RECURSO DE APELAÇÃO
REJEIÇÃO
FALTA DE CONCLUSÕES
Sumário

1. As conclusões da motivação recursória não podem limitar-se a uma mera afirmação de procedência do pedido da recorrente, com indicação das normas jurídicas violadas, pois o art. 639.º, n.º 1, do C.P.C., exige que nelas se indiquem resumidamente os fundamentos por que se pede a revogação, alteração ou anulação da decisão em crise.
2. Não apresenta conclusões a apelante que se limita a afirmar, ainda que sob o título como tal denominado, a afirmação de que «a decisão recorrida violou o disposto nos nºs. 1 e 2 do artigo 716º e nos arts. 726º nº 3, alínea c), do Código de Processo Civil, o disposto também no nº 4 do referido normativo legal, o disposto também nos artigos 358º a 361º, e igualmente no artigo 297º do referido normativo legal, donde, atento o que dos autos consta, e por violação dos citados preceitos, o recurso dever ser julgado procedente e provado e a sentença recorrida ser substituída por acórdão que julgue os embargos improcedentes e determine que o Tribunal em 1ª Instância ordene o normal e regular prosseguimento dos autos, com o prosseguimento da execução, desta forma se fazendo correcta e exacta interpretação e aplicação da lei, se fazendo, JUSTIÇA.»

Texto Integral

Acordam em Conferência na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

No presente recurso, foi pelo relator proferido o seguinte despacho, datado de 3 de novembro de 2021:
«IB veio, por apenso à execução que lhe movida por C, S.A., deduzir oposição através dos presentes embargos de executado, nos quais foi proferida sentença que os julgou procedentes, declarando, em consequência, extinta a execução.
Inconformada, a embargada interpôs o presente recurso de apelação.
Por entender que a alegação não continha conclusões nos termos e para os efeitos dos arts. 637.º, n.º 2 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil[1], o que deveria ter determinado a rejeição liminar do recurso, nos termos do art. 641.º, n.º 2, al. b).
Não tendo ocorrido essa rejeição liminar, a ausência de conclusões determina o não conhecimento do recurso por este tribunal ad quem (art. 652.º, n.º 1, al. b)).
Cumprido o disposto no art. 655.º, n.º 1, veio a recorrente afirmar que “as alegações apresentadas nos autos contêm, sob o respectivo número “IV”, as conclusões respectivas”.
Sob o capítulo IV da peça recursória consta o seguinte:
“IV
CONCLUSÃO
Em conclusão, portanto, a decisão recorrida violou o disposto nos nºs. 1 e 2 do artigo 716º e nos arts. 726º nº 3, alínea c), do Código de Processo Civil, o disposto também no nº 4 do referido normativo legal, o disposto também nos artigos 358º a 361º, e igualmente no artigo 297º do referido normativo legal, donde, atento o que dos autos consta, e por violação dos citados preceitos, o recurso dever ser julgado procedente e provado e a sentença recorrida ser substituída por acórdão que julgue os embargos improcedentes e determine que o Tribunal em 1ª Instância ordene o normal e regular prosseguimento dos autos, com o prosseguimento da execução, desta forma se fazendo correcta e exacta interpretação e aplicação da lei, se fazendo,
JUSTIÇA.”
Nos termos do n.º 2 do art. 637.º “o requerimento de interposição do recurso contém obrigatoriamente a alegação do recorrente, em cujas conclusões deve ser indicado o fundamento específico da recorribilidade; (...).”
Por sua vez, estatui o n.º 1 do art. 639.º que “o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.”
As conclusões têm a função de individualizar o objeto do recurso, indicando o(s) fundamento(s) específico(s) da recorribilidade[2].
As conclusões servem, pois, para sintetizar os fundamentos pelos quais se defende a revogação, a modificação ou a anulação da decisão recorrida.
As conclusões devem corresponder a fundamentos que, com o objetivo de obter a revogação, alteração ou anulação da decisão recorrida, se traduzam na enunciação de verdadeiras questões de direito (ou de facto) cujas respostas interfiram com o teor da decisão recorrida e com o resultado pretendido.
As conclusões devem elencar os passos fundamentais que, na perspetiva do recorrente, deveriam ter sido dados para atingir um resultado diverso.
Em suma, as conclusões devem constituir um resumo dos fundamentos ou discordância com o decidido.
Ora, aquilo a que a apelante chama “conclusões”, não são conclusões nos termos e para os efeitos dos citados arts. 637.º, n.º 2 e 639.º, n.º 1, do C.P.C., pois não faz qualquer indicação resumida dos fundamentos por que pede a revogação da sentença recorrida, limitando-se a indicar as normas jurídicas que, em seu entender, foram violadas.
A falta de conclusões, uma vez que não determinou a rejeição liminar do recurso (art. 641.º, n.º 2, al. b)), constitui agora circunstância obstativa do seu conhecimento (art. 652.º, n.º 1, al. b)).
Pelo exposto, o mesmo é dizer, por falta de conclusões, rejeito o presente recurso.
Custas pelo recorrente, cuja taxa de justiça fixo em 2 UC’s.
Notifique.»
*
Notificada dessa decisão, veio a apelante apresentar o seguinte requerimento:
«C, S.A, nos autos de recurso à margem referenciados, em que é recorrente e em que é recorrida IB, tendo sido notificado, pelo ofício à margem mencionado, datado de __.__.___, do despacho de V.Exa proferido aos __.__.___, com a referência 17584890, despacho que rejeitou o recurso, por entender e considerar que o mesmo não continha as conclusões à alegação oportunamente apresentada, porque se não conforma com o referido despacho, requer a V.Exa que se digne submeter o caso à Conferência, nos termos e de harmonia com o disposto no nº 3 do artigo 652º do Código de Processo Civil para que sobre a questão recaia Acórdão.»
*
Como afirma João Aveiro Pereira, O ónus de concluir nas alegações de recurso em processo civil, in O Direito, 141.º, 2009, II, 309-337), de harmonia com o acórdão do S.T.J. de 19/02/2008, Proc. n.º 08A194 (Sebastião Póvoas), as conclusões não podem limitar-se a uma singela «afirmação de procedência do pedido da recorrente, antes contendo todo um raciocínio lógico-jurídico a contrariar as razões adoptadas no aresto posto em crise (...)».
Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, 5º vol. reimpressão, Coimbra Editora, 1981, pág. 360, lembra o caso do ac. do STJ de 10/12/1943 que decidiu que «não satisfaz ao disposto no art. 690.º [atual art. 639.º, n.º 1, do C.P.C./13] a alegação do recorrente que, a título de conclusão, se limita a solicitar a absolvição do pedido e a revogação da sentença apelada, pois o artigo exige que nas conclusões se indiquem resumidamente os fundamentos por que se pede a alteração ou anulação da sentença ou despacho».
Como se afirma o Ac. do TRC, de 02.12.1992, sumariado no B.M.J. 422.º-441, citado por João Aveiro Pereira, «alegar não é só apresentar um requerimento com a forma de alegação, mas sim atacar a decisão recorrida e dizer das razões por que se discorda dela, para serem apreciadas no tribunal superior»[3].
Ora, no caso concreto, a apelante limita-se a afirmar, como se viu, que «a decisão recorrida violou o disposto nos nºs. 1 e 2 do artigo 716º e nos arts. 726º nº 3, alínea c), do Código de Processo Civil, o disposto também no nº 4 do referido normativo legal, o disposto também nos artigos 358º a 361º, e igualmente no artigo 297º do referido normativo legal, donde, atento o que dos autos consta, e por violação dos citados preceitos, o recurso dever ser julgado procedente e provado e a sentença recorrida ser substituída por acórdão que julgue os embargos improcedentes e determine que o Tribunal em 1ª Instância ordene o normal e regular prosseguimento dos autos, com o prosseguimento da execução, desta forma se fazendo correcta e exacta interpretação e aplicação da lei, se fazendo, JUSTIÇA.”
Em suma, e pelo exposto, a apelante não apresentou conclusões, nos termos do art. 639.º, n.º 1 do C.P.C., ou seja, não indicou os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
*
DECISÃO:
Pelo exposto, acordam os juízes que integram a 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, em manter a decisão singular submetida à Conferência.
Custas pela apelante - arts. 527.º, n.ºs 1 e 2, 607º, n.º 6 e 663.º, n.º 2, todos do C.P.C.

Lisboa, 21 de dezembro de 2021
José Capacete
Carlos Oliveira
Diogo Ravara
_______________________________________________________
[1] Diploma a que pertencem todas as disposições legais que vierem a ser citadas sem indicação da respetiva fonte.
[2] Cfr. RUI PINTO, Manual do Recurso Civil, Volume I, AAFDL Editora, 2020, p. 293.
[3] Cfr. a este propósito o Ac. do TRL de 23.03.2017, Proc. n.º 1297/12.9T2AMD-A.L1-2 (Pedro Martins), in www.dgsi.pt.