PENHORA
REQUISITOS DE FORMA
TÍTULO EXECUTIVO
Sumário

1 – O auto de penhora deve ser elaborado após a realização desta.
2 – A divergência entre o valor total da penhora mencionado na notificação prevista nos artigos 773.º, n.º 1, e 779.º, n.º 1, do CPC, e aquele que o é no auto de penhora, não determina a nulidade desta.
3 – Na notificação prevista nos artigos 773.º, n.º 1, e 779.º, n.º 1, do CPC, não é necessário indicar o montante exacto da quantia a descontar no salário do executado e a depositar à ordem do agente de execução, desde que se especifiquem os elementos necessários para o devedor do executado proceder a esse cálculo.
4 – Na hipótese de o devedor do executado, apesar de ter reconhecido a sua obrigação, não a cumprir, o exequente pode exigir a prestação nos próprios autos da execução, servindo de título executivo aquela declaração de reconhecimento.
(Sumário do Relator)

Texto Integral

Processo n.º 175/16.7T8MMN-C.E1


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Gestão de (…), Lda., interpôs recurso de apelação da sentença mediante a qual o tribunal a quo julgou improcedentes os embargos de executado por si deduzidos.

As conclusões do recurso são as seguintes:

1 – A ora recorrente foi notificada da douta sentença judicial, na qual foi julgada improcedente a oposição à execução.

2 – Da douta decisão judicial extrai-se em suma que todos os actos praticados pela agente de execução que foram impugnados, por violação da lei processual e dos direitos da recorrente e em manifesto prejuízo da ora recorrente, não têm qualquer relevância judicial.

3 – Da douta decisão judicial conclui-se mesmo que o despacho judicial de 26-06-2019, proferido com fundamento nos actos praticados pela agente de execução, não padece de qualquer vício.

4 – Deste modo, por não se poder conformar com douta decisão judicial proferida, nem com o seu conteúdo, vem a ora recorrente recorrer da douta sentença judicial, nos seguintes termos:

B – Da falta de apreciação do auto de penhora de vencimento e da nulidade da notificação nos termos do n.º 3 do artigo 773.º do Código Processo Civil.

V - Compulsados os autos, verifica-se desde logo a existência do auto de penhora de vencimento que foi lavrado em 29-01-2019, o qual não consta no douto despacho judicial de 26-06-2019, nem é feita qualquer referência àquele, afigurando-se este auto de penhora de extrema relevância, para determinar em termos temporais a data que foi efectivada a penhora do vencimento do executado.

VI - Com efeito, verifica-se que a agente de execução procedeu apenas à elaboração do auto de penhora de vencimento no valor de € 9.362,05, em 29-01-2019, tendo notificado o primitivo executado deste mesmo auto, através da notificação nessa mesma data.

VII - Porém, esta mesma agente de execução notificou em 28-01-2019, ou seja, em data anterior à elaboração do auto de penhora de vencimento, a entidade patronal para efeitos do disposto no n.º 3 do artigo 773.º do C.P.C., “para procederem ao pagamento do valor em dívida de 12.145,95 €”.

VIII - Mutatis mutandis, a agente de execução primeiro notificou a ora recorrente para efeitos do disposto no n.º 3 do artigo 773.º do C.P.C. “para procederem ao pagamento do valor em dívida de € 12.145,95”, em 28-01-2019 e somente lavrou o auto de penhora de vencimento do executado em 29-01-2019, ou seja, em data posterior àquela notificação.

IX - E como se não bastasse, no auto de penhora de vencimento do executado lavrado em 29-01-2019 consta como valor total da penhora de vencimento o montante de € 9.362,05, o que contrasta e contraria manifestamente com o montante de € 12.145,95, exigido à ora recorrente na notificação de 28-01-2019, para efeitos do disposto no n.º 3 do artigo 773.º do Código de Processo Civil.

X - Ora, se o auto de penhora de vencimento do executado no montante de € 9.362,05, apenas foi lavrado em 29-01-2019, só a partir desta mesma data é que se podia considerar a efectiva penhora do vencimento e nunca antes dessa mesma data, não podendo por isso a agente de execução notificar a ora recorrente antes desse dia 29-01-2019, para efeitos do disposto no n.º 3 do artigo 773.º do C.P.C. “para proceder ao pagamento do valor em dívida de € 12.145,95” e com a agravante de ser em valor superior ao da penhora efectuada, como efectivamente o fez no dia 28-01-2019.

XI - Desde logo se constata a ocorrência de dois erros grosseiros por parte da agente de execução, quer ao proceder à notificação da entidade patronal, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 773.º do Código de Processo Civil, quando apenas elaborou o auto de penhora de vencimento em data posterior àquela notificação, quer ao exigir o pagamento do valor de € 12.145,95, quando no auto de penhora de vencimento do executado consta o valor total de € 9.362,05.

XII - Ou seja, no dia 28-01-2019, quando notificou a entidade patronal nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 773.º do Código de Processo Civil, ao exigir o pagamento do valor de € 12.145,95, ainda não estava efectivada a penhora do vencimento do executado, porque ainda não tinha procedido à elaboração do auto de penhora do vencimento, o qual somente o fez em data posterior, mais propriamente em 29-01-2019 e no qual consta como montante total da penhora o valor de € 9.362,05.

XIII - Por sua vez, consta nos autos uma notificação de penhora do vencimento em 08-05-2018, tendo a entidade patronal respondido com a junção do recibo de vencimento do executado.

XIV – Porém, a agente de execução nunca informou a entidade patronal do executado do exacto montante a penhorar do vencimento do executado, limitando-se tão somente a informar do montante total da alegada dívida do executado, no valor de € 12.145,95 e que para mais, como ficou acima demonstrado, até esse valor estava errado, visto que no auto de penhora de vencimento consta o valor total de € 9.362,05.

XV - Pelo que a referida notificação à entidade patronal do executado para penhora do vencimento é claramente insuficiente e encontra-se errada quanto ao valor da penhora, estando não só em falta elementos essenciais, como enferma de um erro material num desses elementos essenciais (o valor da penhora), para que a penhora de vencimento do executado se pudesse concretizar e sobretudo, para que a entidade patronal pudesse proceder aos respectivos descontos nesse mesmo vencimento.

XVI - E sempre se sublinhe que a agente de execução, em vez de informar a entidade patronal do executado do concreto montante a penhorar, no seguimento da resposta da entidade patronal, na qual remeteu o respectivo recibo de vencimento, limitou-se a notificar a entidade patronal do executado em 22-08-2019, para que esta fizesse prova dos descontos ao vencimento do executado, cujo o valor mensal a descontar jamais a entidade patronal foi devidamente informada pela agente de execução.

XVII – E como anteriormente referido, seguidamente a agente de execução procedeu em 28-01-2019 à notificação da entidade patronal, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 773.º do Código de Processo Civil, tendo somente elaborado o auto de penhora do vencimento do executado em 29-01-2019, ou seja, em data posterior àquela notificação, quando para que o vencimento do executado se considerasse legalmente penhorado, a agente de execução tinha primeiramente que lavrar o auto de penhora de vencimento do executado e só depois é que poderia proceder à notificação da entidade patronal, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 773.º do Código de Processo Civil.

XVIII - Pois, na presente situação, se apenas lavrou em 29-01-2019 o auto de penhora de vencimento, somente a partir desta data é que o vencimento estava efectivamente penhorado e jamais poderia estar a notificar previamente a esta data a entidade patronal, nos termos do n.º 3 do artigo 773.º do Código de Processo Civil e ainda por cima, com um valor totalmente diferente do constante no auto de penhora de vencimento, como o fez em 28-01-2019, por manifesta inadmissibilidade legal e processual.

C – Da omissão dos elementos essenciais da obrigação exequenda no despacho judicial de 26-06-2019

XIX - Por seu turno, resulta do douto despacho judicial de 26-06-2019 que “determina-se que a entidade patronal figure como executada, valendo como título executivo a declaração de reconhecimento do devedor – artigo 773.º, n.º 4, e 777.º, n.º 3, ambos do Código de Processo Civil.”

XX - Ora, com o merecido respeito pelo douto despacho judicial, o mesmo é notoriamente omisso quanto à determinação da obrigação (certa, exigível e líquida) que a ora executada alegadamente reconheceu mas não cumpriu, não identificando, tanto quanto possível, a concreta identidade do devedor, o montante, a natureza e a origem da dívida, o título de que constam, as garantias existentes e a data do vencimento, limitando-se a remeter para uma notificação para penhora de créditos que não indica o montante da dívida (a dívida de que agora executada é credora) nem a sua data de vencimento, mas que se limita a indicar o valor máximo que interessa penhorar e o qual para mais está errado.

XXI - Efectivamente, estando nós num processo executivo que vem por despacho judicial condenar a entidade patronal, ora recorrente, como executada, impõe-se o inequívoco esclarecimento da dívida exequenda do processo executivo a cumular contra a “terceira devedora”, ora recorrente, exigindo-se que seja determinada qual foi a obrigação (certa, exigível e líquida) que alegadamente a mesma reconheceu mas não cumpriu, identificando, tanto quanto possível, a identidade do devedor, o montante, a natureza e a origem da dívida, o título de que constam, as garantias existentes e a data do vencimento.

XXII - Tal, não é o que se verifica no douto despacho judicial de 26-06-2019 e que por isso mesmo se impugna.

XXIII - Com efeito, extrai-se da nossa jurisprudência, conforme acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 08-03-2016 (em www.dgsi.pt – Processo n.º 2181/12.1TBPVZE.P1)] “A responsabilidade do terceiro devedor há-de ser sempre limitada à medida do valor da sua obrigação, relativamente ao primitivo executado e não relativa à divida do primitivo executado perante o exequente. Ou seja, a “prestação” a que o antigo 860.º, n.º 3, actual 777.º, n.º 3, do C.P.Civil, se reporta não é a devida pelo executado ao exequente mas antes a devida pelo terceiro devedor do executado a este”.

XXIV - Ora, remetendo o douto despacho judicial para a declaração de reconhecimento do devedor, valendo esta como título executivo, constata-se que a mesma se cinge a indicar apenas como valor líquido da dívida exequenda, exactamente o mesmo valor que considera ser o valor da dívida do executado, sendo que até mesmo este valor está errado nesta notificação, em virtude do valor do auto de penhora ser diferente do valor constante nesta notificação à ora recorrente, não constando assim deste título executivo e consequentemente do douto despacho judicial quais são os concretos montantes da dívida da ora executada – “terceira devedora” – e ora recorrente, para com o executado, nem em que data tais concretos montantes se venceram, nem de onde resulta o reconhecimento por parte da “terceira devedora” de que deve esses concretos montantes ao executado.

XXV - Destarte, em nossa opinião, e sempre salvo o devido respeito por diferente e melhor juízo, verifica-se que no douto despacho judicial é total a falta de menção sobre a certeza, a exigibilidade, e a liquidez, da dívida que a ora executada – “terceira devedora” – terá para com o Executado, e em consequência, a falta de título executivo do qual resultem esses mesmos requisitos da obrigação exequenda (artigo 713.º do Código de Processo Civil).

XXVI - Deste modo, advindo a cumulação de execução contra a ora recorrente - "terceira devedora" – de um título judicial impróprio, como é tido pela doutrina e pela jurisprudência, justamente porque o mesmo encerra uma condenação da devedora decorrente da lei, tal significa que para efeitos do disposto nos artigos 550.º, n.º 2, alínea a) e 703.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil, aquele título executivo assim formado pela notificação efectuada à ora recorrente da penhora do crédito e da falta de declaração desta é havido como sentença judicial condenatória, pelo que o douto despacho judicial ora recorrido deveria obrigatoriamente conter e cumprir todos os requisitos previstos no artigo 724.º do Código de Processo Civil, e também a exigência de ver determinada qual foi a obrigação (certa, exigível e líquida) que a mesma alegadamente reconheceu mas não cumpriu.

XXVII – E saliente-se mesmo o seguinte, ora se o douto despacho judicial determinasse o montante concreto do crédito que a exequente tem a haver da ora recorrente, então porque razão teve o tribunal a quo de proferir o despacho judicial de 08-10-2019, no qual é afirmado: “Sempre que o exequente pretenda, nos autos de execução, que a mesma siga igualmente contra a entidade patronal que reconheceu a dívida, terá, entre o mais, que indicar a quantia exequenda pela qual a entidade patronal é outrossim responsável.”

XXVIII – Tal é a omissão no douto despacho judicial de 26-06-2019 que é o próprio tribunal a quo a ordenar, num outro despacho judicial, que a exequente indique a quantia exequenda de que a ora recorrente é responsável.

XXIX – Por tudo isto, tal, era o que se exigia que estivesse contido no douto despacho judicial ora recorrido, em virtude do mesmo fazer valer como título executivo a declaração de reconhecimento do devedor, com base numa notificação para penhora de créditos que não indica o montante da dívida (a dívida de que a ora executada é credora) nem a sua data de vencimento, mas que se limita a indicar o valor máximo que interessa penhorar, o qual até está em notória contradição com o auto de penhora de vencimento do executado.

XXX – Saliente-se que quando se condena nos termos do artigo 777.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, é imprescindível que seja feita menção nessa mesma condenação aos requisitos da obrigação exequenda (certa, exigível e líquida), bem como a identidade do devedor, o montante, a natureza e a origem da dívida, o título de que constam, as garantias existentes e a data do vencimento, uma vez que a citada declaração de reconhecimento do devedor, validada judicialmente como título executivo é omissa na menção dos requisitos essenciais da obrigação exequenda.

XXXI - Em síntese, se por um lado ficou demonstrado que a declaração de reconhecimento do devedor é nula, uma vez que a agente de execução praticou dois erros grosseiros, sendo o primeiro por ter previamente à elaboração do auto de penhora de vencimento (elaborado em 29-01-2019), procedido à notificação da entidade patronal, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 773.º do Código de Processo Civil em 28-01-2019, quando apenas o poderia ter efectuado após a elaboração do auto de penhora de vencimento e sendo o segundo, por ter lavrado no auto de penhora de vencimento do executado em 29-01-2019 como valor total da penhora de vencimento o montante de € 9.362,05, quando na notificação nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 773.º do Código de Processo Civil efectuada em 28-01-2019, exigiu da ora recorrente o valor de € 12.145,95, sendo por isso mesmo nula a notificação efectuada nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 773.º do Código de Processo Civil efectuada em 28- 01-2019;

XXXII - Por outro, ficou demonstrado que o douto despacho judicial é claramente omisso sobre a certeza, a exigibilidade, e a liquidez, da dívida que a ora executada – “terceira devedora” – terá para com o executado, e em consequência, não contém esses mesmos requisitos da obrigação exequenda e constatando-se que não se verifica a concretização do montante concreto do crédito que o executado primitivo tem a haver da "terceira devedora", ora recorrente, uma vez que o mesmo não consta na declaração de reconhecimento do devedor, nem esse crédito foi concretamente apurado no processo executivo como base em prova documental bastante e inequívoca e nem sequer consta no douto despacho judicial, pelo que resulta claramente neste douto despacho e consequentemente no título executivo que o sustenta, quer a omissão dos requisitos da obrigação exequenda, como também permanece desconhecido o montante do concreto crédito cuja cobrança coactiva se pretende obter da ora recorrente – "terceira devedora".

XXXIII - Neste sentido, deve ser dado provimento ao presente recurso, sendo revogado o douto despacho judicial, nos termos e pelos fundamentos expostos.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O recurso foi admitido, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.


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Questões a resolver:

1 – Validade da penhora;

2 – Suficiência do título executivo.


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Na sentença recorrida, foram julgados provados os seguintes factos:

1. Em 31.01.2016 (…) e (…), Lda. intentou contra (…) execução sob a forma de processo sumário, indicando como valor da execução € 5.323,86.

2. Em 27.10.2017 a exequente apresentou requerimento com vista à cumulação de execução, indicando o valor de € 3.187,09.

3. Em 31.01.2017 foi lavrada cota nos autos principais nos seguintes termos: “procedi à alteração da quantia exequenda tendo em conta a cumulação de execuções”, passando a constar o valor de € 8.510,95.

4. No apenso A foi proferida em 02.10.2017 sentença reconhecendo os créditos reclamados pelo ISS, IP no montante global de € 18.955,40, graduados para serem pagos com primazia face ao crédito da exequente.

5. Gestão de (…), Lda., embargante, é entidade patronal do executado (…).

6. Em 08.05.2018 a embargante foi notificada de ofício da agente de execução do qual, ademais que se dá por integrado e reproduzido, resulta:

“Fica(m) V.ª(s) Exª(s). pela presente notificado(s), nos termos e para efeitos do disposto no artigo 779.º do Código Processo Civil, na qualidade de entidade patronal/entidade pagadora, para a penhora dos respetivos abonos, vencimentos, salários ou outros rendimentos periódicos devidos ao executado adiante indicado, nomeadamente indemnização ou compensação que aquele tenha a receber, até que seja atingido o limite previsto também adiante indicado. No prazo de dez dias deve(m) declarar qual o vencimento do referido funcionário (ver informações complementares para melhor esclarecimento). Nos termos do artigo 738.º do CPC são impenhoráveis dois terços da parte líquida dos vencimentos, salários, prestações periódicas pagas a título de aposentação ou de qualquer outra regalia social, seguro, indemnização por acidente, renda vitalícia, ou prestações de qualquer natureza que assegurem a subsistência do executado. Para efeitos de apuramento da parte líquida das prestações referidas no número anterior, apenas são considerados os descontos legalmente obrigatórios. A impenhorabilidade atrás referida tem como limite máximo o montante equivalente a três salários mínimos nacionais à data de cada apreensão e como limite mínimo, quando o executado não tenha outro rendimento, o montante equivalente a um salário mínimo nacional. São penhoráveis todos os subsídios auferidos pelo Executado, acima identificado, nomeadamente de refeição, de férias e de Natal, desde que o valor mensal que lhe for devido ultrapasse o montante de € 580,00, correspondente ao salário mínimo nacional. Assim deverão informar mensalmente do montante descontado a depositar na conta do processo, utilizando para o efeito a Ref.ª Multibanco constante desta Notificação para Penhora de Salários. Todas as comunicações a realizar poderão ser enviadas para o email: (…). Encontramo-nos ao dispor para esclarecer todas as duvidas que possam surgir. (…) Valor total Previsível da Penhora: € 12.145,74 (doze mil, cento quarenta e cinco euros e setenta e quatro cêntimos). (…) Valor Total Previsto 12.145,74 Euros Identificação do Executado (…), NIF: (…); BI: (…) Cominação / Advertências

Se nada disser, entende-se que reconhecem a existência da obrigação (n.º 4 do artigo 773.º do Código de Processo Civil).

Se faltarem conscientemente à verdade incorrem na responsabilidade do litigante de má-fé (n.º 5 do artigo 773.º do Código de Processo Civil).

Não sendo cumprida a obrigação, pode o exequente ou o adquirente exigir, nos próprios autos da execução, a prestação, servindo de título executivo a declaração de reconhecimento do devedor, a notificação efetuada e a falta de declaração ou o título de aquisição do crédito.

Nos termos do artigo 417.º do Código de Processo Civil, a falta de colaboração pode ser sancionada com multa, sem prejuízo dos meios coercitivos que forem possíveis.

Informações Complementares. Como responder à presente notificação:

A resposta à presente notificação é prestada por meio de termo ou de simples requerimento dirigido ao signatário, no prazo de dez dias, juntando para o efeito o último recibo de vencimento do executado (do qual conste o salário ilíquido, descontos e retenções bem assim as demais regalias, incluindo subsidio de refeição, deslocação, etc.), devendo do recibo ser previamente rasurados os dados pessoais do executado, ou, em alternativa, discriminar todos os créditos e débitos que constam do recibo vencimento.

Se o executado não for trabalhador devem informar de tal facto, esclarecendo se este nunca o foi ou a data em que terminou o vínculo laboral.

Se assim o pretenderem, podem solicitar ao Agente de Execução que determine o valor a ser penhorado. No sítio de internet www.solicitador.org/ CE está disponível um simulador para cálculo da penhora.

Como fazer o pagamento: O pagamento do valor que venha a ser retido ao trabalhador deverá ser pago mensalmente através da referência multibanco supra indicada ou ao balcão de qualquer Agência do … Banco”.

7. Na sequência do referido em 6. a embargante informou a Sr.ª AE mediante comunicação da qual, ademais, que se dá por reproduzida, resulta:

“Gestão de (…), Lda., vem em resposta à V/ notificação referente ao pedido de informação sobre o Sr. (…), comunicar que o mesmo é nosso funcionário, detendo um vínculo laboral com a nossa sociedade comercial. Mais se informa que o mesmo aufere o vencimento mensal constante no respectivo recibo de vencimento, procedendo-se à junção de cópia do recibo de vencimento deste nosso funcionário, para V/ conhecimento. Neste sentido, caso haja mais alguma questão que seja necessário esclarecer, desde já expressamos a nossa inteira disponibilidade para tal. (…)”.

8. Com a comunicação referida em 7, a embargante remeteu recibo de vencimento do executado do qual consta o vencimento líquido de € 728,50.

9. Por ofício de 22.08.2018 a Agente de Execução notificou a embargada nos seguintes termos:

“Assunto: Notificação para Penhora de Salário do Funcionári(a) / Executado(a): (…), NIF: (…); BI: (…) Prazo: 10 (dez) dias. Na sequência da v/ resposta (recebida em 22/05/2018) à n/ notificação para penhora do salário do v/ Funcionário acima identificado, ficam V.ª Ex.ªs notificados para no prazo de 10 (dez) dias fazerem prova do desconto mensal realizado desde aquela data no salário do Executado e do respetivo depósito no processo, através da Referência Multibanco constante da nossa notificação enviada em 07/05/2018, que se anexa.”.

10. Por ofício de 28.01.2019 a Agente de Execução notificou a embargada nos seguintes termos:

“Assunto: Notificação Entidade Patronal – Falta de Resposta – Pagamento do montante em dívida

Prazo: 10 (dez) dias

Não tendo V.ª(s) Exª(s) respondido à Notificação para Penhora de Salários de 07/05/2018 com o depósito do valor penhorado, (de que se junta cópia), ficam pela presente notificados, nos termos e para efeitos do disposto no n.º 4 do artigo 773.º do Código Processo Civil, para procederem ao pagamento do valor em dívida de € 12.145,74 (doze mil e cento e quarenta e cinco euros e setenta e quatro cêntimos), utilizando para o efeito as referências de pagamento constantes do documento junto, no prazo de 10 (dez) dias.”.

11. Em 29.01.2021 a AE lavrou auto de penhora, do qual, ademais, que se dá por integrado e reproduzido, consta: “Limite da penhora Dívida exequenda € 8.510,95; Despesas prováveis € 851,10, Total € 9.362,05”.

12. Na mesma data referida em 11. a Agente de execução notificou o executado de ofício do seguinte teor, que ademais, se dá por integrado e reproduzido:

“Nos termos do disposto nos artigos 784.º e 785.º do Código Processo Civil (CPC), fica pela presente notificado para, no prazo de 10 (dez) dias deduzir, querendo, oposição à penhora dos bem(s) identificado(s) em anexo, com algum dos seguintes fundamentos: a. Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que ela foi realizada; b. Imediata penhora de bens que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda; c. Incidência da penhora sobre bens que, não respondendo, nos termos do direito substantivo, pela dívida exequenda, não deviam ter sido atingidos pela diligência”.

13. O anexo a que se refere o ofício referido em 12. é o auto de penhora referido em 11..

14. O executado não deduziu oposição à penhora, na sequência do referido em 12. e 13..

15. Em 26.06.2019 foi proferido nos autos principais despacho nos seguintes termos:

“Em 08.05.2018 foi concretizada a notificação sob a forma de citação da Entidade Patronal do Executado (…), Gestão de (…), Lda., com o NIF (…), e sede na (…), 2 Corpo E, Estrada de Almeirim, em Évora, para penhora de vencimento.

Em 22.05.2018 a Entidade Patronal respondeu com a junção do recibo de vencimento do Executado.

Em 22.08.2018, perante a ausência dos descontos no vencimento do Executado por parte da Entidade Patronal, foi a mesma notificada para fazer prova no processo do desconto mensal e do seu depósito no processo.

Em 28.01.2019 foi enviada notificação por carta registada à Entidade Patronal por falta de resposta para pagamento da quantia em dívida, nos termos do artigo 777.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

Em 06.02.2019 veio a Exequente requerer que a obrigação fosse cumprida pela Entidade Patronal, nos termos do artigo 777.º, n.º 3, do CPC. Até ao momento a Entidade Patronal não comunicou mais nada ao processo, nem procedeu ao depósito do montante penhorado no salário do Executado (…). Assim, entende-se que a entidade patronal reconhece a existência da obrigação e, consequentemente, determina-se que a entidade patronal figure como executada, valendo como título executivo a declaração de reconhecimento do devedor – artigos 773.º, n.º 4, e 777.º, n.º 3, ambos do Código de Processo Civil”.

16. A agente de execução nunca informou a entidade patronal do executado do exacto montante a penhorar do vencimento do executado.


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1 – Validade da penhora:

A recorrente põe em causa a validade da penhora do salário do executado (…) argumentando, em síntese, o seguinte:

- A recorrente foi notificada da penhora do salário do executado (…) em 28.01.2019 e o auto de penhora foi elaborado em data posterior, mais precisamente em 29.01.2019;

- O valor total da penhora mencionado na notificação prevista nos artigos 773.º, n.º 1, e 779.º, n.º 1, do CPC (diploma ao qual pertencem todas as normas legais doravante referenciadas), não coincide com aquele que o é no auto de penhora;

- A agente de execução nunca informou a recorrente do exacto montante do vencimento do executado (…) a reter e depositar em cada mês.

Analisemos cada um destes argumentos.

Corresponde à realidade que o auto de penhora foi elaborado em data posterior à da notificação da recorrente nos termos dos artigos 773.º, n.º 1, e 779.º, n.º 1. Todavia, isso não viola qualquer norma legal. Aliás, a recorrente não indica que norma entende ter sido violada. Ao invés, o procedimento descrito é o correcto. Primeiro pratica-se o acto a documentar através de auto e só depois este é elaborado. Daí o artigo 753.º, n.º 1, estabelecer que, da penhora (entenda-se, da penhora efectuada), se lavra auto. Ou seja, primeiro realiza-se a penhora e, posteriormente, lavra-se auto da penhora realizada. “Concluídos os atos de penhora nos termos da lei – registo, apreensão, ou notificação – lavra o agente de execução um auto, como impõe o artigo 753.º, n.º 1.”[1]

A penhora de créditos, nomeadamente de salários, consiste na notificação do devedor do executado nos termos estabelecidos nos artigos 773.º, n.º 1, e 779.º, n.º 1. Daí que o momento próprio para a elaboração do auto de penhora seja posterior àquela notificação.

Também corresponde à realidade que o valor total da penhora mencionado na notificação efectuada nos termos dos artigos 773.º, n.º 1, e 779.º, n.º 1, não coincide com aquele que consta do auto de penhora. Todavia, daí também não resulta a nulidade daquela notificação, na sequência da qual, saliente-se, a recorrente não deduziu qualquer oposição. Aliás, mais uma vez a recorrente não fundamenta juridicamente a sua pretensão, indicando uma norma legal que determine a nulidade da penhora efectuada devido à apontada divergência.

A recorrente foi notificada de que os “abonos, vencimentos, salários ou outros rendimentos periódicos devidos ao executado” ficavam penhorados até ser atingido o limite de € 12.145,74. Naturalmente que essa penhora se concretizaria, em cada mês, numa fracção dos referidos “abonos, vencimentos, salários ou outros rendimentos periódicos devidos ao executado”, determinada em conformidade com os parâmetros legais, que foram descritos na notificação. Era à retenção e ao depósito dessa fracção que a recorrente ficava obrigada, nos termos do artigo 779.º, n.º 1. Ora, a recorrente não reteve nem depositou um único cêntimo. Não faz sentido tentar, agora, justificar tal omissão invocando a divergência acima apontada. Se tinha alguma dúvida acerca do conteúdo da notificação, ou se desta discordava, tinha o ónus de solicitar o esclarecimento da dúvida ou de deduzir oposição em tempo oportuno.

Argumenta a recorrente, finalmente, que a agente de execução nunca a informou do exacto montante do vencimento do executado (…) a penhorar. É natural que o não tenha feito, pois, antes da penhora, desconhecia-o. Quem possuía a informação relevante para a determinação daquele montante era, além do executado José Magro, a própria recorrente. Como resulta do n.º 6 dos factos provados, a notificação feita à recorrente continha todos os elementos necessários para que esta calculasse o exacto montante do vencimento do executado (...) a reter e depositar. Mais, consta da mesma notificação que “podem solicitar ao Agente de Execução que determine o valor a ser penhorado”, bem como o endereço electrónico onde seria possível o cálculo daquele montante.

Por este conjunto de razões, é irrelevante que a agente de execução nunca tenha informado a recorrente do exacto montante do vencimento do executado (…) a penhorar. Se, não obstante a detalhada informação constante da notificação que recebeu, tivesse dúvidas sobre esse montante, a recorrente podia solicitar a sua determinação à agente de execução. O que estava vedado à recorrente era não reter e depositar qualquer parcela do salário do executado (…), ignorando a penhora efectuada.

2 – Suficiência do título executivo:

A recorrente sustenta, por outro lado, que inexiste título executivo válido contra si porquanto o despacho proferido em 26.06.2019 é omisso sobre a certeza, a exigibilidade e a liquidez da sua dívida para com o executado (…), faltando, assim, tais requisitos da obrigação exequenda.

A recorrente não tem razão.

Na sequência da sua notificação nos termos dos artigos 773.º, n.º 1, e 779.º, n.º 1, a recorrente reconheceu que o executado (…) era seu trabalhador e remeteu cópia do respectivo recibo de vencimento. Ficou, assim, assente que a recorrente era devedora do salário daquele.

Não obstante, a recorrente não procedeu a qualquer desconto no salário do executado (…) e ao depósito de qualquer quantia à ordem da agente de execução.

O artigo 777.º, n.º 3, estabelece, na parte que agora nos interessa, que, não cumprindo o devedor do executado a sua obrigação, o exequente pode exigir a prestação nos próprios autos da execução, servindo de título executivo a declaração de reconhecimento do devedor. Portanto, ao contrário do entendimento que está na base da argumentação da recorrente, o título executivo em que se funda a execução contra si proposta é a sua própria declaração de reconhecimento da dívida e não o despacho proferido em 26.06.2019. Daí que o conteúdo desse despacho seja irrelevante para a questão da suficiência do título executivo.

Como resulta da exposição que antecede, a recorrente assenta a sua argumentação em vários equívocos, sendo um deles o de que o artigo 777.º, n.º 3, prevê uma condenação do devedor do executado, constituindo o despacho proferido em 26.06.2019 tal condenação, a qual padeceria dos vícios que lhe aponta. Aquela norma não prevê a prolação de qualquer decisão condenatória para que o exequente possa exigir a prestação nos próprios autos da execução, como facilmente se conclui através da sua leitura. Prevê, sim, na parte que nos interessa, que a declaração de reconhecimento do devedor constitui título executivo, prescindindo-se assim de uma decisão condenatória.

Concluindo, o recurso deverá ser julgado improcedente, mantendo-se a sentença recorrida.


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Dispositivo:

Delibera-se, pelo exposto, julgar o recurso improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

Notifique.


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Sumário: (…)

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Évora, 24.02.2022

Vítor Sequinho dos Santos (relator)

José Manuel Barata

Emília Ramos Costa



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[1] RUI PINTO, A Acção Executiva, AAFDL Editora, Lisboa, 2018, p. 629.