ENCERRAMENTO DO PROCESSO DE INSOLVÊNCIA
RECUSA DE EXONERAÇÃO DO PASSIVO RESTANTE
RENOVAÇÃO DA EXECUÇÃO EXTINTA
Sumário

I - Atentas as particularidades próprias do efeito de caso julgado na ação inibitória que é qualificado como um caso julgado secundum eventum litis (o caso julgado favorável aproveita a terceiro, o caso julgado desfavorável é-lhe inoponível), deve concluir-se que a simples correção ou supressão de cláusula por parte do demandado na ação fica aquém do que se pretende com a condenação proibitiva, que se estende a todos os contratos que o demandado venha a celebrar ou a recomendar.
II - A ação inibitória reconduz-se a um controle abstrato da legalidade das cláusulas contratuais gerais, não estando a sua sindicância dependente da inclusão em contratos singulares, bastando essa possibilidade.
III - É proibida e nula, nos termos da al. c) do nº 1 do art.º 22º, com referência ao art.º 12º do RJCCG, a cláusula contratual geral que atribui à predisponente o direito de alterar unilateralmente os termos do contrato, a qualquer momento, com base na sua própria conveniência e sem que ao consumidor seja dada a possibilidade de resolução do contrato ou de solicitar qualquer reembolso, compensação ou indemnização.
IV - Esta cláusula é igualmente proibida e nula por violar o princípio da boa fé, por criar um desequilíbrio na relação contratual estabelecida entre a predisponente e o utilizador/consumidor, colocando este à mercê do arbítrio daquela, perante a possibilidade conferida por esta cláusula de o predisponente poder, a todo o momento e de forma unilateral, alterar os termos do contrato, ou mesmo revoga-lo.
V - A designação “artigos sem sinal de uso indevido”, é uma expressão demasiado vaga e abstrata, podendo, por isso, ser-lhe atribuído o sentido de não permitir ao consumidor a utilização dos bens adquiridos, por forma a verificar a sua conformidade e, nessa justa medida, a cláusula sindicada é nula, por contender com valores fundamentais do direito defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos art.ºs 12.º, 15.º e 16º, do RJCCG, em concreto, por contender com lei imperativa, como é o caso dos art.ºs 14.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei nº 24/2014, de 14-02, sendo também nula nos termos do art.º 294.º do Código Civil.
VI - É nula, por contender com valores fundamentais do direito defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos art.ºs 12.º, 15.º e 16.º, do RJCCG, a cláusula que determina que, para situações de reembolso, determina “aplicável em compras no site B....pt”, por ser ambígua, no sentido de que o reembolso a efectuar ao consumidor será feito sempre através de um crédito a utilizar em compras no site da predisponente.
VII - A publicidade da decisão da ação inibitória tem um efeito dissuasor e visa transmitir à generalidade dos consumidores/interessados o resultado objetivo da ação e a disciplina jurídica a que passarão a estar inelutavelmente submetidos os contratos de adesão celebrados, mostrando-se plenamente adequada à vertente cívico/social da própria ação inibitória, direcionada para a proteção dos interesses difusos da generalidade dos consumidores/aderentes, informados precisamente dos seus direitos através da publicitação em órgãos de comunicação social, a todos os cidadãos plenamente acessíveis, do resultado final da causa.

Texto Integral

Apelação n.º 3258/16.0T8MTS.P1

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

1. Relatório
O Ministério Público intentou acção com processo comum contra B…, S.A., pedindo que se:
1) Declare nulas:
i. - a cláusula 3, sob a epígrafe “Alteração das presentes Condições”;
ii. - a cláusula correspondente ao § terceiro da cláusula 5.2, sob a epígrafe “Informação de Preços”;
iii. - as cláusulas correspondentes aos § sexto e sétimo da cláusula 7., sob a epígrafe “Tratamento e entrega do pedido”;
iv. - a cláusula correspondente ao § quinto da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”;
v. - a cláusula correspondente ao § sétimo da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”;
vi. - a cláusula correspondente ao § oitavo da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”;
vii. - a cláusula 11., sob a epígrafe “Responsabilidade”;
viii. - a cláusula correspondente ao § segundo da cláusula 13., sob a epígrafe “Lei e Foro”;
todas do clausulado “Termos de Uso”, junto como Documento 11, condenando a R. a abster-se de as utilizar em contratos que de futuro venha a celebrar, especificando-se na sentença o âmbito de tal proibição — artigo 30.º, n.º 1, do RJCCG, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, na redacção introduzida pelos Decretos-Lei n.º 220/95, de 31de Agosto, n.º 224-A/96, de 26 de Novembro, n.º 249/99, de 07 de Julho, e n.º 323/2001, de 17 de Dezembro, e artigo 11.º, n.º 2, da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho, na redacção introduzida pela Lei n.º 47/2014, de 28 de Julho;
2) Condene a R. a dar publicidade a tal proibição e a comprovar nos autos essa publicidade, em prazo a determinar na sentença, pedindo-se que a mesma seja efectuada em anúncio a publicar em dois jornais diários de maior tiragem editados em Lisboa e no Porto, durante dois dias consecutivos, de tamanho não inferior a ¼ da página, bem como em anúncio a publicar na página de internet da R. – www.B....pt -, durante três dias consecutivos, de tamanho não inferior a ¼ da página, por forma a ser visualizado por todos os utilizadores da internet que acedam à referida página — artigo 30.º, n.º 2, do RJCCG, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, na redacção introduzida pelos Decretos-Lei n.º 220/95, de 31 de Agosto, n.º 224-A/96, de 26 de Novembro, n.º 249/99, de 07 de Julho, e n.º 323/2001, de 17 de Dezembro;
3) Dê cumprimento ao disposto no artigo 34.º do RJCCG, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, na redacção introduzida pelos Decretos-Lei n.º 220/95, de 31 de Agosto, n.º 224-A/96, de 26 de Novembro, n.º 249/99, de 07 de Julho, e n.º 323/2001, de 17 de Dezembro, determinando a extracção e remessa de certidão da sentença proferida à Direcção-Geral da Política de Justiça – Ministério da Justiça, para os efeitos previstos na Portaria n.º 1093/95, de 06 de Setembro.

Alegou, para tanto e em síntese, que, no exercício da sua actividade, a R., sob a denominação comercial “B…” e no site www.B....pt, divulga a sua marca e expõe para venda os seus produtos, que podem ser adquiridos directamente pelo utilizador que, de qualquer ponto de Portugal, aceda ao sítio. O utilizador do sítio da R. pode efectuar através do mesmo uma encomenda online, procedendo, em seguida, ao pagamento, directamente à R., do valor devido, através de referência Multibanco, Paypal ou cartão de crédito.
Os bens são vendidos e adquiridos mediante a apresentação pela R., no respectivo website, aos utilizadores que com a mesma pretendam contratar, de um clausulado previamente elaborado, com o título “Termos de Uso” – Documento 11. A utilização do sítio da R., bem como a aquisição por parte de qualquer utilizador dos bens e serviços propostos pela R., implica a aceitação obrigatória do teor do conteúdo do documento denominado “Termos de Uso”. O referido documento não contém quaisquer espaços em branco para serem preenchidos pelos contratantes que, em concreto, acedam ao website “B…” e que pretendam adquirir um produto ali anunciado para compra, efectivando-se a ordem de compra com a aceitação das condições constantes deste documento. As condições de utilização constantes naquele clausulado encontram-se disponíveis em página da internet e podem ser acedidas, impressas ou guardadas.
Assim, os contratos celebrados pela R. com os utilizadores do seu sistema correspondem à compra e venda de bens, sendo esse sistema organizado para a sua celebração à distância, uma vez que são concretizados através de uma técnica de comunicação à distância - a internet e o website —, sem a presença física, quer de representante da R., quer do utilizador —, pelo que estão sob a tutela do regime jurídico dos contratos celebrados à distância e fora do estabelecimento comercial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 24/2014, de 14 de Julho, sendo estes contratos igualmente abrangidos pelo regime legal respeitante ao comércio electrónico, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 7/2004, de 07 de Janeiro.
O clausulado sob a denominação “Termos de Uso”, junto como Documento 11, consubstancia um contrato de adesão, sujeito ao Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais (RJCCG), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro.
Assim, a R. incluiu nos contratos de adesão que apresenta ao utilizador/consumidor cláusulas cujo uso é proibido por lei, uma vez que o seu conteúdo contende com as normas legais aplicáveis, sendo, por isso, nulas.
Consta da cláusula 3, sob a epígrafe “Alteração das presentes Condições”, do clausulado “Termos de Uso”, que: “A B…, S.A., reserva-se o direito de modificar unilateralmente e em qualquer momento, sem aviso prévio, a apresentação e conteúdo do sítio Web, seus serviços e as condições gerais de utilização.
Essas modificações servirão para uma melhoria do website, melhorando simultaneamente os serviços oferecidos ao utilizador do website.”.
Esta cláusula é abusiva, porque confere à R. o poder de, a todo o momento, de forma unilateral e sem necessidade de qualquer fundamento ou justificação, baseada apenas na sua própria conveniência, alterar ou modificar os produtos disponíveis, os respectivos preços e as condições e/ou especificações apresentadas.
Acresce que a R. não consagra qualquer cláusula de ressalva relativamente aos contratos que se encontrem já em vigor e em execução, aplicando-se tais alterações de forma imediata, após a sua publicação no sítio, excepto no que respeita aos preços dos produtos, pois nos termos do disposto no segundo § da cláusula 5. 2, sob a epígrafe “Informação de Preços”, a R. reitera poder alterar os preços em qualquer momento, mas compromete-se a aplicar as taxas e preços indicados no momento da realização do pedido de compra.
Atento o teor da cláusula em apreço e verificando-se ainda a ausência na mesma, ou noutras cláusulas dos “Termos de Uso” ou nas informações prestadas no sítio, de qualquer ressalva relativamente aos contratos que se encontrem em vigor e em execução, as modificações que a R. pretende possa efectuar a qualquer momento são imediatamente aplicáveis a todos os contratos em vigor, podendo o utilizador/consumidor vir até a ser confrontado, após a sua compra, com uma alteração das especificações do produto, das condições comerciais e dos serviços, efectuada pela R., sem necessidade de qualquer justificação ou pré-aviso, e sem que ao mesmo seja concedida a possibilidade de resolver o contrato ou de solicitar qualquer compensação ou indemnização.
Assim, a presente cláusula é proibida, por violação do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 22.º RJCCG, uma vez que atribui à predisponente R. o direito de alterar unilateralmente os termos do contrato, a qualquer momento, com base na sua própria conveniência e sem que ao consumidor seja dada a possibilidade de resolução do contrato ou de solicitar qualquer reembolso, compensação ou indemnização, e, consequentemente, nula, em conformidade com o disposto no artigo 12.º daquele diploma legal.
O consumidor que contrata online está numa posição de maior fragilidade em relação àquele que não utiliza os meios electrónicos para contratar, devido à facilidade de contratação inerente à internet, o que, aliado à possibilidade conferida por esta cláusula da R. poder, a todo o momento e de forma unilateral, alterar os termos do contrato, ou mesmo revogar o contrato, coloca o consumidor numa situação de maior fragilidade, criando um desequilíbrio na relação contratual estabelecida.
Desta forma, a cláusula ora sindicada é proibida, por violar valores fundamentais do direito, defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos artigos 15.º e 16.º, ambos RJCCG, uma vez que cria um desequilíbrio na relação contratual estabelecida entre a predisponente R. e o utilizador/consumidor, colocando este à mercê do arbítrio daquela.
Consta do § terceiro da cláusula 5.2, sob a epígrafe “Informação de Preços”, do clausulado “Termos de Uso”, que: “No caso de ocorrência de erro informático, manual, técnico, ou de qualquer outra origem, que cause uma alteração substancial não prevista pela B…, S.A. no preço de venda ao público, de tal modo que este se transforme exorbitante ou manifestamente irrisório, o pedido de compra será considerado inválido e anulado.”.
Esta cláusula é abusiva, porque, mais uma, vez, confere à R. o poder de, a todo o momento, de forma unilateral e sem necessidade de qualquer fundamento ou justificação, baseada apenas no seu próprio entendimento e na sua conveniência, revogar qualquer proposta contratual já aceite pelo utilizador/consumidor, caso entenda a R. ter existido erro sobre o preço e que aquela, e só aquela, entenda ser “exorbitante ou manifestamente irrisório”.
De acordo com a cláusula agora em apreço, a R. pode, posteriormente à celebração do contrato e sem qualquer consulta ao consumidor, entender unilateralmente que o preço contratado é exorbitante ou manifestamente irrisório e, então, revogar livremente o contrato.
Assim, a presente cláusula é proibida, por violação do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 22.º RJCCG, uma vez que atribui à predisponente R. o direito de revogar unilateralmente o contrato, a qualquer momento, com base na sua própria conveniência e sem que ao consumidor seja dada a possibilidade de resolução do contrato ou de solicitar qualquer reembolso, compensação ou indemnização, e, consequentemente, é nula, em conformidade com o disposto no artigo 12.º daquele diploma legal, colocando o consumidor numa situação de maior fragilidade, criando um desequilíbrio na relação contratual estabelecida, pelo que a cláusula é igualmente proibida, por violar valores fundamentais do direito, defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos artigos 15.º e 16.º, ambos RJCCG, criando um desequilíbrio na relação contratual estabelecida entre a predisponente R. e o utilizador/consumidor, colocando este à mercê do arbítrio daquela.
Consta dos § sexto e sétimo da cláusula 7., sob a epígrafe “Tratamento e entrega do pedido”, do clausulado “Termos de Uso”, que: “Todos os artigos são entregues em embalagens seguras. Se detetar danos externos na embalagem do produto deverá reportar esse defeito ao transportador, no momento da entrega, fazendo também referência a esse dano no documento comprovativo da entrega. Deverá ainda contactar a nossa Linha de Apoio ao Cliente ……….
Atenção que um comprovativo de entrega sem referência a danos equivale a um produto entregue em embalagem em perfeitas condições. Se, após aberta a embalagem, detetar danos no produto, dispõe de 24 horas após a receção da encomenda para contactar a nossa linha de Apoio Ao Cliente ………”.
Consta do § sétimo da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”, do clausulado “Termos de Uso”, que: “3. Prazo de Devolução: Até ao 15º dia consecutivo, a partir do dia da entrega
• Produto Avariado – Deverá dirigir-se a uma loja física da B…, apresentando a fatura e o artigo completo. No caso de esta opção não ser possível deverá contactar a nossa linha de Apoio (linha Azul – preço de chamada local), que o ajudará a resolver o problema.
• Devoluções por danos de transporte Os prazos para efetuar reclamação por danos causados pelo transporte serão de 48 horas desde a data da entrega. Passado este período de tempo, a B… não se responsabiliza por qualquer defeito que possa ter ocorrido no transporte.”.
Nos termos destas cláusulas, a R. impõe, quanto à entrega dos produtos adquiridos
pelo consumidor, que este tenha de imediatamente verificar, aquando da recepção dos mesmos e perante a entidade que procedeu ao seu transporte, que os produtos se encontrem em boas condições, mais impondo que, se o consumidor tal não o fizer e não indicar desde logo, ou no prazo máximo de 24 horas, qualquer anomalia, a R. não se responsabilizará mais por qualquer dano.
Da leitura destas cláusulas resulta pretender a R. desonerar-se de qualquer responsabilidade por danos resultantes do transporte, ao impor ao consumidor que este exerça, de forma imediata, ou no prazo máximo de 24 horas, no acto da entrega da encomenda, os seus direitos no que tange à eventual existência de defeitos externos ou visíveis no mesmo, sob pena de, posteriormente, o consumidor não poder invocar perante a R. a existência de defeitos externos ou visíveis, impondo ainda como prazo de devolução de “produto avariado”, o 15.º dia consecutivo, a partir do dia da entrega.
Decorre pretender a R. onerar o consumidor — ou eventualmente um terceiro que receba a encomenda — com o dever de inspeccionar e verificar, de forma imediata e minuciosa, o produto encomendado na presença do distribuidor.
Na verdade, a encomenda com o produto adquirido pelo consumidor pode perfeitamente ser entregue a qualquer pessoa que se encontre na morada indicada por aquele, ficando esta responsável pela entrega da encomenda ao mesmo e podendo eventualmente suceder que o consumidor apenas venha a receber o produto posteriormente e numa fase em que, de acordo com as sindicadas cláusulas, já não poderá exercer os seus direitos, em caso de erro no produto ou em caso de defeitos externos.
As cláusulas sindicadas são abusivas, uma vez que afastam, sem mais, as regras relativas ao cumprimento defeituoso e aos prazos para o exercício de direitos emergentes dos vícios da prestação, nomeadamente, os prazos previstos nos artigos 913.º e ss. CC, e no artigo 5.º, n.º 1, do Decreto- Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril (regime jurídico de certos aspectos da venda de bens de consumo e garantias), reduzindo-os.
Assim, essas cláusulas são nulas, por contenderem com valores fundamentais do
Direito defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos artigos 15.º e 16.º, ambos RJCCG - sendo também nulas nos termos do artigo 294.º CC —, em concreto, por contenderem com lei imperativa, como é o caso dos artigos 2.º, 3.º, 4.º, 5.º e 5.º- A, todos do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril, conforme artigo 10.º do mesmo diploma legal, criando ainda um desequilíbrio das prestações entre as partes contratantes, com prejuízo do utilizador/consumidor, que assim não pode exigir da R. o cumprimento das suas obrigações legalmente estipuladas.
As cláusulas agora sindicadas são igualmente nulas, nos termos do disposto na alínea c) do artigo 18.º, ex vi artigo 20.º, RJCCG, uma vez que, abusivamente, estipulam um limite à responsabilidade da R. nos casos de cumprimento defeituoso da obrigação.
Estas cláusulas são ainda nulas, nos termos do disposto na alínea d) do artigo 21.º, RJCCG, pois afastam os deveres que recaem sobre a R. em resultado de vícios da prestação.
Além do mais, ao afastar expressamente as regras relativas aos prazos para o exercício de direitos emergentes dos vícios da prestação, tais cláusulas são igualmente nulas e proibidas, nos termos do artigo 22.º, n.º 1, alínea g), RJCCG.
Das presentes cláusulas resulta ainda que, caso o consumidor nada diga no acto de entrega da encomenda, ou se não denunciar o defeito no prazo de 24 horas, consagra-se, na prática, uma ficção de aceitação por aquele do estado do bem no momento da entrega.
Assim, as cláusulas em apreço são abusivas e nulas, nos termos do artigo 19.º, alínea d), ex vi artigo 20.º, RJCCG, pois esta norma proíbe cláusulas que consagrem ficções de receptação, de aceitação ou de outras manifestações de vontade com base em factos insuficientes, sendo inadmissíveis cláusulas que imponham unilateralmente a relevância do silêncio como manifestação de vontade no domínio das cláusulas contratuais gerais (mais uma vez, para protecção do consumidor contraente, contrariamente ao regime geral previsto no artigo 218.º CC) e no que respeita à execução do contrato (não quanto à própria conclusão do contrato).
Por outro lado, as cláusulas agora em apreço concretizam uma inversão do ónus da prova, na medida que, com as mesmas, a R. impõe ao consumidor que recuse e devolva a encomenda, no momento da entrega do produto, no caso de existência de um defeito visível, assinalando imediatamente o problema.
Resulta das cláusulas em apreço que, caso o consumidor nada diga no acto de entrega da encomenda, consagra-se uma presunção a favor da R. relativamente ao estado do bem no momento da entrega, modificando-se os critérios da repartição do ónus da prova, em desfavor do consumidor, já que passará a incumbir a este, fazer prova que o defeito ou avaria detectados já existiam no momento da entrega.
Assim sendo, as cláusulas sindicadas operam uma inversão do ónus da prova, sendo, por isso, nulas e proibidas, por violação do disposto na alínea g), do artigo 21.º RJCCG.
Consta do § quinto da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”, do clausulado “Termos de Uso”, que: “1. Artigos sem sinal de uso indevido”.
Nos termos desta cláusula a R. estabelece que os produtos devolvidos pelo consumidor, na sequência da livre resolução do contrato, têm de se encontrar “sem sinal de uso indevido”, ou a devolução dos mesmos e, consequentemente, a resolução do contrato, não será aceite – vide § 8.º desta cláusula.
Ora, a cláusula agora em apreço impõe ao consumidor, na sequência da livre resolução do contrato, a devolução de “artigos sem sinal de uso indevido”, mas tal é uma designação demasiado vaga e abstracta, que tem por efeito não permitir, de todo, ao consumidor a utilização dos bens adquiridos, por forma a verificar a sua conformidade.
Pelo que, a cláusula sindicada é nula, por contender com valores fundamentais do direito defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos artigos 12.º, 15.º e 16º, RJCCG, em concreto, por contender com lei imperativa, como é o caso dos artigos 14.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei nº 24/2014, de 14 de Fevereiro, na parte em que condiciona o exercício do direito de livre resolução do consumidor à circunstância de este não utilizar, de forma efectiva, o bem a devolver - sendo também nula nos termos do artigo 294.º CC.
Consta do § oitavo da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”, do clausulado “Termos de Uso”, que: “Reembolso (Aplicável em compras em B….pt) No caso de devolução, o reembolso do valor da sua compra será efectuado após a validação do cumprimento das condições de devolução descritos anteriormente, tendo a B… um prazo de até 14 dias para o efeito.”.
Nos termos desta cláusula, a R. refere-se ao reembolso devido ao consumidor em caso deste exercer o seu direito de livre resolução do contrato e correspondente ao montante pago pelo mesmo na aquisição do produto que foi devolvido apenas, constando da cláusula, logo a seguir a designação reembolso, que este é aplicável em compras no sítio B….pt, sem qualquer menção de que esta poderia ser uma opção a escolher pelo consumidor e sem qualquer outra menção à forma do reembolso.
Esta cláusula viola de forma expressa a disposição imperativa constante do artigo 12.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 24/2014, de 14 de Julho, que dispõe que: “O reembolso dos pagamentos deve ser feito através do mesmo meio de pagamento que tiver sido utilizado pelo consumidor na transacção inicial, salvo acordo expresso em contrário e desde que o consumidor não incorra em quaisquer custos como consequência do reembolso.”.
Com efeito, o que resulta da letra da cláusula é uma imposição pela R. de que o reembolso a efectuar ao consumidor seja feito sempre através de um crédito a utilizar em compras no sítio da R., desrespeitando a norma legal e não especificando ser tal crédito uma possibilidade de acordo com o consumidor quanto a uma modalidade diversa de pagamento a este do reembolso devido.
Assim, esta cláusula é nula, por contender com valores fundamentais do direito defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos artigos 12.º, 15.º e 16.º, RJCCG, em concreto por contender com lei imperativa — sendo também nula nos termos do artigo 294.º CC —, dando a cláusula origem, tal como se encontra redigida, a um desequilíbrio significativo em detrimento do consumidor, entre os direitos e obrigações das partes decorrentes do contrato.
Consta da cláusula 11., sob a epígrafe “Responsabilidade”, do clausulado “Termos de Uso”, que: “A B…, S.A., não garante a ausência de vírus ou elementos similares em documentos eletrónicos e ficheiros armazenados no seu sistema informático e na sua página web, não se responsabilizando por qualquer dano provocado e derivado da eventual presença de vírus e outros elementos análogos.”.
Nos termos desta cláusula, a R. pretende, em primeiro lugar, desresponsabilizar-se perante o consumidor por qualquer dano provocado e derivado da eventual presença de vírus ou elementos análogos, na medida em que a R. declara não garantir a ausência dos mesmos em documentos electrónicos e ficheiros armazenados no seu sistema informático e na sua página web.
A cláusula agora em apreço, tal como se encontra redigida, corresponde a uma cláusula genérica de exclusão da responsabilidade da R., na medida em que, de uma forma muito abrangente e vaga, a exime de toda a responsabilidade que lhe poderá ser, eventualmente, exigida.
Nestes termos, trata-se de cláusula violadora do princípio da boa-fé, consagrado nos artigos 15.º e 16.º, alínea a), RJCCG, já que cria um desequilíbrio das prestações entre as partes contratantes, com prejuízo do consumidor/utilizador, que assim não pode exigir da R. o cumprimento das suas obrigações legalmente estipuladas, limitando a responsabilidade da R., em manifesta violação do regime geral da responsabilidade civil, consagrada no nosso sistema legal, em especial nos artigos 483.º, n.º 1, e 500.º CC.
Esta cláusula é absolutamente proibida nos termos das alíneas a) e b) do artigo 18.º, ex vi artigo 20.º, ambos do RJCCG, e, consequentemente, nula, em conformidade com o disposto no artigo 12.º deste diploma legal.
De igual forma, as cláusulas sindicadas são absolutamente proibidas, por contender com o disposto no artigo 21.º, alínea h), RJCCG, já que excluem ou limitam de antemão a possibilidade dos consumidores/aderentes poderem demandar judicialmente a R. por quaisquer situações litigiosas que possam surgir.
Consta do § segundo da cláusula 13., sob a epígrafe “Lei e Foro”, do clausulado “Termos de Uso”, que: “Todos os litígios emergentes da interpretação ou execução do presente acordo serão dirimidos pelo Tribunal da Comarca de Lisboa, com expressa renúncia a qualquer outro.”.
Nos termos desta cláusula, estabelece-se, como como foro competente para todos os litígios emergentes do clausulado “Termos de Uso” o Tribunal da Comarca de Lisboa, sem que seja indicada qualquer justificação para o efeito.
Esta cláusula é nula num contrato deste tipo, por contender com valores fundamentais do direito, defendidos pelo princípio da boa-fé (artigos 15.º e 16.º do RJCCG), em concreto, com lei imperativa, nos caso com o actual artigo 71.º, n.º 1, CPC, na redacção introduzida pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho.
A cláusula, tal como se mostra redigida, não designa as questões concretas para as quais o Tribunal de Comarca de Lisboa, o escolhido, tem competência, nem especifica os factos susceptíveis de a originar, limitando-se a uma fórmula vaga e abstracta. A sua redacção confere-lhe, assim, tal amplitude, ao ponto de permitir ao R. nos casos de acções destinadas a obter indemnização pelo não cumprimento ou cumprimento defeituoso e a resolução do contrato por falta de cumprimento, que o foro competente seja determinado por via convencional, através da fixação do foro da comarca de Lisboa, com renúncia a qualquer outro.
Relativamente a estas acções o artigo 71.º, n.º 1, CPC, vedou a eleição de foro convencional, enfermando, por isso, esta cláusula de nulidade, por violação de disposições legais de natureza imperativa — artigos 95.º, n.º 1, e 104.º, n.º 1, alínea a), ambos CPC, e 280.º e 294.º, ambos CC.
É certo que, com a redacção — introduzida pela Lei n.º 14/2006, de 26 de Abril - dos actuais artigos 71.º, n.º 1, e 104.º, n.º 1, alínea a), CPC, em conjugação com o disposto no artigo 95.º, n.º 1, segunda parte, daquele código, e com a publicação do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 12/2007 (publicado no Diário da República, I Série, de 06.12.2007), o alcance prático deste tipo de cláusulas do foro fica algo reduzido e na grande maioria das acções – as previstas no artigo 71.º, n.º 1 -, primeira parte, CPC, em que o R. seja pessoa singular, existe agora o regime imperativo da competência do tribunal do domicílio do R., sendo nulos os pactos relativos ao foro que violem a referida regra — artigo 95.º, n.º 1 —, nulidade esta que é de conhecimento oficioso — artigo 104.º, n.º 1, alínea a) —, pelo que esta cláusula contratual geral nunca poderia ser aplicada, não deixando, contudo de ser, nestes casos, contrária a lei imperativa, até porque da redacção da cláusula nem sequer consta a comum “fórmula de salvaguarda”, com a designa ALMENO DE SÁ, nos termos da qual o foro é estabelecido salvo disposição em contrário, sendo que, de resto, esta formulação sempre seria desnecessária e poderia ainda ser susceptível de gerar confusão no consumidor.
Assim, quanto às situações enquadradas pelo artigo 71.º, n.º 1, CPC, esta cláusula é nula, por contender com valores fundamentais do direito defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos artigos 12.º, 15.º e 16.º, RJCCG, em concreto por contender com lei imperativa, pretendendo-se com a sua declaração de nulidade que os contratantes não sejam sequer confrontados com uma cláusula aparentemente válida.
Porém, a imposição de cláusulas gerais sobre o foro não se reconduz apenas aos casos abrangidos pelo artigo 71.º, n.º 1, primeira parte, CPC, já que fora do seu alcance subsistem as acções de resolução contratual com fundamento noutro facto que não o incumprimento que a R. intente, como por exemplo, as fundadas na resolução por alteração das circunstâncias e as de anulação ou declaração de nulidade do contrato, sujeitas ao regime legal previsto no artigo 80.º do mesmo diploma legal.
Nesses casos, os aderentes serão demandados, por força da cláusula do foro tipificada no clausulado em apreço, no Tribunal da Comarca de Lisboa e não nos tribunais das respectivas residências, como resultaria do regime geral do artigo 80.º CPC.
Porém, sob esta perspectiva, a cláusula em apreço é de utilização proibida, por força do disposto no artigo 19.º, alínea g), ex vi artigo 20.º, ambos RJCCG.
Com efeito, o estabelecimento de tal foro convencional é susceptível de envolver graves inconvenientes para os clientes, mormente quando residentes em localidades distantes de Lisboa, considerando que acedem ao sítio da R. consumidores de todo o país – continente e ilhas -, não só na sua deslocação ao tribunal escolhido pela R. mas também de eventuais testemunhas e do mandatário (ou procura e escolha do mesmo na área do foro escolhido), e na apresentação de outros meios de prova, favorecendo a cláusula em apreço a R. o qual tem, à partida, melhores condições de litigância, pois apresenta uma estrutura de implantação nacional e com maior desenvoltura e recursos na propositura e acompanhamento de acções.
De qualquer modo, mesmo não tendo sido apresentada qualquer justificação para a escolha do foro pela R. certo é que uma eventual salvaguarda dos interesses económicos da R. não justifica o estabelecimento do foro convencional.
Na verdade, a R., como comerciante com uma carteira de clientes de todo o país, dispõe de capacidade económica e financeira, sem dificuldade para angariar os serviços de mandatários judiciais com escritório em qualquer comarca do país. Por outro lado, o fácil recurso, por parte da R. às novas tecnologias de comunicação, conjugado com a possibilidade de produção de prova através de videoconferência, permite à mesma propor e fazer prosseguir até final acções em qualquer tribunal do país, sem que tenha de se deslocar fisicamente ao mesmo qualquer representante ou colaborador.
Assim, é nula a cláusula em apreço, nos termos dos artigos 12.º, 15.º, 16.º e 19.º, alínea g), ex vi artigo 20.º, RJCCG.
Contestou a R., alegando, em síntese, não ser verdade que apenas transaccione online nos termos que constam dos artigos 6.º a 9.º da petição inicial, ou que a celebração de negócios online com a R. implique a aceitação obrigatória de quaisquer cláusulas; que se é efectivamente verdade que os negócios realizados através do seu sítio na internet podem ser considerados celebrados à distância, já não é verdade que tais negócios sejam sempre realizados com consumidores, que não é simplesmente possível afirmar-se — sem ser perante o caso concreto — se a determinado negócio são ou não aplicáveis os normativos especiais do direito do consumidor e só também perante o caso concreto é que é possível aferir se determinada parte é ou não, para estes efeitos, um consumidor.
Mais alegou que, efectivamente, oferece aos seus clientes os termos de um contrato de compra e venda, mas que não exige a aceitação de tais termos para a concretização de qualquer negócio, estando disponível para analisar eventuais propostas que lhe sejam dirigidas pelos seus clientes e, se disso for caso, para aceitar contratar em termos diversos dos por si apresentados como, de resto, já fez por diversas vezes. Tratando-se de vendas através de um sítio na internet, a R. não poderia deixar de apresentar um clausulado aos seus clientes para integrar de forma minimamente precisa o contrato de compra e venda. Contudo, tal facto não significa que não analise e aceite (caso concorde com as mesmas) propostas negociais que lhe sejam dirigidas pelos adquirentes. Os adquirentes não têm que aceitar simplesmente as condições propostas e, de resto, muitos há que não o fazem e não deixam, por causa disso, de celebrar contratos com a mesma.
Alegou, ainda que, atento o teor da petição inicial, diligenciou no sentido de elaborar um novo documento para substituir aquele que consta dos autos, sendo que já procedeu a tal alteração no seu próprio sítio na internet conforme o Doc. 1 que junta. Neste novo documento, decidiu acatar algumas das considerações efectuadas pelo MP, o que não significa, porém, que concorde com todos os argumentos que foram utilizados.
Quanto à Cláusula 3. “Alteração das presentes condições”, a redacção desta cláusula diz respeito única e exclusivamente ao seu sítio na internet e ao seu aspecto e/ou funcionalidades, não pretendendo significar que pudesse unilateralmente modificar condições contratuais, muito menos de contratos já validamente celebrados e em execução. Não diz respeito a contratos celebrados e muito menos a cláusulas ou aspectos essenciais ou determinantes dos mesmos.
Para evitar quaisquer dúvidas relativamente ao que ali vai dito alterou a Cláusula em causa passando a ter, a mesma, o seguinte teor, conforme Doc. 1 junto: “A B… reserva-se o direito de modificar unilateralmente e em qualquer momento, sem aviso prévio, a apresentação e conteúdo do sítio Web, seus serviços e as condições gerais de utilização, ressalvando-se os contratos já celebrados e em execução. Essas modificações servirão para uma melhoria do website, melhorando simultaneamente os serviços oferecidos ao utilizador do website que, caso não concorde com as alterações introduzidas, poderá resolver o contrato.”
Quanto ao 3.º § da Cláusula 5.2 — “Informação de Preços —”, a mesma não só é justa e razoável como está redigida de forma clara e transparente. Afirma o MP que não é dada a possibilidade de resolução do contrato aos clientes da R. quando, de forma expressa, resulta da referida cláusula o oposto.
O que se pretende (e o que resulta da referida cláusula) é que no caso de existir um erro na inserção em sistema do preço de determinado produto, possa a R. corrigir tal erro. E não é qualquer erro que pode legitimar uma correcção — apenas quando o erro for de tal forma grosseiro que nem o mais crédulo dos clientes da R. deixaria de pôr em causa a efectiva correcção da informação que lhe é transmitida.
A R. não tem como evitar se algum dos seus funcionários ao inserir em sistema o preço de um determinado produto se esquece de um algarismo a escrever. Nem tem como acautelar que um determinado programa informático tenha algum erro que altere alguma das informações inseridas através do mesmo.
As situações que a Cláusula em causa pretende acautelar são aquelas em que a diferença de preços (e a existência de um erro) não pode passar despercebida a um adquirente medianamente atento e informado.
O texto desta cláusula não só está em plena conformidade com a solução legal, como é até mais exigente do que esta, em prejuízo da própria R.. De facto, se a intenção da R. era proceder à venda de determinado produto no seu sítio na internet pelo montante de € 500,00 e, no processo de publicação de tal produto e respectivo preço, em virtude de uma falha humana ou técnica, acaba por anunciar que o preço de venda do mesmo é de € 5,00, estamos perante uma situação de erro na declaração negocial. Só que, aqui, ao contrário da solução legal (artigo 247.º CC), a R. estabelece que apenas anulará os contratos em que os erros relativos à inserção de preços sejam de tal forma notórios que ninguém os pudesse ignorar. A R., voluntariamente, refere que apenas procederá à anulação do negócio quando o seu erro for de tal forma grosseiro que não pudesse passar despercebido a um utilizador minimamente diligente.
A cláusula em análise, não só é legítima como não coloca os clientes da R. numa situação de fragilidade, antes, visa simplesmente impedir que se possam aproveitar de eventuais erros manifestos de trabalhadores da R., designadamente no que à inserção de preços em sistema diz respeito, salvaguardando a boa-fé negocial, em plena conformidade com a solução legalmente prevista.
Quanto aos 6.º e 7.º § da Cláusula 7. e 7.º § da Cláusula 8 alega que aquilo que surge descrito na petição inicial como sendo o § 6º e o § 7º da Cláusula 7. é, na realidade, o § 6.º e 7.º do número 7 da Cláusula 6, já que a Cláusula 7.ª que tem como epígrafe “GARANTIA” tem um único §.
Em conformidade com o Doc. 1 junto, o número 7 da Cláusula 6. passará a ter a seguinte redacção: “7. Tratamento e entrega do pedido.
As entregas das encomendas efetuadas online serão feitas apenas nos territórios de Portugal Continental, Arquipélagos dos Açores e da Madeira, com exceção dos grandes domésticos e televisores acima de 63 cm cuja entrega está restringida ao território de Portugal continental.
• Produtos das classes (1, 2, 3, 4 e 6) serão entregues até 2 a 3 dias úteis após a respetiva cobrança.
• Produtos de entregas gratuitas (apenas para Portugal Continental) – Será contatado pela nossa linha de Apoio ao Cliente para o agendamento da entrega.
• Pedidos Mix (Produto Classes de 1 a 6 + Produto de entrega gratuita) – Entregas separadas e enquadradas em cada uma das situações anteriores.
Nota importante: A sua encomenda apenas será processada após a confirmação do respetivo pagamento.
Todos os artigos são entregues em embalagens seguras. Se detetar danos externos
Na embalagem do produto deverá reportar esse defeito ao transportador, no momento da entrega, fazendo também referência a esse dano no documento comprovativo da entrega.
Deverá ainda contactar a nossa Linha de Apoio ao Cliente 808 100 007.
Atenção que um comprovativo de entrega sem referência a danos equivale a um produto entregue em embalagem em perfeitas condições. Se detetar a existência de qualquer desconformidade ou defeito no artigo que adquiriu deve denunciá-lo à B… no prazo máximo de 60 (sessenta) dias a contar da data em que o tenha detetado, contactando a nossa linha de Apoio Ao Cliente ……… (linha Azul – preço de chamada local).
Grandes Electrodomésticos, Televisores e LCD acima dos 63 cm (Entrega gratuita)
A entrega desta categoria de produtos (Ex: Frigoríficos, Máquinas de Lavar, TV acima dos 63 cm) são preparadas no nosso armazém central, e são agendadas de acordo com a disponibilidade de entregas da nossa transportadora na sua região.
Restantes Produtos (Classes de 1 a 6)
As restantes entregas são feitas pela transportadora E…, entregues nos 2 a 3 dias seguintes após a realização da encomenda, salvo em casos excecionais de ruturas de stock ou pagamentos não autorizados.”
Já a Cláusula 8. passará a ter a seguinte redacção, em conformidade com o Doc. 1 junto aos autos:
8 – Devoluções e Direito de livre resolução do contrato
• Direito de livre resolução – O consumidor dispõe de um prazo de 14 dias, a contar do dia em que adquira a posse física dos bens ou do dia em que adquira a posse física do último bem, no caso de vários bens encomendados numa única encomenda e entregues separadamente, para proceder à devolução da sua encomenda, e sem necessidade de indicar o motivo, de acordo com o disposto no nº 1 do artigo 10º do Decreto-Lei nº 24/2014, de 14 de Fevereiro.
Caso assim entenda o consumidor pode preencher e enviar via eletrónica o modelo de formulário de livre resolução ou qualquer outra declaração inequívoca de resolução.
Pode fazê-lo desde que o artigo se encontre nas mesmas condições em que foi vendido, em embalagem original e acompanhado de todos os acessórios que o constituem.
Poderá faze-lo de duas maneiras:
1. Dirigir-se a uma loja física da B…, apresentando a fatura e guia de transporte correspondente e o comprovativo de identificação (Cartão do Cidadão).
2. Contactar a nossa Linha de Apoio ……… (linha Azul – preço de chamada local) para informações sobre procedimentos de envio.
Nota: Nunca expedir o artigo para a B… sem contacto prévio com a Linha de Apoio ……… (linha Azul – preço de chamada local).
Condições da Devolução:
1.Artigos sem sinal de uso indevido e cuja manipulação em caso algum exceda a que habitualmente é admitida num estabelecimento comercial.
2.Devolução do artigo completo, com todos os seus componentes e acessórios, manual de instruções e embalagens originais em perfeito estado.
3.Prazo de Devolução: Até ao 14º dia consecutivo, a partir do dia da entrega, nos termos do disposto no número 1 do artigo 10.º do Decreto-Lei 24/2014, de 14 de Fevereiro.
Reembolso: No caso de devolução, o reembolso do valor da sua compra será efetuado através do mesmo meio de pagamento que foi utilizado pelo consumidor na compra inicial e que não comporte custos para o consumidor, após a validação do cumprimento das condições de devolução descritas anteriormente, tendo a B… um prazo de até 14 dias para o efeito.
O consumidor deve devolver os bens o mais tardar 14 (catorze) dias a contar da data em que informou a B… da decisão de resolução do contrato, tendo que suportar os custos da devolução dos bens.
Ficam excluídos do direito de resolução do contrato, não podendo o consumidor resolver livremente os seguintes contratos de:
- Fornecimento de bens confecionados de acordo com especificações do consumidor
ou manifestamente personalizados;
- Fornecimento de bens que, por natureza, não possam ser reenviados ou sejam suscetíveis de se deteriorarem ou de ficarem rapidamente fora de prazo;
- Fornecimento de bens selados não suscetíveis de devolução, por motivos de proteção da saúde ou de higiene quando abertos após a entrega;
- Fornecimento de bens que, após a sua entrega e por natureza, fiquem inseparavelmente misturados com outros produtos;
- Fornecimento de gravações áudio ou vídeo seladas ou de programas informáticos selados, a que o consumidor tenha retirado o selo de garantia de inviolabilidade após a entrega;
- Fornecimento de jornal, periódico ou revista, com exceção dos contratos de assinatura para o envio dessas publicações.”
Assim, foram eliminadas todas as referências que constam da petição inicial como inadmissíveis, acatando a R. voluntariamente as alterações sugeridas pelo MP e conformando os termos de uso com as mesmas.
Contudo, a interpretação e conclusão a que chega o MP tem mais que ver com a forma como as cláusulas em causa estão redigidas do que, propriamente, com o teor das mesmas, porque a R. cumpre de forma escrupulosa com o regime legal da venda de bens de consumo e com o regime legal dos contratos celebrados à distância, não tendo nunca tido reclamações relativamente aos aspectos que constam da petição inicial.
Quanto ao § 5.º da Cláusula 8, alega a R. que tal Cláusula 8. diz respeito, em suma, ao modo de exercício do direito de livre resolução por parte do adquirente. Não diz respeito ao exercício de direitos atribuídos aos clientes da R. em função do bem adquirido ser defeituoso ou desconforme. Não tem que ver com o exercício de direitos resultantes, designadamente, do regime legal de garantia na venda de bens de consumo ou resultantes do regime da venda de coisa defeituosa constante nos artigos 913.º e ss. CC.
Por isso, a condição imposta (de que, para o exercício do direito de livre resolução, o bem em causa não pode apresentar sinais de utilização indevida) não só é razoável, como está em plena conformidade com o estatuído no n.º 3 do artigo 13.º do Decreto-Lei 24/2014 que prevê que “O consumidor deve conservar os bens de modo a poder restituí-los nas devidas condições de utilização, no prazo previsto no n.º 1, ao fornecedor ou à pessoa para tal designada no contrato.”, e no n.º 2 do artigo 14.º do citado Decreto-Lei: “O consumidor pode ser responsabilizado pela depreciação do bem, se a manipulação efetuada para inspecionar a natureza, as características e o funcionamento desse bem exceder a manipulação que habitualmente é admitida em estabelecimento comercial.”
Não só é lógico como decorre da boa-fé negocial que, se um determinado cliente se arrepende da compra que fez e exerce o seu direito de livre resolução não possa danificar o bem impedindo a sua futura comercialização.
Em todo o caso, a fim de evitar quaisquer dúvidas, entendeu a R. acrescentar ao referido § a expressão que consta acima, passando o mesmo a ter a seguinte redacção:
Artigos sem sinal de uso indevido, nos termos e para os efeitos do n.º 3 do artigo 13.º e do n.º 2 do artigo 14.º do Decreto-Lei 24/2014 de 14/02.”
Apesar da legitimidade da referida Cláusula, entendeu a R. alterar a mesma para que não subsistissem quaisquer dúvidas relativamente ao alcance daquela previsão que, naturalmente, apenas se relaciona com o exercício do direito de livre resolução e não com o exercício de quaisquer outros direitos, designadamente, os relacionados com o regime legal de garantia.
Quanto ao § 8.º da Cláusula 8, alega a R. que não se consegue perceber o que fez o MP concluir que os reembolsos efectuados a clientes da R. na sequência do exercício do direito de livre resolução são feitos através de um crédito a utilizar em compras no sítio na internet da R.. Não são e a R. nunca adoptou tal prática. Nunca a R. reembolsou os seus clientes de outra forma que não a mesma que aqueles utilizaram para pagar os bens adquiridos através do sítio da internet da R.. A R. não faz — nem nunca fez — pelo menos sem o acordo dos seus clientes, qualquer reembolso em crédito para gastar futuramente em aquisições nas lojas físicas ou online da R..
Admite-se que a confusão resulte da informação que se encontra entre parêntesis no início do § e que refere “aplicável em compras em B….pt”.
Ora, aquilo que se pretendia significar era, em suma, que as condições de reembolso que de seguida se enunciam, apenas seriam aplicáveis a reembolsos feitos na sequência do exercício do direito de livre resolução que, naturalmente, apenas existe quando os negócios são efectuados à distância.
É que, além do direito de livre resolução, a R. tem uma política comercial de satisfação devolução nas suas lojas físicas. Esta política traduz-se na possibilidade de, nos primeiros quinze dias após a aquisição de determinados produtos, proceder, sem necessidade de justificação, à devolução do mesmo, beneficiando de um crédito em cartão ou vale do montante pago pelo produto em questão. Daí a necessidade da R. ressalvar que o que ali vai dito apenas tem aplicação às compras realizadas através do seu sítio na internet.
Em todo o caso, a fim de evitar quaisquer dúvidas a R. já alterou o teor daquela cláusula passando agora a ser o seguinte: “Reembolso: No caso de devolução, o reembolso do valor da sua compra será efetuado através do mesmo meio de pagamento que foi utilizado pelo consumidor na compra inicial e que não comporte custos para o consumidor, após a validação do cumprimento das condições de devolução descritas anteriormente, tendo a B… um prazo de até 14 dias para o efeito.”
Quanto à Cláusula 11, alega a R. que não pode (ninguém pode) garantir que dos ficheiros e documentos que constam do seu sítio na internet não existam vírus, trojans ou outros equivalentes com a capacidade de causar danos a terceiros. Da mesma forma, a R. não pode garantir que, por problemas técnicos ou em virtude da acção de terceiros, o acesso ao seu sítio na internet não é bloqueado, impedindo o acesso ao mesmo, por parte dos seus clientes.
O que a R. pode garantir é que não coloca nos seus ficheiros vírus ou outros equivalentes e pode também garantir, que se protege da melhor forma possível, a fim de evitar que outros o façam.
Pelo que, no caso de existirem tais vírus ou de impedimentos no acesso ao seu sítio na internet, não se vislumbra de que forma poderiam ser assacadas responsabilidades à R., sobretudo se a mesma não os colocou lá, nem impediu o acesso ao seu sítio na internet e tudo fez, a fim de evitar tais situações.
Em todo o caso, e uma vez mais a fim de evitar quaisquer controvérsias a R. alterou já o teor da referida Cláusula que passou a ser o seguinte, conforme resulta do Doc. 1 junto: “A B… não é responsável pelos prejuízos decorrentes de quaisquer vírus informáticos ou quaisquer outras situações a que seja alheia que impeçam o acesso e correto funcionamento do domínio www.B....pt bem como dos serviços disponibilizados no mesmo.”
Agora, a R. apenas deixa claro aos seus clientes que, caso os mesmos não consigam aceder ao seu sítio na internet por causas alheias à própria R., não irá a mesma assumir o pagamento de quaisquer prejuízos que, eventualmente, possam advir de tal situação, excluindo-se, na nova redacção, a componente genérica da antiga.
Quanto ao § 2.º da Cláusula 13, alega a R. que há que atender ao facto do entendimento plasmado na petição inicial relativamente ao foro convencionado ser recente e que nem sempre foi aquele o entendimento maioritário.
No entanto, atento o evoluir da jurisprudência e as críticas apontadas pelo MP, entendeu a R. simplesmente excluir dos seus termos de uso tal cláusula, deixando de fixar qualquer competência territorial para eventuais litígios futuros.
A Cláusula 13. aqui em causa diz unicamente respeito à legislação aplicável aos negócios celebrados com a R. através do seu sítio na internet, passando a mesma a ter a seguinte redacção (conforme Doc. 1 junto): “As presentes condições gerais e todos os contratos que vierem a ser celebrados ao abrigo da mesma regem-se pela legislação portuguesa.”
Finalmente, alega a R. que numa clara manifestação de boa-fé e de colaboração com a justiça a R., logo que foi citada para os termos da presente acção, diligenciou no sentido de analisar os argumentos empregues pelo MP na sua petição e de corrigir eventuais falhas e suprir eventuais deficiências ou incoerências do seu clausulado.
Foi mesmo além das alterações exigidas pelo MP tendo procurado melhorar a redacção de todas as cláusulas de forma a adequar as mesmas aos diferentes regimes jurídicos aplicáveis aos negócios que concretiza através do seu sítio na internet.
A R. nunca actuou em violação dos normativos legais imperativos, nem em prejuízo dos seus clientes.
De forma voluntária a R. esvaziou totalmente a acção interposta, apenas mantendo um único ponto de discórdia com o MP, ponto esse que, salvo o devido respeito, não pode ser de outra forma que não a apresentada pela R., sob pena dos ditames da boa fé serem violados, desta feita, pelos clientes da própria R..
Com excepção à cláusula que vai contestada existe, quanto ao demais, uma inutilidade superveniente da lide que deverá ser declarada.
Mais ainda, não tem cabimento que se condene a R. a publicitar em jornais alterações a cláusulas que a própria fez voluntariamente. Além de inexistir fundamento jurídico para tal, inexiste fundamento de facto e é manifestamente exagerada a imposição de tal castigo. A postura processual da R. deve ser valorizada e tida em linha de conta, no que respeita a tal aspecto. Naturalmente que a publicação em jornais nacionais é negativa para a imagem da R., causando-lhe graves prejuízos de imagem. Por outro lado, não resulta dos autos que alguém tivesse alguma vez sido prejudicado pela R. em função do clausulado nos termos de uso, nem o MP faz referência a qualquer denúncia, queixa, ou alegação de caso concreto em que o consumidor tivesse tido prejuízo e que lhe tivesse sido dirigida.
Notificado para se pronunciar quanto às excepções deduzidas pela R., o MP respondeu alegando, em resumo, que a acção inibitória interposta tem dois objectivos, decorrente do pedido de declaração de nulidade das cláusulas enunciadas na petição: o de proibir a R. de incluir as cláusulas em apreço ou cláusula idêntica em contratos que de futuro venha a celebrar e o de impedir que se prevaleça do seu conteúdo em contratos que celebrou no passado.
Impugna, por desconhecimento a alegação da R. de que as cláusulas contratuais reproduzidas nestes autos, com excepção de uma [ínsita no 3.º § da Cláusula 5.2 – Informação de Preços] já não têm correspondência com a realidade e que a R. (após ter recebido a petição inicial) decidiu proceder a modificações na redacção de cada uma das clausulas visadas pelo A. [com excepção da devidamente assinalada e contestada], no sentido de as mesmas serem inequívocas.
Quanto à alegada inutilidade superveniente, pronunciou-se pela sua inexistência uma vez que se a alegada inutilidade resultará, na parte invocada, e se trata sempre de uma alteração unilateral, sem a obrigatoriedade de uma decisão judicial, podendo a R. reincidir no seu uso, sem quaisquer consequências.
Acresce que toda a R. que não seja condenada na abstenção do uso de cláusulas contratuais gerais abusivas não fica sujeita à sanção pecuniária compulsória prevista no artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, o que pode conduzir a reincidência na utilização de cláusulas abusivas.
Por outro lado, sempre existirá utilidade na apreciação do carácter abusivo da cláusula sindicada decorrente do efeito de caso julgado (cfr. artigo 32.º, n.º 2, do mencionado Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro), ao permitir àquele, seja ou tenha sido, parte juntamente com a R. em contrato com este clausulado, invocar a todo o tempo e em seu benefício a decisão incidental de nulidade contida na decisão inibitória.
Isto é, somente a apreciação da causa terá a virtualidade de sanar eventuais efeitos danosos já produzidos em contratos celebrados com a inclusão das mencionadas cláusulas, permitindo aos prejudicados exigir da R. valores que se apurem devidos.
Acrescendo que o próprio legislador, no artigo 25.º, do Decreto-Lei n.º 446/85, para a instauração de acção inibitória, se satisfaz com a possibilidade de utilização as cláusulas, "independentemente da sua inclusão efectiva em contratos singulares".
Foi proferido despacho que identificou o objecto do litígio e enunciou os temas da prova.
Após designação da data para realização da audiência final, a A. declarou expressamente que aceita que exige que os seus clientes aceitem os “Temos de Uso” para que possam realizar quaisquer aquisições no seu sítio da internet e que aceita que os seus clientes que pretendam adquirir produtos no seu sítio da internet, não podem alterar as condições ou cláusulas estabelecidas nos “Termos de Uso”.
Procedeu-se à realização da audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente:
a) Declarou nulas:
1 - A cláusula 3, sob a epígrafe “Alteração das presentes Condições”, com o seguinte teor: “A B…, S.A., reserva-se o direito de modificar unilateralmente e em qualquer momento, sem aviso prévio, a apresentação e conteúdo do sítio Web, seus serviços e as condições gerais de utilização. Essas modificações servirão para uma melhoria do website, melhorando simultaneamente os serviços oferecidos ao utilizador do website.”.
2 – As cláusulas correspondentes aos §§ sexto e sétimo do número 7 da cláusula 6., sob a epígrafe “Tratamento e entrega do pedido”, com o seguinte teor: “Todos os artigos são entregues em embalagens seguras. Se detetar danos externos na embalagem do produto deverá reportar esse defeito ao transportador, no momento da entrega, fazendo também referência a esse dano no documento comprovativo da entrega. Deverá ainda contactar a nossa Linha de Apoio ao Cliente ……….
Atenção que um comprovativo de entrega sem referência a danos equivale a um produto entregue em embalagem em perfeitas condições. Se, após aberta a embalagem, detetar danos no produto, dispõe de 24 horas após a receção da encomenda para contactar a nossa linha de Apoio Ao Cliente ……….”.
3 - A cláusula correspondente ao § quinto da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”, com o seguinte teor: “1. Artigos sem sinal de uso indevido”.
4 - A cláusula correspondente ao § sétimo da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”, com o seguinte teor:
3. Prazo de Devolução: Até ao 15º dia consecutivo, a partir do dia da entrega • Produto Avariado – Deverá dirigir-se a uma loja física da B…, apresentando a fatura e o artigo completo. No caso de esta opção não ser possível deverá contactar a nossa linha de Apoio (linha Azul – preço de chamada local), que o ajudará a resolver o problema.
• Devoluções por danos de transporte - Os prazos para efetuar reclamação por danos causados pelo transporte serão de 48 horas desde a data da entrega. Passado este período de tempo, a B… não se responsabiliza por qualquer defeito que possa ter ocorrido no transporte.”;
5 - A cláusula correspondente ao § oitavo da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”, com o seguinte teor: “Reembolso (Aplicável em compras em B….pt) No caso de devolução, o reembolso do valor da sua compra será efectuado após a validação do cumprimento das condições de devolução descritos anteriormente, tendo a B… um prazo de até 14 dias para o efeito.”;
6 - A cláusula 11., sob a epígrafe “Responsabilidade”, com o seguinte teor: “A B…, S.A., não garante a ausência de vírus ou elementos similares em documentos eletrónicos e ficheiros armazenados no seu sistema informático e na sua página web, não se responsabilizando por qualquer dano provocado e derivado da eventual presença de vírus e outros elementos análogos.”;
7 - A cláusula correspondente ao § segundo da cláusula 13., sob a epígrafe “Lei e Foro”, com o seguinte teor: “Todos os litígios emergentes da interpretação ou execução do presente acordo serão dirimidos pelo Tribunal da Comarca de Lisboa, com expressa renúncia a qualquer outro.”, todas do Clausulado “Termos de Uso”, junto como documento n.º 11 com a petição inicial;
b) Condena-se a R. a abster-se de utilizar as cláusulas contratuais gerais supra identificadas em 1) a 7) nos contratos que de futuro venha a celebrar com os seus clientes;
c) Condena-se a R. a dar publicidade a esta proibição através de anúncio a publicar em dois jornais diários de maior tiragem editados em Lisboa e no Porto, durante dois dias consecutivos, de tamanho não inferior a ¼ da página, e a comprovar nos autos essa publicidade, no prazo de 15 dias, a contar do trânsito em julgado desta decisão.
Inconformada, apelou a R., apresentando as seguintes conclusões:
I – Da impugnação da decisão relativa à matéria de facto
A. Em primeiro lugar, alega-se na petição inicial e é dado por provado que, a aquisição dos bens e serviços comercializados pela Ré implica, sem mais, a aceitação dos termos de uso (Pontos 5, 6 e 7 dos factos dados provados na sentença recorrida). Ora, salvo o devido respeito, esta factualidade foi impugnada pela Apelante na sua contestação (artigos 5.º a 30.º da contestação), motivo pelo qual, era matéria controvertida relativamente à qual havia que se produzir prova.
B. Repara-se que, na sua contestação, a Apelante não rejeita que oferece um clausulado para a integração das vendas online por si realizadas, nem sequer nega que, de forma imediata, o referido clausulado terá que ser aceite para que o processo de venda possa prosseguir. Isto mesmo confirmam as testemunhas arroladas pela Ré, aqui, Apelante, C… (minuto 2:37 a 3:17 da respetiva gravação) e D… (minuto 2:40 a 3:02 da respetiva gravação), como, aliás, não poderia deixar de ser.
C. Em particular, a testemunha C…, descrevendo de forma detalhada o processo de compra, esclarecendo que, para que se consiga avançar para a compra propriamente dita, os clientes devem, antes demais, ter uma conta no website da Apelante e “aceitar os termos e condições e políticas de cookies (…) e depois passar para à parte da compra” (minuto 3:21 a 3:34 da respetiva gravação).
D. Porém, tais testemunhas, confirmando a necessidade de, para conclusão do processo de compra, se aceitar as referidas condições, não põem em causa o que a este propósito vai dito na contestação e que serviu para impugnar aquela matéria alegada na petição inicial. Isto é, como resulta das mencionadas dos referidos testemunhos, a prova produzida limitou-se a constatar o óbvio, isto é, por se tratar de um processo negocial que ocorre online é, naturalmente, forçoso que se apresentem algumas condições que regulem minimamente as condições elementares do negócio a celebrar. Não significando isso, porém, que, caso algum cliente entenda não aceitar alguma daquelas condições, que a Apelante não negoceie com o mesmo os termos da venda a efetuar e a realize em diferentes condições das por si inicialmente propostas.
E. Não tendo sido produzida qualquer prova que contrarie o que, a este propósito, se alega na contestação: as condições de venda online não são imutáveis e está ao alcance dos utilizadores do website da Apelante alterar as mesmas, caso, naturalmente, atuem nesse sentido. A prova testemunhal ou documental produzida no âmbito dos presentes autos, não permite, de forma alguma, que se chegue ás conclusões plasmadas no ponto 6 dos factos dados por provados, já que, nenhum testemunho ou documento, indiciam o que seja a esse propósito.
F. Motivo pelo qual, em face da prova produzida e acima mencionada mas, essencialmente, da prova que não foi produzida, já que, a este propósito, o MP nada demonstra, a matéria constante dos pontos 6 e 7 dos factos provados, não deveria ser dada por provada.
G. De igual forma, e como consequência do suprarreferido, o ponto único dos “Factos não provados” constante da sentença recorrida, não poderia ser dado por não provado.
II – Da inexistência de contrato de adesão
H. Na senda do ora exposto sob a epígrafe A das presentes alegações– e alterada que seja a decisão quanto à matéria de facto a este propósito – há que extrair as legais consequências de tal matéria de facto não poder ser dada por provada.
I. Designadamente, e tal como já se pugnava na contestação, a, aqui, Apelante oferece efetivamente aos seus clientes os termos de um contrato de compra e venda, contudo, não exige a aceitação de tais termos para a concretização de qualquer negócio estando sempre disponível – e facultando meios para esse efeito, designadamente, o endereço de correio eletrónico do seu serviço de apoio ao cliente - para analisar eventuais propostas que lhe sejam dirigidas pelos seus clientes e, se disso for caso, para aceitar contratar em termos diversos dos por si apresentados como, de resto, faz constantemente.
J. Impugnando-se, assim, que a presente acção se possa fundamentar na LDC ou no RJCCG, uma vez que, nem um regime, nem outro, são aplicáveis aos negócios realizados pela Apelante, conforme exposto.
III – Da inutilidade superveniente da lide
K. Tal como consta da matéria dada por provada, logo que citada para os termos da presente ação, a, aqui, Apelante, mesmo que não partilhando da interpretação feita pelo MP e constante da petição inicial, entendeu reformular os “Termos de Uso” do seu website, dando resposta a todas as exigências do Apelado.
L. Com as alterações levadas a cabo – e como se reconhece na sentença recorrida – todas as cláusulas em litígio foram alteradas em termos que não mereceram quaisquer reparos do Apelado. O que, salvo melhor opinião, esvazia por completo o fundamento da petição inicial, consubstanciando uma inutilidade superveniente da lide.
M. Entendeu, porém, o tribunal a quo na douta sentença que aqui se impugna que inexistia qualquer inutilidade superveniente, fundamentando a sua posição por mera remissão para Acórdão do STJ de 16/10/2018. Ora, salvo o devido respeito, sendo este o fundamento da decisão, sempre se terá que questionar o motivo pelo qual tal matéria de facto (existência de contratos celebrados ao abrigo das cláusulas impugnadas), não sendo dada por provada, é utilizada para decidir uma das exceções alegadas pela, aqui, Apelante.
N. Se o fundamento da improcedência do alegado pela Apelante é a existência de contratos celebrados anteriormente ao abrigo destas cláusulas, tal factualidade teria que ter sido alegada e provada, passando a constar do rol de factos provados.
Porém, não só tal matéria é alegada como, de igual forma, não é dada por provada e, no entanto, é a factualidade que serve de base à improcedência da exceção de inutilidade superveniente alegada pela Apelante o que, naturalmente, não se pode admitir.
O. Depois, por terem, entretanto, decorrido mais de quatro anos desde a data de alteração dos termos e condições para ficarem conformes à interpretação do MP, o que, evidentemente, faz com que seja impossível que, por mais que tivessem sido celebrados contratos ao abrigo de tais cláusulas, os mesmos ainda existam juridicamente ou que subsistam direitos por reclamar relativamente aos mesmos.
Isto é, por mais que tivesse ficado demonstrada a celebração de contratos ao abrigo de tais cláusulas - que, como se referiu, não ficou - é absolutamente claro que, na presente data, todas essas relações estão findas. Nenhum direito fundado em tais contratos poderia ainda hoje ser validamente exercido.
IV – Da publicidade da sentença
P. A douta sentença que aqui se impugna determinou que a Apelante estava obrigada a proceder à publicação da mesma em jornal. A fundamentar tal decisão, uma vez mais, a “existência de interessados”, isto é, de pessoas que tenham celebrado com a Apelante, contratos ao abrigo de tais cláusulas. Porém, e uma vez mais, nem tal factualidade foi alegada, nem consta do rol de factos dados por demonstrados na douta sentença recorrida. Pelo que, trata-se uma vez mais de uma mera especulação levada a cabo pelo tribunal a quo e que impõem um prejuízo considerável à Apelante.
Q. Por outro lado, a publicação da sentença não é um efeito imediato da decisão de nulidade, antes, uma decisão que deve ser ponderada pelo tribunal. Ora, o que se fica sem perceber é como é que mais de quatro anos volvidos desde a alteração das cláusulas – demonstrada nos autos – e sem que se demonstre uma única reclamação ou queixa envolvendo esta temática, conclui o tribunal pela necessidade de publicação da sentença.
R. Sendo manifesto que, a publicação em questão, por mais que diga respeito a factos com mais de 4 anos e corrigidos voluntariamente pela Apelante irá comportar um dano na imagem e no prestígio da mesma. Sem que haja qualquer interesse ou bem jurídico a salvaguardar-se com a sua publicação.
V – Da nulidade das cláusulas elencadas na petição inicial
S. Sem prejuízo do supra exposto e de, na verdade, se entender, como se referiu, a inutilidade superveniente da presente lide, certo é que, a não ser a mesma considerada e passando-se a uma efetiva análise do clausulado cuja validade o MP impugna, sempre haverá que evidenciar manifestos lapsos cometidos no julgamento dos presentes autos em primeira instância. Até porque, salvo o devido respeito, se a postura processual da Apelante não é minimamente valorizada e tida em consideração na condenação de que foi alvo,
T. Desde logo, no que respeita à Cláusula 3. “Alteração das presentes condições” que, tal como se referia já na contestação, dizia respeito única e exclusivamente ao sítio na internet da Apelante e ao seu aspecto e/ou funcionalidades, não pretendendo, de forma alguma, significar que a Ré pudesse unilateralmente modificar condições contratuais, muito menos de contratos já validamente celebrados e em execução.
U. Não diz respeito a contratos celebrados e muito menos a cláusulas ou aspectos essenciais ou determinantes dos mesmos. De resto, impõem-se perguntar: de que outra forma que não unilateralmente podem os “Termos de Uso” de um website ser alterados? Obviamente, e tal como se referiu, tratando-se de negociação online os termos iniciais de um acordo de vontades têm que ser fornecidos pelo vendedor. Pelo que, é manifesto, inexiste qualquer nulidade da sobredita cláusula que, por isso, não poderia ter sido declarada nula.
V. O mesmo diga-se relativamente ao Parágrafo 5.º da Cláusula 8, que foi indevidamente declarada nula na sentença recorrida. Não se podendo, salvo o devido respeito, subscrever os argumentos a este propósito utilizados em primeira instância, isto porque, refere o n.º 3 do art.º 13.º do Decreto-Lei 24/2014 o seguinte:
“O consumidor deve conservar os bens de modo a poder restituí-los nas devidas condições de utilização, no prazo previsto no n.º 1, ao fornecedor ou à pessoa para tal designada no contrato.”.
W. Pelo que, fica-se sem perceber de que forma é que a expressão “utilização indevida”, em referência clara à obrigação legal de “restituir nas devidas condições de utilização” pode ser tida por demasiado vaga e abstrata e, muito menos, de que forma é que a mesma poderia condicionar o exercício de direitos legais. É que, de resto, as obrigações legais do cliente resultam já da lei, sendo que, a referida redação daquela cláusula, não as excede de forma alguma.
X. Por fim, no que respeita ao Parágrafo 8.º da Cláusula 8 há igualmente que referir que as extrapolações levadas a cabo pelo tribunal a quo na douta sentença recorrida, além de ilegítimas, carecem de fundamento de facto que a suporte.
Limitando-se a considerar a redação da cláusula ambígua, determina a sua nulidade sem, porém, considerar os esclarecimentos a este propósito prestados pela Apelante e que aqui se reiteram.
Y. A redação da mencionada cláusula é clara e o seu sentido facilmente inteligível. Sendo certo que, esse mesmo sentido, é totalmente conforme com o disposto no n.º 2 do art. 12.º do DL 24/2014.
Z. Inexistindo, por isso, fundamento para que todas as referidas cláusulas sejam declaradas nulas.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve a presente apelação ser dada por provada e julgada procedente e, em consequência, deve:
1. A decisão relativa à matéria de facto ser alterada nos termos constantes da epígrafe A das presentes alegações, dando-se por não provados os pontos 6 e 7 dos factos provados constantes da sentença recorrida e, ainda, por demonstrado a ponto único da matéria não provada;
2. Em função da alteração da decisão relativa à matéria de facto, não deve o clausulado “Termos de Uso” em causa nos autos ser considerado contrato de adesão e, por isso, sujeito ao RJCCG, absolvendo-se, a Apelante de todos os pedidos contra si formulados na petição inicial;
Ou, sempre que assim não se entenda, deve
3. Ser julgada procedente a exceção de inutilidade superveniente da lide, nos termos constantes da epígrafe C das presentes alegações, e, em conformidade, absolver-se a Apelante dos pedidos contra si formulados;
Ou, sempre que assim não se entenda, deve
4. Ser declarada a legalidade das cláusulas elencadas na epígrafe E das presentes alegações;
E, em todo o caso, deve
5. Ser revogada a decisão de publicação da condenação, nos termos expostos sob a epígrafe D das presentes alegações;
Contra-alegou o MP., assim concluindo:
1) No recurso interposto de que ora se responde, vem a ré/recorrente, pugnar pelo seguinte:
1. Alteração da decisão da matéria de facto dando-se por não provados os pontos 6 e 7 dos factos provados constantes da sentença recorrida e, ainda, por demonstrado o ponto único da matéria não provada;
2. Em função da alteração da decisão relativa à matéria de facto, não deve o clausulado “Termos de Uso” em causa nos autos ser considerado contrato de adesão e, por isso, sujeito ao RJCCG; Ou, sempre que assim não se entenda, deve
3. Ser julgada procedente a exceção de inutilidade superveniente da lide, e, em conformidade, absolver-se a Apelante dos pedidos contra si formulados;
Ou, sempre que assim não se entenda, deve
4. Ser declarada a legalidade das cláusulas elencadas na epígrafe E das presentes alegações (cláusula 3 e parágrafo 5.º da cláusula 8);
E, em todo o caso, deve
5. Ser revogada a decisão de publicação da condenação.

*
2) Começando pelo primeiro argumento/pedido: os factos dado como provados e não provados, foram corretamente julgados, e por conseguinte, não podem ser alterados, conforme pretende a
ré/recorrente; na verdade, e conforme se diz na douta sentença a propósitos dos factos impugnados: “No que se refere à factualidade considerada provada em 6) e 7) e considerada não provada, a mesma resultou da aceitação expressa da R. através de requerimento junto as autos após designação de data para a realização da audiência final.”
3) Relativamente à alegação de que não deve o clausulado “Termos de Uso” em causa nos autos ser considerado contrato de adesão, a mesma já ficou devidamente apreciada na douta sentença recorrida, onde poderá ler-se que:
“(…) não restam igualmente dúvidas de que o clausulado sob a denominação “Termos de Uso”, junto como Documento 11 com a petição inicial, consubstancia um contrato de adesão, sujeito ao Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais (RJCCG), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 446/85, de 25-10 uma vez que a celebração dos contratos através do site da ré, são aqueles elaborados unilateralmente pela ré, as cláusulas são preestabelecidas e ao consumidor/utilizador cabe apenas aceitar o que lhe é imposto, nos exactos termos em que são apresentados, não lhe sendo atribuído o direito de discutir ou modificar o seu conteúdo.(…)”
4) Quanto à alegada inutilidade superveniente, resultante do facto de a R. ter alterado o teor de todas as cláusulas que supra se consideraram nulas, o Ministério Público reitera a posição que assumiu no decurso do processo, no sentido da sua inexistência, uma vez que se trataria de uma alteração unilateral, sem a obrigatoriedade de uma decisão judicial, pelo que a Ré sempre poderia reincidir no seu uso, sem quaisquer consequências.
5) Por outro lado, sempre existirá utilidade na apreciação do carácter abusivo da cláusula sindicada decorrente do efeito de caso julgado (cfr. artigo 32.º, n.º 2, do mencionado Dec-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro), ao permitir àquele, seja ou tenha sido, parte juntamente com a Ré em contrato com este clausulado, invocar a todo o tempo e em seu benefício a decisão incidental de nulidade contida na decisão inibitória.
6) Isto é, somente a apreciação da causa terá a virtualidade de sanar eventuais efeitos danosos já produzidos em contratos celebrados com a inclusão das mencionadas cláusulas, permitindo aos prejudicados exigir da Ré valores que se apurem devidos.
7) Acrescendo que o próprio legislador, no artigo 25.º, do D.L. n.º 446/85, para a instauração de acção inibitória, se satisfaz com a possibilidade de utilização das cláusulas, "independentemente da sua inclusão efectiva em contratos singulares".
8) A sentença recorrida também se pronuncia a respeito, dizendo, quanto a nós de forma assertiva, que:
9) “(…) Como se afirma no Ac. do S.T. J. de 16/10/2018, proc. nº 3082/05.5TJLSB.S1, disponível em www.dgsi.pt, cujo entendimento subscrevemos,
10) “O artigo 25.º do Decreto - Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, diploma que aprovou o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais, consagra a ação inibitória nos seguintes termos:
11) “As cláusulas contratuais gerais, elaboradas para utilização futura, quando contrariem o disposto nos artigos 15.º, 16.º, 18.º, 19.º, 21.º e 22.º, podem ser proibidas por decisão judicial, independentemente da sua inclusão efectiva em contratos singulares”.
12) Este tipo de ação tem um escopo preventivo (neste sentido Araújo de Barros, Cláusulas Contratuais Gerais – DL. 446/85 – Anotado, Coimbra, 2010, pág. 373).
13) (…) não parece que a utilidade deste tipo de ações se alcance satisfatoriamente com a prova de que o predisponente não mais usou e não pretende usar as cláusulas tidas por proibidas e nulas (…).
14) Com efeito, mesmo que o predisponente voluntariamente altere ou deixe de utilizar as cláusulas sindicadas na ação inibitória, o interesse social próprio das ações inibitórias, a invocação do caso julgado por terceiros para obstar ao uso da cláusula declarada inválida ou outras que se equiparem substancialmente, e o risco, ainda que abstrato, de poderem tais cláusulas ser novamente utilizadas, só se logram cumpridos e evitado, respetivamente, por via da sentença de mérito que declare a nulidade dessas mesmas cláusulas e não por mera ocorrência do seu não uso (presente).
15) Com efeito, pode encontrar-se utilidade no prosseguimento da ação para apreciação da validade de cláusulas anteriormente utilizadas, na medida em que foram celebrados contratos individuais ao abrigo das mesmas e por ocorrer a possibilidade de serem as mesmas cláusulas ou cláusulas substancialmente equiparáveis novamente utilizadas.
16) Para esta conclusão, concorre, desde logo, a interpretação que, segundo entendemos, melhor se adequa ao teor dos artigos 25.º, 30.º e 32.º do RCCG, segundo os quais a ação inibitória visa, por um lado, a proibição de utilização de cláusulas proibidas em contratos que sejam ou venham a ser celebrados e, por outro lado, erradicar do tráfico jurídico condições gerais iníquas, independentemente da sua inclusão em contratos singulares, assim se protegendo não só o contratante singular mas a verdadeira autonomia privada (…).
17) Assim, vislumbra-se, no primeiro sentido, interesse ou utilidade no prosseguimento da presente ação tendo em vista acautelar a inclusão das cláusulas que venham a ser consideradas nulas ou outras que substancialmente se lhes equiparem (cfr. artigo 32.º, n.º 1 do RCCG) em contratos que o predisponente venha a celebrar ou a recomendar que sejam utilizadas.
18) Daí que, na perspetiva de Araújo de Barros (ob. cit, págs. 388 e 390), atentas as particularidades próprias do efeito de caso julgado na ação inibitória que é qualificado como um caso julgado secundum eventum litis (o caso julgado favorável aproveita a terceiro, o caso julgado desfavorável é-lhe inoponível), deve concluir-se que “a simples correcção ou supressão de cláusula por parte do demandado na acção fica aquém do que se pretende com a condenação proibitiva, que se estende a todos os contratos que o demandado venha a celebrar ou a recomendar” (cfr. Cláusulas Contratuais Gerais - DL 446/85 Anotado, Coimbra Editora, págs. 388 e 390).
19) De forma mais abrangente, pode também inferir-se da posição adoptada pelo Professor Carlos Ferreira de Almeida a respeito da natureza jurídica das cláusulas contratuais gerais, que eventuais alterações introduzidas nos contratos que o predisponente celebre não terão relevância no que se refere à matéria objeto da ação inibitória. Conforme explica o referido autor, as cláusulas contratuais gerais são meros enunciados contratuais gerais, ou seja, enunciados com vocação para se integrarem numa pluralidade de contratos, sendo certo que antes da sua inserção em contratos singulares não são ainda cláusulas contratuais propriamente ditas. No entanto, o facto de ainda não terem sido incluídas em contratos singulares, não implica que não tenham eficácia jurídica, nomeadamente, por já estarem sujeitas a controlo jurisdicional através da ação inibitória (cfr. Contratos I – Conceito, Fontes e Formação, Almedina, 3.ª Edição, pág. 169).
20) O Supremo Tribunal de Justiça também vem decidindo não retirar utilidade à ação inibitória o facto posterior do não uso pelo predisponente das cláusulas visadas na ação. - cfr. Acórdãos de 26 de fevereiro de 2015; 13 de novembro de 2014; 21 de fevereiro de 2013; 8 de maio de 2013; 14 de novembro de 2013; 19 de abril de 2012: 14 de abril de 2011; 31 de maio de 2011.
21) Atento todo o exposto, (…) existe utilidade no prosseguimento da ação inibitória na situação em que as cláusulas foram retiradas ou não são usadas pelo predisponente atenta a função social da ação, o efeito do caso julgado e a prevenção do risco de utilização futura, a decisão de inutilidade superveniente e consequente absolvição da instância deve ser revogada e substituída por outra que conheça do mérito da ação.”
22) Por outro lado, as cláusulas 3.º e 8.º são abusivas e daí que o 4.º pedido formulado pela ré/recorrente deve improceder porquanto, como bem se explica na douta sentença recorrida:
23) (…) atento o teor da cláusula em apreço (3.ª) e verificando-se a ausência na mesma, ou noutras cláusulas dos “Termos de Uso” ou nas informações prestadas no site, de qualquer ressalva relativamente aos contratos que se encontrem em vigor e em execução, as modificações que a ré efectuar, ao abrigo desta cláusula, a qualquer momento, são imediatamente aplicáveis a todos os contratos em vigor, podendo o utilizador/consumidor vir até a ser confrontado, após a sua compra, com uma alteração das especificações do produto, das condições comerciais e dos serviços, efetuada pela ré, sem necessidade de qualquer justificação ou pré-aviso, e sem que ao mesmo seja concedida a possibilidade de resolver o contrato ou de solicitar qualquer compensação ou indemnização.
24) Assim sendo, a presente cláusula é proibida, por violação do disposto na alínea c) do n.º 1 do art.º 22.º do RJCCG, uma vez que atribui à predisponente ré o direito de alterar unilateralmente os termos do contrato, a qualquer momento, com base na sua própria conveniência e sem que ao consumidor seja dada a possibilidade de resolução do contrato ou de solicitar qualquer reembolso, compensação ou indemnização, e, consequentemente, é nula, em conformidade com o disposto no art.º 12.º daquele diploma legal.
25) É, ainda proibida, por violar valores fundamentais do direito, defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos art.ºs 15.º e 16.º, ambos do RJCCG, uma vez que cria um desequilíbrio na relação contratual estabelecida entre a predisponente ré e o utilizador/consumidor, colocando este à mercê do arbítrio daquela, perante a possibilidade conferida por esta cláusula de a ré poder, a todo o momento e de forma unilateral, alterar os termos do contrato, ou mesmo revoga-lo. (…)”
26) Nos termos desta cláusula (8.ª) a ré estabelece que os produtos devolvidos pelo consumidor, na sequência da livre resolução do contrato, têm de se encontrar “sem sinal de uso indevido”, ou a devolução dos mesmos e, consequentemente, a resolução do contrato, não será aceite – vide § 8.º desta cláusula.
27) Dispõe o art.º 10.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 24/2014 de 14-02, respeitante aos contratos celebrados à distancia e fora do estabelecimento comercial, que, no prazo de 14 dias, contados desde que o comprador adquire a posse física dos bens adquiridos, no caso de ser celebrado contrato de compra e venda, aquele pode livremente e sem necessidade de indicar motivo, resolver o contrato e proceder à devolução dos bens adquiridos num prazo de 14 dias a contar da data em que tiver comunicado a decisão de resolução do contrato – art.º 13.º do Decreto-Lei n.º 24/2014.
28) Conforme decorre do art.º 14.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 24/2014, de 14-02, o exercício do direito de livre resolução não prejudica o direito de o consumidor inspeccionar, com o devido cuidado, a natureza, as características e o funcionamento do bem, podendo o consumidor, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito legal, ser responsabilizado pela depreciação do bem, se a manipulação efectuada para inspeccionar a natureza, as características e o funcionamento desse bem exceder a manipulação que habitualmente é admitida em estabelecimento comercial.
29) O diagnóstico do caráter abusivo de uma cláusula pressupõe a prévia determinação do seu sentido, ou seja, a sua interpretação. A este respeito estipula o art.º 5.º da Directiva 93/13/CEE que “No caso dos contratos em que as cláusulas propostas ao consumidor estejam, na totalidade ou em parte, consignadas por escrito, essas cláusulas deverão ser sempre redigidas de forma clara e compreensível. Em caso de dúvida sobre o significado de uma cláusula, prevalecerá a interpretação mais favorável ao consumidor. Esta regra de interpretação não é aplicável no âmbito dos processos previstos no n.º 2 do artigo 7.º [processos como o destes autos, que tenham em vista pôr termo à utilização de cláusulas abusivas]”.
30) Assim, no que concerne às cláusulas ambíguas, em que “na dúvida, prevalece o sentido mais favorável ao aderente” (n.º 2 do art.º 11.º da LCCG), tal regra de interpretação não é aplicável no âmbito das ações inibitórias (n.º 3 do art.º 11.º da LCCJ, aditado pelo Dec.-Lei n.º 249/99, de 7.7).
31) Como diz Almeno de Sá (Cláusulas Contratuais Gerais e Directiva Sobre Cláusulas Abusivas, Almedina, 2.ª edição, 2005, pág. 40) “… se se optasse, na acção inibitória, pela variante de sentido directamente mais favorável ao cliente, correr-se-ia o risco de não poderem ser combatidas, pela via do controlo abstracto, cláusulas intrinsecamente abusivas, prejudiciais ao cliente, tão só porque, na interpretação imediatisticamente mais vantajosa para a contraparte do utilizador, não ultrapassariam os limites da não-contrariedade à boa-fé, tal como resultam dos artigos 15.º e seguintes da lei das cláusulas contratuais gerais…”. Assim, “dada a função preventiva deste tipo de controlo, a solução correcta traduzir-se-á em partir, face a uma cláusula ambígua, da variante de sentido mais prejudicial ao cliente, a fim de determinar se, com tal sentido, a cláusula “resiste” o controlo do conteúdo. Com isto se conseguirá uma mais eficaz e substantivamente mais justa aplicação das normas que regulam a fiscalização do conteúdo” (obra citada, pág. 41).
32) Assim, temos que subscrever a posição do A. quando afirma que a designação “artigos sem sinal de uso indevido”, é uma demasiado vaga e abstracta, podendo, por isso, ser-lhe atribuído o sentido de não permitir ao consumidor a utilização dos bens adquiridos, por forma a verificar a sua conformidade e, nessa justa medida, a cláusula sindicada é nula, por contender com valores fundamentais do direito defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos art.ºs 12.º, 15.º e 16º, do RJCCG, em concreto, por contender com lei imperativa, como é o caso dos art.ºs 14.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei nº 24/2014, de 14-02, sendo também nula nos termos do art.º 294.º CC.(…)”
33) Por último, quanto à publicidade da sentença, a decisão já se pronunciou corretamente a respeito, decidindo que:
34) “(…) O art. 30º do RJCCG estatui:
“1. A decisão que proíba as cláusulas contratuais gerais especificará o âmbito da proibição, designadamente através da referência concreta do seu teor e a indicação do tipo de contratos a que a proibição se reporta.
2. A pedido do autor, pode ainda o vencido ser condenado a dar publicidade à proibição, pelo modo e durante o tempo que o tribunal determine.”
35) Subjacentes à acção inibitória estão interesses de ordem pública, como desde logo, resulta da legitimidade activa conferida ao Ministério Público. Visando a acção inibitória a apreciação abstracta de cláusulas contratuais gerais elaboradas para utilização futura – art. 25º do DL.446/85 – a publicidade, podendo ser imposta ou não na decisão, tem um fim imediato que se exprime na proibição de inclusão em contratos onde constam e em futuros contratos, dirigida ao infractor, fim colimado à protecção do consumidor/aderente que, pela via da publicação da decisão judicial, fica informado e pode fazer a sua opção de modo a não contratar com quem predispõe cláusulas proibidas.
36) Como se refere no Ac. do Tribunal Constitucional nº 360/2001, publicado no Diário da República n.º 264/2001, Série II de 2001-11-14, “(…) porque se trata de cláusulas contratuais gerais, destinadas a um círculo de sujeitos indefinidos e abrangente, a decisão só será plenamente eficaz se também tiver a possibilidade de ser levada ao conhecimento dos interessados, não se tratando de uma sanção em sentido próprio, mas tão-somente de um meio de prevenir os contraentes dos seus direitos, que decorre da publicidade em processo civil”.
37) Como se pode ler no Ac. S.T.J de 13-11-2014, proc. nº 2475/10.0YXLSB.L1.S1, “ (…) esta divulgação pública não tem qualquer caráter sancionatório, não visando naturalmente penalizar a imagem pública da entidade condenada, mas apenas e tão somente transmitir à generalidade dos consumidores/interessados o resultado objetivo da ação e a disciplina jurídica a que passarão a estar inelutavelmente submetidos os contratos de adesão celebrados, mostrando-se plenamente adequada à vertente cívico/social da própria ação inibitória, direcionada para a proteção dos interesses difusos da generalidade dos consumidores/aderentes, informados precisamente dos seus direitos através da publicitação em órgãos de comunicação social, a todos os cidadãos
plenamente acessíveis, do resultado final da causa”.
38) Assim sendo, a postura processual da R. não afasta a necessidade de dar publicidade à decisão, nos termos peticionados pelo A., entendendo-se, contudo, e tendo em consideração que a mesma tem como destinatários a generalidade dos consumidores e que não tem qualquer carácter sancionatório, não ser necessária a publicitação na página da internet da R.(…)”
Nestes termos deverá ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida nos seus precisos termos, como será de inteira Justiça.

2. Fundamentos de facto

A 1.ª instância considerou provados os seguintes factos:

1) A R. é uma sociedade anónima, inscrita na Conservatória do Registo Comercial do Porto – 3.ª Secção, com o n.º ……….
2) A R. tem por objecto social: “Comércio retalhista, a comercialização, distribuição, manutenção e reparação, de aparelhos eletrodomésticos, aparelhos de televisão, rádio e música, artigos diversos de decoração, todos os artigos que se destinem a equipamento do lar, equipamentos informáticos e prestação de serviços conexos, instrumentos musicais, discos, cassetes, disquetes, dvd, videogramas, cd, jogos de computador e produtos similares, atividades de importação e exportação, e ainda o comércio armazenista e grossista de aparelhos eletrodomésticos, aparelhos de televisão, rádio e música e de todos os artigos que se destinem a equipamentos para o lar, equipamentos informáticos, instrumentos musicais, discos, cassetes, disquetes, dvd, videogramas, cd, jogos de computador e produtos similares e ainda a prestação de serviços a outras empresas.”.
3) No exercício da sua actividade, a R., sob a denominação comercial “B…” e no sítio www.B....pt, divulga a sua marca e expõe para venda os seus produtos, que podem ser adquiridos directamente pelo utilizador que, de qualquer ponto de Portugal, aceda ao sítio.
4) O utilizador do sítio da R. pode efectuar através do mesmo uma encomenda online, procedendo, em seguida, ao pagamento, directamente à R., do valor devido, através de referência Multibanco, Paypal ou cartão de crédito.
5) Os bens são vendidos e adquiridos mediante a apresentação pela R., no respectivo website, aos utilizadores que com a mesma pretendam contratar, de um clausulado previamente elaborado, com o título, à data da entrada da acção, de “Termos de Uso”, conforme documento junto com a petição inicial sob o nº 11, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
6) A utilização do sítio da R., bem como a aquisição por parte de qualquer utilizador dos bens e serviços propostos pela R., implica a aceitação obrigatória do teor do conteúdo do documento denominado “Termos de Uso”.
7) O referido documento não contém quaisquer espaços em branco para serem preenchidos pelos contratantes que, em concreto, acedam ao website “B…” e que pretendam adquirir um produto ali anunciado para compra, efectivando-se a ordem de compra com a aceitação das condições constantes deste documento, que os contratantes não podem alterar.
8) As condições de utilização constantes naquele clausulado encontram-se disponíveis em página da internet e podem ser acedidas, impressas ou guardadas.
9) Consta da cláusula 3, sob a epígrafe “Alteração das presentes Condições”, do clausulado “Termos de Uso” – Documento supra referido em 5) -, que: “A B…, S.A., reserva-se o direito de modificar unilateralmente e em qualquer momento, sem aviso prévio, a apresentação e conteúdo do sítio Web, seus serviços e as condições gerais de utilização. Essas modificações servirão para uma melhoria do website, melhorando simultaneamente os serviços oferecidos ao utilizador do website.”.
10) Consta do § terceiro da cláusula 5.2, sob a epígrafe “Informação de Preços”, do clausulado “Termos de Uso” – Documento supra referido em 5) -, que: “No caso de ocorrência de erro informático, manual, técnico, ou de qualquer outra origem, que cause uma alteração substancial não prevista pela B…, S.A. no preço de venda ao público, de tal modo que este se transforme exorbitante ou manifestamente irrisório, o pedido de compra será considerado inválido e anulado.”.
11) Consta dos §s sexto e sétimo do número 7 da cláusula 6., sob a epígrafe “Tratamento e entrega do pedido”, do clausulado “Termos de Uso” – Documento supra referido em 5) -, que:
Todos os artigos são entregues em embalagens seguras. Se detetar danos externos na embalagem do produto deverá reportar esse defeito ao transportador, no momento da entrega, fazendo também referência a esse dano no documento comprovativo da entrega.
Deverá ainda contactar a nossa Linha de Apoio ao Cliente ……….
Atenção que um comprovativo de entrega sem referência a danos equivale a um produto entregue em embalagem em perfeitas condições. Se, após aberta a embalagem, detetar danos no produto, dispõe de 24 horas após a receção da encomenda para contactar a nossa linha de Apoio Ao Cliente ……….”.
12) Consta do § quinto da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”, do clausulado “Termos de Uso” – Documento supra referido em 5) -, que: “1. Artigos sem sinal de uso indevido”.
13) Consta do § sétimo da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”, do clausulado “Termos de Uso” – Documento supra referido em 5) -, que:
3. Prazo de Devolução: Até ao 15.º dia consecutivo, a partir do dia da entrega • Produto Avariado – Deverá dirigir-se a uma loja física da B…, apresentando a fatura e o artigo completo. No caso de esta opção não ser possível deverá contactar a nossa linha de Apoio (linha Azul – preço de chamada local), que o ajudará a resolver o problema.
• Devoluções por danos de transporte - Os prazos para efetuar reclamação por danos causados pelo transporte serão de 48 horas desde a data da entrega. Passado este período de tempo, a B… não se responsabiliza por qualquer defeito que possa ter ocorrido no transporte.”.
14) Consta do § oitavo da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”, do clausulado
Termos de Uso” – Documento supra referido em 5) -, que: “Reembolso (Aplicável em compras em B….pt) No caso de devolução, o reembolso do valor da sua compra será efectuado após a validação do cumprimento das condições de devolução descritos anteriormente, tendo a B… um prazo de até 14 dias para o efeito.”.
15) Consta da cláusula 11., sob a epígrafe “Responsabilidade”, do clausulado “Termos de Uso” – Documento supra referido em 5) -, que: “A B…, S.A., não garante a ausência de vírus ou elementos similares em documentos eletrónicos e ficheiros armazenados no seu sistema informático e na sua página web, não se responsabilizando por qualquer dano provocado e derivado da eventual presença de vírus e outros elementos análogos.”.
16) Consta do § segundo da cláusula 13., sob a epígrafe “Lei e Foro”, do clausulado “Termos de Uso” – Documento supra referido em 5) -, que: “Todos os litígios emergentes da interpretação ou execução do presente acordo serão dirimidos pelo Tribunal da Comarca de Lisboa, com expressa renúncia a qualquer outro.”.
17) Atento o teor da petição inicial a R. diligenciou no sentido de elaborar um novo documento para substituir o supra referido em 5), tendo procedido a tal alteração no seu próprio sítio na internet antes da apresentação da contestação, conforme documento que junta sob o n.º 1 denominado “Informação pré.-contratual/Condições gerais de utilização do site” e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
18) No documento referido em 17), a R. alterou a redacção da Cláusula 3. “Alteração das presentes condições” que passou a ter o seguinte teor: “A B… reserva-se o direito de modificar unilateralmente e em qualquer momento, sem aviso prévio, a apresentação e conteúdo do sítio Web, seus serviços e as condições gerais de utilização, ressalvando-se os contratos já celebrados e em execução. Essas modificações servirão para uma melhoria do website, melhorando simultaneamente os serviços oferecidos ao utilizador do website que, caso não concorde com as alterações introduzidas, poderá resolver o contrato.”.
19) No documento referido em 17), o número 7 da Cláusula 6. passou a ter a seguinte redacção:
“7. Tratamento e entrega do pedido.
As entregas das encomendas efetuadas online serão feitas apenas nos territórios de Portugal Continental, Arquipélagos dos Açores e da Madeira, com exceção dos grandes domésticos e televisores acima de 63 cm cuja entrega está restringida ao território de Portugal continental.
• Produtos das classes (1,2,3,4 e 6) serão entregues até 2 a 3 dias úteis após a respetiva cobrança.
• Produtos de entregas gratuitas (apenas para Portugal Continental) – Será contatado pela nossa linha de Apoio ao Cliente para o agendamento da entrega.
• Pedidos Mix (Produto Classes de 1 a 6 + Produto de entrega gratuita) – Entregas separadas e enquadradas em cada uma das situações anteriores.
Nota importante: A sua encomenda apenas será processada após a confirmação do respetivo pagamento.
Todos os artigos são entregues em embalagens seguras. Se detetar danos externos na embalagem do produto deverá reportar esse defeito ao transportador, no momento da entrega, fazendo também referência a esse dano no documento comprovativo da entrega.
Deverá ainda contactar a nossa Linha de Apoio ao Cliente ……….
Atenção que um comprovativo de entrega sem referência a danos equivale a um produto entregue em embalagem em perfeitas condições. Se detetar a existência de qualquer desconformidade ou defeito no artigo que adquiriu deve denunciá-lo à B… no prazo máximo de 60 (sessenta) dias a contar da data em que o tenha detetado, contactando a nossa linha de Apoio Ao Cliente ……… (linha Azul – preço de chamada local).
Grandes Electrodomésticos, Televisores e LCD acima dos 63 cm (Entrega gratuita)
A entrega desta categoria de produtos (Ex: Frigoríficos, Máquinas de Lavar, TV acima dos 63 cm) são preparadas no nosso armazém central, e são agendadas de acordo com a disponibilidade de entregas da nossa transportadora na sua região.
Restantes Produtos (Classes de 1 a 6)
As restantes entregas são feitas pela transportadora E…, entregues nos 2 a 3 dias seguintes após a realização da encomenda, salvo em casos excecionais de ruturas de stock ou pagamentos não autorizados.”
20) No documento referido em 17), a Cláusula 8. passou a ter a seguinte redacção:
“8 – Devoluções e Direito de livre resolução do contrato
• Direito de livre resolução – O consumidor dispõe de um prazo de 14 dias, a contar do dia em que adquira a posse física dos bens ou do dia em que adquira a posse física do último bem, no caso de vários bens encomendados numa única encomenda e entregues separadamente, para proceder à devolução da sua encomenda, e sem necessidade de indicar o motivo, de acordo com o disposto no nº 1 do artigo 10º do DL nº 24/2014, de 14 de fevereiro.
Caso assim entenda o consumidor pode preencher e enviar via eletrónica o modelo de formulário de livre resolução ou qualquer outra declaração inequívoca de resolução.
Pode fazê-lo desde que o artigo se encontre nas mesmas condições em que foi vendido, em embalagem original e acompanhado de todos os acessórios que o constituem.
Poderá faze-lo de duas maneiras:
1. Dirigir-se a uma loja física da B…, apresentando a fatura e guia de transporte correspondente e o comprovativo de identificação (Cartão do Cidadão).
2. Contactar a nossa Linha de Apoio ……… (linha Azul – preço de chamada local) para informações sobre procedimentos de envio.
Nota: Nunca expedir o artigo para a B… sem contacto prévio com a Linha de Apoio ……… (linha Azul – preço de chamada local).
Condições da Devolução:
1. Artigos sem sinal de uso indevido e cuja manipulação em caso algum exceda a que habitualmente é admitida num estabelecimento comercial.
2. Devolução do artigo completo, com todos os seus componentes e acessórios, manual de instruções e embalagens originais em perfeito estado.
3. Prazo de Devolução: Até ao 14º dia consecutivo, a partir do dia da entrega, nos termos do disposto no número 1 do artigo 10.º do Decreto-Lei 24/2014, de 14 de Fevereiro.
Reembolso: No caso de devolução, o reembolso do valor da sua compra será efetuado através do mesmo meio de pagamento que foi utilizado pelo consumidor na compra inicial e que não comporte custos para o consumidor, após a validação do cumprimento das condições de devolução descritas anteriormente, tendo a B… um prazo de até 14 dias para o efeito.
O consumidor deve devolver os bens o mais tardar 14 (catorze) dias a contar da data em que informou a B… da decisão de resolução do contrato, tendo que suportar os custos da devolução dos bens.
Ficam excluídos do direito de resolução do contrato, não podendo o consumidor resolver livremente os seguintes contratos de:
- Fornecimento de bens confecionados de acordo com especificações do consumidorou manifestamente personalizados;
- Fornecimento de bens que, por natureza, não possam ser reenviados ou sejam suscetíveis de se deteriorarem ou de ficarem rapidamente fora de prazo;
- Fornecimento de bens selados não suscetíveis de devolução, por motivos de proteção da saúde ou de higiene quando abertos após a entrega;
- Fornecimento de bens que, após a sua entrega e por natureza, fiquem inseparavelmente misturados com outros produtos;
- Fornecimento de gravações áudio ou vídeo seladas ou de programas informáticos selados, a que o consumidor tenha retirado o selo de garantia de inviolabilidade após a entrega;
- Fornecimento de jornal, periódico ou revista, com exceção dos contratos de assinatura para o envio dessas publicações.”
21) No documento referido em 17), a Cláusula 11. passou a ter o seguinte teor: “A B… não é responsável pelos prejuízos decorrentes de quaisquer vírus informáticos ou quaisquer outras situações a que seja alheia que impeçam o acesso e correto funcionamento do domínio www.B....pt bem como dos serviços disponibilizados no mesmo.”.
22) No documento referido em 17) não consta qualquer cláusula a fixar qualquer competência territorial para eventuais litígios futuros.
Factos Não Provados
Não se provaram quaisquer outros factos dos alegados nos articulados, nomeadamente e com interesse para a decisão da causa, que:
a) A R. não exige a aceitação dos Termos referidos em 5) dos factos provados para a concretização de qualquer negócio.

3. Do mérito do recurso
O objecto do recurso, delimitado pelas conclusões das alegações (artigo 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1 CPC), salvo questões do conhecimento oficioso não transitadas (artigos 608.º, n.º 2, in fine, e 635.º, n.º 5, CPC), consubstancia-se na seguintes questões:
— impugnação da matéria de facto;
— (in)existência de contrato de adesão;
— inutilidade superveniente da lide;
— nulidade das cláusulas;
— publicidade da decisão.
3.1. Da impugnação da matéria de facto
São os seguintes os factos provados objecto de impugnação:
6) A utilização do sítio da R., bem como a aquisição por parte de qualquer utilizador dos bens e serviços propostos pela R., implica a aceitação obrigatória do teor do conteúdo do documento denominado “Termos de Uso”.
7) O referido documento não contém quaisquer espaços em branco para serem preenchidos pelos contratantes que, em concreto, acedam ao website “B…” e que pretendam adquirir um produto ali anunciado para compra, efectivando-se a ordem de compra com a aceitação das condições constantes deste documento, que os contratantes não podem alterar.
Foi ainda impugnado o facto não provado:
a) A R. não exige a aceitação dos Termos referidos em 5) dos factos provados para a concretização de qualquer negócio.
A 1.ª instância motivou assim a sua convicção:
A factualidade considerada provada em 1) a 5) e 8) a 16) resultou do acordo das partes vertido nos articulados, conjugado com o teor do documento a que nela se faz referência e com a certidão permanente junta como documento n.º 1 junto com a petição inicial.
No que se refere à factualidade considerada provada em 6) e 7) e considerada não provada, a mesma resultou da aceitação expressa da R. através de requerimento junto as autos após designação de data para a realização da audiência final.
Insurge-se a apelante contra a matéria de facto supra enunciada, alegando tratar-se de matéria de facto carecida de prova por ter sido objecto de impugnação nos artigos 5.º a 30.º da contestação.
Aí aceita que oferece um clausulado para a integração das vendas online por si realizadas, e que o referido clausulado terá que ser aceite para que o processo de venda possa prosseguir.
No entanto, afirma que as testemunhas C… e D…, após explicarem esse procedimento, referiram que isso não significa que, caso algum cliente entenda não aceitar alguma daquelas condições, que não negoceie com o mesmo os termos da venda a efetuar e a realize em diferentes condições das inicialmente propostas.
Concluiu que, não tendo sido produzida qualquer prova que contrarie que as condições de venda online não são imutáveis e está ao alcance dos utilizadores do website da apelante alterar as mesmas, caso, naturalmente, atcuem nesse sentido. A prova testemunhal ou documental produzida no âmbito dos presentes autos, a matéria de facto constante dos pontos 6 e 7 dos factos provados, não deveria ser dada por provada e o ponto único da matéria de facto não provada não poderia ser dado por não provado.
Apreciando:
Não se compreende o alcance da impugnação da matéria de facto face à posição tomada através de requerimento da apelante apresentado em 11.05.2017, onde declara expressamente aceitar que exige que os clientes aceitem os “Termos de uso” para que possam realizar as aquisições, e que não podem alterar as condições.
O que, aliás, constitui a fundamentação da 1.ª instância para essa matéria.

Assim, a apelante incorre num admissível venire contra factum proprium.

Sempre se dirá que a alegada disponibilidade da apelante para negociar alguma(s) das cláusulas em apreço em nada contribui para alterar a matéria de facto em apreço.
Com efeito, trata-se de uma mera declaração da apelante, sem qualquer expressão no referido sítio, designadamente sem qualquer informação aos potenciais clientes de que podem negociar qualquer das cláusulas propostas.
Ora, é muito pouco dizer que está disponível para negociar as cláusulas mediante iniciativa da contraparte se esta não tem conhecimento dessa disponibilidade, tanto mais que é convicção generalizadas daqueles que contratam online que essa disponibilidade não existe.
Assim, como se refere no acórdão do STJ, de 14.12.2016, Fonseca Ramos,
www.dgsi.pt.jstj, proc. n.º 20054/10.0T2SNT.L2.S1,
Se a negociação individualizada se faz por condescendência do predisponente, não constando no bloco normativo que elaborou, o direito do aderente poder influir no conteúdo contratual, não vale para um universo indeterminado de contratantes, não assumindo, sequer, relevo a possibilidade de influir na negociação de cláusulas que para o consumidor ou aderente não representam senão aspectos secundários do seu interesse.

Afirma ainda a apelante que a prova testemunhal ou documental produzida no âmbito dos presentes autos, não permite, de forma alguma, que se chegue às conclusões plasmadas no ponto 6 dos factos dados por provados.
Sem razão, porém.
Seguindo o acórdão da Relação de Coimbra, de 20.11.2012, Freitas Neto, www.dgsi.pt.jtrc, proc. 972/10.7TBLSA.C1,
Todavia, sempre se dirá que a característica da inserção em formulário ou num modelo pré-elaborado e impresso do conjunto das cláusulas determinantes da vontade negocial das partes leva naturalmente a que o intérprete presuma a sua não negociabilidade, devendo essa configuração levar à qualificação do contrato como de adesão.
É certo que o nº 3 do já aludido art.º 1º do DL 446/85 estatui que “O ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo”.

Improcede, pois, a impugnação da matéria de facto.

3.2. Da (in)existência de contrato de adesão
A apelante pretendia subtrair as cláusulas em discussão ao regime das cláusulas contratuais gerais estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, afastando a característica da rigidez que as caracteriza através da alteração da matéria de facto.
Não tendo logrado tal alteração, fica demonstrado que A utilização do sítio da R., bem como a aquisição por parte de qualquer utilizador dos bens e serviços propostos pela R., implica a aceitação obrigatória do teor do conteúdo do documento denominado “Termos de Uso”, e que O referido documento não contém quaisquer espaços em branco para serem preenchidos pelos contratantes que, em concreto, acedam ao website “B…” e que pretendam adquirir um produto ali anunciado para compra, efectivando-se a ordem de compra com a aceitação das condições constantes deste documento, que os contratantes não podem alterar.
Assim, as cláusulas em apreço, caracterizadas pela pré-elaboração, rigidez e generalidade estão sujeitas à disciplina do Decreto-Lei n.º 446/85, cujo artigo 1.º, n.º 1, dispõe:
As cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respectivamente, a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente diploma.
Também este segmento do recurso está votado ao insucesso.
3.3. Da inutilidade superveniente da lide
Escreveu-se na sentença recorrida, após concluir pela nulidade das cláusulas em apreço:
Contudo, conforme resulta da factualidade provada em 17) a 22), a R., atento o teor da petição inicial, diligenciou no sentido de elaborar um novo documento para substituir o referido em 5) da factualidade provada, tendo procedido a tal alteração no seu próprio sítio na internet antes da apresentação da contestação, conforme documento que juntou com aquele articulado sob o nº 1 denominado “Informação pré-contratual/Condições gerais de utilização do site”.
Nesse novo documento, conforme resulta da referida factualidade, a R. alterou o teor de todas as cláusulas que supra se consideraram nulas, expurgando da sua redacção todo o teor violador das normas supra elencadas e/ou complementando o seu teor por forma a já não violaram essas disposições legais.
Defende a R. que, por essa razão, estamos perante uma inutilidade superveniente da lide.
Como se afirma no Ac. do S.T. J. de 16/10/2018, proc. nº 3082/05.5TJLSB.S1, disponível em www.dgsi.pt, cujo entendimento subscrevemos,
“O artigo 25.º do Decreto - Lei n.º 446/85, de 25 de outubro, diploma que aprovou o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais, consagra a ação inibitória nos seguintes termos:
“As cláusulas contratuais gerais, elaboradas para utilização futura, quando contrariem o disposto nos artigos 15.º, 16.º, 18.º, 19.º, 21.º e 22.º, podem ser proibidas por decisão judicial, independentemente da sua inclusão efectiva em contratos singulares”.
Este tipo de ação tem um escopo preventivo (neste sentido Araújo de Barros, Cláusulas Contratuais Gerais – DL. 446/85 – Anotado, Coimbra, 2010, pág. 373). (…) não parece que a utilidade deste tipo de ações se alcance satisfatoriamente com a prova de que o predisponente não mais usou e não pretende usar as cláusulas tidas por proibidas e nulas (…).
Com efeito, mesmo que o predisponente voluntariamente altere ou deixe de utilizar as cláusulas sindicadas na ação inibitória, o interesse social próprio das ações inibitórias, a invocação do caso julgado por terceiros para obstar ao uso da cláusula declarada inválida ou outras que se equiparem substancialmente, e o risco, ainda que abstrato, de poderem tais cláusulas ser novamente utilizadas, só se logram cumpridos e evitado, respetivamente, por via da sentença de mérito que declare a nulidade dessas mesmas cláusulas e não por mera ocorrência do seu não uso (presente).
Com efeito, pode encontrar-se utilidade no prosseguimento da ação para apreciação da validade de cláusulas anteriormente utilizadas, na medida em que foram celebrados contratos individuais ao abrigo das mesmas e por ocorrer a possibilidade de serem as mesmas cláusulas ou cláusulas substancialmente equiparáveis novamente utilizadas.
Para esta conclusão, concorre, desde logo, a interpretação que, segundo entendemos, melhor se adequa ao teor dos artigos 25.º, 30.º e 32.º do RCCG, segundo os quais a ação inibitória visa, por um lado, a proibição de utilização de cláusulas proibidas em contratos que sejam ou venham a ser celebrados e, por outro lado, erradicar do tráfico jurídico condições gerais iníquas, independentemente da sua inclusão em contratos singulares, assim se protegendo não só o contratante singular mas a verdadeira autonomia privada (…).
Assim, vislumbra-se, no primeiro sentido, interesse ou utilidade no prosseguimento da presente ação tendo em vista acautelar a inclusão das cláusulas que venham a ser consideradas nulas ou outras que substancialmente se lhes equiparem (cfr. artigo 32.º, n.º 1 do RCCG) em contratos que o predisponente venha a celebrar ou a recomendar que sejam utilizadas.
Daí que, na perspetiva de Araújo de Barros (ob. cit, págs. 388 e 390), atentas as particularidades próprias do efeito de caso julgado na ação inibitória que é qualificado como um caso julgado secundum eventum litis (o caso julgado favorável aproveita a terceiro, o caso julgado desfavorável é-lhe inoponível), deve concluir-se que “a simples correcção ou supressão de cláusula por parte do demandado na acção fica aquém do que se pretende com a condenação proibitiva, que se estende a todos os contratos que o demandado venha a celebrar ou a recomendar” (cfr. Cláusulas Contratuais Gerais - DL 446/85 Anotado, Coimbra Editora, págs. 388 e 390).
De forma mais abrangente, pode também inferir-se da posição adoptada pelo Professor Carlos Ferreira de Almeida a respeito da natureza jurídica das cláusulas contratuais gerais, que eventuais alterações introduzidas nos contratos que o predisponente celebre não terão relevância no que se refere à matéria objeto da ação inibitória. Conforme explica o referido autor, as cláusulas contratuais gerais são meros enunciados contratuais gerais, ou seja, enunciados com vocação para se integrarem numa pluralidade de contratos, sendo certo que antes da sua inserção em contratos singulares não são ainda cláusulas contratuais propriamente ditas. No entanto, o facto de ainda não terem sido incluídas em ontratos singulares, não implica que não tenham eficácia jurídica, nomeadamente, por já estarem sujeitas a controlo jurisdicional através da ação inibitória (cfr. Contratos I – Conceito, Fontes e Formação, Almedina, 3.ª Edição, pág. 169).
O Supremo Tribunal de Justiça também vem decidindo não retirar utilidade à ação inibitória o facto posterior do não uso pelo predisponente das cláusulas visadas na ação. - cfr. Acórdãos de 26 de fevereiro de 2015; 13 de novembro de 2014; 21 de fevereiro de 2013; 8 de maio de 2013; 14 de novembro de 2013; 19 de abril de 2012: 14 de abril de 2011; 31 de maio de 2011.
Atento todo o exposto, (…) existe utilidade no prosseguimento da ação inibitória na situação em que as cláusulas foram retiradas ou não são usadas pelo predisponente atenta a função social da ação, o efeito do caso julgado e a prevenção do risco de utilização futura, a decisão de inutilidade superveniente e consequente absolvição da instância deve ser revogada e substituída por outra que conheça do mérito da ação.”
Em face do exposto, mesmo considerando a factualidade considera provada em 17) a 22), entendemos que não se ocorre inutilidade superveniente da lide.
Entende a apelante que a as alterações levadas a cabo nas cláusulas em apreço, em termos que não merecerem reparos do apelado, esvazia por completo o fundamento da petição inicial, consubstanciando uma inutilidade superveniente da lide.
Relativamente à utilidade no prosseguimento da ação para apreciação da validade de cláusulas anteriormente utilizadas, na medida em que foram celebrados contratos individuais ao abrigo das mesmas, questiona por que tal matéria de facto — existência de contratos celebrados ao abrigo das cláusulas impugnadas — não sendo dada por provada, é utilizada para decidir uma das excepções alegadas pela apelante.
Apreciando:
Tal como a 1.ª instância, subscrevemos integralmente o acórdão do STJ, de 16.10.2018, www.dgsi.pt.jtsj, proc. nº 3082/05.5TJLSB.S1, que aborda de forma clara e incisiva a problemática da inutilidade da lide por via da alteração do teor das cláusulas impugnadas.
Não assiste razão à apelante ao se insurgir contra a decisão com o argumento de que é inadmissível que a sua pretensão relativa à inutilidade da lide seja afastada devido à inclusão dessas cláusulas em contratos singulares quando não se provou que tenham sido celebrados contratos ao abrigo das cláusulas impugnadas.
Com efeito, a acção inibitória reconduz-se a um controle abstracto da legalidade das cláusulas contratuais gerais, não estando a sua sindicância dependente da inclusão em contratos singulares, bastando essa possibilidade.
De todo o modo, muito se estranharia que uma entidade com a dimensão da apelante não tivesse celebrado contratos singulares ao abrigo das cláusulas aqui em apreço.
Independentemente da discussão — estéril — de saber se existem contratos em vigor que eventualmente tenham sido celebrados ao abrigo das cláusulas impugnadas, há outro fundamento que justifica a não extinção da instância por inutilidade superveniente da lide: a formação de caso julgado que impeça a reutilização futura dessa cláusula ou outras de teor semelhante.
Como se sublinha no acórdão do STJ, de 19.09.2006, João Camilo, www.dgsi.pt.jstj, proc. n.º 06A2616, … apesar de se haver provado que desde 7/04/94 a recorrente já não celebra contratos com conteúdo idêntico ao aqui em causa e que já não existiam contratos celebrados com aquele conteúdo ainda por cumprir, à data da propositura da presente acção, tal não obsta teoricamente a que a ré possa voltar a celebrar contratos com aquele conteúdo, se a presente instância se extinguir, pois sem a condenação desta acção, nada a inibe legalmente a fazê-lo.
É que só com a decisão judicial decretadora da inibição, transitada em julgado, é que é possível garantir que a ré não voltará a inserir tais cláusulas em contratos futuros.
Daí que a presente acção mantenha interesse, não se tendo desaparecido o interesse da pretensão do autor, de modo a fazer extinguir a instância nos termos do art. 287º al. e).
A decretar-se a inutilidade da lide, a apelante poderia recuperar as cláusulas impugnadas, sem que se pudesse aplicar a sanção pecuniária prevista no artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 446/85, cujo n.º 1 dispõe o seguinte:
Se o demandado, vencido na acção inibitória, infringir a obrigação de se abster de utilizar ou de recomendar cláusulas contratuais gerais que foram objecto de proibição definitiva por decisão transitada em julgado, incorre numa sanção pecuniária compulsória que não pode ultrapassar o valor de (euro) 4987,98 por cada infracção.
Improcede, pois, este segmento do recurso.
3.4. Da nulidade das cláusulas
Importa agora analisar a (i)legalidade das cláusulas 3.ª e 8.ª, §§ 5.º e 8.º dos Termos de Uso.
Cláusula 3.ª
Escreveu-se na sentença recorrida:
Cláusula 3, sob a epígrafe “Alteração das presentes Condições”, do clausulado “Termos de Uso” – Documento supra referido em 5):
“A B…, S.A., reserva-se o direito de modificar unilateralmente e em qualquer momento, sem aviso prévio, a apresentação e conteúdo do sítio Web, seus serviços e as condições gerais de utilização. Essas modificações servirão para uma melhoria do website, melhorando simultaneamente os serviços oferecidos ao utilizador do website.”.
Alega o A. que esta cláusula é abusiva, porque confere à ré o poder de, a todo o momento, de forma unilateral e sem necessidade de qualquer fundamento ou justificação, baseada apenas na sua própria conveniência, alterar ou modificar os produtos disponíveis, os respectivos preços e as condições e/ou especificações apresentadas, ao que acresce que a ré não consagra qualquer cláusula de ressalva relativamente aos contratos que se encontrem já em vigor e em execução, aplicando-se tais alterações de forma imediata, após a sua publicação no site, excepto no que respeita aos preços dos produtos, pois nos termos do disposto no segundo parágrafo da cláusula 5. 2, sob a epígrafe “Informação de Preços”, a ré reitera poder alterar os preços em qualquer momento, mas compromete-se a aplicar as taxas e preços indicados no momento da realização do pedido de compra.
Contrapõe a R. que a redacção desta cláusula diz respeito única e exclusivamente ao sitio na internet da Ré e ao seu aspecto e/ou funcionalidades, não pretendendo, de forma alguma, significar que a Ré pudesse unilateralmente modificar condições contratuais, muito menos de contratos já validamente celebrados e em execução.
Contudo, mesmo que essa fosse a intenção da R., do teor da cláusula em apreço não resulta que a modificação nele aludida respeite exclusivamente ao aspecto e/ou funcionalidades do sitio da R. na internet, uma vez que, para além de se referir à “apresentação”, faz também expressa menção ao “conteúdo do sítio Web, seus serviços e as condições gerais de utilização” e deles fazem parte os “Termos de Uso” em causa nestes autos.
Ora, como refere o A., decorre do art.º 32.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 7/2004, de 07/01, a oferta de produtos ou serviços em linha representa uma proposta contratual quando contiver todos os elementos necessários para que o contrato fique concluído com a simples aceitação do destinatário, pelo que, sempre que o utilizador/consumidor preenche o formulário de compra disponibilizado pela ré no seu site, o mesmo aceita expressamente a proposta contratual por aquela apresentada, celebrando-se, desta forma, entre o utilizador/consumidor e a ré um contrato de compra e venda à distância, nos termos do art.º 3.º, alínea f), do Decreto- Lei n.º 24/2014, de 14/02.
Assim, atento o teor da cláusula em apreço e verificando-se a ausência na mesma, ou noutras cláusulas dos “Termos de Uso” ou nas informações prestadas no site, de qualquer ressalva relativamente aos contratos que se encontrem em vigor e em execução, as modificações que a ré efectuar, ao abrigo desta cláusula, a qualquer momento, são imediatamente aplicáveis a todos os contratos em vigor, podendo o utilizador/consumidor vir até a ser confrontado, após a sua compra, com uma alteração das especificações do produto, das condições comerciais e dos serviços, efectuada pela ré, sem necessidade de qualquer justificação ou pré-aviso, e sem que ao mesmo seja concedida a possibilidade de resolver o contrato ou de solicitar qualquer compensação ou indemnização.
Assim sendo, a presente cláusula é proibida, por violação do disposto na alínea c) do n.º 1 do art.º 22.º do RJCCG, uma vez que atribui à predisponente ré o direito de alterar unilateralmente os termos do contrato, a qualquer momento, com base na sua própria conveniência e sem que ao consumidor seja dada a possibilidade de resolução do contrato ou de solicitar qualquer reembolso, compensação ou indemnização, e, consequentemente, é nula, em conformidade com o disposto no art.º 12.º daquele diploma legal.
É, ainda proibida, por violar valores fundamentais do direito, defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos art.ºs 15.º e 16.º, ambos do RJCCG, uma vez que cria um desequilíbrio na relação contratual estabelecida entre a predisponente ré e o utilizador/consumidor, colocando este à mercê do arbítrio daquela, perante a possibilidade conferida por esta cláusula de a ré poder, a todo o momento e de forma unilateral, alterar os termos do contrato, ou mesmo revoga-lo.
Segundo a apelante, esta cláusula dizia respeito única e exclusivamente ao seu sítio na internet e ao seu aspecto e/ou funcionalidades, não pretendendo, de forma alguma, significar que pudesse unilateralmente modificar condições contratuais, muito menos de contratos já validamente celebrados e em execução.
Afirma que os termos de uso apenas podem ser alterados unilateralmente e que, de todo o modo, as alterações não poderiam afectar o conteúdo dos contratos já celebrados, pois tais alterações à luz da lei civil jamais teriam qualquer tipo de eficácia retroactiva.
Apreciando:
À interpretação das cláusulas contratuais gerais aplica-se o disposto no artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 446/85, nos termos do qual As cláusulas contratuais gerais são interpretadas e integradas de harmonia com as regras relativas à interpretação e integração dos negócios jurídicos, mas sempre dentro do contexto de cada contrato singular em que se incluam.
Tratando-se de acção inibitória, não logra aplicação a parte final deste normativo, nem o artigo 11.º n.º 2, que estabelece, para as cláusulas ambíguas, o princípio da prevalência do sentido mais favorável ao aderente, por implicarem a inserção das cláusulas contratuais gerais em contratos singulares.
Assim, à interpretação das cláusulas em apreço aplicam-se as regras do artigo 236.º e ss. CC, fazendo-se apelo à figura do declaratário normal.
Ora, um declaratário normal, colocado perante a cláusula em apreço, entenderia que à apelante estava a ser dada a possibilidade de alterar unilateralmente os termos do contrato já em execução.
Não basta dizer que isso não seria consentâneo com a lei civil, pois o que está em causa é precisamente a invalidade da cláusula por violação da lei.
E não deixa de ser sintomático que, no que aos preços concerne, o § 2.º da cláusula 5. 2 permita à apelante alterar os preços em qualquer momento, mas esta compromete-se a aplicar as taxas e preços indicados no momento da realização do pedido de compra.
A argumentação da apelante não invalida o acerto da decisão da 1.ª instância relativamente a esta cláusula.
Cláusula 8.ª, §5.º
Escreveu-se na sentença recorrida:
Parágrafo quinto da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”, do clausulado “Termos de Uso” – Documento supra referido em 5):
“1. Artigos sem sinal de uso indevido”.
Nos termos desta cláusula a ré estabelece que os produtos devolvidos pelo consumidor, na sequência da livre resolução do contrato, têm de se encontrar “sem sinal de uso indevido”, ou a devolução dos mesmos e, consequentemente, a resolução do contrato, não será aceite – vide § 8.º desta cláusula.
Invoca o A. que “artigos sem sinal de uso indevido”, é uma designação demasiado vaga e abstracta, que tem por efeito não permitir, de todo, ao consumidor a utilização dos bens adquiridos, por forma a verificar a sua conformidade, pelo que, a cláusula é nula, por contender com valores fundamentais do direito defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos art.ºs 12.º, 15.º e 16º, do RJCCG, em concreto, por contender com lei imperativa, como é o caso dos art.ºs 14.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei nº 24/2014, de 14-02, na parte em que condiciona o exercício do direito de livre resolução do consumidor à circunstância de este não utilizar, de forma efectiva, o bem a devolver - sendo também nula nos termos do art.º 294.º do Código Civil.
Contrapõe a R. que a Cláusula 8. diz respeito, em suma, ao modo de exercício do direito de livre resolução por parte do adquirente, nada tendo que ver com o exercício de direitos resultantes, designadamente, do regime legal de garantia na venda de bens de consumo ou resultantes do regime da venda de coisa defeituosa, e que a condição imposta (de que, para o exercício do direito de livre resolução, o bem em causa não pode apresentar sinais de utilização indevida) não só é razoável, como está em plena conformidade com o estatuído no n.º 3 do art.º 13.º do Decreto-Lei 24/2014 que prevê que “O consumidor deve conservar os bens de modo a poder restituí-los nas devidas condições de utilização, no prazo previsto no n.º 1, ao fornecedor ou à pessoa para tal designada no contrato.” Acrescenta ainda o n.º 2 do art.º 14.º do citado Decreto-Lei que: “O consumidor pode ser responsabilizado pela depreciação do bem, se a manipulação efetuada para inspecionar a natureza, as características e o funcionamento desse bem exceder a manipulação que habitualmente é admitida em estabelecimento comercial.”
Assim, afirma a R. que não só é lógico como decorre da boa-fé negocial que, se um determinado cliente se arrepende da compra que fez e exerce o seu direito de livre resolução não possa danificar o bem impedindo a sua futura comercialização.
Dispõe o art.º 10.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 24/2014 de 14-02, respeitante aos contratos celebrados à distancia e fora do estabelecimento comercial, que, no prazo de 14 dias, contados desde que o comprador adquire a posse física dos bens adquiridos, no caso de ser celebrado contrato de compra e venda, aquele pode livremente e sem necessidade de indicar motivo, resolver o contrato e proceder à devolução dos bens adquiridos num prazo de 14 dias a contar da data em que tiver comunicado a decisão de resolução do contrato – art.º 13.º do Decreto-Lei n.º 24/2014.
Conforme decorre do art.º 14.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 24/2014, de 14-02, o exercício do direito de livre resolução não prejudica o direito de o consumidor inspeccionar, com o devido cuidado, a natureza, as características e o funcionamento do bem, podendo o consumidor, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito legal, ser responsabilizado pela depreciação do bem, se a manipulação efectuada para inspeccionar a natureza, as características e o funcionamento desse bem exceder a manipulação que habitualmente é admitida em estabelecimento comercial.
Como acima se referiu, invoca o A. que a cláusula agora em apreço impõe ao consumidor, na sequência da livre resolução do contrato, a devolução de “artigos sem sinal de uso indevido”, mas que tal é uma designação demasiado vaga e abstracta, que tem por efeito não permitir, de todo, ao consumidor a utilização dos bens adquiridos, por forma a verificar a sua conformidade.
O diagnóstico do caráter abusivo de uma cláusula pressupõe a prévia determinação do seu sentido, ou seja, a sua interpretação. A este respeito estipula o art.º 5.º da Directiva 93/13/CEE que “No caso dos contratos em que as cláusulas propostas ao consumidor estejam, na totalidade ou em parte, consignadas por escrito, essas cláusulas deverão ser sempre redigidas de forma clara e compreensível. Em caso de dúvida sobre o significado de uma cláusula, prevalecerá a interpretação mais favorável ao consumidor. Esta regra de interpretação não é aplicável no âmbito dos processos previstos no n.º 2 do artigo 7.º [processos como o destes autos, que tenham em vista pôr termo à utilização de cláusulas abusivas]”.
Assim, no que concerne às cláusulas ambíguas, em que “na dúvida, prevalece o sentido mais favorável ao aderente” (n.º 2 do art.º 11.º da LCCG), tal regra de interpretação não é aplicável no âmbito das ações inibitórias (n.º 3 do art.º 11.º da LCCJ, aditado pelo Dec.-Lei n.º 249/99, de 7.7).
Como diz Almeno de Sá (Cláusulas Contratuais Gerais e Directiva Sobre Cláusulas Abusivas, Almedina, 2.ª edição, 2005, pág. 40) “… se se optasse, na acção inibitória, pela variante de sentido directamente mais favorável ao cliente, correr-se-ia o risco de não poderem ser combatidas, pela via do controlo abstracto, cláusulas intrinsecamente abusivas, prejudiciais ao cliente, tão só porque, na interpretação imediatisticamente mais vantajosa para a contraparte do utilizador, não ultrapassariam os limites da não-contrariedade à boa-fé, tal como resultam dos artigos 15.º e seguintes da lei das cláusulas contratuais gerais…”. Assim, “dada a função preventiva deste tipo de controlo, a solução correcta traduzir-se-á em partir, face a uma cláusula ambígua, da variante de sentido mais prejudicial ao cliente, a fim de determinar se, com tal sentido, a cláusula “resiste” o controlo do conteúdo. Com isto se conseguirá uma mais eficaz e substantivamente mais justa aplicação das normas que regulam a fiscalização do conteúdo” (obra citada, pág. 41).
Assim, temos que subscrever a posição do A. quando afirma que a designação “artigos sem sinal de uso indevido”, é uma demasiado vaga e abstracta, podendo, por isso, ser-lhe atribuído o sentido de não permitir ao consumidor a utilização dos bens adquiridos, por forma a verificar a sua conformidade e, nessa justa medida, a cláusula sindicada é nula, por contender com valores fundamentais do direito defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos art.ºs 12.º, 15.º e 16º, do RJCCG, em concreto, por contender com lei imperativa, como é o caso dos art.ºs 14.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei nº 24/2014, de 14-02, sendo também nula nos termos do art.º 294.º do Código Civil.
Relativamente a este segmento da sentença, apelante manifesta a sua discordância quanto à qualificação da expressão “utilização indevida” como de carácter pouco concreto, quando a mesma é utilizada no n.º 3 do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 24/2014 ao dispor que O consumidor deve conservar os bens de modo a poder restituí-los nas devidas condições de utilização, no prazo previsto no n.º 1, ao fornecedor ou à pessoa para tal designada no contrato.
Acrescenta que o n.º 2 do artigo 14.º do citado diploma estabelece que O consumidor pode ser responsabilizado pela depreciação do bem, se a manipulação efetuada para inspecionar a natureza, as características e o funcionamento desse bem exceder a manipulação que habitualmente é admitida em estabelecimento comercial.
Ora, o simples confronto da cláusula em apreciação com os termos das disposições legais acabadas de transcrever permite concluir pelo bem fundado da decisão recorrida.
É óbvio que o cliente não pode danificar o bem, mas a expressão uso indevido pode incutir no consumidor a percepção de que o manuseamento para aferir do funcionamento do bem impede o exercício do direito à livre resolução.
A decisão recorrida não merece censura neste segmento.

Cláusula 8.ª, §8.º
Escreveu-se na sentença recorrida:
Parágrafo oitavo da cláusula 8., sob a epígrafe “Devoluções”, do clausulado “Termos de Uso” – Documento supra referido em 5):
“Reembolso (Aplicável em compras em B….pt) No caso de devolução, o reembolso do valor da sua compra será efectuado após a validação do cumprimento das condições de devolução descritos anteriormente, tendo a B… um prazo de até 14 dias para o efeito.”.
Invoca o A. que esta cláusula viola de forma expressa a disposição imperativa constante do art.º 12.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 24/2014, de 14-07, já que o que resulta da letra da cláusula é uma imposição pela ré de que o reembolso a efectuar ao consumidor seja feito sempre através de um crédito a utilizar em compras no site da ré, desrespeitando a norma legal e não especificando ser tal crédito uma possibilidade de acordo com o consumidor quanto a uma modalidade diversa de pagamento a este do reembolso devido.
Contrapõe a R. que não consegue perceber o que fez o A. concluir que os reembolsos efectuados a clientes da Ré na sequência do exercício do direito de livre resolução são feitos através de um crédito a utilizar em compras no sítio na internet da Ré, que não são, que imagina que a confusão do A. resulte da informação que se encontra entre parêntesis no início do parágrafo e que refere “aplicável em compras em B….pt” mas que aquilo que se pretendia significar era, em suma, que as condições de reembolso que de seguida se enunciam, apenas seriam aplicáveis a reembolsos feitos na sequência do exercício do direito de livre resolução que, naturalmente, apenas existe quando os negócios são efectuados à distância. Isto porque, além do direito de livre resolução, a Ré tem uma política comercial de satisfação devolução nas suas lojas físicas que se traduz na possibilidade de, nos primeiros quinze dias após a aquisição de determinados produtos, proceder, sem necessidade de justificação, à devolução do mesmo, beneficiando de um crédito em cartão ou vale do montante pago pelo produto em questão. Daí a necessidade da Ré ressalvar que o que ali vai dito apenas tem aplicação às compras realizadas através do seu sítio na internet.
Nos termos desta cláusula a ré refere-se ao reembolso devido ao consumidor em caso deste exercer o seu direito de livre resolução do contrato e correspondente ao montante pago pelo mesmo na aquisição do produto que foi devolvido.
Dando aqui novamente por reproduzidas as considerações que acima se explanaram quanto diagnóstico do caráter abusivo de uma cláusula, não constando da cláusula em apreço qualquer outra menção à forma do reembolso para além do que consta logo a seguir a designação reembolso, “aplicável em compras no site B….pt”, é manifesto que estamos perante uma cláusula ambígua – tanto pode ter o sentido que lhe é atribuído pelo A., como ter o sentido que lhe é atribuído pela R. – pelo que se impõe partindo pela variante de sentido mais prejudicial ao cliente, ou seja, de que o reembolso a efectuar ao consumidor será feito sempre através de um crédito a utilizar em compras no site da ré.
Assim sendo, esta cláusula viola de forma expressa a disposição imperativa constante do art.º 12.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 24/2014, de 14-07, que dispõe que: “O reembolso dos pagamentos deve ser feito através do mesmo meio de pagamento que tiver sido utilizado pelo consumidor na transacção inicial, salvo acordo expresso em contrário e desde que o consumidor não incorra em quaisquer custos como consequência do reembolso.”.
Pelo exposto, esta cláusula é nula, por contender com valores fundamentais do direito defendidos pelo princípio da boa-fé, nos termos dos art.ºs 12.º, 15.º e 16.º, do RJCCG, em concreto por contender com lei imperativa - sendo também nula nos termos do art.º 294.º do Código Civil.
Relativamente a este segmento, a apelante limita-se a afirmar que as extrapolações levadas a cabo pela 1.ª instância, além de ilegítimas, carecem de fundamento de facto que as suporte.
Diz que a 1.ª instância considerou que a redacção ambígua da cláusula determinava a sua nulidade sem, porém, considerar os esclarecimentos a este propósito por si prestados.
Que nunca fez — pelo menos sem o acordo dos seus clientes— qualquer reembolso em crédito para gastar futuramente em aquisições nas suas lojas físicas ou online.
Regressamos à questão da interpretação da clausula questionada.
Para um declaratário normal, a expressão “Reembolso (aplicável em compras B….pt)” significa que a quantia a reembolsar será aplicada em compras no sítio da apelante.
Não colhe a explicação da apelante que aquilo que se pretendia significar era que aquelas condições de reembolso apenas seriam aplicáveis a reembolsos feitos na sequência do exercício do direito de livre resolução que, naturalmente, apenas existe quando os negócios são efectuados à distância.
Com efeito, essa explicação não faz sentido porque todas as cláusulas dos Termos de Uso se reportam a negócios feitos à distância, não fazendo qualquer sentido que essa referência se destinasse a esclarecer que aquela condição não se aplicava às lojas físicas. Nem aquela nem quaisquer outras daquele clausulado enquanto tal.
E a prova de que assim é — que o reembolso deve ser utilizado em compras em B….pt — é que nada mais se prevê relativamente à forma de processamento desse reembolso, v.g., restituição no cartão utilizado para pagamento dessa compra.
Nada a censurar à decisão neste segmento.

3.5. Da publicidade da decisão
Escreveu-se na sentença recorrida:
Quanto à publicidade da sentença, defende a R. que a sua postura processual deve ser valorizada e tida em linha de conta, no que respeita a tal aspecto uma vez que, naturalmente, a publicação em jornais nacionais é negativa para a imagem da Ré, causando-lhe graves prejuízos de imagem.
O art. 30º do RJCCG estatui:
“1. A decisão que proíba as cláusulas contratuais gerais especificará o âmbito da proibição, designadamente através da referência concreta do seu teor e a indicação do tipo de contratos a que a proibição se reporta.
2. A pedido do autor, pode ainda o vencido ser condenado a dar publicidade à proibição, pelo modo e durante o tempo que o tribunal determine.”
Subjacentes à acção inibitória estão interesses de ordem pública, como desde logo, resulta da legitimidade activa conferida ao Ministério Público. Visando a acção inibitória a apreciação abstracta de cláusulas contratuais gerais elaboradas para utilização futura – art. 25º do DL.446/85 – a publicidade, podendo ser imposta ou não na decisão, tem um fim imediato que se exprime na proibição de inclusão em contratos onde constam e em futuros contratos, dirigida ao infractor, fim colimado à protecção do consumidor/aderente que, pela via da publicação da decisão judicial, fica informado e pode fazer a sua opção de modo a não contratar com quem predispõe cláusulas proibidas.
Como se refere no Ac. do Tribunal Constitucional nº 360/2001, publicado no Diário da República n.º 264/2001, Série II de 2001-11-14, “(…) porque se trata de cláusulas contratuais gerais, destinadas a um círculo de sujeitos indefinidos e abrangente, a decisão só será plenamente eficaz se também tiver a possibilidade de ser levada ao conhecimento dos interessados, não se
tratando de uma sanção em sentido próprio, mas tão-somente de um meio de prevenir os contraentes dos seus direitos, que decorre da publicidade em processo civil”.
Como se pode ler no Ac. S.T.J de 13-11-2014, proc. nº 2475/10.0YXLSB.L1.S1, “(…) esta divulgação pública não tem qualquer caráter sancionatório, não visando naturalmente penalizar a imagem pública da entidade condenada, mas apenas e tão somente transmitir à generalidade dos consumidores/interessados o resultado objetivo da ação e a disciplina jurídica a que passarão a estar inelutavelmente submetidos os contratos de adesão celebrados, mostrando-se plenamente adequada à vertente cívico/social da própria ação inibitória, direcionada para a proteção dos interesses difusos da generalidade dos consumidores/aderentes, informados precisamente dos seus direitos através da publicitação em órgãos de comunicação social, a todos os cidadãos plenamente acessíveis, do resultado final da causa”.
Assim sendo, a postura processual da R. não afasta a necessidade de dar publicidade à decisão, nos termos peticionados pelo A., entendendo-se, contudo, e tendo em consideração que a mesma tem como destinatários a generalidade dos consumidores e que não tem qualquer carácter sancionatório, não ser necessária a publicitação na página da internet da R..
Insiste a apelante que a decisão, uma vez mais, convoca a existência de interessados, isto é, de pessoas que tenham celebrado com ela contratos ao abrigo de tais cláusulas, quando nem tal factualidade foi alegada, nem consta do rol de factos dados como provados na sentença.
Questiona-se por que forma pode o tribunal recorrido falar de a sentença chegar ao conhecimento de potenciais interessados quando, relativamente a esta matéria, nada foi dado por provado.
A fiscalização da legalidade das cláusulas contratuais gerais opera numa dupla vertente: a incidental, vocacionada para contratos singulares em que essas cláusulas tenham sido incluídas
Como observa Ana Prata, Contratos de Adesão e Cláusulas Contratuais Gerais, Almedina, pg. 627,
A publicitação da decisão judicial é um instrumento que pode ter grande impacte no mercado, quer na sua função dissuasora da utilização de cláusulas nulas, quer na vertente pedagógica e de informação dos sujeitos que recorrem a empresas para satisfação de necessidades. G. Alpa (…) acrescenta uma outra vantagem: a de dar a conhecer aos outros tribunais a orientação adoptada quanto a cada cláusula pelo tribunal encarregado da acção, o que promoverá a uniformização jurisprudencial, em princípio em sentido favorável ao aderente (já que as decisões publicitadas serão necessariamente proibitivas, acrescento eu).
Não se ignora o quanto a publicação de informações deste tipo influência o mercado. Talvez tivesse sido preferível conferir ao tribunal competência oficiosa para a iniciativa de dar publicidade às decisões, não tendo restringido a lei a decisão ao pedido do autor. Isto, acompanhado da indicação dos órgãos através dos quais essa publicidade seria veiculada, poderia constituir um instrumento importante de acatamento do regime deste diploma. Os investimentos empresariais em publicidade são bem demonstrativos de quanto as empresas se esforçarão por evitar esta que lhes é desfavorável.
De lamentar é, pois, que a publicitação, por um lado, fique dependente de pedido do autor e, por outro, que o tribunal possa não o atender.”
Seguindo o acórdão da Relação do Porto, de 16.05.2017, Cecília Agante, www.dgsi.pt.jtrp, proc. n.º 3230/16.0T8MAI.P1,
Entende-se que, por essa via, se cria “o efeito de precedente”, que permite conceder a cada decisão inibidora do uso de cláusulas abusivas uma visibilidade que se refletirá no mercado. Vale por dizer que a publicitação das decisões garante a futura conformação do mercado independentemente do controlo e fiscalização judiciais, pois o seu conhecimento gerará o receio da negatividade de a publicitação das decisões condenatórias e convidará as empresas a corrigir e a adequar as condições gerais que incluem nos contratos que apresentam aos seus clientes. Por isso, à ação inibitória subjazem interesses públicos que convocam a publicitação da sentença condenatória para proibir a empresa condenada a incluir em futuros contratos as cláusulas proibidas, mas que também protegem o consumidor/aderente que, pela via da publicação da decisão judicial, fica informado e em condições de recusar adesão a condições gerais que insiram cláusulas dessa natureza. Por isso se vem afirmando que «[A] publicitação da decisão judicial é um instrumento que pode ter grande impacte no mercado, quer na sua função dissuasora da utilização de cláusulas nulas, quer na vertente pedagógica e de informação dos sujeitos que recorrem a empresas para satisfação de necessidades» [Ana Prata, Contratos de Adesão e Cláusulas Contratuais Gerais, Almedina, 2010, pág. 627; in www.dgsi.pt: Ac. do STJ de 09-12-2014, processo 1004/12.6TJLSB.L1.S1.].
Almeno Sá Almeno de Sá, Cláusulas Contratuais Gerais e Directivas Sobre Cláusulas

Abusiva, pg. 119-20, apud acórdão do STJ de 10.07.2012, Serra Batista, www.dgsi.pt.jstj, proc. n.º 1407/10.0TJPRT.P1.S1, justifica assim a necessidade de publicitação das decisões proferidas em acções inibitórias:
Se aliarmos esta institucionalização do registo de cláusulas proibidas à publicitação da sentença condenatória, nos termos fixados pelo tribunal, pode dizer-se que se cria uma espécie de “efeito de precedente”, que vai conferir, de facto, a cada uma das decisões uma força irradiante sobre a globalidade do fenómeno das condições gerais do contrato – não só sobre a fiscalização, em si mesma, das cláusulas, mas também sobre a própria conformação futura das condições que circularão no mercado, independentemente de qualquer “passagem” por um concreto processo judicial. Na verdade, face ao receio da publicidade negativa que sempre resultará da publicação de uma sentença condenatória, as empresas tenderão, em regra, a corrigir ou a ajustar as suas condições gerais, tendo em conta as decisões entretanto proferidas contra outras empresas, eventualmente já publicadas e remetidas ao competente serviço de registo.

Por todo o exposto, a sentença reclama igualmente confirmação neste segmento.,

4. Decisão
Termos em que, julgando a apelação improcedente, confirma-se a decisão recorrida.
Custas pela apelante (artigo 527.º CPC).

Porto, 11 de Janeiro de 2022
Márcia Portela
João Ramos Lopes
Rui Moreira