PROCEDIMENTO DISCIPLINAR
JUIZ
DIREITO DE DEFESA
SANÇÃO DISCIPLINAR
SUSPENSÃO
IMPUGNAÇÃO
CUMPRIMENTO DE PENA
NOTIFICAÇÃO
ATO ADMINISTRATIVO
VIOLAÇÃO DA LEI
ERRO NOS PRESSUPOSTOS DE FACTO
APRECIAÇÃO DA PROVA
DISCRICIONARIEDADE
ESCOLHA DA PENA
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
Sumário


I. A jurisprudência constitucional tem unanimemente defendido que os direitos de audiência e defesa previstos no artigo 32.º, da CRP, apesar de terem de ser reconhecidos na generalidade de procedimentos ou processos sancionatórios, não gozam do remanescente do regime garantístico do processo criminal para todos os demais ramos do direito sancionatório e, em particular, para o processo disciplinar. Essa exigência constitucional não tem aplicação ao processo disciplinar e nem sequer ao processo contraordenacional. A CRP, nesse tipo de processos, tem somente em vista assegurar os direitos de audiência e de defesa do arguido; e só poderá haver um juízo negativo de constitucionalidade quando qualquer tipo de sanção (contraordenacional, administrativa, fiscal, laboral, disciplinar ou qualquer outra) é aplicada sem prévia audição do arguido e sem lhe conferir condições para se defender das imputações que lhe são feitas, apresentando meios de prova e requerendo a realização de diligências tendentes a apurar a verdade.
O artigo 122.º, do EMJ, quando interpretado no sentido de permitir que um arguido, sancionado com uma pena de suspensão, comece a cumprir a pena antes de transitar em julgado a decisão que a aplicou, não é inconstitucional. O magistrado a quem seja aplicada sanção disciplinar pode sempre lançar mão de impugnação administrativa necessária para o Plenário do CSM, nos termos do disposto no artigo 167.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), do EMJ, ou pode impugnar contenciosamente a deliberação que lhe aplique tal sanção, nos termos do disposto nos artigos 169.º e 170.º do EMJ. Pelo que, a sanção disciplinar não se consolida enquanto tais impugnações não forem objecto de decisão.
E, nos termos do disposto no artigo 122.º, do EMJ, a decisão punitiva pode nem sequer começar a produzir efeitos de imediato, ou até pode ver esses efeitos suspensos, se o magistrado punido a impugne administrativamente para beneficiar da suspensão automática que decorre do artigo 167.º-A do EMJ; ou então, já em fase contenciosa, e apesar de a acção administrativa não ter tal efeito (artigo 172.º, n.º 1, do mesmo diploma), pode sempre interpor providência cautelar de suspensão de eficácia até ao trânsito em julgado da decisão naqueloutra acção administrativa (artigo 128.º do CPTA, ex vi artigos 172.º, n.ºs 2 e 3, e 174.º, ambos do EMJ).
Por último, a decisão não se consolida porque, em caso de procedência da impugnação contenciosa do acto punitivo por decisão jurisdicional, o acto ou é declarado nulo e não produz quaisquer efeitos (artigo 162.º, n.º 1, do CPA), ou é anulado, destruindo-se, assim, retroactivamente todos os seus efeitos (artigo 163.º, n.º 2, do CPA). Além disso, sempre operará o efeito de reconstituição da situação actual hipotética que decorreria para o magistrado punido no caso de não ter sido praticada a sanção entretanto anulada (artigo 173.º do CPTA).
Pelo que apenas uma decisão jurisdicional pode transitar em julgado.

II. Da notificação da decisão (punitiva) não consta a obrigatoriedade da advertência sobre a data de produção de efeitos, nos termos do disposto nos artigos 121.º e 118.º, n.ºs 1 e 2, do EMJ, e 114.º, n.º 2, do CPA.

III. Os pressupostos do acto administrativo são as circunstâncias objectivas, normativamente previstas, de cuja verificação depende a constituição do órgão administrativo no poder-dever de agir mediante a prática de um acto administrativo de determinado tipo legal. Se a emissão do acto se baseou nos pressupostos legalmente devidos, mas não efetivamente existentes, ocorre falta de um pressuposto real ou de facto (a circunstância legalmente prevista não se verificou na realidade).

IV. O vício de violação de lei ocorre quando é efectuada uma interpretação errónea da lei, aplicando-a à realidade a que não devia ser aplicada ou deixando-a de aplicar à realidade que devia ser aplicada.

V. Quanto ao erro sobre os pressupostos de facto em processos em que se discute a validade de actos que aplicam penas disciplinares, cabe ao interessado alegar e provar os vícios que possam pôr em dúvida a validade do acto. Estando em causa um erro quanto aos pressupostos de facto, não pode o interessado limitar-se a manifestar a sua discordância com a matéria de facto e a pedir a reapreciação de toda a prova produzida no processo administrativo ou a sua renovação perante o juiz administrativo, impondo-se antes que delimite com precisão os aspectos relativamente aos quais se verificou um erro de apreciação das provas ou os concretos pontos de facto que entende não corresponderem à realidade, bem como os concretos meios de prova que pertinentemente possam demonstrar a ocorrência de um erro na fixação dos factos.

VI. Pelo que o interessado não pode bastar-se com a simples ou mera negação dos factos que lhe são imputados, cabendo-lhe alegar um conjunto de factos que corporizem a falta de consistência da imputação e sanção de que foi alvo, dos quais se indicie a ilegalidade e que aponte para o erro da imputação.

VII. Importa distinguir entre a situação em que o impugnante contradita os factos que serviram de fundamento à decisão administrativa e requer ao tribunal a produção de novos meios de prova ou a renovação de meios de prova já produzidos no procedimento administrativo, daqueloutra em que pretende apenas discutir a validade do juízo formulado pela entidade administrativa quanto à prova coligida, porquanto num caso está em causa a reapreciação da matéria de facto com base num possível erro na fixação dos factos materiais da causa e, no outro, discute-se apenas um eventual erro na apreciação das provas.

VIII. No tocante à apreciação da prova disciplinar, e de harmonia com os princípios da oficialidade e da verdade real, vale para o instrutor a regra da liberdade da apreciação das provas [artigo 91.º, n.º 2, do CPA], salvo existência de regra legal que a afaste.

IX. Na fixação da medida da pena, a Administração, embora tenha de respeitar os parâmetros legais, goza de certa margem de liberdade.

X. A gravidade da pena a aplicar depende do grau de responsabilidade do agente. A sua apreciação está entregue ao critério dos titulares do poder disciplinar que a avaliarão de acordo com os conhecimentos da personalidade do infractor e das circunstâncias em que agiu. Por isso, ao contrário do que sucede no direito criminal, não se estabelece a correspondência rígida de certas sanções para cada tipo de infracção, deixando-se a quem haja de decidir amplo poder discricionário para punir as infrações verificada.

XI. O artigo 266.º, n.º 2, da CRP sujeita toda a atividade administrativa aos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé. Tais princípios concretizam uma objectivação dos critérios jurídicos de controlo do exercício da margem de livre apreciação, conferindo verdadeiros parâmetros de racionalidade a partir dos quais o Tribunal, face à dinâmica factual apurada e a situação concreta que lhe é submetida, afere da respetiva compatibilização com a juridicidade.

XII. O controlo jurisdicional do exercício administrativo de poderes discricionários é um controlo externo e negativo, que apenas permite aos tribunais a anulação da solução adoptada se ela violar os cânones da razoabilidade e racionalidade básicas, quer em termos jurídicos, quer em termos de senso comum; mas proíbe a definição, pela positiva, do caso concreto, substituindo-se à Administração Pública na ponderação das valorações que integram a margem de livre apreciação, salvo nas chamadas situações de redução da discricionariedade a zero, a que alude o n.º 2, do artigo 71.º, do CPTA. Daí que a violação dos princípios aludidos no n.º 2, do artigo 266.º, da CRP apenas devam determinar a anulação do acto administrativo se for flagrante e ostensiva.

Texto Integral



Processo n.º 11/21.2YFLSB
Autor/recorrente: Juiz de Direito Dr. AA
Entidade demandada: Conselho Superior da Magistratura.


Acordam na Secção do Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça

I. RELATÓRIO
1. O Autor, Juiz de Direito Dr. AA vem intentar Acção Administrativa de Impugnação de Acto Administrativo contra o Conselho Superior da Magistratura (CSM), consubstanciado na Deliberação do Conselho Plenário do CSM, de 20 de abril de 2021, que indeferiu a impugnação administrativa, “aplicando ao Senhor Juiz de Direito Dr. AA, por violação dos deveres de zelo e de assiduidade e pela prática da infração disciplinar prevista na alínea e) do n.º 1 do art.º 83.º-H do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a sanção disciplinar de 90 dias de suspensão”.
2. Na sua Petição Inicial, suscita, em síntese, as seguintes questões:
a) Inconstitucionalidade do artigo 122.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), quando interpretado no sentido de permitir que um arguido, sancionado com uma pena de suspensão, comece a cumprir a pena antes de transitar em julgado a decisão que a aplicou;
b) Nulidade / irregularidade de notificação de decisões punitivas;
c) Violação de lei, por errónea interpretação da Lei e aplicação do direito, por violação do princípio do contraditório, do direito à defesa e do princípio da presunção de inocência;
d) Erro na apreciação da prova:
a. Incorreção do facto dado como provado sob o n.º 15, já que a diligência não se realizou por falta do autor;
b. Incorreção do facto dado como provado sob o n.º 17, já que não faz qualquer sentido que o autor tenha avisado a Sra. Procuradora de que iria faltar a um julgamento de um processo cível em que ela não tinha qualquer intervenção;
c. Todas as suas faltas ao serviço deveriam ter sido consideradas como justificadas.
e) Violação do princípio da proporcionalidade.
3. Foram notificados da petição inicial e documentação anexa, o CSM e o Exmo. Sr. Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do disposto no n.º 1, do artigo 85.º, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA).
4. Em 1.06.2021, veio o CSM apresentar a sua contestação, pugnando pela sua improcedência.
5. Na mesma data - 01.06.2021-, foram apensados aos presentes autos, os de Processo Disciplinar n.º ……/PD/…10.
6. Veio o Exmo. Sr. Procurador-Geral Adjunto, junto deste Supremo Tribunal de Justiça emitir Parecer no sentido da improcedência da acção.
7. Por despacho 2.07.2021, foi determinada a notificação das partes do teor deste Parecer, para que do mesmo tomem conhecimento e possam pronunciar-se, querendo.
8. Neste despacho foi ainda determinado ao abrigo do disposto nos artigos 27.º, n.º 1, alínea a), e 87.º, n.ºs 1, alínea a) e c), e 3, ambos do CPTA, ex vi remissão operada pelos artigos 166.º, n.º 2, 169.º, 172.º, n.º 2, e 173.º, todos do EMJ, notificar o autor para, no prazo de 10 dias, vir aos autos, querendo, informar, com referência para a petição inicial, quais os concretos FACTOS que pretende ver provados com recurso às declarações de parte e aos depoimentos de testemunhas arroladas, devendo levar em linha de consideração, em tal indicação, os factos que (apenas) dependem de prova documental.
9. Notificadas as partes, veio o autor requerer a produção de meios de prova- testemunhal e depoimento de parte.
10. O CSM na sua resposta entendeu pela desnecessidade de realização das diligências, por entender que sendo a prova documental, são irrelevantes as requeridas diligências por parte do autor.
11. Foi proferido despacho em 5.10.2021 que, em suma, julgou desnecessária a abertura de um período de instrução, por considerar a prova essencialmente documental, pelo que se considerou de nenhum relevo as requeridas declarações de parte do autor com vista à comprovação de todos os factos alegados na petição inicial.
12. Mais se determinou neste despacho o seguinte que se transcreve para melhor compreensão: Findos os articulados, cumpriria agora proferir despacho saneador, porventura seguido de despacho com identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas de prova, sendo este o momento oportuno para equacionar a convocação de audiência prévia, nos termos do disposto nos artigos 87.º-A ss., todos do CPTA. In casu, porém, não se divisa qualquer utilidade ou conveniência em convocar a audiência prévia. Há, de resto, inúmeros factores que militam em sentido abertamente desfavorável a tal desiderato. Enunciamo-los sucintamente de seguida. Em primeiro lugar, é não só muito discutível, como efectivamente controvertido, que a matéria em apreço nos autos, atinente à discussão da legalidade de um ato administrativo, não se encontre subtraída à disponibilidade das partes. Por esse motivo, nunca se convocaria audiência prévia para os efeitos de forjar e promover uma tentativa de conciliação, nos termos previstos nos artigos 87.º-A, n.º 1, alínea a), e 87.º-C, ambos do CPTA. Dito isto, a convocação de audiência prévia apenas teria utilidade para os efeitos previstos nas demais alíneas [maxime as alíneas b), c) e d)] do mesmo artigo 87.º-A, n.º 1, do mesmo diploma.  Sucede que, mesmo para estes efeitos, não se divisa utilidade em convocar audiência prévia. Desde logo, inexiste qualquer exceção que não tenha sido já debatida nos articulados. (…) Neste conspecto, atendendo à causa de pedir e respetivos pedidos, julgamos que o estado do processo contém elementos suficientes para o Tribunal, com segurança, conhecer de imediato da questão de facto e de direito da causa. (…) Assim, considerando a causa de pedir e os pedidos concretamente formulados, os poderes de cognição do Tribunal e a vasta prova documental carreada para o processo, entende este Tribunal que os autos dispõem de todos os elementos necessários à apreciação e decisão do mérito da causa. Não há, pois, necessidade em proferir despacho a fixar objeto do litígio e enunciar temas da prova, a que alude o artigo 89.º-A, n.º 1, do CPTA, pelo que também não se verificam as situações que aconselhariam a realização de audiência prévia enunciadas nas alíneas c), d), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 87.º-A do mesmo diploma. Segundo o disposto no n.º 2, do artigo 87.º-B, do CPTA, “o juiz pode dispensar a realização da audiência prévia quando esta se destine apenas ao fim previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo anterior […]”, ou seja, “facultar às partes a discussão de facto e de direito, quando […] tencione conhecer imediatamente, no todo ou em parte, do mérito da causa”. Face ao exposto, e considerando ainda que a aludida discussão de facto e de direito está plenamente assegurada nos autos (posto que, na fase de articulados, as perspetivas dissonantes das partes foram amplamente explanadas), dispensa-se a realização de audiência prévia, ao abrigo do disposto nos artigos 27.º, n.º 1, alínea a), e 87.º-B, n.º 2, ambos do CPTA.
13. Cumpre, pois, apreciar e decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

A. Da Factualidade apurada com relevância para a causa:
1) A 05.02.2020, o Sr. Juiz Presidente da Comarca …. comunicou à entidade demandada CSM que haviam sido adiadas várias diligências agendadas para os dias 29.01.2020 e 04.02.2020, dada a ausência ao serviço do ora autor (cfr. fls. 1-4 do processo administrativo, na acepção dos artigos 1.º, n.º 2, do Código de Procedimento Administrativo e 84.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, doravante designado abreviadamente por PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
2) A 06.02.2020, o Sr. Juiz Presidente da Comarca ....... voltou a comunicar nova ausência do autor, agora no dia 05.02.2020 (cfr. fls. 6-9 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
3) Por despacho de 21.02.2020, o Sr. Juiz Presidente da Comarca ....... considerou justificadas as faltas ocorridas a 29.01.2010, 04.02.2020 e 05.02.2020 ao abrigo do disposto no artigo 10.º, n.ºs 4 e 7, do EMJ, mais consignando ter tomado conhecimento de que o autor também não havia comparecido ao serviço na manhã do dia 10.02.2020 e no dia de 11.02.2020 (cfr. fls. 16-17 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
4) No âmbito da ausência no dia 11.02.2020, referida em 3), resulta do PA, além do mais, o seguinte:
a. No âmbito do processo n.º 212/18….., com diligência agendada para esse dia 11.02.2020, pelas 09h30 (cfr. fls. 118 do PA, cujo teor se dá por reproduzido):
i. Deu entrada nos autos, na véspera e no próprio dia, pelas 09h08, um requerimento das partes, com pedido de homologação de transacção;
ii. O Sr. Escrivão de Direito abriu termo de conclusão nesse mesmo dia;
iii. Sobre o termo de conclusão referido supra, foi proferido despacho pelo ora autor, na qualidade de magistrado titular dos autos, com assinatura eletrónica aposta a 12.02.2020, com o seguinte teor: “Na presente ação declarativa comum, em que são autores […] e réus […], examinando o objeto e qualidade dos intervenientes da respetiva transação, julgo-a válida, pelo que homologo por sentença, condenando nos seus precisos termos, julgando extinta a instância, nos termos do disposto […] e determino, oportunamente, o arquivamento dos autos. // Custas nos termos acordados. // Notifique e Registe. // Dou sem efeito a audiência final. // Desconvoque // D.N. // d. s.”;
b. No âmbito do processo n.º 55/19….., com diligência agendada para esse dia 11.02.2020, pelas 14h00, as partes estavam presentes e foram desconvocadas, por ausência do autor (cfr. fls. 112 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
5) Por despacho de 04.03.2020, o Sr. Vice-Presidente do CSM determinou a abertura de inquérito por forma averiguar os factos relatados pelo Sr. Juiz Presidente da Comarca referidos em 1), 2), 3) e 4) (cfr. fls. 26 a 38 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
6) A 05.03.2020 foram comunicadas novas faltas do autor, nomeadamente, a 04.03.2020 e 05.03.2020, sendo a 10.03.2020 determinado pelo Sr. Vice-Presidente do CSM a ampliação do objeto do inquérito aberto pelo despacho referido em 5) a tais ausências (fls. 121-122 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
7) Sendo comunicadas à entidade demandada novas ausências do autor nos dias 19.05.2020 e 27.05.2020, foi determinando novo alargamento do objeto do inquérito, conforme despacho do Sr. Vice-Presidente do CSM, de 01.06.2020 (cfr. fls. 142 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
8) A 30.06.2020, o Sr. Inspetor Judicial deu por concluído o inquérito aberto pelo despacho referido em 5) e propôs ao CSM a instauração de procedimento disciplinar contra o autor, pela violação dos deveres de assiduidade, lealdade e de zelo em relação às ausências ao serviço nos dias 10.02.2020, 11.02.2020, 04.03.2020, 05.03.2020 e 19.05.2020, e que o inquérito constitua a parte instrutória de tal processo disciplinar, mais propondo o arquivamento relativamente às ausências ao serviço nos dias 3.052020 e 27.05.2020 (cfr. fls. 195 a 208 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
9) Por despacho de 01.07.2020, ractificado pelo Plenário a 07.07.2020, o Sr. Vice-Presidente do CSM concordou com a proposta do Sr. Inspetor referida em 8) (cfr. fls. 210 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
10) No âmbito do processo disciplinar n.º …./PD/…10, foi deduzida a acusação a 09.07.2020 (cfr. fls. 218-222 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
11) O autor apresentou defesa, alegando, em suma, o seguinte (cf. fls. 227-240 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
a. relativamente ao dia 10.02.2020, recebeu “notícia do falecimento de uma pessoa próxima”, tendo ficado “abalado psicologicamente”, tendo contactado “a Digna Magistrada do Ministério Público no sentido de transferir as duas diligências” da manhã para o início da tarde, sendo que, no entanto, as partes não tinham disponibilidade, tendo ainda realizado um julgamento, nessa mesma tarde, no âmbito do processo sumário n.º 29/20.2GPARC;
b. relativamente ao dia 11.02.2020, não se ausentou do serviço, esteve a trabalhar no seu domicílio, porquanto, no processo 212/18…. agendado para as 09h30, as partes transigiram quanto ao objeto do processo e, relativamente ao processo n.º 55/19…., agendado para as 14h15, afirma que “o Senhor Escrivão (CC) informou o arguido que todos os mandatários pretendiam que a mesma fosse dispensada, porquanto um dos mandatários tinha cerca de 40 (quarenta) documentos para juntar”;
c. quanto aos dias 04.03.2020 e 05.03.2020, afirmou que esteve doente e que as faltas apenas foram consideradas injustificadas porque a justificação foi apresentada tardiamente;
d. quanto ao dia 19.05.2020 justificou a sua ausência ao serviço devido a suspeita de contágio do seu filho com o vírus SARS-CoV-2, sendo que no período da tarde tais sintomas se agravaram.
12) Na sua defesa, o autor arrolou quatro testemunhas, cujas inquirições ocorreram entre os dias 14 e 17 de setembro (cf. fls. 266, 268, 269, 270 e 272 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
13) A 2.10.2020, foi pelo Sr. Inspector elaborado relatório final, onde se propunha, pela violação dos deveres de assiduidade, lealdade e de zelo, previstos nos artigo 7.º-A, n.º 1, 7.º-C, 10.º, n.ºs 1, 2 e 7 do EMJ, a aplicação, como reincidente, da pena de 90 (noventa) dias de suspensão de exercício de funções, para além da perda de vencimento e não contabilização de tempo de serviço (cinco dias), nos termos dos artigos, 10.º, n.º 6, e 74.º alínea c), do EMJ (cfr. fls. 275-287 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
14) Na sessão da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do Conselho Permanente do CSM realizada a 17.12.2020, foi decidido aplicar ao autor, como reincidente, da sanção de 90 (noventa) dias de suspensão de exercício, para além da perda de vencimento e não contabilização de tempo de serviço (quatro dias), nos termos dos artigos, 10.º, n.º 6, e 74.º alínea c), do EMJ (cfr. doc. 1 junto à PI e fls. 295-337 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
15) A deliberação referida em 14) foi notificada pessoalmente ao autor a 23.12.2020, através de ofício confidencial com o seguinte teor (transcrição):
(…)
Pelo presente ofício fica V. Exa. notificado, de todo o conteúdo da decisão proferida em 17-12-2020, pelo Conselho Permanente – Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares deste Órgão no processo supra referenciado em que V. Exa. É arguido, registado na Secretaria deste Conselho sob o n.º ...../PD/...10, decisão da qual se remete fotocópia.
Igualmente se remete fotocópia do relatório final elaborado pelo Exmo. Senhor Inspetor Judicial, Juiz desembargador, Dr. BB.
Da referida deliberação poderá reclamar para o Plenário no prazo de 30 dias – artigo 167.º, n.º 2, al. a) do EMJ.
(…)
(cf. fls. 320 e 337 do PA, cujo teor se dá por reproduzido)
16) A 10.03.2020, o autor apresentou impugnação administrativa para o Plenário do CSM da deliberação referida em 14) (cfr. fls. 362-367 do PA, cujo teor se dá por reproduzido; vide também doc. 2 junto à PI).
17) A 20.04.2021, o Plenário do CSM, reunido para apreciar a impugnação administrativa referida em 16), proferiu deliberação com o seguinte teor (transcrição):
(…)
Processo Disciplinar n.º ...../PD/...10:
Impugnação Administrativa
Deliberam, no plenário do Conselho Superior de Magistratura,
I – Relatório

Por despacho de 4 de março de 2020, posteriormente ampliado por despachos de 10 de Março e de 1 de Junho, de 2020, determinou o Senhor Conselheiro Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura a realização de inquérito com vista ao apuramento de factos relativos ao Senhor Juiz de Direito Dr. AA, atualmente em exercício de funções no Juízo Local de Competência Genérica de ……. e respeitantes a ausências ao serviço e adiamento de diligências sem justificação, no Juízo Local de Competência Genérica ……..
Concluída a instrução do inquérito, foi elaborado o relatório datado de 30 de junho de 2020, no qual foi proposta pelo Senhor Instrutor a instauração de processo disciplinar ao Senhor Juiz de Direito em relação às ausências ao serviço dos dias 10 e 11 de fevereiro; 4, e 5 de março; e 19 de maio, todos do ano de 2020, e que o inquérito constituísse a parte instrutória desse processo. Mais propôs o Senhor Inspetor o arquivamento em relação às ausências relativas aos dias 3 de março e 27 de maio, de 2020. Concordando com a referida proposta, remeteu-a o Senhor Vice-Presidente ao Plenário do Conselho Superior da Magistratura, que a ratificou na sua sessão de 7 de julho de 2020.
Em 9 de julho de 2020 foi deduzida acusação, nela se imputando ao Senhor Juiz de Direito arguido o cometimento de infração disciplinar genericamente prevista no art. 82. ° do Estatuto dos Magistrados Judiciais, por violação dos deveres de assiduidade, lealdade e de zelo, por infração aos arts. 7.°-A, n.º 1; 7.°-C; e 10.°, n.ºs 1, 2 e 7, sendo essa infração considerada grave nos termos do proémio do art. 83.°-H e também especificamente nos termos da al. e) - sendo certo que as faltas injustificadas por si, se mais não houvesse, sempre seriam punidas nos termos do artigo 83.°- I, al. a), todos do Estatuto do Magistrados Judiciais anunciando-se a punição dessa infração com pena de suspensão de exercício, uma vez que a conduta em causa consubstancia grave desinteresse pelo cumprimento dos deveres profissionais e manifesto desprestígio para a função jurisdicional - arts. 91 n. ° 1, al. d), 95. ° e 101. ° do Estatuto dos Magistrados Judiciais. Mais se referiu em tal peça que o Sr. Juiz de Direito arguido deverá ser punido agravadamente como reincidente, por se verificarem os pressupostos do art. 86.°, n.º 1, do Estatuto dos Magistrados Judiciais, uma vez que as circunstâncias do caso revelam a ausência de eficácia preventiva da condenação anterior, sendo por isso o limite mínimo da suspensão dilatado nos termos do n.º 2 do referido normativo e ainda que as ausências ilegítimas por cinco dias implicam ainda a perda de vencimento e a não contabilização de tempo de serviço, nos termos dos artigos 10.°, n° 6 e 74.°, al. c), também do Estatuto dos Magistrados Judiciais.
Notificado da acusação, apresentou o Senhor Juiz defesa, na qual pugnou pelo arquivamento do processo, porquanto, em suma:
- No dia 10/02/2020 não se apresentou ao serviço da parte da manhã face à notícia do falecimento de uma pessoa próxima, que comunicou à Magistrada do Ministério Público, tendo-se, porém, deslocado ao Tribunal da parte da tarde com o intuito de realizar as diligências da manhã, o que não foi possível porque as partes não tinham disponibilidade para a parte da tarde. De todo o modo realizou julgamento da parte da tarde no âmbito de um processo sumário. Assim sendo, a ausência ao serviço no dia 10/02, apenas da parte da manhã e que se enquadra materialmente no art. 10. ° do EMJ, não tem relevância ou densidade disciplinar;
- No dia 11/02/2020, ao início da manhã, foi informado telefonicamente pelo Sr. Escrivão de Direito, que no dia anterior tinha dado entrado um requerimento de transação, pelo que a audiência final não se iria realizar, pelo que o informou que iria ficar em casa a trabalhar. Relativamente à audiência da tarde, o Sr. Escrivão informou o arguido que os mandatários pretendiam que fosse dispensada porquanto um dos mandatários tinha cerca de 40 documentos para juntar, pelo que compreendendo os argumentos apresentados não se realizou a agendada audiência prévia para a parte da tarde, pelo que nesse dia o arguido não esteve ausente ao serviço;
- Nos dias 04 e 05/03/2020, esteve ausente ao serviço, mas porque esteve doente, tendo havido apenas uma comunicação tardia de tal facto ao Sr. Juiz Presidente da Comarca, pelo que o único comportamento censurável, no limite, é a comunicação tardia, que não tem relevância disciplinar;
- No dia 19/05/2020 não de deslocou ao serviço uma vez que o seu filho apresentava sintomas compatíveis com "SARS-CoV-2", nomeadamente febre, pelo que decidiu permanecer na sua habitação comunicando tal facto à secretaria e que a diligência devia ser transferida para a parte da tarde. Face ao evoluir dos sintomas do seu filho, não pôde deslocar-se ao Tribunal no período da tarde, pelo que informou de tal a secretaria e pediu para informar os intervenientes processuais e o Sr. Presidente da Comarca .......;
- No final do dia 19/05, início do dia 20/05, o arguido depois de conhecer o quadro evolutivo da doença do seu filho, deu conhecimento ao Sr. Presidente da Comarca ....... e pediu a justificação da sua ausência, o que não ocorreu. Porém, a falta devia ter sido justificada ao abrigo do art. 10. °, n.º 1 do EMJ, sendo certo que logo que teve a certeza que iria estar ausente ao serviço (da parte da tarde) e não realizaria as diligências agendadas, o arguido ordenou que tal comunicação fosse efetuada ao Sr. Juiz Presidente, pelo que foi tempestiva e deve ser considerada justificada. Mesmo que assim não fosse, o motivo da ausência, sempre seria válido, mas com atraso na comunicação, ou seja sem relevância disciplinar.
Concluiu pedindo que os autos fossem arquivados, sendo que caso assim não se entenda, os factos imputados ao arguido não revelam falta de zelo e grave desinteresse pelo cumprimento dos seus deveres funcionais e manifesto desprestígio para função jurisdicional e muito menos pode ser punido como reincidente, pelo que considerando a sua boa conduta, que descreve, é injusta uma pena disciplinar mais grave que a admoestação. Requereu a tomada das suas declarações, arrolou quatro testemunhas e juntou documentos. Foram tomados os depoimentos das testemunhas arroladas. Não se procedeu à tomada de declarações ao Senhor Juiz arguido que, através do seu Ilustre Mandatário, declarou prescindir de prestar declarações.
Finda a produção de prova, elaborou o Senhor Inspetor relatório final, em conformidade com o disposto no artigo 120. ° do Estatuto dos Magistrados Judiciais, no qual são dados como provados e não provados os factos seguintes e respetiva motivação:
«1 - Factos provados
» 1 - O Sr. Juiz de Direito AA ingressou no Centro de Estudos Judiciários em …./2004 (…° Curso). Por deliberação de …./2006, foi nomeado Juiz de Direito em regime de estágio e colocado no Tribunal Judicial da Comarca ........, após o que foi nomeado Juiz de Direito e sucessivamente colocado:
» - No Tribunal Judicial da Comarca ........ (auxiliar) - Decisão de 04/07/2007, com data de posse em 01/08/2007;
» - Na Bolsa de Juízes do Distrito Judicial ........ (auxiliar) - Decisão de 16/07/2007, com data de posse de 05/09/2007 e, por essa via, afeto ao Tribunal Criminal da Comarca ........, por decisão de 12/09/2007;
» - No Tribunal Judicial da Comarca ........ (efetivo) - Decisão de 15/07/2008, com data de posse de 08/09/2008;
» - Na Bolsa de Juízes do Distrito Judicial ........ (efetivo) - Decisão de 14/07/2009, com data de posse de 04/09/2009 - e, por essa via, afeto ao Tribunal Cível ........
, por decisão de 07/09/2009, ao Tribunal Judicial da Comarca ........, por decisão de 02/09/2010, ao Tribunal Judicial da Comarca ........, por decisão de 15/12/2010, ao Tribunal Judicial da Comarca ........ e ao Tribunal Judicial da Comarca ........, por decisão de 02/02/2011, ao Juízo de Pequena Instância Criminal ........, por decisão de 25/02/2011, ao Tribunal Criminal ......., por decisão de 01/09/2011, ao Tribunal de Família e Menores ........, por decisão de 09/11/2011 e à Vara Mista ........, por decisão de 30/03/2012;
» - Na Bolsa de Juízes do Distrito Judicial ........ (efetivo) - Decisão de 10/07/2012, com data de posse de 24/09/2012 e, por essa via, afeto ao Juízo de Instância Criminal ......., por decisão de 04/09/2012, ao Círculo Judicial ......., por decisão de 04/04/2013, ao Juízo de Instância Criminal ......., por decisão de 07/07/2013, ao Juízo de Família e Menores ......., por decisão de 01/11/2013 e ao Juízo de Família e Menores ......., por decisão de 14/11/2013;
» - Na Instância Local ....... - Secção de Competência Genérica (agora Juízo de Competência Genérica .......) - Juiz .. - Decisão de 08/07/2014, com data de posse de 01/09/2014;
» - No Juízo de Competência Genérica ......., afeto no cumprimento da pena disciplinar de transferência, por decisão de 04/12/2019, com tomada de posse em 17/12/2019;
» 2 - Tem as seguintes classificações de serviço:

ClassificaçãoData de HomologaçãoTribunaisPeríodo
Bom17/11/2009Tribunal da Comarca ........ Bolsa de Juízes ........ (1.º e 2.º Juízos Criminais ........

De 10/9/2007 a 31/6/2009
Bom3/6/2014


Bolsa de Juízes ........
 a) Tribunal Cível ........
  b) 1.º Juízo do Tribunal ........
 c) 2.º Juízo do Tribunal ........
 d) 1.º Juízo do Tribunal ........
 e) 2.º Juízo do Tribunal ........
 f) Juízo da Pequena Instância Criminal ........
 g) 1.º e 2.º Juízos Criminais do TJ .......
De 7/9/2009 a 16/9/2013
              h) TFM ........
 i) Vara Mista ........

 j) Juízo de instância criminal ....... em agregação com o Juízo de Instância Criminal ....... (Comarca .......)
k) Círculo Judicial ........

.......24/4/2018Juízo de Competência Genérica ....... – J…
JFM ....... JFM .......
De 17/9/2013 a 6/9/2017


» 3 - Em 07/05/2018, na sequência da deliberação de 24/04/2018 do Conselho Plenário do Conselho Superior da Magistratura que atribuiu a classificação de "......." ao Exmo. Sr. Juiz arguido, o mesmo foi suspenso preventivamente do exercício de funções;
» 4 - Por deliberação de 03/12/2013 do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura, proferida no processo disciplinar n° …..-124/PD, junta aos autos e que aqui se dá por reproduzida, o Sr. Juiz arguido foi condenado por factos ocorridos entre 09/11/2011 e 16/07/2012 (período em que desempenhou funções no Tribunal de Família e Menores ........ e na Vara Mista ........) na pena única de 20 dias de multa suspensa na sua execução pelo período de um ano pela prática de uma infração disciplinar por violação dos deveres de assiduidade, de pontualidade e de prossecução do interesse público (faltas injustificadas, incluindo em dias de serviço de turno, e atrasos injustificados - factos ocorridos entre 28/11/2011 e 29/06/2012), a que correspondeu a pena parcelar de 10 dias de multa, de uma infração disciplinar por violação do dever de domicílio necessário, a que correspondeu a pena parcelar de 15 dias de multa, e de uma infração disciplinar por violação do dever de zelo, a que correspondeu a pena parcelar de advertência;
» 5 - Por deliberação de 04/06/2019 do Conselho Plenário do Conselho Superior da Magistratura, proferida no processo disciplinar n.º ….-40/PD, junta aos autos e que aqui se dá por reproduzida, o Exmo. Sr. Juiz visado foi condenado por factos ocorridos entre 17/09/2013 e 06/09/2017 na pena única de 180 dias de suspensão de exercício e transferência para tribunal diferente daquele em que exercia funções pela prática de uma infração disciplinar por violação grave dos deveres funcionais de prossecução do interesse público, de zelo e de assiduidade (por atrasos na prolação de decisões, atrasos em depósitos de sentenças, adiamentos injustificados e faltas injustificadas com inerente adiamento de diligências), tendo cumprido essa suspensão entre 19/06/2019 e 15/12/2019;
» 6 - Na prossecução da função jurisdicional no Juízo Local de Competência Genérica ......., competiu ao Sr. Juiz de Direito arguido desde a sua tomada de posse a tramitação de todos processos desse Juízo;
» 7 - No dia 10 de fevereiro de 2020, o Sr. Juiz de Direito AA não compareceu ao serviço, nas instalações do Juízo Local de Competência Genérica ......., até por volta das 15.30 horas;
» 8 - Nessa sequência, não se realizaram as diligências nos processos de promoção e proteção n.ºs 310/19….. e 311/19….., agendadas para o dia 10/02/2020 da parte da manhã;
» 9 - Apesar de ter contactado o Tribunal, através de mensagem telefónica enviada para a Exma. Sra. Procuradora da República, DD, e ter informado que por motivo de falecimento de familiar apenas compareceria pelas 11.30 horas, o que não sucedeu, transferindo posteriormente as diligências para as 14.00 horas;
» 10 - Não tendo comparecido a esta última hora, contactou novamente o Tribunal por volta das 14.00 horas, transferindo as diligências para as 15.00 horas, tendo, porém, os intervenientes, abandonado as instalações do Tribunal;
» 11 - Nesse dia 10 de fevereiro acabou por se apresentar nas instalações do Juízo Local de Competência Genérica ....... por volta das 15.30 horas, tendo realizado julgamento no âmbito do processo sumário crime n.º 291/20…., que estava agendado para as 14.00 horas;
» 12 - Nos processos de promoção e proteção n.ºs 310/19….. e 311/19….., tendo sido aberta conclusão no dia da realização das diligências, despachou nos seguintes moldes:
“Não se mostrando viável e realização da diligência no dia de hoje, por razões de organização do agendamento e serviço, transfiro a mesma para o dia 17 de fevereiro, pelas (…)”
» 13 - Tais justificações genéricas não tinham qualquer correspondência com a realidade, tanto mais que os despachos foram proferidos apenas, respetivamente, pelas 20.30 horas e pelas 20.32 horas, quando as diligências estavam agendadas para a parte da manhã;
» 14 - No dia 11 de fevereiro de 2020, o Sr. Juiz de Direito AA não compareceu ao serviço, nas instalações do Juízo Local de Competência Genérica .......;
» 15 - Nessa sequência, não se realizou a audiência prévia no processo comum n.º 55/19….. e o julgamento no processo comum n.º 212/18……., agendados para as 14.15 e 9.30 horas, respetivamente;
» 16 – O Sr. Juiz de Direito arguido não justificou nem comunicou estas suas ausências, nomeadamente ao Sr. Juiz Presidente do Tribunal da Comarca .......;
» 17 - Em relação ao processo comum n.º 55/19….. informou a Sra. Procuradora da República, Dra. DD, que não iria comparecer, informação que foi transmitida por esta à secção e posteriormente aos intervenientes processuais presentes para a realização da diligência;
» 18 - No que concerne ao processo comum n.º 212/18….., no dia anterior e no dia do julgamento, pelas 9.08 horas, deu entrada em juízo um requerimento das partes, tendo sido aberta conclusão ao Sr. Juiz de Direito arguido neste mesmo dia, homologou a transação efetuada apenas no dia seguinte (12/02/2020), tendo, porém, despachado com "d.s." e dizendo "Dou sem efeito a audiência final. Desconvoque", como se a sentença tivesse sido proferida antes do julgamento;
» 19 - O Sr. Escrivão de Direito contactou telefonicamente o arguido na manhã do julgamento informando que tinha entrado um requerimento de transação;
» 20 - Nos dias 04/03/2020 e 05/03/2020, o Sr. Juiz de Direito AA não compareceu ao serviço, nas instalações do Juízo Local de Competência Genérica ......., tendo contactado e informado telefonicamente a secção nesses dias que teve uma indisposição no primeiro dos referidos dias e que se encontrava de baixa médica no segundo dos dias em causa;
» 21 - Nessa sequência, com a informação referida supra, lavrada por "termo", não se realizaram os julgamentos nos processos comuns singulares n.ºs 201/19......, 694/19...... e 221/19......., no dia 04/03/2020, as conferências nos processos de promoção e proteção n.ºs 245/19......., 299/19........, 298/19......., de incumprimento de responsabilidades parentais n.º 497/07......., a leitura de sentença no processo comum singular n.º 97/19....... e a inquirição de testemunhas no procedimento cautelar n.º 277/19......., no dia 05/03/2020;
» 22 - Apenas no dia 06/03/2020, pelas 18.19 horas, através de correio eletrónico, o Dr. AA comunicou as suas ausências ao serviço nos dias 4 e 5/03/2020 ao Sr. Juiz Presidente do Tribunal da Comarca ......., informando que tinha estado doente nesses dias e juntando atestado médico (documento junto aos autos a fls. 251);
» 23 - Por despacho de 10/03/2020, Sr. Juiz Presidente do Tribunal da Comarca ......., considerou as faltas injustificadas devido à comunicação tardia e por já as ter comunicado ao Sr. Vogal do Conselho Superior da Magistratura (documento junto aos autos a fls. 123);
» 24 - No dia 12/03/2020, o Sr. Juiz de Direito arguido apresentou novo requerimento de justificação das ausências ao serviço nos dias 04 e 05/03/2020 ao Sr. Juiz Presidente do Tribunal da Comarca ......., juntando certificado de incapacidade temporária para trabalho e pedindo esclarecimentos sobre o despacho de 10/03/2020 (documentos juntos aos autos a fls. 124);
» 25 - Por despacho de 13/03/2020, manteve o Sr. Juiz Presidente da Comarca ....... o despacho que considerou injustificadas as faltas (documento junto aos autos a fls. 125);
» 26 - No dia 19/05/2020, o Sr. Juiz de Direito AA não compareceu ao serviço, nas instalações do Juízo Local de Competência Genérica ......., tendo contactado telefonicamente a secção e informado que se encontrava impedido de se deslocar ao Tribunal e que a diligência designada para essa manhã, para as 11.30 horas, no âmbito do processo de promoção e proteção n.º 421/12....... ficava adiada para a parte da tarde, pelas 14.00 horas;
» 27 - Para além da diligência no processo de promoção e proteção n° 421/12......., encontravam-se agendadas diligências para a parte da tarde nos processos urgentes de promoção e proteção n.º 101/20...... (13.45 horas), e comuns singulares n.ºs 232/14....... (audição de arguido - 14.00 horas) e 59/18....... (julgamento - 14.15 horas);
» 28 - Por volta das 14.30/14.35 horas, O Sr. Juiz de Direito AA contactou novamente a secção informando que não podia comparecer no Tribunal por estar impedido de se deslocar a Tribunal e que todas as diligências ficavam sem efeito, o que foi apenas nessa altura comunicado a todos os intervenientes processuais presentes, que aí se deslocaram;
» 29 - Pelas 14.44 horas, através de mensagem de correio eletrónico, o Sr. Escrivão de Direito BB, por determinação do Sr. Juiz de Direito arguido, informou o Sr. Presidente do Tribunal Judicial da Comarca ....... da sua não comparência nas diligências agendadas para o dia 19/05/2020 por motivos pessoais;
» 30 - No dia 20/05/2020, às 04.08 horas, através de mensagem de correio eletrónico, enviada para o Sr. Juiz Presidente do Tribunal Judicial da Comarca ......., sem juntar qualquer documento, veio comunicar que esteve ausente do serviço no dia 19/5/2020, dizendo que foi aconselhado a ter o mínimo contacto possível, principalmente com terceiras pessoas não abrangidas pelo agregado familiar, em face da eventualidade de o seu filho mais novo estar infetado com "o vírus". Mais aduziu que se tratou aparentemente de uma situação de falso alarme e continuaria a despachar os processos de casa, por não ter mais diligências agendadas nessa semana. Concluiu dizendo que a justificação apresentada se subsumia a motivos pessoais, pois foi o mesmo que acompanhou o menor durante o dia, pretendendo, "por ora", que a justificação à ausência ao serviço verse sobre o dia em causa (documento junto aos autos a fls. 161 e 162);
» 31 - Por despacho de 22/05/2020, o Sr. Juiz Presidente do Tribunal Judicial da Comarca ......., depois de fazer uma resenha sobre o sucedido e o informado, indeferiu a justificação da falta por não ter comunicado tempestivamente a respetiva ausência ao serviço ao Presidente do Tribunal, pois que a mesma lhe foi comunicada ao meio da tarde pelo Sr. Escrivão de Direito, já depois da hora designada para a realização das diligências, quando poderia ter sido feita antes, sendo que desta forma já não podia ter qualquer intervenção que permitisse salvaguardar a realização das diligências designadas (documento junto aos autos a fls. 168e 169);
» 32- A 26/05/2020, o Sr. Juiz de Direito arguido apresentou novo requerimento ao Sr. Juiz Presidente do Tribunal Judicial da Comarca ......., novamente sem juntar qualquer documento, pedindo a reponderação da justificação da falta, referindo, para além do mais, que o que estava em causa era o art. 10°, n.º 1 do EMJ, que não havia expressamente mencionado, tendo o Sr. Juiz Presidente do Tribunal Judicial da Comarca ......., a 27/05/2020, indeferido tal pretensão, concluindo que "Para além da falta de comunicação, o fundamento da decisão, a avaliação do motivo ponderoso em concreto, o contágio do "SARS-coV-2", o risco de contágio ou eventual sujeição a quarentena preventiva, não se bastaria com uma simples menção do circunstancialismo que invoca e descreve, teria de ser comprovado através do procedimento e certificação previstos, cuja existência sequer foi mencionada." (documentos juntos a fls. 151 a 154);
» 33-0 Senhor Juiz de Direito arguido sabia estar obrigado a comparecer ao serviço e apesar disso, sem ter qualquer justificação válida, não compareceu nas instalações do Juízo de Competência Genérica ....... e não realizou as diligências agendadas nos dias 10 e 11/02 e 19/5. Também nos dias 4 e 5/03, não compareceu ao serviço e comunicou tardiamente as suas ausências, sem qualquer justificação para tal atraso, tal como também sucedeu no dia 19/05, o que tudo fez de forma deliberada, livre e consciente;
» 34 - Sabia ainda que tais comportamentos, reveladores de falta de zelo e de grave desinteresse pelo cumprimento dos seus deveres funcionais e de manifesto desprestígio para a função jurisdicional, constituíam infração disciplinar e eram punidos disciplinarmente, tendo revelado com a sua postura que a sanção anteriormente aplicada de suspensão do exercício de funções por que foi condenado (também por infração disciplinar de idêntica natureza) não alcançou suficiente advertência em termos do cometimento da presente infração disciplinar.
35-0 arguido transmite a perceção de ser independente, isento nas decisões, na conduta processual e empenhado, embora os seus atrasos recorrentes e faltas tenham causado perturbação no serviço;
» 36 - Tem bom relacionamento com os funcionários judiciais, mandatários, bem como com os demais magistrados;
» 37 - Trata com urbanidade e dignidade todos os intervenientes processuais e o público em geral;
» 38 - Exerce as funções com reserva e serenidade.
» 2 - Factos não provados
» De entre o alegado na defesa que não se limita a reproduzir o que já resultava dos factos apurados, que contenha juízos meramente conclusivos, jurídicos, ou opinião pessoal quanto à relevância disciplinar da conduta, não se provou, com algum interesse para a decisão final a proferir:
» 1 - Que tenha falecido uma pessoa próxima do arguido, pela qual nutria elevada estima e consideração, e que com isso o arguido tenha ficado abalado psicologicamente e considerado não ter condições para realizaras diligências agendadas para o dia 10/02/2020 da parte da manhã;
» 2 - Que em relação ao art. 19. ° da defesa que o Sr. Escrivão tenha dito que o julgamento não se ia realizar;
» 3 - Que nessa sequência, o arguido tenha informado o Sr. Escrivão de Direito que ia ficar em casa a trabalhar;
» 4 - Art. 23° da defesa;
» 5- Art. 24° da defesa;
» 6- Art. 25° da defesa;
» 7- Arts. 41°, 43°, 44°, 45°, 46°, 54°, 55°, 56°, 58°, 59°, 60°, 61°, 62°, 63°, 64° e 66. ° da defesa, para além do que consta dos factos apurados.
» 3 - Motivação
» Os factos dados como provados assentam na apreciação crítica e global da prova produzida e que se consubstanciou no seguinte:
» - Registo biográfico, incluindo o registo disciplinar do Sr. Juiz de Direito arguido e respetivas deliberações do Plenário do Conselho Superior da Magistratura;
» - Depoimento do Sr. Presidente do Tribunal da Comarca ......., Juiz Desembargador EE, que basicamente confirmou teor do que constava da documentação junta aos autos em que teve intervenção;
» - Depoimento da Sra. Funcionária Judicial FF, que auxiliava o Dr. AA nas diligências e que basicamente confirmou a matéria que deu por assente quanto ao seu comportamento enquanto Magistrado (itens 35 a 38);
» - Depoimento de BB, Escrivão de Direito, que foi relevante designadamente para determinar a hora de chegada ao Tribunal por parte do Dr. AA no dia 10/02/2020, da informação por si prestada no dia seguinte ao Dr. AA, bem como para esclarecer que o mesmo ligou nesse segundo dia da parte da tarde à hora da diligência ou depois dessa mesma hora para saber se havia acordo ao invés de estar a essa hora em Tribunal, como era a sua obrigação. Foi ainda relevante para a matéria dada por adquirida constante dos itens 35 e seguintes;
» - Depoimento da Sra. Funcionária Judicial CC, que confirmou o teor da cota de fls. 112 na sequência do que lhe foi transmitido pelo escrivão, daí que se mantenha a matéria em causa nos factos assentes (item 17), embora pouca relevância assuma quem transmitiu tal informação (A Sra. Procuradora ou o Sr. Escrivão);
» - Depoimento da Sra. Procuradora da República, Dra. DD, que confirmou que no dia 10/2 recebeu uma mensagem do Dr. AA informando que só iria para o Tribunal pelas 11.30 horas por motivo de falecimento de um familiar. Tal depoimento foi ainda relevante para o apuramento da matéria constante dos itens 35 e seguintes;
» - Registo de faltas, licenças e férias do Sr. Juiz de Direito arguido;
» - Elementos documentais extraídos do sistema informático “citius” relativos aos processos com diligências agendadas para os dias das ausências ao serviço;
» - Informações juntas aos autos, designadamente as prestadas pelo Sr. Juiz Presidente da Comarca .......;
» - Expediente remetido pelo Conselho Superior da Magistratura, nomeadamente relativo aos despachos proferidos pelo Sr. Juiz Presidente da Comarca ....... e requerimentos apresentados pelo Sr. Juiz de Direito arguido, a que se reporta a acusação;
» - Documentos juntos com docs. n.ºs 3 a 7 com a defesa para a prova da atinente matéria, que aliás já resultava inclusivamente de outros documentos. Não se considerou naturalmente a parte conclusiva desses documentos, designadamente a não realização de diligências por baixa médica nos dias 4 e 5/3.
» Quanto à factualidade que quedou não assente, tal resultou da total ausência de prova necessária para o efeito. Especificamente, em relação ao dia 10/2, não ficou provada a versão de que o arguido faltou por causa do falecimento de uma pessoa próxima (nenhuma prova foi oferecida, nem identificada essa pessoa próxima ou familiar como referiu em mensagem enviada para a Sra. Procuradora da República, que aliás nunca se dignou identificar). Acresce que tal está inclusivamente em contradição com o que consta dos despachos proferidos, assumindo o Sr. Juiz de direito tacitamente a sua falsidade.»
O relatório do Sr. Inspetor termina concluindo que Sr. Juiz de Direito arguido violou «…os deveres de assiduidade, lealdade e de zelo (cfr. arts. 7.°-A, n.° 1, 7.°-C 10.°, n.ºs 1, 2 e 7) ao faltar injustificadamente ao serviço cinco dias úteis, não tendo em dois desse dias sequer comunicado de todo a sua ausência (10/02 e 11/02) e com adiamento em todos os casos de diligências, gerador de responsabilidade disciplinar nos termos do proémio do art. 83°-H e especificamente nos termos da al. e) (o incumprimento injustificado, reiterado e revelador da falta de zelo profissional dos horários estabelecidos para a realização das diligências, na sua forma exponencial e total, pois que nem compareceu às mesmas), sendo certo que as faltas injustificadas por si, se mais não houvesse, sempre seriam punidas nos termos do art. 83°-I, al. a) do Estatuto do Magistrados Judiciais», propondo-se que seja aplicada ao Sr. Juiz de Direito Dr. AA, como reincidente, a pena de 90 (noventa) dias de suspensão de exercício, para além da perda de vencimento e não contabilização de tempo de serviço (cinco dias), nos termos dos arts. 10.°, n° 6 e 74. °, al. c), do referido diploma legal.
No relatório, para a escolha da medida da pena, foram ainda ponderados os seguintes antecedentes disciplinares:
- Por deliberação de 03/12/2013 do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura, proferida no processo disciplinar n° ….-124/PD, o Sr. Juiz arguido foi condenado por factos ocorridos entre 09/11/2011 e 16/07/2012 (período em que desempenhou funções no Tribunal de Família e Menores ........ e na Vara Mista ........) na pena única de 20 dias de multa suspensa na sua execução pelo período de um ano pela prática de uma infração disciplinar por violação dos deveres de assiduidade, de pontualidade e de prossecução do interesse público (faltas injustificadas, incluindo em dias de serviço de turno, e atrasos injustificados - factos ocorridos entre 28/11/2011 e 29/06/2012), a que correspondeu a pena parcelar de 10 dias de multa, de uma infração disciplinar por violação do dever de domicílio necessário, a que correspondeu a pena parcelar de 15 dias de multa, e de uma infração disciplinar por violação do dever de zelo, a que correspondeu a pena parcelar de advertência.
- Por deliberação de 04/06/2019 do Conselho Plenário do Conselho Superior da Magistratura, proferida no processo disciplinar n° ….-40/PD, o Exmo. Sr. Juiz visado foi condenado por factos ocorridos entre 17/09/2013 e 06/09/2017 na pena única de 180 dias de suspensão de exercício e transferência para tribunal diferente daquele em que exercia funções pela prática de uma infração disciplinar por violação grave dos deveres funcionais de prossecução do interesse público, de zelo e de assiduidade (por atrasos na prolação de decisões, atrasos em depósitos de sentenças, adiamentos injustificados e faltas injustificadas com inerente adiamento de diligências), tendo cumprido essa suspensão entre 19/06/2019 e 15/12/2019.
No dia 17/12/2020, foi proferida deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM, com o seguinte teor: «Tudo ponderado, pela prática de uma infração disciplinar consubstanciada em cinco dias de faltas injustificadas e duas delas não comunicadas, com não realização de diligências, prevista no art. 82.°, no proémio do art. 83.°-H e também especificamente na sua al. e) do Estatuto dos Magistrados Judiciais, por violação dos deveres de assiduidade, lealdade e de zelo, previstos nos arts. 7.°-A, n.º 1, 7 °-C, 10. °, n.ºs 1, 2 e 7 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura delibera aplicar ao Senhor Juiz de Direito Dr. AA, como reincidente, a sanção de 90 (noventa) dias de suspensão de exercício, para além da perda de vencimento e não contabilização de tempo de serviço (quatro dias), nos termos dos arts. 10.°, n° 6 e 74. °, al. c), do referido diploma legal.».
O Sr. Juiz de Direito arguido, Dr. AA, foi pessoalmente notificado, pelo Secretário de Inspeção, GG, no dia 23/12/2020, como consta da certidão do mesmo dia, assinada pelo arguido. No dia 24/12/2020, nos termos do disposto no art. 122.º do EMJ, iniciou-se o cumprimento da sanção disciplinar de suspensão do exercício de funções.
No dia 10/03/2021, ainda em tempo por força da suspensão de prazos ditada pela Lei n.º 4-B/2021, deu entrada o Recurso Hierárquico (designação do arguido) da deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM, o qual foi autuado com data de 11/02/2021, no qual o arguido vem:
- Apresentar Impugnação Administrativa [Recurso Hierárquico] para o Plenário do Conselho Superior de Magistratura [artigos 167°/2/a (a contrario) e 168° EMJ1], juntando de imediato e em anexo as suas alegações.
- Requerer, considerando que o arguido iniciou de imediato o cumprimento da sanção de suspensão de exercício e que as impugnações administrativas suspendem os efeitos dos atos impugnados (167°-A do EMJ), para evitar dúvidas interpretativas, se digne informar em que data deve o arguido retomar o serviço no Juízo Local de Competência Genérica ......
Atento o disposto no art. 167.º-A do EMJ, o qual refere que as impugnações administrativas suspendem os efeitos dos atos impugnados, por despacho do Sr. Vice-Presidente do CSM de dia 10/03/2021, foi suspensa a execução da sanção disciplinar de suspensão aplicada ao arguido, que regressou ao serviço no dia 11/03/2021. O mandatário do arguido foi notificado logo no dia 10/03/2021.
No que respeita à impugnação administrativa, da mesma constam os seguintes pedidos, com os seguintes fundamentos:
1.Inconstitucionalidade do art. 122.º do EMJ, de acordo com a dimensão normativa que permite a aplicação imediata da sanção disciplinar de suspensão do exercício de funções, apesar de estar ainda a decorrer prazo para impugnação administrativa, requerendo-se que seja a referida norma declarada inconstitucionalidade, com as legais consequências;
2.Nulidade/Irregularidade da notificação, por não constar da mesma qualquer informação e/ou advertência quanto à produção de efeitos da sanção disciplinar;
3.Impugnação da matéria de facto, nos termos que já haviam sido aduzidos em sede de defesa escrita, concluindo-se pela eliminação da matéria de facto constante dos pontos 15 e 17 da matéria de factos dada como provada;
4.Impugnação da matéria de facto, nos termos que já haviam sido aduzidos em sede de defesa escrita, concluindo-se pela violação dos artigos 83°-H, 84°, 86°, 99°, 101° do EMJ.
II – Questão Prévia: inconstitucionalidade da aplicação imediata da pena de suspensão.
O arguido pede que seja declarada a inconstitucionalidade do art. 122.º do EMJ, de acordo com a dimensão normativa que permite a aplicação imediata da sanção disciplinar de suspensão do exercício de funções, apesar de estar ainda a decorrer prazo para impugnação administrativa, com as devidas consequências legais. Porém, tratando-se do CSM um órgão da administração pública, nos termos do disposto no art. 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP), o CSM encontra-se vinculado à CRP e à lei, estando obrigado a aplicar as leis que se encontram em vigor, não podendo afastar a aplicação de uma lei em vigor com fundamento na sua inconstitucionalidade. Atendendo ao teor do art. 280.º da CRP, apenas os tribunais podem afastar a aplicação de leis com fundamento na sua inconstitucionalidade. Assim, e independentemente do juízo que poderá ser feito, em sede própria, sobre a conformidade constitucional do art. 122.º do EMJ, o CSM estava obrigado a aplicá-lo, o que fez, não merecendo qualquer censura a decisão da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM.
Por outro lado, estando já suspensa a sanção disciplinar aplicada ao arguido, aguardando tal suspensão pela deliberação final do Plenário do CSM, não se vislumbra quais as consequências legais que se retirariam da peticionada declaração de inconstitucionalidade.
Pelo que deve ser indeferido o peticionado no que respeita à declaração de inconstitucionalidade do art. 122.º do EMJ.
III – Fundamentação (quanto à impugnação administrativa)
Requer ainda o arguido que seja declarada a nulidade/Irregularidade da notificação, por não constar da mesma qualquer informação e/ou advertência quanto à produção de efeitos da sanção disciplinar. Consultados os autos, verifica-se que o Sr. Juiz de Direito arguido, Dr. AA, foi pessoalmente notificado, pelo Secretário de Inspeção, GG, no dia 23/12/2020, como consta da certidão do mesmo dia, assinada pelo próprio. Foi o seguinte, o teor da notificação:
«Pelo presente ofício fica V. Exa. notificado, de todo o conteúdo da decisão proferida em 17-12-2020, pelo Conselho Permanente – Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares deste Órgão no processo supra referenciado em que V. Exa. é arguida, registado na Secretaria deste Conselho sob o nº ...../PD/...10, decisão da qual se remete fotocópia. Igualmente se remete fotocópia do relatório final elaborado pelo Exmo. Senhor Inspetor Judicial, Juiz Desembargador, Dr. BB. Da referida deliberação poderá reclamar para o Plenário no prazo de 30 dias – Artº 167º, nº 2, al. a) do EMJ.»
Ora, nos termos do disposto nos arts. 118.º e 121.º do EMJ, da notificação deve apenas constar a decisão final, acompanhada do relatório do Inspetor Judicial, bem como, por via do art. 118.º do EMJ, com as devidas adaptações, uma referência aos meios e prazos de impugnação, o que sucedeu. Não decorre da lei qualquer obrigação de que conste da notificação a forma de execução, ou o início da produção de efeitos, da sanção disciplinar aplicada. Tais efeitos resultam, diretamente e sem necessidade de qualquer mediação ou espaço de discricionariedade decisória, do art. 122.º do EMJ. Tratando-se o arguido de um Juiz de Direito, com extensa formação jurídica e obrigação de conhecer a fundo o disposto no EMJ – tal obrigação decorre do disposto na alínea e) do n.º 1, e n.º 7, do art. 73.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, que estabelece o dever de zelo como dever de “conhecer e aplicar as normas legais e regulamentares e as ordens e instruções dos superiores hierárquicos, bem como exercer as funções de acordo com os objetivos que tenham sido fixados e utilizando as competências que tenham sido consideradas adequadas”, aplicável por via do art. 188.º do EMJ – o legislador presume tal conhecimento, não exigindo que esta informação conste da notificação.
Ora, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 123.º do EMJ, «constitui nulidade insuprível a falta de audiência do arguido com possibilidade de defesa e a omissão de diligências essenciais para a descoberta da verdade que ainda possam utilmente realizar-se ou cuja realização fosse obrigatória». Não é legalmente obrigatória a menção do início de produção de efeitos da sanção disciplinar na notificação da decisão final ao arguido. Tal especificidade também não se afigura essencial para a descoberta da verdade, pois que não se relaciona diretamente com os factos que sustentam a prática da infração disciplinar. Pelo que não existe qualquer nulidade ou irregularidade.
Por fim, vem o arguido impugnar a matéria de facto e de Direito, defendendo a eliminação dos factos provados n.ºs 15 e 17, e invocando a ausência de faltas injustificadas, com os seguintes argumentos:
No que respeita aos dias 10 e 11/02/2020:
«31. Na tarde do dia 10.02.2020, o arguido esteve presente no tribunal e realizou diligências, pelo que só esteve ausente durante a manhã, e não todo o dia;
» 32. As diligências do dia 11.02.2020 não se realizaram por factos alheios à vontade do arguido (transação num processo e acordo entre as partes para juntarem documentos, e solicitarem a dispensa da audiência prévia).
» 33. Aliás, a decisão impugnada confunde, na fundamentação, a tarde de 11/02/2020, com a tarde de 10/02 (na tarde de 11/02, o arguido não faltou a qualquer julgamento/diligência (ver penúltimo parágrafo da pág.. 22/44)»
No que respeita aos dias 04 e 05/03/2020:
«34. Se é verdade que o arguido esteve, de facto, ausente do serviço nos dias 04 e 05 de Março de 2020, também é verdade não esteve ausente porque quis, antes porque esteve doente;
» 35. Tendo junto, embora tardiamente, o certificado de incapacidade temporária para o trabalho por doença;
» 36. Tendo estado doente nesses dias (4 e 5 de março), faz sentido valorar negativamente essas ausências como se tivesse faltado por vontade própria?
» 37. Não está em causa o motivo da ausência - que é válido (doença) - mas apenas a comunicação tardia dessa ausência ...;
» 38. Apesar do arguido ter informado a secretaria judicial em tempo útil, é verdade que não comunicou de imediato ao pelo Senhor Juiz Presidente da Comarca;
» 39. Contudo, a eventual irregularidade formal (não ter comunicado de imediato ao Senhor Juiz Presidente da Comarca) em nada belisca ou põe em causa o motivo da ausência;
» 40. O único comportamento censurável, no limite, é a comunicação tardia e não a ausência ao serviço, em si mesma;
» 41. A comunicação tardia não tem dignidade disciplinar, razão pela qual as ausências ao serviço dos dias 04 e 05 de Março não podem ser valoradas como tal.
» 42. Ou, quando muito, têm de ser muito pouco valoradas, face ao diminuto grau de ilicitude.»
No que respeita ao dia 19/05/2020:
«44. O arguido esteve ausente do serviço no dia 19 de Maio para prestar assistência inadiável ao seu filho (menor de 10 anos), que tinha sintomas compatíveis com "SARS-CoV-2", nomeadamente tosse e febre;
» 45. Fez questão de informar a secretaria judicial ao início da manhã e deu instruções para informarem os intervenientes processuais e o Senhor Presidente da Comarca ......., quer telefonicamente, quer por escrito;
» 46. É certo que só no final do dia 19/05, início do dia 20/05, é que o arguido endereçou diretamente ao Senhor Presidente da Comarca ....... uma exposição escrita, dando conta do sucedido e requerendo que a sua ausência fosse considerada justificada;
» 47. Salvo melhor opinião, essa falta deve ser considerada justificada, à luz do art. 10. °/1 do EMJ que prevê: “Quando ocorra motivo ponderoso, os magistrados judiciais podem ausentar-se da circunscrição respetiva por número de dias que não exceda três em cada mês e 10 em cada ano, comunicando previamente o facto ao presidente do tribunal, ou. não sendo possível, imediatamente após o seu regresso.”
» 48. O motivo indicado pelo arguido é claramente ponderoso, ou seja, suspeita de contágio por “SARS-CoV-2” do seu filho, pelo que era de todo imperioso que o arguido lhe prestasse assistência inadiável;
» 49. Quanto ao momento da comunicação, o arguido comunicou à secretaria judicial a impossibilidade comparecer durante a manhã do dia 19/05 e ordenou que fosse comunicado ao Senhor Juiz Presidente da Comarca ....... no início da tarde porque só aí teve conhecimento que estaria ausente do serviço e não realizaria as diligências agendadas (quer as anteriormente agendadas, quer a transferida nessa manhã).
» 50. Não o podia ter feito antes, porquanto não tinha a certeza do impedimento;
» 51. Assim, o arguido comunicou previamente ao Senhor Juiz Presidente da Comarca ......., ou seja, mal teve a certeza que estaria ausente do serviço (de tarde)»
Mais argumenta o arguido, no que respeita à matéria de Direito, o seguinte:
«53. Os factos imputados ao arguido não revelam falta de zelo e grave desinteresse pelo cumprimento dos seus deveres funcionais e manifesto desprestigio para a função jurisdicional;
» 54. Muito menos pode ser punido como reincidente, uma vez que as circunstâncias do caso não revelam a ausência de eficácia preventiva da condenação anterior;
» 55. Os factos dados como provados nos pontos 35 a 38 revelam zelo e interesse no cumprimento dos seus deveres funcionais e de prestígio da função jurisdicional, o que não foi devidamente valorado na decisão aprovada.
» 56. É injusta a aplicação ao arguido de uma pena disciplinar mais grave que a pena de multa.»
No que respeita aos dias 10 e 11/02/2020, não tem razão o recorrente, na medida em que, efetivamente, quanto ao dia 10/02, esteve ausente na parte da manhã e ficou por realizar a diligência agendada para as 14h (tendo os intervenientes deslocando-se ao tribunal, para se ausentarem por volta das 15h, sem que a diligência fosse efetuada), tendo apenas sido realizado um julgamento sumário às 15h30. Mais, não foi junto qualquer comprovativo (através de prova testemunhal ou documental) do falecimento de um familiar, o que podia e devia ter sido feito, nem foi o alegado motivo ponderoso previamente (ou sucedaneamente) comunicado ao Presidente do Tribunal. No que concerne ao dia 11/02/2020, não foram realizadas as duas diligências que estavam agendadas para esse dia (audiência de julgamento no processo comum n.º 212/18......, às 9h30, e audiência prévia no processo comum n.º 55/19....., às 14h15), tendo o arguido ficado a trabalhar em casa. Embora tenha sido junta uma transação pelas partes (no processo comum n.º 212/18......) e cerca de 40 documentos por uma das partes (no processo comum n.º 55/19.....), tal como se explica na Deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM «como não houve despacho prévio ao julgamento, devia ter sido em ata de audiência de julgamento que deveria ter sido proferida a sentença homologatória, dando assim sem efeito o julgamento a realizar e já não proferir despacho no dia seguinte.» Também no que toca à diligência da tarde de dia 11/02, não se afigura suficiente para expurgar a existência de uma falta disciplinar o facto de terem sido juntos, por uma das partes, já durante a tarde, cerca de 40 documentos. Tal facto, por si só, não impediria que fosse realizada a diligência, ainda que a contraparte não prescindisse de prazo de vista, na medida em que se tratava de mera audiência prévia, podendo desde logo ser ouvidas as partes quanto à prova já junta. Por outro lado, no momento em que o arguido decide não se deslocar ao Tribunal, não era ainda certo qual a tomada de posição da contraparte no que respeita ao prazo de vista. Em qualquer caso, releva ainda, de modo central, a falta de comunicação da ausência ao Presidente do Tribunal.
Dispõe o art. 10.º, n.º 1, do EMJ, que a falta será justificada quando ocorra motivo ponderoso e haja comunicação prévia, ou, não sendo possível, assim que o Juiz retornar ao serviço, ao Presidente do Tribunal. No caso, face ao dia 10/02, não só não foi demonstrada a existência de motivo ponderoso, como não foi feita – como poderia e deveria ter sido – a comunicação prévia ao Presidente do Tribunal. Por estas razões, foi corretamente considerada injustificada a referida falta. Irreleva o facto de o arguido ter realizado uma outra diligência na tarde do dia 10/02, pois ficou demonstrado que as partes se deslocaram ao tribunal por volta das 14h, tendo aí permanecido cerca de 1 hora, sem que a diligência para a qual haviam sido convocadas fosse realizada, tendo havido, manifesta perturbação do serviço e inconveniente para as partes. No que respeita ao dia 11/02, dispõe o n.º 2 do art. 10.º do EMJ que «o exercício de funções que pela sua natureza não careça de ser realizado no tribunal pode excecionalmente ser assegurado pelo juiz fora das respetivas instalações, não sendo considerado ausência de serviço quando não implique falta ou perturbação dos atos judiciais». Ora, no caso, existiam diligências agendadas, pelo que não poderia o arguido ter optado por ficar a trabalhar em casa, sem antes se assegurar que as diligências não tinham condições para serem realizadas, ou que deveriam ser adiadas, o que não sucedeu. O que parece ter sucedido, é que o arguido aproveitou algumas vicissitudes processuais (possibilidade de transação e junção de documentos) para proceder ao adiamento ou não realização das diligências.
Não tem também razão o arguido quando alega que a falta de comunicação da ausência ao Presidente do Tribunal não tem qualquer relevância disciplinar. O n.º 1 do art. 10.º do EMJ exige, para que a ausência seja legítima, dois requisitos cumulativos:
a) Motivo ponderoso;
b) Comunicação prévia (ou, excecionalmente, posterior) ao Presidente do Tribunal.
E o n.º 6 do art. 10.º do EMJ estabelece que: «a ausência ilegítima implica, além de responsabilidade disciplinar, a perda de vencimento durante o período em que se tenha verificado». A norma não se refere às faltas injustificadas (conceito autónomo), mas antes à «ausência ilegítima», numa clara referência ao disposto no n.º 1 do art. 10.º do EMJ. Assim, a infração disciplinar, no que respeita aos magistrados judiciais, pode decorrer da ausência de motivo ponderoso (falta injustificada) ou da ausência de comunicação ao Presidente do Tribunal (ausência que poderia ser justificada, mas é ilegítima). Entende-se que assim seja, pois, a comunicação ao Presidente do Tribunal não corresponde a uma mera formalidade, sendo antes essencial para garantir a boa prossecução do interesse público na administração da justiça (dever de todos os magistrados judicias, consagrado nos arts. 3.º e 7.º-C do EMJ), já que permite que seja acionada a substituição do magistrado, quando seja possível, a tempo útil, bem como, não sendo possível a substituição, que sejam avisados os intervenientes, evitando-se deslocações inúteis ao tribunal.
No que respeita aos dias 04 e 05/03/2020, embora haja uma justificação (entrega de baixa médica que atesta situação de incapacidade para o trabalho), falhou o arguido o dever de comunicação prévia ao Presidente do Tribunal, o que podia e deveria ter feito (não tendo sido alegados quaisquer factos que demonstrassem a incapacidade de realizar esta comunicação, tanto mais que o arguido comunicou com a seção). Trata-se, portanto, de mera ausência ilegítima por falta de comunicação prévia.
No que respeita ao dia 19/05/2020, não existe justificação comprovada para a falta, concordando-se com o relatório do Sr. Inspetor e com a deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM quando concluem não ser credível a explicação avançada pelo arguido. Efetivamente, caso o filho do Sr. Juiz de Direito arguido estivesse, efetivamente, com sintomas compatíveis com a «SARSCoV-2», afiguram-se três hipóteses: a) deveria a criança ter sido testada, esclarecendo-se na dúvida (caso em que o arguido teria comprovativo da realização do teste); b) deveria a criança ter-se deslocado ao Centro de Saúde/Hospital ou médico para fazer a despistagem (caso em que haveria comprovativo da deslocação e/ou consulta); c) ou, em caso de dúvida e não havendo indicação do SNS para testagem nem possibilidade de recurso a um médico, deveria ter sido cumprido um período de 14 dias de isolamento profilático, isolamento este que se estenderia a todo o agregado familiar. O que não é credível, à luz da experiência comum que temos tido, ao longo de mais de 1 ano, da sinalização de pessoas com sintomas compatíveis com a «SARSCoV-2», é que houvesse suspeitas de manhã, de tal modo que constituíssem motivo ponderoso de ausência, e que, sem qualquer uma das diligências referidas em a) e b), o arguido pudesse comparecer a uma diligência, no mesmo dia, no período da tarde. Assim, no que toca ao dia 19/05/2020, é forçoso concluir-se que ocorreu uma verdadeira falta justificada, por ausência de motivo ponderoso comprovado.
Face aos factos dados como provados, não está em causa a aplicação da alínea a) do art. 83.º-I do EMJ, uma vez que não ocorreu uma ausência ilegítima e continuada a circunscrição judicial por mais de 3 dias. Também não se preenchem, por não se tratar de ausências continuadas, a alínea d) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ, nem a alínea f) do art. 83.º-G do EMJ. Resta saber se, como se concluiu no relatório do Sr. Inspetor e na deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM, o comportamento global do arguido permite ainda que esteja preenchida a alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ. E, de facto, o que está em causa neste procedimento é um conjunto de comportamentos de violação grave e grosseira do dever de zelo, na medida em que, ainda que se pudessem aceitar, em tese, as justificações dadas pelo arguido para estar ausente do tribunal, de modo algum se consegue justificar a reiterada e renitente ausência de comunicação prévia das referidas ausências ao Presidente do Tribunal. Tal recusa reiterada em cumprir uma regra de fácil execução, para além de inexplicável, trouxe inegáveis prejuízos para o serviço, como foi expressamente declarado pela testemunha DD (Procuradora da República) e pela testemunha BB (Escrivão de Direito); bem como para terceiros (intervenientes que se deslocaram inutilmente ao tribunal na tarde do dia 10/02).
Foi assim, nos termos do disposto nos arts. 82.º, 10.º, n.ºs 1 e 2, e n.º 6, e alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H, todos do EMJ, por violação dos deveres de zelo e de assiduidade, praticada uma única infração grave, de execução reiterada sucessiva. Concorda-se, também, com o relatório do Sr. Inspetor e com a deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM na parte em que concluem no sentido de ser adequada ao caso a pena de suspensão, atendendo aos antecedentes disciplinares do arguido. De facto, tendo já sido aplicada uma pena de suspensão por violação do dever de zelo e de assiduidade (180 dias de suspensão), exigia-se, no mínimo, que o arguido se tivesse sensibilizado para a necessidade de cumprir escrupulosamente com os seus deveres no que respeita à presença no tribunal e comunicação atempada de eventuais ausências inevitáveis.
Resta, por fim, verificar se se deve manter o juízo concreto de gravidade do ilícito e da culpa do arguido e a medida concreta da sanção disciplinar de suspensão. O arguido expressamente invoca a violação do disposto no art. 84.º do EMJ, estando aqui em causa, especialmente o seguinte segmento desta norma: «na escolha e medida da sanção disciplinar a aplicar, o órgão decisor tem em conta todas as circunstâncias que, não estando contempladas no tipo de infração cometida, deponham a favor ou contra o arguido, nomeadamente».
E, aqui, discorda-se do juízo feito pelo relatório do Sr. Inspetor (secundado na deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM), que concluiu pela existência de uma ilicitude muito grave, com o seguinte fundamento: «O grau da ilicitude dos factos é algo elevado, uma vez que não se tratou de um episódio isolado, antes tendo ocorrido cinco situações de faltas, que geraram múltiplos adiamentos de diligências, com os inerentes transtornos para os intervenientes processuais que se deslocaram a Tribunal, sendo que se trataram de atrasos na sua extensão máxima, isto é atrasos que levaram à não realização das diligências.». Porém, na graduação da ilicitude de uma dada infração, ao abrigo do princípio da proibição de dupla valoração, não podem ser tomadas em consideração as circunstâncias concretas, na sua dimensão exata, que foram essenciais para o preenchimento do ilícito típico, como decorre do já citado art. 84.º do EMJ. Ora, o arguido não praticou uma infração disciplinar por se ter ausentado, sem justificação ou ilegitimamente, em cinco dias intercalados, do tribunal. Já se verificou que este comportamento, isoladamente ou globalmente considerado, não se integra nas alíneas dos arts. 83.º-G a 83.º-I do EMJ. Está aqui em causa a construção de uma infração disciplinar reiterada de execução sucessiva (interpolada) em que é a valoração global do comportamento do arguido, o qual, por força das suas características e circunstâncias concretas – combinação de faltas injustificadas e faltas justificadas com ausências ilegítimas por falta de comunicação prévia, com o recurso a pretextos e expedientes processuais para não se deslocar ao tribunal, com confusão de avisos e ordens a diferentes agentes do tribunal, gerando confusão, com falta a diligências marcadas e prejuízo para intervenientes processuais e adiamento de várias diligências – permite sustentar uma violação grave do dever de zelo e, consequentemente, o preenchimento da alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ. De outro modo, estaria em causa a mera ocorrência de duas faltas injustificadas e 3 dias de ausência ilegítima do tribunal, o que apenas permitiria concluir pela prática de cinco infrações disciplinares leves.
Por conseguinte, não poderão estas mesmas circunstâncias, que foram, como resulta do próprio relatório do Sr. Inspetor (aqui confirmado pela deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM), essenciais para o preenchimento do tipo de ilícito disciplinar constante da alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ, ser duplamente valoradas, agora para se concluir por uma ilicitude muito elevada no âmbito das graduações possíveis do leque de potenciais violações da alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ. Deverá, assim, conclui-se apenas por uma ilicitude mediana (bem como intensidade mediana na violação dos deveres de zelo e de assiduidade), mantendo-se, no restante, intactos os juízos relativos ao modo de execução e grau de culpa do agente.
Mantém-se também alterado o juízo agravado de censura, no que respeita à valoração da prevenção especial, pois o Sr. Juiz arguido foi condenado por factos ocorridos entre 17/09/2013 e 06/09/2017 na pena única de 180 dias de suspensão de exercício e transferência para tribunal diferente daquele em que exercia funções pela prática de uma infracção disciplinar por violação grave dos deveres funcionais de prossecução do interesse público, de zelo e de assiduidade (por atrasos na prolação de decisões, atrasos em depósitos de sentenças, adiamentos injustificados e faltas injustificadas com inerente adiamento de diligências). De acordo com o constante no relatório do Sr. Inspetor, «passados cerca de três meses do regresso ao exercício de funções e depois de cerca de nove meses de ser punido voltou a incorrer em infrações disciplinares de idêntica e de similar natureza e revelando com a sua postura que a sanção anteriormente aplicada não alcançou suficiente advertência em termos do cometimento de novas infrações disciplinares, pelo que deve ser punido agravadamente nos termos do art. 86.° do Estatuto dos Magistrados Judiciais».
Deverá, portanto, manter-se a sanção disciplinar nos 90 dias de suspensão, uma vez que estamos perante uma moldura que vai dos 60 dias de suspensão aos 240 dias de suspensão, tendo esta assim já sido fixada muito perto do limite mínimo.
IV – Deliberação
Em face do exposto, delibera o Plenário do Conselho Superior da Magistratura, indeferir a impugnação administrativa, aplicando ao Senhor Juiz de Direito Dr. AA, por violação dos deveres de zelo e de assiduidade e pela prática da infração disciplinar prevista na alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a sanção disciplinar de 90 dias de suspensão.
(…).
        (cf. doc. 3 junto à PI e fls. 390-402 do PA).
18)  Esta deliberação (17) foi notificada pessoalmente ao autor a 23.12.2020, através de ofício confidencial com o seguinte teor que se transcreve:
(…)
Pelo presente ofício fica V. Exa notificado de todo o conteúdo da decisão que se anexa, proferida em 20-04-2021, pelo Conselho Plenário deste Órgão no processo supra referenciado em que V. Exa. é arguido, registado na Secretaria deste Conselho sob o nº ...../PD/...10.
Igualmente se remete cópia do relatório final elaborado pelo Exmo. Senhor Inspetor Judicial, Juiz Desembargador Dr. BB.
Mais se informa V. Exa. que, nos termos do art. 71.º al. b) do E.M.J. deverá suspender as suas funções a partir da presente notificação.
(…)
     (cf. doc. 4 junto à PI e fls. 405-407 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).

B. Do Direito

1. Da inconstitucionalidade do artigo 122.º do EMJ
Alega o autor que o artigo 122.º do EMJ, quando interpretado no sentido de permitir que o arguido comece a cumprir a sanção antes de transitar em julgado, padece de inconstitucionalidade, por violação do princípio da presunção de inocência e por negar ao arguido do processo disciplinar, o direito à defesa, ao contraditório e a um processo equitativo.
Diga-se, desde já, que não lhe assiste razão. Vejamos porquê.
Estipula o artigo 122.º, do EMJ o seguinte: “A decisão que aplicar a sanção disciplinar não carece de publicação, começando a sanção a produzir os seus efeitos no dia seguinte ao da notificação do arguido nos termos do artigo 121.º, ou 15 dias após a afixação do edital, no caso de desconhecimento do paradeiro daquele.”.
Por um lado, a asserção inspiradora e apriorística de que parte o autor - a de que os princípios decorrentes do artigo 32.º da CRP, aplicáveis ao processo criminal, estendem o seu âmbito de aplicação, na íntegra, a qualquer processo sancionatório, designadamente o disciplinar - não se verifica.
Apesar de não o negarmos, registemos que não são desconhecidas as especiais exigências constitucionais que se fazem sentir ao nível do direito disciplinar público. Com efeito, sendo imposta pelo artigo 271.º da CRP, uma responsabilidade do tipo disciplinar, somos, desde logo, confrontados com a perspectiva de um cidadão poder ficar sujeito a sanções decorrentes do exercício indevido de tarefas especificamente confiadas ao abrigo de funções públicas, que se distinguem em face das missões que lhe são atribuídas e do interesse por si prosseguido[1].
Razão pela qual, a CRP não permita que esse regime disciplinar não seja acompanhado de garantias substantivas e processuais suficientes. Isso mesmo é estipulado no artigo 269.º, n.º 3, da CRP que assegura ao arguido de procedimento disciplinar integrado no regime da função pública, os direitos procedimentais de audiência e defesa, precisamente aqueles que, sendo próprios do estatuto de arguido em sede criminal, o n.º 10, do artigo 32.º, da CRP, reconhece como devendo ser estendidos e aplicáveis a qualquer procedimento sancionatório.
Todavia, e sem que se possa negar pertinência a esta constatação, também teremos de asseverar, em contrapartida, que as demais garantias constitucionais previstas para o processo criminal (nomeadamente as previstas nos restantes números do citado artigo 32.º) não deverão ser aplicadas tout court e qua tale a qualquer processo sancionatório. Além de que, o diferente impacto produzido por uma sanção penal não justificaria essa equiparação legal absoluta. Isso mesmo foi decidido no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 659/2006, de 28.11.2006, proferido no processo n.º 637/06.
Por isso, a propósito dos procedimentos disciplinares, a jurisprudência constitucional tem unanimemente defendido que os direitos de audiência e defesa previstos naquela norma constitucional, apesar de terem de ser reconhecidos na generalidade de procedimentos ou processos sancionatórios, não originam o remanescente do regime garantístico do processo criminal para todos os demais ramos do direito sancionatório e, em particular, para o processo disciplinar. Essa exigência constitucional não tem aplicação ao processo disciplinar e, nem sequer, ao processo contraordenacional. A CRP, nesse tipo de processos, tem somente em vista assegurar os direitos de audiência e de defesa do arguido; e, só poderá haver um juízo negativo de constitucionalidade quando qualquer tipo de sanção (contraordenacional, administrativa, fiscal, laboral, disciplinar ou qualquer outra) é aplicada sem prévia audição do arguido (direito de audição) e sem lhe conferir condições para se defender das imputações que lhe são feitas (direito de defesa), apresentando meios de prova e requerendo a realização de diligências tendentes a apurar a verdade.
Aliás, este tem sido o entendimento veiculado, quer pelo Tribunal Constitucional [2], quer por este Supremo Tribunal de Justiça [3].
Por outro lado, a tese do autor confunde os conceitos de trânsito em julgado da sentença condenatória penal com caso decidido administrativo-disciplinar. Na certeza, porém, de que só uma decisão jurisdicional (e nunca a decisão punitiva aplicada pelo CSM, órgão de natureza administrativa) é que pode transitar em julgado, isto é, consolidar-se definitivamente no ordenamento jurídico, logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação [4].
Na verdade, o preceito aqui em análise insere-se no âmbito de um procedimento administrativo de índole disciplinar e não difere sequer de preceitos afins no âmbito disciplinar das relações jurídicas de emprego público. Nomeadamente, tem uma redação muito similar à do artigo 223.º da Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas (LGTFP), ou à do artigo 262.º do Estatuto do Ministério Público (EMP). A razão de ser desses preceitos tem respaldo precisamente na dimensão estritamente administrativa do procedimento disciplinar, por ausência de uma visão integrada do fenómeno sancionador no âmbito do Estado.
É precisamente por estarmos perante uma decisão administrativa e não jurisdicional que podemos recuperar noções próprias e tradicionais do direito administrativo, como o sejam o do privilégio de execução prévia e de autotutela declarativa e executiva, que permitem à Administração executar as suas decisões sem necessidade de para tal obter, previamente, do tribunal um título executivo.
A ratio genérica e inspiradora destas soluções normativas poderá ser encontrada em razões de interesse público, que se prendem com a necessidade de garantir uma Administração Pública célere e eficaz, permitindo-se às autoridades administrativas, como a aqui entidade demandada, que possam, por si próprias, auto-executar os seus actos, se necessário com o auxílio dos meios de coacção previstos na lei (artigos 175.º ss. do CPA).
Mais se pode vislumbrar como escopo específico destas normas o de “proteger e acautelar o interesse do Estado no respeito pelo desempenho regular das funções públicas ou profissionais que exige título bastante para tal ou a conjugação de requisitos ou condições especiais de exercício”[5], motivo pelo qual, inclusive, a lei pune o trabalhador que permaneça no exercício de funções públicas após notificação da decisão de aplicação de pena disciplinar expulsiva ou de suspensão de funções com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias, por crime de usurpação de funções, p. e p. no artigo 358.º do Código Penal (CP).
De todo o modo, por outro lado ainda, e mais decisivamente, não se pode acompanhar o autor no paralelismo com o trânsito em julgado da sentença condenatória porque não corresponde sequer à verdade que a sanção disciplinar se consolide, apesar de começar a produzir efeitos. Aliás, não se divisa que esta solução possa enfermar da inconstitucionalidade alegada pelo autor, nomeadamente por deixar o magistrado objecto de sanção disciplinar em posição de maior vulnerabilidade e com preterição de garantias constitucionais.
Vejamos.
Desde logo, malgrado a regra de início automático de produção de efeitos, não se pode afirmar, summo rigore, que a decisão disciplinar se consolida pela mera prolação do acto punitivo. Tal deve-se pela razão de tal decisão ser susceptível de impugnações, como aliás decorre da presente acção.
Com efeito, o magistrado a quem seja aplicada sanção disciplinar pode lançar mão de impugnação administrativa necessária para o Plenário do CSM dos actos ou omissões do Conselho Permanente em matéria disciplinar, nos termos do disposto no artigo 167.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), do EMJ. Além disso, pode também impugnar contenciosamente a deliberação que lhe aplique tal sanção, através de acção administrativa perante esta Secção de Contencioso do STJ (artigos 169.º e 170.º do EMJ). Em qualquer caso, lançando o magistrado punido disciplinarmente mão de qualquer destes meios impugnatórios, obrigando a um reexame ou revisão da decisão punitiva, é apodítico que a sanção disciplinar não se consolida enquanto tais impugnações não forem objecto de decisão.
A que acresce que, apesar da redação do artigo 122.º, do EMJ, a decisão punitiva pode nem sequer começar a produzir efeitos de imediato, ou até pode ver esses efeitos suspensos: basta que o magistrado punido a impugne administrativamente para beneficiar da suspensão automática que decorre do artigo 167.º-A do EMJ; ou então, já em fase contenciosa, e apesar de a acção administrativa não ter tal efeito (artigo 172.º, n.º 1, do mesmo diploma), pode sempre interpor providência cautelar de suspensão de eficácia até ao trânsito em julgado da decisão naqueloutra acção administrativa (artigo 128.º do CPTA, ex vi artigos 172.º, n.ºs 2 e 3, e 174.º, ambos do EMJ). Em qualquer destes casos, a decisão punitiva vê os seus efeitos suspensos até prolação de decisão por órgão (Plenário, em caso de impugnação administrativa) ou pessoa (este STJ, em caso de impugnação contenciosa) distinta e exógena, supraordenada ao órgão autor do acto punitivo.
Por último, a decisão não se consolida precisamente porque, em caso de procedência da impugnação contenciosa do acto punitivo por decisão jurisdicional, o acto ou é declarado nulo e não produz quaisquer efeitos (artigo 162.º, n.º 1, do CPA), ou é anulado, destruindo-se, assim, retroactivamente todos os seus efeitos (artigo 163.º, n.º 2, do CPA). Além de que sempre operará o efeito de reconstituição da situação actual hipotética que decorreria para o magistrado punido, no caso de não ter sido praticada a sanção entretanto anulada (artigo 173.º, do CPTA).
Face a tudo o exposto, decide-se julgar improcedente, nesta parte, a pretensão do autor com este fundamento.


          2. Da nulidade da notificação da decisão punitiva.
O autor invoca a nulidade/irregularidade da notificação, uma vez que a mesma não se fez acompanhar de qualquer advertência quanto à produção de efeitos, informação sobre os seus direitos de impugnação e respectivo prazo.
Diga-se, desde já, que o autor não identifica qual a notificação a que se refere: se a notificação da deliberação da Secção do Conselho Permanente, reproduzida em 15) dos factos provados; ou, se a notificação da deliberação do Conselho Plenário, parcialmente transcrita em 18) do probatório.
De todo o modo, seja qual for a notificação a que se reporte, não lhe assiste qualquer razão, como veremos de seguida.
Relativamente à notificação da decisão, dispõe o artigo 121.º do EMJ, que: “a decisão final, acompanhada de cópia do relatório a que se refere o art. 120.º, é notificada ao arguido com observância do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 118.º”.
Por sua vez, o artigo 118.º, n.ºs 1 e 2, do EMJ estabelece que: “a decisão de arquivamento ou de acusação é entregue pessoalmente ao arguido ou remetida pelo correio, sob registo, com aviso de receção” e que, “se não for conhecido o paradeiro do arguido, procede-se à sua notificação edital mediante a afixação de um edital na porta do tribunal do exercício de funções e na da sua última residência conhecida”.
Cotejemos estas previsões normativas, específicas do contexto disciplinar regulado no EMJ, com a precisão genérica do artigo 114.º, n.º 2, do CPA, que, sobre a notificação dos atos administrativos. Estabelece este último artigo que: “da notificação do ato administrativo deve constar: a) o texto integral do ato administrativo, incluindo a respetiva fundamentação, quando deva existir; b) a identificação do procedimento administrativo, incluindo a indicação do autor do ato e a data deste; c) a indicação do órgão competente para apreciar a impugnação administrativa do ato e o respetivo prazo, no caso de o ato estar sujeito a impugnação administrativa necessária”.
Da leitura dos citados preceitos, de nenhum deles consta a obrigatoriedade (legal) da advertência sobre a data de produção de efeitos. De resto, e como se disse, nem o próprio autor identifica qualquer base legal que dê respaldo a essa exigência.
Certo é que, cotejando as duas notificações em apreço (a da deliberação da Secção do Conselho Permanente e a do Plenário da entidade demandada), reproduzidas em 15) e 18) do probatório, com as normas que disciplinam o conteúdo e a forma das notificações, temos que de tais notificações constam os elementos obrigatórios do artigo 121.º, do EMJ (decisão final, cópia do relatório a que se refere o artigo 120.º,do EMJ), tendo sido a mesma realizada pelo meio que se prescreve no artigo 118.º, n.º 1, do EMJ, pessoalmente, e com observância, ademais, do disposto no n.º 2, do artigo 114.º, do CPA (ou seja, foi remetido o texto integral do acto administrativo, foi identificado o procedimento administrativo, o autor do acto e a data do mesmo, sendo ainda, no caso da notificação da deliberação da Secção do Permanente, indicado o prazo e o órgão competente para apreciar a impugnação administrativa - artigo 167.º, do EMJ).
Como tal, não procede, também nesta parte, a pretensão do autor com este fundamento.

3. Da incorreta valoração de factos (erro nos pressupostos)
3.1. O autor alega que a matéria dada como provada não retrata correctamente a realidade e/ou é manifestamente insuficiente para a punição, ou da mesma, em todo o caso, não poderiam ser extraídas as conclusões expressas pela entidade demandada, porque, do seu ponto de vista, considerando os factos que deveriam ter sido dados como provados e não o foram, as regras da lógica e da experiência comum que fundamentaram a decisão teriam conduzido a uma apreciação e resultado diferentes.
A este respeito, insurge-se essencialmente contra os seguintes aspetos:
         - Incorreção do facto dado como provado sob o n.º 15, já que a diligência não se realizou por falta do autor;
         - Incorreção do facto dado como provado sob o n.º 17, já que não faz qualquer sentido que o autor tenha avisado a Sra. Procuradora de que iria faltar a um julgamento de um processo cível em que ela não tinha qualquer intervenção;
         -Todas as suas faltas ao serviço deveriam ter sido consideradas como justificadas.

3.2. Os pressupostos do acto administrativo são as circunstâncias objectivas, normativamente previstas, de cuja verificação depende a constituição do órgão administrativo no poder-dever de agir mediante a prática de um acto administrativo de determinado tipo legal.
Se a emissão do acto se baseou nos pressupostos legalmente devidos, mas não efetivamente existentes, ocorre falta de um pressuposto real ou de facto (a circunstância legalmente prevista não se verificou na realidade).
Reafirmando jurisprudência constante, tem vindo a Secção de Contencioso do STJ a decidir reiteradamente que “o vício de violação de lei ocorre quando é efetuada uma interpretação errónea da lei, aplicando-a à realidade a que não devia ser aplicada ou deixando-a de aplicar à realidade que devia ser aplicada”[6].
Quanto ao erro sobre os pressupostos de facto em processos em que se discute a validade de actos que aplicam penas disciplinares, em concreto, tenhamos presente, como ponto de partida para o excurso que se segue, que é “sobre o interessado incide […] o ónus de alegar e provar os vícios que possam pôr em dúvida a validade do ato […]” e que, estando em causa “um erro quanto aos pressupostos de facto, o autor não pode limitar-se a manifestar a sua discordância com a matéria de facto e a pedir a reapreciação de toda a prova produzida no processo administrativo ou a sua renovação perante o juiz administrativo [impondo-se antes que] delimite com precisão os aspetos relativamente aos quais se verificou um erro de apreciação das provas ou os concretos pontos de facto que entende não corresponderem à realidade, bem como os concretos meios de prova que pertinentemente possam demonstrar a ocorrência de um erro na fixação dos factos”[7].
Daí que “o autor não possa, assim, bastar-se com a simples ou mera negação dos factos que lhe são atribuídos / imputados, cabendo-lhe alegar um conjunto de factos que corporizem a falta de consistência da imputação e sanção de que foi alvo, dos quais se indicie a ilegalidade e que aponte para o erro da imputação”[8].
Na certeza, porém, de que importa “distinguir entre a situação em que o impugnante contradita os factos que serviram de fundamento à decisão administrativa e requer ao tribunal a produção de novos meios de prova ou a renovação de meios de prova já produzidos no procedimento administrativo, daquela outra em que pretende apenas discutir a validade do juízo formulado pela entidade administrativa quanto à prova coligida porquanto num caso está em causa a reapreciação da matéria de facto com base num possível erro na fixação dos factos materiais da causa e, no outro, discute-se apenas um eventual erro na apreciação das provas”[9].

No caso dos autos, o autor não pretende impugnar qualquer factualidade que esteja controvertida; mais do que isso (ou mesmo ao invés disso), o que pretende demonstrar é que, partindo de um dado ponto de partida fáctico, a entidade demandada, na deliberação impugnada, procedeu a uma incorrecta valorização dos meios de prova e dos factos apurados e laborou em erro na subsunção dessa dinâmica factual nos tipos de infracção apontados no acto impugnado.

Dito por outras palavras: aquilo contra o que o demandante se insurge não é, summo rigore, um qualquer suposto erro sobre os pressupostos de facto proprio sensu, a demonstrar através de meios de prova em sede contenciosa, mas antes, em bom rigor, um erro de apreciação de provas e um erro de subsunção num tipo de infracção.
Por último, neste enquadramento preliminar, cumpre ter presente que, no tocante à apreciação da prova disciplinar, e “de harmonia com os princípios da oficialidade e da verdade real, vale para o instrutor a regra da liberdade da apreciação das provas [artigo 91.º, n.º 2, do CPA], salvo existência de regra legal que a afaste […]”[10].


3.3. Alega o autor que, com referência ao dia 10.02.2020, apenas esteve ausente da parte da manhã e esteve presente e realizou diligências da parte da tarde. Por conseguinte, não andou bem a deliberação impugnada, ao considerar como falta do autor todo o dia.
A matéria de facto a que se reporta o autor está consignada nos pontos 7) a 13) dos factos dados como provados na deliberação impugnada que, em si mesmo (isto é, enquanto dinâmica factual apurada, expurgada de asserções conclusivas ou de índole jurídica), não foram impugnados pelo demandante. Por esse motivo, recuperemo-los aqui (transcrição):
(…)
“7 - No dia 10 de fevereiro de 2020, o Sr. Juiz de Direito AA não compareceu ao serviço, nas instalações do Juízo Local de Competência Genérica ......., até por volta das 15.30 horas;
8 - Nessa sequência, não se realizaram as diligências nos processos de promoção e proteção n.ºs 310/19..... e 311/19....., agendadas para o dia 10/02/2020 da parte da manhã;
9 - Apesar de ter contactado o Tribunal, através de mensagem telefónica enviada para a Exma. Sra. Procuradora da República, DD, e ter informado que por motivo de falecimento de familiar apenas compareceria pelas 11.30 horas, o que não sucedeu, transferindo posteriormente as diligências para as 14.00 horas;
10 - Não tendo comparecido a esta última hora, contactou novamente o Tribunal por volta das 14.00 horas, transferindo as diligências para as 15.00 horas, tendo, porém, os intervenientes, abandonado as instalações do Tribunal;
11 - Nesse dia 10 de fevereiro acabou por se apresentar nas instalações do Juízo Local de Competência Genérica ....... por volta das 15.30 horas, tendo realizado julgamento no âmbito do processo sumário crime n.º 291/20......, que estava agendado para as 14.00 horas;
12 - Nos processos de promoção e proteção n.ºs 310/19..... e 311/19....., tendo sido aberta conclusão no dia da realização das diligências, despachou nos seguintes moldes:
“Não se mostrando viável e realização da diligência no dia de hoje, por razões de organização do agendamento e serviço, transfiro a mesma para o dia 17 de fevereiro, pelas (…)”
13 - Tais justificações genéricas não tinham qualquer correspondência com a realidade, tanto mais que os despachos foram proferidos apenas, respetivamente, pelas 20.30 horas e pelas 20.32 horas, quando as diligências estavam agendadas para a parte da manhã;”.
(…).
Vejamos.
É certo que, tal como alega o autor, no dia 10.02.2020 apenas esteve ausente da parte da manhã e esteve presente e realizou diligências da parte da tarde.
Contudo, também é inequívoco que a sua ausência ilegítima impediu a realização das diligências agendadas para as 11 horas e depois para as 14 horas, tendo comparecido apenas pelas 15 horas e 30 minutos como, aliás, foi dado como provado.
Recorde-se que, segundo a dinâmica factual (expurgada de asserções conclusivas e alegações jurídicas) apurada no âmbito do procedimento disciplinar, que o autor rigorosamente não contradiz, para esse dia, o autor tinha agendadas duas diligências no período da manhã: uma no processo n.º 310/19....., para as 10h30; e outra no processo 311/19....., agendada para as 11h30. Sendo que, no período da tarde, a diligência no processo n.º 291/20......, estava agendada para as 14h00.
O autor entrou em contacto quer com a Sra. Procuradora, quer com a secretaria, indicando que lhe havia falecido pessoa próxima, e que transferia as diligências para as 14h00. Não comparecendo às 14h00, contactou novamente a secretaria transferindo as diligências para as 15h00, tendo, porém, os intervenientes processuais que se mantiveram no tribunal desde período da manhã, abandonado tais instalações.
Certo é, porém, que o autor apenas se apresentou no Juízo Local de Competência Genérica ....... pelas 15h30, tendo realizado, nesta altura, o julgamento no âmbito do processo sumário 291/20......, que se encontrava agendado para as 14h00.
Nos processos de promoção e protecção n.º 310/19..... e n.º 311/19..... foi aberta conclusão em que o autor despachou nos seguintes moldes: “Não se mostrando viável a realização da diligência no dia de hoje, por razões de organização do agendamento e serviço, transfiro a mesma para o dia 17 de Fevereiro, pelas (…)”. Tais despachos, conforme consta de fls. 109 e 110 (verso) do PA, foram proferidos pelas 20h20 e 20h32 de dia 10.02.2020, sendo que as diligências nos referidos processos se encontravam agendadas para as 10h30 e 11h30 desse dia. Ora, tais despachos não tinham, assim, qualquer correspondência com a verdade.
Mas, sobretudo, o que importa reter é que em circunstância alguma o autor comunicou a sua ausência ao órgão competente, o que inviabilizou a sua substituição; e, nem apresentou qualquer documento justificativo, tal como estava obrigado. A ausência foi, pois, ilegítima, posto que não foi apresentado qualquer comprovativo do falecimento de um familiar do autor, nem foi comunicada ao Sr. Presidente do Tribunal. Eis um primeiro ponto que importa relevar.
Assim como, também ficou demonstrado que, em virtude da comunicação que o autor estabeleceu com a secretaria, os intervenientes processuais nos processos n.º 310/19..... e n.º 311/19....., que se tinham deslocado ao tribunal na manhã do dia 10.02.2020, ali permaneceram até ao período da tarde, com esperança de que as diligências se realizassem pelas 14h00. Como, no entanto, o autor não compareceu mais uma vez pelas 14h00 horas, verificou-se que a sua ausência causou prejuízo para as partes que se deslocarem ao tribunal de manhã e ali permanecerem até ao período da tarde, desnecessariamente.
A este respeito, e tal como se conclui na Deliberação do Plenário de 20.04.2021, “[i]rreleva o facto de o arguido ter realizado uma outra diligência na tarde de dia 10/02, pois, ficou demonstrado que as partes se deslocaram ao tribunal por volta das 14h, tendo aí permanecido cerca de 1 hora, sem que a diligência para a qual haviam sido convocadas fosse realizada, tendo havido, manifesta perturbação do serviço e inconveniente para as partes”.
Também a diligência que se encontrava agendada para as 14h00, no processo 291/20......, apenas teve início às 15h30, sem qualquer explicação para esse atraso.
Ora, conforme vimos supra, o autor alega que só esteve ausente de manhã e não todo o dia. Todavia, esse facto não invalida que não tenha causado grave prejuízo, quer pela não realização das diligências agendadas para o período da manhã e reagendadas para o período da tarde, quer no atraso da diligência realizada no período da tarde.
Como, aliás, se refere na Deliberação do Plenário de 20.04.2021, em segmento que se recorda: (…) “Face aos factos dados como provados, não está em causa a aplicação da alínea a) do art. 83.º-I do EMJ, uma vez que não ocorreu uma ausência ilegítima e continuada a circunscrição judicial por mais de 3 dias. Também não se preenchem, por não se tratar de ausências continuadas, a alínea d) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ, nem a alínea f) do art. 83.º-G do EMJ. Resta saber se, como se concluiu no relatório do Sr. Inspetor e na deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM, o comportamento global do arguido permite ainda que esteja preenchida a alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ. E, de facto, o que está em causa neste procedimento é um conjunto de comportamentos de violação grave e grosseira do dever de zelo, na medida em que, ainda que se pudessem aceitar, em tese, as justificações dadas pelo arguido para estar ausente do tribunal, de modo algum se consegue justificar a reiterada e renitente ausência de comunicação prévia das referidas ausências ao Presidente do Tribunal. Tal recusa reiterada em cumprir uma regra de fácil execução, para além de inexplicável, trouxe inegáveis prejuízos para o serviço, como foi expressamente declarado pela testemunha DD (Procuradora da República) e pela testemunha BB (Escrivão de Direito); bem como para terceiros (intervenientes que se deslocaram inutilmente ao tribunal na tarde do dia 10/02)” (sublinhados nossos).
Pelo que, não se vislumbra nenhum erro sobre os pressupostos de facto ou de direito que implique um juízo de invalidade sobre o acto impugnado, pelo que improcede, nesta parte, a pretensão do autor com este fundamento.

3.4. Mais se insurge o autor contra a valoração que foi efectuada pela entidade demandada quanto aos factos dados como provados nos pontos 14 e 15 do relatório final e da deliberação impugnada, porquanto, segundo o demandante, as diligências do dia 11.02.2020 não se realizaram por factos alheios à vontade do autor (transacção num processo e acordo entre as partes para juntarem documentos, e solicitarem a dispensa da audiência prévia), porquanto:
         i) quanto ao processo n.º 212/18....., as partes fizeram chegar aos autos no dia anterior, com subscrição pela outra parte às 09h08, uma transacção, sendo que esse julgamento não se realizou porque as partes celebraram uma transacção na véspera, pelo que não faz o menor sentido dar como provado que o autor faltou ao serviço no dia 11.02 e, por essa razão, não se realizou o julgamento;
         ii) em relação ao processo 55/19....., esta matéria está estritamente ligada à matéria alegada no artigo 23.º da defesa e que foi, mal, dada como não provada no ponto 4 dos factos não provados, sendo que, se tivesse sido junta aos autos certidão do referido processo judicial, ter-se-ia constatado ser verdadeira a versão do arguido, ou seja, que foram juntos inúmeros documentos pelas partes antes da audiência prévia (o que só corrobora a sua versão) – “se assim não fosse, como é que as partes adivinhavam que o autor ia estar ausente e decidiam apresentar os documentos..!” (sic).

Vejamos.
Constata-se que para este dia encontravam-se agendadas diligências nos processos n.º 212/18......, para as 09h30, e n.º 55/19....., para as 14h15.
Relativamente ao processo n.º 212/18......, no dia anterior e no dia do julgamento, pelas 9h08, deu entrada em juízo requerimento das partes, com pedido de homologação de transacção.
Todavia, é certo que o julgamento agendado para as 09h30 não se realizou porque o autor não estava presente. Se estivesse presente, como era devido, teria homologado a transacção apresentada em acta, na própria sessão agendada, e mesmo sem a presença das partes. Tal como se consignou na deliberação do Plenário do CSM de 20.04.2021, fazendo referência à deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM, “como não houve despacho prévio ao julgamento, devia ter sido em ata de audiência de julgamento que deveria ter sido proferida a sentença homologatória, dando assim sem efeito o julgamento a realizar e já não proferir despacho no dia seguinte”.
Ou, no limite, o autor teria dispensado a realização de audiência, mediante despacho proferido antes da mesma. Mas, não foi isso que sucedeu: tendo o Sr. Escrivão de Direito contactado telefonicamente o autor, na manhã do dia do julgamento, informando que tinha entrado um requerimento de transacção, tendo sido aberta conclusão no mesmo dia, 11.02.2020 (cf. fls. 118 do PA), constata-se que foi proferido pelo autor despacho nesse termo de conclusão com o seguinte teor: “Na presente ação declarativa comum, em que são autores […] e réus […], examinando o objeto e qualidade dos intervenientes da respetiva transação, julgo-a válida, pelo que homologo por sentença, condenando nos seus precisos termos, julgando extinta a instância, nos termos do disposto […] e determino, oportunamente, o arquivamento dos autos. // Custas nos termos acordados. // Notifique e Registe. // Dou sem efeito a audiência final. // Desconvoque // D.N. // d.s.” (negrito nosso).
Sobre o referido despacho foi aposta assinatura eletrónica datada de 12.02.2020 [cfr. facto provado em 18) da deliberação impugnada e 4) do probatório]. Significa isto que, apesar de o autor ter inscrito a menção d.s., querendo fazer parecer que o despacho tinha sido proferido antes do julgamento (e no momento da abertura do termo de conclusão), conforme consta no canto esquerdo do documento, tal despacho foi assinado pelo autor apenas a 12.02.2020. Pelo que não tinha correspondência com a verdade.
Por seu turno, no que respeita ao proc. n.º 55/19....., com audiência agendada para as 14h00 desse mesmo dia, o autor alega que as partes solicitaram a dispensa de audiência prévia porque juntaram documentos. Mas, a verdade é que o autor não compareceu ao tribunal, pelo que não se realizou a diligência no processo 55/19....., agendada para as 14h00, e a desconvocação das partes que, à hora marcada, se encontravam presentes no Tribunal [conforme consta da cota de fls. 112 do PA - vide ponto 4) b. do probatório].
Sempre se refira, tal como bem se consignou no acto impugnado a este respeito, que o facto de terem sido juntos, por uma das partes, durante a tarde, cerca de 40 documentos, não impedia, por si só, a realização da “diligência, ainda que a contraparte não prescindisse de prazo de vista, na medida em que se tratava de mera audiência prévia, podendo desde logo ser ouvidas as partes quanto à prova já junta. Por outro lado, no momento em que o Autor decide não se deslocar ao tribunal, não era ainda certo qual a tomada de posição da contraparte no que respeita ao prazo de vista”.

De todo o modo, a este respeito nem autor, nem entidade demandada, dissentem no tocante ao essencial da dinâmica factual apurada: no dia 11.02.2020 estavam agendadas duas diligências (uma audiência prévia no processo comum n.º 55/19..... e uma audiência final no processo comum n.º 212/18......, agendados para as 14h15 e 09h30, respetivamente); o autor não compareceu no tribunal a horas do início daquelas diligências; no processo n.º 212/18..... as partes fizeram chegar aos autos uma transacção, no dia anterior, com subscrição pela outra parte às 09h08; e no processo 55/19....., foram juntos inúmeros documentos pelas partes antes da audiência prévia.

Onde as partes dissentem é apenas na valoração que a entidade demandada efectuou da ausência do autor, no sentido de, independentemente da transacção e dos documentos juntos, lhe atribuir relevância para a não realização das diligências e de considerar a sua conduta com relevância disciplinar.

Significa isto que nenhuma das diligências se realizou, sendo que em tal dia, o autor não compareceu ao serviço, nas instalações do Juízo Local de Competência Genérica ........

O autor também não comunicou ou justificou tais ausências, impossibilitando, deste modo, a sua substituição.

Acresce que, no dia 11.02.2020, o autor estava obrigado a deslocar-se ao Tribunal, porquanto, tinha diligências agendadas (cfr. artigo 10.º, n.º 2, do EMJ). Não se divisa, por conseguinte, qualquer erro sobre os pressupostos na deliberação impugnada, quando aí se consignou, além do mais, que o ora autor “não poderia ter optado por ficar a trabalhar em casa, sem antes se assegurar que as diligências não tinham condições para serem realizadas, ou que deveriam ser adiadas, o que não sucedeu. O que parece ter sucedido, é que o arguido aproveitou algumas vicissitudes processuais (possibilidade de transação e junção de documentos) para proceder ao adiamento ou não realização das diligências”, e, consequentemente, não se deslocar ao tribunal.
Mais alega o autor, a propósito desta falta no período vespertino, e reportando-se ao facto dado como provado no ponto 17) da deliberação impugnada, que não teria qualquer lógica comunicar à Sra. Procuradora a sua ausência, já que estava em causa a realização de diligência num processo cível.
Também quanto a este ponto entendemos que possa assistir-lhe razão: é que uma leitura integrada e holística do acto impugnado, conjugando e cotejando os factos provados com a motivação da convicção probatória, permite depreender que a entidade demandada julgou verificada a factualidade pertinente para a subsunção na tipologia da infracção disciplinar, independentemente de quem tenha dado a indicação de que estaria ausente (sendo esse um elemento meramente acessório ou complementar e não decisivo para a qualificação da infracção).
Veja-se que, da motivação da deliberação impugnada constava, além do mais, o seguinte: “Depoimento da Sra. Funcionária Judicial CC, que confirmou o teor da cota de fls. 112 na sequência do que lhe foi transmitido pelo escrivão, daí que se mantenha a matéria em causa nos factos assentes (item 17), embora pouca relevância assuma quem transmitiu tal informação (A Sra. Procuradora ou o Sr. Escrivão);” (sublinhado nosso).
De todo o modo, independentemente de quem tenha dado a informação, há uma constatação que releva e se sobrepõe ao alegado: nesse dia o autor não se deslocou ao tribunal, apesar das diligências que se encontravam agendadas.
Pelo que, a pretensão do autor é julgada improcedente também neste ponto.


3.5. Alega o autor que, nos dias 04 e 05.03.2020 esteve doente e, por isso, não esteve ausente voluntariamente, não devendo as faltas nesses dias ter sido valoradas negativamente. Apenas existiu a comunicação tardia ao Presidente do Tribunal, que não reveste dignidade disciplinar.
Vejamos.
No dia 04.03.2020, o autor contactou telefonicamente a secção de processos indicando que teve uma indisposição e, no dia seguinte, 05.03, indicou que se encontrava de baixa médica. Apesar da realização de tal comunicação à secretaria, o autor reconhece que não a comunicou ao Juiz Presidente da Comarca, tal como se encontrava obrigado, pelo que inviabilizou a sua substituição, o que determinou que não se realizassem as diligências nos processos 201/19......, 694/19......, 221/19......., no dia 04.03.2020, e as diligências nos processos 245/19......., 299/19........, 298/19......., 497/07......., 97/19....... e 277/19......., agendadas para o dia 05.03.2020.
O autor apenas comunicou ao Juiz Presidente do Tribunal de Comarca a sua ausência, pelas 18h19 do dia 06.03.2020, através de correio eletrónico, juntando atestado médico.
Ora, nos termos do disposto no artigo 10.º, do EMJ, subordinado à epígrafe “Faltas e ausências”:“quando ocorra motivo ponderoso, os magistrados judiciais podem ausentar-se da circunscrição respetiva por número de dias que não exceda três em cada mês e 10 em cada ano, comunicando previamente o facto ao presidente do tribunal, ou, não sendo possível, imediatamente após o seu regresso” (n.º 1), sendo que “o exercício de funções que pela sua natureza não careça de ser realizado no tribunal pode excecionalmente ser assegurado pelo juiz fora das respetivas instalações, não sendo considerado ausência de serviço quando não implique falta ou perturbação dos atos judiciais” (n.º 2). Em qualquer caso, “[…] os magistrados judiciais devem informar o local em que podem ser encontrados” (n.º 5), sendo que “a ausência ilegítima implica, além de responsabilidade disciplinar, a perda de vencimento durante o período em que se tenha verificado” (n.º 6).
Mais, estabelece o aludido preceito que: “as faltas por doença são de imediato comunicadas pelo magistrado judicial ao presidente do tribunal” (n.º 7), que, “no caso de faltas por doença que se prolonguem por mais de cinco dias úteis, ou sempre que o considere justificado, deve ser exigida pelo presidente do tribunal a apresentação de atestado médico” (n.º 8) e que “as faltas e as ausências previstas no presente artigo são comunicadas pelo presidente do tribunal ao Conselho Superior da Magistratura” (n.º 9).
É, pois, o EMJ que exige que as ausências por doença têm de ser comunicadas, imediatamente, ao Juiz Presidente do Tribunal.
No caso vertente, o autor não comunicou a sua ausência ao serviço, imediatamente, conforme se encontrava obrigado, uma vez que também não se encontrava impedido de efectuar tal comunicação, pois fê-lo junto da secretaria nos dias 04.03.2020 e 05.03.2020.
Como tal, mesmo reconhecendo tratar-se apenas de meras ausências ilegítimas por falta de comunicação prévia ao Presidente do Tribunal, é manifesto que as mesmas têm relevância e dignidade disciplinar: não se tratando, summo rigore, de violação do dever de assiduidade, sempre manifestam a violação do dever de zelo, devendo considerar-se preenchida a previsão da alínea e), do n.º 1, do artigo 83.º-H do EMJ.
Pelo que, também quanto a esta alegação, improcede a pretensão do autor, pelos motivos supra expostos.

3.6. Quanto ao dia 19.05.2020, alega o autor que esteve ausente do serviço para prestar assistência inadiável ao filho, menor de 10 anos, que tinha sintomas compatíveis com a COVID 19.
Na manhã daquele dia 19.05, o ora autor comunicou telefonicamente à secção que se encontrava impedido, determinando que a diligência agendada para a manhã desse dia, no processo de promoção e protecção n.º 421/12......., passaria para as 14h00. Para essa tarde estavam também agendadas as diligências no processo n.º 101/20...... (promoção e protecção) para as 13h45, no processo n.º 232/14....... (audição de arguido) agendado para as 14h00 e no processo 59/18....... (julgamento) agendado para as 14h15.
Cerca das 14h30/14h35, o autor contactou novamente a secção, informando que não podia comparecer no tribunal por estar impedido de se deslocar ao mesmo e, que todas as diligências ficavam sem efeito. Tal foi comunicado, nesse momento, a todos os intervenientes processuais que se haviam deslocado ao tribunal desnecessariamente, quer os que permaneceram desde o período da manhã cuja diligência foi reagendada para as 14h00, quer os restantes que tinham as diligências agendas para o período da tarde.
Pelas 14h44, o Sr. Escrivão de Direito, por ordem do autor, comunicou ao Juiz Presidente de Comarca a ausência do mesmo, fundando-se em motivos pessoais.
O autor apenas comunicou a sua ausência ao Juiz Presidente da Comarca no dia seguinte, 20.05.2020, pelas 04h08, através de correio electrónico, indicando que foi aconselhado a ter o mínimo contacto possível, principalmente com terceiras pessoas não abrangidas pelo agregado familiar, em face da eventualidade de o seu filho mais novo estar infectado com o vírus. Nessa comunicação não juntou qualquer documento que atestasse a situação relatada. Aduziu ainda, na comunicação dirigida ao Juiz Presidente da Comarca, que se tratou aparentemente de uma situação de falso alarme e continuaria a despachar os processos em casa, por não ter mais diligências agendadas nessa semana. Concluiu, dizendo que a justificação apresentada se subsumia a motivos pessoais, pois foi o mesmo que acompanhou o menor durante o dia, pretendendo, por ora, que a justificação à ausência ao serviço versasse sobre o dia em causa.
Consignou-se a este propósito no acto impugnado o seguinte (transcrição):
(…)
No que respeita ao dia 19/05/2020, não existe justificação comprovada para a falta, concordando-se com o relatório do Sr. Inspetor e com a deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM quando concluem não ser credível a explicação avançada pelo arguido. Efetivamente, caso o filho do Sr. Juiz de Direito arguido estivesse, efetivamente, com sintomas compatíveis com a “SARSCoV-2”, afiguram-se três hipóteses: a) deveria a criança ter sido testada, esclarecendo-se na dúvida (caso em que o arguido teria comprovativo da realização do teste); b) deveria a criança ter-se deslocado ao Centro de Saúde/Hospital ou médico para fazer a despistagem (caso em que haveria comprovativo da deslocação e/ou consulta); c) ou, em caso de dúvida e não havendo indicação do SNS para testagem nem possibilidade de recurso a um médico, deveria ter sido cumprido um período de 14 dias de isolamento profilático, isolamento este que se estenderia a todo o agregado familiar. O que não é credível, à luz da experiência comum que temos tido, ao longo de mais de 1 ano, da sinalização de pessoas com sintomas compatíveis com a “SARSCoV-2”, é que houvesse suspeitas de manhã, de tal modo que constituíssem motivo ponderoso de ausência, e que, sem qualquer uma das diligências referidas em a) e b), o arguido pudesse comparecer a uma diligência, no mesmo dia, no período da tarde. Assim, no que toca ao dia 19/05/2020, é forçoso concluir-se que ocorreu uma verdadeira falta [in]justificada, por ausência de motivo ponderoso comprovado.
 (…).
Não se vislumbram motivos para dissentir do decidido na deliberação impugnada.
Alega, ainda, o autor que tal falta poderia ter sido justificada ao abrigo do artigo 10.º, n.º 1, do EMJ. Contudo, não comunicou, tal como estava legalmente obrigado, a sua ausência ao Presidente do Tribunal da Comarca, quando lhe foi possível, ou seja, no mesmo momento em que comunicou à secretaria.
Argumenta, ainda, o demandante que a comunicação foi feita previamente, pela secretaria judicial, tal como estabelece o artigo 10.º, n.º 1, do EMJ, conforme ordenou. No entanto, a comunicação por interposta pessoa não olvida a que tenha que existir uma comunicação formal da ausência ao serviço, que deve ser realizada pelo próprio magistrado ao órgão competente, uma vez que tal como vimos, não se encontrava impedido de a fazer.
Em suma: esta justificação não foi aceite na Deliberação do CSM por se entender que a mesma não merece credibilidade. Na verdade, o autor não apresentou qualquer comprovativo da realização de um teste na pessoa do filho, nem qualquer comprovativo da sua deslocação a qualquer centro de Saúde, nem ocorreu qualquer período de isolamento profilático por parte do demandante.
Por isso, a falta foi correctamente considerada como injustificada.
Pelo que, também quanto a esta alegação, improcede a pretensão do autor, pelos motivos supra expostos.

3.7. Aduz, ainda, o autor que os factos que lhe foram imputados não revelam falta de zelo e grave desinteresse pelo cumprimento dos seus deveres funcionais, também tendo em conta o que decorre dos factos dados como provados em 35) a 38) da deliberação impugnada, e que nenhuma das suas ausências tinha “dignidade disciplinar”.
Resulta dos factos dados como provados invocados pelo autor o seguinte (transcrição):

(…)

35 - O arguido transmite a perceção de ser independente, isento nas decisões, na conduta processual e empenhado, embora os seus atrasos recorrentes e faltas tenham causado perturbação no serviço;

36 - Tem bom relacionamento com os funcionários judiciais, mandatários, bem como com os demais magistrados;

37 - Trata com urbanidade e dignidade todos os intervenientes processuais e o público em geral;

38 - Exerce as funções com reserva e serenidade.

(…).
Mesmo à luz destes factos, julgamos que o acto impugnado, ao censurar disciplinarmente a conduta do autor, não padece de qualquer erro. O que os autos evidenciam, ao invés, é que existiu efectivamente violação do dever de zelo, que resultou em elevados prejuízos para o serviço, e para as partes que se deslocaram ao tribunal sem que as audiências para as quais se encontravam convocadas ocorressem, além de que, o autor, reiteradamente, não comunicou as suas ausências, evitando assim o recurso à substituição por forma a causar o menor prejuízo para o serviço.
O que está em causa neste procedimento, é um conjunto de comportamentos de violação grave e grosseira do dever de zelo, na medida em que, ainda que se pudesse aceitar, em tese, as justificações dadas pelo autor para estar ausente do tribunal, de modo algum se consegue justificar a reiterada e renitente ausência de comunicação prévia das referidas ausências ao Presidente do Tribunal da Comarca.
Secundamos, deste modo, o juízo efectuado no acto impugnado, segundo o qual, tal recusa reiterada em cumprir uma regra de fácil execução, para além de inexplicável, trouxe inegáveis prejuízos para o serviço, bem como para terceiro.
Por isso, o demandante foi considerado autor de uma única infracção grave, de execução reiterada e sucessiva por violação dos deveres gerais de zelo e de assiduidade.
Quanto ao mais, atinente à suposta falta de dignidade disciplinar, limitamo-nos a reproduzir nesta sede, pelo acerto hermenêutico, o que se deixou estabelecido na deliberação impugnado a este respeito (transcrição):

(…)

Não tem também razão o arguido quando alega que a falta de comunicação da ausência ao Presidente do Tribunal não tem qualquer relevância disciplinar. O n.º 1 do art. 10.º do EMJ exige, para que a ausência seja legítima, dois requisitos cumulativos:

a) Motivo ponderoso;

b) Comunicação prévia (ou, excecionalmente, posterior) ao Presidente do Tribunal.

E o n.º 6 do art. 10.º do EMJ estabelece que: “a ausência ilegítima implica, além de responsabilidade disciplinar, a perda de vencimento durante o período em que se tenha verificado”. A norma não se refere às faltas injustificadas (conceito autónomo), mas antes à “ausência ilegítima”, numa clara referência ao disposto no n.º 1 do art. 10.º do EMJ. Assim, a infração disciplinar, no que respeita aos magistrados judiciais, pode decorrer da ausência de motivo ponderoso (falta injustificada) ou da ausência de comunicação ao Presidente do Tribunal (ausência que poderia ser justificada, mas é ilegítima). Entende-se que assim seja, pois, a comunicação ao Presidente do Tribunal não corresponde a uma mera formalidade, sendo antes essencial para garantir a boa prossecução do interesse público na administração da justiça (dever de todos os magistrados judicias, consagrado nos arts. 3.º e 7.º-C do EMJ), já que permite que seja acionada a substituição do magistrado, quando seja possível, a tempo útil, bem como, não sendo possível a substituição, que sejam avisados os intervenientes, evitando-se deslocações inúteis ao tribunal. (…). (sublinhados nossos).
Pelo que também nesta parte, improcede a pretensão do autor, com este fundamento.


3.8. Por último, ainda em sede de erro sobre os pressupostos, sustenta o autor que não pode ser punido como reincidente, “uma vez que as circunstâncias do caso não revelam a ausência de eficácia preventiva da condenação anterior”.
Ora, o que é certo é que não se vislumbra motivo para divergir do entendimento plasmado na deliberação impugnada, segundo a qual se manifestava concordância “[…] também, com o relatório do Sr. Inspetor e com a deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM na parte em que concluem no sentido de ser adequada ao caso a pena de suspensão, atendendo aos antecedentes disciplinares do arguido. De facto, tendo já sido aplicada uma pena de suspensão por violação do dever de zelo e de assiduidade (180 dias de suspensão), exigia-se, no mínimo, que o arguido se tivesse sensibilizado para a necessidade de cumprir escrupulosamente com os seus deveres no que respeita à presença no tribunal e comunicação atempada de eventuais ausências inevitáveis” (sublinhados nossos).
Com efeito, a dinâmica factual apurada nos autos de procedimento disciplinar, evidenciam e indicam com clareza a ausência da eficácia preventiva da condenação anterior, pelo que, julgamos improcedente a pretensão do autor também nesta parte.
                  4. Da desadequação da medida da pena (violação do princípio da proporcionalidade)
4.1. Por último, alega o autor que o acto impugnado aplicou uma sanção excessiva padecendo de um erro grosseiro na determinação da pena, que deveria ser, quando muito, a multa.
Estamos confrontados, nesta fase, já não com um vício de lei por erro sobre os pressupostos da decisão, seja de facto, seja de direito: a infracção existiu efectivamente; e as normas convocadas pela entidade demandada foram, no essencial, as correctas. O que agora se pede ao Tribunal é que sindique a concreta medida da pena disciplinar, ou seja, que promova uma accertamento judicial da dosiometria sancionatória em concreto aplicada ao arguido de acção disciplinar administrativa.
Cumpre apreciar e decidir [11].

4.2. Vejamos o de que doutrina e jurisprudência têm vindo a postular, de forma uniforme, o entendimento de que, na fixação da medida da pena, a Administração, embora tenha de respeitar os parâmetros legais, goza de certa margem de liberdade.
Este entendimento decorre, desde logo, da constatação de que “a gravidade da pena a aplicar depende do grau de responsabilidade do agente. Ora a apreciação desta está entregue ao critério dos titulares do poder disciplinar que a avaliarão de acordo com os conhecimentos da personalidade do infrator e das circunstâncias em que agia. […] Por isso, ao contrário do que sucede no direito criminal, não se estabelece a correspondência rígida de certas sanções para cada tipo de infração, deixando-se a quem haja de decidir amplo poder discricionário para punir as infrações verificadas”[12].
Note-se que o alargamento dos poderes de pronúncia do juiz que haja de mover-se nos meandros processuais do contencioso administrativo, decorrente da possibilidade de inclusive emitir pronúncias de condenação dirigidas às autoridades administrativas (cfr. artigo 66.º, do CPTA), não veio alterar o perfil de controlo da legalidade dos actos da Administração pelos tribunais administrativos, que continua a reger-se pelo princípio da separação de poderes. Fundamental, por isso, é que a pretensão do autor se reporte a um aspecto vinculado do acto administrativo a praticar - ou, pelo menos, que a apreciação do caso concreto permita ao tribunal identificar apenas uma solução como legalmente possível (redução da discricionariedade a zero).
Por isso, depois de consagrar, no seu artigo 2.º, o princípio da tutela jurisdicional efetiva dos particulares perante a Administração, o próprio CPTA estabelece, no seu artigo 3.º, n.º 1, que “no respeito pelo princípio da separação e interdependência dos poderes, os tribunais […] julgam do cumprimento pela Administração das normas e princípios jurídicos que a vinculam e não da conveniência ou oportunidade da sua atuação”.
Assim, importa desde logo reter a ideia, resultante do citado artigo 3.º, n.º 1, de que o princípio da plena jurisdição dos tribunais, ali consagrado, não pode ser entendido de modo ilimitado. Na verdade, existem zonas de actuação da Administração em que os tribunais (administrativos e, ex vi artigos 168.º e 178.º, do EMJ, também a Secção de Contencioso do STJ) não se podem intrometer. Existe aí, pois, uma reserva de liberdade ou discricionariedade da Administração.
Portanto, ou existem “[…] vínculos jurídicos a condicionar, de qualquer modo, a atuação da Administração no caso em apreço, e pede-se ao tribunal que averigue da sua existência e (em caso afirmativo) que os torne efetivos, ou não há vínculos desses e o tribunal só pode abster-se de julgar a conduta administrativa. Naqueles aspetos em que as decisões concretas da Administração relevam de uma qualquer opção discricionária ou de uma margem de apreciação ou valoração autónoma, os tribunais […] – não conseguindo formular sobre essa opção um juízo de desconformidade com o bloco legal que lhe é aplicável – ficam, por lei, proibidos de exercer um controlo sobre elas […]”[13] (sublinhado nosso).
Esta reserva de discricionariedade tem o seu fundamento, precisamente pela razão que o mesmo artigo 3.º, n.º 1, do CPTA evidencia: a necessidade de salvaguardar o princípio da separação de poderes, plasmado no artigo 111.º, n.º 1, da CRP, nos termos do qual “os órgãos de soberania devem observar a separação e a interdependência estabelecidas na Constituição”, e elevado mesmo a limite material da revisão constitucional - cfr. artigo 288.º, alínea j), da Lei fundamental. É daí que decorre, e tal como este Supremo deixou estabelecido no recentíssimo Ac. de 02.12.2021, no proc. n.º 37/20.3YFLSB, a fixação de limites funcionais aos poderes de controlo dos tribunais da atuação dos órgãos administrativos, independentemente dos meios de que se possam socorrer. Tais limites “[…] concretizam-se através da restrição da fiscalização jurisdicional à esfera da juridicidade, implicando que aos tribunais se atribua apenas competências para aferir da compatibilidade das decisões administrativas com a lei, os princípios gerais de direito e as normas constitucionais que integram o bloco de juridicidade. Ao fazê-lo, não estão a privar a Administração da essência da sua função material, porque esta atua num campo em que é heterodeterminada, aplicando ao caso concreto soluções pré-definidas em normas e princípios jurídicos. Já são, no entanto, de excluir do campo da jurisdição todos os poderes de decisão que englobem questões de mérito, isto é, que impliquem a avaliação da oportunidade e conveniência da atividade administrativa […]”[14].

4.3. No domínio específico do direito disciplinar vislumbram-se inúmeras manifestações da formulação de valorações próprias da função administrativa ou da margem de livre decisão.
Desde logo, é defendida de há muito a existência de um juízo de oportunidade na própria instauração do procedimento disciplinar[15].
Esta tese, aliás, encontra respaldo normativo expresso no artigo 207.º, n.º 1, da LGTFP, segundo o qual cabe ao órgão competente para instaurar o procedimento disciplinar, uma vez recebida a participação ou queixa disciplinar, decidir se ele deve ou não ter lugar. “Sendo assim, ao poder de “participar” não corresponde, do lado passivo, outro dever que não seja o de receber a participação e sobre ela, proferindo despacho liminar, decidir se instaura ou não o procedimento adequado” [16].
Além disso, na LGTFP preveem-se inúmeros espaços de abertura normativa, nomeadamente, em sede de preenchimento de conceitos indeterminados, como “prejuízo relevante para o serviço”, “sem consequências importantes” (artigo 185.º), “infração que inviabilize a manutenção do vínculo público” (artigo 187.º) ou a propósito da sanção de suspensão, “comportamentos que atentem gravemente contra a dignidade e o prestígio da função” (artigo 186.º).
Não se pretende dizer com isso que existem matérias, como a da determinação da medida da pena disciplinar, no âmbito das quais os tribunais não podem exercer qualquer controlo: o que está em causa, apenas, é a natureza do poder exercido em cada caso pela Administração, o que implica apurar se determinada actuação se mostra (no todo ou em parte) vinculada, isto é, moldada por regras jurídicas que determinam esse concreto modo de agir, ou discricionária, caso em que essa determinação legal não existe.
Tal também não significa obviamente que não existam aspectos que, no exercício da atividade discricionária, se mostrem submetidos ao total controlo judicial: eles existem. No entanto, são apenas os aspectos vinculados dessa actividade discricionária (como, por exemplo, a competência), ou os limites externos a qualquer actividade administrativa, tais como os princípios a que a mesma deve obedecer, cuja inobservância ostensiva (no caso da actividade discricionária) é sempre judicialmente sindicável (v. gr., o princípio da proporcionalidade).
Assim, o legislador, ao conferir aos tribunais poderes de jurisdição plena (artigos 2.º e 3.º, do CPTA), acaba por, correspectivamente, confiná-los à aplicação da lei e do Direito, vedando aos tribunais a faculdade de se substituírem aos particulares na formulação de valorações que pertencem à respectiva autonomia privada, e às entidades públicas na formulação de valorações que, por já não terem carácter jurídico, mas envolverem a realização de juízos sobre a conveniência e oportunidade da sua actuação, se inscrevem no âmbito próprio da discricionariedade administrativa. A reserva de discricionariedade da Administração Pública, com a consequente insindicabilidade judicial do mérito das medidas e opções administrativas é, pois, corolário imanente do nuclear princípio constitucional da separação de poderes.
Advirta-se, porém, na esteira dos ensinamentos da doutrina mais autorizada, que ora se seguem de perto, que o n.º 1, do artigo 3.º, do CPTA não opõe legalidade a discricionariedade; contrapõe, outrossim, juridicidade a mérito. Pretende o Legislador com isto significar, em bom rigor, não que o sumo de poderes discricionários se encontra fora do domínio jurídico (out of law), ou que, a Administração Pública estaria aí submetida apenas a regras de boa administração, ao arrepio de todo e qualquer parâmetro normativo de controlo; ao contrário, o poder discricionário partilha com o poder estritamente vinculado uma característica transversal e inspiradora: é um poder jurídico.
Daí que, embora se detecte neste domínio, momentos próprios da decisão que estão reservados à Administração (pelo juízo de prognose e, porventura, de ponderação de interesses que convocam), e apesar de ser inerentemente limitado o âmbito dos poderes de cognição dos tribunais judiciais no quadro desta margem de livre apreciação administrativa, a verdade é que, também aqui, a actuação administrativa não é livre, antes estando sujeita a critérios jurídicos (discricionariedade ou “livre decisão, que se move num campo de competência e legalidade, não equivale a arbitrariedade, que se move num campo de absoluta liberdade, positiva e negativa”[17].
Esses critérios jurídicos são fixados, além do mais, pelo artigo 266.º, n.º 2, da CRP, que sujeita toda a actividade administrativa aos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé. Tais princípios concretizam uma objectivação dos critérios jurídicos de controlo do exercício da margem de livre apreciação, conferindo verdadeiros parâmetros de racionalidade a partir dos quais o Tribunal, face à dinâmica factual apurada e a situação concreta que lhe é submetida, afere da respectiva compatibilização com a juridicidade.
Importa, porém, ter presente que o controlo jurisdicional do exercício administrativo de poderes discricionários é um controlo externo e negativo, que apenas permite aos tribunais a anulação da solução adoptada se ela violar os cânones da razoabilidade e racionalidade básicas, quer em termos jurídicos, quer em termos de senso comum – mas, já proíbe a definição, pela positiva, do caso concreto, substituindo-se à Administração Pública na ponderação das valorações que integram a margem de livre apreciação, salvo nas chamadas situações de redução da discricionariedade a zero, a que alude o n.º 2, do artigo 71.º, do CPTA[18].
Daí que a violação dos princípios aludidos no n.º 2, do artigo 266.º, da CRP apenas devam determinar a anulação do acto administrativo se a mesma for flagrante e ostensiva[19].

4.4. A própria jurisprudência, reiterada e constante, da Secção de Contencioso do STJ, vem de há muito postulando precisamente a existência dessa margem de livre apreciação que assiste ao CSM no exercício do poder disciplinar, nomeadamente, na emissão do juízo qualificativo dos tipos de infracção e na dosimetria concreta da pena[20].
4.5. Neste domínio de apreciação jurisdicional da dosiometria de uma sanção disciplinar, assume particular relevo o princípio da proporcionalidade. Como bem aponta a doutrina da especialidade, “os critérios enunciados para a ponderação discricionária da Administração Pública apontam claramente para uma imposição de proporcionalidade, adequação e necessidade da determinação da pena disciplinar. Trata-se da prática de atos de poder público que limitam os direitos dos trabalhadores e que, portanto, se devem sujeitar às garantias do princípio da proporcionalidade. A atividade de escolha e medida das penas é uma atividade claramente discricionária, mas não arbitrária. O legislador aponta alguns critérios, mas não fecha mesmo aqui a porta à consideração de circunstâncias que in casu sejam relevantes para a escolha mais justa e proporcional: “todas as circunstâncias em que a infração tenha sido cometida que militem contra ou a favor dele”[21].
Dizendo por outras palavras:
“[…] da conjugação dos princípios constitucionais da prossecução do interesse público e da proporcionalidade há de resultar que a pena disciplinar a aplicar […] seja sempre a “justa medida” reclamada para salvaguarda desse mesmo interesse público, o que necessariamente implicará que a sanção efetivamente aplicada ou a aplicar seja necessária a acautelar as exigências disciplinares do serviço, adequada a esse mesmo efeito e proporcional ou equilibrada face aos interesses em presença, […]Não obstante a Administração gozar de uma certa discricionariedade na eleição da pena a aplicar em concreto […], não se pode esquecer que os poderes discricionários conhecem limites, dados, justamente, entre outros, pelo princípio da proporcionalidade. Assim sendo, este princípio impede a livre discricionariedade da Administração para eleger a sanção, pelo que […] o exercício do poder disciplinar discricionário há de ser sempre objeto de uma “revisão” posterior por parte do tribunal, destinada a controlar a proporcionalidade da pena […]”[22] .
Ou, por outras palavras, ainda:
“O princípio da proporcionalidade é um “limite material à intervenção” sancionatória, um parâmetro essencial da juridicidade da aplicação de medidas sancionatórias, na determinação da necessidade e da escolha da sanção e da sua medida, mas também no âmbito do princípio da culpa, do princípio da tipicidade e da ilicitude. Estabelecida a relação entre os factos e os recortes qualificantes das normas, apurada a valoração reconducente dos factos a certa infração disciplinar e à sanção (abstrata) que lhe corresponde, impõe-se a determinação da concreta sanção a aplicar e ou da sanção e da sua medida. Também no Direito Disciplinar da função pública temos dois momentos, duas operações distintas. Há a proporcionalidade na subsunção: a adequação do preenchimento de conceitos indeterminados e de cláusulas gerais utilizados no recorte infracional não pode deixar de ser controlada: para cada infração a lei prevê uma determinada sanção e não a possibilidade de várias sanções para uma mesma infração. E, depois, também há a proporcionalidade no apuramento da concreta sanção. Situamo-nos aqui no plano da ponderação dos “interesses presentes no caso concreto”, da avaliação precisa dos factos, da natureza e gravidade da infração, do circunstancialismo em que foi cometida, da categoria do funcionário, da sua personalidade, do tempo de serviço ou antiguidade, da intensidade da culpa e da natureza do serviço”. [23].

4.6. De acordo com o labor dogmático e exegético que recaiu sobre este princípio, temos por assente que o princípio da proporcionalidade se desdobra em três subprincípios: o princípio da adequação, o princípio da necessidade e o princípio da proporcionalidade em sentido estrito.
O primeiro (adequação) impõe que as medidas adoptadas sejam aptas a realizar o fim ou fins que têm em vista alcançar. A actuação administrativa deve ser, assim, congruente com as circunstâncias do caso e os fins que a justificam, impondo-se uma avaliação causa-efeito entre, por um lado, o meio ou solução propostos, e, por outro, o objectivo a atingir. Os critérios da Administração Pública têm de ser possíveis de conduzir ao fim do acto, que, por seu turno, deve coincidir com o fim legal. Assim, quanto à primeira vertente, à questão que se impõe formular (“a medida em causa é apropriada ou adequada à prossecução do fim pretendido?”), a resposta deverá levar em conta que “[…] a medida restritiva só será liminarmente invalidada por inidoneidade ou inaptidão quando os seus efeitos sejam ou venham a revelar-se indiferentes, inócuos ou até negativos tomando como referência a aproximação do fim visado com a restrição […]”[24].
Por seu lado, o princípio da necessidade exige que se escolha, de entre todos os meios idóneos e de igual modo aptos a prosseguir o fim visado, aquele que produza um efeito menos restritivo. A medida administrativa deve ser necessária para o cumprimento dos fins que determinam a atuação pública, de tal sorte que a Administração só deve sacrificar o direito do particular quando tal se revele indispensável para a prossecução do interesse público. Está em causa aferir se existem, porventura, outras medidas idóneas que sejam menos lesivas dos vários interesses em presença. Destinado a detectar actuações excessivas, “[…] o princípio da proporcionalidade assume-se como um princípio comparativo, obrigando à realização de um confronto entre diferentes meios: entre o meio efetivamente utilizado e outros meios hipoteticamente disponíveis para alcançar o fim almejado pelo legislador (e constitucionalmente almejado). O problema agora não é tanto de eficácia do meio eleito pelo legislador como de eficiência ─ da sua eficiência comparada com outros meios, com outras soluções legais, com outras vias de abordar o mesmo problema” [25].
Por último, o princípio da proporcionalidade em sentido estrito proíbe a adopção de medidas excessivas ou desproporcionadas para alcançar os fins pretendidos. A actuação administrativa deve, nesta perspetiva, ser tomada na justa medida da situação carecida de resolução. A Administração deve pesar a relação entre os benefícios que vai obter para o interesse público e os prejuízos correlativos que vai impor ao particular, exigindo-se que se esteja perante um meio equilibrado. Este princípio põe em confronto os interesses perseguidos com a escolha do procedimento e os bens, interesses ou valores sacrificados por essa decisão, obrigando a verificar se o resultado obtido com a limitação de efeitos configura uma justa medida face ao sacrifício de interesses que a mesma implica. Meios e fim são, assim, “colocados em equação mediante um juízo de ponderação, a fim de se avaliar se o meio utilizado é ou não desproporcionado em relação ao fim”[26].
Tal implica o recurso a uma metodologia de ponderação de bens: de um lado, o bem jusfundamental que é objecto de restrição; do outro, o bem constitucional que dir-se-ia justificar essa mesma intervenção restritiva. Esta última vertente só se pode ter por violada se, colocado o julgador perante uma derradeira questão, se confronte com uma resposta necessariamente negativa.
Dizendo por outras palavras: o resultado obtido é proporcional à desvantagem que a medida adotada comporta?
Recuperando os ensinamentos da doutrina autorizada a que aludimos supra, trata-se agora de “apreciar o desvalor do sacrifício imposto […] quando comparado com o valor do bem que se pretende atingir. Assim, ao contrário do que acontecia nos controlos de idoneidade e de indispensabilidade - exclusivamente centrados na apreciação do meio e dando, à partida, como bom, ou pelo menos, inquestionável o fim visado -, na proporcionalidade faz-se necessariamente uma valoração das duas grandezas ou termos da relação em causa, apreciando-se a gravidade da restrição em associação à importância e imperatividade das razões que a justificam” [27].

4.7. Aqui chegados, e para que possamos apreciar e indagar da suposta violação do princípio da proporcionalidade, em qualquer das suas vertentes supra aludidas (adequação, necessidade e proporcionalidade stricto sensu), importa ter presente o fim visado com a sanção disciplinar.
Como tal, cumpre ler a decisão sindicada à luz das finalidades concretas, principal e acessórias, que presidem à censura disciplinar.
É sabido que a sanção disciplinar constitui uma admoestação formal ao trabalhador pelo seu incumprimento. O fim principal da sanção é, por conseguinte, interpelar o trabalhador, tendo em vista a que este não reitere a conduta censurada e actue no cumprimento dos deveres e obrigações laborais e funcionais que sobre si impendem.
Não se trata aqui, porém, de privilegiar em exclusivo (nem sobretudo) uma finalidade repressiva ou retributiva, em que avulte como principal escopo da sanção o de castigar o infractor. Ao invés, a censura disciplinar traduzirá essencialmente um meio de que a Administração Pública se serve para repor o equilíbrio do corpo social momentaneamente alterado pela violação de um ou mais deveres funcionais. Neste conspecto, as medidas disciplinares, indo ao encontro dessa necessidade de reequilíbrio, têm uma função essencialmente preventiva e educativa ([28]).
Assim, as medidas disciplinares visam a proteção da capacidade funcional da Administração e têm como principal finalidade a “prevenção especial ou correção, motivando o agente administrativo que praticou uma infração disciplinar para o cumprimento, no futuro, dos seus deveres, sendo as finalidades retributiva e de prevenção geral só secundária ou acessoriamente realizadas” ([29]).
Os fins essenciais são, portanto, o da prevenção especial, negativa e positiva.
Em suma: o que justifica a punição disciplinar, em primeira linha, é sobretudo o fim de prevenção especial. A aplicação de sanção disciplinar visa evitar que ocorra novo incumprimento de um concreto trabalhador - no limite, pondo termo à relação jurídica de emprego público ([30]). De facto, nalguns casos, a prevenção negativa não comporta senão a cessação da relação de trabalho, mediante a aplicação de sanção extintiva da relação jurídica de emprego. Assim se explica que seja ainda por apelo à finalidade de prevenção especial que as medidas expulsivas sejam aplicadas em caso de infração que inviabilize a manutenção da relação laboral e, portanto, naquelas situações em que o agente, pela sua conduta, mostrou não dar garantias de poder continuar a contribuir para assegurar a capacidade funcional da Administração.
Mas, logo a seguir podem ser apontadas outras finalidades, ainda que acessoriamente: a de reprovação e a de prevenção geral.
Na verdade, recuperando aqui os ensinamentos da doutrina da especialidade ([31]):
“A necessidade de punição não é indiferente ao efeito de interpelação e dissuasão geral (função de prevenção geral positiva e negativa): chama a atenção dos demais trabalhadores para o desvalor funcional da conduta do funcionário infrator, demovendo-os da prática de ilícitos disciplinares. […] Em segunda linha, [a sanção disciplinar] é um instrumento mediato de promoção da disciplina organizacional, ao reafirmar os deveres e obrigações de cujo cumprimento fundamentalmente depende. A confiança a recuperar não é, por vezes, apenas a do interlocutor disciplinar ou titular do respetivo poder (esta não é recuperável nas penas expulsivas), é também a confiança dos elementos da instituição no “acerto” da disciplina vigente (previsibilidade nas atuações futuras; efeito preventivo ou dissuasor da repetição da prática de infrações disciplinares) e, nalguns casos, a compreensão social ante os ecos do exercício da disciplina (inaceitabilidade dos “resultados” da não reação a ações ou omissões disciplinarmente censuráveis) […]”.

4.8. Das diversas sanções estatutariamente previstas (artigos 85.º e ss. do EMJ), in casu, cumpre analisar a aplicada ao autor – a pena de suspensão efectiva, por 90 (noventa) dias – e apurar se a mesma é manifestamente desadequada à gravidade dos factos praticados tal como assentes.
Neste conspecto, importa aqui ter presente que, após proposta pelo Sr. Inspetor, no Relatório Final, de aplicação ao autor, como reincidente, da pena de 90 (noventa) dias de suspensão de exercício de funções, para além da perda de vencimento e não contabilização de tempo de serviço (cinco dias), nos termos dos artigos, 10.º, n.º 6, e 74.º alínea c), do EMJ, por violação dos deveres de assiduidade, lealdade e de zelo, previstos nos artigo 7.º-A, n.º 1, 7.º-C, 10.º, n.ºs 1, 2 e 7 do EMJ, acolhida primeiramente na deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do Conselho Permanente do CSM realizada a 17.12.2020 [cf. pontos 13) e 14) do probatório], na deliberação impugnada  foi o seguinte [cf. ponto 17)] do probatório, que aqui se transcreve:
(…)
Resta, por fim, verificar se se deve manter o juízo concreto de gravidade do ilícito e da culpa do arguido e a medida concreta da sanção disciplinar de suspensão. O arguido expressamente invoca a violação do disposto no art. 84.º do EMJ, estando aqui em causa, especialmente o seguinte segmento desta norma: «na escolha e medida da sanção disciplinar a aplicar, o órgão decisor tem em conta todas as circunstâncias que, não estando contempladas no tipo de infração cometida, deponham a favor ou contra o arguido, nomeadamente».
E, aqui, discorda-se do juízo feito pelo relatório do Sr. Inspetor (secundado na deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM), que concluiu pela existência de uma ilicitude muito grave, com o seguinte fundamento: «O grau da ilicitude dos factos é algo elevado, uma vez que não se tratou de um episódio isolado, antes tendo ocorrido cinco situações de faltas, que geraram múltiplos adiamentos de diligências, com os inerentes transtornos para os intervenientes processuais que se deslocaram a Tribunal, sendo que se trataram de atrasos na sua extensão máxima, isto é atrasos que levaram à não realização das diligências.». Porém, na graduação da ilicitude de uma dada infração, ao abrigo do princípio da proibição de dupla valoração, não podem ser tomadas em consideração as circunstâncias concretas, na sua dimensão exata, que foram essenciais para o preenchimento do ilícito típico, como decorre do já citado art. 84.º do EMJ. Ora, o arguido não praticou uma infração disciplinar por se ter ausentado, sem justificação ou ilegitimamente, em cinco dias intercalados, do tribunal. Já se verificou que este comportamento, isoladamente ou globalmente considerado, não se integra nas alíneas dos arts. 83.º-G a 83.º-I do EMJ. Está aqui em causa a construção de uma infração disciplinar reiterada de execução sucessiva (interpolada) em que é a valoração global do comportamento do arguido, o qual, por força das suas características e circunstâncias concretas – combinação de faltas injustificadas e faltas justificadas com ausências ilegítimas por falta de comunicação prévia, com o recurso a pretextos e expedientes processuais para não se deslocar ao tribunal, com confusão de avisos e ordens a diferentes agentes do tribunal, gerando confusão, com falta a diligências marcadas e prejuízo para intervenientes processuais e adiamento de várias diligências – permite sustentar uma violação grave do dever de zelo e, consequentemente, o preenchimento da alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ. De outro modo, estaria em causa a mera ocorrência de duas faltas injustificadas e 3 dias de ausência ilegítima do tribunal, o que apenas permitiria concluir pela prática de cinco infrações disciplinares leves.
Por conseguinte, não poderão estas mesmas circunstâncias, que foram, como resulta do próprio relatório do Sr. Inspetor (aqui confirmado pela deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM), essenciais para o preenchimento do tipo de ilícito disciplinar constante da alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ, ser duplamente valoradas, agora para se concluir por uma ilicitude muito elevada no âmbito das graduações possíveis do leque de potenciais violações da alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ. Deverá, assim, conclui-se apenas por uma ilicitude mediana (bem como intensidade mediana na violação dos deveres de zelo e de assiduidade), mantendo-se, no restante, intactos os juízos relativos ao modo de execução e grau de culpa do agente.
Mantém-se também alterado o juízo agravado de censura, no que respeita à valoração da prevenção especial, pois o Sr. Juiz arguido foi condenado por factos ocorridos entre 17/09/2013 e 06/09/2017 na pena única de 180 dias de suspensão de exercício e transferência para tribunal diferente daquele em que exercia funções pela prática de uma infração disciplinar por violação grave dos deveres funcionais de prossecução do interesse público, de zelo e de assiduidade (por atrasos na prolação de decisões, atrasos em depósitos de sentenças, adiamentos injustificados e faltas injustificadas com inerente adiamento de diligências). De acordo com o constante no relatório do Sr. Inspetor, «passados cerca de três meses do regresso ao exercício de funções e depois de cerca de nove meses de ser punido voltou a incorrer em infrações disciplinares de idêntica e de similar natureza e revelando com a sua postura que a sanção anteriormente aplicada não alcançou suficiente advertência em termos do cometimento de novas infrações disciplinares, pelo que deve ser punido agravadamente nos termos do art. 86.° do Estatuto dos Magistrados Judiciais».
Deverá, portanto, manter-se a sanção disciplinar nos 90 dias de suspensão, uma vez que estamos perante uma moldura que vai dos 60 dias de suspensão aos 240 dias de suspensão, tendo esta assim já sido fixada muito perto do limite mínimo.
IV – Deliberação
Em face do exposto, delibera o Plenário do Conselho Superior da Magistratura, indeferir a impugnação administrativa, aplicando ao Senhor Juiz de Direito Dr. AA, por violação dos deveres de zelo e de assiduidade e pela prática da infração disciplinar prevista na alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a sanção disciplinar de 90 dias de suspensão. (sublinhados nossos).
(…)

4.9. Aqui chegados, podemos concluir que o acto impugnado observa o princípio da proporcionalidade.
Quanto à vertente do princípio da adequação, essa observância é inequívoca. Na verdade, sendo o propósito das medidas a prevenção de que o autor reiterasse o incumprimento dos deveres funcionais e ainda, acessoriamente, a defesa do prestígio do serviço público da Justiça, julgamos verificada uma relação de causalidade positiva entre o meio e o fim. Isto é, reconhecemos um grau sensível de capacidade dos meios (aplicação da pena aqui sindicada) para intervir na realidade jurídica e material no sentido de alcançar os fins propostos (prevenção especial e geral). Ou seja, as medidas utilizadas pela entidade demandada são aptas à salvaguarda dos fins visados.
Idêntico julgamento se deve ter por referência aos demais critérios que norteiam o princípio sub judicio: não só a sanção é necessária a tais desideratos, como o resultado obtido não é desproporcional à desvantagem que a medida adoptada, comporta.
Faz-se notar que a sanção tomou em devida linha de consideração i) a gravidade da censura de que o autor foi objeto, associada ii) à natureza e contexto das infrações e iii) ao facto de ser reincidente.
Subjacente à adopção da sanção aplicada, portanto, está um juízo de que as condutas apuradas são manifestamente ofensivas da função pública desempenhada pelo autor, bem como o de que o ora demandante agiu com grosseiro desinteresse pelos deveres profissionais.
Todas estas vicissitudes contribuíram para que a entidade demandada, em juízos de prognose em que não se vislumbra qualquer erro manifesto ou palmar, tivesse considerado: i) que o autor, pela sua conduta, mostrou não dar garantias de poder continuar a contribuir para assegurar a capacidade funcional da Administração da justiça no local onde desempenhava funções, pelo que a única forma de evitar novo incumprimento de deveres funcionais passava, não pela extinção do vínculo, mas pela aplicação de uma sanção com privação de exercício efectivo de funções (finalidade de prevenção especial); ii) que a gravidade das infrações merecia uma censura o mais candente possível dentro da moldura sancionatória aplicável, nomeadamente, através da manutenção do vínculo funcional, embora com restrição ao exercício efectivo de funções e da correspetiva percepção de remuneração por um período limitado de 90 dias (finalidade de repressão ou retribuição); e iii) que a confiança, quer dos demais elementos da instituição e da Administração da Justiça, por um lado, quer da própria comunidade em geral, por outro lado, apenas seria recuperada ou recuperável pelo exercício disciplinar que culminasse numa pena de suspensão (finalidade de prevenção geral).
Relembramos que apenas se pretende e pode sindicar, nesta fase, a dosimetria concreta da pena. E, face à ausência de qualquer erro manifesto na escolha da concreta medida da pena, nada podemos neste ponto estabelecer. Se ao Tribunal é possível analisar da existência material dos factos e averiguar se eles constituem infrações disciplinares, já não lhe compete apreciar a concreta medida da pena, salvo em caso de erro notório ou manifesto, o que não ocorreu no caso dos autos.
Assim, não viola o princípio da proporcionalidade a aplicação de pena de suspensão por 90 dias, que se mostra adequada e necessária à gravidade da conduta, aos deveres violados e ao grau de culpa revelado pelo autor da presente acção.
Por tudo o exposto, julga-se improcedente a pretensão do autor também com este fundamento.

5. Destarte,
Julga-se improcedente a impugnação deduzida pelo Sr. Juiz de Direito AA, contra a Deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura de 20 de abril de 2021, confirmando, em consequência, esta Deliberação.






III. DECISÃO

a) Por tudo o exposto, acordam os juízes que constituem a Secção do Contencioso deste Supremo Tribunal de Justiça, em julgar improcedente a impugnação deduzida, confirmando, em consequência, a Deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura de 20 de abril de 2021, tomada no âmbito do Processo Disciplinar n.º ...../PD/...10.
b) Custas a cargo do A., fixando-se a taxa de justiça em 6 UC (artigo 7.º, n.º 1, do RCP e Tabela I-A anexa).
c) Valor tributário: € 30.000,01 (artigo 34.º, n.º 2, do CPTA).

21 de Dezembro de 2021

Processado e revisto pela relatora, nos termos do disposto no artigo 94.º, n.º 2 do CPP.

Margarida Blasco (Relatora)

Maria Olinda Garcia, Ferreira Lopes, Fernando Samões, Catarina Serra, Conceição Gomes, Leonor Cruz Rodrigues (Adjuntos)

Maria dos Prazeres Beleza (Presidente)


______________________
[1] Hoc sensu, vide Rui Medeiros / Tiago Maceirinha, «Artigo 271.º», in AA.VV., Constituição Portuguesa Anotada, tomo iii, organização de Jorge Miranda / Rui Medeiros, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, p. 633; Pedro Fernández Sánchez, «Notas sobre o Enquadramento Constitucional do Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas», in AA.VV., O Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas, Advogados e Magistrados Judiciais, coord. de Pedro Fernández Sánchez / Luís M. Alves, edição do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados e da Editora da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, p. 8
[2] Acórdão do TC n.º 33/2002 de 21.01.2002.
[3] Inter alia, vide o Acórdão de 23.06.2016 (proc. n.º 134/15.7YFLSB), in http://www.dgsi.pt/jstj, cuja exposição aqui viemos seguindo de perto.
[4] Artigo 628.º do CPC, ex vi art. 4.º do CPP; Ac. STJ 11-03-2021, http://www.dgsi.pt
[5] Manuel Leal-Henriques / Manuel Simas Santos, Código Penal anotado, vol. ii, 3.ª ed., 2000, Lisboa, Rei dos Livros, p. 1544.
[6] Acórdão desta Secção de Contencioso de 04-07-2019, proc. n.º 39/18.0YFLSB; vide ainda o Acórdão do de 25-05-2016, proferido no processo n.º 55/14.0YFLSB, assim como, na jurisprudência mais recente, os acórdãos de 20-02-2019, processo n.º 68/18.3YFLSB, e de 24-10-2019, processo n.º 67/18.5YFLSB, ambos em www.dgsi.pt.
[7] Carlos Alberto Fernandes Cadilha, «A prova em contencioso administrativo», Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 69, 2008, Braga, Centro de Estudos Jurídicos do Minho, pp. 49 e 50.
[8] Carlos Medeiros de Carvalho, «O juiz administrativo e o controlo da prova procedimental no processo disciplinar», Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 101, 2013, Braga: Centro de Estudos Jurídicos do Minho, p. 29.
[9] Fernandes Cadilha, cit, pp. 50 e 53.
[10] Medeiros de Carvalho, cit, p 21.
[11] Seguiremos de perto a exposição que esta Secção de Contencioso tem vindo a efectuar com referência a este princípio de proporcionalidade (nomeadamente, os Acórdãos de STJ de 30.06.2020, proferidos nos processos que correram termos sob os n.ºs 3/20.9YFLSB e 46/19.5YFLSB, de 23.09.2020, no processo n.º  44/19.1YFLSB, a que fora apensado o processo n.º 54/19.6YFLSB, e de 16.12.2020, no processo n.º 11/20.0YFLSB, acessíveis em https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/). 
[12] Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, vol. ii, 10.ª ed., reimpressão, 2013, Almedina, pp. 818 a 820.
[13] Mário Esteves de Oliveira / Rodrigo Esteves de Oliveira, Código de Processo nos Tribunais Administrativos – volume i e Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, Almedina, 2006, pág.123.
[14] António Cadilha, «Os poderes de pronúncia jurisdicionais na ação de condenação à prática de ato devido e os limites funcionais da justiça administrativa», AA.VV., Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia. Volume ii, Coimbra, Coimbra Editora, 2010, pp. 167 e 168.
[15] Raquel Carvalho, Comentário ao Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2012, p. 131; Paulo Veiga e Moura / Cátia Arrimar, Comentários à Lei Geral do trabalho em Funções Públicas, 1.º volume, artigos 1.º a 240.º, 2014, Coimbra Editora, p. 597; aludindo a um «princípio de oportunidade temperado ou “discricionariedade vinculada”», vide Ana Fernanda Neves, O Direito Disciplinar da Função Pública, volume ii, 2007, dissertação de doutoramento, inédito, disponível e acessível para consulta online na presente data in https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/164/2/ulsd054618_td_vol_2.pdf, pp. 352 e passim.
[16] Ac. do STA de 08.06.2000, proc. n.º 41 879.
[17] Duarte Rodrigues da Silva, «Notas sobre o Contencioso Administrativo Disciplinar», in AA.VV., O Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas, Advogados e Magistrados Judiciais, coord. de Pedro Fernández Sánchez e Luís M. Alves, edição do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados e da Editora da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 2020, p. 71.
[18]  Maria Francisca Portocarrero, «Aferição judicial ab extra da legalidade do exercício administrativo discricionário», Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 66, 2007, Braga, Centro de Estudos Jurídicos do Minho, p. 34.
[19] Hoc sensu, vide, na doutrina, Mário Aroso de Almeida / Carlos Alberto Fernandes Cadilha (Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 4.ª edição revista, 2017, Coimbra, Almedina, pág. 490) e Mário Esteves de Oliveira / Rodrigo Esteves de Oliveira (op. cit., pág. 125).
[20] Vejam-se os Acórdãos de:
i.    12-12-2002 (processo n.º 4269/01), 27-10-2009 (processos n.ºs 21/09.8YFLSB e 364/09.0YFLSB), 16-11-2010 (processo n.º 451/09.5YFLSB), 16-12-2010 (processo n.º 9/10.6YFLSB), 15-12-2011 (proc. n.º 87/11.0YFLSB), 05-06-2012 (processo n.º 127/11.3YFLSB), 19-09-2012 (processo n.º 10/12.5YFLSB), 18-10-2012 (proc. n.º 125/11.7YFLSB), 21-11-2012 (processo n.º 66/12.0YFLSB), 11-12-2012 (processo n.º 61/12.0YFLSB), 20-03-2013 (proc. n.º 96/13.5YFLSB), 21-03-2013 (processo n.º 15/12.6YFLSB), 26-06-2013 (processos n.ºs 132/12.2YFLSB e 149/11.4YFLSB), 15-10-2013 (processos n.ºs 30/13.2YFLSB e 44/13.2YFLSB) [todos acessíveis em “Sumários do Contencioso”, em www.stj.pt];
ii.    26-02-2014 (proc. n.º 2/13.2YFLSB), 09-07-2014 (proc. n.º 57/13.4YFLSB), 16-12-2014 (proc. n.º 49/14.6YFLSB), 24-02-2015 (proc. n.º 50/14.0YFLSB), 22-02-2017 (processo n.º 10/16.6YFLSB), 30-03-2017 (processo n.º 73/16.4YFLSB), de 22-01-2019 (processos n.ºs 65/18.9YFLSB e 77/18.2YFLSB) e 10-12-2019 (processo n.º 2/19.3YFLSB), disponíveis em http://www.dgsi.pt/jstj;
iii.   30-06-2020 (processos n.ºs 3/20.9YFLSB e 46/19.5YFLSB) e 23-09-2020 (proc. n.º  44/19.1YFLSB, a que fora apensado o processo n.º 54/19.6YFLSB), e ainda de 16-12-2020, no processo n.º 11/20.0YFLSB acessíveis em https:// https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli
[21] Raquel Carvalho, op. cit., pp. 90 e 91.
[22] Veiga e Moura / Arrimar, op. cit., pág. 597.
[23] Ana Fernanda Neves, O Direito…, ii, cit., pp. 150 e 151, exposição posteriormente aprofundada a pp. 447 a 453.
[24] Jorge Reis Novais, Os Princípios Constitucionais Estruturantes da República Portuguesa, reimpressão, Coimbra, Coimbra Editora, 2011, p. 168.
[25] Jorge Miranda / Jorge Pereira da Silva, «Artigo 18.º», in AAVV, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo i, 2.ª edição, coordenação de Jorge Miranda / Rui Medeiros, 2010, pp. 374 e 375.
[26] José Joaquim Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª edição, 13.ª reimpressão, Coimbra, Almedina, 2013, p. 270.
[27] Reis Novais, op. cit., pág. 181.
[28] Manuel Leal-Henriques, Procedimento Disciplinar. Função pública. Outros Estatutos. Regime de Férias, Faltas e Licenças, 4.ª edição, 2002, Lisboa, Rei dos Livros, pp. 118-119.
[29] Luís Vasconcelos Abreu, Para o Estudo do Procedimento Disciplinar no Direito Administrativo Português Vigente: As Relações com o Processo Penal, Almedina, 1993, p. 43.
[30] Ana Fernanda Neves, Direito Disciplinar…, ii, cit., pp. 513-514.
[31] Idem, ibidem.