CONTRATO DE SOCIEDADE
ALTERAÇÃO DO CONTRATO
REPRESENTAÇÃO DA SOCIEDADE
Sumário

I - As modificações introduzidas em contrato de sociedade, mesmo que meramente de construção frásica ou gramatical, constituem alterações a contrato de sociedade e correspondem a alterações formais.
II - Contudo, só as alterações substanciais - as que verdadeiras alterações do conteúdo contrato impliquem -, estão sujeitas ao regime jurídico que a lei estabelece para aquele efeito (cfr. art. 85º e segs, al. h), do nº1, do art. 246º e nº1, do artigo 265.º, todos do Código das Sociedades Comerciais). Entre os casos de alterações contratuais substanciais conta-se a situação dos autos, de alteração do número de gerentes necessário para vincular a sociedade (redução a um - o próprio sócio que votou favoravelmente a deliberação).
III - Para as deliberações sociais importem alterações substanciais ao Pacto Social estabelece, imperativamente, a lei maioria qualificada (de três quartos dos votos correspondentes ao capital social ou número mais elevado de votos exigido pelo contrato de sociedade) – v. preceito anteriormente referido;
IV - Em caso de falta definitiva de um gerente cuja intervenção seja necessária por força do contrato para a representação da sociedade, são várias, as espécies de cláusulas contratuais previstas no nº3, do artigo 253º, do Código das Sociedades Comerciais, sem que em qualquer delas se imponha alteração do Pacto Social: i) as que consistem na indicação nominal do gerente cuja intervenção é indispensável para que a sociedade seja representada (caso em que a falta definitiva do gerente acarreta, tão só, a caducidade da cláusula do contrato); ii) as que exigem apenas certo número de gerentes para representação da sociedade, número esse que pode ser reconstituído ou pelos sócios ou pelo tribunal (concedendo a lei aos sócios um prazo – 30 dias – para preencherem a vaga, pelo meio normal - a eleição de mais um gerente -, podendo, passado esse prazo, sem ter sido eleito outro gerente, qualquer sócio ou gerente requerer ao Tribunal a nomeação de um gerente); iii) as que consagram as situações hibridas de além da indicação nominal de gerentes cuja intervenção é necessária, contemplam exigência de um determinado número de gerentes, caso em que caducando, embora, a referência ao gerente em falta, se mantém a exigência o número de gerentes para a representação da sociedade, a reconstituir pelos sócios ou pelo Tribunal, nos termos referidos.

Texto Integral

Apelação nº 1314/20.9T8AMT.P1
Processo da 5ª secção (3ª Secção cível)
Tribunal de origem do recurso: Juízo de Comércio de Amarante - Juiz 1

Relatora: Eugénia Maria de Moura Marinho da Cunha
1º Adjunto: Maria Fernanda Fernandes de Almeida
2º Adjunto: Maria José Simões

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto

Sumário (cfr nº 7, do art.º 663º, do CPC):
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I. RELATÓRIO

Recorrente: AA…, Lda
Recorrida: BB…

BB…, casada, NIF ………, residente na Avenida …, n.º …, ….-… …, concelho de Paços de Ferreira, intentou a presente ação declarativa comum contra a Ré “AA…, Lda.”, NIPC ………, com sede social na Avenida …, n.º …, ….-… …, concelho de Paços de Ferreira, pedindo que na procedência da ação seja declarada a nulidade ou anulação da primeira e segunda deliberações sociais tomadas na assembleia geral da Ré realizada em 02.09.2020, exaradas na respetiva ata, a primeira que destituiu a Autora do cargo de gerente e a segunda que alterou o pacto social, e, caso a primeira deliberação não padeça de qualquer vício, não sendo declarada inválida, então seja a Ré condenada a pagar-lhe a quantia de 61.400,00 euros (sessenta e um mil e quatrocentos euros), a título de indemnização por destituição da gerente sem justa causa, e condenada a pagar-lhe a quantia de 10.000,00 euros (dez mil euros), a título de indemnização pelos danos por si sofridos decorrentes da prática de factos ilícitos que invoca, peticionando, ainda, que se decrete a nulidade ou anulabilidade da segunda deliberação tomada na assembleia geral da Ré realizada em 02.09.2020, que alterou o pacto social.
Para sustentar a sua pretensão, alega, em síntese, que as deliberações sociais de destituição da gerente da Autora e de alteração do Pacto Social quanto à forma de obrigar a Sociedade são ambas inválidas, a primeira por constituir abuso de direito do único sócio que formou a maioria dos votos, sendo a destituição sem invocação de justa causa, e tal deliberação foi tomada em prejuízo da Autora e também da sociedade e para beneficio exclusivo e ilegítimo do único sócio que votou tal deliberação, e a segunda deliberação por não ter sido deliberada por uma maioria qualificada necessária de 2/3 do capital social.
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Regularmente citada para a presente ação, a Ré apresentou contestação, impugnando os fundamentos da ação invocados pela Autora, alegando que para a destituição da autora não foi invocada justa causa, por não ser necessária, já que a destituição de gerente pode ser livremente deliberada pelos sócios, não existiu beneficio nem abuso de posição do sócio maioritário que votou as deliberações impugnadas, além de não ter sido invocado qualquer prejuízo para a Autora enquanto sócia, o único atendível, por fim alega que o comportamento da Autora posterior a tais deliberações veio confirmar o acerto da sua destituição como gerente, pelos benefícios que trouxe para a empresa. Quanto à segunda deliberação, alteração da forma de obrigar a sociedade alega ter sido uma consequência necessária da destituição da Autora do cargo de gerente, sob pena de paralisação da sociedade que se veria impedida de praticar os mais elementares atos.
Realizada audiência prévia, foi proferido despacho saneador, despacho a fixar o objeto do litígio e indicar os temas da prova, despacho de admissão dos meios de prova apresentados e a designar data para a audiência de discussão e julgamento.
Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais.
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Foi proferida sentença com a seguinte parte dispositiva:
Nos termos e pelos fundamentos expostos, o Tribunal decide julgar a ação parcialmente procedente por parcialmente provada e, em consequência, decide:
a) Julgar improcedente o pedido de declaração de nulidade ou anulabilidade da primeira Deliberação tomada na Assembleia Geral da Ré, realizada do dia 02.09.2020, e que destituiu a Autora BB… do cargo de gerente da Ré, “AA…, Lda.”;
b) Julgar procedente o pedido de anulação da Segunda Deliberação tomada na Assembleia Geral da Ré, realizada do dia 02.09.2020, que alterou o artigo quinto, n.º 3, do Pacto Social da Ré, para passar a ser suficiente a assinatura de um gerente para obrigar a sociedade;
c) Julgar improcedente o pedido de condenação da Ré no pagamento da quantia de €61.400,00 (sessenta e um mil e quatrocentos euros), a título de indemnização por destituição de gerente sem justa causa;
d) Julgar procedente o pedido de condenação da Ré no pagamento à Autora, da quantia de €10.000,00 (dez mil euros), a título de indemnização por danos morais.
e) Condenar a Autora e a Ré nas custas da presente ação, na proporção de 40% para a Autora e de 60% para a Ré, atento o respetivo decaimento.
Registe e notifique.
Comunique a presente decisão à Conservatória do Registo Comercial competente, a fim de ali ser averbado o cancelamento da alteração introduzida ao artigo quinto, n.º 3, do Pacto Social, quanto à forma de obrigar a sociedade, mantendo-se a necessidade da assinatura de dois gerentes.
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A Ré apresentou recurso de apelação, pugnando por que seja revogada a sentença, formulando as seguintes
CONCLUSÕES:
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Apresentou a Autora resposta às referidas alegações de recurso cujo desentranhamento foi ordenado por intempestividade.
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Após os vistos, cumpre apreciar e decidir o mérito do recurso interposto.
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II. FUNDAMENTOS
- OBJETO DO RECURSO
Apontemos as questões objeto do presente recurso, tendo presente que o mesmo é balizado pelas conclusões das alegações do recorrente, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Assim, as questões a decidir são as seguintes:
1ª - Da validade da deliberação de alteração do pacto social tomada na Assembleia Geral da Ré, realizada do dia 02.09.2020, que alterou o artigo quinto, n.º 3, do Pacto Social da Ré (forma de obrigar), para passar a ser suficiente a assinatura de um gerente para obrigar a sociedade em vez de “assinatura conjunta dos gerentes CC… e BB…”, e do quorum deliberativo.
2º - Da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais e do quantum indemnizatório.
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II.A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
1. FACTOS PROVADOS
São os seguintes os factos considerados provados, com relevância, para a decisão (transcrição):
A) A sociedade Ré “AA…, Lda.”, foi constituída em 16.01.1997, com o objeto social de Impressão e atividades dos serviços relacionados com impressão, com capital social de 150.000,00 euros, dividido em cinco quotas, uma de valor nominal de 46.500,00 euros, pertencente ao sócio DD…, uma de valor nominal de 46.500,00 euros, pertencente a sócia EE…, uma de valor nominal de 22.500,00 euros, pertencente a nua propriedade a CC…s e em usufruto simultâneo e sucessivo a DD… e EE…, outra de valor nominal de 18.000,00 euros, pertencente a nua propriedade a BB… e em usufruto simultâneo e sucessivo a DD… e EE…, uma de valor nominal de 16.500,00 euros, pertencente a nua propriedade a FF…, e em usufruto simultâneo e sucessivo a DD… e EE…, obrigando-se a sociedade com a assinatura de um gerente, tendo sido nomeado gerente o Sócio DD….
B) Por deliberação de 03.02.2014, foram designados gerentes os sócios CC… e BB…, passando a sociedade a obrigar-se com a assinatura do gerente DD… ou pela assinatura conjunta dos gerentes CC… e BB….
C) O sócio D… renunciou à gerência em 18.05.2016.
D) Em 16.05.2016 foi averbado o cancelamento do usufruto sobre a quota de 16.500,00 euros, que foi dividida em duas quotas, de valor nominal de 8 250 euros, cada uma, e transmitidas a EE… e a DD…, respetivamente;
E) Em 18.05.2016, foi alterado o contrato social e cancelado o usufruto existente sobre as quotas nominais de 22.500,00 euros e de 18.000,00 euros, tendo sido unificadas as quotas do capital social, passando a estar dividido em duas quotas, uma de valor nominal de 77.250,00 euros, pertencente ao sócio CC… e outra com o valor nominal de 72.750,00 euros, pertencente à Sócia BB…, passando a sociedade a obrigar-se com a assinatura conjunta dos gerentes CC… e BB….
F) Por convocatória feita por carta registada e assinada pelo sócio-gerente CC…, com data de 03.08.2020, foi a sócia BB… convocada para reunir na sede da sociedade, no dia 02/09/2020, pelas 15:00 horas, com a seguinte ordem de trabalhos: Ponto Um: Destituição da gerente BB…; Ponto Dois: Alteração do pacto social quanto à forma de obrigar a sociedade. (…) “Como é do conhecimento de V.ª Ex.ª a necessidade de realização da mencionada Assembleia Geral com tal ordem de trabalhos advém do facto de nos últimos meses terem existido, no meu humilde entendimento, violações graves dos deveres de gerência e da própria gestão da empresa, colocando em causa a própria solvibilidade da mesma”.
G) Da ata da Assembleia Geral realizada em 02.09.2020 da sociedade Ré “AA…, Lda.” consta ter sido presidida a assembleia pelo sócio CC…, com a seguinte Ordem de trabalho: Ponto Um: Destituição da Gerente BB…; Ponto Dois: Alteração do Pacto Social Quanto à forma de obrigar a sociedade.
No período de discussão e votação, o Presidente da Assembleia pôs o primeiro ponto da ordem de trabalhos a votação (Destituição da Gerente BB…), tendo a sócia BB… pedido a palavra e dito o seguinte:
“Como resulta da convocatória a intenção do sócio e gerente CC… pretende destituir sem justa causo, apenas por deter mais 3% na totalidade do capital social unilateralmente impor essa maioria.
A destituição da sua gerente causa prejuízos graves à sociedade quer porque terão de ser desempenhadas por alguém. Por outro lado, a AA… tem 85 anos; sendo uma empresa familiar, os sócios fazem parte da terceira geração, tendo desde cedo perspetivado o seu futuro na mesma, fazendo formação na área dos Artes Gráficas, com a duração de 3 anos e conclusão do Curso Técnico-Profissional de Artes e Indústrias Gráficas, em 1991, no Colégio …. Desde 1991 até à presente data que trabalha nesta empresa, que inicialmente estava em nome individual, da mãe dos sócios, tendo a mesma passado a sociedade por quotas, em 1997, tendo ficado com uma quota doada pelos pais, assim como aos outros dois irmãos, o sócio CC… e FF…. Posteriormente assumiu pessoalmente uma divida em partes iguais com o sócio CC… à irmã FF… para ela sair da sociedade valor que ainda está a pagar na proporção de 50%. Passou por várias áreas, desde a pré-impressão, área comercial, administrativa, até mais tarde chegar à gerência, incumbida pelos pais, quando em 2016, decidiram entregar os desígnios da empresa a si e ao sócio CC… em igualdade de circunstâncias. Sempre zelou pelos seus interesses e evolução, dependendo dela economicamente, sustentando dessa forma a sua família e a sua vida. Nunca teve outro emprego, ou formação, sendo a sua evolução dentro da empresa uma constante e uma mais-valia, quer para si, quer para a empresa. Com a sua destituição da gerência, será profundamente lesada, quer no rendimento que deixará de ter, quer na estabilidade da sua família e do seu futuro. Está quase a completar 48 anos e com essa idade e não sabendo fazer mais nada, terá bastante dificuldade em encontrar outro emprego, afetando-a drasticamente nos projetos que tem, quer o curto, médio e longo prazo, na empresa, onde para além de ter assumido a dívida com a sua irmã, foi sendo também avalista dos vários leasings e créditos, que a empresa foi necessitando, tendo como garantido, que, como gerente, teria sempre o controle e gestão dos mesmos. Sendo destituída da gerência, para além de continuar com o compromisso do pagamento à sua irmã, continua com os seus bens pessoais comprometidos pelo aval que deu. Se alguma vez soubesse que podia ou iria ser destituída de gerente, jamais teria encaminhado a sua vida da forma que encaminhou, não teria assumido responsabilidades pessoais (em partes iguais com o sócio CC…) e não teria se responsabilizado pessoalmente perante a empresa. Com toda esta situação, além da estrutura familiar estar abalada, encontrando-se mentalmente e psicologicamente fragilizada, estando a ter acompanhamento psiquiátrico. Tendo estes danos de serem ressarcidos pela sociedade e pelo sócio CC… se votar favoravelmente com prejuízo paro a sociedade.”
Em face do referido pela sócia BB…, o sócio CC… pediu a palavra e disse: “Refuto a veracidade do relatado pela sócia BB…, sendo que o presente assunto da destituição foi por diversas vezes debatido, estranhando que venha invocar surpresa quanto à realização da presente assembleia uma vez que a mesma sempre soube da possibilidade da sua realização, como também sempre soube que o capital social que detinha na sociedade e as consequências legais de ter uma quota inferior.”
De seguida, levou-se a votação o ponto primeiro da ordem de trabalhos, tendo o mesmo sido aprovado por maioria, com o voto a favor do sócio CC… e com o voto contra da sócia BB….
Entrou-se depois na apreciação do ponto dois da ordem de trabalhos (alteração do Pacto Social quanto à forma de obrigar a sociedade), tendo o presidente da Assembleia e em face da deliberação do ponto anterior, proposto que a sociedade deve obrigar-se com a assinatura de um gerente, alterando-se dessa forma o pacto social, nomeadamente no artigo 5.º, número três, devendo constar o seguinte: “Para obrigar a sociedade é suficiente a assinatura de um gerente.”.
O Presidente da Assembleia pôs o segundo ponto da ordem de trabalhado a votação (alteração do Pacto Social quanto à forma de obrigar a sociedade), tendo a sócia BB… pedido a palavra e dito o seguinte: “entende que o ponto segundo da convocatória não refere expressamente qual o artigo do pacto social que se quer levar a votação e alterar, pelo que, quanto a este ponto, falta menção expressa na convocatória pelo que a assembleia não está habilitada a deliberar.”
De seguida, levou-se a votação o ponto segundo da ordem de trabalhos, tendo o mesmo sido aprovado por maioria, com o voto a favor do sócio CC… e com o voto contra da sócia BB….
Em face da aprovação do segundo ponto da ordem de trabalhos, fica deliberado alterar o artigo quinto, número 3 do pacto social, com a redação abaixo.
“3 – Para obrigar a sociedade é suficiente a assinatura de um gerente.”
Nada mais havendo a tratar a sessão foi encerrada às quinze horas e trinta minutos, da qual, se lavrou a presente ata que depois de lida em voz alta e aprovada vai ser assinada pelos presentes.
H) A Autora foi contratada como trabalhadora da Ré a 1 de março de 1992.
I) A Ré é uma empresa familiar que se dedica à atividade de impressão de diversos produtos, por conta de editores ou de terceiros, e à encadernação e acabamento das referidas impressões.
J) Desde 18.05.2016, a Autora assumiu em pleno a responsabilidade pelo departamento financeiro da empresa, exercendo as seguintes funções: gestão de todos os pagamentos e cumprimento de obrigações legais (IVA, Segurança Social e IRS), gestão dos pagamentos a fornecedores e funcionários, processamento dos cheques recebidos e depósitos nos bancos, responsabilidade por todos os assuntos contabilísticos, com assessoria de empresa de contabilidade, contacto com os bancos, no sentido de receber informações relativas a concessão de créditos, manutenção de cartões refeição, entre outros, registo e confirmação de todos os movimentos bancários, confirmação e registo das entradas e saídas em numerário, entre outras funções.
K) A Autora auferia o vencimento mensal ilíquido de €800,00 (oitocentos euros).
L) A Autora auferia um subsídio de alimentação, por cada dia de trabalho efetivo, no valor diário de 7,23 euros.
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Após a produção de prova realizada em audiência de julgamento, consideram-se provados também os seguintes factos:
1. Desde que passaram a ser gerentes da Ré, a Autora e o CC… continuaram a receber mensalmente os mesmos vencimentos que vinham auferindo como trabalhadores da Ré.
2. Por acordo de ambos e por dificuldades financeiras da Ré, a Autora e CC… nem sempre recebiam os seus subsídios de férias e de natal.
3. A Autora recebeu o seu subsídio de férias e de Natal no ano de 2020.
4. Até à sua destituição do cargo de gerente, a Autora sempre utilizou um carro da Ré para as suas deslocações particulares.
5. CC… desde sempre e até ao mês de julho de 2020, utilizou um carro da Ré para as suas deslocações particulares.
6. Atualmente o CC… retomou a utilização do carro da Ré para as suas deslocações pessoais.
7. Até à sua destituição de gerente, a Autora sempre utilizou um cartão de telemóvel que era pago pela Ré para assuntos da empresa e também para uso pessoal.
8. Após a sua destituição de gerente, a Autora continuou a utilizar o mesmo cartão de telemóvel, que deixou de ser pago pela Ré.
9. A Autora e o seu irmão CC… vêm mantendo uma relação de conflito entre si, desde data anterior a dezembro de 2012, por discordarem quanto à alteração da estrutura societária da Ré, não abdicando o CC… de uma posição maioritária na Ré.
10. Desde dezembro de 2018 a Autora e CC… deixaram de falar um com o outro.
11. Em 14.12.2012, os pais da Autora propuseram à Autora e ao gerente da Ré, CC…, o seguinte: “Uma das formas para resolver…
Os €35.000 e €30.000 terão de ser desbloqueados o mais rápido possível.
Se até setembro de 2014 não estiver desbloqueado, o dinheiro dos seguros de vida será para amortizar o que estiver em falta.
Quando a faturação não chegar para os compromissos ou seja €32.000 (+-) vocês também não recebem a totalidade do salário, como eu não recebo os 3% de percentagem.
A renda, seja qual for a faturação, terei de receber todos os meses.
A partir destas situações e tudo resolvido, vocês dividem o rendimento como bem entenderem. Só depois de chegar a um acordo, fazemos doação da parte da nossa cota, em que iremos ficar com 6%, 3% para mim e 3% para a minha mulher.
Se ainda assim não estiverem de acordo, pode-se tentar vender a empresa nestas condições: 39% para mim e minha mulher, 25% CC…, 25% BB…, 11% FF….
Se mesmo assim não concordarem, para já não há divisão das cotas. Têm de assumir a gerência os dois e quando a faturação for inferior a €36.000, o CC… recebe o salário do trabalhador mais bem pago, mais €100, o seguro e carro para trabalhar, a BB…, o ordenado da escriturária, mais €50,00, seguro e almoço e carro para serviços domésticos.
Outra situação será tentar desfazer-me disto e aí não prescindo dos meus 62%. Quem tiver capacidade para tomar conta da empresa que faça propostas.
Conclusão responsabilidade da dívida da empresa €137.000, sendo que €70.000 serão para ser pagos ao Banco em 16 meses, €22.000 e €50.000 em 38 meses +-, o restante como está descrito em cima.
Por último apresentem-me uma proposta fundamentada aceite pelos dois e assinada.
12. Em 3.01.2020, a Autora remeteu comunicação escrita ao irmão CC… com o seguinte teor: “Depois de uma prolongada e refletida análise sobre a nossa empresa, sinto necessidade de te dizer algumas coisas: Estou preocupada e apreensiva quanto ao futuro da empresa. Embora a mesma tenha aumentado no ano passado, o volume de vendas, o que é certo é que o ano foi atípico e contrariamente ao esperado o fim de ano veio alterar aquilo que podia ser um ano atual mais folgado em termos de reforço de tesouraria. Não sei, nem consigo prever como vai ser este ano, mas na minha área, é desgastante constatar todos os meses que não consigo fazer os pagamentos aos fornecedores atempadamente e os mesmos têm que ser geridos às pinguinhas, conforme os pagamentos dos clientes vão entrando. Ao mesmo tempo presencio diariamente situações com as quais eu não concordo e que na maior parte das vezes me sinto impotente e de pés e mãos atadas, para fazer algo, nem que seja para dar o meu ponto de vista. Já te fiz algumas observações, reparos e dei opiniões, no sentido de ajudar a melhorar ou dar outro ponto de vista, o que na maior parte das vezes nem me respondeste. Gostava de saber o que esperas para a empresa e da empresa para ti. Eu queria continuar, mas com bem estar e sentido de realização, tentando traçar metas e objetivos para alcançarmos algo melhor para o bem de todos. Para isso acontecer, há alguns aspetos que têm que mudar, principalmente na organização e dinâmica da empresa. Não há sintonia, parceria, espírito de equipa, chefia e desta forma, não acredito que nenhuma empresa sobreviva. Vejo desmotivação em todos, começando por nós. Estou disponível para te ouvir e se assim o entenderes e quiseres podemos conversar pessoalmente, sem pedras na mão. Aguardo os teus comentários.”
13. Em 6.01.2020, CC… remeteu à Autora comunicação escrita onde escreveu: “Como já te disse e volto a referir a principal razão do meu afastamento de ti tem a ver com a tua postura super negativa, e de procura do erro em vez do oposto. Tu vês aquilo que queres ver, mas facilmente podias constatar qual a razão da diferença se assim o quisesses – Os trabalhos de fim de ano fizemos quase integralmente todos, até algum novo mais – a razão do valor da faturação a menos tem a ver com valores que pouco interferem nessas contas sendo que tens em Outubro 9000 euros de 3 catálogos da … todos feitos fora e em Dezembro tens 12000 euros das agendas da … que este ano só vamos fazer uma delas (a de menos valor) e só agora em Janeiro, mais 3500 euros de outro catálogo da … também todo feito fora, e 5000 euros de faturação não real – ou seja cerca de 20000 euros em Dezembro. Como tal se refizeres as contas vais ver que o aumento de faturação real no ano foi bem mais superior ao que tu queres ver e o final de ano não foi assim tão atípico como dizes. (…) Não consegues tu nem consigo eu – Tal como a tua área é desgastante a minha é bem mais – além do trabalho que já fazia, assumi novas funções para reduzir custos e tenho tentado otimizar a produção de maneira a reduzir os custos ao mínimo – a gestão fazemos o melhor que podemos e sabemos. Mais uma vez a tua postura negativa só te deixa ver o que queres ver. O ano passado tiveste 20000 no banco para conseguires fazer face aos compromissos que tinhas e eles desapareceram. Este ano não tiveste esses 20000 euros e apesar de estar a ser difícil conseguir cumprir os compromissos eles vão sendo cumpridos. As mudanças efetuadas de aumento de faturação e redução de despesas já surtiram algum efeito pois se não terias que neste semestre de ter arranjado 20000 euros como no ano passado. Agora claro que o ajuste demora a refletir e por isso este arrastar das contas e dificuldade de tesouraria. (…) Eu também presencio diariamente situações com as quais não concordo mas claramente não as mesmas que tu. (…) Regra geral respondo às poucas sugestões que fazes, sendo que quando são como a última (do registo extra de trabalhos estragados) em que notoriamente vejo apenas a tal BB… supernegativa e focada no erro a minha reação é apagar o mail o mais rápido possível para afastar essas tuas carga negativas e não entrar no teu barco do negativismo – se há algo que quero manter pela minha saúde e possível bem estar é uma mente e atitude positiva – o que não é fácil quando lido diariamente com uma pessoa que é exatamente o oposto. As mudanças acontecem com ações reais e concretas que têm impacto direto na empresa – quantas destas fizeste? (…) Neste momento a minha atitude para com a empresa é de ir gerindo o dia a dia, sem grandes metas nem grandes objetivos a longo prazo. O meu atual objetivo é fazer o necessário para liquidar as dividas e empréstimos que a empresa ainda tem. A seguir logo veremos. Da empresa para mim é que no mínimo a empresa me forneça a retribuição do meu trabalho. (…) A primeira parte da frase não concordo que seja de todo verdadeira – se assim fosse esse o teu desejo agirias de acordo com ele e como já referi fazes o completo oposto quando toda a tua forma de estar e trabalhar está focada no erro, no negativo, na critica e não nesse bem estar. A segunda parte acho que esse objetivo é de todos nós e em última análise de todo o ser humano. (…) Sim concordo que existem coisas que têm que mudar, mas mais uma vez não são claramente as mesmas que tu achas. (…) Concordo. A desmotivação existe sempre que nos sentimos impotentes para resolver os problemas que nos surgem e vemos que a nossa batalha vai sendo perdida pouco a pouco. No meu caso agravada por sentir que o meu empenho é posto em causa por ti, por desvalorizares o meu trabalho, por colocares em causa as minhas decisões e muitas vezes interferires nelas diretamente quando ao contrário eu nunca o fiz. Duplamente agravada pela plena convicção que além de tu não veres a diferença dos nossos papeis nesta empresa ainda sou completamente desvalorizado pela diferença salarial que existe entre nós, relativamente aquilo que fazemos, que produzimos e que representamos na empresa. Como tal cada dia que passa a minha desmotivação é maior sem dúvida. (…) Ao contrário de ti, continuo a dirigir-me diretamente a ti quando assim acho que tenho que o fazer para situações que assim o justificam. Quando te disse que queria evitar o contacto direto contigo no dia a dia, como já te expliquei não me revejo absolutamente em nada na tua postura e forma de trabalhar – se consegui aliviar um pouco toda negatividade e escuridão que estava a sentir à minha volta foi exatamente por essa distância e o não ter que lidar diariamente com o teu negativismo. Optaste ao contrário de mim por evitar qualquer tipo de abordagem direta mais uma vez demonstrando a tua postura negativa na vida pois como tiveste oportunidade de ver quando tenho que falar contigo falo. Estou e sempre estarei disponível para qualquer assunto que assim o justifique e se nunca o fizeste é porque não quiseste.”
14. Em 6.01.2020, a Autora remeteu comunicação escrita ao CC… onde escreveu: Em 1.º lugar a minha intenção não era estar aqui a trocar galhardetes contigo, mas não consigo continuar a fazer de conta; Reconheço e como disse o volume de faturação aumentou, aliás vem aumentando nos últimos 3 anos. Já o dezembro que costuma ser o melhor mês do ano, tal não aconteceu e foi o pior dezembro dos últimos 4 anos. As razões acho que são várias... Não sei em que te baseias para dizer que a tua área é bem mais desgastante do que a minha, se não a fazes, nem passa por ti. Também não entendo como conseguiste assumir novas funções, trabalhando menos tempo, com a certeza que há coisas que estão a ficar para trás, ou menos cuidadas, em prole de outras. Não cheguei a dizer-te quais são as coisas que presencio diariamente e não concordo, assim como tu não me disseste quais são as que tu não concordas, mas já deste o assunto como encerrado, partindo do princípio que não estamos de acordo e não há nada a fazer. As várias observações, reparos e iniciativas que vou tendo, incluem as poucas que são postas em prática na empresa e as outras não vão para a frente, porque tu apagas as minhas opiniões, porque as consideras negativas e peanuts, e nem sequer por respeito dás o teu ponto de vista e me respondes. Algumas dessas ações e tentativas de ações: - A criação de um mapa de prémios mensal, - A Campanha de fim de ano, do ano passado, - A persistência para que fossem realizados os calendários deste ano antes do final do ano, - A ideia em conjunto com o GG… e persistência para que fosse feito um folheto com trabalhos de fim de ano (que não saiu) e outro de apresentação, para novos clientes (que ainda também não saiu), - A ideia e projeto de fazer uma ficha de não conformidade para ter um maior controlo sobre os estragos e responsabilização dos funcionários (que consideraste, soube agora, uma manifestação de negativismo). Quais foram as ações desenvolvidas por ti? Eu espero mais da empresa. Além de querer pagar as dívidas e cumprir com os compromissos atempadamente, não ambiciono ter uma empresa milionária, mas quero mais e não quero apenas pagar as dívidas e depois logo se vê! Quanto à retribuição do teu trabalho, posso já adiantar-te que este mês (já te tinha alertado), entrou pouco dinheiro em relação aos valores a pagar em dinheiro. Por isso não tenho dinheiro para pagar nem a minha, nem a tua retribuição, e ainda falta pagar uma parte ao HH…. Eu disse que queria continuar, naquelas circunstâncias, tu pões em dúvida, mas de seguida dizes que é o objetivo de todos nós alcançar algo melhor, mas não te vi a traçar nenhuma meta ou objetivo para que tal possa acontecer. A minha ideia é falarmos sobre essas metas e objetivos... Falo-te precisamente em aspetos que acredito serem muito importantes a abordar para conseguirmos alcançar aquilo que todos queremos, mas tu muito vagamente dizes que concordas que há coisas que têm que mudar, mas não dizes quais, apenas assumes de imediato que nada tem a ver com o que eu penso. Este acho que é o teu principal problema. Se tu te achas desvalorizado por mim, como me hei de eu sentir, perante aquilo que dizes?! Eu estou perfeitamente bem comigo, com aquilo que sou, que faço, as minhas competências, profissionalismo e responsabilidades. Por muito que te custe eu sou tua sócia, não sou tua empregada e quando os pais passaram a empresa para nós, ambos concordamos com as condições. Vamos recuar 1 ano atrás: eu falava contigo normalmente, umas vezes melhor, outras pior, umas vezes respondias-me torto, outras respondia-te eu, mas falávamos. Até ao dia em que além de me ofereceres porrada, me proibiste de te dirigir a palavra. Como se não bastasse tudo à frente da II…. Achei que estavas de cabeça quente e voltei a insistir e falei contigo e mantiveste a tua posição. Foi uma falta de respeito muito grande e grave. Sei que depois disso me dirigiste a palavra sempre que entendeste e eu nunca te virei a cara. Como é óbvio eu deixei de o fazer. CC…, toda a negatividade e escuridão estão dentro de ti. Resolve as tuas frustrações. Coloca amor no teu coração e verás que a luz aparece. A única escuridão que tenho dentro de mim é de desilusão e tristeza.”
15. A Autora propôs ao seu irmão CC…, em alternativa, venderem a empresa, ceder-lhe a sua quota ao irmão ou este ceder à autora a sua quota.
16. O CC… aceitou ceder a sua quota à Autora.
17. A Autora enviou comunicação escrita ao seu irmão CC…, em 25.05.2020, com o seguinte teor: “Na sequência da nossa conversa e das circunstâncias atuais, a minha proposta é a seguinte: - Dar-te 1 000,00 euros/mês durante 50 meses, saindo de imediato da empresa, ou -Manter o teu salário da folha, durante 50 meses, mantendo as regalias de desconto para a segurança social, seguro de acidentes de trabalho. Alterando os estatutos para apenas eu como gerente. Tudo isto e com as devidas salvaguardas para ambas as partes, estipuladas e escritas com advogado.”
18. Em 26.05.2020, CC… respondeu à Autora, escrevendo o seguinte: “Em relação à proposta e comparativamente a valorização que foi dada à quota da FF… nem vale a pena comentar. Mas na fase em que todos estamos não vou sequer fazer nenhuma contraproposta em relação a esse ponto - Aceito a primeira opção. Existem contudo algumas condições que penso são lógicas e compreensíveis, - Relativamente a parte da divida da FF… que assumimos para comprar a quota dela terá que existir um documento em que claro assumirás o resto da divida para com ela - a tua parte e a minha - O restante do meu salario destes 2 ou 3 meses que ainda não recebi terão que ser liquidados na data da minha saída - Terá que existir um documento da tua parte tal como foi com a FF… a assumir a divida como pessoal - Terá que existir um documento que em caso de incumprimento da AA… em relação às dividas ainda vigentes qualquer valor que me seja imputado devido ao meu aval pessoal reverterá sempre para ti
Satisfeitas essas condições como disse não coloco qualquer entrave a avançar para o advogado tratar o que for necessário.”
19. A Autora retirou a sua proposta de aquisição da quota do seu irmão CC….
20. Em 29.06.2020, a Autora remeteu comunicação escrita a CC… com o seguinte teor: “Conforme reunião na passada quinta-feira, com o Dr. JJ… e de acordo com o que foi dito e acordado perante ele; qualquer assunto ou alteração à dinâmica da empresa, terá que passar por ele e ele servirá de mediador na passagem de informação e nas decisões tomadas. Passa a informação que pretendes alterar a ele, pois eu só lhe respondo a ele, que posteriormente fará chegar a ti. Contigo continuarei apenas a tratar das situações triviais e essenciais da empresa.”
21. Em 29.06.2020, CC… remeteu comunicação escrita à Autora e à funcionária da Ré, de nome II…, com o seguinte teor: “Em virtude aos últimos eventos apresento aqui algumas diretrizes éticas e legais que terão necessariamente de ser implementadas já a partir de dia 1 de julho de 2020. Não estou a exigir nada que seja ilegal nem a exigir nada a outros que eu da mesma maneira irei cumprir escrupulosamente. Realço que levarei às últimas consequências qualquer infração a estas diretrizes – algumas dessas possíveis consequências serão também para mim mas da minha parte estou pronto para tudo.
Viaturas: As viaturas da empresa são para uso único e exclusivo dos 2 gerentes e funcionários da empresa e para funções unicamente de trabalho. Como tal ninguém extra empresa pode usar qualquer das viaturas independentemente da finalidade - Nenhum gerente ou funcionário pode usar a viatura para qualquer finalidade de âmbito pessoal. Como tal urgentemente colocar gps nas viaturas que ainda não o tenham instalado e fornecer os dados de acesso a ambos os gerentes. Para que se compreenda que levarei esta questão às últimas consequências no caso de eu detetar que alguém extra à empresa usou ou está a usar qualquer viatura da empresa de imediato apresentarei queixa na GNR de desvio e uso ilegítimo de bem.
Faturação: - Acabar de forma imediata com faturação paralela. A partir deste momento não se venderá mais nenhum item seja ele qual for sem a emissão de uma fatura legal e como tal cessará o mais rápido possível qualquer movimentação de dinheiro que não seja proveniente de faturas legais de clientes e fornecedores; O dinheiro que possa existir em caixa proveniente dessa mesma faturação até à data será colocado nas instalações da AA… em local a designar com acesso a ambos os gerentes e até esse dinheiro acabar. Para que se compreenda que levarei esta questão às últimas consequências no caso de eu detetar a emissão de qualquer talão ou o movimento de qualquer dinheiro ou valor a partir de dia 1 de Julho de 2020, sem existir um documento legal para o efeito na mesma hora apresentarei uma queixa na Autoridade Tributária como parte interessada e responsável da empresa alheio a esse movimento ilegal.
Salários: Todos os salários passarão a ser unicamente aqueles que estão nos recibos de salário com o respetivo subsidio de alimentação para todos os funcionários incluído os 2 gerentes da empresa. Não haverá lugar a qualquer tipo de subsidio extra de qualquer teor ou a qualquer despesa que não tenha a ver única e exclusivamente com a empresa.
Viagens para visitas a clientes/fornecedores: A partir de dia 1 de julho todas as viagens necessárias para visitas a clientes/fornecedores serão feitas de forma alternada entre mim e a BB…, sendo que não admitirei de forma nenhuma que qualquer dessas funções ou tarefa seja passada ao GG… a não ser que esteja dentro da sua rota já programada, mas que não cancelará a próxima viagem a quem de direito pertence. Para tal irei fornecer um mapa à II… no qual ficará registado quem foi e em que dia e nunca farei 2 viagens consecutivas (tal como a BB…) a não ser por motivo de força maior. Para que se compreenda que levarei esta questão às últimas consequências sejam quais forem as consequências para algum trabalho, entrega inadiável, etc., não irei fazer nova viagem enquanto a BB… não tiver feito a sua e pela questão que já coloquei das viaturas não poderá delegar em ninguém externo à empresa para utilizar alguma viatura para esse efeito - se alguém o fizer numa viatura extra à empresa para a substituir não considerarei que foi cumprida a vez da BB… e como tal continuará a sua obrigação de a fazer.
Em relação à questão do meu horário de entrada na empresa a partir do dia 1 de julho de 2020 será exatamente o mesmo de todos os funcionários.
Envio este mail à BB… e neste caso à II… porque a II… neste caso será parte ativa nestas alterações.
II… peço desculpa de te dar mais um encargo e não quero que sintas que vais ser algum tipo de policia - nada disso - tem a ver com questão dos talões e com a questão do mapa de viagens entre mim e a BB… que terás de ser tu a gerir e teria forçosamente de passar por ti também até para teres noção das questões e implicações legais por trás do não cumprimento destas diretrizes que podem em última instância ter também consequências legais para ti, como tal tinhas forçosamente que ter conhecimento das mesmas.”
22. Em 01.07.2020, CC… remeteu comunicação escrita à Autora, com conhecimento à funcionária da Ré, de nome II…, com o seguinte teor: “venho por este meio informar que a partir do dia de ontem deixei a carrinha da empresa que me está atribuída nas instalações da AA…. A partir do dia 1 de julho de 2020 não mais utilizarei a carrinha para me deslocar do trabalho para cada e de casa para o trabalho. Já não utilizava para outros fins que não de trabalho (à parte deste) e como tal a carrinha estará sempre nas instalações da empresa a não ser quando tenha de me deslocar a serviço da AA…. Não espero outra coisa da tua parte que não seja o cumprimento da mesma forma do uso da viatura da empresa para assuntos apenas da empresa e nunca de carater pessoal. Reservo-me o direito de exigir contrapartidas financeiras no caso de detetar qualquer utilização da tua parte para qualquer assunto que não da empresa. Como tal sempre que isso aconteça irei proceder à emissão de uma declaração com comprovação de testemunhas, com as quais farei um processo e em caso de necessidade, como referi, irei exigir contrapartidas financeiras pelo uso indevido da viatura sem o consentimento expresso de um dos sócios gerentes.”
23. Em 09.07.2020, CC… remeteu comunicação escrita à Autora, com o seguinte teor: “De acordo com as várias alterações orgânicas que terão que ocorrer na empresa, venho por este meio exigir que a partir da próxima segunda-feira dia 13 de julho de 2020 eu tenha acesso total ao caixa da empresa. O caixa terá que ser fechado todos os dias por ambos com conferencia e assinatura de ambos e ambos terão que ficar com uma cópia do mesmo documento. O dinheiro em caixa ficará na empresa em local a designar por ambos com acesso a ambos. Fornecerei amanhã à II… novas folhas de controle de caixa com melhor organização e separação de transferências, cheques e numerário as quais passarão a ser usadas em vez das folhas atuais que têm tudo misturado e de difícil acesso. O caixa será feito de maneira para que qualquer dos sócios em qualquer altura possa facilmente conferir o que entrou em dinheiro, o que está em dinheiro no caixa, o que nesse dia entrou de transferências e o que entrou de cheques. Fico a aguardar o teu feedback durante o dia de amanhã para isto entrar em vigor como disse na próxima segunda feira dia 13 de julho. Em caso de recusa da tua parte irei além de elaborar nova ocorrência, tomar todas as medidas legais para salvaguardar os meus direitos de sócio (ainda por cima maioritário) na empresa.”
24. CC… comunicou as regras referidas em 16, 17 e 18, sem previamente as ter acordado com a autora, que delas não teve conhecimento prévio.
25. A Em 02.07.2020, a Autora remeteu ao advogado JJ…, comunicação escrita com o seguinte teor: (…) Gostava de acrescentar e reforçar que a instabilidade entre ambos já vem de anos atrás, já com várias tentativas minhas de encontrar um ponto de equilíbrio e comunicação. A minha tolerância é mais do que muita e a partir de certa altura e com as constantes faltas de respeito do meu irmão para comigo, decidi não tolerar mais certas atitudes e comecei a fazer pressão para que as situações tomassem um rumo diferente, para bem de todos. Numa das últimas discussões e em desespero, disse-lhe que não havia mais condições para continuarmos a trabalhar juntos e teríamos 3 opções: ou ficava ele, ou ficava eu, ou vendíamos a empresa e ele recusou qualquer das opções, apenas aceitou que lhe fizesse uma proposta para ele sair. Reconheceu que não era viável continuarmos juntos por sermos incompatíveis. Que estava farto de mim, da AA… e deste trabalho, embora tivesse dito que estaria disposto a levar os compromissos assumidos até ao fim. Como recuei na minha proposta ele ficou indignado e passou a ações que o Dr. já é conhecedor. Na realidade penso que eu já deveria ter tido esta atitude há mais tempo, pois com isso ele moveu-se e tomou iniciativas, pena é que foram iniciativas para causar mal estar, transtorno e arranjar mais problemas em vez de soluções, que poderiam ser pensadas em conjunto, para bem de todos, como tantas vezes lhe solicitei. (…).
26. Em 09.07.2020, CC… remeteu comunicação escrita à Autora, com o seguinte teor: “Como deves ter reparado as idas ao fornecedor que seriam ontem da tua competência, seguindo a distribuição equitativa de tarefas, como te recusaste fazer, e já o terceiro dia seguido que para salvaguardar os interesses superiores da empresa eu volto a fazer. Hoje dia 9 de julho de 2020 existem novas visitas que são necessárias efetuar na zona da Maia. Mais uma vez te informo que 6 a tua vez de assegurares essas visitas. Aguardo ate as 14:30 horas que me informes se vais ou não assumir essas visitas. Se até essa hora não receber uma resposta da tua parte e não efetuares as visitas, mais uma vez para salvaguardar os interesses da empresa irei eu novamente. Irei no entanto, proceder a elaboração de nova ocorrência a qual anexarei ao processo.”
27. A 10.07.2020, ao retornar ao seu escritório, a Autora deparou-se com os seus documentos em desordem, tendo questionado por escrito o seu irmão sobre se havia sido o mesmo a entrar no seu escritório e se procurava algum documento, ao que o mesmo respondeu por escrito “Todos os documentos relativos a AA… são de ambos, não tenho que pedir acesso a eles, se tens documentos pessoais que não queres que eu aceda tens que os guardar noutro sitio, mas como não encontrei o que queria vou enviar por mail o que necessito.
28. Em 10.07.2020, CC… remeteu comunicação escrita à Autora, com o seguinte teor: “Preciso que me indiques onde tens os documentos ou que mos entregues, para eu poder aceder ao seguinte, -Listas, relatórios, comprovativos de todos os valores relativos aos pagamentos aos pais -Folhas com as contas de todos os meses dos nossos pagamentos em numerário e transferências dos nossos salários dos últimos 2 anos -Balancetes analíticos dos últimos 2 anos -Relatório de movimentos e saldos do caixa AA…, Lda. dos últimos 2 anos. Ao mesmo tempo alerto para o seguinte: -Não aceito que a partir deste dia seja metida como despesa da empresa qualquer fatura de caracter pessoal minha ou tua, seja qual for o efeito. Aguardo resposta o mais urgente possível.”
29. Em 29.07.2020, CC… remeteu comunicação escrita à Autora, com o seguinte teor: “Mais uma vez informo-te que é a tua vez de efetuares as visitas necessárias para a tarde de dia 29 de julho. É necessário ir Santo Tirso a 2 sítios e a Maia. Aguardo hoje até as 14 horas uma resposta, que me confirmes se vais ou não efetuar as visitas. Em caso negativo ou de não resposta, mais uma vez irei assegurar as mesmas e consequentemente elaborar mais uma ocorrência para adicionar ao processo.
30. Em 31.07.2020, a Autora remeteu ao advogado JJ…, comunicação escrita com o seguinte teor: (…) Na sequência da última reunião e conforme combinado envio a minha proposta para tentativa de acordo com o meu irmão, no sentido de ser possível a permanência e convivência de ambos na nossa empresa: Em relação a "proposta" do meu irmão, tenho a dizer o seguinte: 1.º - Não aceito e considero intolerável, que qualquer um de nós tome decisões ou faça alterações a orgânica e funcionamento basilares da empresa sem prévio acordo entre ambos. Posto isto, vou considerar as "diretrizes" do meu irmão, como uma proposta. 2.º - Não estou de acordo e não aceito que não possa fazer uso das viaturas da empresa para uso pessoal. E lógico que o uso não poderá ser abusivo e considero um benefício legitimo dos sócios gerentes, utilizarem as viaturas da empresa quer seja para trabalho ou serviço pessoal. 3.º - Aceito e concordo que seja melhorado o documento de controle do caixa com movimentos e saldo diário, conferido por ambos. Quanto ao dinheiro em caixa, devera ficar a responsabilidade de um de nós, sendo que não faço questão de ser eu. 4.º -Acho de toda a justiça usufruirmos do mesmo salário e das mesmas regalias. 5.º -Aceito e concordo que o vendedor faça um planeamento semanal das visitas, mas de alguma forma acompanhando de perto o seu trabalho, concluo que o seu tempo, visitas e viagens podem ser melhor rentabilizadas e otimizadas. Deixo para reflexão, assim como uma possível alteração nas variantes das comissões. 6.º -Estou recetiva a fazer o que for necessário, souber e puder para o bom funcionamento da empresa, de forma a não pôr em causa o bom desempenho das minhas habituais tarefas e sem qualquer tipo de imposição ou regra inflexível.
Outras minhas pretensões: 1.º - Criação de Registo de Não Conformidades, para que sejam registadas todas as ocorrências, como estragos de trabalhos, reclamações de clientes e respetivas consequências e custos e/ou prejuízos. 2.º -Implementação de controle de stocks (aceito sugestões). É necessário ter noção clara e controle sobre os desperdícios. 3.º - Adaptação da listagem de trabalhos e provas, de forma a que quando um prazo não seja cumprido, fique registado o motivo e a nova data. 4.º - Existem outros assuntos não menos importantes, que terão que ser falados pessoalmente. Sendo esta a minha posição, estou recetiva a alterações e/ou adaptações, salvaguardando os superiores interesses da empresa. (…).”
31. Em resposta à Convocatória referida em F), a autora remeteu a CC… carta datada de 12.08.2020, a solicitar-lhe esclarecimentos em relação à ordem de trabalhos, nomeadamente indagando se a assembleia visa a sua destituição de gerente com ou sem justa causa, e questionando o local escolhido para a realização da assembleia, por não ser a sede da Ré, não tendo sido apresentado qualquer fundamento e querendo saber se estaria presente o advogado do sócio CC….
32. Em resposta à carta da autora, CC… remeteu-lhe carta datada de 12.08.2020, onde escreveu: (…) Como sabes, apesar de existirem um conjunto de comportamentos da tua parte que colocam em causa a viabilidade da nossa empresa, não pretendo avançar com a ação judicial nem proceder à destituição com justa causa, motivo pelo qual procedi à marcação da Assembleia com a ordem de trabalhos que já tens conhecimento. (…) A destituição de gerente pode ser livremente tomada por decisão unilateral da sociedade, independentemente da existência de justa causa, como é o nosso caso. Quanto à indemnização devida ao gerente destituído sem justa causa não me irei pronunciar quanto à mesma que, como sabes, deverá ser decidida judicialmente e para tal tem de ser provada, não bastando a simples invocação da perda da remuneração devida pelo exercício da gerência. Quanto à realização da Assembleia, a mesma vai-se realizar na Rua …, n.º .., ….-… Paços de Ferreira uma vez que, como sabes perfeitamente, a sede social não tem as mínimas condições para podermos, juntamente com os nossos advogados, reunirmos, falarmos e realizarmos a Assembleia, ao contrário das outras Assembleias em que apenas assinávamos as atas. Assim sendo, mantenho o local para a realização da Assembleia na Rua …, n.º .. – ….-… Paços de Ferreira. Por último, informo que poderão estar presentes na assembleia quer o teu como o meu advogado, (…).”
33. Em resposta à carta de CC…, a Autora remeteu-lhe comunicação em 24.08.2020, onde escreveu: (…)continuas a afirmar que tenho comportamentos que “colocam em causa a viabilidade da nossa empresa” sem que concretizes quais. Sem que identifiques esses comportamentos não consigo responderás tuas insinuações. Solicito que concretizes quais os meus atos ou atitudes que prejudicam a empresa para me pronunciar. (…) na tua carta de convocação da assembleia não tenhas concretizado se a destituição da gerência era com ou sem justa causa e não tenhas marcado a assembleia para o local onde legalmente a mesma se deve realizar. (…) Relativamente à indemnização em caso da minha destituição de gerente, ao contrário do que afirmas a mesma pode ser acordada extrajudicialmente, a não ser que estejas enquanto sócio e gerente já com a decisão tomada quer em destituir quer despender recursos da empresa num processo judicial. Uma vez mais reafirmo que investi toda uma vida na empresa que é da nossa família há décadas. Desde adolescente orientei a minha formação profissional e foi a única profissão que tive com a qual sustentei e sustento a minha família e perspetivei justificadamente nela o resto da minha atividade. Por isso, adquiri a quota à nossa irmã (que ainda estou a pagar), aceitei responsabilizar-me pessoalmente por financiamentos da empresa. A tua decisão em me destituir prejudicará gravemente a empresa porque alguém terá de fazer as atividades por mim desenvolvidas e ressarcir-me dos prejuízos causados pela sua eventual decisão abusiva e prejudicial aos interesses da empresa, tomada apenas porque tens mais 3% do capital social que usas para interesses pessoais para os quais te vens preparando. (…) Apesar de continuar a entender que nos termos legais a assembleia tem de ser realizada como sempre foi nas instalações da empresa que tem sala com espaço, mesa, cadeiras suficientes para albergar os sócios e os advogados até porque nesse dia a empresa está fechada de férias, não quero fazer que isso seja impedimento, estando disponível para deslocar ao escritório do teu advogado, acompanhada do meu.
34. Em resposta CC… remeteu comunicação à Autora, em 25.08.2020, onde escreveu: (…) julgo que o meu e-mail foi bastante claro quanto ao facto de a destituição, a ocorrer na assembleia agendada para o dia 02 de setembro de 2020, será sem justa causa, só assim o poderá ser, como sabes, visto que sempre foste informada pelo advogado da empresa (Dr. JJ…), pelo que estranho que de um dia para o outro tudo isto pareça novidade para ti. Sempre foste devidamente esclarecida quanto à possibilidade da existência da destituição dos gerentes, aliás, foste tu quem decidiu de um momento para o outro dizer que não existiam condições para que ambos exercêssemos a gerência, foste tu que apresentaste uma proposta para aquisição da minha quota, que foi por mim aceite, e foste tu que também desististe da compra logo, não se compreende a tua abrupta estupefação quanto à possibilidade de destituição. Como sabes, tivemos várias reuniões com o advogado da empresa em que discutimos diversos assuntos, desde aquisição de quotas, bem como atos de gerência, e sempre foste informada de que a destituição de gerente poderia ocorrer de duas formas, ou com justa causa ou sem justa causa, está última através de deliberação dos sócios, sendo que também sempre soubeste o valor da quota de cada um, por isso estranho a tua surpresa repentina. Dizes que estás assessorada e por isso deves saber que não estou a cometer qualquer ilegalidade e as sociedades não poderão ficar reféns da vontade dos sócios minoritários, sendo que, caso a empresa venha a ser condenada a pagar-te algum montante, a mesma fará tudo para cumprir os seus compromissos para contigo e para com todos, o que sempre foi e será nosso apanágio. (…)
35. Em resposta a CC… a Autora remeteu-lhe comunicação, em 27.08.2020, onde escreveu: “(…) não sabia que me podias destituir de gerente! Achas que se soubesse alguma vez queria ficar com a quota da nossa irmã? Achas que alguma vez assumia a qualidade de fiadora nos empréstimos da empresa? Aliás, quando foi para dividir as quotas entre nós os dois, na presença dos nossos pais e do Dr. JJ… questionei se havia algum problema em tu ficares com mais 3% do capital social. Ao que o Dr. JJ… referiu não haver qualquer problema: "são os dois gerentes mandam os dois igualmente". É igualmente mentira que alguma vez referisse que não tínhamos condições de sermos os dois gerentes. Antes da tua convocatória para a Assembleia geral, andávamos em conversações para chegar a acordo de entendimento e convivência. Durante muito tempo não te interessaste pela empresa, chegavas às 11H00 ou 11H30 e saías aquando dos funcionários. De repente unilateralmente e sem falar comigo e através de email dirigido com conhecimento dos colaboradores da empresa estabeleceste e impuseste unilateralmente um conjunto de regras, com as quais na generalidade concordo. Não concordo é que como gerente como eu não tenhas falado comigo antes e tenha sabido das mesmas aquando dos funcionários. Para além de ilegal, pois todas as decisões da gerência têm de ser tomadas em conjunto e não unilateralmente por ti, também comunicar por email aos funcionários situações que apenas dizem respeito à gerência, não é correto, cordial e não acautela os interesses da empresa, transparecendo mau estar para os colaboradores. As sociedades não podem ficar reféns de decisões do sócio, só porque tem apenas mais 3% e delibera de forma premeditada e de acordo com os seus interesses pessoais e não o interesse social, bem sabendo que com essa decisão vai prejudicar gravemente a sobrevivência da sociedade quer pelo custo financeiro da indemnização quem e é devida, quer pela necessidade de alguém que desempenhe as funções que desempenho na sociedade. (…)”
36. Em resposta CC… remeteu à Autora comunicação, em 28.08.2020, onde escreveu: “(…) É pena de facto que aquilo que me acusas seja exatamente o que com este mail demonstras: que na falta de argumentos reais e válidos começam as meias verdades, as inverdades e as mentiras, tudo misturado com um pouquinho de sal, metendo tudo na mesma panela, dizendo várias vezes as mesmas mentiras, julgando que comisso elas se transformam em verdade. Não podias pois estar mais longe da verdade - por mais vezes que digas uma mentira ela não se torna verdade - apenas demonstra o carácter de quem as diz. Os pais nunca estiveram presentes nas reuniões com o Dr. JJ… referentes a este processo que estamos a passar, e essas reuniões com o Dr. JJ… tiveram origem na tua afirmação e propostas registadas por escrito, sendo que a primeira reunião que foste tu própria que agendaste para contratualizarmos a proposta por ti efetuada e aceite por mim com todas as condições que impuseste para eu sair da empresa e tu assumires a gestão e propriedade total da mesma. Numa demonstração, uma vez mais, da tua impreparação, atitudes irresponsáveis e irrefletidas, acabaste por voltar atrás quando o Dr. JJ…, transparente, integro e claro como sempre foi, te faz algumas perguntas simples, de carácter financeiro e técnico, acerca das tuas intenções e, de repente, cais na real e voltas atrás quando te apercebes que não reúnes as mínimas condições para o fazer. O Dr. JJ… a partir daí e de uma forma altruísta, como advogado da empresa há já muitos anos, assume o compromisso pessoal, como disse ele - "até nem vou cobrar as reuniões", em conjunto e em separado na tentativa de nos ajudar a encontrar alguma forma de entendimento. Reafirmo, que nestas reuniões nunca os nossos pais estiveram presentes, sendo lamentável que o digas, bem sabendo que mentes. Fizeste de conta que não percebeste que eram a essas reuniões a que me referia no mail anterior, e não a reuniões efetuadas há 6 ou 7 anos atrás em que de facto estivemos reunidos com os pais para as doações de quotas da empresa. Nestas reuniões com o Dr. JJ… foste alertada de uma forma clara pelo Dr. JJ… (que se necessário ele pode confirmar) da tua situação em relação à tua posição minoritária, citando, ele disse: "BB… neste momento nas situações de gestão corrente e diária vocês têm o mesmo poder de decisão, mas se o seu irmão convocar uma Assembleia Geral quem manda é ele..." - Estas foram as palavras dele - não sei com que dúvidas podes tu ficar desta afirmação - mais, logo a seguir na sequência dessa afirmação do Dr. JJ… eu disse-te de uma forma muito clara que não existindo da tua parte a mínima intenção de cederes em coisas tão transparentes e claras como as que exigi de igualdade, eu iria tomar medidas mais drásticas e pedi-te que não voltasses a fazer a triste figura que fizeste na primeira reunião com o Dr. JJ…, que te informasses bem dos teus direitos porque depois eu não voltaria atrás quando isso acontecesse, ao que tu respondeste de uma forma bem clara - "Estou preparada para tudo". Sempre fiz tudo e tudo tenho feito para conseguimos juntos gerir a nossa empresa, apresentei um conjunto de regras e pedi-te que também apresentasses as tuas regras/exigência (o que nunca fizeste) para que a nossa convivência na empresa fosse saudável e permitisse que, juntos, trabalhássemos e geríssemos. Mesmo em relação à tua triste justificação que na altura da divisão de quotas não sabias das consequências do que assinaste por eu ter ficado com mais 3% e logo como sócio maioritário, mais uma vez isso demonstra a tua falta de preparação e qualificação para gerires assuntos com esta importância, pois devias saber que se há algo que não podes alegar é desconhecimento quando te imputam consequências legais dos teus atos - experimenta dizer a um policia que não te pode multar por circulares a 150km/h numa autoestrada pois não sabias que o máximo que podes circular é 120km/h. O que assinaste tal como eu, assinaste de livre e espontânea vontade e com o conhecimento legal das suas implicações às quais agora não podes alegar desconhecimento, aliás, fomos sempre devidamente esclarecidos em todos os passos que demos, mesmo os nossos pais, visto que obtiveram sempre aconselhamento jurídico. É completamente falso a referência que fazes aos meus horários de trabalho. Estou na empresa desde os meus 19 anos, e desde cedo assumi de uma forma bastante responsável todas as minhas obrigações e responsabilidades e nunca a questão do horário teve qualquer implicação no meu rendimento ou aplicação. Nunca tive horário de entrada nem nunca tive horário de saída. Como facilmente qualquer funcionário da empresa pode confirmar, se necessário, desde noites de trabalho, diretas, sábados, nunca existiu qualquer questão de eu não assumir as minhas responsabilidades e sempre dei tudo de mim pela empresa a todos os níveis e funções - sempre fiz tudo o que era necessário para o melhor da empresa – fosse como operário nas máquinas, em trabalhos manuais, nos acabamentos, em trabalho de escritório, em entregas ou visitas, em manutenções ou reparações e claro nas minhas funções principais de orçamentação e gestão de produção, ao contrário de ti que sempre fizeste apenas o teu trabalho administrativo e entrando praticamente à mesma hora de manhã que eu (como facilmente posso provar) e nunca ajudando a empresa em qualquer atividade extra ou horário extra à tua função administrativa. Em todas as noites que trabalhei junto com outros funcionários, nunca uma única vez perguntaste sequer se a tua ajuda era necessária. De qualquer forma como referiste que o meu horário de entrada era para ti inadequado, eu numa demonstração de boa fé, informei-te que a partir do dia 1 de Julho de 2020 iria passar a entrar ao mesmo horário dos funcionários e a utilizar o relógio de ponto para ficar registado e que claro esperava que tu fizesses o mesmo, ou seja, o que pediste que fizesse passei a fazer o que demonstra a minha boa fé de juntos, conseguirmos gerir a empresa. Exigiste de mim o cumprimento de um horário, e tu, cumpriste esse horário? O certo é que mais uma vez e demonstrando a incoerência e inflexibilidade das tuas posições, continuaste a entrar todos os dias entre as 10:00 e 10:30 horas e sem usar o relógio de ponto, como disse, posso facilmente comprovar a diferença entre as nossas posturas. Referes que tomei medidas de forma unilateral e dando conhecimento aos colaboradores - mais uma camada de meias verdades com mentiras. Primeiro a única pessoa a quem dei conhecimento de algumas questões foi à II…, mas tive o cuidado de previamente te informar e justificar porquê, e não te opuseste a isso portanto, não podes alegar desconhecimento pois informei-te por escrito e a justificação está nessa mesma comunicação portanto nem sequer te preciso voltar a referir - basta leres o email. Segundo, não tomei medidas nenhumas unilaterais - existe uma grande confusão na tua cabeça entre medidas unilaterais e exigência de cumprimento de um código de conduta igualitário que apresentei para ambos os gerentes, o qual eu cumpro de uma forma criteriosa e tu simplesmente ignoraste uma vez mais de uma forma irresponsável, arrogante e irrefletida, e uma vez mais com consequências que não podes alegar desconhecer porque te foram transmitidas inúmeras vezes - uma vez mais facilmente posso provar tudo isto. Não estás obrigada a cumprir esse código de conduta, é certo, mas tiveste oportunidade de apresentar as tuas condições para que juntos conseguíssemos gerir a empresa, e nada fizeste. Mais uma vez, fui eu que tudo tenho feito para que juntos conseguíssemos gerir a empresa, sempre tive uma postura conciliadora e de tentar ultrapassar os problemas, sendo que a melhor forma de o fazer é criar um conjunto de regras, que não foram acatadas por ti. Tens razão total quando dizes que a empresa não pode ficar refém de 3%, neste caso confundiste quais os 3% pois, como facilmente se pode constatar em todas as comunicações que trocamos, tudo o que fiz e disse foi na completa salvaguarda dos interesses da empresa ao contrário de ti que, por uma questão de puro orgulho irracional ignoraste todos os prejuízos que as tuas atitudes poderiam provocar na empresa se não fossem salvaguardados por mim. Em relação à sobrevivência da empresa, uma vez mais reafirmo que tudo o que faço é a pensar na nossa empresa e não em mim, e ao pensar na nossa empresa estou a pensar em ti e nos nossos pais, pois o cumprimento das diversas responsabilidades junto dos credores, clientes e funcionários deve ser o nosso objetivo, e não os nossos interesses pessoais que, tu sabes, coloquei de parte e sempre tudo tenho feito para o bem da empresa. Em relação a qualquer indemnização, como já deves ter sido informada pelo teu advogado, ela terá que ser acionada por ti e provada em tribunal - o que já é outra questão e que na altura devida será tratada com toda a atenção e respeito que merecem e, no caso a empresa ou até eu a título pessoal formos condenados a pagar algum montante a título de indemnização, assumirei as minhas responsabilidades e tudo farei para as resolver. Relativamente a esta troca de galhardetes esta será a minha última resposta aos teus mails, pois não acrescentam nada de novo, sendo que deves estar a tentar obter informações para um eventual processo judicial, lamento que o faças com mentiras. Caso apresentes propostas concretas estou como sempre estive disponível para as receber e analisar, caso contrário, não responderei a mais comunicações de teor similar ao que recebi. (…).
37. A Autora não recebeu qualquer quantia da Ré, a título de indemnização, na sequência da sua destituição do cargo de gerente da Ré.
38. A Autora reside por cima das instalações da Ré.
39. Era a Autora quem abria diariamente as instalações da Ré, pelas 08:30 horas, ausentando-se de seguida para regressar mais tarde, entre as 10:00 e as 10:30 horas.
40. CC… chegava às instalações da Ré entre as 10:00 e as 10:30 horas, habitualmente.
41. Após a destituição de gerente da autora, passou a ser CC… quem abre as instalações da Ré, pelas 08:30 horas.
42. Até à destituição de gerente da Autora, o CC… era o responsável pelos orçamentos e pela produção na Ré, fazendo também entregas a clientes.
43. Até à sua destituição de gerente, a Autora não fazia entregas a clientes nem trabalhos de produção.
44. Até à destituição de gerente da Autora, o CC… não executava funções administrativas na Ré.
45. Quando era necessário trabalhar para além das 18:00 horas (horário de fecho normal da Ré), a Autora não estava presente na empresa.
46. Quando era necessário trabalhar para além das 18:00 horas, o CC… estava sempre presente.
47. Quando era necessário trabalhar para além das 18:00 horas, o marido da autora vinha ajudar nas tarefas de produção sendo-lhe pagas as horas que trabalhava para a Ré.
48. Após a sua destituição de gerente, a Autora nunca mais exerceu as funções administrativas que vinha desempenhando na Ré até então, sendo-lhe distribuídas tarefas na produção e de entregas a clientes.
49. A funcionária II…, que é administrativa da Ré, sempre trabalhou no escritório e nunca executou tarefas na produção nem de entregas a clientes.
50. Após a destituição de gerente da Autora, as tarefas que vinha desempenhando passaram a ser executadas pela funcionária II….
51. Após a destituição de gerente da Autora, a limpeza das instalações da Ré passou a ser feita por uma empresa externa, pertencente à ex-mulher do CC….
52. Antes da destituição de gerente da Autora, quem fazia a limpeza das instalações da Ré era a mesma pessoa que efetuava serviços de limpeza em casa da Autora e dos pais desta.
53. Desde a saída de gerente da Autora, a Ré reduziu os seus custos com energia elétrica, em virtude de terem reduzido o intervalo para o almoço em trinta minutos, levando a que a laboração diária terminasse meia hora mais cedo, passando as máquinas a estarem ligadas menos meia hora por dia, já que permanecem ininterruptamente ligadas desde a manhã até ao encerramento da laboração diária.
54. Após a destituição da Autora, a Ré reduziu os seus custos em combustível, em virtude da reorganização feita pelo CC… das deslocações para entregas a clientes.
55. Após a sua destituição, a Autora continuou a auferir o mesmo salário que vinha auferindo anteriormente.
56. Após a destituição da Autora, os salários auferidos por CC… e pelos restantes trabalhadores da Ré foram aumentados, o primeiro no montante de 60 euros, e os restantes na proporção correspondente ao aumento do salário mínimo nacional.
57. Após a destituição da Autora, esta apagou todos os e-mails existentes (recebidos e enviados) do seu endereço eletrónico profissional, causando transtornos à Ré, por desconhecimento dos acordos de pagamento feitos com clientes e dos contactos realizados com os Bancos.
58. Quando cessou funções de gerente, a Autora não deixou quaisquer registos dos montantes recebidos em numerário e das saídas do Caixa.
59. Após a destituição da Autora, durante alguns dias não foi possível efetuar pagamentos em homebanking, por ser necessária a validação com o código a enviar para o cartão de telemóvel utilizado pela Autora, que esta não deixou na empresa.
60. Os conflitos existentes entre a Autora e CC… causavam mal-estar na empresa e afetavam os restantes trabalhadores.
61. Após a destituição da Autora, CC… exigiu ao anterior sócio gerente (DD…) a entrega do veículo que este utilizava, o qual fora adquirido em regime de Lessing, sendo a Ré quem efetuava o pagamento das respetivas rendas.
62. Na sequência do pedido referido em 60, DD… solicitou à Ré a entrega das suas instalações já que estas se encontram num prédio da sua propriedade.
63. Em 13.10.2020, foi homologado por sentença, o Acordo obtido nos autos de Procedimento Cautelar instaurado pela Requerente BB… e a requerida “AA…, Lda.”, do seguinte teor: “A Requerida reconhece que a Requerente é sua trabalhadora desde 01.03.1992, tendo o contrato ficado suspenso no período de 04.02.2014 a 02.09.2020 e que nesta data a Requente readquiriu o estatuto de trabalhadora por conta de outrem e deveria ter continuado ao serviço da Requerida. Tendo a requerida aceitado reintegrar imediatamente a requerente ao seu serviço com efeitos retroagidos ao dia 03.09.2020, sem prejuízo da sua antiguidade. Não é devida à Requerente a retribuição do mês de setembro de 2020 nem a retribuição até 09.10.2020, uma vez que a requerente se encontrava de baixa médica. A Requerente continuará a desempenhar as funções correspondentes à categoria profissional de administrativa, e demais funções que até aqui desempenhava, de segunda a sexta, das 09h às 18h30m, com intervalo de almoço das 12h30m às 14h. A Requerida compromete-se a pagar à Requerente a remuneração mensal ilíquida de oitocentos euros, acrescida da quantia devida de subsidio de alimentação.”
64. A Autora sofreu desgaste psicológico decorrente dos conflitos existentes entre si e o seu irmão CC…, agravado pela sua destituição de gerente da Ré.
65. Por via da sua destituição de gerente, deixando de exercer as funções administrativas que desempenhava no escritório da Ré, passando a executar tarefas na produção, enquanto outra funcionária passou a executar as suas anteriores funções, a Autora sofreu quebra de prestígio profissional e social.
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2. FACTOS NÃO PROVADOS
Com interesse para o objeto do presente litígio não se provaram os seguintes factos essenciais:
a) A Autora cumulava também as funções de gestão de visitas e vendas, sendo responsável pela gestão de crédito a atribuir aos clientes e análise de risco dos mesmos.
b) A Autora prestava ainda apoio no atendimento telefónico e presencial a clientes e fornecedores.
c) Sempre que era necessário, designadamente em períodos de maior volume de trabalho, a Autora dava apoio quer em trabalhos manuais, na área de acabamentos quer na entrega de trabalhos e ainda em deslocações aos Correios.
d) Era a Autora quem conduzia algumas visitas de estudo e tratava de toda a documentação de estagiários.
e) Toda a gestão de recursos humanos, nomeadamente anúncios e seleção de novos candidatos a emprego era efetuada pela Autora.
f) Era da responsabilidade da Autora a gestão dos resíduos, concretamente a emissão de guias de acompanhamento e submissão do mapa anual de resíduos.
g) Para realizar as tarefas desempenhadas pela Autora na Ré terão de ser contratados vários colaboradores, com os custos a tal associados.
h) Perdendo a sua remuneração de gerente a Autora ficará em situação de difícil sustento.
i) Com a sua destituição de gerente, a Autora ficou sem funções nem rendimentos.
j) Os serviços de limpeza das instalações da Ré passaram a ser mais onerosos para a Ré desde a destituição de gerente da Autora.
k) Era a Ré quem efetuava o pagamento da pessoa que efetuava serviços de limpeza em casa da Autora e dos pais desta.
L) Apela sua idade, a Autora dificilmente conseguirá obter outro cargo com funções semelhantes às de gerente.
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II.B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Da reapreciação de mérito
Insurge-se a Ré contra a sentença recorrida na parte em que:
i) - julgou procedente o pedido de anulação da Segunda Deliberação tomada na Assembleia Geral da Recorrente, realizada do dia 02.09.2020, que alterou o artigo quinto, n.º 3, do Pacto Social da Recorrente (para passar a ser suficiente a assinatura de um gerente para obrigar a sociedade, em vez da “assinatura conjunta dos gerentes CC… e BB…”);
ii) - julgou procedente o pedido de condenação da Ré/Apelante a pagar à Autora/Recorrida a quantia de 10.000,00 Euros (dez mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais decorrentes dos atos ilícitos que resultaram verificados.

Analisemos:
1ª- Da validade da deliberação de alteração do pacto social e do quorum deliberativo

Analisando a pretensão recursória, cumpre referir que a deliberação de alteração do Pacto Social quanto à forma de obrigar a sociedade, por forma a Ré passar a obrigar-se unicamente com a assinatura de um gerente, foi votada favoravelmente apenas pelo sócio maioritário, CC…, gerente, e com o voto contra da outra sócia, a Autora (facto provado em G), a outra gerente, destituída, (sendo que o capital social está dividido em duas quotas: uma, de valor nominal de 77.250,00 euros, pertencente ao sócio CC…, outra com o valor nominal de 72.750,00 euros, pertencente à Sócia BB…).
A questão que se suscita no recurso é, tão só, a de saber se, para a deliberação social ser válida, bastava o voto do sócio maioritário, CC…, como defende a apelante, ou se lei imperativa estatui, para tal, a maioria de ¾, como entendeu o Tribunal a quo e a Autora/apelada (sócia minoritária).
Vejamos.
Entendeu, e bem, adianta-se, o tribunal a quo que a alteração do Pacto social quanto à forma de obrigar da Recorrente deveria ter sido tomada por maioria de ¾ do valor correspondente ao capital social, e não tendo tal ocorrido verificou-se o desrespeito ao art.º 265º, do Código das Sociedades Comerciais, diploma a que nos reportamos na falta de outra referência, que não pode ser derrogado.
A Recorrente, considerando, embora, estar, em regra, a modificação do contrato de sociedade sujeita a uma maioria ¾ dos votos correspondentes ao capital social, entende que tal exigência, não abarcando todas as alterações ao contrato de sociedade, não se aplica ao caso, pois que o Pacto Social da Recorrente, no que à forma de obrigar diz respeito, é nominal - referindo “assinatura conjunta dos gerentes CC… e BB…” – e, com a destituição da Recorrida, a alteração de tal cláusula é consequência direta e necessária da deliberação, logo à alteração do contrato de sociedade quanto à forma de a obrigar não é aplicável o disposto no art.º 265.º, bastando, pois, a maioria simples, prevista no nº 3 do art.º 250º, o que efetivamente ocorreu.
Entende a apelante que, como decorrência da deliberação que determinou a destituição da Recorrida, caducou o artigo quinto do pacto social que regia sobre a forma como a Recorrente se obrigava, pelo que, ao deliberar-se sobre a alteração da cláusula contratual referente à forma de obrigar a sociedade, a Assembleia Geral da Ré limitou-se a preencher o vazio criado pela destituição, não tendo havido, por isso, qualquer alteração do pacto social no que a tal matéria dizia respeito. Considera que, nos termos do nº 3 do art.º 253º, “Faltando definitivamente um gerente cuja intervenção seja necessária por força do contrato para a representação da sociedade, considera-se caduca a cláusula do contrato, caso a exigência seja nominal; no caso contrário, não tendo a vaga sido preenchida no prazo de 30 dias, pode qualquer sócio ou gerente requerer ao tribunal a nomeação de um gerente nos termos do contrato ou da lei”, verifica-se ser a forma de obrigar da Recorrente nominal, por especificar a concreta identidade dos gerentes que obrigavam a Recorrente, faltando a Recorrida tal determinou a caducidade da cláusula que fixou a assinatura conjunta de ambos os gerentes como forma de obrigar a recorrida (nos termos da 1ª parte do nº 3 do indicado art.º 253º), a qual, a partir da referida destituição passou a ser apenas representada pelo outro gerente nomeado no pacto social, bastando, desde então, a assinatura deste para a plena vinculação daquela.
Debruçando-nos sobre a questão, sendo a regra geral, consagrada no artigo 85.º a de que “A alteração do contrato de sociedade, quer por modificação ou supressão de alguma das suas cláusulas quer por introdução de nova cláusula, só pode ser deliberada pelos sócios, salvo quando a lei permita atribuir cumulativamente essa competência a algum outro órgão.”, nos termos do disposto no artigo 246.º, n.º 1, alínea h), especificamente se consagra, para as sociedades por quotas, que depende de deliberação dos sócios o ato de “alteração do contrato de sociedade”.
E sendo, em regra, as deliberações dos sócios tomadas pela maioria simples dos votos, não se contando como emitidas as abstenções, ou seja, a lei satisfaz-se com a maioria relativa (v. nº3, do art. 250º), contam-se entre as exceções à mesma as deliberações de alteração do contrato de sociedade, decorrendo a exigência de um quorum deliberativo qualificado diretamente da lei, imperativa[1].
Com efeito, de acordo com o estatuído no nº1, do artigo 265.º, as deliberações de alteração do contrato só podem ser tomadas por maioria de três quartos dos votos correspondentes ao capital social ou por número ainda mais elevado de votos exigido pelo contrato de sociedade.
Assim, as cláusulas do contrato que sejam essenciais, isto é, cláusulas sem as quais os sócios não tinham formado a vontade de constituir a sociedade, não podem ser modificadas a não ser por maioria de ¾, pois tal implica uma alteração do contrato de sociedade. Se houver deliberação sobre os elementos essenciais (v. art. 9º) e modificação de algum deles, está a dar-se uma, objetiva e substancial, alteração do pacto. E para que possam ser tomadas deliberações sobre cláusulas essenciais tem de haver maioria qualificada e não, como pretende a requerida, maioria simples.
“A doutrina mostra-se dividida quanto à qualificação do vício que afeta a deliberação de alteração do contrato que haja sido tomada sem a maioria qualificada de votos fixada no nº1 deste artigo, ou sem as exigências superiores fixadas no próprio contrato de sociedade.
No sentido da inexistência da deliberação, vid. Raúl Ventura, Sociedade por Quotas, vol. II, pág. 266; no sentido da mera anulabilidade, sujeita ao regime do art. 58º, vid. Lobo Xavier, em RLJ, 118º, 72 e segs, e L. Brito Correia, Direito Comercial, vol. III., 1990, págs. 325 e segs, sendo esta última a interpretação que melhor se coaduna com o elemento histórico, atenta a circunstância de não ter transitado para o Código a norma correspondente ao art. 75º, nº 1, do Projeto, que fora objeto de pertinente crítica por parte de Lobo Xavier (lug. cit.)”[2].
Como bem considerou o Tribunal a quo ser o nº1, do artigo 265º uma norma imperativa e que, não podendo ser retirada aos sócios a possibilidade de procederem à alteração do pacto social, tal apenas pode ocorrer se verificada uma maioria de três quartos dos votos correspondentes ao capital social.
Bem subsume o caso ao referir “no caso concreto, a alteração do artigo quinto n.º 3 do pacto social, votada na Assembleia Geral realizada em 02.09.2020, passando a ter o seguinte teor: “3 – Para obrigar a sociedade é suficiente a assinatura de um gerente.”, apenas teve o voto favorável do sócio CC…, que tem uma quota de valor nominal de 77.250,00 euros, isto é, cuja participação social é de 51,5% do capital social, e teve o voto contra da sócia BB…, que tem uma quota de valor nominal de 72.750,00 euros, ou seja, cuja participação social é de 48,5% (factos provados em E e G), logo terá de se concluir que tal deliberação é anulável, nos termos previstos no artigo 58.º, n.º 1, alínea a), do citado diploma legal, por violar norma imperativa e que não pode ser derrogada pela vontade ainda que unanime dos sócios, já que, tal alteração social não foi votada por uma maioria de três quartos dos votos correspondentes ao capital social.
E bem refuta os argumentos contrários: “E não se diga como pretende a Ré que, tendo sido destituída do cargo de gerente a sócia BB…, e tendo a sociedade apenas dois sócios, com participações similares a sociedade ficaria paralisada, e como tal a alteração de tal cláusula é uma consequência necessária e direta dessa decisão/deliberação, uma vez que se viria impossibilitada de obrigar a sociedade nos simples atos do dia-a-dia, com a impossibilidade de alteração do contrato de sociedade.
O argumento da Ré é falacioso e não pode colher.
Com efeito, estaria descoberta a fórmula de contornar a lei e, concretamente, uma norma de carater imperativo. Bastando ao sócio dominante, mas sem maioria de 2/3, afastar um dos gerentes, destituindo-o sem necessidade sequer de invocar justa causa, para logo de seguida, como ocorreu no caso concreto, alterar sozinho e sem a necessária maioria, o Pacto Social, deixando a sociedade de se obrigar com a assinatura de dois gerentes, para passar a obrigar-se apenas com a assinatura de um gerente.
Como é evidente, tal não é permitido por Lei e, quando falte um gerente, sendo apenas dois e obrigando-se a sociedade com as assinaturas de ambos, existe norma no Código das Sociedades Comerciais para colmatar tal falta.
Com efeito, dispõe o artigo 253.º, n.º 3, do Código das Sociedades Comerciais: “Faltando definitivamente um gerente cuja intervenção seja necessária por força do contrato para a representação da sociedade, considera-se caduca a cláusula do contrato, caso a exigência tenha sido nominal; no caso contrário, não tendo a vaga sido preenchida no prazo de 30 dias, pode qualquer sócio ou gerente requerer ao tribunal a nomeação de um gerente até a situação ser regularizada, nos termos do contrato ou da lei.”
Assim, cabia ao sócio maioritário, que pretendia votar a deliberação de destituição de gerente da Autora acautelar tal situação, incluindo na convocatória para tal Assembleia a eleição de um novo gerente que substituísse a gerente cuja destituição ia ser votada, em vez de se arrogar o direito de alterar sozinho o pacto social, sabendo que a sua participação social era inferior a 2/3 do capital.
E não se diga que para eleger novo gerente também carecia da mesma maioria de 2/3 e que nunca obteria o acordo da Autora para eleger tal gerente, já que não é possível afirmar que a Autora não concordasse com qualquer pessoa que viesse a ser indicada, e, ainda que nenhuma pessoa merecesse a concordância de ambos os sócios, no imediato, sempre qualquer sócio poderia lançar mão da possibilidade conferida pelo artigo 253.º, n.º 3, do Código das Sociedades Comerciais, pedindo ao Tribunal que nomeasse um gerente até que a situação fosse resolvida”.
Deste modo bem se entendeu, “não tendo sido votada pela maioria qualificada necessária e tratando-se de uma alteração aos Estatutos da sociedade, não podia ser aprovada apenas com o voto do sócio CC…, que apenas tem uma participação social de 51,5%, como tal, a Deliberação tomada na Assembleia Geral Ordinária da Ré, de 2.09.2020, de Alteração do Pacto Social Quanto à forma de obrigar a sociedade, padece efetivamente de vicio, ainda que não de nulidade, por não se enquadrar em nenhuma das alíneas do artigo 56.º, pelo que será anulável nos termos da alínea a) do artigo 58.º, pelo que a mesma terá de ser declarada e julgado procedente, nesta parte, o pedido da autora”.
Tendo a sociedade dois sócios, ambos gerentes, e exigindo o contrato de sociedade a assinatura em conjunto de ambos os gerentes, acrescentando os nomes dos, então, gerentes, a destituição de um deles faz funcionar o disposto na primeira parte do nº3, do art 253º[3].
E, com efeito, no caso de falta definitiva de um “gerente cuja intervenção seja necessária por força do contrato para a representação da sociedade, há que distinguir duas espécies de cláusulas contratuais”[4], previstas no nº3, do artigo 253:
i). uma espécie “consiste na indicação nominal do gerente cuja intervenção é necessária: são clausulas frequentes na prática, que fazem sobressair a importância de um gerente, geralmente sócio, o qual, embora sozinho não represente a sociedade, é indispensável para que a sociedade seja representada. Neste caso, a falta definitiva do gerente acarreta a caducidade da cláusula do contrato. Na verdade, a sociedade continua (…), e por isso necessita de ser representada; por outro lado, a indicação dos sócios ao efetuarem a indicação nominal não se compadece com a nomeação judicial de outro gerente”[5].
ii). outra espécie em que “é exigido apenas certo número de gerentes para representação da sociedade, número esse que pode ser reconstituído ou pelos sócios ou pelo tribunal, sem necessidade de fazer caducar a cláusula. A lei concede aos sócios um prazo – 30 dias – para preencherem a vaga, pelo meio normal, que é a eleição de mais um gerente; passando esse prazo, sem ter sido eleito outro gerente, qualquer sócio ou gerente pode requerer ao Tribunal a nomeação de um gerente”[6].
No caso, temos uma situação hibrida, pois além da indicação nominal de gerentes cuja intervenção é necessária, temos a exigência de um número, mais de um, dado prever-se “assinatura conjunta”.
E, assim, caducando, embora, a referência à gerente destituída, mantém-se a exigência de um outro gerente para a representação da sociedade, a reconstituir pelos sócios ou pelo Tribunal, nos termos referidos em ii).
Todas as modificação que sejam introduzidas no contrato de sociedade, por mais pequenas que sejam, mesmo que, somente, modificações de construção frásica ou gramatical, constituem alterações ao referido contrato, correspondem a “alterações formais, embora nem todas estejam sujeitas ao regime jurídico que a lei estabelece para esse efeito (nos arts 85º e segs), por resultarem de atos que substancialmente não implicam a alteração do contrato, como é o caso da amortização de quotas sem redução do capital social, da cessão de quotas ou do simples decurso do tempo”, contando-se entre casos de alterações contratuais substanciais o de, efetiva, alteração do “número mínimo necessário para vincular a sociedade”[8], a situação dos autos.
Constituem “meras alterações formais, mas não substanciais as que se traduzem na caducidade de cláusulas temporárias ou acidentais. Assim, mesmo que tais cláusulas devam vigorar para além da própria constituição da sociedade – como é o caso da designação dos titulares dos órgãos sociais no próprio clausulado do contrato de sociedade (ainda que em regra transitória) -, a sua caducidade não implica alteração do contrato. (…) Estas cláusulas ao caducarem têm-se por não escritas, não se considerando que existe alteração do contrato, elas simplesmente apagam-se do respetivo clausulado”[9].
É considerada alteração substancial ao contrato a modificação da forma de a sociedade se obrigar perante terceiros.
Exigindo o pacto, no que à forma de obrigar diz respeito, “assinatura conjunta dos gerentes”, indicando os nomes “CC… e BB…”, a modificação formalmente introduzida – passar a figurar, em vez do estabelecido, “Para obrigar a sociedade é suficiente a assinatura de um gerente” -, traduz alteração substancial.
Ora, a caducidade não pode senão reportar-se à referência nominal “BB…, mantendo-se o Pacto Social no demais, significando que, a regra subjacente da vinculação de dois gerentes não caduca, como não caduca a referência a “CC…”, pelo que ao suprimir a referência nominal não apenas da Recorrida, mas também ao outro, especificamente referido, gerente e ao modificar a regra subjacente relativa à forma de vinculação da Sociedade Recorrente, esta está a proceder a uma alteração do pacto social, subsumível ao nº 1, do art. 265.º, exigindo-se, para aprovação da deliberação de alteração do pacto social, a maioria qualificada de três quartos do capital social.
Neste conspecto, tendo sido alterado o Pacto Social, passando a exigir-se apenas assinatura de um gerente, constata-se que a deliberação de alteração do mesmo foi aprovada por maioria simples, exigindo, todavia, o art. 265.º, para a concreta alteração dos Estatutos, maioria de três quartos do capital social, como bem entendeu o Tribunal a quo, nunca podendo a deliberação ser aprovada, apenas, com o voto do sócio CC…, pois que, de outro modo, afastando a seu inteiro gosto, a outra sócia da gerência, poderia exercer, contra o que acordado havia sido no contrato de sociedade, plenamente a ditadura da sua maioria.
Destarte, tem de ser mantida a decisão da 1ª instância quanto à deliberação de alteração do Pacto Social.
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2ª- Do ressarcimento de danos não patrimoniais e do quantum indemnizatório
Peticiona a Autora lhe sejam ressarcidos os danos não patrimoniais que sofreu, causados pelos atos ilícitos que se prendem com a sua destituição de gerente sem justa causa, bem tendo o Tribunal a quo entendido que não obstante a deliberação de destituição de gerente da Autora não constituir a prática de qualquer ato ilícito e, como tal, à luz da ilicitude da deliberação de destituição, não poder a Autora ser indemnizada, pode, contudo sê-lo pelos danos não patrimoniais que ilicitamente lhe foram causados pelo modo como a Ré processou tal destituição.
Com relevância para apreciação deste pedido, provou-se que:
- Até à sua destituição de gerente, a Autora não fazia entregas a clientes nem trabalhos de produção.
- Após a sua destituição de gerente, a Autora nunca mais exerceu as funções administrativas que vinha desempenhando na Ré até então, sendo-lhe distribuídas tarefas na produção e de entregas a clientes.
- Após a destituição de gerente da Autora, as tarefas que vinha desempenhando passaram a ser executadas pela funcionária II….
- A funcionária II…, que é administrativa da Ré, sempre trabalhou no escritório e nunca executou tarefas na produção nem de entregas a clientes.
- Em 13.10.2020, foi homologado por sentença, o Acordo obtido nos autos de Procedimento Cautelar instaurado pela Requerente BB… e a requerida “AA…, Lda.”, do seguinte teor: “A Requerida reconhece que a Requerente é sua trabalhadora desde 01.03.1992, tendo o contrato ficado suspenso no período de 04.02.2014 a 02.09.2020 e que nesta data a Requente readquiriu o estatuto de trabalhadora por conta de outrem e deveria ter continuado ao serviço da Requerida. Tendo a requerida aceitado reintegrar imediatamente a requerente ao seu serviço com efeitos retroagidos ao dia 03.09.2020, sem prejuízo da sua antiguidade. Não é devida à Requerente a retribuição do mês de setembro de 2020 nem a retribuição até 09.10.2020, uma vez que a requerente se encontrava de baixa médica. A Requerente continuará a desempenhar as funções correspondentes à categoria profissional de administrativa, e demais funções que até aqui desempenhava, de segunda a sexta, das 09h às 18h30m, com intervalo de almoço das 12h30m às 14h. A Requerida compromete-se a pagar à Requerente a remuneração mensal ilíquida de oitocentos euros, acrescida da quantia devida de subsidio de alimentação.”
- A Autora sofreu desgaste psicológico decorrente dos conflitos existentes entre si e o seu irmão CC…, agravado pela sua destituição de gerente da Ré.
- Por via da sua destituição de gerente, deixando de exercer as funções administrativas que desempenhava no escritório da Ré, passando a executar tarefas na produção, enquanto outra funcionária passou a executar as suas anteriores funções, a Autora sofreu quebra de prestígio profissional e social.
Configura a Autora o direito à indemnização por danos não patrimoniais, que pela sua gravidade merecem a tutela do direito e reconhece-lhe o Tribunal a quo o direito nos seguintes termos: “antes de ser designada gerente a autora era funcionária da Ré, desde 1.03.1992 (facto provado em H), e desde 18.05.2016, a Autora assumiu em pleno a responsabilidade pelo departamento financeiro da empresa, exercendo funções de gestão de todos os pagamentos e cumprimento de obrigações legais (IVA, Segurança Social e IRS), gestão dos pagamentos a fornecedores e funcionários, processamento dos cheques recebidos e depósitos nos bancos, responsabilidade por todos os assuntos contabilísticos, com assessoria de empresa de contabilidade, contacto com os Bancos, no sentido de receber informações relativas a concessão de créditos, manutenção de cartões refeição, entre outros, registo e confirmação de todos os movimentos bancários, confirmação e registo das entradas e saídas em numerário, entre outras funções (facto provado em J), até à sua destituição de gerente, a Autora não fazia entregas a clientes nem trabalhos de produção (facto provado em 43), porém, após a sua destituição de gerente, a Autora nunca mais exerceu as funções administrativas que vinha desempenhando na Ré até então, sendo-lhe distribuídas tarefas na produção e de entregas a clientes (facto provado em 48), enquanto as suas tarefas administrativas passaram a ser executadas pela funcionária II… (facto provado em 50), sendo que esta funcionária sempre trabalhou no escritório e nunca executou tarefas na produção nem de entregas a clientes (facto provado em 49).
Por outro lado, provou-se ainda que em 3.10.2020, foi homologado por sentença, o Acordo obtido nos autos de Procedimento Cautelar instaurado pela Requerente BB… e a requerida “AA…, Lda.”, do seguinte teor: “A Requerida reconhece que a Requerente é sua trabalhadora desde 01.03.1992, tendo o contrato ficado suspenso no período de 04.02.2014 a 02.09.2020 e que nesta data a Requente readquiriu o estatuto de trabalhadora por conta de outrem e deveria ter continuado ao serviço da Requerida. Tendo a requerida aceitado reintegrar imediatamente a requerente ao seu serviço com efeitos retroagidos ao dia 03.09.2020, sem prejuízo da sua antiguidade. Não é devida à Requerente a retribuição do mês de setembro de 2020 nem a retribuição até 09.10.2020, uma vez que a requerente se encontrava de baixa médica. A Requerente continuará a desempenhar as funções correspondentes à categoria profissional de administrativa, e demais funções que até aqui desempenhava, de segunda a sexta, das 09h às 18h30m, com intervalo de almoço das 12h30m às 14h. A Requerida compromete-se a pagar à Requerente a remuneração mensal ilíquida de oitocentos euros, acrescida da quantia devida de subsidio de alimentação.” (facto provado em 63).
Assim, torna-se evidente que, após a destituição de gerente da Autora, o outro gerente da Ré, CC…, não resistiu a tiques de autoritarismo e a querer demonstrar perante os restantes trabalhadores da Ré que agora era apenas ele quem mandava na empresa e que a Autora era uma mera empregada, como os restantes, esquecendo-se que ela continuava a ser sócia da sociedade (…).
Por isso, apesar da sentença homologatória do Acordo celebrado entre a Autora e a Ré nos autos de Procedimento Cautelar instaurado no Juízo de Trabalho de Penafiel, onde a Ré se obrigou a readmitir como sua funcionária a Autora para continuar a desempenhar as funções correspondentes à categoria profissional de administrativa, e demais funções que até aqui desempenhava, que nunca foram tarefas de produção nem de entregas a clientes, retirou a Autora das funções administrativas que desempenhava, retirando-a do escritório da empresa, que era o seu local de trabalho, para a colocar em tarefas de produção, sob as ordens de outro funcionário, responsável pelo setor da produção (como referiu a testemunha KK…), e mandando-a deslocar-se para fora da empresa, para fazer entregas a clientes, quando anteriormente não fazia tais tarefas.
Ora, como é bom de ver, a Autora sofreu desgaste psicológico por via da sua destituição de gerente e de ter deixando de exercer as funções administrativas que desempenhava no escritório da Ré, para passar a executar tarefas na produção, enquanto outra funcionária passou a executar as suas anteriores funções (facto provado em 65).
Com efeito, foram-lhe retiradas as suas funções para lhe serem atribuídas funções (…) não se poderá comparar as funções que eram desempenhadas pela Autora antes da sua destituição com as tarefas que lhe foram atribuídas depois de 03.09.2020.
Donde, atentas as regras de experiência comum o Tribunal não pode deixar de considerar que a Autora sofreu efetivamente quebra de prestígio profissional e social, pois viu-se relegada para funções de menor responsabilidade, quando antes lhe estavam atribuídas funções administrativas e financeiras.
E não se diga que, deixando de ser gerente sempre perderia as funções de chefia que desempenhava, o que lhe retiraria prestigio social, pois, se é verdade tal facto, também não deixa de ser verdade que o outro gerente da Ré (…) quis efetivamente humilha-la perante os outros funcionários, retirando-a do escritório da empresa, retirando-lhe as tarefas que executava e passando as suas funções para outra funcionária, que as não executava anteriormente, e baixando a Autora ao setor da produção para executar tarefas sob as ordens de outro funcionário.
Ora, tal comportamento é manifestamente lesivo dos direitos da Autora, enquanto trabalhadora da Ré, porquanto nunca antes tinha executado as tarefas que lhe foram atribuídas após a sua destituição de gerente, quando já antes de ser gerente sempre executou tarefas administrativas e financeiras na sociedade e nunca desempenhou tarefas na produção.
Logo, existiu uma diminuição de categoria da Autora, sendo a mesma ilícita e abusiva, ademais que, por Acordo homologado por sentença judicial, a Ré se comprometeu a readmitir a Autora como sua trabalhadora e para exercer as funções correspondentes à categoria profissional de administrativa, e demais funções que até aqui desempenhava.
Donde, tendo executado toda uma vida profissional, tarefas administrativas e financeiras no escritório da Ré, para, de um dia para o outro, deixar de as executar, sem justificação para tanto, passando a serem-lhe atribuídas tarefas na produção, e tendo de se deslocar para fora da empresa para fazer entregas a clientes, por certo e como se provou a Autora sofreu abalo psicológico com esta sua despromoção e ao ver-se atingida na sua dignidade com a mesma, perante todos os restantes trabalhadores da empresa, objetivo perseguido e alcançado pelo outro gerente da Ré, pelo que tal circunstancialismo é passível de causar damos morais e psicológicos na Autora, como se provou, e tais danos por provirem de uma conduta ilícita e ilegítima do gerente da Ré, são passiveis de indemnização, nos termos previstos no artigo 496º, n.º 1, do Código Civil.
Com efeito, a gravidade dos danos causados à Autora merece a tutela do direito e os factos praticados pelo gerente da Ré, CC…, que vimos referindo, merecem efetivamente censura e são ilícitos, por contrários ao Acordo homologado por sentença mas também porque violam o disposto nos artigos 119.º e 120.º, n.º 1 e n.º 3, do Código de trabalho que impedem que o trabalhador seja colocado a desempenhar tarefas compreendidas em outra categoria sem o seu acordo e sem justificação, como ocorre no caso concreto (…).

- Da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais e quantum indemnizatório

A atuação da Ré, ora apelante, foi, na verdade, ilícita, por violadora das referidas obrigações, mormente das contratualmente assumidas, sendo que, na verdade bem resulta, até, ser a mesma sócia e com uma posição muito próxima da do outro sócio, bem transparecendo a ilícita, por ilegal, desproporcional e abusiva, “ditadura da maioria”, a reprimir.
Bem refere o Tribunal a quo serem estes danos atendíveis, sendo aplicada a regra geral da responsabilidade subjetiva, nos termos do disposto no nº1, do artigo 483º e do n.º 1 e 798º do Código Civil, diploma a que se reportam os preceitos doravante citados sem outra referência, culpa na violação do acordo que se presume por força do disposto no artigo 799º.
Analisemos da adequação da compensação atribuída.
Estabelece o art. 496º que: “1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”.
E o nº 4, do referido artigo, que “O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º…”.
Resulta, assim, do referido nº1 a admissibilidade genérica do ressarcimento dos danos não patrimoniais. Como dele decorre, os danos não patrimoniais são indemnizáveis, quando, pela sua gravidade, sejam merecedores da tutela do direito.
Antunes Varela define danos não patrimoniais como sendo “os prejuízos (como dores físicas, desgostos morais, vexames, perda de prestígio ou de reputação, complexos de ordem estética) que, sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a honra, o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização”[10].
Luís Manuel Teles Menezes Leitão define-os como “aqueles que correspondem à frustração de utilidades não suscetíveis de avaliação pecuniária, como o desgosto resultante da perda de um ente querido”[11].
Tais danos só são indemnizáveis quando, pela sua gravidade, merecerem a tutela do direito, sendo a aludida gravidade um conceito relativamente indeterminado, a apurar, objetivamente, caso a caso, de acordo com a realidade fáctica apurada. A gravidade mede-se por um critério objetivo, de normalidade e bom senso prático. A gravidade deve “medir-se por um padrão objectivo e não de acordo com factores subjectivos, ligados a uma sensibilidade particularmente aguçada ou especialmente fria ou embotada do lesado, sendo tais danos compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, e tratando-se mais de uma satisfação do que de uma indemnização, a ser calculada segundo critérios de equidade, atendendo-se ao grau de responsabilidade do lesante, à sua situação económica e à do lesado, às flutuações do valor da moeda, etc”[12] .
Enunciam-se alguns danos não patrimoniais que têm sido, recentemente, considerados pela jurisprudência merecerem a tutela do direito como: a perceção que o lesado, mesmo em estado de não (pelo menos completa) consciência, possa ter da situação em que se encontra, do grau de irreversibilidade das lesões, a destruição de um projeto de vida de casal, a impotência sexual de que fique a padecer o lesado bem como o consequente dano de seu cônjuge ou companheiro, o dano biológico, isto é a perda de qualidade de vida do sujeito[13].
No caso em apreço, não existem dúvidas que as consequências da atuação da Ré, ilícita e culposa, para o Autor revestiram de gravidade, como bem foi decidido, sendo, por isso, justificativas do seu ressarcimento, a título de danos não patrimoniais. Por graves, tem o Autor direito a ser indemnizado por eles, cabendo determinar qual o quantum a atribuir.
Ora, de harmonia com o princípio geral expresso no art. 562º, a obrigação de indemnizar implica a reconstituição da situação que existiria se não se tivesse verificado a lesão, repondo-se as coisas no lugar em que estariam se não se tivesse produzido o dano. Visa-se a eliminação deste, devendo a indemnização equivaler ao montante do dano imputado (v. nº2 do art. 566º).
Porém, estando em causa a lesão de interesses imateriais, a reconstituição natural da situação anterior é impossível e também o é a fixação de um montante pecuniário equivalente ao «mal» sofrido, apenas se podendo atenuar, minorar ou, de algum modo, compensar os danos sofridos pelo lesado.
E “se a indemnização por danos não patrimoniais não elimina o dano sofrido, pelo menos, permite atribuir ao lesado determinadas utilidades que lhe permitirão alguma compensação pela lesão sofrida sendo, em qualquer caso, melhor essa compensação do que nenhuma. A atribuição dessa compensação não representa qualquer imoralidade, uma vez que não resulta do comércio de bens não patrimoniais, representando, pelo contrário, uma sanção ao ofendido por ter privado o lesado das utilidades que aqueles bens lhe proporcionavam”[14].
Nos termos do nº4, do 496º, o montante da indemnização a atribuir será fixado equitativamente pelo Tribunal tendo em conta a extensão e gravidade dos danos causados, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso que se justifique ponderar. Este tipo de indemnização será fixado segundo o bom senso e o prudente arbítrio do julgador, temperado com os critérios objectivos a que se alude no art. 494º.
E daqui resulta que a indemnização por danos não patrimoniais “não se reveste de natureza exclusivamente ressarcitória, mas também cariz punitivo, assumindo-se como uma pena privada, estabelecida no interesse da vítima, por forma a desagravá-la do comportamento do lesante”[15].
Como se escreve no Acórdão da Relação do Porto, Processo 108/08.4TBMCN.P1, de 8/7/2010, “refere “inter alia”, o Ac. do STJ, de 30.10.96, in BMJ 460-444: “(...) No caso dos danos não patrimoniais, a indemnização reveste uma natureza acentuadamente mista, pois “visa reparar, de algum modo, mais que indemnizar os danos sofridos pela pessoa lesada”, não lhe sendo, porém, estranha a “ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente”. O quantitativo da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais terá de ser calculado, sempre, “segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e às do lesado e do titular da indemnização», «aos padrões da indemnização geralmente adoptados na jurisprudência, as flutuações de valor da moeda, etc”[16].
Estes preceitos devem ser aplicados com prudência, pois a sua aplicação tem como efeito deixar sem indemnização parte dos danos reais[17], como entende Galvão de Teles, Direito das Obrigações, 7ª Edição, Coimbra Editora, 2010, p.357, nota 1, o que pode, por isso, gerar injustiças para os lesados, a beliscar a certeza e segurança jurídicas, fins sempre tidos em vista na aplicação da justiça.
Como afirma Dário Martins de Almeida[18], “pretende-se encontrar somente aquilo que, no caso concreto, pode ser a solução mais justa; a equidade está assim limitada sempre pelos imperativos da justiça real (a justiça ajustada às circunstâncias), em oposição à justiça meramente formal. Por isso se entende que a equidade é sempre uma forma de justiça. …A equidade é, pois, a expressão da justiça num dado caso concreto”. Como é sabido, a satisfação dos danos não patrimoniais não é uma verdadeira indemnização, visto não ser um equivalente do dano, tratando-se antes de atribuir ao lesado uma satisfação ou compensação que não é suscetível de equivalente[19]. “É, assim, razoável que no seu cálculo, se tenham em atenção, além da natureza e intensidade do dano causado, as outras circunstâncias do caso concreto que a equidade aconselha sejam tomadas em consideração e, em especial, a situação patrimonial das partes e o grau de culpa do lesante”[20].
E a indemnização por danos não patrimoniais tem em vista compensar de alguma forma o lesado pelos sofrimentos e inibições que sofrera em consequência do evento danoso, compensação que só será alcançada se a indemnização for adequada e significativa do ponto de vista financeiro e não meramente simbólica.
Tal compensação deve “ser proporcionada à gravidade do dano, tomando-se em conta, na sua fixação, todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida”[21].
A lei ao, através da remissão feita no art. 496°, n°4 “para as circunstâncias mencionadas no art. 494°, ter mandado atender, na fixação da indemnização, quer à culpa, quer à situação económica do lesante, revela que ela não aderiu, estritamente, à tese segundo a qual a indemnização se destinaria nestes casos a proporcionar ao lesado, de acordo com o seu teor de vida, os meios económicos necessários para satisfazer ou compensar com os prazeres da vida os desgostos, os sofrimentos ou as inibições que sofrera por virtude da lesão. Mas também a circunstância de se mandar atender à situação económica do lesado, ao lado da do lesante, mostra que a indemnização não reveste, aos olhos da lei, um puro carácter sancionatório"[22].
Como se refere no Ac. RG de 18/12/2017, Processo nº 397.12.5TBAMR.G1, em que a ora relatora foi adjunta, “nestas hipóteses, e conforme é posição pacífica da doutrina e da jurisprudência, o que está em causa é a fixação de um benefício material/pecuniário (único possível) que se traduza, pelas utilidades, prazeres ou distrações que proporciona – porventura, de ordem espiritual –, numa compensação ou atenuação pelos bens imateriais antes referidos da pessoa humana (o lesado), atingidos pelo evento.
Nesta conformidade, a compensação dos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade mereçam a tutela do direito, não pode – por definição – ser feita através da teoria ou fórmula da diferença prevista no art. 566º, n.º 2.
Ao invés, o montante da indemnização, nos termos do disposto no arts. 496º, n.º 4 e 494º, deverá ser fixado equitativamente pelo tribunal, que atenderá ao grau de culpa do lesante, à situação económica do lesante e do lesado, às demais circunstâncias do caso, nomeadamente, por assim o imporem os princípios da proporcionalidade e igualdade, aos critérios e valores usualmente acolhidos na jurisprudência em casos similares.[23]
Com efeito, como se refere no citado Ac. STJ de 18.06.2015,[24] “não podendo apurar-se o valor exacto de tais danos, atenta a sua natureza, o respectivo montante deverá ser fixado pelo tribunal segundo critérios de equidade (…), fazendo apelo a todas as regras de prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida (…) e tendo em atenção a extensão e gravidade dos prejuízos, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e demais circunstâncias do caso (artigos 496º, n.º 3, 1ª parte e 494º do Código Civil).” (sublinhado nosso).
E, ainda, prossegue o referido douto aresto, “nos parâmetros gerais a ter em conta considerou o Acórdão deste Supremo Tribunal, de 19 de Abril de 2012 (proc. n.º 3046/09.0TBFIG.S1, acessível em www.dgsi.pt) serem ainda de destacar a nossa inserção no espaço político, jurídico, social e económico correspondente à União Europeia e o maior relevo que vem sendo dado aos direitos de natureza pessoal, tais como o direito à integridade física e à qualidade de vida, e, bem assim, que a jurisprudência deste mesmo Supremo Tribunal tem evoluído no sentido de considerar que a indemnização em causa deve constituir um lenitivo para os danos suportados e não ser orientada por critérios hoje considerados miserabilistas, por forma a, respondendo actualizadamente ao comando do artigo 496º, traduzir uma efectiva possibilidade compensatória para os danos suportados e a suportar.” (sublinhado nosso).
No entanto, como se adverte no Ac. STJ de 17.12.2015 (e nos variadíssimos arestos ali elencados), a utilização de critérios de equidade não deve impedir que se tenham em conta as exigências do princípio da igualdade, o que implica a procura de uniformização de critérios, naturalmente não incompatível com a devida atenção às circunstâncias de cada caso concreto.
Conforme se colhe da mesma jurisprudência do Supremo, o recurso à equidade não pode, nem deve conduzir à arbitrariedade, não devendo os tribunais “…contribuir de nenhuma forma para alimentar a ideia de que neste campo as coisas são mais ou menos aleatórias, vogando ao sabor do acaso ou do arbítrio judicial. Se a justiça, como cremos, tem implícita a ideia de proporção, de medida, de adequação, de relativa previsibilidade, é no âmbito do direito civil que a afirmação destes vectores se torna mais premente e necessária, já que eles conduzem em linha recta à efectiva concretização do princípio da igualdade consagrado no art. 13º da Constituição.”[26]
Por último, é ainda de referir, nesta sede, que à obrigação indemnizatória, a título de danos não patrimoniais, se deve reconhecer, não só um papel de reparação ou compensação, mas também um papel de censura ou punitivo do agente do facto lesivo.
Com efeito, como se refere no Ac. STJ de 30.10.96, BMJ 460, pág. 444 (citado no Ac. STJ de 26.01.2016, relator Fonseca Ramos, já citado), “no caso dos danos não patrimoniais, a indemnização tem uma natureza acentuadamente mista, pois visa reparar, de algum modo, mais que indemnizar os danos sofridos pela pessoa lesada, não lhe sendo, porém, estranha a ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente.
Está-se, pois, aqui perante uma indemnização com natureza não estritamente reparadora, mas também sancionatória, devendo considerar-se o grau de culpa do agente uma vez que o sofrimento ou desgosto do lesado é o reflexo dele.
Como se refere no Acórdão do STJ de 19/5/2009, Processo 298/06.0TBSJM.S1“realçando a componente punitiva da compensação por danos não patrimoniais pronunciam-se, no seu ensino, os tratadistas.
Menezes Cordeiro “Direito das Obrigações”, 2° vol, p. 288 ensina que “a cominação de uma obrigação de indemnizar danos morais representa sempre um sofrimento para o obrigado; nessa medida, a indemnização por danos morais reveste uma certa função punitiva, à semelhança aliás de qualquer indemnização”.
Galvão Telles, “Direito das Obrigações”, 387, sustenta que “a indemnização por danos não patrimoniais é uma “pena privada, estabelecida no interesse da vítima – na medida em que se apresenta como um castigo em cuja fixação se atende ainda ao grau de culpabilidade e à situação económica do lesante e do lesado”.
Menezes Leitão realça a índole ressarcitória/punitiva, da reparação por danos morais quando escreve: “assumindo-se como uma pena privada, estabelecida no interesse da vítima, de forma a desagravá-la do comportamento do lesante” – “Direito das Obrigações”, vol. I, 299.
Pinto Monteiro, de igual modo, sustenta que, a obrigação de indemnizar é “uma sanção pelo dano provocado”, um “castigo”, uma “pena para o lesante” – cfr. “Sobre a Reparação dos Danos Morais”, RPDC, n°l, 1° ano, Setembro, 1992, p. 21”.
O quantitativo da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais terá de ser calculado, sempre, “segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e às do lesado e do titular da indemnização”, “aos padrões da indemnização geralmente adotados na jurisprudência, as flutuações de valor da moeda, etc.”.
Também no Acórdão do STJ de 13/7/2017, Processo 3214/11.4TBVIS.C1.S1, se refere Como ensina o Sr. Prof. Antunes Varela, e como vem sendo seguido pela jurisprudência dos nossos tribunais, o juízo de equidade requer do julgador que tome «em conta todas as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida», sem esquecer que sobredita “indemnização” tem natureza mista, já que visa não só compensar o dano sofrido, mas também reprovar, de algum modo, a conduta lesiva[27].
Com efeito, ante a imaterialidade dos interesses em jogo, a indemnização dos danos não patrimoniais não pode ter por escopo a sua reparação económica. Visa sim, por um lado, compensar o lesado pelo dano sofrido, em termos de lhes proporcionar uma quantia pecuniária que permita satisfazer interesses que apaguem ou atenuem o sofrimento causado pela lesão; e, por outro lado, servir para sancionar a conduta do agente. Todavia, no critério a adotar, não se devem perder de vista os padrões indemnizatórios decorrentes da prática jurisprudencial, procurando - até por uma questão de justiça relativa - uma aplicação tendencialmente uniformizadora ainda que evolutiva do direito, como aliás impõe o n.º 3 do artigo 8.º do CC.
Para tal efeito, são relevantes, além do mais: a natureza, multiplicidade e diversidade das lesões sofridas[28].
Analisando a prática dos tribunais, constatamos que os quantitativos indemnizatórios, que antes eram quase simbólicos, têm vindo progressivamente a subir nos últimos anos.
Os danos não patrimoniais causados não podem deixar de ser merecedores da tutela do direito.
Visto o enquadramento jurídico da questão e subsumindo o direito aos factos, verifica-se que bem decidiu o Tribunal a quo que, entendeu o valor peticionado, de 10.000,00 euros, justo e adequado à gravidade dos factos praticados e às consequências que resultaram para a Autora, que se viu afetada psicologicamente pela prática dos mesmos, certo sendo que se não está a apreciar qualquer responsabilidade relacionada com o contrato de trabalho, mas meramente os danos não patrimoniais sofridos pela Autora decorrentes do modo com a destituição foi levada a cabo.
Também assim entendemos, afigurando-se-nos adequada e equilibrada, a indemnização, de 10.000,00 €, fixada pelo tribunal a quo, para a reparação dos referidos danos não patrimoniais sofridos pela autora, decorrentes dos atos ilícitos que se prendem com o modo como se processou a sua destituição de gerente da recorrida.
*
Diga-se, ainda, quanto aos valores fixados, que o juízo de equidade da 1ª instância “deve ser mantido sempre que – situando-se o julgador dentro da margem de discricionariedade que lhe é consentida - se não revele colidente com os critérios jurisprudenciais que, numa perspectiva actualística, generalizadamente vêm sendo adoptados, em termos de poder pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade”[29], pelo que sempre o montante indemnizatório, por inteiramente conformes ao referido, deve ser mantido.
Assim, fixada a indemnização por danos não patrimoniais com base na equidade, o Tribunal superior só deve intervir quando os montantes fixados se revelem, de modo patente, em colisão com os critérios jurisprudenciais que vêm a ser adotados, para assegurar a igualdade, o que manifestamente, não sucede no caso. Não ocorrendo oposição, a ponderação casuística das circunstâncias do caso deve ser mantida, já que o julgador se situou na margem de discricionariedade que lhe é consentida.
*
Improcedem, por conseguinte, as conclusões da apelação, não ocorrendo a violação de qualquer dos normativos invocados pela apelante, devendo, por isso, a decisão recorrida ser mantida.
*
III. DECISÃO
Pelos fundamentos expostos, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmam, integralmente, a decisão recorrida.
*
Custas pela apelante, pois que ficou vencida – art. 527º, nº1 e 2, do CPC.

Porto, 24 de janeiro de 2022
Assinado eletronicamente pelos Juízes Desembargadores
Eugénia Cunha
Fernanda Almeida
Maria José Simões
______________
[1] Paulo Olavo Cunha, Direito das Sociedades Comerciais, 7ª Edição, Almedina, pág. 695.
[2] Abílio Neto, Código Comercial Código das Sociedades Legislação Complementar Anotados, 15ª Edição, Ediforum, pág. 672
[3] Cfr. Ac. da RP de 19/3/1992, CJ, 1992, 2º, 218.
[4] Raúl Ventura, Sociedade por Quotas, vol. III, pág. 50.
[5] Ibidem, pág. 50.
[6] Ibidem, pág. 50.
[7] “CC… e BB…”.
[8] Paulo Olavo Cunha, idem, pág. 998.
[9] Ibidem, pág. 999
[10] Antunes Varela, Das Obrigações em geral, 6ª ed., l°, pág .571.
[11] Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Vol. I, 14ª edição, Almedina, págs. 328.
[12] Antunes Varela, Idem, p. 600
[13] Ana Prata (Coord.), Código Civil Anotado, 1º vol., 2017, Almedina, pág 648
[14] Luís Menezes Leitão, Ibidem, pág. 330.
[15] Idem, pág 331
[16] Acórdão da Relação do Porto, Processo 108/08.4TBMCN.P1 de 8/7/2010, in www.dgsi.pt
[17] Ana Prata (Coord.), idem, pág 644
[18] Dário Martins de Almeida, Manual de Acidentes de Viação, 2ª ed., Almedina. pág 73/74.
[19] Em sentido contrário, Ana Prata (Coord.), idem, pág 647, Diversamente do que por vezes se lê, os danos não patrimoniais são suscetíveis de avaliação pecuniária, pois são objeto de indemnização e esta é em dinheiro na esmagadora maioria dos casos. Os interesses lesados, esses sim, é que são não patrimoniais.
[20] Vaz Serra, RLJ, Ano 113º, p. 104.
[21] P. Lima e A. Varela, Código Civil Anotado, Vol. 1, Coimbra, p. 501
[22] Antunes Varela, ibidem p. 607 e segs.
[23] Vide, neste sentido, Ac. STJ de 04.06.2015, relatora Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, já citado; e Ac. STJ de 26.01.2016, proc. n.º 2185/04.8TBOER.L1.S1, relator Fonseca Ramos; Ac. STJ de 28.01.2016, proc. n.º 7793/09.8T2SNT.L1.S1, relatora Maria da Graça Trigo; ou, ainda, Ac. STJ de 18.06.2015, proc. n.º 2567/09.9TBABF.E1.S1, relatora Fernanda Isabel Pereira, todos disponíveis in www.dgsi.pt.
[24] Proc. n.º 2567/09.9TBABF.E1.S1, relatora Fernanda Isabel Pereira, acessível em www.dgsi.pt.
[25] Proc. n.º 3558/04.1TBSTB.E1.S1, relatora Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, acessível em www.dgsi.pt.
[26] Vide, ainda, neste sentido, Ac. STJ de 07.04.2016, proc. n.º 237/13.2TCGMR.G1.S1, relatora Maria da Graça Trigo; e Ac. STJ de 18.06.2015, já citado, e, ainda, Ac. STJ de 31.01.2012, proc.n.º 875/05.7TBILLH.C1.S1, relator Nuno Cameira, todos disponíveis in www.dgsi.pt.
[27] [4] Vide Prof. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. 1.º, 10.ª Edição, Almedina, pag. 605, nota 4.
[28] Acórdão do STJ de 13/7/2017, Processo 3214/11.4TBVIS.C1.S1, in dgsi.net
[29] Acórdão do STJ de 29/6/2017, processo 976/12.5TBBCL.G1.S1, in dgsi.net, cujo relator foi Lopes do Rego
Cfr, ainda, neste sentido, Ac. do STJ de 26/5/2015, Processo 2607/11;Sumários, Maio/2015, pag 51, citado por Abílio Neto, Código Civil Anotado, 19ª Edição, 2016, Ediforum, pag 545.