IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Sumário


Não cumpre o ónus previsto no art.° 640.°do Código de Processo Civil o apelante que, nas alegações e nas conclusões, agrega a matéria de facto impugnada em blocos ou temas e indica os meios de prova relativamente a cada um desses blocos, mas omitindo-os relativamente a cada um dos concretos factos cuja decisão impugna.

Texto Integral




Processo n.º 573/17.9T8MTS.P1. S1 (Revista) - 4ª Secção

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

I

1. AA intentou a presente ação declarativa de condenação, em processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra Primafrio S.L., Doctrans – Transportes Rodoviários de Mercadorias, Lda. e Lamision – Sociedade De Transportes, Lda., peticionando (na sequência do aperfeiçoamento da petição inicial), que:

I. Seja declarado que as Rés se encontram em relação de domínio ou de grupo e, por isso, sejam condenadas solidariamente a pagar ao Autor a indemnização que este delas reclama, e que vier a ser julgada a final;

Subsidiariamente,

II. Seja desconsiderada a personalidade jurídica das três Rés e, por via dessa desconsideração, sejam as mesmas condenadas solidariamente a pagar ao Autor a indemnização que este delas reclama, e que vier a ser julgada a final;

Cumulativamente,

III. Seja declarada verificada a justa causa alegada pelo Autor e, por via dela:

IV. Serem as Rés condenadas no pagamento de € 4.275,00, a título de diferenças salariais:

V. Serem as Rés condenadas no pagamento de € 65.590,56, a título descanso compensatório não gozado;

VI. Serem as Rés condenadas a liquidar ao Autor a quantia € 20.496,24, a título de indemnização por antiguidade;

VII. Serem as Rés condenadas a liquidar ao Autor a quantia € 50.000,00, por todos os danos não patrimoniais causados;

VIII. Ser a Rés condenadas a pagar ao Autor, os juros que se vencerem sob as quantias peticionadas, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.

2. As Rés contestaram e o Autor respondeu à contestação.

3. Foi realizada a audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença que julgou a presente ação parcialmente procedente e, em consequência:

a) Declarou que as três Rés se encontram numa relação de grupo;

b) Absolveu as três Rés dos pedidos contra as mesmas deduzidos.

4. O Autor interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação decidido julgar o recurso parcialmente procedente quanto à matéria de facto e no mais improcedente.

5. O Autor interpôs recurso de revista do acórdão do Tribunal da Relação, tendo, para além do mais, arguido uma nulidade.

6. Por acórdão de 23.06.2021, o Tribunal da Relação julgou improcedente a arguição da nulidade.

7. No recurso de revista que interpôs o A. formulou as seguintes conclusões:

1. O presente recurso de revista é admissível nos termos do art.º 671.º, n.º 1 do CPC, porquanto o objeto do mesmo incide sobre o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, o qual não conheceu de parte da impugnação da matéria de facto, por entender que o Recorrente não cumpriu com o ónus estatuído ao art.º 640.º do CPC.

2. Com efeito, tal acórdão configura uma decisão ex novo e, por conseguinte, não se verifica o duplo grau de jurisdição, uma vez que é imputada à 2.ª instância uma violação da lei processual, que descaracteriza a dupla conforme.

 Das nulidades do acórdão recorrido: A. – Da omissão de pronúncia

3. O Venerando Tribunal da Relação ... não se pronunciou relativamente às 15.ª a 22.ª conclusões da apelação do Recorrente, as quais versavam sobre a inversão do ónus da prova e ainda a valoração favorável das declarações de parte do Autor, por força da atuação das Rés, as quais obstaculizaram à realização de diversos meios de prova requeridos pelo Autor, os quais foram admitidos por despacho saneador, proferido em 17/11/2017.

4. Circunscreve-se no âmbito de jurisdição do Tribunal da Relação a interpretação e aplicação da norma de direito probatório material prevista no n.º 2 do art.º 344.º, CC, uma vez que a inversão do ónus da prova é suscetível de influir no conteúdo da decisão do Tribunal que aprecia as provas produzidas.

5. Estatui o n.º 2 do art.º 608.º do CPC que incumbe ao Juiz a resolução de todas questões trazidas à sua douta apreciação pelas partes, exceto aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução preconizada em relação a outras, apenas podendo ocupar de outras questões que a lei lhe permitir ou impuser o seu conhecimento oficioso.

6. Por despacho saneador de 17/11/2017 (fls. 628 e seguintes), foram admitidos diversos meios probatórios requeridos pelo Autor, mormente a junção de documentos que estão na posse das Rés. Posteriormente, por despacho de 19/12/2017 (fls. 638 e 638 verso) foi admitido o depoimento de parte do legal representante da 1.ª Ré, a diversa matéria constante da petição inicial aperfeiçoada, bem como da resposta do Autor.

7. As Rés, de uma forma totalmente injustificada, dolosamente e de má-fé, não acataram as ordens judiciais, nem no que respeita à junção de parte dos documentos, nem no que respeita à confissão, através do depoimento de parte do legal representante da 1.ª Ré, requerido pelo Autor, furtando-se a tais meios probatórios.

 8. A repartição normativa do ónus da prova pode sofrer ainda alguns desvios, mormente atento o coeficiente de esforço probatório exigível a cada uma das partes, segundo as circunstâncias do caso, e o seu dever de colaborar para a descoberta da verdade.

9. Desde logo, na ponderação concreta desse esforço probatório, poderá o Tribunal valorar livremente a falta de colaboração de qualquer das partes, como decorre do art.º 417.º, n.º 2, do CPC, à luz das regras da experiência, e atendendo à falta de colaboração da contraparte que estaria em melhores condições de o proporcionar.

10. Além disso, nas situações em que ocorra um comportamento culposo da parte não onerada que torne impossível ou extremamente dificultosa a prova pela parte onerada, poderá determinar-se a inversão do ónus de prova sobre a parte faltosa, nos termos do preceituado no artigo 344.º, n.º 2, do CC.

11. As Rés não cumpriram, de má-fé e dolosamente, o dever de cooperação a que estavam obrigadas, segundo o regime dos arts. 6.º, 7.º, 8.º, 590.º, n.º 2, alínea c), 429.º a 431.º e 417.º do CPC e ainda art.357.º, n.º 2 do CC, tendo ficado no «segredo dos deuses» os documentos que o Autor, de uma forma legítima e com o beneplácito judicial, requereu que fossem juntos pelas Rés aos autos, impondo-se confrontar tal conduta processual omissiva das demandadas com o regime legal aplicável, designadamente, para efeitos do funcionamento do regime excecional contido no art.º 344.º, n.º 2, do CC.

12. Ainda que a conduta ilegítima, dolosa e de má-fé levada a cabo pelos Rés não conduzisse à inversão do ónus da prova, o que sempre não se concebe, pelo menos, levaria a uma valoração fortemente negativa dessa recusa das Rés, em termos de formação, em sede de convicção íntima do julgador, de um juízo fáctico favorável, em moldes concretos a definir por este Supremo Tribunal de Justiça, à alegação correspondente feita pelo Autor nos seus articulados.

 13. Desta forma, a recusa de colaboração das Rés e a apreciação dessa recusa, deve ser apreciada para efeitos probatórios e inversão do ónus da prova (art.º 417.º n.º 2 CPC), visando evitar inverter o sentido da decisão, designadamente, considerando-se provados os factos integrantes dos arts. 5.°, 15.°, 16.°, 17.°, 18.°, 23.°, 24.°, 25.°, 26.°, 72.°, 73.°, 74.°, 75.°, 76.°, 77.°, 78.°, 79.°, 81.°, 82.°, 85.°, 86.°, 87.° da petição inicial aperfeiçoada; e ainda os arts. 10.°, 65.°, 66.°, 17.°, 18.°, 19.°, 20.°, 37.° e 38.°, 59.°, 60.° e 61.°, 66.°, 69.°, 70.°, 71.°, 72.°, 73.°, 76.°, 99.°, 103.° e 104.° da resposta.

14. Com efeito, o Tribunal da Relação ao não conhecer sobre tal querela trazida à sua douta apreciação, o acórdão ora recorrido enferma de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615.º, n.º l, alínea d) ex vi art. 666.º, n.º l, ambos do CPC.

Da violação e errada aplicação da lei:

A.- Do ónus de impugnação da matéria de facto:

15. O Tribunal da Relação rejeitou o conhecimento das conclusões 25.ª a 31.ª, por entender que o Apelante não cumpriu com os ónus legais estatuídos na lei de processo, designadamente, com a alínea b) do n.º l do art. 640.º CPC, por entender que o Autor impugnou a matéria de facto em blocos, não especificando os concretos meios de prova que impunham decisão diversa para cada um daqueles factos, limitando-se a indicar de um modo genérico.

16. Relativamente ao ónus legal estatuído ao art.º 640.º, n.º l e 2 do CPC, importa referir que o mesmo é modelado em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Nesse sentido, afigura-se ao Recorrente que a admissibilidade da agregação de alguma factualidade seja possível, na medida em que tal factualidade se encontra intrinsecamente interligada, relevando o conjunto de meios de prova quanto àquele grupo, indicando os erros de julgamento que atingem todos esses pontos fácticos.

 17. O que, desde já, se mostra vantajoso no que tange ao princípio da economia processual, pois que seria despiciente impugnar cada facto individualmente, indicando os meios de prova que abalam tal decisão factual, ainda que essa factualidade se encontre interligada entre si.

18. Por outro lado, embora o NCPC exija o cumprimento do ónus de alegação a cargo do Recorrente, impondo a este, quando se trata de impugnação da decisão da matéria de facto, que proceda à especificação prevista nas alíneas do n.º 1 do art.º 640.º, o exercício desse ónus, conforme se salientou em ponto anterior, não pode ser exponenciado a um nível tal que praticamente determine a reprodução, ainda que sintética, nas conclusões do recurso, de tudo quanto a esse respeito já tenha sido alegado na respetiva motivação.

19. O que verdadeiramente importa ao exercício do ónus de impugnação em sede de matéria de facto é que as alegações, na sua globalidade, e as conclusões, contenham os requisitos que constam do art.º 640.º do NCPC. Não sendo exigível, da parte do Recorrente, a repetição exaustiva da fundamentação desenvolvida ao longo do conteúdo das alegações.

20. Por outro lado, o cerne da questão é saber se as conclusões apresentadas na Apelação permitem ou não o conhecimento do recurso pelo Tribunal da Relação antes interposta, o que configura uma questão melindrosa, que, a par das demais, afinal, requer prudência e contenção.

21. Tem sido entendimento pacífico jurisprudencial que as conclusões devem ser um resumo, explícito e claro, da fundamentação das questões equacionadas pelo recorrente, visando, à luz do princípio da cooperação, facilitar a realização do contraditório e o balizamento do objeto do recurso, pretendendo-se, dessa forma, que tais conclusões resumam as questões de facto e de direito que revelem a censura da decisão impugnada.

 22. Sendo ainda certo que, quando as conclusões de recurso sejam obscuras ou complexas, deve o Relator convidar o recorrente a, além do mais, sintetizá-las, sob pena de se não conhecer do recurso na parte afetada, não devendo haver lugar, contudo, ao excesso, sustentando a complexidade das mesmas pela sua extensão, ou, inversamente, sustentando que as conclusões são sintéticas demais, por o Apelante não ter reproduzido todos os meios de prova e transcrições de depoimentos que impunham decisão diversa, para cada um dos factos impugnados.

23. Salvo o devido respeito por opinião diversa, o Recorrente cumpriu o ónus de síntese que lhe era imposto pelo artigo 639.º do C.P.C., tendo elaborado um texto dissertativo-argumentativo, com coerência gramatical e lexical, que depois concluiu de forma sintética, agrupando as ideias principais.

24. A sanção do não conhecimento do recurso deve apenas aplicar-se à parte afetada pelo não cumprimento do ónus legal de formular alegações, ou, então, de não formular conclusões sintéticas e claras, adveniente do convite de aperfeiçoamento do relator, com aproveitamento de tudo aquilo que, ainda com algum esforço do Tribunal e da contraparte, permita saber quais as questões postas pelo Recorrente e quais as razões da sua discordância com a decisão recorrida.

25. Nessa senda, o Tribunal da Relação ... ao rejeitar a apelação do Recorrente, no que diz respeito à impugnação da matéria de facto, por alegado incumprimento do ónus legal previsto no número 1 do artigo 639.º e nos números 1 e 2 do art.º 640.º do CPC, violou ou aplicou erradamente a lei de processo, nos termos e para os efeitos do art.º 674.º/1, al. b), CPC.

B. - Do Direito:

26. No que diz respeito à matéria de Direito, sufragou o Tribunal da Relação que, em sede de recurso, impende também sobre o Apelante o ónus de invocar os argumentos jurídicos que, na sua convicção, justificam o afastamento dos fundamentos constantes da decisão recorrida para sustentar o modo como interpretou e/ou aplicou a lei, conforme o estatuído ao n.º 2 do art. 639.º do CPC, o que não foi observado na Apelação.

27. No seguimento lógico das alegações de apelação, o Autor, em última instância, impugnou também a decisão de direito, porquanto, uma vez reapreciada a prova e operada a inversão do ónus da prova, pelos motivos já aqui aduzidos, a solução jurídica a dar à questão controvertida trazida à apreciação do Tribunal, necessariamente, teria que conduzir uma solução jurídica diferente da sentenciada em 1.ª instância.

28. Destarte, dependendo a apreciação do recurso pertinente à interpretação e aplicação do Direito ao caso concreto, do prévio sucesso do simultâneo recurso interposto sobre a matéria de facto fixada, sendo este último julgado totalmente improcedente, fica necessariamente prejudicado o conhecimento daquele primeiro.

Do regime da inversão do ónus da prova:

29. A aplicação do regime da inversão do ónus da prova depende da verificação de dois pressupostos, a saber: a) que a prova de determinada factualidade, por ação da parte contrária, se tenha tornado impossível de fazer; b) que tal comportamento, da mesma parte contrária, lhe seja imputável a título culposo.

30. O princípio violado é o do dever de cooperação para a descoberta da verdade que, visando uma sã administração da justiça e a obtenção de uma decisão de mérito, o mais possível correspondente, em termos judiciários, à verdade material subjacente, vincula todas as pessoas e que se encontra explicitado no art.º 417.º, n.º 1 do CPC.

31. O estatuído no n.º 1 do art.º 417.º do CPC, como enunciação de um princípio geral que é, também ele sujeito ao princípio da proporcionalidade, o qual se desdobra, por seu turno, em três subprincípios: a) princípio da adequação, ou princípio da idoneidade; b) princípio da exigibilidade; c) princípio da proporcionalidade em sentido restrito.

 32. À impossibilidade da prova, por atuação culposa da parte não colaborante para com o onerado, deve ser equiparado, em termos de sanção do art.º 344.º, n.º 2, do Código Civil, um comportamento omissivo total ou parcialmente inviabilizador da prova, desde que, dessa falta de colaboração resulte, comprovadamente, fragilidade probatória causada pelo recusante.

33. Dessa feita, o Tribunal recorrido violou o estatuído aos arts. 344.º, n.º 2 do CC, arts. 417.º, n.º 1 e 2, 430.º, 431.º, 1 e 2, todos do CPC.

C- Da Inconstitucionalidade do artigo 640.° e 639.°, n.°l e 3 do C.P.C. na interpretação do acórdão recorrido:

34. A definição do direito ao recurso como integrante e componente do direito fundamental de defesa, impõe que a lei assegure um regime, prevendo e tornando efetiva tanto a modelação processual de um sistema coerente e acessível de recursos, como os tipos organizatórios e regime, adequados e suficientes para concretizar as imposições constitucionais.

35. O princípio do processo equitativo supõe que os sujeitos do processo usem os direitos e cumpram os seus deveres processuais com lealdade, tendo em vista a realização da Justiça e da obtenção de uma decisão justa, o que também determina, por correlação, que as autoridades, que dirigem o processo, não pratiquem atos, no exercício dos poderes processuais de ordenação, que possam criar a aparência confiante de condições legais do exercício de direitos, com a posterior e inesperada projeção de efeitos processualmente desfavoráveis para os interessados, que depositaram confiança no rigor e na legalidade de tais atos.

36. Assim, na hipótese colocada, verifica-se que o acórdão recorrido violou o disposto nos arts 6°, 7.º, 8.º, 639°, n° 1, 2, e 640.º do CPC, bem como o disposto no art.º 20.° da CRP, fazendo uma interpretação inconstitucional dos artigos 639.º e 640.° do CPC e violando e lesando os direitos do Recorrente.

 

8. A parte contrária não apresentou resposta.

 

9. Neste Supremo Tribunal de Justiça, o Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que

10. Nas suas conclusões, o recorrente suscita as seguintes questões que cumpre solucionar:

a) Se o Tribunal da Relação decidiu bem ao ter rejeitado parcialmente a reapreciação da matéria de facto, por ter considerado que o recorrente não cumpriu os ónus a que estava obrigado pelo artigo 640.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil;

b) Se o acórdão recorrido é nulo com fundamento em omissão de pronúncia sobre as questões suscitadas nos números 15 a 22 das conclusões do recurso de apelação, relativas à inversão do ónus da prova (artigo 417.º, n.º 2 do Código de Processo Civil) e à valoração favorável das declarações de parte do Autor;

c) Se a interpretação dada pelo Tribunal da Relação aos artigos 639.º, n.º 1 e 3 e 640.º do Código de Processo Civil é inconstitucional por violação do disposto no artigo 20.º da Constituição.

II

A) Fundamentação de facto:

O Tribunal da Relação consignou os factos dados como provado e não provados pelo Tribunal de 1.ª instância.

Factos provados:

“1. As rés “Primafrio”, “Doctrans” e “Lamision” dedicam-se as três ao transporte rodoviário nacional e internacional de mercadorias, entre outros – docs. de fls. 21v a 23v, de fls. 24v a 29 e de fls. 29v a 31v.

2. No objeto social da ré “Primafrio” consta, ainda: agência de transportes, compra e venda de toda a classe de veículos terrestres e industriais, comércio de carburantes combustíveis e lubrificantes, aluguer de camiões sem condutor e de semirreboques e exportação e venda por grosso de produtos hortícolas.

3. As três rés encontram-se inscritas na ANTRAM – Associação Nacional dos Transportes Públicos Rodoviários de Mercadorias.

4. A primeira ré é participada pela sócia “Krone – Mur Servifrio, SL” e tem como administrador …. BB – doc. de fls. 21v a 23v.

5. A segunda ré é participada pela sócia “Krone – Mur Servifrio, SL” e, à data da instauração da ação, tinha como gerentes CC, DD e EE - doc. de fls. 24v a 29 -, gerência essa que, atualmente (desde Janeiro de 2018), está entregue a este último e a FF - cfr. doc. de fls. 671 a 680v.

6. A terceira ré é participada pelos sócios BB, DD e “Krone – Mur Servifrio, SL” e, à data da instauração da ação, tinha como gerentes CC e GG - doc. de fls. 29v a 31v -, gerência essa que, atualmente (desde Janeiro de 2018), está entregue a esta última e a FF – cfr. doc. de fls. 681 a 686.

7. HH foi gerente da segunda e da terceira rés até 2010 (renúncias registadas a 23/01/2010 e a 11/05/2010, respetivamente – cfr. fls. 671 e ss. e 681 e ss.), é procurador junto da primeira ré (doc. de fls. de fls. 21v a 23v) e é quem, pelo menos, de facto, administra a sociedade “Krone – Mur Servifrio, SL”.

8. HH é ainda detentor de participações sociais junto da sociedade “Yosemit Holding, SGPS, L.da”, sociedade esta que foi já sócia da segunda ré (Doctrans) – docs. de fls. 24v a 29 e de fls. 33/33v.

9. A sociedade “Krone – Mur Servifrio, SL” tem sede no mesmo local que a primeira ré - Polígono Industrial La Serretamolina de Segura, Buenos Aires s/n, 30500, Múrcia, Espanha – doc. de fs. 32/32v.

10. Os trabalhadores da segunda ré conduzem camiões cujos semi reboques apenas estão identificados com o nome e logótipo da primeira ré.

11. O autor exerceu funções como motorista da ré “Primafrio” entre 01/02/2007 e 02/03/2010 – doc. de fls. 34.

12. No dia 03/02/2010, o autor e a ré “Doctrans” subscreveram o acordo denominado contrato de trabalho a tempo indeterminado, pelo qual o primeiro se obrigava a exercer as mesmas funções de motorista para a segunda – doc. de fls. 34v a 35v.

13. Apesar do descrito no facto anterior, o autor continuou a exercer as suas funções nos exactos moldes em que o vinha fazendo desde 2007, embora com alteração da identificação da empregadora no seu recibo de vencimento.

14. Entre a segunda e a terceira rés ocorreu transferência de trabalhadores.

15. O autor conduzia os veículos por ordens e no interesse da segunda ré, sendo que ... estão identificados com a marca d´água da primeira ré.

16. A segunda ré pagava ao autor um vencimento base de 600 €, acrescidos de 105,75 € a título de prémio TIR e de 337,50 € a título de Cláusula 74ª n.º 7 do CCT.

17. Pagava-lhe, ainda, montantes variáveis, a título de ajudas de custo, numa média mensal de cerca de 2.500 €.

18. O autor foi acometido de uma doença de carcinoma, tendo permanecido em situação de baixa médica desde agosto de 2015 até ao final do contrato – cfr. docs. de fls. 38 e de fls. 38v a 42.

19. O autor remeteu à segunda ré a carta registada com a/r, datada de 25/02/2016, pela qual solicitou o pagamento de parte do subsídio de Natal de 2015 e de trabalho suplementar, bem como a regularização da sua situação contributiva junto da Segurança Social (defendendo que o seu salário mensal era de 1.075 € e não de 600 €) – cfr. doc. de fls. 42v a (cfr., ainda, fls. 44v).

20. Na pendência da situação de baixa médica do autor, este último contactou, telefonicamente, II (funcionária administrativa da ré “Primafrio”), questionando-a quanto ao valor base de vencimento considerado para efeitos de cálculo dos montantes que lhe eram devidos.

21. Os montantes pagos ao autor pela Segurança Social, a título de subsídio de doença, foram calculados com base nas quantias descritas no facto provado n.º 16 – cfr. doc. de fls. 38v e ss.

22. Por carta registada com a/r dirigida à segunda ré, datada de 14/03/2016, recebida dois dias depois, o autor resolveu o respetivo vínculo com os seguintes fundamentos: “(…) Assunto: RESOLUÇÃO COM JUSTA CAUSA (…) Venho pela presente comunicar a imediata resolução, com justa causa, do meu contrato de trabalho celebrado com V. Excias, nos termos do nº 1 e nº 2 alíneas a), b), d), e) e f) do art.º 394.º do C. Trabalho. No passado dia 25 de fevereiro de 2016, remeti carta registada a V. Excias a elencar diversos factos praticado por V. Excias e que são lesivos dos meus direitos patrimoniais e morais. Apesar disso, V. Excias não se dignaram responder à minha missiva e não liquidaram os valores que me são devidos, quer a título de subsídio de Natal, quer a título de horas suplementares, assim como não procederam à regularização junto da Segurança Social do meu contrato de trabalho. Além disso, como V. Excias estão cientes, encontro-me de baixa médica devido a doença de carcinoma, e não tendo a Vossa empresa declarado corretamente os valores do meu vencimento junto da Segurança Social, estou a ser altamente lesado nesta fase da minha vida, pois que a minha retribuição mensal é de € 1.075,00, e não de € 600,00, como consta no meu extrato de remunerações. Após me ter dedicado exemplarmente ao desempenho das minhas funções na Vossa Empresa, foi-me comunicado pela V/ funcionária e representante, de nome II, em relação a tal divergência entre a retribuição depositada e a que me era devida, o seguinte: a) O acordo de pagamento que a empresa tem com os funcionários não abrange pessoas doentes; b) Não há autorizações para pagar a pessoas doentes; c) Isto não é a ONU nem a Santa Casa da Misericórdia; d) E vais passar para outra empresa, a Lamision, Sociedade de Transportes, Lda. Ora, todos estes factos, conjugados com os anteriormente relatados na minha missiva de 25 de Fevereiro de 2016, e que dou por integralmente reproduzida, a que não obtive resposta, e atento o incumprimento por parte de V. Excias, determinam a minha decisão de resolução do contrato de trabalho, com justa causa. Assim, V. Excias não cumpriram com os deveres que vos são impostos, como é o caso do dever de respeitar e tratar o trabalhador com urbanidade e probidade, pagar pontualmente a retribuição, que deve ser justa e adequada e ainda proporcionar boas condições de trabalho, do ponto de vista físico e moral. Não posso ainda deixar de frisar que tais comportamentos praticados por V. Excias, e ainda pelos Vossos funcionários, têm agravado o meu estado de saúde, aumentando a ansiedade, a depressão, nervosismo que me assolam nesta fase da minha vida. Fico aguardar o envio, no prazo de cinco dias úteis, da Declaração Modelo 5044 da Segurança Social e do Certificado de Trabalho, sem prejuízo do pagamento dos créditos laborais que me são devidos, emergentes da cessação do contrato de trabalho, acrescida da indemnização por antiguidade, nos termos do nº 1 do art.º 396.º do C.Trabalho, que não deixarei de reclamar junto de V. Excias. (…)” – cfr. doc. de fls. 36/36v (vide, ainda, fls. 37/37v).

23. O horário de trabalho do autor era de 40 horas semanais, distribuídas de segunda a sexta-feira, podendo ser aumentado em 2 horas diárias, até ao limite de 50 horas semanais.

24. O autor chegou a trabalhar no dia de Natal e na passagem de ano (em datas não concretamente apuradas).

25. Os veículos pesados de mercadorias (cabeças de trator) da ré “Doctrans” e da ré “Lamision” têm matrícula portuguesa e são propriedade das mesmas (assim como o material informático, licenças de transporte, alvarás).

26. Tais rés têm um departamento de contabilidade próprio e dispõem de departamentos administrativos e de pessoal próprios.

27. A ré “Doctrans”, com referência ao IES de 2015, apresentou um volume de vendas e serviços prestados de 161.922.192,74€ e gastos com pessoal de 80.441.818,74€, bem como um total de ativo de 40.917.889,86€ - cfr. doc. de fls. a 112.

28. A ré “Lamision”, com referência ao IES de 2015, apresentou um volume de vendas e serviços prestados de 29.312.150,89€ e gastos com pessoal de 13.622.036,83€, bem como um total de ativo de 13.336.680,04€ – cfr. doc. de fls. 112v a 114v.

29. A ré “Primafrio” é uma das principais clientes das rés “Doctrans” e “Lamision”, contratando os serviços destas empresas para o transporte dos seus semirreboques de frio pela União Europeia.

30. As rés “Doctrans” e “Lamision” são clientes da ré “Primafrio”, a nível de abastecimento de gasóleos, lubrificantes e óleos.

31. As rés “Doctrans” e “Lamision” utilizam os semirreboques da ré “Primafrio” para efetuarem transporte de mercadorias a frio a favor de clientes seus.

32. Os montantes pagos ao autor e que eram imputados a título de ajudas de custo – estrangeiro, de importâncias variáveis, eram calculados consoante os kms percorridos (contabilizados entre os dias 20 de cada mês), e destinavam-se ao pagamento dos fins de semana e feriados passados no estrangeiro, bem como a compensar descansos não gozados.

33. A título de ajudas de custo, a ré “Doctrans” processou nos recibos de vencimento do autor, entre Março de 2010 e Agosto de 2015 (data em que entrou de baixa médica), o montante total de 127.261,28€, sendo 22.826,55€ em 2010 (1.870€ em Março, 2.910€ em Abril, 3.095€ em Maio, 1.613,02€ em Junho, 2.602,52€ em Julho, 803,63€ em Agosto, 374,36€ em Setembro, 3.154,54€ em Outubro, 2.790,23€ em Novembro e 3.613,25€ em Dezembro), 29.430,14€ em 2011 (2.705€ em Janeiro, 3.520€ em Fevereiro, 2.295€ em Março, 2.560€ em Abril, 2.922,17€ em Maio, 2.585,69€ em Junho, 2.403,28€ em Julho, 190,68€ em Agosto, 2.035 em Setembro, 2.737€ em Outubro, 2.167,27€ em Novembro e 3.308,85€ em Dezembro), 28.061,85€ em 2012 (2.493,31€ em Janeiro, 2.261,99€ em Fevereiro, 2.921,89€ em Março, 1.756,30€ em Abril, 2.040€ em Maio, 2.560€ em Junho, 3.205€ em Julho, 1.036,54€ em Agosto, 1.665€ em Setembro, 2.998,39€ em Outubro, 2.130€ em Novembro e 2.293,43€ em Dezembro), 28.003,24€ em 2013 (2.580,26€ em Janeiro, 2.232,42€ em Fevereiro, 2.817,13€ em Março, 3.038,42€ em Abril, 2.455,79€ em Maio, 2.846,65€ em Junho, 2.917,12€ em Julho, 305,27€ em Agosto, 1.845,01€ em Setembro, 2.867,65€ em Outubro, 2.533,77€ em Novembro e 1.563,27€ em Dezembro), 29.172,22€ em 2014 (2.776,04€ em Janeiro, 2.306,72€ em Fevereiro, 2.768,43€ em Março, 2.397,26€ em Abril, 3.336,80€ em Maio, 2.316,02€ em Junho, 2.362,06€ em Julho, 1.852,62€ em Agosto, 252,08€ em Setembro, 3.499,34€ em Outubro, 2.560,08€ em Novembro e 2.744,77€ em Dezembro) e 14.970, 18€ em 2015 (2.929,51€ em Janeiro, 2.747,52€ em Fevereiro, 2.226,17€ em Março, 2.224,49€ em Abril, 2.608,76€ em Maio e 2.233,73€ em Junho) – cfr. docs. de fls. de 117 a 185.

34. A ré “Doctrans” procedia, ainda, a adiantamentos, antes de cada viagem, para pagamento de despesas de alimentação e higiene do autor (durante as viagens) – cujos montantes eram depois descontados nas verbas processadas a título de ajudas de custo -, tendo processado nos recibos de vencimento do autor, a esse título, um total de 39.204,29€, a saber: 4.267€ em 2015 (720€ em Janeiro, 720€ em Fevereiro, 720€ em Março, 540€ em Abril, 720€ em Maio, 540€ em Junho, 55€ em Agosto e 252€ em Novembro), 7.994,99€ em 2014 (210,22€ em Janeiro, 597,62€ em Fevereiro, 933,59€ em Março, 673,33€ em Abril, 960,41€ em Maio, 856,09€ em Junho, 727,83€ em Julho, 355,70€ em Agosto, 900€ em Outubro, 882,20€ em Novembro e 898€ em Dezembro), 3.557,10€ em 2013 (360€ em Janeiro, 180€ em Abril, 180€ em Maio, 222,91€ em Junho, 360€ em Julho, 43€ em Agosto, 625,09€ em Setembro, 793,63€ em Outubro, 185,82€ em Novembro e 606,65€ em Dezembro), 8.654,81€ em 2012 (888,43€ em Janeiro, 615€ em Fevereiro, 720€ em Março, 540€ em Abril, 315,83€ em Maio, 1.184,02€ em Junho, 1.112,06€ em Julho, 180€ em Agosto, 832,88€ em Setembro, 720€ em Outubro, 655,26€ em Novembro e 891,33€ em Dezembro), 8.056,45€ em 2011 (732€ em Janeiro, 1.057,39€ em Fevereiro, 590,95€ em Março, 869,22€ em Abril, 732€ em Maio, 720€ em Junho, 836,43€ em Julho, 121,06€ em Setembro, 755,29€ em Outubro, 540€ em Novembro e 1.075,11€ em Dezembro) e 6.673,94€ em 2010 (1.099,98 em Março, 687,63€ em Abril, 729,83€ em Maio, 346,50€ em Junho, 743,81€ em Julho, 180€ em Agosto, 1.020€ em Outubro, 540€ em Novembro e 1.326,19€ em Dezembro) – cfr. docs. de fls. de 117 a 185.

35. Enquanto trabalhador da segunda ré, o autor foi submetido a um exame médico no dia 07/03/2013, tendo sido considerado “apto” (cfr. ficha de aptidão de fls. 727).

36. A ré “Doctrans” tem instituído o sistema de condução em equipa, o qual foi aplicado ao aqui autor (que tinha um colega de cabine – 2º motorista - para tripulação do camião que lhe estava atribuído, nessa medida tendo partilhado a condução com JJ).

37. Quando, no percurso das viagens, os veículos da segunda ré são inspecionados para efeitos de controlo dos tempos de condução, pausas e repouso, é possível imprimir, in loco, o registo da atividade efetuada através do aparelho digital de controlo.

38. Os tacógrafos instalados a bordo dos veículos pesados de mercadorias da ré “Doctrans” são dispositivos digitais.

39. O veículo conduzido pelo autor, pese embora tivesse trator de matrícula portuguesa registado em nome da ré “Doctrans”, apresentava-se com o logótipo e imagem da ré “Primafrio” (cfr. docs. de fls. 587/588), tal como sucede com os outros veículos.

40. Na rede social facebook, pelo menos, em Maio de 2017, existia um grupo fechado designado por Doctrans Primafrio Lamision – cfr. fls. 591.

41. Na página da internet referente à ré “Lamision” consta como endereço de email da mesma: info@doctranslda.com (cfr. doc. de fls. 591v).

42. É a ré “Primafrio” quem elabora os procedimentos de condução, de abastecimento (dos tratores das 2ª e 3ª rés) – nos postos de abastecimento da primeira ré -, parqueamento das viaturas e transporte das mercadorias, que são entregues pela segunda e terceira rés aos seus trabalhadores, para que os observem (cfr. docs. de fls. 593v a 597).

43. Os tratores da segunda ré são reparados em oficinas autorizadas da marca do veículo.

44. Pelo menos alguns dos contactos e ordens realizadas aos trabalhadores das rés “Doctrans” e “Lamision” provêm da sede da ré “Primafrio”, em Espanha (alguns fornecidas na língua ...), sendo que, na base de ..., foram outorgados contratos de trabalho entre motoristas e a segunda ré.

45. Na base (instalações) da ré “Primafrio”, em ... ou ..., o autor e os restantes trabalhadores das rés descarregavam os cartões dos tacógrafos.

46. O tratamento de multas/contraordenações de todas as rés é feito por LL (da sociedade “G..”), em Múrcia, na sede da ré “Primafrio” (para onde os trabalhadores das rés têm de encaminhar as multas de trânsito).

47. Os exames médicos a que os trabalhadores das três rés são sujeitos realizam-se na base de ... (instalações da primeira ré).

48. Os recibos de vencimento do Autor sempre lhe foram colocados à disposição para serem assinados na base da 1.ª Ré Primafrio, em ... ou ....

49. Era também nessa base que o autor levantava as ordens das viagens seguintes e apresentava as despesas e os quilómetros percorridos no fim de cada viagem.

50. O autor nunca se deslocou a Alverca do Ribatejo onde, até ao ano de 2017, estava sediada a ré Doctrans (cfr. fls. 671 e ss.), sede essa instalada num edifício destinado a serviços (cfr. fls. 597v).

51. A sede da 3.ª Ré, Lamision, esteve também, pelo menos até 2017, instalada num edifício igualmente destinado a escritórios de serviços, sito ao Largo Rafael Bordalo Pinheiro, n.º 16, concelho de Lisboa (cfr. fls. 598 e doc. de fls. 681 e ss.)

52. Pelo menos enquanto perdurou o exercício de funções pelo autor, eram as instalações da primeira ré que serviam de plataforma dos veículos e de base para o seu aparcamento (das três rés).

53. As CMR (guias de transporte de mercadorias – controlo de mercadoria rodoviária) da segunda ré são elaboradas e impressas na língua ... (a primária do documento) e com a marca d´água da ré “Primafrio” (sendo em tudo idênticas às CMR da primeira ré – cfr. docs. de fls. 598v e 599).

54. Os CMR são levantados e preenchidos na base em ... ou ..., nas instalações da primeira ré.

55. O Autor sofreu um acidente de viação no dia 27/03/2011, o qual foi participado pela segunda ré à “Generali – Companhia de Seguros, S.p.A” (cfr. docs. de fls. 724v a 726v).

56. A terceira ré, em 2014, tinha cinco trabalhadores e, no ano seguinte, tinha já 68 trabalhadores (cfr. docs. de fls. 186 a 190 e de fls. 191).”

Constam ainda da sentença, enquanto não provados, os seguintes factos, cuja enumeração foi inserida pelo Tribunal da Relação:

Da Petição Inicial

1. - que HH seja casado com DD;

2. - que as três rés partilhem os departamentos administrativo e de contabilidade;

3. - que o autor auferisse uma remuneração base de 1.075€ mensais;

4. - que a segunda ré tenha prometido ao autor que iria “regularizar” junto da Segurança Social a sua situação contributiva (com referência ao salário de 1075€);

5. - que a sociedade “Krone – Mur Servifrio, SL” tenha como administrador único HH;

6. - que BB seja procurador junto da sociedade “Krone – Mur Servifrio, SL”;

7. - que os trabalhadores da 2ª ré utilizem cabeças de tractor da 1ª ré;

8. - que as três rés partilhem equipamentos, Know-How e clientela, no que extravasa o constante da factualidade provada;

9. - que os trabalhadores das três rés trabalhem para as mesmas de forma indiscriminada e regular;

10. - que o autor exercesse funções para a primeira ré;

11. - que o autor tenha subscrito o contrato de trabalho que outorgou com a 2ª ré por exigência da 1ª ré e para evitar ser despedido;

12. - que, em inícios de 2016, a segunda ré, através de II, tenha comunicado ao autor que ele teria que aceitar ser transferido para a terceira ré;

13. - que a primeira ré tenha transmitido ao autor que a segunda ré era uma empresa do grupo a que pertencia aquela, e que o autor manter-se-ia a desempenhar as suas funções com as mesmas condições laborais e de retribuição, e a acatar as ordens dos mesmos responsáveis, alterando-se apenas a denominação da sua entidade patronal;

14. - que a primeira ré tenha transmitido ao autor que a segunda ré assumiria todos os direitos laborais e de antiguidade que o mesmo havia adquirido ao serviço da “Primafrio”;

15. - que a gestão da segunda ré seja feita por BB;

16. - que o horário referido no facto provado n.º 23 fosse fixado através de mapas de escalas nos moldes previstos na cláusula 4ª n.º 1 do contrato de fls. 34 e ss.;

17. - o alegado nos arts. 72º a 77º da PI;

18. - que o autor não tenha gozado folga nos seguintes dias do ano de 2009: a) entre 01/01 e 28/02: 9 sábados (03/01, 10/01, 17/01, 24/01, 31/01, 07/02, 14/02, 21/02 e 28/02), 8 domingos (04/01, 11/01, 18/01, 25/01, 01/02, 08/02, 15/02, 22/02), e 1 feriado (01/01); b) entre 01/03 e 30/04: 8 sábados (07/03, 14/03, 21/03, 28/03, 04/04, 11/04, 18/04 e 25/04), 9 domingos (01/03, 08/03, 15/03, 22/03, 29/03, 05/04, 12/04, 19/04, 26/04), e 2 feriado (10/04 e 25/04); c) entre 01/05 e 30/06: 5 (e não, como por lapso, se terá escrito, “9”) sábados (02/05, 09/05, 16/05, 23/05, 30/05), 9 domingos (03/05, 10/05, 17/05, 24/05, 31/05, 07/06, 14/06, 21/06, 28/06), e 2 feriado (01/06 e 10/06); d) entre 01/07 e 30/09: 8 sábados (04/07, 11/07, 18/07, 25/07, 05/09, 12/09, 19/09, 26/09), 8 domingos (05/07, 12/07, 19/07, 26/07, 06/09, 13/09, 20/09, 27/09); e) entre 01/10 e 31/12: 13 sábados (03/10, 10/10, 17/10, 24/10, 31/10, 07/11, 14/11, 21/11, 28/11, 05/12, 12/12, 19/12, 26/12), 13 domingos (04/11, 11/10, 18/10, 25/10, 01/11, 08/11, 15/11, 22/11, 29/11, 06/12, 13/12, 20/12, 27/12), 5 feriados (05/10, 01/11, 01/12, 08/12, 25/12);

19. - que o autor não tenha gozado folga nos seguintes dias do ano de 2010: a) entre 01/01 e 28/02: 9 sábados (02/01, 09/01, 16/01, 23/01, 30/01, 06/02, 13/02, 20/02, 27/02), 9 domingos (03/01, 10/01, 17/01, 24/01, 31/01, 07/02, 14/02, 21/02 e 28/02) e 1 feriado (01/01); b) entre 01/03 e 30/04: 8 sábados (06/03, 13/03, 20/03, 27/03, 03/03, 10/04, 17/04 e 24/04), 8 domingos (07/03, 14/03, 21/03, 28/03, 04/04, 11/04, 18/04 e 25/04); c) entre 01/05 e 30/06: 9 (e não, como por lapso, se terá escrito, “8”) sábados (01/05, 08/05, 15/05, 22/05, 29/05, 05/06, 12/06, 19/06, 26/06), 9 (e não, como por lapso, se terá escrito, “8”) domingos (02/05, 09/05, 16/05, 23/05, 30/05, 06/06, 13/06, 20/06 e 27/06) e 3 feriados (01/05, 03/06, 10/06); d) de 01/07 a 30/09: 9 sábados (03/07, 10/03, 17/07, 24/07, 31/07, 04/09, 11/09, 18/09, 25/09), 8 domingos (04/07, 11/07, 18/07, 25/07, 05/09, 12/09, 19/09, 26/09); e) de 01/10 a 31/12: 13 sábados (02/10, 09/10, 16/10, 23/10, 30/10, 06/11, 13/11, 20/11, 27/11, 04/12, 11/12, 18/12, 25/12), 13 domingos (03/10, 10/10, 17/10, 24/10, 31/10, 07/11, 14/11, 21/11, 28/11, 05/12, 12/12, 19/12, 25/12), e 4 (e não, como por lapso, se terá escrito, “5”) feriados (05/10, 01/11, 01/12, 08/12);

20. - que o autor não tenha gozado folga nos seguintes dias do ano de 2011: a) de 01/01 a 28/02: 9 (e não, como por lapso, se terá escrito, “8”) sábados (01/01, 08/01, 15/01, 22/01, 29/01, 05/02, 12/02, 19/02, 26/02), 9 domingos (02/01, 09/01, 16/01, 23/01, 30/01, 06/02, 13/02, 20/02, 27/02), e 1 feriado (01/01); b) de 01/03 a 30/04: 9 sábados (05/03, 12/03, 19/03, 26/03, 02/04, 09/04, 16/04, 23/04, 30/04), 8 domingos (06/03, 13/03, 20/03, 27/03, 03/04, 10/04, 17/04, 24/04) e 2 (e não, como por lapso, se terá escrito, “1”) feriados (22/04, 25/04); c) de 01/05 a 30/06: 8 sábados (07/05, 14/05, 21/05, 28/05, 04/06, 11/06, 18/06, 25/06), 9 domingos (01/05, 05/05, 15/05, 22/05, 29/05, 05/06, 12/06, 19/06, 26/06) e 2 (e não, como por lapso, se terá escrito, “1”) feriados (01/05 e 23/06); d) de 01/07 a 30/09: 9 sábados (02/07, 9/07, 16/07, 23/07, 30/07, 03/09, 10/09, 17/09, 24/09), 9 domingos (03/07, 10/07, 17/07, 24/07, 31/07, 04/09, 11/09, 18/09, 25/09); e) de 01/10 a 31/12: 14 sábados (01/10, 08/10, 15/10, 22/10, 29/10, 05/11, 12/11, 19/11, 26/11, 03/12, 10/12, 17/12, 24/12, 31/12), 13 domingos (02/10, 09/10, 16/10, 23/10, 30/10, 06/11, 13/11, 20/11, 27/11, 04/12, 11/12, 18/12, 25/12), e 5 feriados (05/10, 01/11, 01/12, 08/12, 25/12);

21. - que o autor não tenha gozado folga nos seguintes dias do ano de 2012: a) de 01/01 a 28/02: 8 sábados (07/01, 14/01, 21/01, 28/01, 04/02, 11/02, 18/02, 25/02), 9 domingos (01/01, 08/01, 15/01, 22/01, 29/01, 05/02, 12/02, 19/02, 26/02) e 2 feriado (01/01, 21/02); b) de 01/03 a 30/04: 10 (e não, como por lapso, se terá escrito, “9”) sábados (03/03, 10/03, 17/03, 24/03, 31/03, 01/04, 07/04, 14/04, 21/04, 28/04), 9 (e não, como por lapso, se terá escrito, “8”) domingos (04/03, 11/03, 18/03, 25/03, 01/04, 08/04, 15/04, 22/04, 29/04) e 2 feriado (06/04, 25/04); c) de 01/05 a 30/06: 9 sábados (05/05, 12/05, 19/05, 26/05, 02/06, 09/06, 16/06, 23/06, 30/06), 8 domingos (06/05, 13/05, 20/05, 27/05, 03/06, 10/06, 17/06, 24/06) e 3 feriado (01/05, 07/06 e 10/06); d) de 01/07 a 30/09: 9 sábados (07/07, 14/07, 21/07, 28/07, 01/09, 08/09, 15/09, 22/09, 29/09), 10 domingos (01/07, 08/07, 15/07, 22/07, 29/07, 02/09, 09/09, 16/09, 23/09, 30/09); e) de 01/10 a 31/12: 13 sábados (06/10, 13/10, 20/10, 27/10, 03/11, 10/11, 17/11, 24/11, 01/12, 08/12, 15/12, 22/12, 29/12), 13 domingos (07/10, 14/10, 21/10, 28/10, 04/11, 11/11, 18/11, 25/11, 02/12, 09/12, 16/12, 23/12, 30/12) e 5 feriados (05/10, 01/11, 01/12, 08/12, 25/12);

22. - que o autor não tenha gozado folga nos seguintes dias do ano de 2013: a) de 01/01 a 28/02: 8 sábados (05/01, 12/01, 19/01, 26/01, 02/02, 09/02, 16/02, 23/02), 7 (e não, como por lapso, se terá escrito, “3”) domingos (06/01, 13/01, 20/01, 27/01, 03/02, 17/02, 24/02) e 2 feriados (01/01, 10/02); b) de 01/03 a 30/04: 9 sábados (02/03, 09/03, 16/03, 23/03, 30/03, 06/04, 13/04, 20/04, 27/04), 8 domingos (03/03, 10/03, 17/03, 24/03, 07/04, 14/04, 21/04, 28/04) e 4 feriados (29/03, 31/03, 05/04, 25/04); c) de 01/05 a 30/06: 9 sábados (04/05, 11/05, 18/05, 25/05, 01/06, 08/06, 15/06, 22/06, 29/06) 9 domingos (05/05, 12/05, 19/05, 26/05, 02/06, 09/06, 16/06, 23/06, 30/06) e 2 feriados (01/05 e 10/06); d) de 01/07 a 30/09: 8 sábados (06/07, 13/07, 20/07, 27/07, 07/09, 14/09, 21/09, 28/09) 9 domingos (07/07, 14/07, 21/07, 28/07, 01/09, 08/09, 15/09, 22/09, 29/09) e 1 feriado (15/08); e) de 01/10 a 31/12: 13 sábados (05/10, 12/10, 19/10, 26/10, 02/11, 09/11, 16/11, 23/11, 30/11, 07/12, 14/12, 21/12, 28/12), 12 domingos (06/10, 13/10, 20/10, 27/10, 03/11, 10/11, 17/11, 24/11, 01/12, 15/12, 22/12, 29/12) e 2 (e não, como por lapso, se terá escrito, “1”) feriados (08/12 e 25/12);

23. - que o autor não tenha gozado folga nos seguintes dias do ano de 2014: a) de 01/01 a 28/02: 8 sábados (04/01, 11/01, 18/01, 25/01, 01/02, 08/02, 15/02, 22/02), 8 domingos (05/01, 12/01, 19/01, 26/01, 02/02, 09/02, 16/02, 23/02) e 1 feriado (01/01); b) de 01/03 a 30/04: 9 sábados (01/03, 08/03, 15/03, 22/03, 29/03, 05/04, 12/04, 19/04, 26/04), 8 domingos (02/03, 09/03, 16/03, 23/03, 30/04, 06/04, 13/04, 27/04) e 3 feriados (18/04, 20/04, 25/04); c) de 01/05 a 30/06: 9 sábados (03/05, 10/05, 17/05, 24/05, 31/05, 07/06, 14/06, 21/06, 28/06), 9 domingos (04/05, 11/05, 18/05, 25/05, 01/06, 08/06, 15/06, 22/06, 29/06) e 2 (e não, como por lapso, se terá escrito, “1”) feriados (01/05 e 10/06); d) de 01/07 a 30/09: 8 sábados (05/07, 12/07, 19/07, 26/07, 06/09, 13/09, 20/09, 27/09), 8 domingos (06/07, 13/07, 20/07, 27/07, 07/09, 14/09, 21/09, 28/09) e 1 feriado (15/08); e) de 01/10 a 31/12: 13 sábados (04/10, 11/10, 18/10, 25/10, 01/11, 08/11, 15/11, 22/11, 29/11, 06/12, 13/12, 20/12, 27/12), 13 domingos (05/10, 12/10, 19/10, 26/10, 02/11, 09/11, 16/11, 23/11, 30/11, 07/12, 14/12, 21/12, 28/12) e 2 feriados (08/12 e 25/12);

24. - que o autor não tenha gozado folga nos seguintes dias do ano de 2015: a) de 01/01 a 28/02: 9 sábados (03/01, 10/01, 17/01, 24/01, 31/01, 07/02, 14/02, 21/02, 28/02), 8 domingos (04/01, 11/01, 18/01, 25/01, 01/02, 08/02, 15/02, 22/02) e 1 feriado (01/01); b) 01/03 a 30/04: 7 sábados (07/03, 14/03, 21/03, 28/03, 04/04, 11/04, 18/04,) 8 domingos (01/03, 08/03, 15/03, 22/03, 29/04, 12/04, 19/04, 26/04) e 3 feriados (03/04, 05/04, 25/04); c) de 01/05 a 30/06: 9 sábados (02/05, 09/05, 16/05, 23/05, 30/05, 06/06, 13/06, 20/06, 27/06), 9 domingos (03/05, 10/05, 17/05, 24/05, 31/05, 07/06, 14/06, 21/06, 28/06) e 2 feriados (01/05 e 10/06); d) 01 a 30/07: 4 sábados (04/07, 11/07, 18/07, 25/07) e 4 (e não, como por lapso, se terá escrito, “5”) domingos (05/07, 12/07, 19/07, 26/07);

25. - que II seja secretária administrativa ou funcionária da 2ª ré;

26. - que a referida II tenha dirigido ao autor as expressões descritas nos arts. 57º e 59º da PI;

27. - que, na sequência de palavras proferidas pela citada II, o autor se tenha sentido angustiado e desgostoso;

28. - que a segunda ré tenha diminuído e humilhado o autor em virtude de o mesmo se encontrar doente;

29. - que o autor se tenha sentido mal, agravado o seu estado clínico ou ficado noites sem dormir, assim como tenha agravado qualquer estado depressivo, nervosismo ou perturbação que já apresentasse, na sequência de algum comportamento assumido pela segunda ré;

30. - que o autor se tenha sentido inútil e desprezado pelas rés e que tenha exercido as respectivas funções em condições de trabalho lesivas para a sua saúde e bem-estar, e em prejuízo da sua vida familiar;

31. - que o autor tenha trabalhado horas e semanas a fio sem ver a sua família e sem descansar, por imposição das rés;

32. - que, quando o autor tentava fazer qualquer exigência, as rés ou os seus representantes o ameaçassem com o despedimento;

Da Contestação das rés Doctrans e Lamision:

33. - que o autor nunca tenha conduzido cabeças de tractores da primeira ré;

34. - que nunca tenha existido transferências patrimoniais entre a 1ª e a 2ª rés para efeito de pagamentos de salários aos trabalhadores da segunda;

35. - que a segunda ré não tenha qualquer funcionária chamada “II”;

36. - que a tripulação dos veículos TIR da segunda ré sempre tenham respeitado os períodos máximos de tempos de condução e os períodos de tempos de descanso;

37. - que a ré “Doctrans” tenha cerca de 2000 trabalhadores e ré “Lamision” tenha cerca de 1000 trabalhadores;

38. - que a ré “Primafrio” não partilhe clientes com as restantes duas rés, nem partilhe com estas CMR;

39. - que as rés Doctrans e Lamision beneficiem de preços mais competitivos e vantajosos nos combustíveis fornecidos pela 1ª ré;

40. - que o descrito no facto provado n.º 31 tenha subjacente algum contrato de aluguer dos semirreboques da primeira ré;

41. - que, sob a rubrica “ajudas de custo”, a segunda ré tenha pago ao autor um montante global de 130.005,25€, dos quais 17.714,15€ em 2015;

42. - que, sob a rubrica “adiantamentos”, a segunda ré tenha pago ao autor um montante global de 39.807,32€, dos quais 4.870,03€ em 2015;

43. - que, entre o autor e a 2ª ré tenha sido expressamente negociado/acordado qualquer regime remuneratório distinto do previsto no IRCT aplicável ao vínculo;

44. - que a ré “Doctrans” tenha contratado os serviços de saúde e segurança no trabalho com as empresas “C...” e “M...”;

45. - que o autor tenha feito exame de aptidão médica no dia 27/09/2010;

46. - que o autor viajasse com o trabalhador MM;

Da Resposta do autor:

47. - que seja a ré “Primafrio” quem determine aos trabalhadores das restantes duas rés qual o local, em ..., onde, sob a sua supervisão e orientação, os veículos tractores (na titularidade destas últimas) seriam reparados e revistos, bem como que, tal local, seja uma oficina ou base da primeira ré;

48. - que seja a ré “Primafrio” quem, recentemente, permita que os tratores sejam reparados em oficinas autorizadas da marca do veículo;

49. - que sempre tenha sido a ré “Primafrio” quem, no início das viagens, transmitisse diretamente ao autor o local onde podia estacionar o veículo para descansar, bem como quais os locais de abastecimento de combustível do veículo (trator) conduzido pelo mesmo;

50. - que, atualmente, o descrito no facto provado n.º 45 se mantenha (descarga dos cartões em ...) e que esse fosse o único local onde tal tarefa pudesse ser efetuada;

51. - que seja na base da ré “Primafrio” que fiquem armazenados os dados dos tacógrafos de todos os trabalhadores das três rés (nos computadores da primeira ré);

52. - que o departamento de controlo de tráfego apenas exista na sede da ré “Primafrio” (inexistindo nas demais rés);

53. - que LL seja trabalhador da ré “Primafrio”;

54. - que os exames médicos a que se alude no facto provado n.º 47 sejam realizados por um médico contratado pela ré “Primafrio”;

55. - que as rés permutem entre si a titularidade dos veículos/tratores, assim como que a matrícula portuguesa dos veículos da 2.ª e 3.ª rés seja cancelada para que os mesmos sejam inscritos e matriculados em ..., a favor da ré Primafrio, e vice-versa;

56. - que um mesmo veículo/trator possua matrícula portuguesa e ..., a qual é alterada consoante as conveniências ou território em que tal veículo circula;

57. - que as rés tenham sido multadas por a matrícula não corresponder ao chassis;

58. - que os pagamentos dos serviços que as rés Doctrans e Lamision encomendam e liquidam à ré Primafrio correspondam a meras operações contabilísticas (para processar as despesas e os movimentos contabilísticos de todas as rés, nomeadamente para efeitos fiscais);

59. - que os funcionários administrativos que exercem atividade para a segunda e para a terceira rés, na sede destas em Portugal, recebam ordens da primeira ré ou dos trabalhadores desta, provindas de ...;

60. - que seja a primeira ré quem determina e autoriza a realização das reparações e revisões dos veículos de todas as rés;

61. - que o contrato de trabalho do autor com a 2ª ré tenha sido assinado a pedido de II, na base da 1ª ré, em ...;

62. - que, aquando da assinatura do contrato com a segunda ré, tenha ocorrido alguma alteração da matrícula do veículo então conduzido pelo autor;

63. - que, nos edifícios referidos nos factos provados n.º 50 e 51 existam escritórios de advogados, sociedades de mediação imobiliária e centros auditivos;

64. - que seja a primeira ré quem efetua a coordenação e a contratação dos veículos e trabalhadores de todas as rés;

65. - que, quando algum trabalhador suspeitava ou desconfiava que iria transitar para outra ré, e para que o mesmo assinasse um novo contrato, lhe fosse prometida a troca do camião em que circulava por um outro novo;

66. - que a segunda e a terceira rés não possuam uma imagem própria, nem um sinal distintivo no mercado;

67. - que seja a primeira ré quem contrata os serviços de transporte com o cliente final e quem fatura ao cliente o transporte da mercadoria;

68. - que as rés Doctrans e Lamision não possuam clientes, apenas servindo a ré Primafrio (estando totalmente dependentes dos serviços prestados a esta última);

69. - que as CRM da 2ª ré tenham o logótipo (já não a marca d´água) da 1ª ré;

70. - que, após o acidente sofrido pelo autor a 27/03/2011, em substituição do camião sinistrado, a primeira ré lhe tenha entregue um outro veículo de matrícula ..., sua propriedade, cuja licença comunitária pertencia à Primafrio;

71. - que o autor tenha efetuado viagens sozinho;

72. - que o autor nunca tenha viajado com um colega chamado MM, apenas o tendo feito com os colegas NN, OO, PP e QQ;

73. - que o descanso do motorista apenas ocorresse durante a circulação do veículo (enquanto o colega conduzia);

74. - que o acidente do dia 27/03/2011 tenha ocorrido nas circunstâncias descritas na Resposta (quando o autor estava a conduzir, o seu companheiro tentou saltar do compartimento onde dormia para a frente da cabina, tendo-se desequilibrou-se e caído em cima daquele, originando o despiste);

75. - que a segunda ré tenha sido condenada por 32 infrações nos anos de 2012, 2013 e 2014, tendo ficado interditada de circular na prefeitura da região ...;

76. - que a segunda ré tenha sido condenada por ter praticado 16 delitos de cabotagem irregular e 14 delitos de falsificação ou utilização irregular de tacógrafo, bem como que tenha sido alvo de uma investigação por alegada violação dos direitos dos trabalhadores e regras de transporte;

77. - que CC seja um “testa de ferro” da 1ª ré;

78. - que, após a instauração da presente ação, BB tenha contactado telefonicamente o autor, desculpando-se “pela atuação da funcionária II” (e comunicando-lhe que esta teria sido despedida) e solicitando que desistisse do processo, voltando a trabalhar para a 2ª ré.

79. - que o autor sempre tenha recorrido aos funcionários de nacionalidade ... que trabalhavam nos escritórios da 1ª Ré Primafrio (nomeadamente a II) para esclarecimento de qualquer assunto da viagem ou relativo a salários ou despesas.

B) Fundamentação de Direito:

O recorrente questiona a decisão do Tribunal da Relação que rejeitou parcialmente a reapreciação da matéria de facto, por ter considerado que o recorrente não cumpriu os ónus a que estava obrigado pelo artigo 640.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil.

Nessa linha, defende que a interpretação dada pelo Tribunal da Relação aos artigos 639.º, n.º 1 e 3 e 640.º do Código de Processo Civil é inconstitucional por violação do disposto no artigo 20.º da Constituição.

Vejamos a parte do acórdão do Tribunal da Relação que se debruçou sobre a questão:

Importando dar aplicação no presente recurso ao regime que se expôs anteriormente, constata-se que o Recorrente, em parte substancial do recurso que dirige à matéria de facto no sentido da sua reapreciação, em vez de concretizar os meios de prova em relação a cada um dos factos impugnados, como lhe era exigido, faz tal concretização por referência a conjuntos de factos (que, diga-se, se assumem entre eles como diversos e/ou autónomos), assim, respetivamente, recorrendo ao corpo das alegações em que se faz a concretização, quanto aos seguintes conjuntos de pontos que constam da sentença, 25.º a 31.º do elenco factual provado e, quanto ao considerado não provado, em face da numeração por nós introduzida, os seguintes: 5.º e 6.º; 7.º a 9.º; 10.º a 14.º; 15.º, 17.º (o alegado no artigos 72.º a 77.º da petição inicial), 18.º, 19.º, 20.º, 21.º, 22.º, 23.º, 24.º, 31.º e 73.º; 26.º (o primeiro não referido nas conclusões) a 32.º; 47.º a 51.º, 60.º (este não referido nas conclusões) e 79.º; 52.º e 53.º; 55.º a 58.º; 61.º e 62.º; 64.º, 65.º, 67.º e 68.º; 70.º, 71.º, 72.º, 74.º, 75.º, 76.º e 78.º.

Na mencionada atuação do Recorrente inserem-se também as considerações que faz nas conclusões 15.ª a 22.ª sobre imputada violação pela Tribunal a quo do disposto ao artigo 344.º, n.º 2, do Código Civil (CC) e 417.º, n.º 2 do CPC, referentes à inversão do ónus de prova, para concluir, assim na conclusão 21.ª, que, “por conseguinte, todos os factos constantes dos artigos acima melhor identificados a fls. 98 (último parágrafo) a 141, e que por economia processual aqui se dão por reproduzidos, deveriam ter sido declarados provados, com recurso à inversão do ónus de prova”, e, na conclusão 22.ª, por sua vez, que “para além disso, tal recusa, antecedida e seguida da produção de outros meios de prova pelo Autor, designadamente as suas declarações de parte, que cuidou de informar e avisar antecipadamente que versariam sobre a factualidade pessoal e do conhecimento direto do BB, que assim não as quis contrariar, infirmar ou confirmar, deveria ter servido ainda para valorar favoravelmente as declarações de parte do Autor”.

É que, em face do modo como faz a invocação, torna-se manifesto que se limita aqui a tecer considerações genéricas sobre eventual inversão do ónus da prova e ainda de pretendida valoração favorável das suas declarações de parte, sendo que, pretendendo fazer uso de tais argumentos quanto a quaisquer pontos concretos da factualidade provada, assim no sentido de fundamentar diversa convicção, esses deveria dirigir em concreto a cada um desses factos que pretendesse impugnar (e não pois em termos genéricos). De facto, no cumprindo os ónus legais impostos, nos termos antes indicados, torna-se necessário, como se disse, que se indique nas conclusões os concretos pontos de facto que se consideram incorretamente julgados, os concretos meios de prova que impõem decisão diversa e qual a decisão a proferir sobre as questões de facto que são impugnadas, sem esquecermos que, como resulta do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de Setembro de 2018, também antes citado, a exigência, em termos de indicação dos concretos meios de prova, se reporta a cada um daqueles factos e não pois de modo genérico. Nos termos expostos, limitar-nos-emos a apreciar os pontos de facto que são expressamente indicados depois nas conclusões, desde que cumpridos também os supra afirmados ónus legais.

Porque assim é, aplicando o regime que anteriormente se afirmou, que temos como resultante do regime legal, rejeita-se o recurso quanto aos antes indicados conjuntos de factos, por falta de cumprimento nessa parte do também mencionado ónus legal.

Tendo presente as conclusões do recorrente, acima transcritas, vejamos de lhe assiste razão.

O artigo 640.º do Código de Processo Civil, com a epígrafe «Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto» estatui o seguinte:

1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.

3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.

A atual redação desta disposição legal foi introduzida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, e encontra correspondência, embora com algumas alterações, no art.º 685.º do anterior Código de Processo Civil, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24/8.

António Santos Abrantes Geraldes (Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2016 – 3.ª Edição, Almedina, pág. 136 e seguintes) refere que as alterações mais salientes introduzidas na nova redação caracterizam-se pelo reforço do ónus de alegação, devendo o recorrente, sob pena de rejeição, indicar a resposta que, no seu entender, deve ser dada às questões de facto impugnadas, e relativamente a provas gravadas basta ao recorrente a indicação exata das passagens da gravação, não sendo obrigatória em caso algum a sua transcrição.

O citado autor, numa apreciação da evolução histórica do instituto da «Modificabilidade da decisão de facto», sublinha que a possibilidade de alteração da matéria de facto deixou de ter carácter excecional para se assumir como uma função normal do Tribunal da Relação, verificados que estejam os requisitos impostos pela lei. No entanto, adverte que «Nesta operação foram recusadas soluções que pudessem reconduzir-nos a uma repetição do julgamento, tal como foi rejeitada a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, tendo o legislador optado por abrir apenas a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente».

O Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a pronunciar-se, em diversos acórdãos, sobre o ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, firmando uma linha jurisprudencial que iremos procurar sintetizar.

No que diz respeito ao enquadramento processual da rejeição da impugnação da decisão relativa à matéria de facto, o Supremo Tribunal de Justiça considerou no acórdão de 3/12/2015, proferido no processo n.º 3217/12.1TTLSB.L1.S1 (Revista-4.ª Secção), que se o Tribunal da Relação decide não conhecer da reapreciação da matéria de facto fixada na 1.ª instância, invocando o incumprimento das exigências de natureza formal decorrentes do artigo 640.º do Código de Processo Civil, tal procedimento não configura uma situação de omissão de pronúncia.

No mesmo acórdão refere-se que o art.º 640.º, do Código de Processo Civil exige ao recorrente a concretização dos pontos de facto a alterar, assim como dos meios de prova que permitem pôr em causa o sentido da decisão da primeira instância e justificam a alteração da mesma e, ainda, a decisão que, no seu entender deve ser proferida sobre os pontos de facto impugnados.

Acrescenta-se que este conjunto de exigências se reporta especificamente à fundamentação do recurso não se impondo ao recorrente que, nas suas conclusões, reproduza tudo o que alegou acerca dos requisitos enunciados no art.º 640.º, n.ºs 1e 2 do CPC.

Por fim, conclui-se que versando o recurso sobre a impugnação da decisão relativa à matéria de facto, importa que nas conclusões se proceda à indicação dos pontos de facto incorretamente julgados e que se pretende ver modificados.

A propósito do conteúdo das conclusões, o acórdão de 11-02-2016, proferido no processo n.º 157/12.8 TUGMR.G1.S1 (Revista) – 4.ª Secção, refere que tendo a recorrente identificado no corpo alegatório os concretos meios de prova que impunham uma decisão de facto em sentido diverso, não tem que fazê-lo nas conclusões do recurso, desde que identifique os concretos pontos da matéria de facto que impugna (Cfr. no mesmo sentido acórdãos de 18/02/2016, proferido no processo n.º 558/12.1TTCBR.C1.S1, de 03/03/2016, proferido no processo n.º 861/13.3TTVIS.C1.S1, de 12/05/2016, proferido no processo n.º 324/10.9TTALM.L1.S1 e de 13/10/2016, proferido no processo n.º 98/12.9TTGMR.G1.S1, todos da 4.ª Secção).

No que diz respeito à exigência prevista na alínea b), do n.º 1, do art.º 640.º do Código de Processo Civil, o acórdão de 20-12-2017, proferido no processo n.º 299/13.2TTVRL.C1.S2 (Revista) - 4ª Secção, afirma com muita clareza que quando se exige que o recorrente especifique «os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida», impõe-se que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respetivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens de cada um dos depoimentos.

Quanto ao caso em análise no aludido acórdão referiu-se que não cumpre aquele ónus o apelante que, nas alegações e nas conclusões, divide a matéria de facto impugnada em três «blocos distintos de factos» e indica os meios de prova relativamente a cada um desses blocos, mas omitindo-os relativamente a cada um dos concretos factos cuja decisão impugna.

Acerca da natureza do ónus de alegação, quando se pretenda impugnar a matéria de facto, o acórdão de 09-02-2017, proferido no processo n.º 471/10.7 TTCSC.L1.S1 (Revista – 4.ª Secção), sublinhou que «Ao impor um ónus especial de alegação quando se pretenda impugnar a matéria de facto, com fundamento na reapreciação da prova gravada, o legislador pretendeu evitar que o impugnante se limite a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo simplesmente a reapreciação de toda a prova produzida em primeira instância, daí que o prazo acrescido de 10 dias só seja aplicável quando o recorrente o use efetivamente para impugnar a matéria de facto».

Finalmente, na linha da doutrina (Cfr. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2016-3.ª Edição, Almedina, pág. 142), o Supremo Tribunal de Justiça tem entendido que quando o recorrente não cumpra o ónus imposto no art.º 640.º do Código de Processo Civil não há lugar ao convite ao aperfeiçoamento, que está reservado para os recursos da matéria de direito (Cfr. acórdãos de 7/7/2016, proferido no processo n.º 220/13.8TTBCL.G1.S1 e de 27/10/2016, proferido no processo n.º 110/08.6TTGDM.P2.S1, ambos da 4.ª Secção).

Mais recentemente, a propósito desta problemática, a Secção Social deste Supremo Tribunal voltou a sublinhar:

- A alínea b), do n.º 1, do art.º 640.º do CPC, ao exigir que o recorrente especifique “os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida”, impõe que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respetivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens de cada um dos depoimentos.

- Não cumpre aquele ónus o apelante que, nas alegações e nas conclusões, agrega a matéria de facto impugnada em blocos ou temas e indica os meios de prova relativamente a cada um desses blocos, mas omitindo-os relativamente a cada um dos concretos factos cuja decisão impugna. (Acórdão de 19-12-2018, proferido no Proc. n.º 271/14.5TTMTS.P1. S1 e Acórdão de 05-09-2018, proferido no Proc. n.º 15787/15.8T8PRT.P1. S2.)

- Da conjugação do art.º 640.º, n.º 1, alíneas a) e c), do Código de Processo Civil, com o disposto no art.º 639.º, n.º 1, do mesmo diploma legal, resulta que o recorrente que pretenda impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto tem de fazer consignar nas suas conclusões os concretos pontos de facto que pretende impugnar e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida. (Acórdão de 31-10-2018, proferido no Proc. n.º 2820/15.2T8LRS.L1. S1.)

- Na verificação do cumprimento dos ónus de alegação previstos no artigo 640.º do Código de Processo Civil, os aspetos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

- Limitando-se o Recorrente a afirmar, tanto na alegação como nas conclusões, que, face aos concretos meios de prova que indica, “se impunha uma decisão diversa”, relativamente às questões de facto que impugnara, deve o recurso ser rejeitado quanto à impugnação da matéria de facto, por não cumprimento do ónus processual fixado na alínea c), do n.º 1, do artigo 640.º, do Código de Processo Civil. (Acórdão de 06-06-2018, proferido no Proc. n.º 1474/16.3T8CLD.C1. S1.)

- Não cumpre o ónus imposto pelo n.º 2, al. a), do artigo 640.º do Código de Processo Civil - indicação exata das passagens da gravação em que se funda a sua discordância - o recorrente que nem indicou as passagens da gravação, nem procedeu à respetiva transcrição e se limitou a fazer um resumo, das partes pertinentes desses depoimentos. (Acórdão de 06-06-2018, proferido no Proc. n.º 125/11.7TTVRL.G1. S1.)

 

- Sendo as conclusões não apenas a súmula dos fundamentos aduzidos nas alegações stricto sensu, mas também e sobretudo as definidoras do objeto do recurso e balizadoras do âmbito do conhecimento do tribunal, no caso de impugnação da decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente indicar nelas, por referência aos concretos pontos de facto que constam da sentença, aqueles cuja alteração pretende e o sentido e termos dessa alteração.

- Por menor exigência formal que se adote relativamente ao cumprimento dos ónus do art.º 640.º do Código de Processo Civil e em especial dos estabelecidos nas suas alíneas a) e c) do n.º 1, sempre se imporá que seja feito de forma a não obrigar o tribunal ad quem a substituir-se ao recorrente na concretização do objeto do recurso.

- Tendo o recorrente nas conclusões se limitado a consignar a globalidade da matéria de facto que entende provada, mas sem indicar, por referência aos concretos pontos de facto que constam da sentença e que impugna, os que pretende que sejam alterados, eliminados ou acrescentados à factualidade provada, não cumpriu o estabelecido no art.º 640.º, n.º 1, als. a) e c) do Código de Processo Civil, devendo o recurso ser liminarmente rejeitado nessa parte. (Acórdão de 16-05-2018, proferido no Proc. n.º 2833/16.7T8VFX.L1. S1.)

- A exigência, imposta pelo art.º 640.º, n.º1, al. b) do Código de Processo Civil, de especificar os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, determina que essa concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respetivos meios de prova, e quando gravados com a indicação exata das passagens da gravação em que se funda o recurso.

- Não cumpre aqueles ónus o apelante que, nas alegações não especificou os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou de gravação nele realizada, que impunham decisão diversa da recorrida sobre os pontos da matéria de facto que pretendia impugnar, limitando-se a transcrever as declarações, a mencionar documentos, tomando como referência determinados tópicos que elencou. (Acórdão de 11-04-2018, proferido no Proc. n.º 789/16.5T8VRL.G1. S1.)

̶  As coordenadas estabelecidas pelo Supremo Tribunal de Justiça no que concerne à interpretação do disposto no artigo 690.º do Código de Processo Civil, referente ao ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, visam evitar soluções que possam conduzir a uma repetição total do julgamento, em virtude de recursos genéricos contra uma decisão da matéria de facto alegadamente errada, observando-se assim a opção do legislador de viabilizar apenas uma reapreciação de questões concretas, relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente, permitindo deste modo um efetivo exercício do contraditório por parte do recorrido.

̶ A verificação do cumprimento dos ónus de alegação previstos no artigo 640.º do Código de Processo Civil, no que respeita aos aspetos de ordem formal, deve ser norteada pelo princípio da proporcionalidade e da razoabilidade.

̶ Não cumprem o ónus imposto pelo art.º 640.º, n.º 1, alíneas b) e c) e n.º 2, alínea a), do Código de Processo Civil os recorrentes que não concretizaram, por referência a cada um dos mencionados factos que impugnaram, quais os meios probatórios que, no seu entender, imporiam decisão diversa daquela que foi dada pelo Tribunal de 1.ª Instância, não indicando também a decisão que, no seu entender, devia ser proferida sobre a matéria de facto, relativamente a determinados factos impugnados (Acórdão do STJ de 6/11/2019, Processo n.º 1092/08.0TTBRG.G1.S1).

̶ A exigência, imposta pelo art.º 640.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil, de especificar os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, determina que essa concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respetivos meios de prova, e quando gravados com a indicação exata das passagens da gravação em que se funda o recurso.

̶ Quando o conjunto de factos impugnados se refere à mesma realidade e os concretos meios de prova indicados pelo recorrente sejam comuns a esses factos, a impugnação dos mesmos em bloco não obstaculiza a perceção da matéria que se pretende impugnar, pelo que deve ser admitida a impugnação (Acórdão do STJ de 19/5/2021, Processo 4925/17.6T80AZ.P1.S1)

̶  É excessiva a rejeição da impugnação da matéria de facto feita em “blocos” quando tais blocos são constituídos por um pequeno número de factos ligados entre si, tendo o Recorrente indicado com precisão os meios de prova e as formulações alternativas que pretendia ver adotadas. (Acórdão de 14-07-2021, Proc. n.º 19035/17.8T8PRT.P1.S1)

Na verdade, toda a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça sobre a problemática em causa é norteada pelo princípio da proporcionalidade, havendo sempre a preocupação de efetuar uma análise rigorosa em face de cada caso concreto.

Nessa linha, as coordenadas estabelecidas pelo Supremo Tribunal de Justiça visam evitar soluções que possam conduzir a uma repetição total do julgamento, em virtude de recursos genéricos contra uma decisão da matéria de facto alegadamente errada, observando-se assim a opção do legislador de viabilizar apenas uma reapreciação de questões concretas, relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente, permitindo deste modo um efetivo exercício do contraditório por parte do recorrido.

Atenta a doutrina e jurisprudência que foram sendo firmadas, podemos concluir que o recorrente que pretenda impugnar a decisão da matéria de facto, deve:

– Concretizar cada um dos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

– Especificar os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, sendo que essa concretização deve ser feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respetivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens de cada um dos depoimentos;

– Enunciar a decisão alternativa que propõe; 

– Indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda a sua discordância com o decidido (tratando-se de prova gravada).

No caso concreto dos autos, como se refere no acórdão recorrido, o recorrente ao impugnar a decisão relativa à matéria de facto, na parte que foi rejeitada, optou por efetuar uma impugnação por referência a conjuntos de factos, sendo que cada conjunto integra factos que apresentam uma grande diversidade entre si e autonomia, não se verificando uma ligação entre os mesmos que justifique a uma apreciação em comum.

Basta conferir os transcritos pontos de facto, dados como provados, 25.º a 31.º e factos dados como não provados 5.º e 6.º; 7.º a 9.º; 10.º a 14.º; 15.º, 17.º (o alegado no artigos 72.º a 77.º da petição inicial), 18.º, 19.º, 20.º, 21.º, 22.º, 23.º, 24.º, 31.º e 73.º; 26.º (o primeiro não referido nas conclusões) a 32.º; 47.º a 51.º, 60.º (este não referido nas conclusões) e 79.º; 52.º e 53.º; 55.º a 58.º; 61.º e 62.º; 64.º, 65.º, 67.º e 68.º; 70.º, 71.º, 72.º, 74.º, 75.º, 76.º e 78.º.

Também andou bem o Tribunal da Relação na apreciação das considerações efetuadas pelo recorrente referentes à inversão do ónus de prova, pois estamos perante considerações genéricas, exigindo-se também nesta vertente uma individualização dos factos concretos que se consideram incorretamente julgados.

Os ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto visam obstar à repetição integral do julgamento, caso se admitissem recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, sendo a manifestação da opção do legislador de abrir uma pontual possibilidade de revisão de pontos concretos de facto que se apresentem controvertidos, face a uma concretização bem fundamentada por parte do recorrente.

Esta exigência legal visa facilitar a atividade do Tribunal e da parte recorrida, com vista a uma administração racional da justiça no seu todo, de forma que todos seja assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, como se proclama no art.º 20 da Constituição da República Portuguesa.

Assim, não vislumbramos, face às circunstâncias concretas que determinaram a rejeição parcial da impugnação da decisão relativa à matéria de facto, que a interpretação dada pelo Tribunal da Relação aos artigos 639.º, n.º 1 e 3 e 640.º do Código de Processo Civil seja inconstitucional, por violação do disposto no artigo 20.º da Constituição.

Sufragando-se a decisão do Tribunal da Relação que rejeitou parcialmente a reapreciação da matéria de facto, por ter considerado que o recorrente não cumpriu os ónus a que estava obrigado pelo artigo 640.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil, estamos perante uma situação em que o Tribunal da Relação confirmou, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância, pelo que a este STJ está vedado conhecer das restantes questões suscitadas no recurso de revista (art.º 671.º n.º 3 do CPC)

III

Decisão:

Face ao exposto acorda-se em negar a revista, confirmando-se o acórdão recorrido.

Custas a cargo do recorrente.

Anexa-se sumário do acórdão.

Lisboa, 16 de dezembro de 2021

Chambel Mourisco (Relator)

Maria Paula Moreira Sá Fernandes

Leonor Maria da Conceição Cruz Rodrigues