RECURSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO
SENTENÇA
INSUFICIÊNCIA DA MATÉRIA DE FACTO PARA A DECISÃO
Sumário


I – Pese embora em sede de ilícito contraordenacional não se coloquem com a mesma profundidade e grau de exigência as necessidades de fundamentação impostas à elaboração da sentença penal, a fundamentação de facto e de direito da sentença condenatória em processo contraordenacional, ainda que sucinta, deverá transcrever a factualidade, indicar as normas jurídicas violadas e explicitar de que forma os factos se subsumem ao direito e qual o critério seguido para determinar as coimas concretas e a coima única em caso de concurso de contraordenações determinante da realização de cúmulo jurídico. Não o fazendo, será nula, nos termos do artigo 379.º, nº 1, al. a) primeira parte, por inobservância do disposto nos artigos 374.º, nº 2, ambos do CPP, ex vi dos artigos 41.º, nº 1.º e 74.º, nº 4.º do RGC.

II – O vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada previsto no artigo 410.º, nº 2.º, al. a) do CPP ocorre quando a conclusão a que se chega não é suportada pelas respetivas premissas, isto é, quando a matéria de facto apurada não é a suficiente para fundamentar a solução de direito encontrada, padecendo de tal vício a sentença condenatória em processo contraordenacional que não cuidou de concretizar as condutas que, por ação ou por omissão, são atribuídos à pessoa coletiva, não permitindo, assim, que dos factos se consiga retirar o alcance objetivo e subjetivo de tais condutas.

(Sumário elaborado pela Relatora)

Texto Integral



Acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:

I - Relatório.
Nos presentes autos de recurso de contraordenação que correm termos no Juízo de Competência Genérica do Entroncamento, do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, com o n.º305/21.7T9STR.E1, foi a arguida (…), com sede na Rua (…), condenada pela prática de duas contraordenações:
- Uma contraordenação grave relativa ao incumprimento dos requisitos na área de serviço – instalação por forma a evitar a propagação de fumos e cheiros – prevista no n.º 1, al. b) e n.º 2 do artigo 123.º, conjugado com o n.º 3 do artigo 126.º do Decreto-Lei n.º 10/2015, de 16 de janeiro, na sua redação atual, e punível nos termos da subalínea iii) da alínea a), do n.º 1 do artigo 143.º do mesmo diploma legal;
- Uma contraordenação grave relativa à de falta de sinalização, com modelo de interdição ou condicionamento de fumar, conforme modelo aprovado no Anexo I, da Lei n.º 37/2007, prevista no n.º 1 do artigo 6.º, em conjugação com o n.º 1 do artigo 4.º, ambos da Lei n.º 37/2007, de 14 de agosto, na sua redação atual, e punível pela alínea c), do n.º 1 e n.º 2 do artigo 25.º do mesmo diploma.

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Inconformada com tal decisão, veio a arguida interpor recurso da mesma, tendo apresentado, após a motivação, as conclusões que passamos a transcrever:
“1. O Tribunal a quo condenou a Arguida pela prática de uma contraordenação de incumprimento dos requisitos na área de serviço – instalação por forma a evitar a propagação de fumos e cheiros, prevista no n.º 1 alínea b) e n.º 2 do artigo 123º, conjugado com o n.º 3 do artigo 126º da Decreto-Lei n.º 10/2015, de 16 de janeiro, na sua redação atual, e punível pela subalínea iii) alínea a) do n.º 1 do artigo 143º do mesmo diploma com a coima mínima de € 8.200,00.
2. Entendeu o Tribunal a quo ter havido uma atuação com dolo dos empregados da Arguida, por se tratar de local utilizado diariamente para o trabalho pelos trabalhadores da Arguida, que estes não podiam deixar de saber o estado da agindo assim como dolo e não com negligência quanto aos factos em questão.
3. A responsabilidade contraordenacional das pessoas coletivas ou equiparadas não tem carácter objetivo, já que pressupõe a prática do facto típico pelos seus “órgãos” no exercício das suas funções, entendendo-se como tal as pessoas físicas que têm a seu
cargo decidir e atuar pelas pessoas coletivas – artigo 7º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro – não existindo responsabilidade quando a contraordenação tenha sido praticada por pessoas físicas que tão-só mereçam a qualificação de agentes ou auxiliares, como é o caso dos empregados.
4. Ora, não ficou provado qualquer conhecimento da situação em apreço por parte do legal representante da Arguida, tendo, ao invés, ficado provado que: “11.-a data dos factos em causa nos presentes autos coincidiu com um período de tempo em que o legal representante da Arguida, por motivos de saúde, viu-se impedido de controlar tudo o que se passava nos diversos estabelecimentos da Arguida. 12.- O Legal representante da Arguida sofreu, nessa altura, um aneurisma, motivo que determinou o seu internamento hospital.”
5. Encontrando-se o legal representante, em face do estado grave de saúde, impedido de controlar o estado e o que se passava nos diversos estabelecimentos, resulta
evidente que o legal representante desconhecia a situação concreta em que se encontrava a tubagem daquele estabelecimento em concreto.
6. Assim, deveria ter sido reconhecida a situação de erro sobre as circunstâncias
alegada em sede de impugnação, a qual afasta o dolo, em conformidade com o disposto no artigo 8º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27/10, ficando ressalvada a negligência.
7. Sendo imputável à Arguida a prática da contraordenação em apreço, a título de negligência, sempre se impõe a redução a metade da coima aplicada, em face do disposto no artigo 143º, n.º 6 do Decreto-Lei n.º 10/2015, de 16 de Janeiro.
8. O Tribunal a quo fez assim uma errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 7º e 8º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro.
9. O Tribunal a quo recusou a aplicação à Arguida da medida de Admoestação, no entanto, considerando a atuação negligente da Arguida, sendo o seu grau de culpa reduzido e a gravidade da infração é em si mesma reduzida, estão verificados os pressupostos do artigo 51º do Regime Geral das Contraordenações.
10.Interpretando o referido artigo 51º à luz do disposto no n.º 3 do artigo 9º do Código Civil, temos de entender que a classificação das contraordenações como grave não obstaculiza a opção pela aplicação da admoestação (Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 18/04/2012, Proc. N.º 430/11.2TBMLD.C1).
11.Na aferição da gravidade da infração e da culpa do agente o Tribunal, tem de se atender, nomeadamente, se houve ou não benefício económico, se existiu ou não dolo e qual a conduta do agente anterior e posterior à prática da contraordenação.
12.Sendo a conduta da Arguida negligente, não existindo qualquer benefício económico e sendo a Arguida primária, nada obsta à aplicação da medida de Admoestação, não se podendo aceitar o entendimento constante da sentença recorrida de que tal medida não satisfaz as exigências de prevenção e sancionamento.
13. Fez, assim, o Tribunal a quo uma errada interpretação e aplicação do artigo 51º do Regime Geral das Contraordenações.
14.Caso assim não se entenda, sempre se invoca que a sentença recorrida está ferida de nulidade por falta de fundamentação, nos termos do artigo 379º, n.º 1, alínea a) conjugada com o artigo 374º, n.º 2 ambos do Código de Processo Penal, na medida em que é totalmente omissa quanto à enunciação dos critérios que determinaram a fixação da coima única.
15.A fixação da coima única é obrigatória e exige uma decisão fundamentada (Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 11/11/2008, Proc. 2490/08-1), constituindo a concretização do dever constitucional de fundamentação expressa e acessível dos atos lesivos (artigo 268.º, n.º 3, da C.R.P.) e, sobretudo, a consagração da garantia constitucional do direito à defesa (artigo 32.º, n.º 10, da C.R.P), visando habilitar o arguido a adversar a existência e valoração dos elementos concretamente considerados com vista à contestação e diminuição do montante da coima que lhe fo fixada.
16.Considerando que as coimas individuais aplicadas a cada uma das contraordenações se fixaram no seu limite mínimo, deveria a coima única, considerando os parâmetros consagrados no artigo 19º do Regime Geral das Contraordenações, também ser fixada em valores próximos dos limites mínimos, a qual seria equilibrada e proporcional à responsabilidade da Recorrente pelas contraordenações cometidas.”
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Termina pedindo a revogação da sentença recorrida e a sua substituição por outra que, “em face da atuação meramente negligente da Arguida, aplique uma medida de Admoestação ou, caso assim não se entenda, declare nula, por falta de fundamentação a decisão de aplicação de coima única”.
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O recurso foi admitido.
Na 1.ª instância, o Ministério Público pugnou pela improcedência do recurso e pela consequente manutenção da decisão recorrida, tendo apresentado as seguintes conclusões:
“1.ª Os trabalhadores da ora recorrente atuaram com dolo quanto à incorreta instalação do sistema de exaustão por falta isolamento da tubagem que não evitava a propagação de fumos e cheiros.
2.ª A atuação é geradora da responsabilidade coletiva nos termos do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, em que se integram os trabalhadores ao seu serviço, desde que atuem no exercício das suas funções ou por causa delas
3.ª A conduta dolosa dos trabalhadores que se encontravam ao serviço, e que responsabiliza a sociedade arguida, é incompatível e afasta a aplicação do erro sobre as circunstâncias previsto no artigo 8.º n.º 2 do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro.
4.ª A simples admoestação não satisfaz as exigências de prevenção e sancionamento dos factos que basearam os ilícitos contraordenacionais pelos quais a arguida foi condenada, que não revestem gravidade reduzida.
5.ª O Tribunal determinou as coimas correspondentes a cada uma das contraordenações, nos montantes de 250, 00, ambas pelo limite mínimo, tendo aplicado uma coima única nos termos do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro.
6.ª A sentença recorrida encontra-se fundamentada e fez uma determinação ponderada e correta das coimas aplicadas à ora recorrente e não violou o artigo 7.º, 8.º, 51.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro.”
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O Exmo. Procurador Geral Adjunto neste Tribunal da Relação emitiu parecer, tendo-se pronunciado no sentido da improcedência do recurso.
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Foi cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2 do CPP, tendo sido apresentada resposta pela recorrente, reiterando os fundamentos e a pretensão invocados no recurso.
Procedeu-se a exame preliminar.
Colhidos os vistos legais e tendo sido realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

II – Fundamentação.
II.I Delimitação do objeto do recurso.
Nos termos consignados no artigo 412º nº 1 do CPP, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente na sua motivação, as quais definem os poderes cognitivos do tribunal ad quem, sem prejuízo de poderem ser apreciadas as questões de conhecimento oficioso.
Em obediência a tal preceito legal, a motivação do recurso deverá enunciar especificamente os fundamentos do mesmo e deverá terminar pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, nas quais o recorrente resume as razões do seu pedido, de forma a permitir que o tribunal superior apreenda e conheça das razões da sua discordância em relação à decisão recorrida.
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O regime dos recursos de decisões proferidas em 1.ª instância em processo de contraordenação encontra-se estabelecido nos artigos 73.º a 75.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro – Regime Geral das Contraordenações (RGC).
Importa convocar nesta sede o acórdão de fixação de jurisprudência n.º 3/2019, in DR 124/2019, série 1 de 2019-07-02, no qual se estatuiu que:
“Em processo contraordenacional, no recurso da decisão proferida em 1.ª instância o recorrente pode suscitar questões que não tenha alegado na impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa”.
Da análise do regime legal acima referido e, bem assim, do estatuído no citado acórdão de fixação de jurisprudência decorrem, relativamente aos processos de contraordenação, duas conclusões:
- A impugnação da decisão da autoridade administrativa não assume a natureza de um verdadeiro recurso, sendo antes a causa retirada do âmbito administrativo e entregue a um órgão independente e imparcial, o tribunal;
- O Tribunal da Relação funciona como tribunal de revista ampliada – podendo alterar a decisão do Tribunal recorrido sem qualquer vinculação aos termos e ao sentido em que foi proferida, ou anulá-la e devolver o processo ao mesmo Tribunal, sempre sem prejuízo do conhecimento oficioso de qualquer dos vícios referidos no artigo 410.º CPP, por força do disposto nos artigos 41.º, nº 1.º e 74.º, nº 4.º do RGC – e como última instância, conhecendo apenas da matéria de direito.
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Delimitado o âmbito dos recursos de contraordenação e considerando as conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação e bem assim os vícios da decisão que o tribunal deverá conhecer oficiosamente, são as seguintes as questões a apreciar e a decidir:
1 – Apreciar a nulidade da sentença por falta de fundamentação no processo de determinação das medidas das coimas parcelares e da coima da coima única (artigos 374º, nº 2, 379, nº 1, alínea a) do CPP ex vi dos artigos 41.º, nº 1.º e 74.º, nº 4.º do RGC).
2 – Apreciar a existência do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (artigo 410º, nº 1, al. a) do CPP ex vi dos artigos 41.º, nº 1.º e 74.º, nº 4.º do RGC).
3 – Determinar se a sentença recorrida fez uma errada valoração do elemento subjetivo do tipo quanto à contraordenação relativa ao incumprimento dos requisitos na área de serviço, ao considerar a atuação dolosa e não negligente da arguida, tendo interpretado e aplicado incorretamente os artigos 7.º, n.º 2 e 8º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 433/82.
4 – Apreciar a adequação da não aplicação da medida de admoestação solicitada pela recorrente.

II.II - A decisão recorrida.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença que conheceu das nulidades da decisão administrativa arguidas pela recorrente, julgando-as improcedentes e condenou a mesma pela prática de duas das contraordenações que lhe vinham imputadas.

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Com base na documentação constante dos autos e na prova produzida em audiência, a sentença recorrida que deu como provados e não provadosos seguintes factos:
“1.- No dia 19 do mês de outubro de 2016, pelas Ilh25m, no estabelecimento de bebidas e restauração, denominado (…), e explorado pela arguida (…) ocorreu uma ação de fiscalização levada a cabo por uma brigada da ASAE.
2.- No decurso da fiscalização ao referido estabelecimento, verificou-se que era exercida a atividade de restauração.
3.- Foi constatada a incorreta instalação do sistema de exaustão por falta de isolamento da tubagem, não evitando desta forma a propagação de fumos e cheiros.
4.- Foi verificada a inexistência de aviso a restringir a venda de bebidas alcoólicas e bem assim, o dístico de permissão de fumar.
5.- Os empregados e representantes que trabalhavam no referido estabelecimento da arguida não sabiam, nem previram ou aceitaram a realização dos factos supra referidos em 4., embora devessem, por estarem obrigados a cumprir as regras relativas ao exercício da atividade da Arguida, designadamente, assegurar-se da afixação dos devidos avisos relativamente à venda e ao consumo de álcool e tabaco, no interior do estabelecimento, verificar se tais factos não ocorriam.
6.- Os empregados e representantes da arguida que trabalhavam no referido estabelecimento sabiam e aceitaram a situação descrita no facto supra referido em 3., não se inibindo, não obstante tal situação, de manter a laboração do referido estabelecimento, sabendo que a mesma contrariava as regras que estavam obrigado(a) a cumprir relativas ao exercício da sua atividade, designadamente, ao cumprimento dos requisitos do estabelecimento.
7.- Os empregados e representantes da arguida que trabalhavam no referido estabelecimento tem capacidade para entender as proibições legais e se determinar de acordo com as mesmas.
8.- A Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) aplicou a Arguida pela prática dos factos referidos supra em 1, por decisão proferida em 24/11/2020, a coima única de 1200 euros.
9.- O estabelecimento em causal (…) abriu ao público no ano de 2005 no seguimento de obras realizadas no mesmo, devidamente licenciadas pela autorização de obras n. 0 6832/021 de 06/09/2005, tendo sido emitido o respetivo alvará de licença ou autorização de n.0 8790/2005 de 23/11/2005.
10.- Em 02/06/2014 deu entrada de comunicação prévia, prevista no artigo 340 do D.L. n.0 555/991 de 16 de dezembro, na redação do Decreto-Lei, n. 0 26/201 OI de 30 de março a qual foi atribuída o processo com o n.0 16-2014/128.
11.- A data dos factos em causa nos presentes autos coincidiu com um período de tempo em que o legal representante da Arguida, por motivos de saúde, viu-se impedido de controlar tudo o que se passava nos diversos estabelecimentos da Arguida.
12.-0 legal representante da Arguida sofreu, nessa altura, um aneurisma, motivo que determinou o seu internamento hospital.
13.-A Arguida tem três estabelecimentos e 14 empregados e no último ano não obteve lucros da sua laboração embora tenha conseguido cumprir os seus compromissos financeiros pagando a fornecedores e trabalhadores.
14.-A Arguida, na pessoa do seu legal representante, desconhecia que não se encontravam ambos os avisos supra referidos devidamente afixados, e desde que passou a ser obrigatória a afixação dos mesmos a Arguida sempre ordenou que se procedesse à respetiva afixação.

B) FACTOS NÃO PROVADOS NÃO PROVADOS NÃO CONCLUSIVOS:
1.- Que Que foi apresentado novo pedido para legalização de restauração e bebidas, ao qual foi atribuído o número de processo Ol2020/3.
2.- Que os representantes da arguida sabiam, previram e aceitaram a não afixação dos devidos dos avisos relativamente à venda e ao consumo de álcool e tabaco, no interior do estabelecimento;
3.- Que era exercida a atividade de restauração, mais ampla do que a autorizada de apenas bebidas, não sendo constatada a existência e de título válido para o exercício da atividade;
4.- Que nunca existiu, como não existe, qualquer propagação de fumos e cheiros no estabelecimento, como o podem confirmar todos os seus clientes e funcionários;
5.- Que quanto ao aviso de proibição de venda e consumo de bebidas alcoólicas, a Arguida veio a apurar que o mesmo havia sido retirado pela empregada de limpeza, a qual, inadvertidamente, não o voltou a afixar no respetivo sítio após a conclusão da limpeza promovida no estabelecimento.
6.- Que o estabelecimento da Arguida foi, desde a data da sua abertura, inúmeras vezes visitada e fiscalizada por inspetores da ASAE, nunca tendo sido detetada em nenhuma dessas visitas/fiscalizações qualquer problema com o sistema de exaustão;.

II.III - Apreciação do mérito do recurso.
Vejamos então cada uma das questões acima enunciadas.
1- Da nulidade da sentença por falta de fundamentação no processo de determinação das medidas das coimas parcelares e da coima da coima única arguida pela recorrente.
De acordo com a lei processual penal, concretamente nos termos do artigo 379.º CPP, sentença nula é aquela que se encontra inquinada por vícios decorrentes ou do seu conteúdo ou da sua elaboração. Tal nulidade, ainda que não arguida em recurso, é de conhecimento oficioso, conforme decorre do nº2 do mesmo artigo.
A este respeito convocamos o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 1/2003, que considera ferida de nulidade a notificação ao arguido que “...não lhe oferecer todos os elementos necessários para que este fique a conhecer a totalidade dos aspetos relevantes para a decisão, nas matérias de facto e de direito”.
Não obstante registarmos que em sede de ilícito contraordenacional não se colocam com a mesma profundidade e grau de exigência as necessidades de fundamentação impostas à elaboração da sentença penal,[1] assentamos, porém, em que a fundamentação, de facto e de direito na sentença condenatória em processo contraordenacional, ainda que sucinta, deverá transcrever a respetiva factualidade, indicar as normas jurídicas violadas e explicitar de que forma os factos se subsumem ao direito e qual o critério seguido para determinar as coimas concretas e a coima única em caso de concurso de contraordenações determinante da realização de cúmulo jurídico. Só assim a decisão condenatória num processo contraordenacional dará cabal cumprimento ao AUJ n.º 1/2003 acima referido, e respeitará garantias de defesa do arguido, oferecendo-lhe, (citando de novo o mencionado aresto) “os elementos necessários para que este fique a conhecer a totalidade dos aspetos relevantes para a decisão, nas matérias de facto e de direito”.
Ora, tal não sucede de todo na situação que agora nos ocupa, pois que no que diz respeito ao processo de determinação das medidas das coimas parcelares e da coima única, a sentença recorrida consignou apenas que “(…) entende-se relativamente a contraordenação de incumprimento dos requisitos na área de serviço manter a coima aplicada a Arguida pelos mínimos legais isto é a coima de 8200 euros e relativamente a contraordenação de falta de sinalização, com modelo de interdição ou condicionamento de fumar condenar a arguida na coima de 1250 euros mínimo legal e em cumulo de coimas nos termos do artigo 19 do RGCO, D. L. N.0 433/82., de 27 de Outubro, condenar a Arguida na coima única de 9000 euros”.
E por aqui se ficou. Nada se escreveu relativamente ao cumprimento dos critérios legalmente previstos nos artigos 18.º e 19º do RGCO para a determinação das medidas das coimas parcelares e da coima única, o que inviabiliza o escrutínio da legalidade de tal operação.
Nesta conformidade, considerando que da leitura da sentença recorrida não se aferem quais os critérios ponderados na determinação das medidas concretas das coimas parcelares e da coima única, verifica-se indubitavelmente a nulidade da sentença por falta de fundamentação nos termos dos artigos 374.º, n.º 2 e 379.º do Código de Processo Penal ex vi dos artigos 41.º, nº 1.º e 74.º, nº 4.º do RGC.
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2 – Da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (artigo 410º, nº 2, al. a) do CPP ex vi dos artigos 41.º, nº 1.º e 74.º, nº 4.º do RGC).
Pese embora a recorrente não invoque expressamente na sua motivação e nas conclusões que da mesma extraiu a existência dos vícios consagrados no nº 2 do artigo 410º do CPP, atendendo ao caráter oficioso de que se reveste o respetivo conhecimento, procederemos de seguida à sua apreciação.
Os poderes de cognição dos Tribunais da Relação encontram-se expressamente consignados no artigo 428.º do CPP, dispondo o mesmo que “As Relações conhecem de facto e de direito”, sendo certo que, conforme acima explicitámos, nos recursos de contraordenação o Tribunal da Relação funciona como última instância, conhecendo apenas da matéria de direito, mas também como tribunal de revista ampliada, podendo alterar a decisão do Tribunal recorrido sem qualquer vinculação aos termos e ao sentido em que foi proferida, ou anulá-la e devolver o processo ao mesmo Tribunal, sempre sem prejuízo do conhecimento oficioso de qualquer dos vícios referidos no artigo 410.º CPP.
Na impugnação restrita, diferentemente do que sucede na impugnação da matéria de facto em sentido amplo – esta com observância dos ónus impostos pelo artigo 412.º, n.ºs 3 e 4 do CPP, não admissível nos presentes autos – os vícios da decisão, consagrados no n.º 2 do art.º 410.º do CPP, deverão resultar do próprio texto da decisão recorrida e a sua verificação pelo tribunal de recurso prescinde da análise da prova concretamente produzida e atém-se à conexão lógica do texto da decisão, por si só, ou conjugado com as regras da experiência comum.
Analisemos se a sentença recorrida enferma do vício consagrado no n.º 2, al. a) do art.º 410.º do CPP.
De acordo com o disposto no artigo 410.º, nº 2, alínea a) do CPP, mesmo nos casos em que a lei restringe a cognição do Tribunal a matéria de direito e desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, o recurso pode ter como fundamento a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada. Ora, na situação vertente, emerge como manifesta tal insuficiência – concretamente no que diz respeito à identificação do ou dos legais representantes da arguida e à descrição das condutas, por ação ou por omissão, que possam ser atribuídos à pessoa coletiva, praticadas a título doloso ou negligente e que integrem os ilícitos contraordenacionais pelos quais a recorrente foi condenada.
Efetivamente, confrontando a sentença recorrida, nela descortinamos claramente o aludido vício.
Analisemos mais de perto as identificadas situações.
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Cabe sindicar a existência do vício da sentença previsto no artigo 410.º, nº 2.º, al. a) do CPP, ou seja, a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.
Tal vício ocorre nas situações em que a simples leitura da decisão, por si ou conjugada com as regras da experiência comum, permite concluir que a matéria de facto provada na sentença não suporta a decisão de direito, quer quanto à culpabilidade quer quanto à determinação da pena. Ou seja, dito de outro modo, tal vício verifica-se quando a conclusão a que se chega não é suportada pelas respetivas premissas, isto é, quando a matéria de facto apurada não é a suficiente para fundamentar a solução de direito encontrada.
E tal sucede não só quando os factos dados como provados não permitem concluir se o arguido praticou ou não um crime ou uma contraordenação, mas também quando de tais factos não constam todos aqueles que foram tidos em consideração para a verificação de causas de exclusão da ilicitude, da culpa ou da imputabilidade do arguido ou para a graduação da medida da pena.
Na situação dos autos, a sentença recorrida não identifica os legais representantes da arguida, nem os seus trabalhadores, mencionando indistintamente uns e outros, não nos permitindo apreender se as condutas ilícitas, também elas não concretizadas, foram perpetradas por uns ou por outros e de que forma. De facto, a seleção factual constante da decisão não inclui a identificação do ou dos legais representantes da arguida, sendo certo que nos factos provados nº 5., 6. e 7. se referem, reiteradamente, os “empregados e representantes da arguida que trabalhavam no referido estabelecimento” atribuindo-se a tais pessoas o conhecimento e a vontade de realização dos tipos contraordenacionais, sem que, no entanto, em nenhum momento, se dê como provado que as referidas pessoas agiram por determinação e em representação da arguida.
É certo que a falta de individualização da pessoa singular cuja atuação configurou uma infração imputável à pessoa coletiva, não se revela indispensável para efeitos de responsabilização desta. A imputação da prática de um ilícito contraordenacional a uma pessoa coletiva não pressupõe, a nosso ver, que se indague qual ou quais as pessoas singulares que em concreto levaram a cabo as condutas geradoras de responsabilidade contraordenacional da pessoa coletiva.
A referida imputação demandará apenas que se apurem condutas, por ação ou por omissão, que possam ser atribuídos à pessoa coletiva – e a atribuição à pessoa coletiva resulta da circunstância de se haver concluído que tais condutas são da responsabilidade da mesma e, portanto, que foram praticados pelos seus órgãos no exercício das respetivas funções, independentemente da individualização das pessoas concretas que integram tais órgãos – sendo certo que a referida entidade é legalmente tratada como um centro autónomo de imputação de ilícitos contraordenacionais.
De facto, quanto ao modelo de imputação consagrado no artigo 7.º, n.º 2, do RGCO, perfilhamos o entendimento segundo o qual o mesmo prevê uma imputação autónoma ou direta da infração à pessoa coletiva, pelo que não é necessária a identificação concreta do agente singular que cometeu a infração para que a mesma seja imputável àquela. E, assim sendo, as pessoas singulares representantes da pessoa coletiva infratora e responsáveis pelas infrações, não têm que ser indicadas na decisão condenatória proferida na fase administrativa do processo.[2]
Porém, na situação vertente, a decisão recorrida não cuidou igualmente de concretizar quais as condutas, por ação ou por omissão, que possam ser atribuídos à pessoa coletiva.
Assim, os factos atinentes aos elementos objetivos das contraordenações encontram-se descritos de forma absolutamente conclusiva e impessoal nos pontos 3. e 4. dos factos provados, dos quais consta “3.- Foi constatada a incorreta instalação do sistema de exaustão por falta de isolamento da tubagem, não evitando desta forma a propagação de fumos e cheiros.” “4.- Foi verificada a inexistência de aviso a restringir a venda de bebidas alcoólicas e bem assim, o dístico de permissão de fumar.”.
Nenhum outro facto relativo aos elementos objetivos dos ilícitos contraordenacionais consta dos factos provados da sentença recorrida.
Acresce que, no que diz respeito à contraordenação relativa à “área de serviço”, ao invés de descrever o sistema de exaustão instalado no estabelecimento e, bem assim, as concretas deficiências no mesmo verificadas, por forma a viabilizar a extração da conclusão relativa à sua adequação ou desadequação, tendo por referência a norma legal aplicável, a sentença fez constar como único facto relevante a própria conclusão “foi constatada a incorreta instalação do sistema de exaustão por falta de isolamento da tubagem, não evitando desta forma a propagação de fumos e cheiros”, nada mais consignando acerca da conduta contraordenacional que subsumiu ao artigo 123.º n.º 1, al. b) e n.º 2, conjugado com o artigo 126.º n.º 3 do Decreto-Lei n.º 10/2015, de 16 de janeiro.
Impunha-se, pois, que a decisão condenatória tivesse cuidado de identificar quais as condutas da arguida – por ação ou por omissão – desenvolvidas em seu nome por quem a representa, que preenchem os elementos objetivos dos tipos contraordenacionais em causa.
Porém, não o fez. Em bom rigor, não identificou qualquer conduta, muito menos a imputou a qualquer pessoa que representasse a arguida, tendo-se limitado a utilizar as fórmulas vagas e impessoais “Foi constatada a …” e “Foi verificada a…”, tendo consignado mais à frente, “5.- Os empregados e representantes que trabalhavam no referido estabelecimento da arguida não sabiam, nem previram ou aceitaram a realização dos factos supra referidos em 4.-, embora devessem, por estarem obrigados a cumprir as regras relativas ao exercício da atividade da Arguida, designadamente, assegurar-se da afixação dos devidos avisos relativamente à venda e ao consumo de álcool e tabaco, no interior do estabelecimento, verificar se tais factos não ocorriam”
e
“6.- Os empregados e representantes da arguida que trabalhavam no referido estabelecimento sabiam e aceitaram a situação descrita no facto supra referido em 3., não se inibindo, não obstante tal situação, de manter a laboração do referido estabelecimento, sabendo que a mesma contrariava as regras que estavam obrigado(a) a cumprir relativas ao exercício da sua atividade, designadamente, ao cumprimento dos requisitos do estabelecimento”.
Tal exposição factual revela-se, a nosso ver, claramente insuficiente para sustentar a imputação de uma conduta dolosa ou negligente a uma pessoa coletiva, registando-se, ademais, que o conhecimento e vontade de realização dos ilícitos em causa ou a violação dos deveres de cuidado que lhes deram origem não se consubstanciam no facto de os “empregados e representantes da arguida que trabalhavam no referido estabelecimento” saberem que existia uma incorreta instalação do sistema de exaustão e terem aceitado continuar a laborar ou no facto de não saberem nem terem previsto ou aceitado a inexistência do aviso a restringir a venda de bebidas alcoólicas e do dístico de permissão de fumar, mas deverem tê-lo feito “por estarem obrigados a cumprir as regras relativas ao exercício da atividade da arguida”.
Parece-nos evidente que o dolo e a negligência dos tipos contraordenacionais em causa não poderão deixar de traduzir-se no conhecimento e vontade da arguida de ter instalado ou mandado instalar incorretamente o aludido sistema de exaustão (conduta desvaliosa por ação) ou ter permitido que o estabelecimento continuasse a laborar com o mencionado sistema deficiente de exaustão (conduta desvaliosa por omissão) e de não ter diligenciado pela colocação do dístico e do aviso (conduta desvaliosa por omissão).
E o que dizer da circunstância de nos factos 11.,12. e 14. a sentença dar como provado que “11.- A data dos factos em causa nos presentes autos coincidiu com um período de tempo em que o legal representante da Arguida, por motivos de saúde, viu-se impedido de controlar tudo o que se passava nos diversos estabelecimentos da Arguida.
12.-0 legal representante da Arguida sofreu, nessa altura, um aneurisma, motivo que determinou o seu internamento hospital.
(…)
14.-A Arguida, na pessoa do seu legal representante, desconhecia que não se encontravam ambos os avisos supra referidos devidamente afixados, e desde que passou a ser obrigatória a afixação dos mesmos a Arguida sempre ordenou que se procedesse à respetiva afixação.”?
Pese embora tais factos não se encontrem em total contradição com os factos nºs 5., 6. e 7. – contradição que apenas se não verifica porquanto desconhecemos se o legal representante referido nos factos 11. 12. e 13. se incluía nos “empregados e representantes da arguida que trabalhavam no referido estabelecimento” mencionados nos pontos5., 6. e 7. – a prova dos mesmos contribui fortemente para intensificar a nossa convicção relativa à verificação do vício previsto no artigo 410º, nº 2, al a) do CPP, pois que de tal factualidade parece-nos resultar, pelo menos, a falta de conhecimento e vontade de realização dos ilícitos contraordenacionais, ou seja, a falta de dolo da pessoa coletiva.
Não olvidando as especificidades dos ilícitos contraordenacionais quando comparados com o direito penal, das quais resulta que – não obstante enquanto processo sancionatório o mesmo dever assegurar ao arguido um conjunto de garantias equivalentes às previstas no processo criminal – tal processo não se encontra onerado com o mesmo grau de rigor e exigência de explanação, impostos à sentença penal, sempre diremos que é necessário que dos factos se consiga retirar o alcance objetivo e subjetivo das condutas, o que, inquestionavelmente, não sucede na decisão sindicada no presente recurso.
Dito de outra forma, a factualidade tida em conta pelo tribunal “a quo” para considerar preenchidos os elementos objetivos e subjetivos das contraordenações revela-se claramente insuficiente atendendo à falta de concretização das condutas imputadas à arguida, quer em termos objetivos que em termos subjetivos. Assim, a conexão entre a factualidade que o tribunal recorrido julgou provada e análise que faz da mesma aquando da sua subsunção às normas jurídicas aplicáveis apresenta-se como logicamente inaceitável, por insuficiência da primeira.
Pelo exposto, somos a concluir pela existência do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada previsto no artigo 410.º, nº 2.º, al. a) do CPP, o que determina o reenvio dos autos ao tribunal recorrido nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 426º, nº 1 do CPP, aplicáveis ex vi dos artigos 41.º, nº 1.º e 74.º, nº 4.º do RGC.
***
Atendendo à verificação do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e da nulidade que inquinam a sentença recorrida, fica prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas no recurso e acima elencadas.
Assim, nos termos do disposto no artigo 426º, nº 1 do CPP, impõe-se determinar o reenvio do processo para apuramento dos factos acima enunciados, com vista ao suprimento do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e com vista à elaboração de nova decisão com sanação do aludido vício e da nulidade de que enferma a sentença recorrida.
Consigna-se, finalmente, que na elaboração de tal decisão deverá o tribunal recorrido ter em conta a nova redação das normas jurídicas aplicadas na sentença recorrida, que lhes foi conferida pelo Decreto-Lei nº 9/2021, de 29 de Janeiro, diploma que – tendo entrado em vigor 180 dias após a sua publicação, nos termos do seu artigo 183º – expressamente consigna, no seu artigo 182º, que “1 - Aos processos de contraordenação pendentes à data da entrada em vigor do presente decreto-lei aplica-se o regime que, em concreto, se afigure mais favorável ao arguido.”
***
III – Decisão
Por tudo o exposto e considerando a fundamentação acima consignada, acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em:
A) Declarar nula a sentença recorrida nos termos do artigo 379.º, nº 1, al. a) primeira parte, por inobservância do disposto nos artigos 374.º, nº 2, ambos do CPP ex vi dos artigos 41.º, nº 1.º e 74.º, nº 4.º do RGC;
B) Declarar a existência do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada previsto no artigo 410.º, nº 2.º, al. a) do CPP ex vi dos artigos 41.º, nº 1.º e 74.º, nº 4.º do RGC.
C) Determinar o reenvio dos autos ao tribunal “a quo” para se apurar, com a precisão possível, as condutas, por ação ou por omissão, que possam ser atribuídos à pessoa coletiva, a título de dolo ou de negligência, devendo, subsequentemente, ser proferida nova decisão na qual deverão suprir-se o vício e a nulidade assinalados.

Sem tributação.
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(Processado em computador pela relatora e revisto integralmente pelas signatárias)

Évora, 16 de dezembro de 2021.
Maria Clara Figueiredo
Maria Margarida Bacelar
Sumário
I – Pese embora em sede de ilícito contraordenacional não se coloquem com a mesma profundidade e grau de exigência as necessidades de fundamentação impostas à elaboração da sentença penal, a fundamentação de facto e de direito da sentença condenatória em processo contraordenacional, ainda que sucinta, deverá transcrever a factualidade, indicar as normas jurídicas violadas e explicitar de que forma os factos se subsumem ao direito e qual o critério seguido para determinar as coimas concretas e a coima única em caso de concurso de contraordenações determinante da realização de cúmulo jurídico. Não o fazendo, será nula, nos termos do artigo 379.º, nº 1, al. a) primeira parte, por inobservância do disposto nos artigos 374.º, nº 2, ambos do CPP, ex vi dos artigos 41.º, nº 1.º e 74.º, nº 4.º do RGC.

II – O vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada previsto no artigo 410.º, nº 2.º, al. a) do CPP ocorre quando a conclusão a que se chega não é suportada pelas respetivas premissas, isto é, quando a matéria de facto apurada não é a suficiente para fundamentar a solução de direito encontrada, padecendo de tal vício a sentença condenatória em processo contraordenacional que não cuidou de concretizar as condutas que, por ação ou por omissão, são atribuídos à pessoa coletiva, não permitindo, assim, que dos factos se consiga retirar o alcance objetivo e subjetivo de tais condutas._______________________________________________
[1] A este propósito vide, entre outros, acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12.09.2007, lavrado no Proc. 0711693 e disponível em www.dgsi.pt
[2] Neste sentido se pronunciou expressamente o Acórdão do TC nº 566/2018, relatado pelo Conselheiro Pedro Machete, no âmbito do Processo nº processo n.º 336/18, disponível no site do Tribunal Constitucional, tendo decidido “Não julgar inconstitucional a norma extraída do artigo 283.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, aplicável ex vi artigo 41º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, e artigo 45º da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, e dos artigos 50.º e 58º do citado Decreto-Lei n.º 433/82, igualmente aplicáveis por força do referido artigo 45.º, segundo a qual «em decisão condenatória proferida na fase administrativa de processo contraordenacional não carecem de ser indicadas as pessoas singulares representantes da pessoa coletiva infratora responsáveis pelas infrações».