização pelo órgão considerado competente nos termos do artigo anterior, notificando-se o requerente desse facto e de que, caso pretenda a suspensão da execução e a regularização da sua situação tributária, deve ser constituída ou prestada garantia idónea nos termos do artigo seguinte ou, em alternativa, obter a autorização para a sua dispensa.
4 - Caso se apure que o pedido de pagamento em prestações não obedece aos pressupostos legais de que depende a sua autorização, o mesmo será indeferido de imediato, com notificação ao requerente dos fundamentos do mesmo indeferimento. 5 - É dispensada a prestação de garantia para dívidas em execução fiscal de valor inferior a (euro) 5000 para pessoas singulares, ou (euro) 10 000 para pessoas coletivas.
- artigo 199.º: “(…) 13 - Os pagamentos em prestações ao abrigo de plano de recuperação no âmbito de processo de insolvência ou de processo especial de revitalização ou em acordo sujeito ao regime extrajudicial de recuperação de empresas em execução ou em negociação que decorra do plano ou do acordo não dependem da prestação de quaisquer garantias adicionais. 14 – As garantias constituídas à data autorização dos pagamentos em prestações referidos no número anterior mantêm-se até ao limite máximo da quantia exequenda (…).”
Reportando tais preceitos ao caso concreto, uma vez mais, somos forçados a discordar da recorrente, quando sustenta a sua pretensão de revogação da decisão proferida pelo tribunal a quo na violação dos artigos 195.º e 215.º do CIRE, 190.º e segs. do CRCSPSS e 30.º, n.º 2 e 3 da LGT.
É que apenas lhe assistiria razão na eventualidade de estarmos perante alguma violação não negligenciável nos moldes aludidos pelo artigo 215.º do CIRE, o que não é o caso.
Com efeito, reitera-se, para além de as medidas aprovadas se revelarem imprescindíveis para que a devedora possa recuperar financeiramente, é facto incontroverso que não se estipulou qualquer extinção ou redução do crédito da recorrente (nem do capital, nem de juros), mas apenas uma mera modificação dos prazos de pagamento desse mesmo crédito - sendo que o artigo 30.º, n.º 2 só refere as hipóteses de redução ou extinção do crédito.
E, pese embora a apelante tenha votado contra a aprovação do plano de recuperação (não dando o seu acordo ao pagamento da dívida em prestações nos moldes previstos), o certo é que tal possibilidade é legalmente admitida pelos artigos 189.º e 190.º do CRCSPSS e 81.º do Decreto Regulamentar n.º 1-A/2011, para além de ter ficado consignado no plano de revitalização que a regularização da dívida ocorrerá “através de plano prestacional a autorizar” pela credora no âmbito da execução fiscal.
Acresce que o número de prestações previstas no plano (122) contém-se no limite máximo permitido pelo mesmo artigo 81.º (em abstracto, são legalmente admissíveis 150 prestações).
E, refira-se, para os créditos da Segurança Social, o legislador não fixou qualquer outro limite, designadamente, atinente ao montante do crédito em dívida, como sucede para os créditos da AT – cfr. artigo 196.º, n.º 6 do CPPT (500 UCs) -, assim como não impõe a prestação de qualquer garantia (como resulta do teor do artigo 203.º ao prescrever apenas que podem ser previstas garantias).
Ora, se assim é, mau grado a discordância da Segurança Social, e não se ignorando que o pagamento em prestações tem de ser autorizado nos termos que resultam do artigo 190.º, n.º 1 e 6 do CRCSPSS, a verdade é que sempre tal incumprimento configurará um vício negligenciável para os efeitos previstos pelo artigo 215.º do CIRE, já que não ocorre qualquer compressão do crédito tributário da recorrente (diferente seria se o plano previsse a extinção ou a redução do seu crédito).
Tanto mais que o nº 3 do artigo 30º da LGT não faz depender a aprovação e a validade do acordo de pagamento do voto favorável da Segurança Social, pois que tal transformaria o mesmo num voto de qualidade e num verdadeiro direito de veto. A indisponibilidade a que faz alusão a lei é, naturalmente, relativa ao crédito e às condições legais previstas para a sua extinção ou modificação, e nada tem que ver com o carácter do voto em si, nos termos do qual a Segurança Social se assume como outro qualquer credor (reportando-se a autorização prevista na lei apenas aos procedimentos administrativos).
Também o teor do artigo 36.º, n.º 3 da LGT (que a recorrente invoca na motivação das suas alegações, mas que, em sede de conclusões, não referencia) não se nos afigura susceptível de viabilizar o entendimento da recorrente.
Com efeito, no plano, refere-se que a primeira prestação deverá ocorrer “em datas idênticas para os credores Segurança Social e AT”, sendo que, no que concerne à dívida desta última, ficou acordado que a primeira prestação se venceria “até ao final do mês seguinte à data da sentença homologatória do plano”. Ora, se é certo que o pagamento não é imediato, atento o hiato temporal que pode estar causa, sempre tal violação será, igualmente, de considerar negligenciável.[xvii]
Ou seja, o plano, não só prevê expressamente que os pagamentos serão definidos nas condições que vierem a ser aprovadas pela credora (em sede de execução fiscal) como, acima de tudo, não contém, com respeito à mesma, qualquer medida que acarrete a produção de um resultado que a lei não autoriza (como sucederia se se tivesse previsto um número de prestações superior a 150), nem que interfira com a justa salvaguarda dos interesses/posição da Segurança social.
Diga-se, na verdade, que não se nos afigura que a vinculação da recorrente ao plano homologado se revele excessiva ou desproporcionada, como também não resulta que a sua situação tenha assumido maior fragilidade, menor protecção, com tal homologação (isto é, que, desse plano, resulte para a mesma uma situação menos favorável do que aquela que teria caso o mesmo não fosse homologado) [xviii], tanto mais que a mesma, nas suas alegações recursórias, não invocou qualquer facto que permitisse a esta Relação concluir nesse sentido.
Como decidido pelo acórdão da Relação de Coimbra de 01/10/2013, se bem que viola as disposições tributárias o plano de recuperação que, sem o acordo da Segurança Social, contenha modificação do prazo de vencimento de créditos tributários, tal violação pode ser considerada negligenciável (e não conduzir por isso à recusa de homologação do plano) se tal modificação for em abstracto consentida pelas disposições tributárias e invocáveis.[xix]
Também o STJ, no acórdão proferido em 18/02/2014, entendeu que “(…) não é de excluir que no plano da insolvência, ao abrigo do art. 196º, nº1, als. a) e c) do CIRE, cabe o perdão ou redução do valor dos créditos da AT ou da Segurança Social sobre o passivo do devedor, quer quanto ao capital, quer quanto aos juros, bem como a modificação dos prazos de vencimento ou das taxas de juro, sejam os créditos comuns, garantidos ou privilegiados, aprovado o plano que respeitou o quorum estabelecido no artigo 212°, desde que a intervenção nos créditos do Estado credor não evidencie uma redução injusta e desproporcional, tendo em conta o somatório dos créditos dos particulares e a medida em que deles abdicam, visando a recuperação da empresa pré-insolvente.” [xx]
E, o mesmo tribunal, em acórdão de 24/03/2015, não se coíbe de afirmar: “Sempre se diz ex abundanti, nesta nossa senda argumentativa, que temos entendido que a circunstância de que os créditos fiscais e da Segurança Social não serem iguais aos outros, não pode conduzir a uma tal protecção que mesmo sendo tais créditos de montante reduzido, pudesse ser permitido ao Estado acabar por inviabilizar qualquer tentativa de recuperação, votando contra todo e qualquer plano de recuperação, porque nestas situações particulares, efectuando uma interpretação actualista do artigo 215º do CIRE vem-se entendendo como caso negligenciável admitindo, por isso, a aprovação do plano a violação que se traduza numa mera modificação dos prazos de pagamento e/ou numa redução das taxas de juros, que reflictam e exprimam uma redução global do crédito pouco expressiva e se tal modificação dos prazos e redução de juros não estiver à partida proibida pelas disposições tributárias abstractamente convocáveis e invocáveis (…)
Trata-se de uma “válvula de segurança” interpretativa que evita por em causa acordos em que aqueles créditos, pelo seu reduzido montante e/ou, por via da concessão de moratórias por banda da administração, têm vindo a ser cumpridos pelo devedor, os quais a seguir-se com rigor a interpretação efectuada pelo segundo grau, também nunca poderiam ser homologados desde que a tal se opusessem os respectivos credores.”  [xxi]
Mais recentemente, esta Secção, em acórdão proferido em 22/09/2020, referindo-se a um caso no qual a Segurança Social votou desfavoravelmente o plano de revitalização, escreveu: “(…) não resulta como inevitável a ilegalidade do Plano (ou das medidas por ele previstas para os créditos do Estado) sempre que este seja votado desfavoravelmente pela Segurança Social ou pela Autoridade Tributária; apenas e tão só quando não respeite os requisitos ou limites da extinção ou redução das dívidas fiscais ou contributivas nos termos em que estas são legalmente autorizadas, independentemente do sentido de voto - favorável ou desfavorável - daqueles credores.
Com efeito, (…) o nº 3 do art. 30º da LGT não veio (e num Estado de Direito seria no mínimo de estranhar que o fizesse) conferir caráter indisponível ou imperativo ao sentido de voto do credor Segurança Social ou Autoridade Tributária, no sentido de dele depender a aprovação e a validade do Plano de Insolvência e/ou das medidas por ele previstas, transformando-o num voto de qualidade que, no sentido preconizado pelo Recorrente, corresponderia a um verdadeiro direito de veto. A indisponibilidade ou imperatividade da lei vai reportada apenas aos créditos, no que aqui interessa, às condições legais previstas para a respetiva extinção ou modificação, que são juridicamente sindicáveis, e já não ao sentido de voto que pelo credor Estado seja manifestado em sede de votação de Plano (seja no âmbito de PER, seja em processo de insolvência), que o emite como qualquer outro credor, nas condições previstas pelo art. 73º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Assim, a indisponibilidade prevista pelo art. 30º, nº 3 da LGT vai reportada apenas aos créditos do Estado; e o âmbito da inderrogabilidade ou imperatividade do regime de regularização de dívidas ao Estado reporta às condições em que a lei ‘autoriza’ a Autoridade Tributária ou a Segurança Social a autorizar o pagamento em prestações, mas não inclui a autorização destas entidades. Autorização (administrativa) que constitui condição de eficácia da proposta de pagamento em prestações no âmbito do procedimento (administrativo) legalmente previsto para o seu processamento e deferimento, no âmbito das competências (administrativas) da Autoridade Tributária e da Segurança Social (cfr. art. 190º, nº 6 do CRCSPSS e 197º do CPPT), mas que não tem nem pode ter assento e constituir requisito de eficácia do plano prestacional para pagamento de dívidas ao Estado inserido no âmbito mais alargado de um plano de reestruturação do passivo do devedor ‘universalmente’ aprovado em sede procedimento judicial legalmente erigido a motor de promoção da recuperação do agente económico endividado.” [xxii]
Por assumir igualmente pertinência para o caso, vejam-se, ainda, os acórdãos da Relação de Coimbra de 24/09/2013 [xxiii] e da Relação de Guimarães de 11/07/2013 [xxiv], os quais, sob a égide do objectivo visado pelo PER – reabilitação económica das empresas capazes de se recuperar - admitem a possibilidade de homologação de plano de revitalização, mesmo com o voto desfavorável da Fazenda Pública e do ISS, nos casos em que não se descortina uma violação não negligenciável, por não contrariar o plano a norma prevista no artigo 30.º da LGT ou qualquer outra norma tributária relativa ao modo de pagamento dos créditos a estas entidades. 
Também ao nível da doutrina, a admissão de modificabilidade dos créditos tributários tem vindo a ser defendida.
Segundo Catarina Serra, "a vingar a interpretação contrária, ficaria irremediavelmente comprometida a função de recuperação de empresas, que é – deve ser – uma das funções irrenunciáveis de qualquer lei da insolvência. Atendendo a que as dívidas ao Estado e à Segurança Social representam quase sempre a parte mais significativa do passivo do insolvente, seria mesmo o fim da recuperação". [xxv]
Conclui-se, pois, que, na concreta situação, pese embora a inquestionável natureza indisponível do crédito da Segurança Social, uma vez que as medidas previstas no plano de revitalização para a regularização do mesmo respeitam os limites abstractamente previstos no regime geral contributivo, não ocorrendo qualquer redução ou extinção da dívida, considerando os fins visados pelo PER e a justa medida exigível à prossecução e alcance dos mesmos, não poderá a oposição desta credora ser obstáculo a que o plano seja considerado legal, tanto mais que a concretização do plano prestacional será oportunamente apreciado e decidido em sede de execução fiscal.
Termos em que não poderá proceder a presente apelação, confirmando-se a homologação do plano de revitalização, inclusive quanto ao crédito da Segurança Social.
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IV - DECISÃO
Perante o exposto, acordam os Juízes da Secção do Comércio deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente, mantendo-se a decisão recorrida que homologou o plano de revitalização na sua íntegra.
Custas pela apelante.

Lisboa, 22 de Fevereiro de 2022
Renata Linhares de Castro
Nuno Magalhães Teixeira
Rosário Gonçalves
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[i] O n.º 1 do artigo 194.º do CIRE prevê, pois, um tratamento igualitário dos credores no plano de insolvência - princípio conditio par creditorum -, sendo que, no entanto, não se trata de uma igualdade absoluta, antes impondo que situações distintas sejam tratadas de modo diferente (consoante a natureza dos créditos e a diversidade das suas fontes). O que está vedado é a sujeição a diferentes regimes de credores que se encontram em circunstâncias idênticas (salvo se nisso os mesmos acordarem – n.º 2 do artigo 194.º). 
[ii] O n.º 2 do artigo 196.º do CIRE elenca as entidades que não podem ser afectadas pelas medidas propostas/aprovadas, sendo que aí não é mencionado o Estado.
[iii] In Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, Quid Juris, 3.ª Edição, 2015, a pág. 782.
[iv] Nesta matéria, veja-se o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 31/03/2016 (Proc. n.º 0182/16, relator Ascensão Lopes), no qual se refere que a matéria da garantia a prestar está fora do campo da indisponibilidade do direito e deve ter em consideração a situação concreta da requerente sempre na perspectiva do equilíbrio do objectivo da sua recuperação económica e da salvaguarda do interesse público em garantir a boa cobrança dos créditos fiscais.
[v] Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98 de 17/12, diploma este aplicável aos créditos da Segurança Social por força da alínea a) do artigo 3.º do CRCSPSS.
[vi] A recorrente invoca, ainda, violação do disposto no artigo 125.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, invocação essa que, no entanto, se mostra de todo injustificada e desprovida de qualquer relevância, uma vez que este preceito corresponde a uma disposição transitória atinente aos processos que ainda se encontrassem pendentes à data da entrada em vigor das alterações introduzidas por tal diploma.
[vii] Como refere ALEXANDRE SOVERAL MARTINS, in Um Curso de Direito da Insolvência, Almedina, 2015, págs. 412/413, “O aditamento do nº 3 referido (ao artigo 30º da Lei Geral Tributária) visava, designadamente, enfrentar as dúvidas que até aí surgiam acerca da relação entre o CIRE, a LGT, o CPPT, e o regime da regularização das dívidas à segurança social. Com efeito, a jurisprudência mostrava-se dividida quanto à possibilidade de o plano de insolvência, porque previsto em lei especial, afastar o regime contido em normas imperativas da legislação referida. O artigo 30º, nº 3, da LGT não permite agora dizer que as soluções previstas no plano prevaleceriam sobre a legislação fiscal”.
[viii] Também encontramos o princípio da indisponibilidade do crédito tributário manifestado no artigo 85.º, n.º 3 do CPPT, que dispõe “A concessão da moratória ou a suspensão da execução fiscal fora dos casos previstos na lei, quando dolosas, são fundamento de responsabilidade tributária subsidiária.”.
[ix] Para além de serem indisponíveis, os créditos tributários são irrenunciáveis – artigo 60.º do CPPT -, apenas sendo possível conceder perdões e/ou moratórias nas situações legalmente previstas (mesmo que tais medidas se mostrem imprescindíveis à recuperação do devedor).
Como refere SARA LUÍS DIAS, in O Crédito Tributário no Processo de Insolvência e nos Processos Judiciais de Recuperação, Almedina, 2021, pág. 46, “não pode a AT estabelecer qualquer tipo de negociação com os contribuintes e afetar o seu crédito, devendo cingir a sua atuação ao que estiver legalmente disposto. Só o legislador pode definir as situações em que tal tratamento aparentemente ´desigual´, refletido na concessão de perdões e/ou moratórias dos seus créditos, se pode verificar, só ele está habilitado a fixar as condições em que deva acontecer a modificação e/ou extinção da obrigação fiscal”.
[x] Neste sentido, vide o acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 15/12/2011 (Proc. n.º 467/09.1TYVNG-Q.P1.S1, relator Silva Gonçalves) e de 10/05/2012 (Proc. n.º 368/10.0TBPVL-D.G1.S1, relator Álvaro Rodrigues).
[xi] SUZANA TAVARES DA SILVA e MARTA COSTA SANTOS, Os créditos fiscais nos processos de insolvência: reflexões críticas e revisão da jurisprudência, Janeiro/2015, disponível para consulta in https://estudogeral.sib.uc.pt/jspui/bitstream/10316/24784/1/STS_MCS%20insolvencia.pdf
[xii] Caso contrário, dificilmente se conseguiria compatibilizar a protecção dos créditos tributários com a efectiva e eficaz prossecução das finalidades do CIRE, bem como dar cumprimento às obrigações a que o Estado se vinculou no Memorando de entendimento sobre condicionalismos específicos de política económica, de 17/05/2011, onde se consigna expressamente que “as autoridades tomarão também as medidas necessárias para autorizar a administração fiscal e a segurança social a utilizar uma maior variedade de instrumentos de reestruturação baseados em critérios claramente definidos nos casos em que os credores tenham aceite a reestruturação dos seus créditos, e para rever a lei tributária com vista à remoção de impedimentos à restruturação voluntária das dívidas”.
Por pertinente, veja-se a posição de CATARINA SERRA, in Processo Especial de Revitalização - contributos para uma “rectificação”, Revista da Ordem dos Advogados, nº 72, Abril/Setembro, 2012, pág. 740, onde se defende uma interpretação restritiva das normas tributárias com fundamento na teleologia subjacente ao PER e na unidade do sistema jurídico - “a regra de que havendo contradição entre o que resulta da interpretação do texto expresso de uma norma jurídica e aquilo que resulta do silêncio de outra se resolve com a sobreposição da primeira à segunda não deve ser mantida quando acarrete uma desconsideração da teleologia que está subjacente a esta e outras perturbações intoleráveis para a harmonia do sistema jurídico”.
[xiii] Nesse sentido, veja-se Sara Luís Dias, obra citada, pág. 167: “a aprovação e consequente homologação de planos de recuperação que alterem ou condicionem o crédito tributário para além dos limites previstos na lei tributária afeta o princípio da indisponibilidade do crédito tributário (e o interesse público e colectivo que lhe está subjacente), o qual, conforme vimos, impossibilita a AT de, livremente, aceitar e/ou aderir a medidas que, mesmo imprescindíveis e favoráveis à recuperação do insolvente, impliquem uma redução ou extinção dos seus créditos”.
[xiv] Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, 16/09.
[xv]  Decreto que procedeu à regulamentação do CRCSPSS.
[xvi] Código de Procedimento e de Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/99, de 26/10
[xvii] Nesse sentido, veja-se o acórdão da Relação de Coimbra de 24/09/2013 (Proc. n. 36/13.1TBNLS.C1, relator Freitas Neto).
[xviii] Veja-se, a título de exemplo, o disposto no artigo 97.º, n.º 1, al. a), do CIRE, do qual decorre que, sendo declarada a insolvência da devedora, desaparecerão os privilégios dos créditos da recorrente.
[xix] Acórdão proferido no âmbito do Proc. n.º 1786/12.5TBTNV.C2, relatado por Barateiro Martins.
[xx] Acórdão proferido no Proc. n.º 1786/12.5 5TBTNV.C2.S1, relatado por Fonseca Ramos.
[xxi] Acórdão proferido no âmbito do Proc. n.º 664/10.7TYVNG.P1.S1 e relatado por Ana Paula Boularot, tendo a ilustre conselheira reiterado tal posição na publicação Julgar, n.º 31, Janeiro-Abril de 2017 - Apontamentos sobre os efeitos do processo especial de recuperação -, disponível em http://julgar.pt.
[xxii] Proc. n.º 2542/19.5T8VFX.L1-1, relatora Amélia Sofia Rebelo.
[xxiii] Proc. n. 36/13.1TBNLS.C1, já mencionado: “1. Face à redacção dada ao art.º 30 da Lei Geral Tributária, com o aditamento do seu actual n.º 3, pelo art.º 123 da Lei n.º 55-A/2010 de 31/12, os créditos fiscais e os créditos da Segurança Social devem considerar-se como indisponíveis, o que significa que, em princípio, não poderão ser objecto de alteração ou transacção nos planos de recuperação apresentados no âmbito de processos de revitalização ou insolvência. 2. Impende sempre sobre o juiz do processo, como garante último da legalidade, nos termos dos art.ºs 17-F/5, 215 e 216 do CIRE, o dever de recusar os planos de recuperação do devedor que nesses processos ofendam a natureza indisponível de tais créditos, independentemente do sentido de voto do Estado ou da Segurança Social, salvo se concluir ser negligenciável a violação dessa intangibilidade para além do condicionalismo que a própria lei tributária admita.
[xxiv] Proc. n. 1411/12.4TBEPS-A.G1, relator António Sobrinho: “a ratio legis que está imanente, neste âmbito de recuperação do devedor, nos diversos normativos legais, quer do Código de Insolvência (vg. artºs 215º e 216º citados), quer do processo especial de revitalização, não se compadece com a dependência absoluta e exclusiva da vontade de um dos credores (na aprovação ou reprovação do plano), ainda que privilegiado, como o aqui recorrente, salvo se estivesse em causa a indisponibilidade do seu crédito, isto é, houvesse extinção ou redução do mesmo, ou se tratasse de pagamento em prestações desconforme, quanto à substância, com normas legais imperativas e contidas no Código Contributivo.”
[xxv] In O Regime Português da Insolvência, 5ª edição, 149 e segs. Também no sentido preconizado, veja-se L. M. PESTANA DE VASCONCELOS, in Recuperação de Empresas: o Processo de Revitalização, págs. 135 e segs.