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CASO JULGADO
AUTORIDADE DE CASO JULGADO
AÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
SERVIDÃO DE PASSAGEM
PRINCÍPIO DA PRECLUSÃO
Sumário
Sumário (elaborado pelo relator – art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil).
1- A exceção dilatória nominada do caso julgado visa o efeito negativo de impedir a instauração de uma ação já anteriormente decidida entre as mesmas partes (do ponto de vista jurídico), por decisão de mérito, transitada em julgado, e pressupõe que entre ambas as ações (a já decidida e a segunda) ocorra identidade de sujeitos, pedidos e causas de pedir. A segunda ação tem de ser a repetição da primeira, já decidida, por decisão de mérito transitada em julgado. 2- A exceção dilatória inominada da autoridade do caso julgado visa o efeito positivo de impor que, uma determinada questão já decidida, numa anterior ação, por decisão de mérito, transitada em julgado, se tenha de impor numa segunda ação, que corra entre as mesmas partes (do ponto de vista jurídico), sempre que essa questão seja suscitada, nessa segunda ação, a título principal ou prejudicial, e quando ambas as ações estejam entre si numa relação de prejudicialidade, de modo que a apreciar-se essa mesma questão, na segunda ação, se viole o caso julgado que cobre a decisão de mérito proferida na primeira ação. 3- Nessa dimensão positiva do caso julgado, ambas as ações têm de estar entre elas numa relação de prejudicialidade, de modo que o decidido, na segunda ação, por decisão de mérito transitada em julgado, contraria/viola o caso julgado que cobre a decisão de mérito proferida na primeira ação, e entre ambas essas ações têm de existir identidade jurídica de sujeitos, mas não tem de existir identidade de pedidos e/ou de causas de pedir. 4- Não ocorre a exceção dilatória inominada da autoridade do caso julgado entre uma ação de reivindicação, em que a aí autora e o seu entretanto falecido marido, arrogando-se proprietários de um prédio e que desse prédio faz parte integrante uma parcela de terreno, por terem adquirido esse direito de propriedade por usucapião, reivindicaram da aí ré essa parcela de terreno, e em que viram essa pretensão a improceder, por decisão de mérito transitada em julgado, e uma segunda ação intentada pela mesma autora contra a mesma ré, em que a primeira, arrogando-se proprietária exclusiva daquele prédio, pretende obter a condenação da ré a reconhecer que sobre aquela parcela de terreno (antes reivindicada) se encontra constituída, por usucapião, uma servidão de passagem, em benefício daquele prédio, uma vez que entre esta segunda ação e a primeira (de reivindicação) não intercede qualquer nexo de prejudicialidade. 5- O princípio da preclusão previsto no art. 573º do CPC aplica-se ao réu, mas não ao autor, pelo que não tendo a ré da ação de reivindicação deduzido reconvenção, pedindo que se reconhecesse que a parcela de terreno reivindicada pela aí autora e pelo entretanto falecido marido desta, era sua propriedade, da circunstância de os neles autores não alegarem que sobre a parcela de terreno (que reivindicaram) se encontrava constituída uma servidão de passagem sobre o prédio, não decorrem quaisquer consequências jurídicas em sede de preclusão e de caso julgado, não impedindo que a autora instaure aquela segunda ação, alegando que sobre essa parcela de terreno, antes reivindicada, se encontra constituída, por usucapião, uma servidão de passagem em benefício daquele prédio (que era objeto da ação de reivindicação), mas de que agora se arroga proprietária exclusiva.
Texto Integral
Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação de Guimarães, no seguinte:
I- Relatório
A. C., residente em .., Rue …, França, instaurou a presente ação declarativa, com processo comum, contra O. C., residente na Rua … Vila Nova de Famalicão, pedindo que se:
a- declare a existência de uma servidão de passagem que consiste no acesso pedonal e de veículos, motorizados ou não, sobre a área com extensão aproximadamente de 12,00 m2 de terreno, e que possibilita o acesso do prédio da Autora à via pública – quer porque o seu prédio se encontra encravado em função do comportamento da Ré, quer porque, e sem prescindir, tal direito de servidão de passagem se constituiu por via da usucapião;
b- condene a Ré a reconhecer a existência da aludida servidão de passagem;
c- condene a Ré a entregar uma cópia da chave da fechadura do portão de entrada que faculta o acesso à área identificada em a);
d- condene a Ré a retirar/destruir imediatamente o muro que construiu e obstruiu a área identificada em a), repondo-a no exato estado em que a área estava anteriormente;
e- condene a Ré a abster-se de quaisquer atos que impeçam ou diminuam a utilização dessa área, e de, por qualquer meio, extravasar e impedir o uso e fruição da passagem referida em a);
f- ordene o registo da servidão predial de passagem melhor identificada em a);
g- condene a Ré no pagamento à Autora de uma indemnização, por danos patrimoniais e não patrimoniais, pelos motivos supra alegados, a liquidar em execução de sentença, mas de montante nunca inferior a 10.000,00 euros.
Para tanto alega, em síntese, ser dona e legítima possuidora do prédio urbano composto por casa de habitação e quintal, sito no Lugar ..., freguesia de ..., Vila Nova de Famalicão, inscrito na matriz urbana sob o art. ..º e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º …, o qual confronta a sul com a Ré;
Há aproximadamente dois anos a Autora encontra-se impossibilitada de entrar no seu prédio dado que, sem o seu consentimento, a Ré trocou o canhão da fechadura do portão de entrada nesse prédio;
Esse portão encontra-se inserido na área frontal do prédio da Autora e possibilita o acesso do mesmo à via pública;
Essa área frontal tem cerca de 12,00 m2 e é através dela que a Autora, há mais de 30 anos, à vista de todos, sem oposição de quem quer que seja, sem violência e de boa fé acede ao seu prédio, na convicção de que se trata de um direito seu, que se encontra constituído sobre essa área de terreno e que lhe confere o direito de servidão de passagem pela mesma;
Acresce que a Ré construiu recentemente um muro, apropriando-se da totalidade do espaço correspondente à entrada do prédio da Autora, impossibilitando a passagem desta para o seu prédio;
Anteriormente à construção do muro, o acesso ao prédio fazia-se através do dito portão, que ficava dentro dessa zona de 12,00 m2, e que era utilizado por toda a gente e que comportava a passagem de todo o tipo de veículos, motorizados ou não;
A discussão da titularidade da referida área de terreno de 12,00 m2 foi objeto da ação, que correu termos no Juízo Central Cível de Guimarães – Juiz 3, com o n.º 6088/17.8T8GMR, em que foi decidido, por sentença transitada em julgado, que essa área de terreno não é propriedade exclusiva da Autora, nem da Ré, e que sobre a mesma recai um direito de servidão de passagem;
A área em referência é a única que dá acesso do prédio da Autora à via pública, razão pela qual jamais pode ser obstruída;
O comportamento da Ré impede a Autora de aceder ao seu prédio, causando-lhe danos patrimoniais e não patrimoniais, que discrimina;
A Autora já diligenciou junto da Ré no sentido de solucionar o presente impasse de maneira consensual, mas sem sucesso.
A Ré contestou defendendo-se por exceção e por impugnação.
Invocou a exceção dilatória do caso julgado, alegando que no âmbito da ação que correu termos no Juízo Central Cível de Guimarães – Juiz 3, com o n.º 6088/17.8T8GMR, a Autora arrogou-se proprietária da parcela de terreno de 12,00 m2, pedido esse que foi julgado improcedente, por decisão transitada em julgado;
Acresce que a Ré foi absolvida de todos os pedidos deduzidos pela Autora nessa ação, incluindo do pedido aí formulado na alínea b), em que esta pedia a condenação da aí e aqui Ré a “abster-se da prática de quaisquer atos que impeçam ou diminuam a utilização da parte da Autora dessas mesmas extensões de terreno”;
Conclui que a Autora “não pode agora formular o mesmo pedido – ou por outras palavras, obter nova decisão judicial que contrarie a primeira decisão”;
Impugnou parte dos factos alegados pela Autora na petição inicial.
Conclui pedindo que a ação seja julgada improcedente e seja absolvida dos pedidos.
Por despacho proferido em 28/05/2021 concedeu-se à Autora o prazo de dez dias para se pronunciar, querendo, quanto à exceção dilatória do caso julgado invocada pela Ré.
Na sequência desse despacho, a Autora respondeu à exceção em causa, concluindo pela respetiva improcedência, alegando que, no âmbito daquela primeira ação, discutia-se o “reconhecimento do direito de propriedade da Autora sobre o prédio ali melhor identificado e sobre uma parcela de terreno de aproximadamente 12,00 m2 que daquele faz parte”, quando, na presente ação, se invoca “a existência do direito de uma servidão de passagem”, não se discutindo, pois, “o direito de propriedade da Autora” sobre a dita parcela de terreno.
Notificou-se a Autora para juntar aos autos certidão da sentença proferida no âmbito dos autos n.º 6088/17.8T8GMR, do Juiz 3, do Juízo Central Cível de Guimarães, com nota do respetivo trânsito em julgado (cfr. despacho de 09/06/2021), o que aquela fez, por requerimento entrado em juízo em 17/06/2021, em que juntou aos autos certidão da sentença e do acórdão confirmatório daquela, proferido em 28/03/2019, com nota do respetivo trânsito em julgado em 10/05/2019.
Realizou-se audiência prévia, em que, frustrada a conciliação das partes, concedeu-se a palavra às partes a fim de se pronunciarem, querendo, quanto à exceção dilatória do caso julgado, tendo estas mantido as posições que já tinham assumido nos seus articulados a propósito da mencionada exceção.
Discutiram-se os aspetos jurídicos da causa e, após as partes terem alterado os seus requerimentos probatórios, a 1ª Instância ordenou que os autos lhe fossem conclusos.
Em 09/07/1021 proferiu-se despacho saneador, em que se conheceu da exceção dilatória do caso julgado invocada pela Ré, na vertente de autoridade do caso julgado, julgando-a procedente e absolvendo a Ré da instância, constando essa decisão da seguinte parte dispositiva:
“Pelo exposto, julgo procedente a invocada exceção de autoridade de caso julgado, por efeito preclusivo da decisão proferida na ação n.º 6088/17.8T8GMR e, em consequência, absolvo a Ré da instância.
Custas a cargo da Autora”.
Inconformada com o assim decidido, a Autora interpôs o presente recurso de apelação, em que formula as seguintes conclusões:
1. A Autora/Recorrente propôs a presente ação arrogando ser dona e legítima possuidora do prédio urbano melhor identificado no artigo 1.º da Petição Inicial, peticionando o reconhecimento de uma servidão a favor deste prédio. 2. Porém, conforme decorre do requerimento junto aos autos, em 24/09/2021, esta não é titular do direito de propriedade sobre o referido prédio. 3. Como se alcança da análise conjugada da caderneta predial e descrição predial juntas aos autos, com a petição inicial, e resulta, inclusive, já demonstrado na ação n.º 6088/17.8T8GMR, o referido prédio integra o acervo hereditário da herança aberta por óbito de J. M., falecido marido da Autora/Recorrente. 4. Sendo manifesto que o prédio em questão não foi ainda partilhado, ação deveria ter sido proposta por todos os herdeiros, em representação da herança. 5. Pelo que, independentemente do que abaixo se dirá sobre o mérito da decisão recorrida, não pode deixar de ser afirmada a exceção da ilegitimidade da Autora/Recorrente e, consequentemente, absolvida a Ré/Recorrida da instância. 6. Do que resulta ficar prejudicada a apreciação do mérito do recurso.
SEM PREJUÍZO, 7. Por sentença datada de 9 de julho de 2021, o Tribunal aquo julgou procedente a exceção de autoridade do caso julgado invocada, por via do efeito preclusivo da decisão proferida na ação n.º 6088/17.8T8GMR, absolvendo a Ré/Recorrida da instância. 8. Acontece, porém, que essa decisão é resultado de um clamoroso erro de interpretação e aplicação do direito do Tribunal aquo. 9. Desde logo, porque o objeto da presente ação em nada contende ou contraria a decisão transitada, não tendo ficado precludida a possibilidade de a Autora/Recorrente, na presente ação, fazer valer, invocar e pedir o reconhecimento de um direito diverso, incasu, o direito de servidão de passagem. 10. E, depois, porque, no caso dos presentes autos, não se tem por verificada a exceção da autoridade do caso julgado invocada pelo Tribunal aquo para fundamentar a sua decisão. 11. Embora a servidão de passagem que a Autora/Recorrente ora pretende ver reconhecida incida sobre a parcela de 12 m2 a que se refere a sentença da ação n.º 6088/17.8T8GMR, nessa ação, em momento algum, resultou demonstrado que a referida parcela era parte integrante do prédio da Ré/Recorrida ou foi afirmado que esta detinha sobre a mesma um direito de propriedade plena. 12. Aliás, da matéria de facto não provada, designadamente dos factos constantes do ponto II.16., resulta antes que não foi feita qualquer prova de que a Ré/Recorrida atua sobre a referida parcela de 12 m2 com a convicção de exercer um direito próprio. 13. Mal andou, por isso, o Tribunal aquo ao afirmar que, na ação 6088/17.8T8GMR, foi reconhecido o direito de propriedade plena sobre a parcela à Ré/Recorrida. 14. De todo o modo, sempre se dirá que, mesmo que tivesse resultado demonstrada a propriedade da Ré/Recorrida, ainda assim o objeto da presente ação em nada contenderia ou contrariaria a decisão transitada em julgado, isto porque a determinação da titularidade do direito de propriedade sobre a referida parcela de 12 m2 sempre seria pressuposto do reconhecimento da existência do direito de servidão de passagem peticionado pela Autora/Recorrente nesta ação. 15. É, assim, evidente, que, no caso dos presentes autos, não se tem por verificada a exceção da autoridade do caso julgado invocada. 16. Pelo que, violou o Tribunal aquo o disposto no artigo 580.º do CPC.
SEM PRESCINDIR, 17. Sendo o presente recurso julgado procedente, se a ação houver de prosseguir, entende a Autora/Recorrente, face ao alegado pela Ré/Recorrida nos artigos 7, 52, 53, 54 e 55 da contestação, que se impõe ao Mmo. Juiz do Tribunal aquo, no âmbito do poder-dever que a lei lhe confere no artigo 590.º, n.º 4, do CPC e ao abrigo do princípio da cooperação (artigo 7.º, n.º 2, do CPC), convidar a Autora/Recorrente a suprir as insuficiências e imprecisões do seu articulado, nomeadamente através da apresentação de um novo, em que concretize a matéria de facto atinente à existência e configuração do direito de servidão de passagem invocado.
TERMOS EM QUE, julgando procedente a exceção da ilegitimidade da Autora/Recorrente e, consequentemente, absolvendo a Ré/Recorrida da instância ou, assim não se entendendo, julgando o recurso de apelação interposto totalmente procedente, farão V. Exas inteira e acostumada JUSTIÇA.
A apelada contra-alegou pugnando pela improcedência da apelação, concluindo as suas contra-alegações de recurso nos termos que se seguem:
A. A recorrente vem mentindo e tentando brincar na Justiça e com esta.
B. Está claro que a recorrente é a proprietária do prédio em causa – bastava atentar no documento junto por esta que adquiriu em escritura de partilha (bem próprio) o prédio. A recorrente desconhece o direito sucessório e os efeitos do regime de bens no casamento.
C. Seja como for – NUNCA PODERIA SER AGORA POSTA EM CAUSA UMA eventual ILEGITIMIDADE SEM DIREITO A CONTRADITÓRIO E EM MOMENTO que nem é OPORTUNO.
D. Não pode agora sequer ser objeto deste recurso e/ou decisão por acórdão.
E. Sim, é de facto, apenas e tão só, o que a recorrente apresenta nas suas alegações que delimitam o recurso.
F. A douta decisão do Juiz a quo é colocada em crise, mas sem qualquer razão por parte da recorrente.
G. A autora inicialmente e aqui neste assunto (outro processo) tentou a todo custo ser dona de uma parte do prédio da ré.
H. Começou nesse anterior processo judicial por afirmar que a propriedade era sua (12m2).
I. Esse pedido foi improcedente.
J. Logo CASO JULGADO.
K. A ré foi absolvida do pedido formulado pela autora na sua anterior petição (ver pedido B “abster-se da prática de quaisquer atos que impeçam ou diminuam a utilização por parte dos autores dessas mesmas extensões de terreno”) na petição e douta sentença no dispositivo “absolvendo-se os réus nos demais pedidos formulados”.
L. Ora estamos perante mais uma vez do caso julgado.
M. Essa utilização pela autora foi improcedente.
N. Não pode agora formular o mesmo pedido – ou por outras palavras obter nova decisão judicial que contrarie a primeira decisão.
O. Todos os argumentos apresentados na douta sentença – estão corretos e sem qualquer erro.
P. Na verdade, o juiz a quo tem toda a razão – precludiu o direito para intentar nova ação.
Nestes termos deverá o recurso ser totalmente improcedente.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam do conhecimento oficioso do tribunal - cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
No seguimento desta orientação, as questões que são colocadas pela apelante à consideração desta Relação resumem-se ao seguinte:
a- se ao não ter conhecido da exceção dilatória da ilegitimidade ativa e ao não ter julgado esta procedente, absolvendo a apelada (Ré) da instância, o tribunal a quo incorreu em erro de direito em virtude de, contrariamente ao que se encontra alegado pela apelante na petição inicial, esta não ser dona exclusiva do prédio urbano identificado no art. 1º da petição inicial, mas esse prédio, tal como “se alcança da análise conjugada da caderneta predial e descrição predial juntas aos autos e com a petição inicial e, inclusive, do decidido na ação n.º 6088/17.8T8GMR (…) integra o acervo hereditário da herança aberta por óbito de J. M., falecido marido” da apelante.
A propósito desta questão, suscita-se a questão prévia de se saber se tendo a apelante instaurado a presente ação alegando ser proprietária exclusiva do prédio identificado no art. 1º da petição inicial e se não tendo a apelada invocado a exceção dilatória da ilegitimidade ativa na contestação e, bem assim não tendo o tribunal a quo conhecido oficiosamente dessa exceção no despacho saneador recorrido, se a apelante pode suscitar a exceção dilatória em causa no âmbito das suas alegações de recurso e se esta Relação pode dela conhecer e, na positiva, se essa exceção se mostra procedente e quais os remédios jurídicos que a lei coloca ao dispor do tribunal para superar a mesma;
b- se ao julgar procedente a exceção dilatória inominada da autoridade do caso julgado e ao absolver a apelada (Ré) da instância, a decisão recorrida padece de erro de direito, impondo-se a sua revogação e determinar o prosseguimento dos autos; e
c- a ter a presente ação de prosseguir os seus legais termos, se se impõe convidar a apelante a suprir as insuficiências e imprecisões da petição inicial, nomeadamente, através da apresentação de nova petição inicial em que concretize a matéria de facto atinente à existência do direito de servidão de passagem.
A propósito desta questão suscita-se a questão prévia de se saber se o tribunal ad quem pode conhecer desse fundamento de recurso.
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A- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos que revelam para conhecer da presente apelação são os que constam do relatório acima elaborado, a que acrescem os seguintes factos:
A- Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º .../20111123, da freguesia de ..., o prédio urbano composto por casa de habitação, com quintal, sito no Lugar ..., freguesia de … e ..., inscrito na matriz predial urbana sob o art. … - cfr. doc. de fls. 13.
B- Esse prédio encontra-se com aquisição inscrita, no registo, pela ap. 6 de 1987/11/19, a favor de A. C., por sucessão deferida em partilha extrajudicial, por óbito de A. S. – cfr. doc. de fls. 13.
C- Correu termos sob o n.º 6088/17.8T8GMR.G1, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Central Cível de Guimarães – Juiz 3, ação declarativa de condenação, na forma de processo comum, intentada por A. C. (aqui Autora) e marido, J. M., contra O. C. (aqui Ré) em que a primeira pede que:
a) se declare o direito de propriedade da Autora sobre um prédio que identifica e sobre uma parcela de 12 m2, que daquele faz parte e que a Ré passou a ocupar desde meados de 2014, o que vem impedindo a utilização e o acesso dos Autores à sua habitação;
b) se condene a Ré a reconhecer esse direito e a restituir aos Autores aquela parcela do seu prédio e a absterem-se de quaisquer atos que impeçam ou diminuam a utilização da mesma pelos Autores – cfr. certidão de fls. 62 a 80.
D- Por sentença proferida em 03 de dezembro de 2018, essa ação foi julgada parcialmente procedente, constando a respetiva parte dispositiva do seguinte:
“Por tudo o exposto, declaro que o prédio identificado em 1.1. e 1.2 é propriedade da Autora e dos habilitados, absolvendo-se os Réus dos demais pedidos formulados. Custas a cargo dos Autores” – cfr. certidão de fls. 62 a 80.
E- Por acórdão proferido por esta Relação em 28/03/2019, transitado em julgado em 10/05/2019, o recurso de apelação interposto pelos aí Autores da sentença referida em D), foi julgado improcedente e confirmada a sentença aí recorrida, lendo-se, nesse aresto, a propósito da parcela de terreno objeto dos presentes autos, o seguinte: “… a questão em discussão nos autos, tal como aliás a delimitam os próprios Recorrentes, é a de saber se a parcela de terreno de 12 m2 é parte integrante do seu prédio e de sua propriedade. E, quanto a tal parcela, não só não provaram os Autores que a mesma faz parte integrante do seu referido prédio, como não provaram relativamente a ela uma posse determinante da sua aquisição por usucapião. Tal como bem se saliente na sentença recorrida o registo não dá direitos, apenas os conserva e publicita, e a presunção do artigo 7º do Código de Registo Predial não abrange as áreas e confrontações constantes da descrição dos respetivos prédios. Ora, os Autores não lograram demonstrar conforme lhes competia a área total e respetivas confrontações do seu prédio (cfr. pontos 1) e 2) dos factos não provados; apenas provaram que confronta a sudeste com o prédio referido da Ré)” - certidão de fls. 62 a 80.
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B- FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA B.1- Da exceção dilatória da ilegitimidade ativa
A apelante imputa erro de direito ao despacho saneador recorrido, que absolveu a apelada (Ré) da instância por via da procedência da exceção dilatória inominada da autoridade e força do caso julgado, advogando, ao que se depreende das suas alegações de recurso, que antes de conhecer dessa exceção impunha-se ao tribunal a quo que tivesse conhecido da exceção dilatória da ilegitimidade ativa e tivesse absolvido a apelada da instância com esse fundamento.
Com efeito, sustenta a apelante que “A Autora/Recorrente propôs a presente ação arrogando ser dona e legítima possuidora do prédio urbano composto por casa de habitação e quintal, sito no lugar …, freguesia de ..., concelho de Vila Nova de Famalicão, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o número ... – cfr. artigo 1º da petição inicial -, peticionando o reconhecimento de uma servidão a favor deste prédio. Acontece, porém, que, conforme decorre do requerimento junto aos autos em 24/09/2021 – referência 11986098 -, esta não é titular do direito de propriedade sobre o referido prédio. Como se alcança da análise conjugada da caderneta predial e descrição predial junta aos autos, com a petição inicial – cfr. documento n.º 1 -, o referido prédio integra o acervo hereditário da herança aberta por óbito de J. M., falecido marido da Autora/recorrente. Sendo manifesto que o prédio em questão não foi ainda partilhado, a Autora/recorrente não tem legitimidade para, per si, propor a presente ação. A ação dos presentes autos deveria ter sido proposta por todos os herdeiros, em representação da herança. Pelo que, independentemente do que abaixo se dirá sobre o mérito da decisão recorrida, não pode deixar de ser afirmada a exceção da ilegitimidade da Autora/recorrente e, consequentemente, absolvida a Ré/recorrida da instância. Do que resulta ficar prejudicada a apreciação do mérito do recurso”.
Destarte, se bem interpretamos a alegação da apelante, na perspetiva desta, tendo a mesma instaurado a presente ação pedindo que se declare, e se condene a Ré (apelada) a isso ver reconhecido, que sobre o trato de terreno, com a área de 12 m2, se encontra constituída, por usucapião, uma servidão de passagem a favor do prédio de que a apelante se arroga proprietária exclusiva e que identifica no art. 1º da petição inicial, verificando-se da documentação junta aos autos, em anexo à petição inicial, na sua perspetiva, que esse prédio não é propriedade exclusiva da mesma, mas antes da herança aberta por óbito do seu falecido marido, J. M., impunha-se que a 1ª Instância, antes de conhecer da exceção dilatória inominada da autoridade do caso julgado, tivesse conhecido oficiosamente da exceção dilatória da ilegitimidade ativa, julgando-a procedente e absolvendo a Ré da instância, por via da procedência dessa exceção.
Acontece que sendo os recursos os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, através dos quais a recorrente visa obter o reexame da matéria apreciada pela decisão recorrida, isto é, meios de visam obter o reexame da matéria apreciada na decisão recorrida por um órgão jurisdicional hierarquicamente superior àquele que proferiu essa decisão, e não criar decisões sobre matéria nova, não podendo assim neles ser versadas questões que não tenham sido suscitadas perante o tribunal recorrido, exceto se se tratar de questões que sejam do conhecimento oficioso do tribunal(1), a propósito deste fundamento de recurso suscita-se a questão prévia de se saber se não tendo a exceção dilatória da ilegitimidade ativa da apelante para instaurar a presente ação sido suscitada pela apelada na contestação, a qual, aliás, pugna pela não verificação dessa exceção nas suas contra alegações de recurso, e não tendo a 1ª Instância conhecido oficiosamente dessa exceção no despacho saneador recorrido, se a apelante pode invocar essa exceção, pela primeira vez, nas suas alegações de recurso e, independentemente disso, se essa exceção é do conhecimento oficioso do tribunal e, no caso positivo, se a sua procedência tem por consequência jurídica, tal como é propugnado pela apelante acontecer, a absolvição da Ré da instância.
Acresce que se impõe indagar se ao não ter conhecido dessa exceção, passando ao conhecimento imediato da exceção dilatória inominada da violação da autoridade do caso julgado, o tribunal a quo incorreu em erro de direito, impondo-se que esta Relação conheça, no âmbito da presente apelação, da exceção dilatória da ilegitimidade ativa e absolva a Ré da instância, do que resultará, conforme pretende a apelante “ficar prejudicada a apreciação do mérito do recurso”.
Posto isto, a legitimidade processual, ativa ou passiva, consubstancia um pressuposto processual, isto é, um dos elementos que tem de estar preenchido para que o juiz possa entrar na apreciação do mérito da causa que lhe é submetida pelas partes, concedendo ou indeferindo a providência requerida.
Os pressupostos processuais são, assim, “as condições mínimas consideradas indispensáveis para, à partida, garantir uma decisão idónea e uma decisão útil da causa.
Não se verificando algum desses requisitos, como a legitimidade das partes, a capacidade judiciária de uma delas ou de ambas, o juiz terá, em princípio, que abster-se de apreciar da procedência ou improcedência do pedido, por falta de um pressuposto essencial para o efeito” (2), estando-lhe vedado entrar no conhecimento do mérito da causa.
A ausência dos pressupostos processuais, como é o caso da ilegitimidade ativa ou passiva (al. e) do art. 577º do CPC), configuram exceções dilatórias, que, a procederem, consentaneamente com o que se vem dizendo, nos termos do n.º 2 do art. 576º, obstam a que o tribunal conheça do mérito da causa e dão, em princípio, lugar à absolvição do Réu da instância e, excecionalmente, mais concretamente, nos casos de incompetência relativa ou absoluta do tribunal, determinam, ou podem determinar, a remessa do processo para o tribunal competente para conhecer dessa concreta ação.
Mediante o pressuposto da legitimidade exige-se, como condição para que o tribunal possa entrar na apreciação do mérito da causa que lhe é submetida, que a ação tenha sido intentada (legitimidade ativa) pelas “partes certas” e contra (legitimidade passiva) as “partes certas” da relação jurídica controvertida delineada pelo autor na petição inicial, posto que, de contrário, a atividade jurisdicional que o tribunal venha a desenvolver não terá qualquer efeito útil, porque o autor e/ou o réu não são os titulares do interesse relevante em discussão na concreta relação jurídica material controvertida submetida pelo autor à apreciação e à decisão do tribunal, ou não são os exclusivos detentores desse interesse relevante, e daí que a decisão de mérito que viesse a ser proferida pelo tribunal, reconhecendo ou recusando o direito a que o autor se arroga titular, não teria qualquer efeito jurídico, por as partes com o interesse relevante discutido na ação não se encontrarem no processo, do lado ativo e/ou do lado passivo, ou as partes que nele figuram não eram os exclusivos titulares ativos ou passivos desse interesse relevante, pelo que o caso julgado material que viesse a cobrir a decisão de mérito que dirimisse esse conflito não o lograria solucionar por não ser oponível aos verdadeiros sujeitos ativos e passivos do direito em causa.
Portanto, mediante o pressupostos da legitimidade exige-se que quem figura no processo como autor e como réu sejam os efetivos detentores do interesse relevante que se encontra em discussão na ação submetida pelo autor à apreciação e à decisão do tribunal, ou seja, exige-se que quem figura como parte na causa, quer do lado ativo (enquanto autor), quer do lado passivo (enquanto réu), tenha uma posição concreta perante a causa que é submetida ao tribunal, e daí que a legitimidade não seja uma qualidade pessoal, mas antes uma qualidade posicional da parte face à ação, ao litígio que aí se discute (3).
Nos termos do art. 30º do CPC, o autor é parte legítima quando tenha interesse direto em demandar e o réu é parte legítima quando tenha interesse direto em contradizer (n.º1), sendo que, para esses efeitos, o interesse direto em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da ação e o interesse direto em contradizer pelo prejuízo que dessa procedência advenha (n.º 2).
Logo, para que o autor disponha de legitimidade ativa para instaurar determinada ação contra determinado réu é necessário que o mesmo tenha um determinado interesse perante o objeto da relação jurídica material controvertida que delineou subjetiva (quanto aos sujeitos) e objetivamente (quanto ao pedido e à causa de pedir) na petição inicial; mas não basta que aquele tenha um interesse qualquer nessa relação jurídica controvertida que submeteu à apreciação e à decisão do tribunal, ainda que remoto ou indireto, é necessário que o mesmo tenha um interesse direto e pessoal na apreciação dessa relação jurídica material controvertida, como é o caso do credor em relação ao devedor na ação de cobrança de dívida, porque o credor é o titular ativo do direito de crédito e o devedor o seu titular passivo.
Quanto ao réu, mediante o pressuposto da legitimidade passiva exige-se que este seja o titular do interesse relevante que se discute na ação, isto é, que seja quem tem o interesse direto e pessoal que nela se encontra em discussão, por ser o titular passivo dessa relação.
Estando-se em sede de apreciação de pressupostos processuais numa fase preliminar ou inicial da ação, em que ainda não se entrou na apreciação do mérito da causa, mas antes se está numa fase em que se trata de indagar se estão ou não reunidas as condições mínimas consideradas indispensáveis pela lei processual civil para que, à partida, o juiz possa entrar na apreciação do mérito da causa, naturalmente que em sede de apreciação do pressuposto processual da ilegitimidade ativa ou passiva, não releva, sequer poderá relevar, se o autor ou o réu, de acordo com a lei substantiva aplicável à concreta relação jurídica material controvertida que se encontra delineada na petição, é o efetivo, isto é, o substantivo e material titular dessa relação jurídica material controvertida que lhe foi submetida pelo autor, ou seja, se o autor é o efetivo e substantivo credor e, bem assim, se o réu é o efetivo e substantivo devedor dessa relação, o que apenas poderá ser aferido uma vez discutido o mérito da causa, contendendo já com a legitimidade substantiva, ou seja, reafirma-se, com o mérito.
Nesta fase preliminar da ação o que interessa é verificar se, de acordo com a relação jurídica material controvertida delineada pelo autor na petição inicial, isto é, atentos os factos por ele aduzidos nesse articulado fundador da ação e com base nos quais delineia a relação jurídica material controvertida que submete à apreciação e à decisão do tribunal, ficcionando-se que esses factos são verdadeiros (o que se queda por demonstrar em momento ulterior da ação), por referência ao quadro jurídico abstrato suscetível de ser aplicado a esses factos, aquele que instaurou a ação e que, portanto, nela figura como autor, é o titular direto dessa relação jurídica, detendo a qualidade de credor, e se o sujeito demandado (réu) é o titular do interesse direto dessa relação jurídica material controvertida, detendo a qualidade de sujeito passivo ou de devedor dessa relação.
Caso essa questão mereça resposta positiva, então impõe-se concluir, respetivamente, pela legitimidade ativa da pessoa que nessa concreta ação figura como autor (demandante) e pela legitimidade passiva da pessoa que nessa mesma ação figura como réu (demandado), concluindo-se pela resposta inversa caso aquela resposta mereça resposta negativa do lado ativo ou do lado passivo ou de ambos os lados (ativo e passivo).
Nesta esteira, lê-se no n.º 3 do art. 30º do CPC, que “na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor”, ou seja, exceto nos casos em que a lei disponha expressamente em sentido diverso, para efeitos de se verificar se se encontra ou não preenchido o pressuposto processual da legitimidade ativa ou passiva e, portanto, se estão ou não no processo as denominadas “partes certas” para que o juiz, à partida, possa entrar na apreciação do mérito dessa causa, terá aquele de atender exclusivamente à relação jurídica material controvertida alegada pelo autor na petição inicial e partindo dessa relação (no pressuposto que o autor irá demonstrar esses factos que alegou, constitutivos dessa relação jurídica material controvertida), apelar ao quadro jurídico que é abstratamente aplicável à mesma, verificar se quem figura como autor na ação é o titular ativo do direito invocado pelo autor e de que aquele faz derivar a pretensão de tutela judiciária que pretende que o tribunal lhe reconheça (pedido) e se quem figura nessa ação como réu é o titular passivo desse direito invocado pelo autor e de que este faz derivar o pedido, concluindo-se, no caso positivo, pela legitimidade ativa do autor e pela legitimidade passiva do réu e, no caso negativo, consoante essa ilegitimidade se verifique do lado ativo e/ou do lado passivo, pela procedência da exceção da ilegitimidade ativa e/ou passiva e pela consequente absolvição do réu da instância, por não estarem salvaguardadas as condições mínimas que permitem ao juiz entrar na apreciação do mérito da causa, por nessa concreta ação não estarem as “partes certas” da relação jurídica material controvertida delineada nela pelo autor na petição inicial.
Precise-se que atenta a relação jurídica material controvertida delineada pelo autor na petição inicial, poderá acontecer que olhando para essa relação jurídica delineada pelo autor na petição inicial ou que resulta dos documentos que entretanto foram juntos aos autos, e subsumindo a mesma ao quadro jurídico que abstratamente lhe é aplicável, essa relação jurídica material controvertida poderá ter um único sujeito, do lado ativo (um único titular ativo do direito exercido nos autos pelo autor), e um único sujeito, do lado passivo (um único sujeito passivo dessa relação, um único devedor), caso em que ocorre uma situação de legitimidade singular dos titulares daquela concreta relação jurídica material controvertida delineada pelo autor na petição inicial.
Mas também poderá acontecer que essa relação jurídica material controvertida delineada pelo autor na petição inicial ou que resulta evidenciada dos documentos entretanto juntos aos autos, tenha uma pluralidade de pessoas em qualquer dos dois lados dessa relação processual, falando-se, nessas situações, em pluralidades de partes ou de litisconsórcio.
O litisconsórcio poderá ser ativo, quando a relação jurídica material controvertida tenha vários titulares do direito (lado ativo), passivo, quando essa relação jurídica material controvertida tenha vários devedores do direito (lado passivo), ou ser duplo ou simultâneo, quando a relação jurídica material controvertida tenha vários titulares, isto é, vários credores do direito e vários devedores deste.
Nos casos de litisconsórcio, isto é, nos casos em que a relação jurídica material controvertida delineada pelo autor na petição inicial, apesar de ser única, tem várias partes principais do lado ativo e/ou do lado passivo, nuns casos, a lei processual não impõe que a ação seja intentada por todos os credores e contra todos os devedores, mas noutros casos impõe que assim seja e daí que se imponha distinguir entre litisconsórcio voluntário e litisconsórcio necessário.
Ocorre uma situação de litisconsórcio voluntário quando, apesar da relação material controvertida respeitar a várias pessoas, a ação respetiva pode ser proposta por todos ou contra todos os interessados (n.º 1 do art. 32º), ou seja, no litisconsórcio voluntário, “todos os interessados podem demandar ou ser demandados, mas não se verifica qualquer ilegitimidade se não estiverem todos presentes na ação”. Assim, sempre que a relação jurídica material controvertida tenha uma pluralidade de interessados, ativos ou passivos, mas a lei, o negócio ou a própria natureza da relação jurídica, não exija que a ação tenha de ser intentada por todos os sujeitos ativos dessa relação ou contra todos os sujeitos passivos dessa relação, está-se na presença de um litisconsórcio voluntário.
No litisconsórcio voluntário fica na disponibilidade dos vários interessados ativos (dos vários credores) dessa relação instaurar ou não a ação conjuntamente por todos, e é ao autor que caberá, em função dos seus interesses, optar por instaurar a ação contra apenas um dos sujeitos passivos dessa relação jurídica, contra vários desses sujeitos passivos dessa relação, ou contra todos, sendo certo que qualquer um dos sujeitos ativos dispõe de legitimidade ativa para instaurar a ação, assim como qualquer um dos sujeitos passivos dessa relação dispõe de legitimidade passiva para ser demandado isoladamente (4).
Por sua vez, ocorre uma situação de litisconsórcio necessário quando “todos os interessados devem demandar ou ser demandados, originando a falta de qualquer deles uma situação de ilegitimidade. Assim, enquanto o litisconsórcio voluntário decorre exclusivamente da vontade dos interessados, o litisconsórcio necessário é imposto ao autor ou autores da ação” (5).
Essa imposição da ação ter de ser intentada por todos os sujeitos ativos da relação jurídica material controvertida delineada pelo autor na petição inicial, isto é, por todos os titulares ativos do direito que aquele pretende exercer naquela concreta ação e de onde faz derivar o pedido, e/ou dessa ação ter de ser instaurada contra todos os sujeitos passivos dessa mesma relação jurídica material controvertida (contra todos os devedores) pode decorrer da lei – situação em que se está perante um litisconsórcio necessário legal, em que a necessidade do litisconsórcio é imposta por lei -, do negócio – situação em que o litisconsórcio se diz convencional, por ser imposto por estipulação das partes do concreto negócio jurídico delineado pelo autor na petição inicial –, ou pode ser imposta pela própria natureza da relação jurídica material controvertida – em que o litisconsórcio se diz natural, decorrendo a imposição do litisconsórcio da necessidade de se garantir que a decisão de mérito que venha a ser proferida pelo tribunal possa produzir o seu “efeito útil normal”, isto é, por essa decisão de mérito que eventualmente venha ser proferida, sem a presença de todos os sujeitos, ativos e/ou passivos, dessa mesma relação jurídica material controvertida, que dirimiu, “não compor definitivamente a situação jurídica das partes, por esta poder ser afetada pela solução dada numa outra ação entre outras partes”, como é o caso, por exemplo, da ação de regulação das responsabilidades parentais, que terá de ser instaurada pelo Ministério Público contra ambos os progenitores, ou da ação de divisão de coisa comum, que tem de ser instaurada por um ou vários dos comproprietários contra os restantes, ou da ação de prestação de contas, que tem de ser instaurada por um ou vários interessados, contra os restantes, etc. (art. 28º do CPC). Em todos esses exemplos, caso a ação fosse proposta apenas contra um dos progenitores do menor, contra um dos vários interessados na prestação de contas, ou contra um dos comproprietários do prédio a dividir, a decisão de mérito que viesse a ser proferida não vincularia os restantes interessados, não operando caso julgado contra os mesmos, que poderiam instaurar nova ação, em que a decisão de mérito que nela viesse a ser proferida poderia não ser coincidente e até contrariar a antes proferida e transitada em julgado (6).
Assentes nas premissas que se acabam de enunciar, revertendo ao caso dos autos, nele, a apelante A. C., arrogando-se proprietária exclusiva do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º .../20111123, inscrito na matriz predial urbana sob o art. ..., intentou a presente ação contra a apelada O. C., pretendendo que se declare que em benefício desse seu prédio se encontra constituída uma servidão de passagem, onerando uma faixa de terreno, com uma área de aproximadamente 12,00 m2, que sustenta ser “propriedade da Ré”, mas que “não é propriedade exclusiva de qualquer das partes – quer Autora quer Ré” – art. 15º da p.i. -, servidão de passagem essa que se constitui por usucapião, bem como, além do mais, que se condene a última a isso ver reconhecido.
Em anexo à petição inicial, a apelante juntou aos autos certidão emitida pela Conservatória do Registo Predial de ..., que prova plenamente que a propriedade sobre esse prédio se encontra inscrita, no registo, a favor da apelante, pela ap. 6, de 1987/11/19, por via de o ter adquirido por “sucessão deferida em partilha extrajudicial”, por óbito de A. S.”.
Nessa mesma inscrição consta que a apelante é casada com “J. M., no regime de comunhão de adquiridos”.
Destarte, como bem conclui a apelada, atenta a relação jurídica material controvertida delineada pela apelante na petição inicial, em que esta se arroga proprietária exclusiva do prédio supra identificado, que identifica no art. 1º da petição inicial, bem como atento o teor da inscrição registral do prédio em referência e da presunção decorrente dessa inscrição, por força do art. 7º do CRP, nos termos da qual se presume, salvo prova em contrário, que o titular inscrito, no registo, é o titular do direito, e do regime de casamento da apelante com o entretanto falecido marido desta, J. M. (a comunhão de adquiridos), o prédio em referência nos autos (prédio alegadamente dominante, isto é, beneficiário da servidão de passagem que a apelante pretende ver reconhecida por usucapião) é propriedade exclusiva da apelante, dado tratar-se de um prédio que adveio à propriedade da apelante, na pendência do casamento desta com J. M., por sucessão ou doação (art. 1722º, al. b) do CC), pelo que não ocorre qualquer ilegitimidade ativa da apelante para instaurar a presente ação.
Acontece que, em anexo à mesma petição inicial, a apelante juntou aos autos cópia da sentença proferida no âmbito dos autos de ação de processo comum n.º 6088/17.8T8GMR, que correu termos pelo Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Central Cível de Guimarães – Juiz 3.
Em função desse documento, verifica-se que a apelante, conjuntamente com o seu entretanto falecido marido, J. M., instaurou ação de reivindicação contra a aqui Ré, O. C., arrogando-se ambos os aí Autores (apelante e marido) proprietários do identificado prédio, por via de o terem adquirido originariamente, mediante funcionamento do instituto da usucapião e, bem assim de uma parcela de terreno, que alegam ser parte integrante desse mesmo prédio, e que é a parcela de terreno sobre a qual, no âmbito da presente ação, a apelante pretende encontrar-se constituída, por usucapião, uma servidão de passagem, em benefício daquele prédio, de que se arroga, nesta ação, proprietária exclusiva.
O marido da apelante, J. M., veio a falecer no âmbito da mencionada ação n.º 6088/17.8GMR e, nessa sequência, foram habilitados como sucessores deste, a Autora e os filhos do casal, por sentença transitada em julgado.
A identificada ação de reivindicação veio a ser julgada improcedente quanto à mencionada parcela de terreno (relembra-se, parcela de terreno sobre a qual, no âmbito da presente ação, a apelante pretende encontrar-se constituída, por usucapião, a servidão de passagem, em benefício daquele prédio – de que se arroga proprietária exclusiva), mas procedeu quanto à pretensão da apelante (aí Autora e do seu falecido marido) em verem declarado o direito de propriedade de ambos sobre o identificado prédio, tanto assim, que no âmbito dessa ação ficou decidido o seguinte:
“Por tudo o exposto, declaro que o prédio identificado em 1.1 e 1.2 é propriedade da Autora e dos habilitados, absolvendo-se os Réus dos demais pedidos formulados”.
O assim decidido veio a ser confirmado por acórdão desta Relação de 28/03/2019, transitado em jugado em 10/05/2019 – cfr. certidão de fls. 62 a 80.
Destarte, contrariamente ao que vem alegado pela apelante na petição inicial, em que se arroga proprietária exclusiva do prédio que identifica no art. 1º da petição inicial e, bem assim do que resulta da presunção do art. 7º do CRP, decorrente desse prédio se encontrar inscrito, no registo, com aquisição exclusiva a favor da apelante, presunção essa que é, aliás, uma mera presunção iuris tantum e, portanto, ilidível mediante prova em contrário, não impedindo, portanto, essa presunção legal a prova de que o identificado prédio não é propriedade exclusiva da apelante, mas antes desta e do seu, entretanto, falecido marido, encontra-se definitivamente assente, intra e extraprocessualmente, por força do trânsito em julgado que cobre a decisão de mérito proferida no âmbito da ação n.º 6088/17.8T8GMR.G1, que o prédio em referência nos autos (prédio alegadamente dominante) é propriedade da apelante e dos seus filhos, a primeira, enquanto titular da meação desse prédio e herdeira da meação do seu falecido marido naquele prédio, juntamente com os seus os filhos, que também são herdeiros.
Ora, sendo inegável que a apelante e os seus filhos, aceitaram a herança aberta por óbito do falecido marido da Autora, J. M., tanto assim que, no âmbito do processo n.º 6088/17.8T8GMR.G1, foram habilitados como sucessores desse falecido, por sentença transitada em julgado, ação essa em que, reafirma-se, por decisão de mérito, transitada em julgado, encontra-se definitivamente declarado que o prédio identificado no art. 1º da petição inicial não é propriedade exclusiva da apelante, conforme esta alega acontecer, na petição inicial, no âmbito da presente ação, mas é antes propriedade desta e dos aí habilitados (apelante, enquanto herdeira do seu falecido marido, J. M., e dos filhos desse casal), quer a herança do falecido marido da apelante, J. M., permaneça indivisa, quer já tenha sido partilhada e o prédio em causa tenha sido adjudicado à apelante (enquanto cônjuge meeira e herdeira de J. M.) e aos filhos do casal (estes, enquanto herdeiros da J. M.), ingressando na esfera jurídica da apelante e desses seus filhos em regime de compropriedade, a apelante não dispõe de legitimidade ativa para instaurar a presente ação, desacompanhada dos filhos.
Na verdade, aceite expressa ou tacitamente a herança aberta por óbito de J. M. pelos respetivos sucessores, como é o caso dos autos, a herança aberta por óbito de J. M. deixou de estar jacente (art. 2046º do CC), pelo que cessou a personalidade judiciária que a al. a) do art. 12º do CPC reconhece excecionalmente à herança jacente.
Destarte, sem prejuízo das situações que nos termos do disposto nos arts. 2079º e 2087º a 2090º do CC, cabem no âmbito de competência e atribuições do cabeça de casal (onde manifestamente não se insere a propositura da presente ação, em virtude desta ter em vista o reconhecimento da constituição, por usucapião, de um direito de servidão de passagem em benefício de um prédio que integra a identificada herança, não se consubstanciando, portanto, num ato de administração ordinária que a apelante, enquanto cabeça de casal da herança aberta por óbito do seu falecido marido, pudesse realizar desacompanhada dos restantes herdeiros do seu falecido marido), nos termos do disposto no art. 2091º, n.º 1 do CC, os direitos relativos à herança só podem ser exercidos conjuntamente por todos os herdeiros e contra todos os herdeiros.
Deste modo, a permanecer a herança aberta por óbito do falecido marido da apelante por partilhar, esta não dispõe de legitimidade ativa para, enquanto cônjuge meeira do prédio e herdeira daquele seu falecido marido, instaurar a presente ação, desacompanhada dos restantes herdeiros, uma vez que essa legitimidade ativa pertence, por imposição legal, a todos os herdeiros, pelo que todos têm de instaurar a presente ação, sob pena de ilegitimidade ativa – situação de litisconsórcio necessário legal ativo (7).
Mas a ter a herança aberta por óbito do falecido marido da apelante já sido partilhada e caso o prédio identificado no art. 1º da petição inicial tenha sido adjudicado à apelante (enquanto cônjuge meeira e herdeira do seu falecido marido) e aos filhos do casal (enquanto herdeiros de J. M.), esse prédio ingressou na esfera jurídica patrimonial do cônjuge meeiro (apelante) e de cada um dos herdeiros de J. M. (apelante e filhos) (8), passando o prédio a pertencer a estes em regime de compropriedade e como tal, nos termos da primeira parte do n.º 1 do art. 1405º do CC, a presente ação tinha igualmente de ser instaurada por todos os comproprietários do prédio, por se tratar de uma situação de litisconsórcio necessário legal ativo, porquanto, os comproprietários exercem, em conjunto, todos os direitos que pertencem ao proprietário singular (9).
Resulta do exposto que quer o prédio identificado no art. 1º da petição inicial, em benefício do qual a apelante pretende ver constituída, por usucapião, a servidão legal de passagem sobre a parcela de terreno com uma área de aproximadamente 12,00 m2, que alega ser propriedade da apelada (ainda que não exclusivamente desta), integre a herança aberta por óbito do marido e essa herança permaneça por partilhar, quer essa herança já tenha sido partilhada, e o prédio tenha sido adjudicado à apelante e aos filhos, ingressando na esfera jurídica destes em regime de compropriedade, a apelante não dispõe de legitimidade ativa para, desacompanhada dos restantes herdeiros ou comproprietários desse prédio, instaurar a presente ação.
Acontece que a única parte da presente ação que podia invocar a exceção dilatória da ilegitimidade ativa da apelante para, desacompanhada dos restantes herdeiros do falecido marido desta (caso a herança aberta por óbito de J. M. permaneça por partilhar) ou dos restantes comproprietários do prédio identificado no art. 1º da petição inicial (caso a herança de J. M. já tenha sido partilhado e esse prédio tenha sido adjudicado à apelante e aos restantes herdeiros de J. M.), instaurar a presente ação, era a apelada (Ré) e tinha de o fazer, sob pena de preclusão, na contestação (art. 573º do CPC).
Conforme supra já se referiu, a apelada não invocou a mencionada exceção na contestação, tanto assim que, conforme se disse, esta, ainda que infundadamente, pugna, nas suas contra-alegações de recurso, pela improcedência dessa exceção.
Quanto à apelante, não lhe assiste o direito de invocar a mencionada exceção dilatória.
No entanto, dado tratar-se de uma exceção dilatória, que, como tal, obsta ao conhecimento do mérito da causa, a exceção em referência é do conhecimento oficioso do tribunal (art. 578º do CPC).
Deste modo, embora à apelante não assista o direito de invocar a exceção dilatória da sua ilegitimidade ativa para instaurar a presente ação desacompanhada dos restantes herdeiros do seu falecido marido ou dos restantes comproprietários do prédio identificado no art. 1º da petição inicial nas suas alegações de recurso, a mesma não está naturalmente impedida de, junto da primeira instância, ou de no âmbito das suas alegações de recurso, chamar à atenção para a verificação da exceção em referência para que, uma vez que se trata de exceção que é do conhecimento oficioso do tribunal, o tribunal ad quem, sendo caso disso, dela conheça.
Sucede que, contrariamente àquele que é o entendimento sufragado pela apelante nas suas alegações de recurso, não só o tribunal a quo não estava obrigado a conhecer da exceção dilatória da ilegitimidade ativa previamente ao conhecimento da exceção dilatória inominada da violação do caso julgado, de que conheceu, como a exceção dilatória da ilegitimidade ativa, não determina a imediata absolvição da Ré da instância, uma vez que essa exceção, nos termos do disposto nos arts. 33º, 261º e 316º, n.º 1 do CPC, é sanável, mediante a intervenção dos restantes herdeiros ou comproprietários do prédio na presente ação.
Com efeito, lê-se no art. 608º, n.º 1 do CPC, que sem prejuízo do disposto no n.º 3 do art. 278º, a sentença conhece, em primeiro lugar, das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela sua precedência lógica.
Conforme pondera Teixeira de Sousa, decorre deste preceito que “uma exceção dilatória deve ser apreciada antes de outra, sempre que o conhecimento da primeira prejudique, por inutilidade ou desnecessidade, a apreciação da segunda, isto é, sempre que a apreciação de uma consuma a necessidade do conhecimento da outra. Por exemplo: faz sentido analisar a falta de personalidade judiciária antes de averiguar a capacidade da parte, porque, se faltar aquela personalidade, não importa apreciar esta eventual incapacidade; a ineptidão da petição inicial deve ser apreciada antes da análise da admissibilidade da coligação, porque, se a petição for inepta quanto a todos os pedidos cumulados, não interessa julgar a admissibilidade dessa coligação (…). Mas nem todas as exceções dilatórias podem ser hierarquizadas segundo uma ordem lógica de julgamento. (…). Assim, sempre que essa hierarquização seja impossível, o tribunal pode fundamentar a absolvição da instância em qualquer exceção, não tendo que observar nenhuma ordem na sua apreciação. Num certo sentido, pode mesmo estranhar-se a referência do art. 660º, n.º 1 in fine (atual art. 608º, n.º 1 do CPC), a uma ordem de apreciação das exceções dilatórias, dado que todas aquelas que podem ser apreciadas na sentença final conduzem a uma decisão, que é a absolvição do réu da instância. Sempre que se verifique um concurso de fundamentos de uma decisão, o mais razoável é aceitar a apreciação alternativa de qualquer deles (…)”, e conclui: “mesmo quando se possa defender uma certa prioridade na apreciação de algumas exceções dilatórias, a inobservância dela não origina qualquer omissão de pronúncia do tribunal e não determina a nulidade da decisão. Dado que a decisão seria sempre a mesma qualquer que fosse a exceção dilatória apreciada, ou seja, seria sempre uma absolvição da instância, não se pode concluir que o desrespeito dessa prioridade determine uma omissão de pronúncia. A ordem referida no art. 660º, n.º 1 in fine (atual art. 608º, n.º 1) é, por isso, meramente indicativa” (10).
Logo, contrariamente ao que parece ser o entendimento da apelante, a 1ª Instância não estava obrigada a conhecer da exceção dilatória da ilegitimidade ativa daquela para instaurar a presente ação desacompanhada dos restantes herdeiros do seu falecido marido, ou dos restantes comproprietários do prédio identificado no art. 1º da petição inicial, antes de conhecer da exceção dilatória inominada da violação da autoridade do caso julgado.
Aliás, dir-se-á que tendo o tribunal julgado a exceção dilatória inominada da violação da autoridade do caso julgado procedente, com a consequente absolvição da Ré (apelada) da instância, o conhecimento daquela exceção dilatória da ilegitimidade ativa previamente a esta atentaria contra a economia e a celeridade processual.
Com efeito, como dito, a exceção dilatória da ilegitimidade ativa é suprível, o que significa que o tribunal a quo, no exercício do poder-dever que lhe é conferido pelos arts. 6º, n.º 2 e 590º, n.º 2, al. a) do CPC, tinha, em sede de despacho pré-saneador, de convidar a apelante a suprir a mencionada exceção dilatória, fazendo intervir nos autos, mediante o competente incidente da intervenção principal provocada, dos restantes herdeiros ou comproprietários do prédio (11), e só caso esta (ou a Ré, apelada – n.º1 do art. 316º do CPC) não deduzisse o incidente de intervenção principal, fazendo intervir, do lado ativo, os restantes herdeiros ou comproprietários do prédio identificado no art. 1º da petição inicial (prédio alegadamente dominante), dentro do prazo fixado para o efeito pelo tribunal, é que o juiz podia conhecer da exceção em referência e absolver a Ré (apelada) da instância, com fundamento na procedência da exceção dilatória da ilegitimidade ativa, por preterição do litisconsórcio necessário legal ativo.
Ora, não tendo o juiz do tribunal a quo cumprido ainda com esse convite, ao que não será alheia a circunstância de estar filado na procedência da exceção dilatória inominada da autoridade do caso julgado, com que sem dúvida alguma procurou obstar à prática de atos inúteis, ao endereçar aquele convite à apelante para que suprisse a sua ilegitimidade ativa para a presente ação, fazendo intervir os restantes herdeiros ou comproprietários do prédio para, em seguida, julgar procedente a mencionada exceção dilatória inominada da autoridade do caso julgado e estando, consequentemente, caso o presente recurso venha a proceder e não existam outros impedimentos processuais à prossecução dos presentes autos, nomeadamente, a eventual ineptidão da petição inicial, por falta de alegação da causa de pedir, e/ou por ininteligibilidade da causa de pedir alegada pela Autora na petição inicial, aquele ainda em tempo de formular esse convite dirigido à apelante para que sane a mencionada exceção dilatória da ilegitimidade ativa, impera concluir pela improcedência deste fundamento de recurso.
Na verdade, no âmbito do despacho saneador recorrido, a 1ª Instância não conheceu oficiosamente da exceção dilatória da ilegitimidade ativa da apelante para instaurar a presente, nem sequer o podia fazer, sem antes, no cumprimento do dever vinculado ou obrigação que lhe é atribuído pelos arts. 6º, n.º 2 e 590º, n.º 2, al. b) do CPC, endereçar convite à apelante para que suprisse essa exceção, sob pena de assim não proceder, incorrer na nulidade a que alude o art. 201º do CPC (12).
Privilegiando a celeridade processual, no despacho saneador recorrido, a 1ª Instância passou, de imediato, ao conhecimento da exceção dilatória inominada da violação da autoridade do caso julgado, que julgou procedente.
Caso o presente recurso venha a proceder e, por conseguinte, seja revogada a decisão recorrida, que absolveu a apelada (Ré) da instância com fundamento na procedência da exceção dilatória inominada da violação da autoridade do caso julgado, tendo os autos de prosseguir os seus termos legais (naturalmente, caso não existam outros impedimentos a esse prosseguimento), a 1ª Instância ainda está em tempo de cumprir com o seu ónus legal de convidar a apelante a suprir a exceção dilatória da ilegitimidade ativa, fazendo intervir, mediante o competente incidente de intervenção principal provocada, os restantes herdeiros ou comproprietários do prédio identificado no art. 1º da petição inicial.
Destarte, a pretensão da apelante no sentido de que se julgue procedente a exceção da ilegitimidade ativa e se absolva a apelada (Ré) da instância com esse fundamento, não tem qualquer arrimo jurídico possível.
Resulta do exposto, improceder este fundamento de recurso.
B.2- Exceção dilatória inominada da autoridade do caso julgado.
A primeira instância julgou procedente a exceção dilatória inominada da autoridade do caso julgado com os seguintes argumentos: a ação que correu termos sob o n.º 6088/17.6T8GMR, do Juízo Central Cível de Guimarães, Juiz 3, “configurava-se como uma típica ação de reivindicação, na qual a Autora reclamava o reconhecimento da propriedade da parcela em causa nos autos. É sobejamente sabido que o demandado numa ação desse tipo só pode repelir a pretensão reivindicatória por duas vias: atacando a titularidade do direito invocado ou, não negando o direito de propriedade do reivindicante, obstar à procedência invocando uma qualquer relação que lhe confira a posse ou detenção da coisa reivindicada, nomeadamente, decorrente de um vínculo obrigacional ou de um direito real menor, como seja um direito de servidão e que limita aquele. No processo nº 6088/17.8T8GMR a aqui Autora negou o direito de propriedade aí invocado pela aqui ré e alegou que a parcela agora novamente em discussão era parte integrante do seu prédio, alegação essa que viu indemonstrada, com a plena prova de que a parcela se incluía em prédio da aqui ré. Contudo, nada mais alegaram, nem excecionaram, ainda que a título subsidiário, nomeadamente a existência da servidão que agora surpreendentemente invoca, embora a mesma, atentos os largos lapsos temporais que estribam a respetiva factualidade, já tivesse necessariamente que existir ou, pelo menos, ser praticada de forma constante e ininterrupta e deixando, necessariamente, marcas visíveis e permanentes. Ora, não o tendo feito no momento próprio (qual seja na petição inicial do processo 6088/17.8T8GMR), ficou precludida a possibilidade de o fazer nesta demanda visto estar em causa a mesma parcela e a respetiva utilização, bem como o direito de propriedade plena sobre ela anteriormente reconhecido e cuja presente ação não pode, assim, contrariar”, entendimento este com a qual não se conforma a apelante, e a nosso ver, antecipe-se desde já, com inteira razão.
Aliás, em abono da solução jurídica que adotou, a 1ª Instância invocou, no despacho saneador recorrido, entre outros, o acórdão proferido pelo aqui relator, em 28/06/2018, no âmbito dos autos de apelação n.º 2010/12.6TBGMR-E.G1, mas sem razão, uma vez que a solução que perfilha não é aquela que resulta do que propugnamos nesse aresto, tanto assim que no âmbito da ação n.º 6088/17.8T8GMR.G1, do Juízo Central Cível de Guimarães, Juiz 3, a aqui apelante (Autora), não assume a posição de Ré, mas antes de Autora, o que, conforme infra se verá, faz toda a diferença quanto ao princípio da preclusão, uma vez que esta opera em relação ao réu dessa ação, mas não em relação a quem assume nela a posição de autor.
Conforme ponderamos no aresto de 28/06/2018, que é invocado pela 1ª Instância na decisão recorrida, embora a exceção do caso julgado e a autoridade de caso julgado sejam efeitos distintos da mesma realidade jurídica, a exceção do caso julgado, enquanto exceção dilatória, tem que ver com um fenómeno de identidade entre relações jurídicas, sendo a mesma relação submetida sucessivamente à apreciação jurisdicional, ignorando-se ou desvalorizando-se o facto dessa mesma relação já ter sido anteriormente apreciada e decidida jurisdicionalmente, mediante decisão de mérito, transitada em julgado.
A verificação da exceção dilatória do caso julgado material pressupõe a verificação da tripla identidade de sujeitos, pedido e causa de pedir.
Aqui atua a dimensão negativa do caso julgado, impedindo que essa mesma relação jurídica já anteriormente decidida, por decisão de mérito transitada em julgado, seja julgada uma segunda vez.
Já a autoridade do caso julgado relaciona-se com a existência de relações – já não de identidade jurídica – mas de prejudicialidade entre os objetos processuais, de modo que julgada, em termos definitivos, certa matéria numa ação que correu termos entre determinadas partes, a decisão sobre o objeto desta primeira ação impõe-se necessariamente em todas as posteriores ações que venham a correr entre as mesmas partes, incidindo sobreum objeto diverso, mas cuja apreciação dependa decisivamente do objeto previamente julgado, perspetivado como verdadeira relação condicionante ou prejudicial da relação material controvertida na segunda ação.
Deste modo, enquanto “a exceção de caso julgado visa evitar que o órgão jurisdicional, duplicando as decisões sobre idêntico objeto processual, contrarie na decisão posterior o sentido da decisão anterior ou repita na decisão posterior o conteúdo da decisão anterior”, já “quando vigora como autoridade de caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspeto positivo de proibição de contradição de decisão transitada: a autoridade de caso julgado é o comando de ação, a proibição de omissão respeitante à vinculação subjetiva à repetição do processo subsequente do conteúdo da decisão anterior e à não contradição no processo posterior do conteúdo da decisão anterior” (13).
Sintetizando, a exceção dilatória de caso julgadopressupõe o confronto de duas ações (uma delas contendo uma decisão já transitada em julgado), e a tríplice identidade entre ambas de sujeitos, de causa de pedir e de pedido. Consequentemente, visa o efeito negativo da inadmissibilidade da segunda ação, por forma a evitar a repetição de causas.
Por sua vez, a força e autoridade de caso julgado decorre de uma anterior decisão que tenha sido proferida e em que ficara decidido, com força de caso julgado, uma determinada questão de mérito, impondo que essa questão não mais possa ser apreciada numa ação subsequente, quer nela surja a título principal, quer se apresente a título prejudicial, e independentemente de aproveitar ao autor ou ao réu. Prende-se com a força vinculativa da primeira decisão e do inerente caso julgado e visa o efeito positivo de impor essa primeira decisão, como pressuposto indiscutível da segunda decisão de mérito, e pode funcionar independentemente da tríplice identidade exigida pela exceção, pressupondo apenas “a decisão de determinada questão que não pode voltar a ser discutida” (14).
Na dimensão de força e autoridade de caso julgado, como afirma Teixeira de Sousa, “não é a decisão, enquanto conclusão do silogismo judiciário, que adquire o valor de caso julgado, mas o próprio silogismo considerado no seu todo: o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge estes fundamentos enquanto pressuposto da decisão (15).
Deste modo, se numa determinada ação de reivindicação se reconheceu que o réu se encontra na posse de um prédio por força de um contrato de arrendamento, o que determinou a improcedência dessa ação de reivindicação, por decisão de mérito, transitada em julgado, não pode este (arrendatário), em posterior ação, alegar ou, fazendo-o, o tribunal decidir, que esse contrato de arrendamento fora revogado por acordo escrito celebrado em data anterior ao encerramento da discussão em audiência final realizada na primeira ação.
Da mesma forma, se numa ação de reivindicação se condenar o Réu a reconhecer a propriedade do Autor sobre determinado imóvel e a restituí-lo àquele, não pode o primeiro, em posterior ação, vir invocar justo título (ex: contrato de arrendamento) que já detinha antes do encerramento da discussão daquela audiência final e que o legitimava a deter o imóvel reivindicado, justo título esse que, no entanto, não cuidou em invocar naquela primeira ação, ou que tendo invocado, não logrou provar.
A semelhante resultado também se chega pelo princípio da preclusão dos meios de defesa do Réu. Embora o conhecimento das exceções não adquira, em regra, força de caso julgado material (cfr. art. 91º, n.º 2 do CPC), o trânsito em julgado de sentença de mérito que reconheceu, em todo ou em parte, o direito do autor, faz precludir todos os meios de defesa do réu, mesmo os que não chegou a deduzir, e até os que ele poderia ter deduzido com base num direito seu, impedindo-o de, em posterior ação, vir exercer esses direitos. Trata-se de uma consequência do princípio da concentração, expressamente definido no art. 573º do CPC. Nesse sentido, “vale a máxima segundo a qual o caso julgado cobre o deduzido e o dedutível” (16).
Esta preclusão da invocação num processo posterior de questões não suscitadas num processo findo reporta-se, necessariamente, àquelas que sejam anteriores ao encerramento da discussão na fase da audiência final e que, consequentemente, não puderam ali ser suscitadas, mediante a apresentação de articulado superveniente, pelo que, “…para efeitos do caso julgado, apenas os factos ocorridos depois do encerramento da discussão são considerados factos novos e podem ser invocados como uma nova causa de pedir numa ação posterior” (17).
Em síntese, “pela exceção visa-se o efeito negativo da inadmissibilidade da segunda ação, constituindo-se o caso julgado em obstáculo a nova decisão de mérito”, enquanto que “a autoridade do caso julgado tem antes o efeito positivo de impor a primeira decisão, como pressuposto indiscutível de segunda decisão de mérito. (…) Este efeito positivo assenta numa relação de prejudicialidade: o objeto da primeira decisão constitui questão prejudicial na segunda ação, como pressuposto necessário da decisão de mérito que nesta há-de ser proferida” (18).
No caso dos autos, é absolutamente pacífico que entre a presente ação e a que correu termos sob o n.º 6088/17.8T8GMR, do Juízo Central Cível de Guimarães, Juiz 3, a única identidade que existe, e mesmo assim, parcial (porquanto os herdeiros de J. M., o qual figurava como autor naquela anterior ação, não figuram como autores na presente ação) é a identidade de sujeitos, mas não ocorre identidade de causas de pedir, nem sequer de pedidos (embora, como infra se verá, poderá ocorrer uma parcial identidade de pedidos).
Com efeito, na presente ação, a Autora (apelante) pretende que se declare e condene a Ré (apelada) a ver reconhecida que sobre a parcela de terreno, com a área aproximadamente de 12,00 m2, melhor identificada no art. 5º da petição inicial, se encontra constituída, por usucapião, uma servidão de passagem em benefício do prédio que identifica no art. 1º desse mesmo articulado (prédio alegadamente dominante), e que, por via disso, se condene a Ré a entregar-lhe uma cópia da chave da fechadura do portão de entrada, que faculta o acesso à identificada área, a retirar/destruir imediatamente o muro que construiu e que obstruiu a dita área de terreno, repondo-a no exato estado em que estava anteriormente, a abster-se de quaisquer atos que impeçam ou diminuíam a utilização dessa área e de, por qualquer meio, estorvar ou impedir o uso e fruição da passagem, se ordene o registo daquela servidão de passagem e, finalmente, se condene a Ré a pagar-lhe uma indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que lhe causou em consequência de a ter impedido de exercer o seu direito de servidão de passagem, constituído por usucapião, por essa parcela de terreno, impedindo-a de aceder ao seu prédio.
A causa de pedir que serve de fundamento a estes pedidos, são os atos de posse alegadamente constitutivos dessa servidão de passagem por usucapião, que a apelante alega na petição inicial e, bem assim os atos lesivos desse seu pretenso direito de servidão de passagem (colocação do portão e construção do muro que alegadamente impedirão aquela de exercer esse seu direito de servidão de passagem, que se processará pela referida área de terreno com aproximadamente 12,00 m2).
Por sua vez, na ação que correu termos no Juízo Central Cível de Guimarães, Juiz 3, sob o n.º 6088/17.8T8GMR, a aqui Autora (apelante) e marido, J. M., falecido na pendência dessa ação, instauraram uma ação contra a aqui Ré (apelada), pedindo que se declare o direito de propriedade daqueles sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ... (que é o prédio alegadamente dominante, no âmbito da presente ação, isto é, o que a apelante identifica no art. 1º da petição inicial, em benefício do qual pretende ver declarada estar constituída a servidão de passagem, constituída por usucapião, que onera a dita área de terreno, com aproximadamente 12,00 m2) e sobre uma parcela de terreno de 12,00 m2 que daquele prédio faz parte (que é a tal parcela de terreno sobre a qual pretende agora que se declare constituída a servidão de passagem, em benefício daquele prédio) e que se condene a ali Ré (aqui apelada e também Ré) a reconhecer esse direito de propriedade, constituído por usucapião, e a restituir-lhes aquela parcela de terreno (com aproximadamente 12,00 m2 de área) e a absterem-se de quaisquer atos que impeçam ou diminuíam a utilização da mesma pelos Autores.
A causa de pedir nesta ação são os atos possessórios conducentes à aquisição do direito de propriedade sobre o prédio, incluindo sobre a dita parcela de terreno, com a área aproximada de 12,00 m2, que alegadamente integrará esse prédio, por usucapião.
Destarte, como bem diz a 1ª Instância, a ação n.º 6088/17.8T8GMR é uma típica ação de reivindicação, em que arrogando-se titulares do direito de propriedade sobre o prédio que identificam nessa ação (que é o prédio alegadamente dominante na presente ação, e que se encontra identificado no art. 1º da petição inicial apresentado no âmbito da presente ação), de que fará parte a área de terreno com aproximadamente 12,00 m2 (que é a área de terreno sobre a qual, no âmbito da presente ação, estará constituída a servidão de passagem, em benefício daquele prédio), constituído por usucapião, os aí Autores (aqui Autora e apelante e seu, entretanto falecido marido), pretendem que a aí e aqui Ré (apelada) seja condenada a restituir-lhes a mencionada parcela de terreno.
Já a presente ação não configura uma ação de reivindicação, mas antes uma ação em que a apelante (Autora) pretende ver declarada que em benefício daquele prédio identificado no art. 1º da petição inicial, se encontra constituída, por usucapião, uma servidão de passagem, que onera a área de terreno, com aproximadamente 12,00 m2 (em relação à qual, naquela anterior ação, a aqui e aí Autora e marido, se arrogavam proprietários e que reivindicavam da Ré).
Dos presentes autos não consta a petição inicial da ação n.º 6088/17.8T8GMR, mas apenas cópia da sentença que foi proferida no âmbito dessa ação e, bem assim, certidão do acórdão confirmatório dessa sentença, com nota do respetivo trânsito em julgado, pelo que desconhecemos se no âmbito dessa anterior ação os aí Autores (aqui apelante e seu entretanto falecido marido) já pediam ou não a destruição do muro a que alude a alínea d) do petitório deduzido pela Autora (apelante) no âmbito dos presentes autos, ou se pediam também a entrega das chaves, a que alude a alínea c) do petitório da presente ação.
No entanto, contrariamente ao pretendido pela apelada, não há que confundir esses pedidos deduzidos no âmbito da presente ação, sequer o pedido deduzido nessa anterior ação, com o pedido nesta deduzido na alínea e) do aqui petitório, com aqueles que eventualmente foram deduzidos no âmbito daquela anterior ação.
Na verdade, os pedidos que a apelante deduz no âmbito da presente ação relativos à entrega da chave, à retirada/destruição do muro e à condenação da Ré a abster-se da prática de quaisquer atos que impeçam ou diminuam a utilização por parte da Autora da dita área de terreno, com a área de aproximadamente 12,00 m2, são uma decorrência de essas obras e conduta da Ré serem alegadamente impeditivas do exercício pela apelante (Autora) do direito de servidão de passagem, constituído por usucapião, que esta alega estar constituído em benefício do prédio que identifica no art. 1º da p.i., encargo esse que alegadamente se encontra constituído sobre a parcela de terreno com a área aproximadamente de 12,00 m2, que aquela identifica no art. 5º do mesmo articulado.
Já a ter a apelante (Autora) e o seu entretanto falecido marido, J. M., autores no âmbito da ação de reivindicação que correu termos sob o n.º 6088/17.8T8GMR, pedido que a aí e aqui Ré, destruísse o muro, lhes entregasse as chaves do mesmo portão e se abstivesse de quaisquer atos que impeçam ou diminuam a utilização da dita área de terreno, esses pedidos são uma decorrência da pretensa lesão do direito de propriedade, constituído por usucapião, sobre o prédio que identificam nessa ação (prédio que é o que nos presentes autos se encontra identificado no art. 1º da p.i.- prédio dominante), de que faz parte a identificada parcela de terreno, com aproximadamente 12,00 m2.
Destarte, ainda que naquela anterior ação os aí Autores tenham pedido que a aí e aqui Ré destruísse o muro, lhes entregasse as chaves do portão e se abstivesse de quaisquer atos que impeçam ou diminuam a utilização por parte dos Autores da área de terreno, com aproximadamente 12,00 m2, pedidos esses a que aludem os pedidos deduzidos pela aqui Autora nas alíneas c), d) e e) do petitório da presente ação, a causa de pedir que serve de fundamento a esses pedidos é totalmente distinta em ambas as ações – nestes autos, a causa de pedir de tais pedidos é a pretensão de lesão do alegado direito de servidão de passagem, constituído por usucapião, em benefício do prédio identificado no art. 1º da p.i. (prédio dominante), sobre a parcela de terreno identificada no art. 5º da p.i. (“parcela” serviente), enquanto naquela anterior ação, a causa de pedir de tais pedidos é a alegada lesão do direito de propriedade, constituído por usucapião, de que são pretensos titulares a aí e aqui Autora e o seu entretanto falecido marido, J. M., sobre o prédio, que é o prédio que se encontra identificado no art. 1º da p.i, na presente ação, que alegadamente integrava aquela parcela de terreno, com aproximadamente 12,00 m2 de área.
Destarte, entre a presente ação e aquela anterior não existe identidade de causas de pedir, nem sequer de pedidos, mas quando muito, no que aos pedidos respeita, poderá ocorrer uma parcial identidade de pedidos, mas que assentam em causas de pedir totalmente distintas.
Deste modo, tal como também foi decidido pela 1ª Instância, entre a presente ação e aquela outra não ocorre a exceção dilatória do caso julgado, na sua dimensão negativa, de proibição de repetição da anterior causa, porquanto a presente ação não é repetição da ação de reivindicação, já discutida e decidida, por decisão de mérito transitada em julgado.
Avançando. No ordenamento jurídico nacional vigora a denominada teoria da substanciação (n.º 4 do art. 581º do CPC), nos termos do qual ao autor não basta indicar, na petição inicial, o direito a que se arroga em juízo, mas é indispensável que aquele especifique o facto ou factos constitutivos desse direito, alegando os factos essenciais constitutivos desse direito, pelo que nas ações reais não basta ao autor alegar ser titular de um determinado direito real, mas terá impreterivelmente de enunciar a causa específica do pedido, ou seja, o concreto título aquisitivo do direito: um determinado ato jurídico de compra e venda, de doação, de sucessão ou a usucapião (19).
Deste modo, a circunstância de um determinado autor ter instaurado uma ação de reivindicação com fundamento num determinado contrato de compra e venda e dessa ação vir a improceder, não o impede de, posteriormente, instaurar uma nova ação de reivindicação, tendo por objeto o mesmo prédio e contra o mesmo réu, com fundamento num outro título, isto é, noutra causa de pedir, por exemplo, a doação, a usucapião, etc.; assim como não é impeditiva daquele autor instaurar uma outra ação, contra o mesmo réu, com fundamento na mesma causa de pedir, mas pretendendo obter um outro efeito jurídico, ou seja, um outro pedido – na primeira ação o autor pretendia, por exemplo, obter a restituição do réu de um dada parcela de terreno, e na segunda ação pretende dele obter a restituição de uma outra parcela de terreno, que entretanto foi ocupada pelo último, ou que este já ocupava aquando da instauração da primeira ação, mas cuja restituição, nessa primeira ação, o autor se absteve de dele reivindicar.
Significa isto, que a circunstância de a aqui apelante (Autora) e o seu entretanto falecido marido, J. M., terem anteriormente instaurado uma ação de reivindicação contra a aqui Ré (apelada), que correu termos sob o n.º 6088/17.8T8GMR.G1, arrogando-se proprietários do prédio que agora identifica no art. 1º da p.i., no âmbito da presente ação (como prédio pretensamente dominante, isto é, beneficiário da alegada servidão de passagem, constituída por usucapião), e que desse prédio faz parte integrante a parcela de terreno, que agora identifica no art. 5º do mesmo articulado, no âmbito da presente ação (como parcela onerada pela servidão de passagem – serviente), por via de alegadamente terem adquirido esse direito de propriedade, sobre esse prédio e parcela de terreno, por usucapião, reivindicando da aqui e aí Ré essa parcela de terreno, e de terem visto essa sua pretensão, quanto a essa parcela de terreno, a ser julgada improcedente, por decisão de mérito transitada em julgado, não a impede agora de instaurar a presente ação, pretendendo que se reconheça e condene a Ré a isso ver reconhecido, que sobre aquela parcela de terreno se encontra constituída, por usucapião, uma servidão de passagem, a favor do prédio identificado no art. 1º da petição inicial, posto que entre ambas as ações não ocorre identidade de pedidos, nem sequer de causas de pedir, pelo que não atua a exceção do caso julgado na sua dimensão negativa, de proibição de repetição de ações, dado que essa repetição da anterior ação não ocorre no âmbito dos presentes autos.
Mas, salvo o devido respeito por entendimento contrário, diversamente do decidido pela 1ª Instância, também não atua a exceção do caso julgado, na sua dimensão positiva de proibição de contradição do anteriormente decidido, naquela primeira ação, por sentença de mérito transitada em julgado, isto é, não se verifica a exceção inominada da autoridade do caso julgado, uma vez que para que essa exceção dilatória, nessa dimensão positiva, se afirmasse, era indispensável que a presente ação estivesse numa relação de prejudicialidade em relação à ação de reivindicação que correu termos sob o n.º 6088/17.8T8GMR, que julgou improcedente, por decisão de mérito transitada em julgado, a restituição pela aqui e aí Ré da parcela de terreno, com aproximadamente 12,00 m2 de área, aos Autores, os quais alegavam terem adquirido o respetivo direito de propriedade por usucapião.
Com efeito, não se vislumbra que entre ambas essas ações ocorra qualquer relação de prejudicialidade, de modo que a procedência da presente ação, com o consequente reconhecimento que sobre essa parcela de terreno com a área aproxima de 12,00 m2, se encontra constituída, por usucapião, uma servidão de passagem, em benefício do prédio identificado no art. 1º da p.i., retirasse o fundamento ou contrariasse o decidido, em definitivo, naquela outra ação, porquanto, da circunstância de naquela anterior ação se ter julgado, em definitivo, que os aí Autores não adquiriram a propriedade, por usucapião, sobre essa parcela de terreno e, consequentemente, que não são proprietários desta, com fundamento nesse título de aquisição (a usucapião), não significa que sobre essa mesma parcela de terreno não se encontre constituída, por usucapião, uma servidão de passagem em benefício do prédio desses mesmos autores.
De resto, nessa anterior ação a aí e aqui Ré não deduziu reconvenção, pelo que nela, contrariamente ao decidido pela 1ª Instância, não foi reconhecido o direito de propriedade da Ré sobre a dita parcela de terreno.
E não tendo sido deduzida reconvenção, os aí Autores nunca assumiram nela a posição de reconvindos, isto é, de réus, pelo que quanto a eles nunca vigorou o princípio da preclusão a que alude o art. 573º do CPC.
Na verdade, o princípio da preclusão a que apela a 1ª instância em sede de decisão recorrida para fundamentar o por si aí decidido, vale para o réu (art. 573º do CPC), mas não para o autor, isto é, é o réu que, na contestação, sob pena de preclusão, tem de deduzir toda a defesa que possua contra a pretensão de tutela judiciária (pedido) que o Autor contra si formula, pelo que, da circunstância de no âmbito de naquela anterior ação, os aí Autores não terem invocado o direito de servidão de passagem, alegadamente constituído por usucapião, sobre a mencionada área de terreno, com aproximadamente 12,00 m2, constituída em benefício do prédio identificado no art. 1º da p.i., não determina para os mesmos qualquer consequência jurídica, quer em sede de preclusão, quer de caso julgado.
Neste sentido escreve Teixeira de Sousa: “O âmbito da preclusão é substancialmente distinto para o autor e para o réu. Quanto ao autor, a preclusão é definida exclusivamente pelo caso julgado: só ficam precludidos os factos que se referem ao objeto apreciado e decidido na sentença transitada. Assim, não está abrangida por essa preclusão a invocação de uma outra causa de pedir para o mesmo pedido, pelo que o autor não está impedido de obter a procedência da ação com base numa distinta causa de pedir. Isto significa que não há preclusão sobre factos essenciais, ou seja, sobre factos que são suscetíveis de fornecer uma nova causa de pedir para o pedido formulado. Mas está precludida a invocação pelo autor de factos que visam completar o objeto da ação anteriormente apreciada, mesmo que com uma decisão de improcedência. (…). Quanto ao âmbito da preclusão que afeta o réu, há que considerar que lhe incumbe o ónus de apresentar toda a defesa na contestação, pelo que a preclusão que o atinge é independente do caso julgado: ficam precludidos todos os factos que podiam ter sido invocados como fundamento dessa contestação, tenham ou não qualquer relação com a defesa apresentada e, por isso, com aquela que foi apreciada pelo tribunal. Suponha-se que o autor alegou a prescrição do crédito do autor e não invocou o seu pagamento; a alegação deste último está definitivamente precludida, pelo que essa parte não pode pretender a sua apreciação numa outra ação com o fundamento de que o tribunal da causa só desatendeu a prescrição invocada” (20).
Deste modo e em síntese, conforme cremos sobejamente demonstrado supra, contrariamente ao decidido pela 1ª Instância, entre a presente ação e a que correu termos no Juízo Central Cível de Guimarães, Juiz 3, sob o n.º 6088/17.8T8GMR, não intercede a exceção dilatória inominada da autoridade do caso julgado, pelo que se impõe revogar o despacho saneador recorrido e determinar o prosseguimento dos autos.
B.3- Do convite ao aperfeiçoamento.
Pretende a apelante que se impõe que esta Relação determine à 1ª Instância que a convide a aperfeiçoar o seu articulado, isto é, a petição inicial.
Acontece que, conforme é bom de ver, sendo os recursos meios específicos de impugnação de decisões judiciais, essa questão não pode ser conhecida por esta Relação.
Na verdade, o convite ao aperfeiçoamento dos articulados previsto no n.º 4 do art. 590º do CPC, é um verdadeiro dever legal do juiz, pelo que revogada a decisão recorrida, que julgou procedente a exceção dilatória inominada da autoridade do caso julgado, e determinado o prosseguimento dos autos, é à 1ª Instância que cumpre aferir se deverá ou não formular esse convite à apelante (Autora), ou antes se se está perante um caso de ineptidão da petição inicial, por falta e, inclusivamente, por ininteligibilidade da causa de pedir.
Note-se que o convite ao aperfeiçoamento destina-se apenas a corrigir articulados que, cumprindo os requisitos mínimos, se revelem, contudo, insuficientes, deficientes ou imprecisos em termos de fundamentação da pretensão, não servindo, pois, para salvar petições afetadas pelo vício da ineptidão resultante da falta ou ininteligibilidade da causa de pedir (art. 186º do CPC) (21).
Compulsada a petição inicial, verifica-se que nela a apelante (Autora), não identifica o prédio alegadamente onerado com a servidão de passagem (isto é, o prédio serviente), limitando-se, no art. 5º da p.i., a alegar que essa pretensa servidão de passagem se processa por um trato de terreno, com uma área de aproximadamente 12,00 m2, quando nos termos do disposto no art. 1543º do CC, servidão predial é o encargo imposto num prédio (não um encargo imposto sobre um trato de terreno) em proveito exclusivo de outro prédio pertencente a dono diferente; diz-se serviente o prédio sujeito à servidão e dominante o que dela beneficia.
Acresce que, no ponto 15º da petição inicial, a Autora alega que “a parcela correspondente aos 12,00 m2 de terreno que possibilita o acesso à via pública, quer pelo imóvel pertencente à Autora, quer pelo imóvel pertencente à Ré, não é propriedade exclusiva de qualquer uma das partes – quer Autora quer Ré”, ou seja, para além de não identificar qual o concreto prédio propriedade da Ré de que faz parte o dito trato de terreno, com a área aproximadamente de 12,00 m2, por onde se processa a pretensa servidão de passagem, constituída por usucapião (isto é, não identifica o prédio serviente), que pretende estar constituída em benefício do prédio dominante (prédio identificado no art. 1º da p.i.), contraditoriamente com a noção de servidão predial, que tem por base a consideração que o prédio dominante (no caso, o identificado no art. 1º da p.i.) e o prédio serviente (não identificado, vindo apenas alegado que a servidão se processa por um trato de terreno com aproximadamente 12,00 m2 de área), têm de pertencer a proprietários distintos, a Autora acaba por alegar que essa área de terreno por onde se processará a pretensa servidão de passagem e que integrará o prédio serviente, é propriedade da Ré e da própria Autora, no que incorreu no eventual vício da ininteligibilidade da causa de pedir.
Acresce que a Autora não alega, na petição inicial, o concreto local por onde se processa essa servidão de passagem no referido trato de terreno com a área de aproximadamente 12,00 m2, e que esse local se revela por sinais visíveis e permanentes, quando, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 1548º do CC, as servidões não aparentes não podem ser constituídas por usucapião.
Destarte, caberá à 1ª Instância analisar a petição inicial e verificar se esta, designadamente, perante as considerações que se acabam de explanar, é ou não suscetível de ser aperfeiçoada, ou se antes é de todo imprestável, por padecer do vício da ineptidão, por eventual ausência de alegação da causa de pedir e ininteligibilidade dessa causa de pedir e, em função desse seu juízo, convidar a Autora a corrigir a petição inicial e a fazer intervir os restantes herdeiros ou comproprietários do prédio identificado no art. 1º da petição inicial, sanando, assim, o vício da ilegitimidade ativa da Autora para instaurar a presente ação desacompanhada daqueles restantes herdeiros ou comproprietários desse prédio, ou, caso conclua que a petição inicial é inepta, após observância do contraditório (concedendo às partes prazo para se pronunciarem quanto a esse vício, sob pena de, não o fazendo, incorrer no vício da nulidade, por violação do princípio do contraditório, a que alude o n.º 3 do art. 3º do CPC), proferir decisão nesse sentido.
Decorre do exposto, improceder este fundamento de recurso.
Termos em que, em síntese, procede a presente apelação, impondo-se revogar a decisão recorrida, que julgou procedente a exceção dilatória inominada da autoridade do caso julgado, e determinar o prosseguimento dos autos, devendo a 1ª Instância, adotar as cautelas supra enunciadas.
*
Decisão:
Nesta conformidade, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, acordam em julgar a presente apelação procedente e, em consequência:
- revogam a decisão recorrida, que julgou procedente a exceção dilatória inominada da autoridade do caso julgado, e determinam o prosseguimento dos autos, devendo a 1ª Instância adotar as cautelas supra enunciadas.
*
Custas pela apelada (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
Notifique.
*
Guimarães, 20 de janeiro de 2022
Assinado eletronicamente pelos Juízes Desembargadores:
José Alberto Moreira Dias (relator)
Rosália Cunha (1ª Adjunta)
Lígia Venade (2ª Adjunta)
1. Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”, vol. II, 2015, Almedina, págs. 395 e 396.
2. Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “Manuel de Processo Civil”, 2ª ed., Coimbra, 1985, pág. 104; Domingues de Andrade, “Noções Elementares de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1979, págs. 74 e 75, que define pressupostos processuais como “requisitos de que depende dever o juiz proferir decisão sobre o mérito da causa, concedendo ou denegando a providência judiciária requerida pelo demandante. Na falta deles o juiz só pode e deve declarar isso mesmo, abstendo-se de estatuir sobre o mérito. (…). Podem ser positivos (personalidade e capacidade judiciária, etc.) ou negativos (não haver litispendência, etc.) e gerais ou especiais (privativos de certos tipos de processo)”.
3. Paulo Pimenta, “Processo Civil Declarativo”, 2014, Almedina, pág. 69.
4. Teixeira de Sousa, “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, Lex, Lisboa 1997, págs.152 a 154.
5. Teixeira de Sousa, ob. cit., págs. 152 e 153.
6. Teixeira de Sousa, ob. cit., págs. 156 a 164.
7. Oliveira Ascensão, “Sucessões”, 4ª ed., 1989, pág. 496; Acs. RC. de 15/06/2010, Proc. 690/2002.C1; de 16/11/2010, Proc. 51/10.7TBPBC.C1; RP. de 24/02/2014, Proc. Proc. 7/11.2TBBAO.P1, in base de dados da DGSI.
8. Ac. RG. de 25/02/2008, CJ. 2008, t. 1º, pág. 293: “(…) a herança já partilhada deixou de existir como património autónomo, dissolveu-se ou diluiu-se nos patrimónios dos herdeiros, passando cada um dos bens que a integraram a confundir-se com os demais bens do herdeiro a quem foi adjudicado. Após a partilha deixa de fazer sentido aludir a bens da herança, pois cada um desses bens entrou na esfera jurídica patrimonial do herdeiro a quem coube, perdendo qualquer ligação à herança, enquanto património autónomo, deixou de ter existência jurídica”.
9. Neste sentido Domingues de Andrade, “Noções Elementares de processo Civil”, Coimbra Editora, 1979, pág. 77, que pondera que a ação confessória de servidão tem de ser intentada “contra todos os comproprietários do prédio serviente, porque a servidão, sendo indivisível (art. 1546º do CC), não pode existir só quanto a algum deles. Então a sentença que ali fosse proferida só poderia ter entre as partes um efeito obrigacional, surtindo pois algum efeito útil, mas não o normal”.
10. Teixeira de Sousa, ob. cit., págs. 359 a 361.
11. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 2º, 3ª ed., Almedina, pág. 581: “As partes, tal como o autor as determina ao propor a ação declarativa (contra o réu), devem ser aquela que, perante os factos narrados na petição apresentada em juízo, o direito substantivo considera como as que se podem ocupar do objeto do processo, sob pena de ilegitimidade processual (n.ºs 2 e 3 do art. 30º). Esta ilegitimidade é sanável quando resulta de não ter demandado, ou não ter sido demandada, determinada pessoa, que devia ser parte juntamente com o autor ou o réu, ou seja, em caso de preterição de litisconsórcio necessário (arts. 33º, 261º e 316º, n.º 1 do CPC).
12. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, 2ª ed., Almedina, 697 a 708, com citação de múltipla jurisprudência.
13. Miguel Teixeira de Sousa, “O Objeto da Sentença e o Caso Julgado Material”, BMJ, 325, págs.49 e segs..
14. Ac. STJ, de 21/03/2012, Proc. n.º 3210/07.6TCLRS.L1, S1, in base de dados de dados da DGSI. No mesmo sentido Acs. STJ. de 13/12/2007, Proc. 07A3739; 15/01/2013, Proc. 816/09.2TBAGD.C1.S1, base de dados DGSI.
15. Miguel Teixeira de Sousa, in ob. cit., págs. 578 e 579.
16. Manuel Andrade, in ob. cit., pág. 324; Ac. STJ. de 08/04/2010, Proc. 2294/06.9TVPRT.S1, in base de dados da DGSI.
17. Miguel Teixeira de Sousa, ob. cit., pág. 584.
18. Lebre de Freitas, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 2º, 2ª ed., pág. 354.
19. Ferreira de Almeida, ob. cit., págs. 72 a 73.
20. Teixeira de Sousa, ob. cit., págs. 585 e 586.
21. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, ob. cit., pág. 703, nota 25.