REGIME OS JOVENS ADULTOS
CO-AUTORIA
INDEMNIZAÇÃO
Sumário

A adolescência implica um padrão de redução transitória das características pessoais vantajosas, especialmente amabilidade e autodisciplina, a ponto de se caracterizar como uma "ruptura" temporária da personalidade, que evolui condicionada por uma intrincada mistura de factores genéticos e ambientais.

Se dos factos provados não resultam elementos que nos permitam concluir que não existem elementos que nos produzam sérias razões para crer, com razoabilidade, que a reintegração não seja facilitada mediante a aplicação do regime dos jovens delinquentes, ela deve ser aplicada em execução do princípio do in dubio pro reo.

Numa co-autoria o resultado danoso penalmente relevante, a qualquer título, é imputado a todos os co-autores.

Por força do disposto no artigo 513º do Código Civil) a solidariedade de devedores existe quando resulte da lei, sendo que nos termos do 497º/1, do CC se forem várias pessoas responsáveis pelos danos é solidária a sua responsabilidade.

Esta é uma norma imperativa, admitindo a lei, no entanto, que entre os responsáveis se possa vir a discutir, em sede de direito de regresso, a divisão de responsabilidades nos termos do nº 2 do artigo 497º/CC.

(Sumário elaborado pela relatora)

Texto Integral

Acordam os Juízes, em conferência, na 3ª Secção Criminal, deste Tribunal:


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I–Relatório:


Em processo comum, com intervenção do Tribunal colectivo, foram julgados os arguidos:
1º - MM______,  
2º - JS_____,  
3º - RA_____,
 
Foi proferida decisão nos seguintes termos:
1–Julgar extinto o procedimento criminal instaurado contra o arguido MM______ pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punível (p. e p.) pelo artigo 143º/1 do Código Penal (CP), em consequência da homologação da desistência de queixa apresentada.
2–Absolver o arguido MM______ da prática, em autoria material, de um crime de ameaça agravada, p. e p. pelos artigos 153º, n.º 1 e 155º, n.º 1, al. a), do CP.
3–Absolver o arguido MM______da prática, em co-autoria material, de dois crimes de ameaça agravada, ps. e ps. pelos artigos 153º, n.º 1 e 155º, n.º 1, al. a), do CP.
4–Absolver o arguido MM______da agravação prevista no n.º 4 do artigo 177º do CP.
5–Absolver o arguido MM______da prática de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143º, n.º 1 do CP.
6– Absolver o arguido MM______da prática, em autoria material, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86º, n.º 1, al. d) do NRJAM, aprovado pela Lei n.º 5/2006, de 23-02.
7–Absolver o arguido JS______da prática, em co-autoria material, de dois crimes de ameaça agravada, ps. e ps. pelos artigos 153º, n.º 1 e 155º, n.º 1, al. a), do CP.
8–Absolver o arguido JS______da prática, em co-autoria, de um crime de abuso sexual de criança agravado, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 171º, n.º 1 e 177º, n.º 4, do CP.
9–Absolver o arguido JS______da prática, em autoria material, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86º, n.º 1, als. c) e d) do NRJAM, aprovado pela Lei n.º 5/2006, de 23-02.
10–Absolver o arguido RA______da prática, em co-autoria material, de dois crimes de ameaça agravada, ps. e ps. pelos artigos 153º, n.º 1 e 155º, n.º 1, al. a), do CP.
11–Condenar o arguido MM______pela prática em concurso efectivo:
a)-em autoria material, de um crime de abuso sexual de criança, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 171º, n.º 1 do CP, na pena de um ano e dez meses de prisão;
b)-em co-autoria material de um crime de ofensa à integridade física grave qualificada, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 143º, n.º 1, 144º, al. b), e 145º, nºs 1, al. c) e 2, com referência ao artigo 132º, n.º 2, al. h) do CP, na pena de quatro anos e seis meses de prisão;
c)-em autoria material, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86º, n.º 1, al. c) do NRJAM, aprovado pela Lei n.º 5/2006, de 23-02, na redacção da Lei n.º 50/2019, de 24-07, na pena de um ano e seis meses de prisão.
12–Condenar o arguido MM______ na pena única de cinco anos e três meses de prisão.
13–Condenar o arguido JS______ pela prática, em co-autoria material de um crime de ofensa à integridade física grave qualificada, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 143º, n.º 1, 144º, al. b), e 145º, nºs 1, al. c) e 2, com referência ao artigo 132º, n.º 2, al. h) do CP, na pena de três anos e seis meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, a contar do trânsito em julgado da decisão, acompanhada de regime de prova, assente num plano de reinserção social a elaborar pelos serviços de reinserção social, com incidência na vertente da consolidação das competências pessoais e sociais.
14–Condenar o arguido RA_____ pela prática, em co-autoria material de um crime de ofensa à integridade física grave qualificada, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 143º, n.º 1, 144º, al. b), e 145º, nºs 1, al. c) e 2, com referência ao artigo 132º, n.º 2, al. h) do CP, na pena de três anos e dois meses de prisão suspensa na sua execução por igual período, a contar do trânsito em julgado da decisão, acompanhada de regime de prova, assente num plano de reinserção social a elaborar pelos serviços de reinserção social, com incidência na vertente da consolidação das competências pessoais e sociais.
15–Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante EM_____, e, em consequência, condenar os arguidos/demandados MM______e RA_____ solidariamente, a pagar ao demandante a quantia de dez mil euros, acrescida de juros desde a data da presente decisão, à taxa legal de 4% ou à taxa legal que vier a vigorar até integral pagamento, absolvendo os arguidos/demandados do remanescente peticionado.
16–Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido pela demandante AM_____  e, em consequência, condenar o arguido/demandado MM______ a pagar à demandante a quantia de dois mil euros, acrescida de juros desde a data da presente decisão, à taxa legal de 4% ou à taxa legal que vier a vigorar até integral pagamento, absolvendo o arguido/demandado do remanescente peticionado;
17–Absolver os arguidos/demandados JS______ e RA_____ do peticionando pela demandante AM_____.
18–Julgar procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido pela demandante E... Vila ... – Soc. G... E..., S.A. contra os arguidos/demandados MM_____ JS______ e RA_____ e, em consequência, condenar os arguidos/demandados solidariamente a pagar à demandante a quantia de seis mil quinhentos e oitenta euros e dezoito cêntimos, acrescida de juros de mora vencidos desde a data da notificação dos arguidos/demandados para contestar o pedido de indemnização civil, à taxa legal de 4%, ou à taxa legal que vier a vigorar até integral pagamento.

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A demandante E... Vila ... – Soc. G... E..., S.A., deduziu pedido de indemnização civil contra os três arguidos, peticionando a sua condenação no pagamento de seis mil quinhentos e oitenta euros e dezoito cêntimos, correspondente ao custo da assistência hospitalar prestada ao ofendido EM_____, na sequência das lesões sofridas em consequência da actuação dos arguidos, acrescida de juros, à taxa legal, até integral pagamento.
Os demandantes EM_____ e AM_____ deduziram pedido de indemnização civil contra os três arguidos peticionando a sua condenação no pagamento de mil euros, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência da sua actuação e no pagamento aos demandantes EM____ e AM____ das quantias, respectivamente, de dez e cinco mil euros, a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos, acrescida de juros, à taxa legal, desde a data da notificação para contestar até integral pagamento.
O arguido MM_____contestou, negando em termos globais a autoria dos factos.
Os arguidos JS_____ e RA_____ ofereceram o merecimento dos autos.

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II–Fundamentação de facto:

No acórdão recorrido foram considerados provados os seguintes os factos:

Da acusação:
1–AM_____ nasceu em 27 de Novembro de 2006, e é filha de _____, tendo os arguidos conhecimento da sua idade.
2– Em data não concretamente apurada, situada entre Junho e o final de Agosto de 2019, o arguido MM______encetou conversação através da rede social Facebook AM_____, que então residia em França, dizendo-lhe que queria ser seu namorado, mensagem a que a ofendida respondeu negativamente, tendo bloqueado o número do arguido.
3–No dia 27 de Março de 2020, a hora não concretamente apurada, anterior às 19h30m, AM_____ deslocou-se da sua residência sita em Vila ... ..., na companhia de SA______ para a residência da sua tia, sita nas proximidades.
4–Mais tarde, nesse dia, entre as 19h30m e as 20 horas, quando AM_____ regressava à sua residência, acompanhada de SA______ o arguido MM_____ dirigiu-se àquela, puxando-lhe o cabelo, e acto contínuo, colocou as suas mãos na zona dos seios e das nádegas de AM_____apertando-os, dizendo-lhe «vou-te trancar numa barraquinha para te abrir o furo».
5–Nessa altura, quando SA_____ disse ao arguido MM_____ para parar com a sua actuação, o arguido desferiu uma cabeçada em SA_____, causando-lhe dor.
6–Receosa, AM_____ abandonou o local, dirigindo-se para a sua residência, local onde deu conhecimento a EM_____  do sucedido.
7–No mesmo dia, cerca das 20 horas, após tomar conhecimento do ocorrido, EM_____  abordou os arguidos MM______, JS______ e RA_____  que se encontravam em V... F... X..., localizada nas imediações da sua residência, procurando perceber o motivo da conduta assumida pelo arguido MM_____.
8–Ali chegado, EM_____ dirigiu-se ao arguido MM______, dizendo-lhe «olha lá, não achas que a miúda é muito nova para ti?».
9–Nessa ocasião, sem que nada o fizesse prever, o arguido MM_____ dirigiu-se a EM_____, desferindo-lhe um murro que o atingiu na zona do lábio, causando-lhe dor e fazendo-o sangrar.
10–Acto contínuo, o arguido MM_____ envolveu-se num confronto físico com EM_____, que o agarrou de frente, tendo o arguido JS______surpreendido EM_____pelas costas, agarrando-o pelo pescoço, fazendo-lhe um «mata-leão», causando-lhe pela força imprimida e movimento realizado, dor no pescoço e na zona da omoplata esquerda.
11–Enquanto EM______ efectuava tentativas de se libertar e proteger-se dos actos de que era alvo, o arguido MM______, munido de uma faca borboleta, com cabo de cor amarela/dourada, desferiu pelo menos quatro golpes no corpo do ofendido, atingindo-o nas zonas da face posterior do hemitórax direito, hipocôndrio direito e região clavicular esquerda.
12–Na descrita ocasião, em conjugação de esforços com os arguidos MM_____ e JS______, o arguido RA_____ desferiu um pontapé no pé esquerdo do ofendido EM_____ , fazendo-o cair no solo, causando-lhe dores, provocando-lhe a luxação do cotovelo esquerdo.
13–No momento em que o ofendido EM_____  embateu no solo, o arguido MM_____ apanhou do solo a faca borboleta que deixou cair.
14–Quando o ofendido EM_____ se encontrava prostrado no solo, o arguido JS______ disse aos arguidos MM_____ e RA_____  «deixa-o que ele já está furado», momento em que os arguidos encetaram fuga do local.
15–Na sequência do sucedido, o ofendido EM_____  necessitou de receber tratamento médico no Hospital de Vila ... ..., onde ficou internado entre os dias 27 a 29 de Março de 2020, com necessidade de posterior acompanhamento em consultas de ortopedia.
16–Como consequência directa e necessária da conduta descrita e assumida pelos arguidos, o ofendido EM_____ sofreu dores nas zonas corporais atingidas, ferida perfurante abdominal, localizada na base do hemitorax direito (hipocôndrio direito, com atingimento dos planos até à costela); ferida perfurante da face posterior do hemitorax direito, profunda nos planos musculares; ferida perfurante ao nível da clavícula esquerda, atingindo o osso; ferida contusa da comissura labial direita; ferida do braço direito; e, deformação do cotovelo esquerdo (luxação), lesões que lhe causaram as seguintes sequelas:
Face: cicatriz nacarada pouco notável no terço direito da face inferior da região perioral, com cerca de 1 centímetro de comprimento.
Tórax: cicatriz hiperpigmentada no terço superior do hemitórax esquerdo, com 1 centímetro de comprimento, outra de idênticas características no terço superior direito do dorso, com 2 centímetros de comprimento.
Abdómen: cicatriz hiperpigmentada no hipocôndrio direito, com 3 centímetros de comprimento.
Membro superior direito: cicatriz hiperpigmentada na face externa do terço médio do braço, com 1 centímetro de comprimento.
Membro superior esquerdo: limitações de extensão do cotovelo em 20º.
17–Tais lesões determinaram ao ofendido EM_____  um período de 70 dias para a cura, com afectação da capacidade de trabalho geral e profissional por igual período.
18–Do evento resultaram ainda para o ofendido EM_____ consequências permanentes que se traduzem nas cicatrizes identificadas, e limitação de extensão do cotovelo esquerdo em 20º.
19–Em data não concretamente apurada, após 27 de Março de 2020, o arguido JS______ publicou na rede social Instagram uma fotografia com os dizeres «Cair levantar» e «E guerra q ez kre e guerra q ez teni», na qual surge retratado empunhando um objecto de características não concretamente apuradas, aparentando tratar-se de uma arma de fogo, juntamente com dois indivíduos do sexo masculino, um deles de identidade desconhecida, sendo que um dos indivíduos também exibe um objecto de características não concretamente apuradas, aparentando tratar-se de uma arma de fogo, fotografia que AM_____ viu.
20–AM_____ viu a fotografia referida em 19, sentindo receio.
21–No dia 3 de Setembro de 2020, o arguido MM______detinha na sua posse, no anexo/arrecadação da sua residência sita na Rua, em P..., Vila ... ..., uma pistola marca Reck, modelo P6E, 8 mm, sem carregador, com a inscrição 6.35, calibre 6,35 mm Browning, resultante da transformação artesanal das características originais da arma (calibre nominal 8 mm, destinado apenas a munições sem projéctil, nomeadamente de alarme e de gás lacrimogéneo), pela adaptação de um cano (estriado rudimentarmente), com a câmara redimensionada ao calibre 6,35 mm, apreendida no âmbito da busca domiciliária efectuada na referida data, no período compreendido entre as 07 horas e as 07h e 30m.
22–Os arguidos MM_____ JS______e RA_____ tinham perfeito conhecimento que a ofendida AM_____ tinha treze anos de idade, e que se encontrava a desenvolver a sua personalidade, nomeadamente na esfera sexual.
23–Ao actuar da forma descrita em 4 da factualidade provada, o arguido MM____ sabia ofender a integridade física de AM_____ e causar-lhe dor, ao puxar o cabelo da ofendida, sabia que ao proferir a expressão supra mencionada gerava na ofendida intranquilidade e receio de que se seguisse a prática de outros actos que atentassem contra a sua integridade física e liberdade e autodeterminação sexual, sabendo ainda que, ao agarrar os seios e nádegas de AM_____ contra a vontade desta, a ofendida não tinha, devido à sua idade, a capacidade e o discernimento necessários a uma livre decisão, pelo que com o descrito comportamento coarctava a sua liberdade e autodeterminação sexual, comprometendo o seu livre e saudável desenvolvimento, o que quis e efectivamente fez.
24–Ao actuarem da forma descrita em 11 a 16, os arguidos MM____ JS_____ e RA_____  agiram em comunhão de esforços e intentos, em execução de um plano a que todos livremente aderiram, com o propósito concretizado de molestar o corpo e a saúde do ofendido EM_____, e de lhe provocar dores e lesões corporais, como efectivamente provocaram, conhecendo a natureza cortoperfurante e contundente do objecto empunhado pelo arguido MM____ tendo plena consciência da sua capacidade de agressão e das lesões graves e irreversíveis que poderiam infligir no corpo do ofendido, ao atingi-lo, sem que nada o fizesse prever, com aquele objecto nas zonas da face posterior do hemitórax direito, hipocôndrio direito e região clavicular esquerda, não se coibindo os arguidos, ainda assim, de actuar da forma descrita, causando no ofendido as lesões e sequelas permanentes supra descritas, o que quiseram, valendo-se ainda da sua superioridade numérica, sabendo que dessa forma deixavam o ofendido indefeso perante as suas investidas, não tendo capacidade física para se defender dos actos que perpetraram, factos que tornaram mais censurável a sua actuação, que quiseram e efectivamente fizeram.
25–O arguido MM______conhecia ainda a natureza e características da faca borboleta e pistola supra referidos em 11 e 21, tendo agido com o propósito concretizado de ter em seu poder, na sua disponibilidade, e usar os mencionados objectos, sabendo que para tanto não estava autorizado, pois não os podia deter, transportar, nem trazer consigo, tendo perfeita consciência de que a sua posse e detenção naquelas circunstâncias lhe estava legalmente vedada, o que quis fazer e efectivamente fez.
26–Os arguidos MM_____, JS______ e RA_____agiram de forma livre, deliberada e consciente, sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei, e tinham a liberdade necessária para se determinarem de acordo com essa mesma avaliação.
Do pedido de indemnização civil deduzido pela demandante E... Vila ... – Soc. G... E..., S.A.:
27–A demandante, instituição hospitalar que tem por missão a prestação de cuidados de saúde, prestou cuidados assistenciais a EM_____, em 27 de Março de 2020, na sequência da agressão sofrida, infligida pelos arguidos/demandados MM_____ JS______ e RA_____  visando os cuidados médicos prestados o tratamento das lesões sofridas pelo ofendido em consequência directa e necessária da agressão de que foi vítima.
28–Os cuidados hospitalares prestados ao ofendido EM_____, tiveram um custo para a demandante no montante total de € 6.508,18, quantia não paga até à presente data.
Do pedido de indemnização civil deduzido pelos demandantes EM_____  e AM_____ :
29–Em consequência da conduta dos arguidos/demandados, o demandante EM_____ ficou sem trabalhar durante pelo menos setenta dias, ficando limitado em consequência das sequelas permanentes no exercício da actividade profissional de motorista, temendo pela vida e integridade física, sentindo dores e desgosto sempre que se olha ao espelho e vê as cicatrizes no seu corpo, não conseguindo descansar tranquilamente, tendo os factos ocorridos sido objecto de comentário no meio social onde reside, o que provocou desgosto e constrangimento no demandante, pelo confronto da sua imagem perante os familiares e amigos, fazendo com que o mesmo se isolasse mais em casa, sobretudo nos primeiros seis meses que se seguiram aos factos.
30–Em consequência da conduta do arguido/demandado MM____ a demandante AM_____ sentiu-se perturbada psicologicamente, isolando-se em casa, principalmente nos primeiros seis meses que se seguiram aos factos, interiorizando como sua a culpa pelo ocorrido no dia 27-03-2020 após os factos de que foi vítima, sentindo desgosto e constrangimento pelo confronto da sua imagem perante os familiares e amigos, dado os factos ocorridos terem sido objecto de comentário no meio social onde reside, incluindo o meio escolar, sentindo ansiedade e receio que o ocorrido pudesse novamente suceder, não conseguindo descansar tranquilamente, o que prejudicou o desenvolvimento da sua personalidade, necessitando de acompanhamento psicológico, estando a ser acompanhada em consulta de psicologia desde 01-04-2020.

Mais se provou:
31–O arguido MM______ é o terceiro filho de uma fratria de cinco irmãos, fruto do relacionamento instável entre os progenitores, ambos toxicodependentes, o que motivou que fosse confiado à guarda dos avós maternos com meses de idade, que procuraram colmatar a ausência dos pais biológicos, mantendo com os netos uma dinâmica relacional afectiva e estável.
32–Quando o arguido tinha dez anos de idade a progenitora, numa situação de abstinência de consumos, integrou o arguido no novo contexto familiar constituído com outro companheiro e os filhos mais velhos, mantendo o arguido contactos e uma relação de proximidade com os avós residentes na mesma cidade.
33–A nível escolar revelou precocemente desinteresse pelos estudos, tendo frequentado os quatro primeiros anos de escolaridade de forma relativamente regular. As dificuldades surgiram a partir do segundo ciclo, na época que transitou para o agregado da progenitora, e constituiu uma nova rede relacional, registando nesse período uma conduta conflituosa com os pares, em contexto escolar, para além de dificuldades de aprendizagem e um elevado nível de absentismo, os quais contribuíram para diversas reprovações durante o 5º ano de escolaridade.
34–O arguido só concluiu o 5º e 6º ano de escolaridade a partir dos dezasseis anos, integrado no Programa Integrado de Educação e Formação, tendo abandonado definitivamente a escola com dezoito anos de idade. Posteriormente tentou habilitar-se com o 9º ano de escolaridade, através de uma acção formativa, que abandonou por elevado absentismo.
35–Na fase da adolescência o arguido revelou grande permeabilidade aos pares locais e passou a assumir conjuntamente com estes atitudes de confrontação e irreverência face às autoridades policiais, e a participar em comportamentos associados sobretudo a contendas com grupos rivais, postura agravada pelos consumos de haxixe e álcool que não se verificavam em contexto familiar, não se mostrando o arguido disponível para um tratamento dirigido à problemática aditiva, tendo o agravamento destas condutas levado a que o agregado optasse pelo regresso do arguido à morada e família da avó, aos dezanove anos de idade.
36–À data dos factos o arguido vivia junto da avó materna e de uma irmã, existindo entre os membros do agregado boas relações familiares, ainda que, da parte da família, uma fraca capacidade de orientação e contenção do arguido.
37–O arguido trabalhava de forma irregular em empregos temporários e indiferenciados na área da construção civil, armazém e reparação de motorizadas, mostrando algum dinamismo e empenhamento nos trabalhos em que se envolvia. A baixa escolarização foi, contudo ,um dos factores que contribuiu para a instabilidade laboral que caracterizou o seu percurso de trabalho, limitando ao longo dos anos uma maior fixação a um emprego.
38–O arguido ajudava economicamente a família e particularmente a progenitora, que por motivos de saúde deixou de poder trabalhar regularmente.
39–No Estabelecimento Prisional o arguido tem mantido uma conduta ajustada aos normativos institucionais e sem averbamentos disciplinares, contando com apoio familiar consistente por parte da família, progenitora, padrasto e irmãos, que estão disponíveis para o acolher em liberdade.
40–De acordo com o relatório social trata-se de um arguido que «apresenta aparentemente uma conduta ajustada em contexto familiar e laboral, mas comportamentos de risco e desafiadores da autoridade quando se associa a pares pró criminais, agravados por consumos de álcool e drogas.
A situação de reclusão permitiu interromper os laços com grupos de referência e os consumos excessivos de álcool, possibilitando por parte do arguido uma maior reflexão crítica sobre a sua conduta e definição de estratégias mais ajustadas para o futuro, que passam pela inserção no agregado materno, com afastamento das amizades e investimento num projecto laboral.».

41–O arguido MM______ averba no certificado de registo criminal as seguintes condenações transitadas em julgado:
a)-pela prática em 23-10-2019 de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo art. 3º, n.º 1 do DL n.º 2/98, de 03-01, a pena de 50 dias de multa, à razão diária de € 5,25, substituída por 33 dias de prisão subsidiária, declarada extinta pelo pagamento da multa. – (sentença proferida em 04-11-2019, nos autos de Processo Sumário n.º 779/19.6PAVFX, do Juízo Local Criminal de Vila Franca de Xira, transitada em julgado em 04-12-2019).
b)-pela prática em 28-01-2020 de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punido pelo art. 3º, nºs. 1 e 2 do DL n.º 2/98, de 03-01, a pena de 110 dias de multa, à razão diária de € 5,00. – (sentença proferida em 02-03-2020, nos autos de Processo Sumário n.º 68/20.3GFVFX, do Juízo Local Criminal de Vila Franca de Xira, transitada em julgado em 26-06-2020).
c)-pela prática em 26-06-2018 de um crime de roubo, previsto e punido pelo art. 210º, n.º 1 do Código Penal, a pena de 1 ano e 2 meses de prisão, suspensa na execução por igual período, acompanhada de regime de prova. – (acórdão proferido em 23-07-2020, nos autos de Processo Comum n.º 409/19.6GHVFX, do Juízo Central Criminal de Loures, transitado em julgado em 24-08-2020).

42–O processo de desenvolvimento do arguido JS______ decorreu em Vila ... ..., no Bº. P..., inserido no núcleo familiar de origem, constituído pelos progenitores, avó paterna e duas irmãs, tendo ainda o arguido uma irmã mais velha que nunca esteve inserida no agregado materno, sendo a dinâmica relacional funcional, e o quadro material relativamente satisfatório perante as despesas quotidianas, alicerçado no salário do progenitor como operário fabril.
43–No plano escolar o arguido não apresentou aptidão ou motivação pela aprendizagem, estando habilitado com o 5º ano de escolaridade, tendo averbado várias retenções escolares, sendo o seu percurso escolar caracterizado por conflitualidade registada essencialmente com outros estudantes.
44–Com cerca de dezassete anos de idade, após o progenitor ter sofrido um acidente de trabalho que lhe determinou a interrupção do percurso laboral, o arguido abandonou a aprendizagem, enveredando pelo ingresso no mercado de trabalho.
45–Nessa altura o arguido ingressou na empresa “Italagro” onde permaneceu durante duas campanhas agrícolas de recolha e processamento de tomate. Com dezanove anos de idade emigrou para Inglaterra, onde permaneceu durante alguns meses, tendo estado inserido também numa empresa agrícola.
46–Após o regresso a Portugal o arguido reingressou no agregado familiar de origem, residente numa habitação camarária, trabalhando desde há alguns meses como servente na área da construção civil, auferindo € 40,00 diários.
47– O arguido é praticante de futsal numa colectividade da sua zona de inserção, revelando algum empenho nesta actividade desportiva.
48–De acordo com o relatório social, o arguido denota «aparentemente alguma capacidade crítica e de descentração para avaliar em abstracto os seus actos.».
49–Do certificado de registo criminal do arguido JS_____ nada consta.
50–O processo de desenvolvimento do arguido RA_____ decorreu no agregado familiar de origem, de características socioeconómicas medianas, constituído pelos progenitores e três irmãos mais velhos, sendo a dinâmica familiar funcional, realçando a preocupação dos progenitores em assegurar a satisfação das necessidades básicas do agregado e em garantir um ambiente integrador, de acordo com as regras e normas socialmente adequadas.
51–Ao nível do percurso escolar, o arguido logo no primeiro ciclo registou uma reprovação no 1º ano e duas no 3º ano, registando mais duas reprovações no 5º ano e uma no 6º ano, tendo o mesmo desinteresse pelos estudos, associado a um elevado absentismo escolar. Face ao seu percurso escolar, o arguido acabou por ser encaminhado para um curso PIEF na escola EB 2 3 de V..., onde se encontra actualmente, mas que pretende abandonar logo que complete os dezoito anos de idade.
52–É no contexto escolar que surgem os primeiros contactos com o sistema da Justiça, vindo o mesmo a ser alvo de dois processos tutelares educativos, que não reflectem na totalidade a relação do arguido com os agentes educativos (tanto professores como auxiliares), com quem mantém uma relação adequada.
53–De acordo com o relatório social «No plano pessoal, o arguido revelou capacidades próprias para a sua idade face a uma reflexão sobre os assuntos e elaborar sobre os mesmos uma opinião. (...)
Face à presente situação jurídica, revela moderada capacidade crítica face ao bem jurídico em causa (...)».
54–Do certificado de registo criminal do arguido RA_____ nada consta.

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Factos não provados:

Não se provou que:
1–Que aquando do referido em 2 da factualidade provada o arguido MM_____tenha ainda dito a AM_____«quando te apanhar vou-te abrir o furo».
2–Que em datas e números de vezes não concretamente apurados, no período compreendido entre Setembro de 2019 e 27 de Março de 2020, os arguidos JS______ e RA_____  quando se cruzaram com AM_____ na via pública, tenham dirigido a esta as seguintes expressões «um dia vamos-te trancar em casa e abrir-te o furo», sabendo que ao dirigir a AM_____ tais expressões, criavam a aparência de que podiam concretizar o que diziam, gerando em AM_____ intranquilidade e receio de que se seguisse a prática de actos que atentavam contra a sua integridade física e liberdade e autodeterminação sexual, o que quiseram e conseguiram.
3–Que para além do referido em 4 da factualidade provada, noutras ocasiões, no período compreendido entre Setembro de 2019 e 26 de Março de 2020, o arguido MM______ quando se cruzou com AM_____ na via pública, tenha dirigido a esta as seguintes expressões «um dia vamos-te trancar em casa e abrir-te o furo».
4–Que aquando do referido em 3 da factualidade provada, o arguido JS_____ se tenha abeirado de AM_____e sem que nada o fizesse prever, tenha colocado a sua mão no seio desta, apertando-o.
5–Que aquando do referido em 4 da factualidade provada, os arguidos JS_____ e RA_____ se tenham dirigido a AM_____; e que o arguido JS_____ tenha colocado também a sua mão na zona nadegueira de AM_____apertando-a.
5–Que o arguido JS______ ao agarrar os seios e nádegas de AM_____, tenha actuado ciente que AM_____ não tinha, devido à sua idade, a capacidade e o discernimento necessários a uma livre decisão, pelo que, com o descrito comportamento coarctava a sua liberdade e autodeterminação sexual, e comprometia o seu livre e saudável desenvolvimento.
11–Que aquando do referido em 11 da factualidade provada, o arguido JS______ estivesse munido de um objecto de natureza cortoperfurante e contundente de características não concretamente apuradas; e que tenha desferido golpes com tal objecto no corpo do ofendido EM_____, conhecendo as características de tal objecto, agindo com intenção de o ter em seu poder, e na sua disponibilidade, e de usar tal objecto, sabendo que para tanto não estava autorizado, pois não o podia deter, transportar, nem trazer consigo, tendo perfeita consciência de que a sua posse e detenção naquelas circunstâncias lhe estava legalmente vedada.
12–Que para além do referido em 12 da factualidade provada, o arguido RA_____ tenha desferido outros pontapés no corpo de EM_____.
13–Que o arguido JS______tenha enviado a fotografia referida em 19 da factualidade provada para o perfil pertença de  .
14–Que ao ver a fotografia referida em 19 da factualidade provada, tenha sentido receio, fazendo-o temer o comportamento dos arguidos.
15–Que o arguido JS_____tenha dirigido as expressões mencionadas em 19 da factualidade provada a AM_____ e a EM_____, criando a aparência que podia concretizar o que dizia, sabendo que gerava naqueles intranquilidade e receio de que se seguisse a prática de actos que atentassem contra as suas vidas, o que quis e logrou fazer.
16–Que após os factos ocorridos em 27 de Março de 2020, em data e número de vezes não concretamente apurados, quando se cruzaram com EM_____ na via pública, os arguidos MM_____ JS______ e RA_____ lhe tenham dirigido as seguintes expressões, «isto não fica assim», e «desta vez foi com a faca, a próxima vai ser com chumbo», e que os arguidos o tenham feito criando a aparência de que podiam concretizar o que diziam, sabendo que geravam em EM_____  intranquilidade e receio de que se seguisse a prática de actos que atentassem contra a sua vida, o que quiseram e lograram fazer.

***

IIII–Fundamentação probatória:

O Tribunal a quo justificou a aquisição probatória nos seguintes termos:
A convicção do Tribunal para o apuramento dos factos provados fundamentou-se na análise conjugada e crítica:
1 - das declarações do arguido MM_____.
Em termos globais, o arguido negou a autoria dos factos imputados na acusação, designadamente no que respeita ao comportamento ilícito criminal de que foi vítima AM_____  que admitiu conhecer por esta morar no Bº. P..., negando que quando a mesma residiu em França tenha encetado conversação com a menor, dizendo-lhe que queria ser seu namorado, negando igualmente que no dia 27-03-2020 tenha puxado o cabelo de AM_____e que tenha colocado as mãos nos seios e nádegas da menor, no que foi contrariado pelas declarações convictas e consistentes da declarante AM_____nos termos infra mencionados.
Não obstante, admitiu que na data em questão encontrava-se na rua, junto à residência de TT____, prima de AM_____acompanhado dos arguidos JS_____ e RA_____ quando a menor passou no local acompanhada de SA______ tendo chamado SA_____ à parte, tendo-o confrontado com o facto de duas semanas antes o ter visto a levar uma bicicleta pertencente ao pai do arguido JS_____, tendo desferido uma cabeçada em SA_____.
Confrontado com os factos imputados na acusação, de que foi vítima EM_____, pai de AM_____referiu que no mesmo dia, já depois do ocorrido com SA_____, o declarante e os co-arguidos cruzaram-se com EM_____, quando se encontravam perto da paragem de autocarro, indo os co-arguidos com o declarante à Esquadra da P.S.P., onde estava a cumprir a medida de coacção de obrigação de apresentação periódica, três vezes por semana, encontrando-se SA_____ e DM_____ a cerca de cinco a seis metros de distância.
Referiu que ouviu EM______dirigir-se aos co-arguidos, perguntando pelo declarante; e que, quando olhou para o lado aquele desferiu um murro que o atingiu junto ao olho direito.
Nessa altura o demandante EM______empunhou uma navalha, ponta e mola, não se recordando se a lâmina estava visível, e ao ver a navalha assustou-se, recuou, tirou uma navalha que trazia consigo no bolso da frente das calças, que após os factos atirou para o local visível na fotografia de fls. 216, admitindo que abriu a navalha e que, encontrando-se de pé, de frente para EM______, desferiu um primeiro golpe, de cima para baixo, que atingiu o demandante no braço, um segundo golpe que atingiu o demandante na zona do abdómen, e um terceiro golpe, não se recordando a zona do corpo do demandante atingida pelo mesmo.
Referiu que depois de desferir os golpes que atingiram o demandante, o arguido JS_____ agarrou EM_____ por trás, fazendo-lhe uma «gravata», e que nessa altura o arguido RA_____ desferiu dois pontapés no demandante, provocando a queda deste, tendo o demandante caído, quase sentado, amparado pelo braço esquerdo.
Nessa altura a ponta e mola que o demandante empunhava caiu, tendo EM_____  agarrado na mesma, colocando-a na bolsa que trazia à cintura, tendo ido para o passeio onde se encontrava o cônjuge.
Não viu o demandante sangrar, tendo encontrado o mesmo no hospital, onde se deslocou dado ter sofrido um corte na mão, admitindo que tal corte tenha sido provocado ao golpear com força EM_____, referindo ainda que foi no caminho para o hospital que se desfez da navalha que utilizou.
Confrontado com a matéria imputada no ponto 17 da acusação, mencionou que não ouviu o arguido JS_____ proferir a referida expressão.
Após a ocorrência dos factos apenas se cruzou com o demandante quando passava sozinho de bicicleta, referindo que queria pedir-lhe desculpa, não o tendo feito dado ter receio da reacção do demandante.
Confrontado com a matéria imputada no ponto 25 da acusação, admitiu que tinha na sua posse a arma transformada apreendida, mencionando que a encontrou no mato, detendo a referida arma de fogo desde Fevereiro de 2020, encontrando-se a pistola ao lado dos azulejos, no local visível nas fotografias de fls. 212-213.
As declarações prestadas pelo arguido na parte em que negou a autoria dos factos imputados de que foi vítima AM_____e quanto à cronologia e dinâmica dos acontecimentos ocorridos no dia 27-03-2020, de que foi vítima EM_____ , designadamente quando à justificação dada para a actuação que reconheceu como impulsiva, mencionando que teve medo de ser esfaqueado pelo demandante, foi contrariada pelas declarações coerentes e consistentes dos demandantes AM_____ e EM______, nos termos infra mencionados.
2- das declarações do arguido JS______.
No essencial mencionou que conheceu o arguido RA_____ em 2015-2016, conhecendo o arguido MM_____ desde a infância de ambos, conhecendo igualmente a ofendida AM_____ do Bº. P... .
Referiu que nunca contactou com AM_____ através das redes sociais.
Na data em que os factos ocorreram – 27-03-2020 – estava com os co-arguidos quando viram a menor AM_____ acompanhada de SA_____, tendo comentado com o arguido MM_____ que cerca de duas semanas antes o pai tinha-lhe dito que deu por falta de uma bicicleta, ouvindo dizer que tinha sido levada por SA_____ e por DE_____.
Mencionou que o arguido MM_____ decidiu confrontar SA_____ com a situação da bicicleta, tendo visto aquele desferir uma cabeçada em SA_____, que se queixou; e que, enquanto tal ocorria, AM_____ ficou a conversar com AE_____ e TT_____ que estavam à janela.
Confrontado com os factos imputados na acusação, ocorridos posteriormente, de que foi vítima EM______, mencionou que o demandante dirigiu-se ao arguido MM_____ dizendo-lhe «agora pensas que és o rei disto tudo», tendo desferido um murro que atingiu o arguido.
Nessa altura viu EM_______com uma ponta e mola na mão direita, tendo a faca caído quando desferiu o murro, apanhando-a de seguida, tendo o arguido MM_____ recuado, retirando uma faca de abertura manual, que agarrou com a mão direita, «embrulhando-se os dois», pensando que o arguido MM_____ estava a atingir EM_____ com socos, admitindo que agarrou o demandante, puxando-o para trás com força, tendo EM_____ caído, momento em que o demandante tentou agarrar a ponta e mola, tendo o arguido RA_____ desferido um pontapé na perna direita do demandante.
Confrontado com a matéria imputada no ponto 17 da acusação, admitiu a mesma, referindo que proferiu a expressão mencionada dado ter visto a mão de MM_____com sangue, pensando que o sangue era do demandante EM_____, que saiu do local pelos próprios meios.
Questionado a respeito da matéria imputada no ponto 22 da acusação, e confrontado com a fotografia de fls. 66, mencionou que publicou a mesma com os dizeres indicados na acusação, no Instagram, no perfil público, não tendo enviado a mesma para AM_____não tendo nesta parte as declarações do arguido sido infirmadas por qualquer elemento probatório produzido ou examinado em audiência de julgamento.
Quanto aos factos constantes do ponto 24 da acusação, negou a autoria dos mesmos, referindo que não dirigiu mais a palavra ao demandante EM_____.
3– das declarações do demandante EM_____, pai da demandante AM_____.
No essencial mencionou que conhecia os arguidos do Bairro, nunca tendo tido desavenças com os mesmos; e que, em 2019 residiram em França, tendo regressado no dia 01-09-2019.
Quando residia com o agregado em França, a sua filha AM_____ mostrou-lhe uma mensagem do arguido MM_____, dizendo que queria 25 namorar com a menor, tendo dito à sua filha para bloquear o contacto, o que a mesma fez na presença do declarante, nada mais tendo acontecido entre Setembro de 2019 e Março de 2020.
De forma coerente, espontânea e consistente, descreveu então a cronologia e dinâmica dos acontecimentos ocorridos no dia 27-03-2020, referindo que cerca das 19 horas estava em casa, a preparar o jantar, tendo o cônjuge do declarante pedido a AM_____ para ir a casa da tia buscar um comprimido para as dores de cabeça, não se apercebendo se a menor foi sozinha.
Quando AM_____ chegou foi a correr para a casa-de-banho, onde ficou cerca de 15 a 20 minutos, saindo em pânico, a chorar, dizendo que os arguidos MM_____ e JS______a tinham apalpado no rabo e nos seios.
Foi à janela da cozinha, tendo visto os arguidos junto a um muro a cerca de 200 metros de distância, tendo decidido ir falar com os mesmos, sobre o ocorrido com a sua filha, referindo de forma convicta que não levou nenhuma arma branca, e que não tinha conhecimento de qualquer situação relacionada com o furto de uma bicicleta.
Quando chegou junto dos arguidos, abordou o arguido MM______, proferindo a expressão mencionada no ponto 11 da acusação, referindo que o arguido riu-se, olhou para o lado e desferiu um murro que atingiu o declarante no lábio.
Nessa altura o declarante e o arguido MM_____ agarraram-se frente a frente, sentindo algo a atingi-lo com força, pensando que estava a ser atingido pelo arguido MM_____ com murros.
Entretanto o arguido JS_____nas costas do declarante fez um «mata-leão», tendo recuado, embatendo no muro, tendo o arguido RA_____ desferido um pontapé que atingiu o declarante no pé esquerdo, caindo para o cão, deslocando o cotovelo.
Nessa altura apercebeu-se de cair no solo uma faca borboleta, ouvindo o arguido JS_____ proferir a expressão mencionada no ponto 17 da acusação, «deixa, deixa, já está furado», tendo os arguidos passado para o outro lado da rua.
Sentiu o braço deslocado, dirigindo-se para casa, vendo o seu irmão e a sua mulher a descer a rua na direcção do declarante, apercebendo-se que a camisola que vestia estava furada.
Referiu que decidiu deslocar-se ao hospital devido às dores que sentia no braço, sendo o seu irmão que conduziu o veículo, tendo no caminho começado a sentir humidade na zona do abdómen, tendo encontrado o arguido MM_____ no hospital quando este estava a fazer a triagem, não tendo ouvido nenhum dos arguidos proferir a expressão mencionada no ponto 24 da acusação.
Confrontado com a matéria constante do ponto 22 da acusação referiu que foi a sua filha AM_____ que lhe mostrou a imagem que estava no perfil público do Instagram.
Mencionou que após a ocorrência dos factos notou alterações no comportamento de AM_____sentindo a sua filha mais preocupada, não saindo à rua sozinha, tendo a menor acompanhamento psicológico semanal desde 01-04-2020, e que, a menor durante cerca de seis meses teve receio de ir à escola, sendo o declarante que a acompanhava.
Descreveu ainda as lesões sofridas e as sequelas decorrentes da mesma, referindo que trabalha como motorista, e que a perda de força muscular no braço esquerdo dificulta o trabalho do demandante, nomeadamente no manuseamento de paletes.
4– das declarações da demandante AM_____ ofendida nos autos, ouvida em declarações para memória futura (encontrando-se a respectiva transcrição a fls. 462 a 501 dos presentes autos), bem como em declarações complementares prestadas em audiência de julgamento.
Das declarações da demandante resulta um relato objectivo, convicto e coerente sobre a ocorrência dos factos relacionados com a actuação do arguido MM_____, de que foi vítima em 27-03-2020, nos termos que resultaram provados.
Tal consistência no relato convicto efectuado pela mesma, sem quaisquer indícios de fabulação ou de instrumentalização quanto à ocorrência dos factos, resulta inclusivamente da circunstância da menor ter descrito a actuação do arguido MM_____nos precisos termos em que se recordava, não procurando construir factos para colmatar quaisquer lacunas ao nível da memória, mencionando expressamente que apenas o arguido MM_____ praticou os factos de que foi vítima, não tendo o arguido JS_____ praticado quaisquer factos contra a mesma.
Assim, mencionou que conhecia os arguidos do Bairro, sabendo os mesmos a idade da declarante, dado que a viram crescer na mesma zona.
Referiu que depois de regressar de França foi morar para a habitação onde reside, onde vive também o tio Miguel ..., tendo a sua tia Marta ... e a prima TT_____ deixado de frequentar a sua casa.
Confrontada com os depoimentos das mesmas, bem como com o depoimento de SA_____, mencionou que era amiga deste, tendo estado com o menor em casa da sua tia, negando que o mesmo frequentasse a casa da declarante, e que a sua mãe o ajudasse com comida, referindo que não conhecia DM_____.
A respeito dos factos ocorridos no dia 27-03-2020 referiu que a sua mãe pediu-lhe para ir a casa da tia Sofia ... buscar um comprimido para a dor de cabeça, tendo encontrado no caminho para casa da tia SA_____, que a acompanhou, e no regresso passou pelo prédio onde morava a sua prima TT_____, que estava à janela com AE_____.
Quando passou já se encontravam no local os arguidos, que a injuriaram, continuando a andar, apercebendo-se que o arguido MM_____ ia atrás de si, tendo olhado para trás, e de seguida o arguido MM_____ puxou-lhe com força o cabelo, sentindo dor, recuando, tendo o mesmo colocado as duas mãos nos seios de declarante, agarrando-os e apertando-os, empurrando-a contra ele, colocando as mãos nas nádegas da declarante, apalpando-a por cima da roupa, mencionando expressamente que «sentiu nojo do apalpão», dizendo-lhe na mesma ocasião o arguido MM_____ «vou-te trancar numa barraquinha para te abrir o furo», frase que o arguido apenas lhe disse nesse dia, levando a sério a expressão proferida pelo arguido, mencionando que enquanto decorria a actuação do arguido, os arguidos JS______e RA_____ estavam distantes, não tendo proferido qualquer expressão tendo a declarante como destinatária.
Referiu que devido à actuação do arguido MM_____, quando chegou a casa foi fechou-se na casa-de-banho, tendo o pai perguntado o que se tinha passado, contando-lhe o sucedido, tendo o pai dito à declarante que ia falar com os arguidos, tendo saído de casa não levando consigo qualquer objecto cortante.
Descreveu ainda as sequelas que sentiu em consequência do ocorrido, referindo que tem medo de andar na rua, saindo apenas acompanhada dos pais e do seu namorado, tendo deixado de se vestir como se vestia anteriormente, procurando ocultar o corpo, referindo que quando se sente mais nervosa, o lado esquerdo do seu corpo incha, tomando medicação para o inchaço; que sente tristeza dado o facto de os seus amigos terem deixado de lhe falar, dizendo que era mentirosa, «por acreditarem mais nas notícias do que em si», tendo acompanhamento psicológico semanal.
Confrontada com as fotografias cuja junção foi admitida por despacho proferido em acta, juntas com o requerimento Refª 39197917, referiu que a primeira fotografia foi tirada quando tinha onze ou doze anos, tendo-a publicado em 29-07-2020; na fotografia publicada em 22-03-2021 está com o namorado, sendo na altura da foto apenas amigos; a fotografia publicada em 10-08-2020 foi tirada em Junho de 2018 quando a sua tia Marta ... veio a Portugal, e as duas últimas fotografias (a primeira à bebida que os pais estavam a beber) foram tiradas no dia 09-06-2021, na piscina de casa do seu primo.
5– do depoimento da testemunha, cunhada do demandante EM_____  e tia da demandante AM_____.
No essencial mencionou que no dia 27-03-2020 AM_____ deslocou-se a casa da depoente, cerca das 19 horas, para ir buscar comprimidos para as dores de cabeça, tendo cerca de 30 minutos depois a sua irmã Tatiana ... telefonado a contar-lhe o que sucedeu.
Referiu que desde esse dia a menor AM_____ não se encontra bem psicologicamente, tendo medo de sair à rua, com receio que algo possa suceder novamente, tendo medo de ir à escola.
6– do depoimento da testemunha, cônjuge do demandante EM_____  e mãe da demandante AM_____.
No essencial mencionou que no dia 27-03-2020 a sua filha foi buscar um medicamento a casa da tia Sofia ..., e que, quando chegou a casa fechou-se na casa-de-banho, saindo passados cerca de 15 a 20 minutos, a chorar, tendo contado o que se tinha passado.
Nessa altura o demandante foi à janela, tendo visto os arguidos, decidindo ir falar com os mesmos para perguntar o que tinha acontecido com a sua filha, tendo a depoente, o cunhado   e as filhas ficado na janela, vendo o arguido MM_____ fazer um gesto de agredir o marido com um murro, tendo nessa altura a depoente e o seu cunhado saído para a rua, ao encontro do demandante.
Quando desceram já EM_____  vinha a subir a rua em direcção a casa, tendo um corte no lábio e o cotovelo deslocado, queixando-se com dores, tendo no caminho para o hospital sentido a camisola molhada, apercebendo-se que tinha sido esfaqueado.
Referiu que na triagem ouviu o arguido MM_____ dizer que se tinha cortado na mão, com um vidro, exaltando-se, dizendo que era mentira e que o arguido tinha esfaqueado o marido.
Referiu ainda que os arguidos conheciam a sua filha AM_____ desde criança, tendo todos crescido no Bairro; que viveram em França entre 05-06-2019 e 01-09-2019, data em que regressaram a Portugal; que a sua filha contou-lhe que o arguido MM_____ lhe enviou uma mensagem quando estavam em França a dizer que queria namorar com ela, tendo a menor bloqueado o número no telemóvel.
Mencionou que TT_____ é prima de AM_____tendo deixado de falar com a mãe daquela, sua irmã, dado a sua sobrinha dizer que no dia 27-03-2020 não viu nada do que aconteceu com a sua filha, o que não corresponde à verdade.
Após os factos ocorridos no dia 27-03-2020 a sua filha AM_____ chorava «dia e noite», dizendo que a culpa era dela, tendo crises de ansiedade, ficando inchada do lado esquerdo quando tal acontece.
Referiu que o demandante «não é de brigas»; e que, se soubesse que era para brigar com os arguidos indo acompanhado do irmão.
Mencionou que o demandante não gosta de ver as cicatrizes, não fazendo a barba devido à cicatriz na cara, evitando tirar a t-shirt em público, quando vão à praia, tendo perdido a força no braço esquerdo.
Quanto à sua filha AM_____ durante muito tempo não queria ir à escola, dado os colegas dizerem que era mentirosa, porque tinha constado na comunicação social que a mesma tinha sido violada, tendo a menor acompanhamento psicológico semanal, deixando de se vestir como fazia anteriormente, sentindo vergonha.
Referiu que na data dos factos TT_____ namorava com o arguido JS_____ e AE_____ namorava com o arguido MM_____.
7– do depoimento da testemunha SA_____.
No essencial mencionou que conhece os arguidos desde que foi para um colégio em Vila ... ...., com doze anos de idade, sendo amigo dos mesmos.
No dia 27-03-2020 foi com AM_____de quem referiu ser namorado à data, a casa da tia da menor buscar comprimidos, tendo ficado à porta, e no regresso encontraram os arguidos, tendo o arguido MM_____chamado o depoente à parte, dizendo-lhe que não o queria no bairro, por causa de DM_____ ter tirado uma bicicleta ao pai do arguido JS_____, respondendo «tásse bem», tendo o arguido MM_____ desferido uma cabeçada no depoente.
Referiu que nessa altura AM_____ estava a conversar com TT_____ que estava à janela, tendo posteriormente acompanhado a menor a casa.
Quanto aos factos ocorridos posteriormente no mesmo dia, mencionou de forma inconsistente que estava do outro lado do passeio quando EM_____  se dirigiu aos arguidos, perguntando porque tinham agredido o depoente, tendo visto EM_____ tirar uma ponta-e-mola e o arguido MM_____ uma faca borboleta, tendo os arguidos RA_____ e JS______ se colado na frente, envolvendo-se em confronto físico, tendo EM_____ após levantar-se do chão saído do local.
Mencionou ainda que chegou a frequentar a casa de AM_____na presença dos pais da menor, nunca tendo pernoitado na mesma.
8–do depoimento da testemunha Miguel ..., irmão do demandante EM_____  e tio da demandante AM_____.
No essencial mencionou que conhece o arguido MM_____ desde os seis anos de idade, tendo sido colegas de escola.
Vive com o irmão e a sobrinha desde há dois anos, nunca tendo visto SA_____ e DM_____ na habitação.
Referiu que a menor AM_____ era muito bem-disposta e que, no dia 27-03-2020, quando chegou a casa, «foi de relâmpado» para a casa-de-banho, saindo com a cara muito vermelha, a chorar e a tremer.
Entretanto a cunhada do depoente disse na presença do demandante que a menor tinha sido apalpada e lhe tinham puxado os cabelos, referindo-se aos arguidos MM_____ e JS______.
EM_____  foi à janela, tendo visto os arguidos, dizendo que ia falar com os mesmos, tendo o depoente dito ao irmão que ficava à janela, a ver, tendo acompanhado o demandante à porta, não levando o mesmo nenhum objecto na mão.
Da janela apercebeu-se que o irmão disse algo aos arguidos, tendo sido agredido com um murro desferido pelo arguido MM______, saindo nesse momento de casa a correr, acompanhado da cunhada; e, quando chegaram junto de EM_____, que se dirigia para casa, já este estava agarrado ao braço, estando os arguidos do outro lado da estrada a abandonar o local.
Apercebeu-se que o irmão tinha um corte no lábio, e o ombro deslocado, dizendo que tinha o braço partido, dirigindo-se de seguida para o hospital, não conseguindo o irmão ir sentado no banco do pendura por causa do apoio do braço, aparecendo-se no caminho que tinha sido esfaqueado.
Referiu que EM_____  está incapacitado, não conseguindo fazer força no braço, sentindo dores quando está a conduzir, nem conseguindo transportar os sacos com as compras; e que, o irmão não se sente bem ao ver-se ao espelho, tendo relutância a estar sem camisola devido às cicatrizes.
Mencionou que AM_____ tem medo de ir sozinha à rua, tendo ido à piscina acompanhada da família; que a menor está mais sensível, tendo acompanhamento psicológico, provocando o stress inchaço no seu corpo, sentindo-se culpada pelo que aconteceu ao pai, tendo baixado o rendimento escolar.
9– do depoimento da testemunha ______.
No essencial mencionou que em Março de 2020 morava em Vila ... ..., costumando frequentar o Bº. P... com SA_____, tendo este contado que lhe tinham batido por o depoente ter tirado a bicicleta do pai do arguido JS_____.
Num depoimento intrinsecamente inconsistente, referiu que no dia 27-03-2020 viu desde o início a «briga» entre EM_____  e os arguidos, tendo visto o demandante com uma navalha dar um golpe na mão do arguido MM_____, não obstante mencionar que não viu o que os arguidos fizeram ao pai da AM_____.
De igual modo, sem qualquer corroboração pelos demais elementos probatórios, mencionou que antes dos factos ocorrerem estava em casa de AM_____quando SA_____ disse que lhe tinham batido, tendo EM_____  dito que ia saber o que tinha acontecido, vendo-o pegar numa navalha que estava junto à porta.
10– do depoimento da testemunha -________-.
No essencial mencionou que conhece os arguidos de P..., sendo amiga de todos.
No dia 27-03-2020 estava em casa de TT_____, à janela, quando apareceram SA_____ e AM_____ com um saco de compras do Lidl, tendo surgido no local os arguidos, que se dirigiram para a esquina do prédio acompanhados de SA_____, que surgiu cerca de três minutos depois, saindo do local com AM_____ficando a depoente a conversar com os arguidos, durante cerca de 30 a 40 minutos.
Referiu ainda que frequenta a mesma escola que AM_____não tendo notado qualquer alteração no comportamento da mesma.
11– do depoimento da testemunha TT_____, prima de AM_____.
No essencial mencionou que conhece os arguidos desde que residiu em P..., deixando de morar no local depois do que sucedeu com o tio EM_____.
No dia 27-03-2020 estava à janela com a amiga AE_____, tendo visto AM_____ quando esta regressava a casa acompanhada de SA_____, referindo de forma intrinsecamente inconsistente que os arguidos estavam a caminhar noutra direcção, não se tendo aproximado de AM_____nem de SA_____, versão contrariada inclusivamente pelas declarações do arguido MM_____ que admitiu ter confrontado o menor com a alegada subtracção de uma bicicleta.
Referiu que AM_____ se dirigiu para casa depois de ter conversado com a depoente, tendo os arguidos ficado nas traseiras do prédio, ficando posteriormente a conversar com a depoente e com ------- cerca de 30 a 40 minutos.
Por último mencionou que não fala com a prima desde esse dia, não tendo notado nenhuma mudança no comportamento da mesma.
12– do depoimento da testemunha -________, pai do arguido RA_____ sobre as condições sociais e características de personalidade do arguido; e que, mencionou no essencial que desde a ocorrência dos factos notou uma mudança no comportamento do filho.
13– do depoimento da testemunha -_________, apenas sobre as características de personalidade do arguido JS_____, que conhece desde a infância deste.
14– do depoimento da testemunha -________.
No essencial mencionou que foi colega de escola do arguido JS______ até ao 5º ano.
Confrontado com a fotografia de fls. 66 referiu que tirou a mesma com o arguido JS_____, não tendo publicado nem partilhado a fotografia, e que aquela não tinha nenhum destinatário concreto.
15– do depoimento da testemunha -_____, tia de AM_____
No essencial mencionou que antes da ocorrência dos factos frequentava a casa da irmã e da sobrinha, e que SA_____ também frequentava a casa, estando de relações cortadas com a irmã desde o dia em que os factos ocorreram, não notando alterações no comportamento de AM_____.
16– do depoimento da testemunha -____- sobre as condições sociais e características de personalidade do arguido JS______.
17– do depoimento da testemunha -_____-, sobre as características de personalidade dos arguidos.
18– do auto de denúncia de fls. 4-5, e do auto de notícia de fls. 92 a 93, no que respeita à data e local da ocorrência.
19– do documento de fls. 113, comprovativo da data de nascimento da menor AM_____.
20– da documentação clínica do demandante EM_____, de fls. 33 a 37, 51 a 58, e 98-99.
21– da documentação clínica do arguido MM_____, de fls. 40, e 60-61, constando do diagnóstico efectuado na triagem que o mesmo apresentava um ferimento na mão, constando expressamente nos campos destinados à Observação e Diagnóstico, que o arguido não respondeu à chamada, tendo abandonado a Urgência.
22– dos relatórios da perícia de avaliação do dano corporal na pessoa do demandante EM_____, de fls. 43 a 44 (conclusões preliminares), 48 a 49, 95 a 97, 103 a 105 (conclusões preliminares), e 76 a 77, e 108-109 (relatório final), e informação complementar de fls. 434-435, constando as seguintes conclusões do relatório final:
«- A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 05/06/2020.
- As lesões atrás referidas terão resultado de traumatismo de natureza cortoperfurante e contundente o que é compatível com a informação.
- Tais lesões terão determinado 70 dias para a consolidação médico-legal: com afectação da capacidade de trabalho geral (70 dias) e com afectação da capacidade de trabalho profissional (70 dias).
- Do evento resultaram para o Examinado as consequências permanentes descritas, as quais, sob o ponto de vista médico-legal, traduzem em limitação de extensão do cotovelo esquerdo e cicatrizes não desfigurantes, com enquadramento no art. 144º do CP.».
23- da fotografia de fls. 66, e das fotografias do ecrã do telemóvel apreendido ao arguido JS_____, de fls. 233 a 235.
24- da informação do Departamento de Armas e Explosivos da P.S.P., relativamente à inexistência de registos/manifestos de armas de fogo, da titularidade dos arguidos MM_____ e JS______, de fls. 68.
25- do auto de busca e apreensão à residência do arguido MM_____, de fls. 209, e reportagem fotográfica de fls. 211 a 216.
26- do auto de exame directo à arma de fogo apreendida ao arguido MM______, de fls. 217.
27- do relatório do exame pericial à arma de fogo apreendida, de fls. 457 a 459.
28- dos documentos comprovativos do custo da assistência hospitalar prestada pela demandante E... Vila ... – Soc. G... Est..., S.A., de fls. 736 a 739.
29- dos relatórios sociais de fls. 941 a 945, 968 a 972, e 975 a 979, sobre as condições sociais e características de personalidade dos arguidos.
30- dos certificados de registo criminal de fls. 811, 812 e 813 a 818.
Da análise conjugada e crítica dos elementos probatórios supra mencionados, nomeadamente as declarações coerentes e consistentes da ofendida AM_____ que descreveu de forma convicta a actuação do arguido MM_____, nos termos supra mencionados, conferindo a coerência, consistência e objectividade na descrição dos factos de que foi vítima credibilidade às declarações da menor, tanto mais que resulta claramente de tais declarações que a mesma não procurou construir qualquer versão em relação aos factos de que não se recordava, tendo inclusive mencionado que os arguidos JS_____ e RA_____ não proferiram quaisquer expressões de que fosse destinatária, nem praticaram quaisquer factos contra a mesma; conjugado com as declarações do demandante EM_____, progenitor da menor, e os depoimentos das testemunhas Tatiana ... e MM_____, respectivamente progenitora e tio da menor, a respeito do circunstancialismo e estado emocional da menor quando chegou a casa, e posteriormente ao relatar o ocorrido, e as alterações comportamentais que constataram posteriormente, aliado às regras da experiência comum, permitiram ao Tribunal concluir pela veracidade da versão apresentada pela menor AM_____ relativamente aos factos de que foi vítima praticados pelo arguido MM_____, nos termos que resultaram provados.
Relativamente aos factos ocorridos posteriormente, no dia 27-03-20202, de que foi vítima o ofendido EM_____, verifica-se desde logo que as declarações dos arguidos MM_____ e JS______, que não obstante serem convergentes quanto à circunstância de se colocarem conjuntamente com o arguido RA_____ no local onde os factos ocorreram, admitindo o arguido MM_____ que desferiu golpes com uma navalha que atingiram o ofendido, referindo que admitia que o golpe que sofreu na mão tivesse sido provocado pela força utilizada quando desferiu os golpes que atingiram o ofendido, e admitindo o arguido JS_____ que agarrou o ofendido por trás, tendo o mesmo caído ao chão depois de ter sido atingido por um pontapé desferido pelo arguido RA_____ (facto admitido pelo arguido em sede de primeiro interrogatório judicial) revelaram-se intrinsecamente inconsistentes e incoerentes no que respeita à motivação subjacente à respectiva actuação, mencionando os arguidos MM_____ e JS______ que actuaram precipitadamente, numa atitude defensiva, com receio da reacção do ofendido, sendo contrariadas pelos restantes elementos probatórios, designadamente as declarações do demandante EM_____, as declarações da demandante AM_____ e os depoimentos coerentes e consistentes das testemunhas Tatiana ... e Miguel ..., que referiram que quando o ofendido saiu de casa não levava consigo nenhum objecto cortante, pretendendo apenas conversar com os arguidos sobre o que tinha ocorrido com a sua filha, e ainda os relatórios de avaliação do dano corporal na pessoa do ofendido, comprovativos das lesões sofridas pelo mesmo, produzidas por um instrumento de natureza corto-perfurante, aliados às regras da experiência comum, permitiram ao Tribunal concluir pela actuação conjunta dos arguidos MM_____, JS_____ e RA_____nos factos que constituem o objecto do presente processo, ocorridos em 27-03-2020, de que foi vítima o ofendido EM_____, nos termos que resultaram provados.

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Quanto aos factos não provados, o Tribunal formou a sua convicção com base na ausência de prova concludente produzida em audiência de julgamento.»
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IV–Recurso:

O arguido RA_____ recorreu, concluindo as alegações nos termos que se transcrevem:
«1.– Foi o arguido condenado pela prática, em co-autoria material, de um crime de ofensa à integridade física grave qualificada, na forma consumada, previsto e punido pelos arts. 143.º, n.º 1, 144.º, al. b), e 145.º, n.ºs 1, al. c) e 2, com referência ao art. 132.º, n.º 2, al. h) do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 2 (dois) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período de tempo.
2.– Foi também condenado ao pagamento solidário de duas indemnizações cíveis no valor de € 6.580,18 e € 10.000,00, a título de tratamentos hospitalares e danos não patrimoniais respetivamente.
3.–  O recorrente tinha 16 anos à data da prática dos factos e o tribunal recorrido entendeu não aplicar o regime penal especial para jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos de idade, aprovado pelo Dec. Lei n.º 401/82, de 23-09.
4.– Entendeu o tribunal recorrido que “(...)a ausência de demonstração da interiorização do desvalor da respectiva conduta, aliado à gravidade objectiva dos factos praticados pelos arguidos, valorados globalmente, constituindo factores de risco elevado em termos de adequada reinserção social, não possibilitam a formulação de um juízo de prognose favorável que permita concluir pela vantagem da atenuação especial prevista no diploma em apreço para o processo de reinserção social dos arguidos.”
5.–  Com o devido respeito, andou mal o tribunal recorrido.
6.– Da matéria dada como provada não existem elementos que nos permitam considerar que a aplicação do regime especial de jovens adultos não deva ser aplicado.
7.– Ainda que não seja requisito para a aplicação do regime especial para jovens urge a necessidade de distinguir a real participação do recorrente nos factos praticados, que é consideravelmente menos gravosa.
8.– Em conformidade com o facto 12 dos factos provados o arguido recorrente deu um pontapé no pé esquerdo do ofendido, reação impulsiva e uma total “parvoíce” como referiu em sede de primeiro interrogatório, que admitiu o seu ato com a perceção de que não o devia ter feito.
9.– Da matéria de facto provada sabemos que se trata de um jovem com alguns problemas comportamentais por se deixar influenciar pelos pares, por ser rebelde e desinteressado pela escola
10.– Foi a primeira vez que praticou um facto criminoso, que é grave.
11.– Tem uma família coesa com situação financeira mediana.
12.– Pelo que se pode afirmar que existem “razões sérias para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado”.
13.– Veja-se o preâmbulo do referido decreto-lei n.º 401/82 de 23 de Setembro:
14.– “(...) 4. O princípio geral imanente em todo o texto legal é o da maior flexibilidade na aplicação das medidas de correcção que vem permitir que a um jovem imputável até aos 21 anos possa ser aplicada tão-só uma medida correctiva.
Trata-se, em suma, de instituir um direito mais reeducador do que sancionador, sem esquecer que a reinserção social, para ser conseguida, não poderá descurar os interesses fundamentais da comunidade, e de exigir, sempre que a pena prevista seja a de prisão, que esta possa ser especialmente atenuada, nos termos gerais, se para tanto concorrerem sérias razões no sentido de que, assim, se facilitará aquela reinserção.”
15.– Foi com o objetivo de priorizar a reeducação do jovem delinquente que o legislador criou o referido diploma legal, penalizando-o de forma mais branda para uma melhor reinserção.
16.–  O tribunal aquo deveria ter aplicado ao arguido recorrente por ser um jovem, à data dos factos com 16 anos e com um enorme suporte familiar com condições para ajudá-lo da sua reinserção.
17.– A jurisprudência tem tido este mesmo entendimento e veja-se, a título de exemplo o acórdão n.º 499/14.8PWLSB.L1.S1 do STJ, datado de 31.03.2016, onde foi relatora Helena Moniz, bem como o acórdão n.º 897/14.7JABRG.G1 do TRL, datado de 03.04.2017, onde foi relator Fernando Chaves.
18.– Sendo aplicável ao arguido o regime penal especial para jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos de idade, aprovado pelo Dec. Lei n.º 401/82, de 23-09, deve a sua pena ser especialmente atenuada nos termos do disposto no art. 73.º do CP, ex vi art. 4.º do referido decreto-lei, sendo o seu limite máximo reduzido a um terço e o seu limite mínimo reduzido a um quinto.
19.– A pena do crime de ofensa à integridade física grave qualificada tem como limite mínimo 3 anos e como limite máximo 12 anos, nos termos do disposto no art. 145.º n.º 1 alínea c) do CP.
20.– Assim, ao arguido terá de ser aplicada em concreto uma pena dentro da moldura penal de 7 meses e 9 dias (limite mínimo reduzido a 1/5) e 4 anos (limite máximo reduzido a 1/3), pena essa, suspensa na sua execução como já decidido pelo tribunal recorrido.
21.– Entende-se que essa pena não deverá ultrapassar 1 ano em função da culpa e das exigências de prevenção geral de integração e da prevenção especial de socialização, de harmonia com o disposto nos arts. 71.º, n.º 1 e 40.º do CP, nomeadamente o facto de o arguido se encontrar a estudar e não averbar quaisquer condenações no seu registo criminal.
22.– O recorrente não se conforma com as indemnizações arbitradas pelo tribunal recorrido.
23.–  O tribunal julgou procedente o PIC do hospital e condenou os arguidos ao pagamento do valor de € 6.580,18 de forma solidária.
24.– No PIC deduzido pela demandante não vêm descritos os tratamentos e o valor dos mesmos, limitando-se a referir que prestou cuidados essenciais ao ofendido em consequência das agressões infligidas pelos arguidos, e que os mesmos têm o valor global de € 6.580,18.
25.– Dos documentos juntos com o referido PIC constam apenas três facturas e uma nota de crédito, documentos esses que foram remetidos individualmente para cada arguido pela demandante para pagamento.
26.– Ora, todas as facturas têm valores diferentes, sendo que ao recorrente foi remetida fatura para pagamento no valor de € 939,97 (fls. 739).
27.–O tribunal recorrido não se pronunciou sobre a participação de cada arguido, e que consta dos factos provados, relativamente ao PIC para apuramento da real responsabilidade civil individual de cada um deles.
28.– Não pode o recorrente deixar de demonstrar a sua indignação ao ser condenado a pagar, solidariamente, despesas hospitalares de alguém que foi esfaqueado 4 vezes por outro arguido, como consta do ponto 11 dos factos provados.
29.– Em consequência de tais golpes o ofendido foi assistido e submetido a diversas intervenções e tratamento, algo que não resultou do comportamento do recorrente.
30.– De toda a prova produzida, incluindo do depoimento do ofendido, não resulta que todas as lesões descritas no ponto 16 dos factos provados são consequência da conduta dos três arguidos, pelo que o tribunal recorrido não podia dar como provada tal factualidade.
31.– De todos os actos cometidos durante a agressão e constantes dos pontos 9 a 14, o recorrente é mencionado apenas no ponto 12 onde se refere que desferiu um pontapé ao ofendido que o fez cair.
32.–Como consequência directa do comportamento do recorrente, o ofendido sofreu deformação do cotovelo esquerdo, causando-lhe limitações de extensão do cotovelo em 20º do membro superior esquerdo.
33.–Pelo que no ponto 16 dos factos provados o tribunal recorrido devia ter individualizado os danos e suas sequelas relativamente à conduta de cada arguido.
34.–No ponto 16 dos factos provados e relativamente ao recorrente o texto deveria ter a seguinte redação: “Como consequência direta e necessária da conduta do arguido RA_____ (descrita em 12), o ofendido EM_____ sofreu deformação do cotovelo esquerdo (luxação) que lhe causou sequelas no membro superior esquerdo, nomeadamente, limitações de extensão do cotovelo em 20º”
35.– Fixando assim a real participação do recorrente em toda a factualidade descrita no acórdão recorrido.
36.–E é apenas nessa medida que deve o recorrente ser responsabilizado e condenado a pagar os valores inerentes a tratamentos pelo danos que ele causou e não que outros arguidos causaram.
37.–No termos do disposto no artigo 497.º, n.º 1 do CC, a responsabilidade solidária existe quando as mesmas pessoas causam os mesmos danos e não foi, de todo, o que sucedeu.
38.–  Os danos causados pelo esfaqueamento não são os mesmos que a luxação no cotovelo, não existe nexo causal entre os golpes e a luxação no cotovelo, bem como não existe nexo causal entre o pontapé e as perfurações do ofendido.
39.–  O elemento constitutivo da responsabilidade civil, em geral, é o nexo de causalidade entre o facto e o dano e é a isto que se deve atender na determinação da responsabilidade individual do recorrente e, por consequência, na fixação da indemnização.
40.– O artigo 563.º do CC diz-nos que “a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão.”
41.– Assim sempre se dirá que se o recorrente não desferisse o pontapé que resultou na queda do ofendido, deformando o cotovelo esquerdo, então existia obrigação de indemnizar por não existir dano.
42.– Foi violado o art. 497.º, n.º 1 do CC, não existindo por isso solidariedade na obrigação de indemnizar o demandante no valor de € 6.580,18, devendo o recorrente ser responsabilizado apenas pelos tratamentos inerentes à luxação do cotovelo esquerdo.
43.– O tribunal recorrido também andou mal ao condenar o recorrente ao pagamento solidário de indemnização no valor de € 10.000,00 pelos danos não patrimoniais sofridos pelo ofendido/demandante.
44.–  Na mesma lógica que a anteriormente exposta, em sede de responsabilidade civil por facto ilícito, reitera-se que não existe solidariedade na obrigação de indemnizar.
45.–O valor indemnizatório que o recorrente deve pagar ao ofendido/demandante a título de danos não patrimoniais, deve ser aferido nos termos da lei, nomeadamente os artigos 496.º, n.º4, 562.º e 564.º todos do CC, atendendo exclusivamente à sua conduta.
46.– Para o cálculo da indemnização devida vigora o princípio da equidade.
47.–Veja-se um excerto do acórdão do STJ de 20.11.2019, n.º 107/17.5T8MMV.C1.S1, relator Nuno Pinto Oliveira: “Em relação aos danos não patrimoniais, o princípio é o de que a indemnização deve calcular-se de acordo com a equidade (art. 496.º, n.º 4, do Código Civil). A equidade funciona como único recurso, “ainda que não descurando as circunstâncias que a lei manda considerar, a saber: o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso (por exemplo, a natureza e a intensidade e da lesão infligida)”.
48.–Pelo que não deve a indemnização ser arbitrada por valor superior a 1.000,00 (mil euros).

Nestes termos e demais de direito deverá o presente recurso obter provimento e, em consequência:
a)- Ser aplicado ao recorrente o regime penal especial para jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos de idade, aprovado pelo Dec. Lei n.º 401/82, de 23-09, devendo a sua pena ser especialmente atenuada reduzindo-se os limites da pena para 7 meses e 9 dias (limite mínimo reduzido a 1/5) e 4 anos (limite máximo reduzido a 1/3), pena essa, suspensa na sua execução como já decidido pelo tribunal recorrido, que não deverá ultrapassar 1 ano.
b)- Ser o recorrente absolvido da obrigação solidária de pagamento da indemnização ao demandante E... Vila ... - Soc. G... E..., S.A., no valor global de € 6.580,18 e ser condenado apenas ao pagamento dos tratamentos inerentes à luxação do cotovelo esquerdo.
c)-Ser o recorrente absolvido da obrigação solidária de pagamento da indemnização arbitrada ao demandante EM_____ no valor de € 10.000,00 e ser condenado a uma indemnização de valor inferior a ser arbitrada por V. Exas. considerando o acto ilícito praticado pelo recorrente, não devendo ultrapassar os € 1.000,00.».

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Contra-alegou o Ministério Público, concluindo as respectivas alegações nos seguintes termos:
«Analisado acórdão recorrido, não se vislumbra a existência de qualquer violação das normas que regem a determinação da medida concreta da pena, nomeadamente os artigos 71.º e 73.º, do Código Penal, 1.º e 4.º, do Dec. Lei n.º 401/82, de 23-09, os quais foram, devida e criteriosamente aplicados, não merecendo o acórdão qualquer censura.
Nestes termos, não deverá ser concedido provimento ao recurso, mantendo-se o douto acórdão recorrido. ».

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Nesta instância, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta subscreveu o teor da argumentação e conclusões aduzidas pelo Ministério Público no Tribunal recorrido.

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V–Questões a decidir:
Do artº 412º/1, do CPP resulta que são as conclusões da motivação que delimitam o objecto do recurso e consequentemente, definem as questões a decidir em cada caso ([1]), exceptuando aquelas questões que sejam de conhecimento oficioso ([2]).

As questões colocadas pelo recorrente, arguido, são:
- Redução da pena por aplicação do regime especial de jovens adultos;
- Inexistência de solidariedade na obrigação de indemnizar o demandante civil no valor de € 6.580,18;
- Excesso da indemnização fixada pelos danos não patrimoniais sofridos pelo ofendido/demandante.

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VI–Fundamentos de direito:
1- Da redução da pena por aplicação do regime especial de jovens adultos:
O recorrente entende que deveria ter sido abrangido pela legislação relativa a jovens delinquentes, o DL n.º 401/82 de 23-09, quanto à atenuação especial da pena prevista no seu artigo 4º, com fundamento em que é primário, teve uma participação secundária nos factos praticados, tendo-se limitado a dar um pontapé no pé esquerdo do ofendido e assumiu, em sede de primeiro interrogatório de detido, que não o devia ter feito.
Pugna pela aplicação de uma pena não superior a 1 ano de prisão, suspensa na sua execução, em função da culpa e das exigências de prevenção geral de integração e da prevenção especial de socialização que se revelam.

O Tribunal recorrido pronunciou-se sobre a questão nos seguintes termos:
«O factor idade não comporta uma aplicação automática e imediata do regime especial para jovens consagrado no mencionado diploma, exigindo-se ainda que dos factos concretamente provados resulte um determinado circunstancialismo que legitime a formulação de um juízo de prognose favorável, no sentido da atenuação facilitar a reinserção social do agente.
Conforme salienta a doutrina e a jurisprudência quanto a esta matéria, impõe-se que a atenuação especial facilite a reinserção social, não devendo tal juízo de prognose radicar em mero subjectivismo mas ao invés em elementos factuais concretamente provados que conduzam à conclusão que a moldura penal abstracta comum não cumpre, por excessiva, os fins da socialização.
Salienta a este respeito o Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão de 13-07-2011, http://www.dgsi.pt/, «A conjugação e a ponderação dos fins das penas, e do tratamento diferenciado conforme os fins prevalecentes no dolo e nos crimes negligentes, retira espaço de aplicabilidade ao regime penal dos jovens comandado por exclusivas finalidades de prevenção especial. Por isso, a aplicação do regime especial encontrará dificuldades insuperáveis nos casos em que não haja assunção da prática dos factos, sem possibilidade de o julgador substanciar o convencimento quanto ao comprometimento determinado do agente em assumir e interiorizar os valores e a dimensão ética das exigências impostas ... Não se provando os factos demonstrativos da interiorização do desvalor da conduta, não é possível formular um juízo sobre as vantagens para a reinserção social (...)».
No caso em apreço, a ausência de demonstração da interiorização do desvalor da respectiva conduta, aliado à gravidade objectiva dos factos praticados pelos arguidos, valorados globalmente, constituindo factores de risco elevado em termos de adequada reinserção social, não possibilitam a formulação de um juízo de prognose favorável que permita concluir pela vantagem da atenuação especial prevista no diploma em apreço para o processo de reinserção social dos arguidos, ficando assim afastada a aplicação aos arguidos JS_____ e RA_____do regime consagrado no Dec. Lei nº 401/82, de 23-09. ».

A propósito dos requisitos para aplicação da atenuação especial prevista na norma invocada, veja-se a síntese que consta do acórdão do STJ, de 31-03-2011, 3ª SECÇÃO, no processo 169/09.9SYLSB.S1:
«I- Todos estão, porém, de acordo em que a atenuação especial ao abrigo do regime visando os jovens adultos:
- não é de aplicação necessária e obrigatória;
-nem opera de forma automática, sendo de apreciar casuisticamente;
- é de conhecimento oficioso;
-a consideração da sua aplicação não constitui uma mera faculdade do juiz,
-mas antes um poder-dever vinculado que o juiz deve (tem de) usar sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos, sendo de concessão vinculada;
-de aplicar sempre que procedam sérias razões para crer que da atenuação resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado, sendo a aplicação em tais circunstâncias, obrigatória e oficiosa,
-havendo a obrigação, ou pelo menos, não se dispensando a equacionação da pertinência ou inconveniência da sua aplicação;
-justificando-se a opção ainda que se considere inaplicável o regime, isto é, devendo ser fundamentada a não aplicação».

Significa isto que a aplicação tem que ter um suporte na matéria de facto provada que reflicta a viabilidade de uma atenuação especial para a ressocialização do agente do crime, que passa necessariamente pela demonstração de uma capacidade de auto-censura, porque só assim o desiderato do favorecimento de um processo de reeducação se pode obter.

O arguido exerceu o seu direito de não se pronunciar sobre os factos imputados. Nada há a criticar quanto à opção mas o certo é que isso impediu que o Tribunal tivesse uma percepção directa sobre a sua eventual postura crítica perante os factos que praticou, que não se revestem da singeleza que descreve. O arguido provocou o desequilíbrio e queda do ofendido, num momento em que estava a ser sujeito a um golpe de mata-leão (que consiste na subjugação da vitima pelo pescoço e que lhe provoca asfixia) e depois de ter sido esfaqueado, ou seja, estando ele já ferido. Com esse pontapé o ofendido caiu e sofreu uma luxação do ombro, o que foi significativo para os danos corporais e dores sofridos.

Em causa está nitidamente uma situação de co-autoria na prática de um crime, em que cada um dos arguidos tomou parte directa na sua execução, agindo em conjugação de intenções e esforços. Significa isto que o resultado dessa acção conjunta é imputável, nos mesmos termos, aos três arguidos.

O arguido já foi sujeito a dois processos tutelares.

Não obstante as referidas circunstâncias que não abonam em favor da adequação da medida pretendida, o certo é que ficou a constar do provado que os processos tutelares educativos não reflectem na totalidade a relação do arguido com os agentes educativos (tanto professores como auxiliares), com quem mantém uma relação adequada e que de acordo com o relatório social «No plano pessoal, o arguido revelou capacidades próprias para a sua idade face a uma reflexão sobre os assuntos e elaborar sobre os mesmos uma opinião. (...). Face à presente situação jurídica, revela moderada capacidade crítica face ao bem jurídico em causa (...)».

Esta factualidade, perspectivada em face dos 16 anos que o arguido tinha na altura dos factos, é adequada a fazer funcionar o princípio do in dubio pro reo em benefício da aplicação da legislação dos jovens delinquentes. Como se refere no acórdão n.º 499/14.8PWLSB.L1.S1, do STJ, de 31.03.2016,  «Não é a culpa do arguido, consubstanciada no facto concreto que praticou, que nos poderá limitar a aplicação do regime especial de jovens adultos. A única coisa que a lei impõe como limite à aplicação desta atenuação especial é a consideração de que o arguido não tirará quaisquer vantagens para a sua reintegração social daquela diminuição».

A idade de 16 anos é caracterizada por uma enorme imaturidade, nos tempos que correm. Dizem os professores que se nota, de ano para ano, essa maior imaturidade nos adolescentes. Estudos referem que o início da adolescência, que nos rapazes começa por volta dos 14/15 anos, implica um padrão de redução transitória das características pessoais vantajosas, especialmente amabilidade e autodisciplina, a ponto de se caracterizar a adolescência como uma "ruptura" temporária da personalidade, que evolui condicionada por uma intrincada mistura de factores genéticos e ambientais ([3])

Para o sexo masculino é a fase das grandes manifestações de rebeldia, da fuga às reflexões pessoais, designadamente à compreensão da necessidade das regras sociais e à adequação das intenções e das práticas ao socialmente correcto. Em face da manifestação de alguma capacidade crítica face aos factos em causa, há um ponto de partida para que o presente processo crime possa acordar o arguido para as novas responsabilidades próprias de jovem adulto, percebendo que terminou a fase da irresponsabilidade infantil e que, se quer que o considerem como adulto tem que agir enquanto tal. O provado indica que o arguido tem apoio familiar adequado para uma correcta socialização o que contribui para uma expectativa positiva de crescimento com maior maturidade.

Dizendo de outro modo, dos factos provados não resultam elementos que nos permitam concluir que não existem elementos que nos produzam sérias razões para crer, com razoabilidade, que a reintegração não seja facilitada mediante a aplicação do regime dos jovens delinquentes.

Nessa medida, impõe-se a aplicação desse regime, estando em causa a prática pelo arguido, em co-autoria material, de um crime de ofensa à integridade física, grave e qualificada, na forma consumada, previsto e punido pelos artigos 143º/1, 144º/b) e 145º/1- c) e 2, com referência ao artigo 132º/2-h), do CP. Tal crime é punível com pena de prisão de 3 a 12 anos. Aplicada a atenuação especial temos que a moldura penal vai de a 7 meses e 6 dias a 8 anos, nos termos do artigo 73º/CP.

No acórdão recorrido considerou-se, para efeitos de fixação da pena concreta, a seguinte ordem de factores:
i-as elevadas necessidades de prevenção geral, dada a instabilidade e alarme social provocados pela prática do crime de ofensa à integridade física grave qualificada, objecto de elevada reprovação social;
ii-o grau de ilicitude dos factos, que se considerou elevado, tendo em conta, nomeadamente, o modo de cometimento do crime em co-autoria, sobressaindo a actuação do arguido MM_____ com ascendente sobre os co-arguidos, o instrumento utilizado (faca borboleta) para provocar as lesões sofridas pelo ofendido, a extensão e localização das lesões, o facto de o ilícito criminal ter sido cometido em pleno dia, na via pública, tendo os arguidos abandonado o local sem providenciar pelo auxílio do ofendido, revelando por parte dos arguidos maior audácia e indiferença pelas consequências da sua actuação;
iii-a intensidade dolosa, tendo os crimes praticados pelos arguidos sido cometidos na modalidade de dolo directo;
iv-as consequências resultantes da actuação dos arguidos, tendo em conta as concretas lesões sofridas pelo ofendido e as sequelas daí resultantes;
v-a ausência de interiorização do desvalor da respectiva actuação por parte dos arguidos;
vi-as condições sociais dos arguidos e a juventude dos arguidos JS_____ e RA_____ à data da prática dos factos.
vii-a ausência de antecedentes criminais relativamente aos arguidos JS_____ e RA_____.

No que concerne à referida ausência de interiorização do desvalor da actuação, por parte do recorrente, há uma clara contradição entre essa afirmação e os pontos de facto acima transcritos, relativos à postura do recorrente em face do crime, pelo que essa afirmação não é de considerar, tal como a questão da idade, que já fundamentou a aplicação da atenuação especial.

Considerando as agravantes e atenuantes gerais acima referidas e bem assim a gravidade que a culpa demonstrada assume dentro da moldura penal especialmente atenuada, agora avaliada em função da maturidade expectável para o tipo de atitude em causa - que viola a integridade física, bem jurídico que faz parte do núcelo duro dos bens penalmente tutelados, essenciais para a vivência em sociedade, o que se aprende naturalmente desde que se começa a ter consciência do outro - entende-se adequada a pena de dois anos e três meses de prisão ao recorrente, mantendo-se a suspensão na sua execução por igual período, sujeita às condições já fixadas no acórdão recorrido.

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2-Da inexistência de solidariedade na obrigação de indemnizar o demandante civil:
O recorrente entende que as indemnizações fixadas, quer a título de danos patrimoniais quer não patrimoniais, não podem ser solidárias na medida em que o Tribunal teria que atender, única e exclusivamente, aos danos provocados pela actuação de cada um dos arguidos, sendo que a sua actuação provocou danos menores em comparação com os produzidos pelos demais co-arguidos.

Ora sucede que o crime pelo qual o arguido foi condenado foi praticado em co-autoria material, conforme acima se referiu e, aliás, consta do acórdão respectivo - e o recorrente não põe em causa.

Numa co-autoria o resultado danoso penalmente relevante, a qualquer título, é imputado a todos os co-autores, na medida em que todos actuam, ainda que por formas distintas, mediante a mesma intenção e em vista da obtenção de um mesmo fim (artigo 26º/CP).

Nos termos do artigo 26º do CP «é punível como autor quem executar o facto, por si mesmo ou por intermédio de outrem, ou tomar parte directa na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros, e ainda quem, dolosamente, determinar outra pessoa à prática do facto, desde que haja execução ou começo de execução».

A co-autoria decompõem-se nos seguintes elementos integrantes: «um acordo, expresso ou tácito para a realização conjunta de uma acção criminosa; a) intervenção directa na fase executiva do crime; b) repartição de tarefas ou papeis entre cada comparticipante; c) domínio funcional do facto, traduzido na possibilidade de exercer o domínio positivo do facto típico e de impedir ou abortar esse resultado» ([4]).

A co-autoria, no caso, emerge precisamente de uma situação em que, participando no facto criminoso mais do que uma pessoa, todos agem por acordo (ou conjuntamente, que seja). Ou seja, pressupõe uma decisão conjunta ou a adesão a uma decisão já tomada e a execução conjunta.

A execução conjunta implica que a actuação do agente integre a essencialidade da conduta, o que não pressupõe a execução de todos os actos típicos do crime.

A actuação do grupo em que o agente se inseriu foi uma decisão conjunta, ainda que tácita, da prática do crime, do arguido e dos demais, em co-domínio funcional. O domínio funcional que se exige no artigo 26º/CP não é necessariamente a capacidade de determinar a actuação de todos e de cada um dos demais membros do grupo, bastando-se a do próprio agente, na sua relação com o grupo, desde que ela seja relevante na obtenção do resultado criminoso visado, o que sucede quando cada qual desempenha o papel pressuposto na globalidade da acção.

Havendo uma execução conjunta, o que releva para efeitos da prática do crime é a imputação do resultado da acção conjunta a cada um dos agentes, precisamente porque toda a execução do facto (a acção de dominar fisicamente o ofendido e de o espancar pela forma descrita) está coberta pela decisão conjunta de o cometer, em conjugação de esforços e energias.

Como é doutrina e jurisprudência comuns para a imputação do resultado a todos os intervenientes, num quadro de co-autoria, não é necessário que todos comparticipem na actividade total porque o que justamente caracteriza esta figura é a “divisão de trabalho” para obtenção do fim projectado.

Significa isto, aplicado ao caso dos autos, que é irrelevante à imputação do crime a qualquer dos arguidos recorrentes saber qual dos agentes praticou este ou aquele facto, sendo que se sabe que cada um deles praticou actos de agressão física que resultaram nas lesões acima descritas.

O que releva é que todos se determinaram à prática do crime, conjuntamente, em coadjuvação de esforços e energias e cometeram-no, praticando cada qual os actos necessários e adequados à obtenção do resultado visado.

Assente a co-autoria, vejamos o regime da obrigação civil emergente.

Por força do disposto no artigo 513º do Código Civil (CC) a solidariedade de devedores existe quando resulte da lei, sendo que nos termos do 497º/1, do CC se forem várias pessoas responsáveis pelos danos é solidária a sua responsabilidade. Esta é uma norma imperativa que define a responsabilidade face ao lesado, admitindo a lei, no entanto, que entre os responsáveis se possa vir a discutir, em sede de direito de regresso, a divisão de responsabilidades entre cada um, nos termos do nº 2 do artigo 497º/CC.

Em face das normas aplicáveis é manifestamente improcedente a pretensão invocada, subsistindo necessariamente a condenação solidária dos arguidos no pagamento do valor fixado, quer a título de danos patrimoniais quer não patrimoniais.

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VII–Decisão:

Acorda-se, pois, concedendo parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido RA_____, em alterar a decisão recorrida no que concerne à pena aplicada ao arguido, que se fixa em dois anos e dois meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, a contar do trânsito em julgado da decisão, acompanhada de regime de prova, assente num plano de reinserção social a elaborar pelos serviços de reinserção social, com incidência na vertente da consolidação das competências pessoais e sociais.
Sem custas.

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Texto processado e integralmente revisto pela relatora.



Lisboa,17/11/2021


                                  
(Maria da Graça M. P. dos Santos Silva)                                  
(A. Augusto Lourenço)




[1]Cf. Germano Marques da Silva, em «Curso de Processo Penal», III, 2ª edição, 2000, pág. 335, e Acs. do S.T.J. de 13/5/1998, em B.M.J. 477-º 263; de 25/6/1998,em  B.M.J. 478º-242 e de 3/2/1999, em  B.M.J. 477º-271.
[2]Cf. Artºs 402º, 403º/1, 410º e 412º, todos do CPP e Ac. do Plenário das Secções do S.T.J., de 19/10/1995, D.R., I – A Série, de 28/12/1995.
[3] Cfr.https://www.bbc.com/future/article/20180608-how-our-teenage-years-shape-our-personalities.
[4]Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Processo n.º 470/16.5JACBR.S1 de 14-12-2017, em www.dgsi.pt.