APENSAÇÃO DE PROCESSOS
FASES
CELERIDADE PROCESSUAL
Sumário


Aa apensação de sete causas a julgar simultaneamente e com recurso a extensos meios de prova, só em parte é coincidente entre todas elas, mostra a inconveniência da apensação

Texto Integral



ACORDAM NA 1.ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA
I.Relatório
No dia 07.09.2020, a interveniente AGEAS PORTUGAL – Companhia de Seguros, SA, apresentou um requerimento com o seguinte teor:
“1º No Juizo 2 desse Tribunal, sob o nº 2311/18.0T8PTM corre termos ação declarativa de condenação pelos mesmos factos alegados neste autos pela AA., conforme cópia da p.i. apresentada naquele processo , que se anexa sob o nº 1 e aqui se dá por integralmente reproduzida .
2º Como RR nesses autos 2311/18.0T8PTM , surgem os RR “Portugal Retail Europark FUND”, “Fund Box – Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, SA” e “Central de Borla –Comércio de Utilidades, SA”, , bem assim a Chamada Ageas , cuja intervenção foi deferida após requerimento deduzido pela sua segurada e ora também R, “De Borla”.
3º Ora, tais RR são-no também nos autos sub iudice, para além dos demais RR aqui melhor identificados.
4º As AA de forma coligada e cada uma de per si, acionaram as RR, pedindo a sua condenação nos valores já liquidados por cada uma, bem assim de outros por liquidar, mormente, juros.
5º Também a A. nos autos 2311/18.0T8PTM demandou as RR identificadas no anterior ponto 2, apresentado a mesma causa de pedir e o mesmo tipo de pedido, ainda que com quantum distinto.
6º A R. “De Borla” apresentou nesses autos a sua contestação, praticamente idêntica à apresentada nestes autos e chamando aos autos a Seguradora Ageas, que contestou os pedidos
7º Face às Partes em ambos os processo serem parcialmente distintas, ainda que a causa de pedir e o pedido sejam semelhantes em ambos os processos , entende-se não haver lugar à invocação de litispendência.
8º Contudo, entende-se estarmos perante a situação prevista no artº 267 do CPCivil.


9º Como refere o Tribunal da Relação de Coimbra, em perclaro Acórdão de 21.05.2013 “a finalidade da apensação de ações é a economia da atividade processual e a uniformidade de julgamento que pode proporcionar a circunstância da causa de pedir ser a mesma e única ou se os pedidos estarem numa relação de dependência nas ações apensadas” (vd. www.dgsi.pt/trc.nsf)
10º E adianta-se ainda neste Acórdão (proc. 4044/07.3TJCBR-C.C1) “ A uniformidade de julgamento, evitando que as causas em questão que versam sobre questões idênticas ou conexas sejam objeto de julgamentos dispares, apresenta-se como a maior vantagem da apensação de ações, pois serão objecto de uma única decisão proferida pelo mesmo juiz”.
11º E é o caso em ambos os processos.
12º Com efeito, face ao disposto no artº 36, nº 1 do CPCivil, a AIG, A. nos autos 2311/18.0T8PTM, podia ter-se coligado com as suas congéneres , AA nos autos sub iudice, não as tendo acompanhado por razões que se desconhecem.
13º Na verdade, basta atentar nas petições iniciais de ambos os processos para se constatar que as causas de pedir são as mesmas (incêndio no Retail Park com alegado inicio na loja da “De Borla”), os pedidos idênticos, apenas variando no quantum indemnizatório,
14º Conduzindo a que tenham de ser apreciados os mesmos factos para decidir como é de Direito.
15º Aliás, mesmo que a causa de pedir não fosse a mesma – e entendemos que o é – sempre haveria lugar a coligação ativa, como bem refere o Acórdão de 1.02.05 do Tribunal da Relação do Porto que defende “ para a a coligação ativa ou passiva não se exige que a causa de pedir seja a mesma, nem que os factos sejam exatamente os mesmos, bastando que a apreciação dos pedidos principais dependa essencialmente da apreciação dos mesmos factos” (vd. JTRP00037668.dgsi.net).
16º Ora, em ambos os processos a solução de Direito passa pela apreciação dos mesmos factos.
17º Estando reunidos os pressupostos da coligação , entende-se ser possível a apensação dos autos 2311/18.0T8PTM aos presentes autos, face aop disposto estavam, como estão , reunidos.
18º Deste modo, irá requerer-se no processo próprio, face ao disposto no artº 267, nº 3 do CPCiivl, a apensação destes autos (artº 267, nºs 1 e 2 do CPCivil).
19º A Requerente, enquanto Chamada/R., é parte em ambos os autos, (doc. 2) sendo que este Juízo é o competente para decidir sobre o ora requerido (artº 267, nºs 2 e 3 do CPCivil).
20º O processo nº 2311/18.0T8PTM encontra-se ainda na fase dos articulados, pois só agora a ora Requerente e R, naqueles autos apresentou a sua contestação,
21º Entende-se, pois, qua a apensação ora requerida é oportuna e não colide com a evolução processual de ambos os processos, tanto mais que em nenhum deles houve ainda lugar à audiência preliminar.

22º Como refere o Supremo Tribunal de Justiça num seu Acórdão de 12. 05. 2016 “ com a apensação dos processos visam-se os benefícios processuais que se obteriam se as açções tivessem sido propostas em conjunto ab initio, ficando as várias causas unificadas num só processo” (vd. Proc. 2808/07, Sumários, Maio de 20’16, pg42).
23º Face ao exposto, requer -se a V.Exª que seja decidida a apensação dos autos nº 2311/18.0T8PTM em curso no Juiz 2 desse Tribunal aos presentes autos nº 2921/17.2T8PTM, nos termos do disposto no artº 267, nºs 1 e 2 do CPCivil.”.
No dia 09.10.2020, AIG EUROPE LIMITED – SUCURSAL EM PORTUGAL, apresentou o seguinte requerimento:
“1. A ora exponente é A. no âmbito dos autos que, sob, o nº 2311/18.0T8PTM, correm termos no juiz 2 deste mesmo juízo central de Portimão, sendo que até ao momento desconhecia em absoluto a pendência dos presentes autos, os quais que lhe foram dados a conhecer através da Contestação da AGEAS aí apresentada (v. Doc. 1, adiante junto e que aqui se dá por integralmente reproduzido – Autos de Processo nº 2311/18.0T8PTM ).
2. A referida ação foi apresentada em juízo em 2018.09.15, ou seja, após a entrada em juízo dos presentes autos, e já foram apresentadas todas as contestações e respetivas respostas às mesmas, aguardando-se apenas marcação da audiência prévia que foi inclusive requerida pela A. e RR. nesses mesmos autos (v. Doc. 1, adiante junto e que aqui se dá por integralmente reproduzido).
3. No âmbito da referida ação nº 2311/18.0T8PTM, a Tríplice processual existente é, em síntese, a seguinte:
a) Sujeitos:
- “AIG EUROPE LIMITED – SUCURSAL EM PORTUGAL”, na qualidade de Autora, seguradora credora de montantes indemnizatórios pagos ao Continente no âmbito de apólices de seguro e por conta de danos e prejuízos emergentes do incêndio de 2012.09.23 que destruiu o Portimão Retail Park, em sede de sub-rogação legal e convencional;
- “PORTUGAL RETAIL EUROPARK FUND”, na qualidade de Réu, proprietário do empreendimento comercial e instalações do Portimão Retail Park, responsável solidário pelos danos verificados em consequência do incêndio de 2012.09.23;
- “FUND BOX – SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO, S.A. ”, na qualidade de Réu, sociedade administradora , representante daquele, gestora e administradora do Portimão Retail Park, responsável solidária pelos danos verificados em consequência do incêndio de 2012.09.23; e
- “AGEAS PORTUGAL – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.”, na qualidade de Interveniente Acessória, seguradora das RR., responsável solidária pelos danos verificados em consequência do incêndio de 2012.09.23.
b) Pedidos:

- “Ser a A. declarada sub-rogada (…) nos direitos do Continente contra as RR.”, “Serem as RR. condenadas a pagar à A. a quantia de € 13.033.750,22 (…) paga ao Continente por conta dos danos e prejuízos indicados (…) e “juros legais vencidos e vincendos”.
c) Causa de Pedir:
- Factos e Normas Jurídicas relativas a relações jurídicas estabelecidas no âmbito de contratos de seguro outorgados entre as partes;
- Factos e Normas Jurídicas relativas a relações jurídicas estabelecidas no âmbito do instituto da Sub-rogação Legal e Convencional;
- Factos e Normas Jurídicas relativas a montantes pagos pela A. no âmbito das relações jurídicas estabelecidas nos contratos de seguro e reclamados nos presentes autos por Danos e Prejuízos emergentes do incêndio de 2012.09.23, da total responsabilidade solidária dos RR. e Interveniente em causa (v. Docs. ……, adiante juntos)
No caso sub judice, considerando a Tríplice existente nos presentes autos e a ação que, sob o nº 2311/18.0T8PTM, corre termos no Juiz 4 deste mesmo juízo Central de Portimão, verifica-se assim de forma clara o seguinte:
- As partes ativas (seguradoras) são idênticas e/ou semelhantes e agem em sub- rogação, peticionando a condenação solidária dos mesmos RR., com quantuns diferentes;
- A causa de pedir e pedidos são absolutamente semelhantes e/ou idênticas, implicando a análise da mesma factologia e fundamentos jurídicos;
- Ao contrário do alegado pelos RR., na data atual, a fase dos articulados já findou em ambos os autos, sendo que, apesar de algumas exceções já estarem aqui decididas, ambos aguardam de forma concomitante a marcação da audiência prévia que inclusive as partes solicitaram em ambos os processos judiciais de forma espontânea;
- Na prática, foram apresentadas petições iniciais e contestações absolutamente semelhantes, tanto nos seus fundamentos como na respetiva prova a produzir.
4. Ora, nos termos do art. 267º do CPC:
“ 1 - Se forem propostas separadamente ações que, por se verificarem os pressupostos de admissibilidade do litisconsórcio, da coligação, da oposição ou da reconvenção, pudessem ser reunidas num único processo, é ordenada a junção delas, a requerimento de qualquer das partes com interesse atendível na junção, ainda que pendam em tribunais diferentes, a não ser que o estado do processo ou outra razão especial torne inconveniente a apensação.
2 - Os processos são apensados ao que tiver sido instaurado em primeiro lugar, salvo se os pedidos forem dependentes uns dos outros, caso em que a apensação é feita na ordem da dependência, ou se alguma das causas pender em instância central, a ela se apensando as que corram em instância local.


3 - A junção deve ser requerida ao tribunal perante o qual penda o processo a que os outros tenham de ser apensados.”
Sobre este normativo, a nossa jurisprudência e doutrina tem vindo a decidir e a entender de forma unanime o seguinte:
a) “A finalidade da apensação de acções é a economia de actividade processual e a uniformidade de julgamento que pode proporcionar a circunstância da causa de pedir ser a mesma e única, ou de os pedidos estarem numa relação de dependência nas acções apensadas.
A junção dos processos encontra o seu fundamento na conexão existente entre eles, tendo como objectivos a economia de actividade processual e a coerência ou a uniformidade de julgamento.
A economia da actividade processual traduz-se numa economia de meios resultante da instrução e julgamento das causas apensadas, pois as mesmas, a partir da apensação são tratadas processualmente como uma única, embora sem perder a sua autonomia, sendo esta a razão justificativa da junção por conexão.
A uniformidade de julgamento, evitando que as causas em questão que versam sobre questões idênticas ou conexas sejam objecto de julgamentos díspares, apresenta-se como a maior vantagem da apensação de acções, pois serão objecto de uma única decisão proferida pelo mesmo juiz.
Da lei não resulta directamente qual o momento até ao qual pode ser requerida ou ordenada a apensação.
No entanto, tendo presente os fundamentos que a justificam – a economia de actividade e a uniformidade do julgamento – o julgamento da causa que se pretende apensar ou da causa a que a apensação se devia fazer, apresenta-se-nos como o limite” (v. Ac. RC de 2013.05.21, Proc. 4044/07.3TJCBR-C.C1, www.dgsi.pt);
b) “Se o requerimento de apensação de dois processos ao abrigo do disposto no artigo 275º do Código de Processo Civil for indeferido porque o estado do processo ou outra razão especial torna inconveniente a apensação (nº 1, parte final, do art.º 275º) e entretanto esse obstáculo for removido ou deixar de se verificar, nada obstará a que a pretensão de apensação, atendendo aliás às vantagens de economia processual que o preceito tem em vista, seja de novo reapreciada” (v. Ac. RL 2007.11.15, Proc. 5207/2007-2, www.dgsi.pt).
c) “A reforma do processo civil veio aliviar sobremaneira os requisitos de que depende a apensação de acções, considerando que a mesma pode promover maior eficácia do processo e economia de meios, além de potenciar decisões logicamente compatíveis, evitando contradição de julgados formalmente justificadas mas dificilmente admitidas pelos interessados” (v. Abrantes Geraldes , Temas da Reforma do Processo Civil, II, Almedina, 2010, p.p. 48-49; cfr. Manuel Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, Reimpressão,1993, p.p. 140, nota 1).


4. Aplicando os princípios e normativos ao caso ora em análise, cremos ser manifesto que a apensação prevista e determinada no art. 267º do CPC deverá ser ordenada.
4.1. Por um lado, as duas ações em causa tem uma conexão estreita e absolutamente idêntica no que concerne à sua tríplice sendo que a sua junção impõe-se tendo em vista a prossecução da economia de atividades e respetiva coerência e uniformidade de julgamentos, assim se conseguindo que “as várias causas passam a ser instruídas, discutidas e julgadas conjuntamente; daí a economia” sendo que “a vantagem mais apreciável é a garantia do julgamento uniforme.” (v. CPC anotado, Vol. III, Coimbra Editora, 1946, p.p. 203).
4.2. Por outro lado, as duas ações, por se verificarem os requisitos de admissibilidade do litisconsórcio (ativo e/ou passivo) e da coligação (ativa), podiam – e deveriam – ter sido apresentadas em ato único e num mesmo processo, mediante coligação de AA. e litisconsórcio de RR., apresentando-se, assim, verificados todos os requisitos previstos e determinados no art. 267º para a apensação da ação nº 2311/18.0T8PTM aos presentes autos.
4.3. Finalmente, neste exato momento, ao contrário do alegado pelos RR.DSTORE Retail, S.A. e Fund Box, não existe qualquer inconveniente processual para a apensação e julgamento unívoco das duas ações, dado que inclusive na ação nº nº 2311/18.0T8PTM foi apresentada a p.i., as respetivas contestações e respostas às mesmas, aguardando-se apenas pela marcação da audiência prévia em ambos os autos, que foi inclusive sugerida pelos próprios RR. sendo que “tendo presente os fundamentos que a justificam – a economia de actividade e a uniformidade do julgamento – o julgamento da causa que se pretende apensar ou da causa a que a apensação se devia fazer, apresenta-se-nos como o limite” (v. Ac. RC de 2013.05.21, Proc. 4044/07.3TJCBR-C.C1, www.dgsi.pt).
5. In casu, a imposição da apensação destas duas ações - tal como já foi inclusive alegado e requerida pela própria R. AGEAS que com a mesma concorda – deriva do próprio princípio da economia processual que impõe que “deve procurar-se o máximo de resultado processual com o mínimo emprego de actividade” e que “cada processo deve resolver o máximo possível de litígios.” (v. art. 130º do CPC e Pais do Amaral, Direito Processual Civil, 5.ª ed., Almedina, 2006, p. 218; cfr. Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil. 3.ª ed., Coimbra Editora, 2013, p. 203 e Manuel Andrade, Noções Elementares de Direito Civil, Coimbra Almedina, 1979, p. 387 e segs.), maxime face ao próprio teor e espirito “(d)a lei adjectiva – ou seja, do art. 267º do CPC – que deve ser interpretada e aplicada por forma a que os princípios da celeridade e da economia processual não entrem em rota de colisão com a finalidade precípua de todo e qualquer processo” (v. Ac. STJ de 2012.07.10, Proc. 157/1999.L2.S1, www.dgsi.pt).
6. Aliás, considerando que “se o requerimento de apensação de dois processos (…) for indeferido porque o estado do processo ou outra razão especial torna inconveniente a apensação (nº 1, parte final, do art.º 275º) e entretanto esse obstáculo for removido ou deixar de se verificar, nada obstará a que a pretensão de apensação, atendendo aliás às vantagens de economia processual que o preceito tem em vista, seja de novo reapreciada.” (v. Ac. RL de 2007.11.15, Proc. 5207/2007-2, www.dgsi.pt), pelo que sempre a apensação teria de ser considerada e, desde já, decidida a junção de ambos os processos, não se relegando para mais tarde a presente questão processual, maxime, face à possibilidade de contradição de julgados em vários aspetos das duas ações (tanto ao nível do direito substantivo como do direito adjetivo).
Assim, ponderando-se os prós e os contras da decisão a proferir por este douto tribunal, atrevemo-nos a afirmar que, face à complexidade das duas ações que pode ser minimizado em julgamento comum, “tendo presente os fundamentos que a justificam – a economia de actividade e a uniformidade do julgamento – o julgamento da causa que se pretende apensar ou da causa a que a apensação se devia fazer, apresenta-se-nos como o limite” (v. Ac. RC de 2013.05.21, Proc. 4044/07.3TJCBR-C.C1, www.dgsi.pt), situação que manifestamente não se verifica in casu, dado que ambos os autos aguardam a marcação da audiência prévia.
7. Em face do exposto, requerer-se a este douto Tribunal, nos termos e para os efeitos do art. 267º do CPC, se digne ordenar a apensação dos autos que sob o nº 2311/18.0T8PTM correm termos no 2º Juiz deste mesmo juízo central aos presentes autos de processo 2921/17.2T8PTM que foram apresentados primeiramente em juízo, com as legais consequências.”.
As RR., FUND BOX SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO, S.A., e DSTORE RETAIL, S.A., opuseram-se a que fosse ordenada a requerida apensação de processos.
No dia 06.05.2021 AIG EUROPE LIMITED – SUCURSAL EM PORTUGAL, companhia de seguros e resseguros, apresentou o seguinte requerimento:
“1. Através do douto despacho de 2020.11.16, este douto Tribunal procedeu à designação da audiência prévia para o próximo dia “14 de Maio de 2021, (…) às 09 horas e 30 minutos”, para a qual a ora Exponente foi notificada para estar presente.
2. Acontece porém que a ora exponente apresentou ainda antes do despacho em causa requerimento tendo em vista a este douto Tribunal se dignasse a ordenar a apensação dos autos que sob o nº 2311/18.0T8PTM correm termos no 2º Juiz deste mesmo juízo central aos presentes autos de processo 2931/17.2T8PTM que foram apresentados primeiramente em juízo (v. Requerimento de 2020.10.09 - Ref. Citius 8261685).
3. Ora, até ao momento, este douto Tribunal – certamente por mero lapso – não se pronunciou sobre a referida questão incidental, essencial e de extrema importância para o regular prosseguimento da presente instância, sendo certo que a decisão a proferir é ainda absolutamente essencial e imprescindível para o inicio e realização dos trabalhos e finalidades da audiência prévia em causa, podendo, inclusive, implicar a total inviabilidade e inutilidade da referida diligência e deslocação das partes a este douto Tribunal em tempo da atual pandemia de Covid-19.

4. Nesta conformidade, e tendo em vista a salvaguarda do principio da economia processual e a fim de evitar-se a realização de diligências e atos inúteis e desnecessários, requer-se mui respeitosamente a este douto Tribunal se digne dar sem efeito a diligência de audiência prévia agendada para o próximo dia 2021.05.14 e, consequentemente, a emissão de despacho tendo em vista a apensação dos autos que sob o nº 2311/18.0T8PTM correm termos no 2º Juiz deste mesmo juízo central aos presentes autos de processo 2931/17.2T8PTM que foram apresentados primeiramente em juízo, com as legais consequências.
E.D.”
No dia 10.05.2021, foi proferido o seguinte despacho:
“Requerimento para apensação de acções
AIG-Europe, Limited pede que seja determinada a apensação dos autos n.º 2311/18.0T8PTM, deste Juízo Central Cível, Juiz 2, aos presentes.
Naqueles autos são partes (activa) a AIG-Europe, Limited (ora requerente) e (passiva) Portugal Retail Europark Fund, Fund Box e interveniente acessória a Ageas.
Este Tribunal compulsou os autos acima identificados.
No caso concreto, as partes não são coincidentes. No âmbito do processo acima referido foi agendada Audiência Prévia para o dia 13 de Setembro de 2021. Nestes foi agendada Audiência Prévia para o próximo dia 14 de Maio de 2021.
Uns e outros apresentam especial complexidade – como é reconhecido no âmbito dos autos distribuídos ao Juiz 2. A ora requerente não é parte nestes autos.
A este respeito dispõe o artigo 267º do Código de Processo Civil:
1 - Se forem propostas separadamente acções que, por se verificarem os pressupostos admissibilidade do litisconsórcio, da coligação, da oposição ou da reconvenção, pudessem ser reunidas num único processo, é ordenada a junção delas, a requerimento de qualquer das partes com interesse atendível na junção, ainda que pendam em tribunais diferentes, a não ser que o estado do processo ou outra razão especial torne inconveniente a apensação.
2 - Os processos são apensados ao que tiver sido instaurado em primeiro lugar, salvo se pedidos forem dependentes uns dos outros, caso em que a apensação é feita na ordem dependência, ou se alguma das causas pender em instância central, a ela se apensando as que corram em instância local. 3 - A junção deve ser requerida ao tribunal perante o qual penda o processo a que os outros tenham de ser apensados. 4 - Quando se trate de processos que pendam perante o mesmo juiz, pode este determinar, mesmo oficiosamente, ouvidas as partes, a apensação. 5 - Tendo sido penhorados, em execuções distintas, quinhões no mesmo património autónomo ou direitos relativos ao mesmo bem indiviso, pode o juiz, oficiosamente ou a requerimento parte, ordenar a apensação ao processo em que tenha sido feita a primeira penhora desde que não ocorra nenhuma das circunstâncias previstas no n.º 1 do artigo 709.º.
Como acima se referiu, as partes não são coincidentes em ambos os processos e as posições assumidas também não. Não se verifica nenhum dos pressupostos elencados no n.º 1 do precito em análise. Sublinhe-se que a requerente não é parte nos presentes autos.
Acresce que a apensação, no âmbito de dois processos com esta especial complexidade, por todos reconhecida, seria, desde logo, um obstáculo à celeridade dos autos, tanto mais que imporia que se desse sem efeito a Audiência Prévia agendada para a semana em curso.
Pelo exposto, este Tribunal decide não proceder à apensação das acções, o que, em bom rigor, apenas serviria para aportar mais complexidade à já existente.
Mantém-se a data agendada para Audiência Prévia (a não ser que as partes, entretanto, tenha conseguido, através das negociações que encetaram, alguma plataforma de entendimento).
No dia 12.05.2021, AGEAS PORTUGAL – Companhia de Seguros, SA, Chamada, apresentou um requerimento, com o seguinte teor:
“1º Foi a Chamada notificada do despacho de 10.05.2021 que recaiu sobre requerimento apresentado por AIG Europe Limited, com a refª 38781104.
2º Nesse despacho é referido, e bem, que a AIG não é parte nestes autos, decidindo-se conforme consta do referido despacho.
3º Ora, a Chamada AGEAS, parte em ambos os autos, requereu a apensação do processo sob o nº 2311/18.0T8PTM corre termos no 2º Juizo desse Tribunal, aos autos sub iudice (req. Refª 36394174).
4º A Chamada aguardava a prolação de despacho sobre o seu requerimento, o que pensava ir ocorrer em sede de audiência prévia ou em momento imediatamente anterior à mesma.
5º Ora, o despacho agora proferido não contempla , no nosso entendimento , o requerimento apresentado pela Ageas, porquanto surge em resultado do requerido por quem não é parte nestes autos, conforme resulta da leitura daquele.
6º Face ao exposto, importa saber se o despacho ora proferido se aplica ao requerido pela Chamada AGEAS quanto a apensação dos autos, pois os pressupostos do requerimento desta são distintos dos alegados pela AIG Europe Limited.
7º Assim, requer-se a V.Exª se digne esclarecer se o despacho de 10.5.2021 é aplicável ao requerido pela Ageas em requerimento com a refª 36394174.”.
No dia 13.05.2021 foi proferido o seguinte despacho:
“Requerimento que antecede
Efectivamente, o despacho que precede o presente apenas se refere expressamente ao requerimento da AIG.
Contudo, os fundamentos considerados para a não apensação não são privativos do requerimento daquela: este Tribunal decidiu não proceder à apensação atenta a especial desvantagem que a mesma tinha para a tramitação destes autos, considerando a complexidade individual de cada um dos processos.
Pelo exposto, a decisão tomada no processo relativamente à apensação vale no processo para todos os sujeitos processuais.
(…)”
A chamada, AGEAS PORTUGAL – Companhia de Seguros, SA, não se conformando com o despacho prolatado no dia 13 de Maio p.p., dele interpôs recurso, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões:
“A) O presente visa sindicar por V.Exªs o despacho de 13.05.2021 (Refª 120216124) proferido pelo Tribunal a quo que indeferiu o pedido de apensação do processo nº 2311/18.0T8PTM aos presentes autos nº 2921/17.2T8PTM , em requerimento deduzido pela AGEAS PORTUGAL – Companhia de Seguros, S.A, reiterando o Tribunal a quo a fundamentação e o argumentário constante de um anterior despacho (Refª 120167440) proferido a propósito de um requerimento apresentado por um interveniente acidental, a AIG Europe Limited-Sucursal em Portugal.
B) A Recorrente discorda da fundamentação de tal despacho e, assim, do indeferimento da sua pretensão, aliás secundada por requerimento deduzido também pelo A. nos autos a apensar;
C) A apensação de processos é um instituto de natureza eminentemente prática, visando obter a maior economia processual possível, e, ao mesmo tempo, promover a uniformidade de julgamentos.
D) Analisando ambos os processos e articulados verificamos, com exceção da A. , sujeito ativo no processo 2311/18.0T8PTM – a identificada AIG Europe Limited- Sucursal em Portugal – que os demais sujeitos , os passivos, os RR e a Chamada, ora Recorrente são os mesmos.
E) Nos autos 2311/18.0T8PTM, são RR , os ora Recorridos “Portugal Retail Europark FUND”, “Fund Box – Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, S.A” e “Central de Borla – Comércio de Utilidades, S.A”, bem como a chamada Ageas, ora Recorrente, cuja intervenção foi deferida após requerimento deduzido pela sua segurada e era também R, “De Borla”.
F) Ora, tais RR são-no também nos autos sub iudice, para além dos demais RR melhor identificados nos autos supra.
G) Quanto às AA , ora Recorridas , as mesmas de forma coligada e cada uma per si, acionaram as RR, pedindo a sua condenação nos valores já liquidados por cada uma, bem assim de outros por liquidar, mormente, juros.
H) E ainda que a A. nos autos 2311/18.0T8PTM não seja parte ativa nos autos sub iudice, certo é que demandou as RR identificadas nos presentes autos, apresentando a mesma causa de pedir e o mesmo tipo de pedido, ainda que com quantum distinto.
I) Mas, entendemos, que não é um distinto valor peticionado pelas AA em ambos os processos que impede a requerida apensação, porquanto tal é mera consequência de uma causa de pedir, sendo que a causa de pedir é idêntica em ambos os processos.
J) Quanto à data de realização das audiências prévias, consideramos que a mesma não poderia ser impedimento para a apensação que se desejava e deseja.
K) Em primeiro lugar, por que a Recorrente apresentou o seu requerimento em Juízo em 7 de Setembro de 2020, quando as audiências prévias ainda se encontravam por realizar.
L) Em segundo lugar, porque a audiência prévia marcada nos autos a apensar (2311/18.0T8PTM) só iria ter lugar cerca de 4 meses depois de idêntica diligência nos presentes autos, pelo que entendemos que este argumento temporal claudica perante os factos.
M) Deste modo, à data em que a Recorrente apresentou o seu requerimento de apensação este era – e continua a ser- oportuno, não colidindo com a evolução processual de ambos os processos porque, na data, em nenhum deles ocorrera ainda a audiência prévia, conforme se invocou no requerimento apresentado pela Recorrente.
N) A Recorrente era e é , em ambos os autos, parte passiva, Chamada que foi pela sua Segurada e R., ora Recorrida , a “De Borla”.
O) E ainda que a “especial complexidade” invocada no despacho recorrido para indeferir a apensação seja real, certo é que assenta numa mesma factualidade factualidade técnico-jurídica , sendo que ao apreciara-se a mesma num dos processos estar-se-ia a apreciar a do outro.
P) Ora, constata-se nas petições iniciais de ambos os processos que, as causas de pedir são as mesmas no que refere ao fundamento da ação (incêndio no Retai Park com o alegado início na loja da “De Borla”), os pedidos idênticos e os RR os mesmos, apenas variando no quantum indemnizatório peticionado em cada processo.
Q) Do Tribunal a quo, esperava-se a aplicação e interpretação da Lei de forma “Lato sensu”, visando a uniformidade de julgamento e a economia processual, quer para os Srs. Juízes, quer para as partes, e demais intervenientes processuais.
R) Como refere o Tribunal da Relação de Coimbra, em perclaro Acórdão de 21.05.2013 “a finalidade da apensação de ações é a economia da atividade processual e a uniformidade de julgamento que pode proporcionar a circunstância da causa de pedir ser a mesma e única ou se os pedidos estarem numa relação de dependência nas ações apensadas” (vd. www.dgsi.pt/trc.nsf).


S) E adianta-se ainda neste Acórdão (proc. 4044/07.3TJCBR-C.C1) “A uniformidade de julgamento, evitando que as causas em questão que versam sobre questões idênticas ou conexas sejam objeto de julgamentos dispares, apresenta-se como a maior vantagem da apensação de ações, pois serão objeto de uma decisão proferida pelo mesmo juiz”.
T) E não é, por demais, despiciendo também invocar a economia processual que a apensação dos autos geraria, sem que tal tivesse consequências negativas para qualquer uma das partes intervenientes em ambos os processos.
U) Entende-se, pois, que o tribunal a quo violou o disposto no artigo 267º, nºs 1 e 2 do CPCivil, decidindo não proceder a apensação dos processos fundamentando tal com “...especial desvantagem que a mesma tinha para tramitação destes autos, considerando a complexidade individual de cada um dos processos”, o que merece censura, determinando o presente recurso.
NESTES TERMOS,
E nos mais de Direito, que V. Exas Doutamente suprirão, deve ser concedido inteiro provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se o despacho recorrido, ordenando-se a apensação aos presentes autos do processo nº 2311/18.0T8PTM em curso no Juiz 2 do Juízo Central Cível de Portimão, com o que V.Exªs farão, como sempre, a mais lidima
JUSTIÇA!”
As RR., FUND BOX SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO, S.A., entidade gestora e liquidatária do extinto Fundo de Investimento Imobiliário Fechado PORTUGAL RETAIL e EUROPARK FUND (“PREF”), e DSTORE RETAIL, S.A., responderam às alegações, pugnando pela confirmação do despacho recorrido.
Providenciados os vistos, em simultâneo, por meios electrónicos, e nada obstando ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir
II. Objecto do Recurso
Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelos recorrentes e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas, cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (art.º 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º e 663.º, n.º 2 do CPC).
É questão a decidir:
- Verificação dos pressupostos de que depende a apensação de acções.
III. Fundamentação
1.De Facto
Os factos pertinentes à resolução do presente recurso constam do antecedente relatório.
2. Do mérito do recurso
Vejamos os termos da causa.
No caso em apreço, a presente acção foi proposta por a) “Zurich Insurance plc – Sucursal em Portugal”, b) “Zurich Insurance plc – Sucursal no Reino Unido”, c) “Lusitania, Companhia de Seguros, SA” e d) “Seguradoras Unidas, SA” (pelas ex-Tranquilidade , SA e ex-Açorena Seguros, SA) contra “FUND BOX - Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário SA”, “Charon – Prestação de Serviços de Segurança e Vigilância SA”, “Jones Lang Lasalle (Portugal) Sociedade de Mediação Imobiliária, SA”, “Central de Borla – Comércio de Utilidades, SA” e “DESFO SGPS SA”.
Foi formulado pedido nos seguintes moldes:
259. E, sem prejuízo do que venha a ser pedido em incidente de liquidação (a título de encargos com os sinistros e com o pleito) os montantes agregados (capital e juros vencidos) dos pedidos autónomos de cada seguradora Autora são os seguintes:
(a) A Autora Zurich PT (segurada Staples): 2.731.445,42€
(b) A Autora Zurich UK (segurada Staples): 800.567,19€
(c) A Autora Lusitania (segurada Moviflor): 628.872,80€
(d) A Autora ex Tranquilidade (segurada Moviflor): 628.872,80€
(e) A Autora ex Açoreana (seguradas Rádio Popular e Karisa): 2.324.561,25€
260. O valor agregado de todos os pedidos (capital e juros vencidos) feitos pelas seguradoras Autoras em coligação é de 7.114.319,47€.
261. Os pedidos de cada seguradora Autora são de ter como formulados identicamente contra todos e cada uma das entidades Rés, por vigorar o antes regime de solidariedade passiva das mesmas.
Em apertadíssima síntese, invoca-se, como causa de pedir, a ocorrência de um incêndio no “Retail Park” de Portimão (gerido pela 1.ª Ré, sendo a 3.ª Ré, mandatária desta) que se iniciou numa loja aí explorada pela 4.ª Ré (e, por intermédio desta, pela 5.ª Ré) e que, em virtude de deficiências construtivas e do emprego de materiais com grau inadequado de resistência e reacção ao fogo e ainda devido à negligência/incumprimento de regras protocoladas protagonizados pela 2.ª Ré, se propagou a lojas exploradas por segurados das AA., ali também sedeadas, nelas causando prejuízos que foram por estas ressarcidos em cumprimento de contratos de seguros antes ajustados.
Foi deduzida reconvenção pela 2.ª Ré contra “Seguradoras Unidas S.A.”, em virtude de celebração de contrato de seguro cuja apólice se encontra identificada
À data da prolação do despacho recorrido – 13 de Maio p.p. - , estava marcada a audiência preliminar para o dia 14 de Maio p.p.. Entretanto, foi já fixado o objecto do litígio, fixados os temas da prova e admitidos os meios de prova, no passado dia 25 de Maio p.p., sendo que o despacho saneador, onde foram decididas várias excepções, foi proferido no dia 28.06.2018, e dele foi interposto recurso pelas AA. e R. Fundbox, na parte em que se pronunciou, quanto à ilegitimidade passiva da R. Fundbox, tendo esta ainda recorrido na parte em que se decidiu da arguida prescrição, sendo que a decisão desta última excepção apenas transitou em julgado no dia 16.02.2021.
Atentemos agora na acção que, sob o n.º 2311/18.0T8PTM, corre termos no Juiz 2 do Juízo Central Cível de Portimão.
Foi a mesma proposta por “AIG EUROPE LIMITED – SUCURSAL EM PORTUGAL” contra “PORTUGAL RETAIL EUROPARK FUND, representado pela “Fund Box – Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, S.A.”, “FUND BOX – SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO, S.A. e “CENTRAL DEBORLA – COMÉRCIO DE UTILIDADES, S.A.”.
Foi formulado o seguinte pedido:
“a) Ser a A. declarada sub-rogada, na medida dos montantes por si pagos e indicados no presente articulado, nos direitos do CONTINENTE contra as RR.;
b) Serem as RR. condenadas a pagar à A. a quantia de € 13.033.750,62 (…) paga ao CONTINENTE, por conta dos danos e prejuízos indicados no presente articulado, no âmbito dos contratos de seguro titulados pela apólice 06080025 identificada no presente articulado;
c) Serem as RR. condenadas a pagar à A. a quantia que se vier a liquidar ulteriormente (…) correspondente às despesas e honorários devidos com o presente processo judicial;
d) Serem as RR. condenadas a pagar à A. os juros legais vencidos e vincendos relativos às quantias peticionadas nas alíneas anteriores, desde a citação até efetivo e integral pagamento, acrescidos, a partir do trânsito em julgado da sentença de condenação que vier a ser proferida, de juros à taxa anual de 5%, nos termos do disposto no art. 829º-A/4 do Código Civil; e
e) Serem as RR. condenadas a pagar à A. os montantes relativos às custas processuais e procuradoria relativas aos presentes autos, com as legais consequências. (…)”
Em apertadíssima síntese, invoca-se, como causa de pedir, a ocorrência de um incêndio no “Retail Park” de Portimão (pertença do 1.º Réu, sendo a 2.ª Ré a gestora deste) que se iniciou numa loja aí explorada pela 3.ª Ré e que, em virtude de deficiências construtivas e do emprego de materiais com grau inadequado de resistência e reação ao fogo, se propagou a uma loja explorada por um segurado da A., ali também sedeada, nela causando prejuízos que foram por esta ressarcidos em cumprimento de contrato de seguro antes ajustado.
Na contestação aapresentada pela R. Fundbox foram suscitadas a excepção dilatória de incompetência territorial do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, a excepção da falta de personalidade judiciária do PREF (Fundo de Investimento Imobiliário Fechado PORTUGAL RETAIL EUROPARK FUND), a excepção de ilegitimidade passiva da Ré FundBox, enquanto demandada na qualidade de sociedade gestora e legal representante do PREF e também enquanto demandada na sua própria qualidade.
Neste processo foi agendada a realização de audiência prévia para o dia 13 de Setembro p.p..
Apreciemos.
“Se forem propostas separadamente acções que, por se verificarem os pressupostos de admissibilidade do litisconsórcio, da coligação, da oposição ou da reconvenção, pudessem ser reunidas num único processo, é ordenada a junção delas, a requerimento de qualquer das partes com interesse atendível na junção, ainda que pendam em tribunais diferentes, a não ser que o estado do processo ou outra razão especial torne inconveniente a apensação” (n.º 1 do art.º 267.º do CPC).
Como é consabido, a apensação de processos (art.º 267º e seguintes do CPC) tem dois desígnios fundamentais: o da economia processual e o da uniformidade de julgamento.
Com efeito, a apensação de processos é um instituto de natureza eminentemente prática, que visa obter a economia da actividade processual, e, ao mesmo tempo, promover a uniformidade de julgamentos quando estão em causa questões conexas, ou seja quando a causa de pedir ser a mesma e única, ou de os pedidos estarem numa relação de dependência nas acções apensadas.
Na verdade, “a este instituto subjazem razões de economia processual bem como de uniformidade de julgados. A apensação depende da verificação dos seguintes pressupostos formais ou substanciais: entre as diversas acções instauradas e pendentes devem verificar-se as circunstâncias de que depende o litisconsórcio, a coligação, a oposição ou a reconvenção; a apensação deve ser requerida pelos interessados e só pode ser oficiosamente determinada quando incida sobre processo ou processos adstritos ao mesmo juiz (excluindo-se deste modo as situações em que o processo está pendente no mesmo tribunal ou juízo, mas na titularidade de juiz diferente); deve verificar-se um interesse atendível na junção de processos; o requerimento deve ser apresentado no processo que deva suportar a apensação; a pretensão apenas deve ser deferida depois de respeitado o contraditório e desde que o estado do processo ou outras razões especiais não impeçam a apensação”[1].
A apensação de acções só se justifica verdadeiramente quando as causas são conexas[2]. “O fundamento da junção é a conexão: Juntam-se as causas que são conexas; e juntam-se, como dissemos, para se conseguirem estes dois benefícios:
a) Economia de actividade
b) Coerência, ou melhor, uniformidade de julgamento.”[3]
"Para se proceder à apensação de processos, é necessária a verificação de pressupostos positivos, consubstanciados na conexão objectiva e na compatibilidade processual, e um pressuposto negativo destinado a aferir da inconveniência da apensação.
(…)
Como refere Rodrigues Bastos[4], atribui-se ao Tribunal um poder discricionário na ponderação do aludido pressuposto negativo.
Assim, e como salienta Rodrigues Bastos[5], a parte que requer a apensação deverá demonstrar a existência da conexão entre as acções e que a apensação serve em concreto a um mais perfeito desenvolvimento da relação jurídica processual”[6].
“Visando a apensação de processos a economia processual e a uniformidade de julgamento, tendo em vista os interesses da paz social e da justiça, deve deixar-se ao prudente arbítrio do julgador a apreciação das suas vantagens ou inconvenientes no caso concreto»[7].
Destarte, requerida a apensação, o juiz deferirá o requerimento se entender ser legal e conveniente a apensação ou indeferindo-o se entender ser ilegal (por não obedecer aos requisitos exigidos pelo referido art.º 267.º do CPC), ou, sendo legal, a apensação se tornar inconveniente, dado o estado dos processos ou em atenção a qualquer outra circunstância. Vale isto por dizer que no deferimento da apensação de processos, o juiz está, por um lado, vinculado a determinados critérios legais e por outro atribui-se ao juiz um poder discricionário na ponderação do aludido pressuposto negativo.
Feito este excurso, regressemos ao caso.
Cabe constatar que a apelante não empreendeu um esforço significativo no sentido de demonstrar que, entre os presentes autos e aqueles que correm termos sob o n.º 2311/18.0T8PTM, se verificavam os pressupostos de que depende a admissibilidade de qualquer um dos institutos a que alude o n.º 1 do art.º 267.º do CPC, optando por salientar as vantagens que, na sua óptica, adviriam da apensação de processos.
Focando-nos, em particular, na coligação (a única figura ali prevista que cobra aplicação ao caso), há a notar que o n.º 1 do art.º 36.º do CPC autoriza que vários autores demandem um ou vários réus, quando a causa de pedir seja a mesma e única ou quando os pedidos estejam entre si numa relação de prejudicialidade ou de dependência.
No caso e como emerge da brevíssima concitação das causas de pedir enunciadas numa e noutra lide, os fundamentos fácticos dos pedidos formulados só em parte são coincidentes.
A coincidência verifica-se apenas no que concerne à ocorrência do referido incêndio no identificado espaço comercial, divergindo as respectivas AA. no que concerne à identificação das suas concretas causas e das entidades por elas responsáveis, o que justifica que os RR. demandados num e noutro processo sejam diferentes entre si.
São ainda divergentes os fundamentos invocados para, ao abrigo dos diferentes contratos de seguro, justificar os montantes que terão sido liquidados aos respectivos segurados.
Daí que não devamos considerar que estamos perante uma causa de pedir idêntica, uma mesma e única causa de pedir. E, como é patente, os pedidos formulados numa e noutra lide, não se encontram entre si numa relação de prejudicialidade ou numa relação de dependência.
Poder-se-ia, contudo, considerar que, pese embora essas dissimilitudes, a procedência dos pedidos principais formulados numa e noutra acção depende essencialmente da apreciação dos mesmo evento da vida real (em suma, as causas eficientes do incêndio e da sua propagação) e da interpretação e aplicação das mesmas regras de direito, mormente aquelas que regem o exercício do direito de sub-rogação pelas seguradoras no contexto de seguros de danos.
Estaria, por isso, perfunctoriamente verificado o pressuposto a que alude o n.º 2 do art.º 36.º do CPC, pelo que, em abstracto, seria admissível a coligação e, nessa medida, a apensação.
Cabe aqui esclarecer que a diversidade de sujeitos processuais não obviaria, por si só, à apensação.
Sucede, porém, que, o estado de desenvolvimento de ambos processos é diferente entre si.
Nestes autos, à data em que foi proferido o despacho recorrido - 13.05.2021 -, estava prestes a iniciar-se a realização da audiência prévia, sendo que o despacho saneador havia sido já proferido em 28.06.2018, onde foram decididas várias excepções, dele tendo sido interposto recurso pelas AA. e R. Fundbox, na parte em que se pronunciou, quanto à ilegitimidade passiva da R. Fundbox, tendo esta ainda recorrido na parte em que se decidiu da arguida prescrição, sendo que a decisão desta última excepção apenas transitou em julgado no dia 16.02.2021.
Entretanto, no decurso de duas sessões – 14.05.2021 e 25.05.2021 - foi fixado o objecto do litígio, seleccionados os temas da prova e designadas datas para a realização da audiência final. Neste processo, os autos encontram-se já no dealbar da fase de julgamento.
Naqueloutros autos e naquela data – 13.05.2021 -, estava apenas agendada a realização da audiência prévia - com prolação do despacho saneador (a pronunciar-se sobre as excepções arguidas), fixação do objecto do litígio e selecção dos temas de prova - para cerca de 4 meses mais tarde.
Assim, ao contrário do que parece transparecer das conclusões recursórias, não nos deparamos, pois, com um mero desfasamento temporal entre as datas agendadas para a realização das audiências prévias em cada um daqueles processos.
E, como deflui da parte final do n.º 1 do art.º 267.º do CPC, o que deve ser considerado neste conspecto são os estados actuais de cada um dos processos a apensar. Com efeito, a (in)conveniência na apensação deve ser aferida em atenção do concreto desenrolar da tramitação processual que se regista no momento em que a mesma é objecto de apreciação jurisdicional.
É que, como se sabe, o processo deve ter uma evolução dinâmica com vista a alcançar a decisão final, não se podendo, por isso, aquilatar a viabilidade/conveniência da apensação com referência a momentos processuais pregressos, há muito ocorridos. Por isso, o estado evolutivo de cada um daqueles processos no momento em que foi apresentado o requerimento apreciado pelo despacho recorrido é, neste contexto, desprovido de relevância.
Assim, se é certo que o requerimento apresentado em 7 de Setembro de 2020 poderia ter sido objecto de despacho em momento precedente[8], inexistem motivos para considerar que se decidiu com desacerto ao considerar o estado actual de cada uma das causas.
E, também, não é de esquecer o facto de a requerida apensação se vir a traduzir, materialmente, num "aglomerado" de um total de sete causas[9] a julgar simultaneamente e com recurso a extensos meios de prova. A matéria factual - extensa em ambos os processos, com significativo acervo documental - como se expôs, só em parte é coincidente entre todas elas.
Avulta, enfim, a irrefutável complexidade inerente ao apuramento das causas de um incêndio de grandes dimensões num espaço comercial gerido por um fundo imobiliário e cujas consequências danosas, a avaliar pelas alegações e pelos montantes peticionados, ascendem a vários milhões de euros.
Temos assim que, ainda que legal, a requerida apensação iria mostrar-se inconveniente, dado o estado processual em que se encontram os dois processos (com evidente atraso para o presente) e a inerente complexidade a um julgamento assaz alargado de factos que só em parte são harmonizáveis entre si, à vasta produção de prova testemunhal e documental, complicando e dilatando o julgamento no tempo.
Assim, é patente que as vantagens de economia processual e de uniformização de julgados que poderiam advir da apensação dos identificados processos são vastamente superadas pela dimensão e relevância prática dos aludidos inconvenientes.
Deste modo, à luz da ponderação exigida pela parte final do n.º 1 do art.º 267.º do CPC, é, pois, de confirmar o despacho recorrido.
Assim, pelas razões aduzidas, em face dos prolegómenos supra-convocados, sem necessidade de maiores considerações, resulta a improcedência das alegações que, ex adverso, compõem a minuta recursória, concluindo-se não merecer o recurso provimento.
As custas serão suportadas, porque vencido, pelo apelante (n.ºs 1 e 2 do art.º 527.º do CPC).
IV. Dispositivo
Pelo exposto, acorda-se neste Tribunal da Relação em negar provimento à apelação e, em consequência, mantem-se a decisão recorrida.
Custas pelo apelante.
Registe.
Notifique.
Évora, 25 de Novembro de 2021
Florbela Moreira Lança (Relatora)
Elisabete Valente (1.ª Adjunta)
Cristina Dá Mesquita (2.ª Adjunta)
(acórdão assinado digitalmente)
_______________________________________________
[1] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Sousa, CPC anotado, em anot. ao art.º 267.º
[2] Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, III, pp. 203
[3] Alberto dos Reis, op. e loc. Cit, nota 3.
[4] Notas ao CPC, II, pp. 37
[5] op. cit., pp. 36
[6] Ac da RL de 07.05.2009, proc. nº 10525/08-2, acessível em www.dgsi.pt
[7] Ac. da RL de 23.06.1999, proc. n.º 0027474, acessível em www.dgsi.pt
[8] Repare-se que as pronúncias das apeladas foram oferecidas em Outubro de 2020.
[9] Note-se que a presente causa é, como se colhe do relatório, uma coligação de cinco Autoras – com pedidos individualizadamente formulados – contra cinco Réus, tendo um deles deduzido reconvenção contra uma das AA..