SECTOR EMPRESARIAL DO ESTADO
FUNDO DE PENSÕES
CONTRIBUIÇÃO EXTRAORDINÁRIA DE SOLIDARIEDADE
ORÇAMENTO DO ESTADO
Sumário

Sendo a (…) uma empresa pertencente ao sector empresarial do Estado, financiada e tutelada pelo próprio, e tendo as Leis do Orçamento do Estado referentes aos anos  2011 a 2016, estabelecido normas, de carácter excepcional e imperativo, destinadas à redução da despesa, entre elas a contribuição extraordinária de solidariedade, que incide sobre as pensões, e que visa ser suportada no momento do pagamento e pelo beneficiário pensionista, não é legitimo admitir a hipótese de o CCC, do qual esta é associada, suporte um complemento destinado a reduzir a despesa do Estado.
(Elaborado pela relatora)

Texto Parcial

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa

I – Relatório
AAA intentou a presente acção emergente de contrato de trabalho, a seguir a forma de processo comum, contra BBB em representação do CCC pedindo que, em face do incumprimento, pelo Réu, do disposto no art. 25º da alteração do contrato constitutivo do Fundo de Pensões …, deverá reconhecer-se o direito do Autor às prestações complementares que lhe são devidas e não lhe foram pagas pelo Réu, com referência aos anos de 2011 a 2016, correspondentes aos montantes que foram descontados da respectiva pensão a título de Contribuição Extraordinária de Solidariedade, pela CGA e pela Futuro, no montante global de €50.717,01.
 Pede ainda que, na qualidade de gestor do Fundo de Pensões, seja condenado a pagar ao Autor tais quantias, no montante global de €50.717,01 e respectivos juros de mora, calculados desde as datas de vencimento até integral e efectivo pagamento, ascendendo os vencidos até à presente data ao montante de €8.994,31.
Para tanto, alega que o Réu é a entidade gestora de um fundo de pensões do qual é beneficiário, tendo cumprido com o pagamento ao longo da sua vida activa no valor de 0,5% da sua retribuição. Pugna pelo facto de, tendo passado à reforma, ter o direito a receber as pensões previstas no contrato, que correspondem à diferença entre a pensão correspondente à retribuição líquida que o CTA auferiria se permanecesse ao serviço com as mesmas funções e categoria que desempenhava quando se aposentou, e a pensão paga pelos organismos oficiais.
Refere que a Réu cumpriu esta obrigação até 2010. Porém, nos anos de 2011 a 2016 não o fez, na medida em que não pagou, a título de pensão complementar, as quantias que foram retiradas em sede de CES (contribuição extraordinária de solidariedade). Peticiona assim a diferença entre o que foi pago e o que deveria ter sido pago, com inclusão do CES, e os juros de mora sobre tal.
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Legalmente citada, a Ré contestou, tendo sido arguida a excepção de incompetência do tribunal, que foi julgada procedente e considerado o tribunal de trabalho como sendo o competente. Excepciona ainda a ilegitimidade, excepção que veio a ser julgada improcedente.
Em sede de impugnação refere que as contribuições a cargo do sindicato e dos participantes são fixas mas as que estão a cargo dos associados CCC são variáveis porque são as que são necessárias adicionar às do sindicato e participantes para permitirem o pagamento dos benefícios. Postula que a pensão complementar a cargo do fundo corresponde à diferença entre a pensão bruta, correspondente ao valor da retribuição líquida que o CTA auferiria se permanecesse ao serviço e a pensão mensal da CGA ou CNP ilíquida. Assim, o único valor líquido que se atende é o valor da retribuição do CTA no activo. E refere que tal assim sucede porque o objectivo do Fundo é precisamente o de atribuir ao beneficiário um complemento de pensão que, na soma das duas pensões (do estado e do fundo), corresponda ao valor líquido do vencimento que o beneficiário teria. Mais refere que o pressuposto foi sempre o de impender sobre a pensão apenas o IRS, e sobre as remunerações ilíquidas o IRS e as contribuições para a segurança social. Ora, refere que o Autor pretende incluir no cálculo da pensão bruta relevante da “PB”, além dos impostos, a CES. A CES resultou de uma medida do orçamento de estado, que importou uma redução de vencimentos e pensões de determinado valor. E tal reverte a favor da Segurança social ou da CGA, sendo deduzida pelas entidades pagadoras dessas pensões, conforme resulta da lei 55-A/2010, de 31 de Dezembro. Sustenta que a CES foi criada com o intuito de reduzir a despesa, tal como já decidiu o tribunal constitucional e foi uma medida temporária. Alega que, quer o elemento literal do contrato constitutivo, quer o elemento racional ou teleológico, determinam que a CES não deve ser incluída na parcela PB até porque o CES é uma parcela que incide sobre a fase do pagamento. Por outro lado, a CES é um valor suportado pelos beneficiários dos pagamentos, foi instituído com esse fim, e não deve pois ser suportado pelo fundo de pensões ou associados pois o propósito foi reduzir, em termos efectivos, a despesa directa ou indirecta do estado. Ora, a CCC é uma empresa pública que integra o sector empresarial do estado donde não faria sentido o Estado cobrar CES aos beneficiários e estes terem um aumento do complemento de pensão acrescido do valor da CES acrescido do valor da pensão pois o objectivo foi diminuir a despesa. Conclui assim pela improcedência da acção.
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O Autor pediu a intervenção, como Réu, na acção, do CCC, e pugna pela improcedência das excepções invocadas pela Ré.
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Foi indeferida a intervenção principal requerida.
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Não foi realizada audiência prévia e foi dispensada a fixação dos temas da prova.
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Foi proferido despacho saneador, o qual conheceu da validade e regularidade da instância e foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade, com o esclarecimento de que “retifica-se a presente ação no sentido de ficar claro que a R. é, efetivamente a BBB  porém que o faz em representação do CCC e não em nome próprio.”
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Foi realizado julgamento com observância do legal formalismo.
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A sentença julgou a acção improcedente, com  a absolvição da Ré do pedido.
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Inconformado, o Autor interpôs recurso, concluindo nas suas alegações que
(…)  *                            
A Ré apresentou contra-alegações, concluindo pela improcedência do recurso.
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O Exmo Procurador-Geral Adjunto, junto deste Tribunal da Relação, apôs visto no processo.
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Os autos foram aos vistos aos Exmos Desembargadores Adjuntos.
Cumpre apreciar e decidir
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II – Objecto
Tendo em consideração as conclusões apresentadas no recurso, cumpre decidir se a sentença é nula, e se o tribunal a quo errou ao considerar que, no CCC,  no cálculo da pensão bruta relevante para determinação do valor da PB, não deve incidir também a Contribuição Extraordinária de Solidariedade.
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III – Fundamentação
São os seguintes os factos considerados provados pela primeira instância
1. Em 31/7/1999 foi celebrado o contrato constitutivo do CCC, com duração por tempo indeterminado, no qual são associados a … e o Sindicato …, em termos que constam de fls. 7 a 14 dos autos.
2. Tal contrato constitutivo veio a ser alterado (parcialmente) pelas partes em 15/3/2012, em termos que constam de fls. 14v a 21 dos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
 3. A BBB é a sociedade gestora do dito fundo.
 4. O Autor exerceu as funções de controlador aéreo por conta, sob as ordens e direcção da …, mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado celebrado em data anterior a 30/9/2007, estando abrangido pelo acordo de empresa de CTA e aderiu ao plano de pensões.
 5. Durante a sua vida activa foi “Participante” deste Fundo, tendo contribuído mensalmente para o respectivo financiamento com um montante correspondente a 0,5% da sua retribuição total.
 6. Quando passou à situação de aposentado, passou a “Beneficiário” de tal Fundo de Pensões, nos termos definidos no art. 1º al. d), continuando a contribuir mensalmente com um montante correspondente a 0,5% da sua pensão de reforma.
 7. Quando passou à situação de reforma e, enquanto beneficiário, passou a ter o direito ao recebimento das pensões previstas nos planos de pensões constantes do contrato.
 8. O Autor é pensionista da CGA.
 9. Ao longo dos anos (2011 e 2016), a Caixa Geral de Aposentações, descontou relativamente à pensão de reforma do Autor as quantias legalmente previstas a título de Contribuição Extraordinária de Solidariedade conforme no quadro infra:
Autor CGA futuro
total
CES 2011 3054,66 0,00 3054,66
CES 2012 5813,66 1214,99 7028,65
CES 2013 10144,96 4165,12 14310,08
CES 2014 10815,31 4582,48 15397,79
CES 2015 4670,01 2203,18 6873,19
CES 2016 2675,28 1377,36 4052,64 37173,88 13543,13 50717,01;
 10. Nos anos de 2012 a 2016 o CCC reteve ao Autor sobre a pensão recebida os valores que constam de fls. 28 verso (ano 2012), 30 verso (ano 2013), 36 (ano 2015), 40 (ano 2014) e 43 verso (ano 2016) e nos termos que das mesmas constam e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.”.
 11. O … , associado do … é uma entidade pública empresarial, inserida no sector empresarial do Estado.
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IV – Apreciação do Recurso
A – Da nulidade da sentença
Invoca o recorrente a nulidade da sentença, alegando que a causa de pedir nos autos é o (in)cumprimento contratual do artigo 25º da alteração do Fundo de Pensões, questão sobre a qual a presente sentença é, na prática, totalmente omissa, invocando o vício previsto no artigo 615º nº1 d) do CPC.
Basta uma simples leitura da sentença para se verificar que a mesma incidiu sobre o disposto no artigo 25º supra referido.
O que está em causa e é invocado pelo recorrente corresponde àquilo que o mesmo considera ser um erro de julgamento, mas não a uma nulidade da sentença, por omissão de pronúncia.
Improcede, assim, a alegada nulidade.
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B – Se no CCC, o cálculo da pensão bruta relevante para determinação do valor da PB, deve incidir também a Contribuição Extraordinária de Solidariedade.
É a seguinte a fundamentação da sentença recorrida: “Em 2011 surgiu o CES, uma contribuição especial que se tornou necessária em face da conjuntura económica então vivida e que durou até 2016.
A questão de saber se esta contribuição era inconstitucional ficou há muito resolvida e o seu cariz constitucional e imperativo mesmo sobre as pensões privadas ficou assente na lei de orçamento de estado na Lei 20/2012, de 14 de maio.
Saber se o CES tem de ser suportado pelo Fundo ou pelo beneficiário passa por saber se esta contribuição deve incidir no cálculo da pensão bruta relevante para determinação do valor “PB”.
Atentemos então no contrato constitutivo do Fundo cuja fonte de atribuição da pensão e desse cálculo assenta no art. 25º que ora citamos.
“1. A partir da data em que os Participantes passem à situação de reforma, de aposentação ou de invalidez, o Fundo pagará mensalmente aos beneficiários uma pensão complementar igual à diferença entre a pensão correspondente à retribuição líquida que o CTA auferiria se permanecesse ao serviço com as mesmas funções e categoria daquelas que desempenhava quando se reformou ou aposentou, e a pensão paga pelos organismos oficiais.
PCf = PB – PSS
PCf = Pensão Complementar a cargo do Fundo
PB = Pensão Bruta correspondente à retribuição líquida que o CTA [Controlador de Tráfego Aéreo] auferiria se permanecesse ao serviço com as mesmas funções e categoria (Pensão líquida = retribuição líquida)
PSS = Pensão mensal da CGA ou do CNP, ilíquida, consoante o regime a aplicar.
2.As diferenças referidas no número anterior são calculadas todos os anos e devidas, quando for caso disso, com efeitos a 1 de Janeiro de cada ano, em relação aos beneficiários que tenham as contribuições para o Fundo em dia, devendo ser pagas, no que respeita aos beneficiários da Caixa Geral de Aposentação e, no mês imediato à Receção da informação da atualização da pensão de aposentação e no que respeita aos beneficiários da Segurança Social a partir do momento em que seja rececionada a informação da atualização da pensão de reforma por velhice”.
Não se pode olvidar que o CES foi uma contribuição extraordinária de natureza excecional e transitória sendo indubitável que o seu escopo foi reduzir a despesa direta ou indireta do estado. Incidia sobre os pensionistas, de acordo com determinados escalões, não abrangendo os trabalhadores no ativo. O escopo deste imposto foi já afirmado, e cumpre mencionar que visava ser suportado pelos próprios beneficiários. E este facto tem a sua relevância quando se pensa que o responsável pelo financiamento deste Fundo é uma entidade jurídica dependente da tutela do estado.
Ao incidir apenas sobre os pensionistas o CES cria uma situação de desigualdade entre estes e os do ativo. E não há dúvidas que isso não foi previsto aquando do pacto constitutivo.
Porém, a norma (art. 162º da Lei 55-A/2010, de 31 de dezembro) é clara e prevê que os pensionistas se encontram sujeitos a este imposto. Donde, se o Fundo tivesse de suportar o pagamento do imposto quando os demais pensionistas o suportaram tal criaria uma desigualdade para com os demais.
Efetivamente não faria sentido ser o Fundo a suportar um imposto que visou ser suportado no momento do pagamento e pelo beneficiário pensionista, não abatendo senão ao valor a receber pelo pensionista, e igualmente não faria sentido que o estado suportasse este pagamento (pois a CCC pertence ao sector empresarial do estado) quando o objetivo é precisamente a diminuição da despesa do Estado.
Donde, estamos em crer que o elemento teleológico tem de se sobrepor e conduz a que o CES seja suportado pelo beneficiário e não pelo CCC, entrando na fase do pagamento e não a cargo do Fundo.
Por outro lado tem razão o R. quando refere que a se entender de outro modo tal geraria um circulo vicioso pois o valor da pensão acrescido de CES geraria um pensão de valor superior e determinaria um valor superior de CES que por sua vez teria que ser considerado no cálculo do complemento.
Em suma o CES não foi previsto aquando da constituição do CCC, por não existir, porém o que se pretende do mesmo não pode ser olvidado e nessa medida tem o mesmo de ser suportado pelo beneficiário do fundo de pensões e não por este.
E nessa medida improcede a presente ação.
Vejamos
A Lei 55-A/2010, de 31 de Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2011, adoptou uma série de medidas de redução remuneratória (veja-se, a título expressivo, o artigo 19º). Nomeadamente, foi estabelecida uma Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES) de 10% sobre as reformas, pensões, subvenções e outras, cujo valor mensal não fosse superior a 5.000€, calculado sobre a parte que excedesse esse valor, a qual abrangia o somatório de todas as pensões de aposentação, de reformas e equiparadas e subvenções mensais vitalícias pagas pela CGA, CNP e por quaisquer entidades públicas – “Artigo 162.º
Contribuição extraordinária de solidariedade
1 - As reformas, pensões, subvenções e outras prestações pecuniárias de idêntica natureza, pagas a um único titular, cujo valor mensal seja superior a (euro) 5000 são sujeitas a uma contribuição extraordinária de 10 %, que incide sobre o montante que excede aquele valor.
2 - O disposto no número anterior abrange a soma das pensões e aposentação, de reforma e equiparadas e as subvenções mensais vitalícias pagas pela CGA, I. P., pelo Centro Nacional de Pensões e, directamente ou por intermédio de fundos de pensões, por quaisquer entidades públicas, independentemente da respectiva natureza e grau de independência ou autonomia, nomeadamente as suportadas por institutos públicos, entidades reguladoras, de supervisão ou controlo, e empresas públicas, de âmbito nacional, regional ou municipal.
3 - A contribuição prevista no presente Artigo reverte a favor da segurança social, no caso das pensões pagas pelo Centro Nacional de Pensões, e a favor da CGA, I. P., nas restantes situações, sendo deduzida pelas entidades referidas no número anterior das pensões por elas abonadas.
4 - O beneficiário de reformas, pensões, subvenções e outras prestações pecuniárias, a que se refere o n.º 1, presta as informações necessárias para que os órgãos e serviços processadores possam dar cumprimento ao disposto no presente Artigo.
Para o ano de 2012 - alteração à Lei 64-B/2011, de 30 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2012) – foi alargada a base de incidência da CES – “Artigo 22.º
Disposição complementar
1 - O disposto no n.º 15 do artigo 20.º e no artigo 25.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, e nos n.ºs 2 e 3 do artigo 162.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, que se mantém em vigor nos termos do n.º 1 do artigo 20.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, abrange todas as pensões pagas a qualquer título, nomeadamente pensões de sobrevivência, subvenções e prestações pecuniárias equivalentes que não estejam expressamente excluídas por disposição legal.
2 - Para efeitos de aplicação do disposto no n.º 15 do artigo 20.º e nos n.ºs 1 e 2 do artigo 25.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, considera-se a soma de todas as pensões, subvenções e prestações referidas no número anterior da mesma natureza, percebidas pelo mesmo titular.
3 - Para efeitos do disposto no número anterior, considera-se que têm a mesma natureza, por um lado, as pensões, subvenções e prestações atribuídas por morte e, por outro, todas as restantes, independentemente do ato, facto ou fundamento subjacente à sua concessão.
4 - Com exceção das pensões expressamente excluídas por lei, o disposto no n.º 15 do artigo 20.º e no artigo 25.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, abrange todos os aposentados, reformados, pré-aposentados ou equiparados que recebam as pensões e ou os subsídios de férias e de Natal ou quaisquer prestações correspondentes aos 13.º e ou 14.º meses, pagos pelas entidades referidas no n.º 1 do artigo 25.º da referida lei, independentemente da natureza pública ou privada da entidade patronal ao serviço da qual efetuaram os respetivos descontos ou contribuições ou de estes descontos ou contribuições resultarem de atividade por conta própria. (…)” – e estabelece que o regime do CES tem natureza imperativa.
Nos termos do artigo 78º nº3 da Lei 66-B/2012, “3 - O disposto nos números anteriores abrange, além das pensões, todas as prestações pecuniárias vitalícias devidas a qualquer título a aposentados, reformados, pré-aposentados ou equiparados que não estejam expressamente excluídas por disposição legal, incluindo as atribuídas no âmbito do sistema complementar, designadamente no regime público de capitalização e nos regimes complementares de iniciativa coletiva, independentemente:
a) Da designação das mesmas, nomeadamente pensões, subvenções, subsídios, rendas, seguros, indemnizações por cessação de atividade, prestações atribuídas no âmbito de fundos coletivos de reforma ou outras, e da forma que revistam, designadamente pensões de reforma de regimes profissionais complementares;
b) Da natureza pública, privada, cooperativa ou outra, e do grau de independência ou autonomia da entidade processadora, nomeadamente as suportadas por institutos públicos, entidades reguladoras, de supervisão ou controlo, empresas públicas, de âmbito nacional, regional ou municipal, caixas de previdência de ordens profissionais e por pessoas coletivas de direito privado ou cooperativo, designadamente:
i) Centro Nacional de Pensões (CNP), no quadro do regime geral de segurança social;
ii) Caixa Geral de Aposentações (CGA), com exceção das pensões e subvenções automaticamente atualizadas por indexação à remuneração de trabalhadores no ativo, que ficam sujeitas às medidas previstas na presente lei para essas remunerações;
iii) Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS);
iv) Instituições de crédito, através dos respetivos fundos de pensões, por força do regime de segurança social substitutivo constante de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho vigente no setor bancário;
v) Companhias de seguros e entidades gestoras de fundos de pensões;
c) Da natureza pública, privada ou outra da entidade patronal ao serviço da qual efetuaram os respetivos descontos ou contribuições ou de estes descontos ou contribuições resultarem de atividade por conta própria, bem como de serem obrigatórios ou facultativos;
d) Do tipo de regime, legal, convencional ou contratual subjacente à sua atribuição, e da proteção conferida, de base ou complementar.”
As leis referentes aos Orçamento do Estado para 2013 a 2016 contêm normas idênticas – cfr art. 78º da  Lei 66-B/2012, de 31 de Dezembro (Orçamento Estado 2013), art. 76º da Lei 83-C/2013, de 31 de Dezembro (Orçamento Estado 2014), art.79º da Lei 82-B/2014, de 31 de Dezembro (Orçamento Estado 2015) e 20º nº6 da Lei 7-A/2016 de 30 de Março (Orçamento Estado 2016).
O objectivo legal da contribuição CES, foi o de, naturalmente, reduzir a despesa directa ou indirecta do Estado, neste caso, reduzir as pensões pagas, estando pois em causa razões de interesse público que justificam estas normas excepcionais e transitórias, face à situação, também ela excepcional, ao nível económico, que o país atravessava.
A Empresa … E. P. foi criada pelo Decreto-Lei 404/98 de 18-12.
Quanto à sua natureza, rege o artigo 4º “Natureza da …, E. P.
1 - A ..., E. P., é uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira e de património próprio, estando sujeita à tutela e superintendência dos Ministros das Finanças e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.
2 - A …, E. P., exerce os poderes e prerrogativas do Estado que lhe são conferidos por lei ou pelo seu Estatuto, sem prejuízo das competências tutelar e de superintendência cometidas por este ou outros diplomas aos órgãos do Estado.
3 - A …, E. P., assume os direitos e responsabilidades atribuídos ao Estado relativamente aos bens do domínio público sob sua administração, nos termos das disposições legais aplicáveis.
4 - Consideram-se abrangidos pelo disposto nos n.ºs 2 e 3 os poderes do Estado quanto:
(…)
6 - A contratação de fornecimentos poderá ser feita pela empresa segundo um regime de direito público, sempre que o justifiquem a sua dimensão, preço ou importância.
Artigo 5.º
Objecto da …, E. P.
1 — À …, E. P., caberá a prestação do serviço público, em moldes empresariais, relativo à exploração e desenvolvimento das infra-estruturas e dos serviços de apoio à navegação aérea, designadamente a gestão do tráfego aéreo em todas as suas vertentes e o desenvolvimento, instalação, gestão e exploração dos inerentes sistemas de comunicações, navegação, vigilância e infra-estruturas associadas e actividades conexas, em cumprimento das normas de convenções internacionais ou de organizações internacionais da aviação civil de que Portugal seja respectivamente subscritor e Estado membro. (…)
Artigo 6.º
Transferência de direitos e obrigações
1 — Por efeito da cisão da …E. P., operada pelo presente diploma, são transferidos para a …, E. P., todos os direitos e obrigações, de qualquer fonte e natureza, incluindo as posições contratuais de que era titular a …, E. P., na área das atribuições referidas no artigo anterior.
2 — As infra-estruturas e sistemas associados referidos no n.º 2 do artigo anterior, e bem assim todos os bens, direitos e obrigações do domínio privado do Estado ou de natureza patrimonial com eles relacionados, são transferidos para a …, E. P., sem alteração de regime.
3 — A …, E. P., não está sujeita às regras de administração e alienação a que estão sujeitos os bens e direitos do domínio privado do Estado.
4 — Até ao termo dos correspondentes contratos, o Estado mantém perante as instituições financeiras ou outras que celebraram os contratos cujas posições são transferidas para a …, E. P., nos termos do n.º 1, as mesmas relações de suporte, designadamente financeiro, não podendo o presente diploma ser considerado alteração de circunstâncias para efeitos de tais contratos.
Artigo 7.º
Património destacado por força da cisão
1 — O património inicial da …, E. P., é constituído pelos seguintes bens, direitos e obrigações destacados da … S. A., por efeito do presente diploma:
a) Todos os elementos patrimoniais que correspondem à universalidade de bens, direitos e obrigações relacionados, directa ou indirectamente, com as infra-estruturas e sistemas de navegação aérea indicados nas alíneas a) e b)
do n.º 2 do artigo 5.º e que à data da cisão se encontram na esfera da …, E. P., afectos à prossecução do serviço público de navegação aérea para apoio à aviação civil;
b) Todos os demais elementos patrimoniais com aptidão para a prossecução do serviço público e navegação aérea para apoio à aviação civil  que sejam incluídos na lista a que se refere  alínea b) do n.º 3 do artigo 26.º
2 — O destaque patrimonial previsto no número anterior compreende a transferência para a administração da …, E. P., sem alteração do seu regime, dos bens do domínio público que à data da cisão sejam da administração da …, E. P., e que se encontrem afectos à prossecução do serviço público de navegação aérea para apoio à aviação civil tal como definido no artigo 5.º do presente diploma, bem como aqueles que, tendo aptidão para esse fim, sejam incluídos na lista a que se refere o número anterior.
3 — A identificação dos bens e direitos que constituem o património inicial da …, E. P., constará da lista a que se refere a alínea b) do n.º 1, a aprovar por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e o Equipamento, do Planeamento e da Administração o Território.
Artigo 8.º Taxas de rota
 Sem prejuízo do demais estabelecido no Estatuto da …, E. P., quanto aos proveitos da empresa, o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 461/88, de 14 de Dezembro, passa a ter a seguinte redacção: «Artigo 4.º 1 — Os montantes relativos às taxas de rota cobradas pelo eurocontrol e correspondentes aos voos efectuados no espaço aéreo das regiões de informação de voo sob jurisdição do Estado Português constituem receitas da Empresa Pública Navegação Aérea de Portugal, …, E. P., nos termos do respectivo Estatuto. 2 — As quantias devidas à …, E. P., nos termos do número anterior e para efeitos de reembolso, serão deduzidas da remuneração que for devida ao eurocontrol, nas condições definidas por esta organização, de acordo com o artigo 20.º do Acordo, que vinculem internacionalmente o Estado Português
ANEXO I
ESTATUTOS DA … E. P.
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Natureza, denominação, sede e duração
1 — A Empresa …, designada abreviadamente por …, E. P., é uma pessoa colectiva de direito público dotada de autonomia administrativa e financeira e de património próprio. (…)
Artigo 2.º
Legislação aplicável
A …, E. P., rege-se pelas normas legais que lhe sejam especialmente aplicáveis, pelos presentes Estatutos e respectivos regulamentos de execução, observando-se nos casos omissos o Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de Abril, e a demais legislação aplicável às empresas públicas e, na sua falta, as normas de direito privado, salvo relativamente a actos de autoridade ou cuja natureza implique o recurso a normas de direito público.
Artigo 5.º
Conselho de administração
1 — O conselho de administração é composto por um presidente e quatro vogais nomeados e exonerados pelo Conselho de Ministros, sob proposta do Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território. (…)
Artigo 6.º
Competência
1 — Ao conselho de administração compete, em geral, o exercício de todos os poderes necessários para assegurar a gestão e o desenvolvimento da empresa e a administração dos bens afectos à actividade da …, E. P., sem prejuízo dos poderes da tutela.
2 — Compete em especial ao conselho de administração:
(…)
s) Assegurar, relativamente às actividades exercidas pela empresa, a participação em associações ou organismos nacionais e internacionais relacionados com as mesmas e assegurar ou garantir, junto daquelas associações ou organismos ou em qualquer país, a representação do Estado
Português sempre que lhe seja solicitada pelo Governo.
3 — O conselho de administração necessita de parecer favorável da comissão de fiscalização para obrigar a empresa, por empréstimo ou outra forma de financiamento, interno ou externo, por prazo superior a 10 anos.
(…)
Artigo 11.º
Comissão de fiscalização
1 — A comissão de fiscalização é composta por três membros, um dos quais presidirá, designados por períodos de três anos, por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da tutela, e mediante o processo de nomeação previsto na lei, contando-se como completo o ano civil em que tenham sido designados. (…)
12º Competência e funcionamento
2 — Trimestralmente, a comissão de fiscalização deve enviar ao Ministro das Finanças e ao ministro da tutela um relatório sucinto em que refira os controlos efectuados e as anomalias detectadas, assim como os principais desvios verificados em relação aos orçamentos e respectivas causas.
CAPÍTULO III
Intervenção do Governo
Artigo 13.º
Finalidade e âmbito
Sem prejuízo da autonomia legal e estatutária conferida à empresa, cabe ao Governo definir os objectivos gerais a prosseguir pela …, E. P., e o enquadramento no qual se deve desenvolver a respectiva actividade, de modo a assegurar a sua harmonização com as políticas globais e sectoriais nos termos definidos na lei e ainda com as políticas e orientações no âmbito da navegação aérea definidas pelos organismos ou organizações internacionais em que Portugal esteja representado ou seja Estado membro.
Artigo 14.º
Tutela económica e financeira
A tutela económica e financeira da …, E. P., é exercida pelo Ministro das Finanças e pelo ministro da tutela e compreende:
a) A definição dos objectivos básicos a prosseguir pela empresa, designadamente para efeitos de preparação dos planos de investimentos e financiamentos e dos orçamentos;
b) O poder de exigir todas as informações e documentos julgados úteis para acompanhar a actividade da empresa;
c) O poder de determinar inspecções ou inquéritos ao funcionamento da empresa ou a certos aspectos deste, independentemente da existência de
indícios de prática de irregularidades;
d) O poder de autorizar ou aprovar:
I) Os planos de investimento e respectivos planos de financiamento;
II) Os orçamentos anuais de exploração, de investimento e financeiros, bem como as respectivas actualizações que impliquem reduções de resultados previsionais e acréscimo de despesas de investimento;
III) Os documentos relativos à prestação de contas, aplicação de resultados, constituição e utilização de reservas;
IV) As taxas aeronáuticas que forem devidas pela prestação do serviço público assegurado pela empresa;
V) A política geral de preços e taxas proposta pelo conselho de administração, a praticar na exploração das actividades não incluídas no número anterior;
VI) A contratação de empréstimos em moeda nacional, por prazo superior a 10 anos, ou em moeda estrangeira, bem como a emissão de obrigações, estabelecendo as respectivas condições gerais;
VII) A aquisição ou alienação de partes do capital de outras sociedades por valores superiores a 5% do capital próprio;
VIII) Os princípios a que deve obedecer a reavaliação do activo e os respectivos coeficientes, bem como os critérios de reintegração e amortização dos bens;
IX) As dotações para capital e outras verbas a conceder pelo Orçamento do Estado e fundos autónomos;
X) Os contratos-programa e os contratos de gestão;
XI) Os demais actos que, nos termos da legislação aplicável, necessitem de autorização tutelar.
CAPÍTULO IV
Gestão patrimonial e financeira e regime de exploração
Artigo 15.º
Princípios de gestão
1 — A gestão patrimonial e financeira da …, E. P., deve realizar-se por forma a assegurar a sua viabilidade económica e o seu equilíbrio financeiro, devendo aplicar as regras legais, o disposto nestes Estatutos e os princípios da boa gestão empresarial.
2 — Sempre que se verifiquem as situações previstas no n.º 3 do artigo 3.º destes Estatutos, o Estado poderá compensar a empresa pelos encargos ou redução de receitas daí resultantes.
(…)
Artigo 18.º
Capital estatutário
1 — O capital estatutário inicial da NAV, E. P., é fixado em 5 000 000 000$.
2 — O capital estatutário poderá ser reforçado com as dotações que como tal forem inscritas no Orçamento do Estado.
3 — O capital estatutário pode ser aumentado por entradas patrimoniais ou por incorporação de reservas.
4 — O capital estatutário só pode ser aumentado ou reduzido por decisão do Ministro das Finanças e do ministro da tutela, nos termos do n.º 3 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de Abril.
(…)
CAPÍTULO V
Agrupamento, fusão, cisão e liquidação
Artigo 25.º
Agrupamento
A …, E. P., pode agrupar-se com outras empresas públicas ou estabelecer outras formas de cooperação, mediante autorização do Governo.
Artigo 26.º
Fusão, cisão e liquidação
A fusão, cisão ou liquidação da …, E. P., são actos da competência do Governo, sendo-lhes aplicável o regime previsto no Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de Abril.
Artigo 16.º
Capital social e acções
1 - A …, S. A., tem um capital social inicial de 15000000000$00, o qual se encontra integralmente subscrito e realizado pelo Estado, pelos valores que integram o património da sociedade.
2 - As acções representativas do capital da …, S. A., pertencentes ao Estado serão detidas pela Direcção-Geral do Tesouro, podendo a sua gestão ser cometida, por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, a uma pessoa colectiva de direito público ou a entidade que, por imposição legal, pertença ao sector público.
3 - Os direitos do Estado como accionista da …, S. A., são exercidos por um representante designado por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, salvo quando a gestão das acções tenha sido cometida a outra entidade nos termos do n.º 2.
Em 31-07-1999, entre a Empresa …. EP, o Sindicato …, e a BBB, foi constituído o CCC, tendo por finalidade exclusiva o pagamento de pensões vitalícias de reforma e aposentação, invalidez e sobrevivência, de acordo com a Plano estabelecido em tal contrato (cfr. art. 2º)
Nos termos do Acordo, o Fundo seria financiado, nomeadamente, “Pela entrega ao CCC, pela … EP, do montante de Esc.6.007.889.00$00”(…) – art. 3º nº2 c).
A …, EP é associada do fundo – art. 1º b).
O património do Fundo será integrado pelo valor de determinadas entradas, nomeadamente, pelas contribuições a realizar pelos associados.
A associada …, EP, contribui mensalmente para o financiamento do Fundo com 24,8% da massa salarial total dos CTA´s Participantes, que, sendo subscritores da Caixa Geral de Aposentações, mantém vínculo laboral válido com a empresa, e com 4,2% da massa salarial total dos CTA,s Participantes que, sendo subscritores do Centro Nacional de Pensões ou da caixa Nacional de Aposentações mantém vínculo laboral válido com a empresa (art. 5º), para além da contribuição especial a que se refere o arrigo 11º.
O contrato constitutivo do Fundo foi alterado em 15-03-2012, mantendo-se como associados a …, EPE e o …, e mantendo a mesma finalidade (art. 2º).
Nos termos do artigo 5º  - “Contribuições dos Associados – 1. A Associada …., EPE contribui para o financiamento do Fundo com um montante necessário para o integral cumprimento das responsabilidades decorrentes do Plano de Pensões, sendo estas reavaliadas anualmente através de um estudo actuarial.
(…)”
Artigo 7º “Processamento das Contribuições – 1.As contribuições da Associada … EPE são entregues à entidade gestora na data de processamento das retribuições aos CTA´s Participantes.
2.As contribuições dos Participantes previstas no nº1 do art.6º são retidas e entregues à entidade gestora pela Associada …., EPE na data de processamento das respectivas retribuições. (…)”
É verdade que o Fundo de Pensões a que se referem os autos prevê, no seu artigo 25º, que ““1. A partir da data em que os Participantes passem à situação de reforma, de aposentação ou de invalidez, o Fundo pagará mensalmente aos beneficiários uma pensão complementar igual à diferença entre a pensão correspondente à retribuição líquida que o … auferiria se permanecesse ao serviço com as mesmas funções e categoria daquelas que desempenhava quando se reformou ou aposentou, e a pensão paga pelos organismos oficiais.
PCf = PB – PSS
PCf = Pensão Complementar a cargo do Fundo
PB = Pensão Bruta correspondente à retribuição líquida que o CTA [Controlador de Tráfego Aéreo] auferiria se permanecesse ao serviço com as mesmas funções e categoria (Pensão líquida = retribuição líquida)
PSS = Pensão mensal da CGA ou do CNP, ilíquida, consoante o regime a aplicar.
2.As diferenças referidas no número anterior são calculadas todos os anos e devidas, quando for caso disso, com efeitos a 1 de Janeiro de cada ano, em relação aos beneficiários que tenham as contribuições para o Fundo em dia, devendo ser pagas, no que respeita aos beneficiários da Caixa Geral de Aposentação e, no mês imediato à Receção da informação da atualização da pensão de aposentação e no que respeita aos beneficiários da Segurança Social a partir do momento em que seja rececionada a informação da atualização da pensão de reforma por velhice”.
Num caso como o presente, não podemos, contudo, ater-nos ao elemento literal de interpretação da norma.
A interpretação jurídica tem por objecto descobrir, de entre os sentidos possíveis da lei, o seu sentido prevalente ou decisivo, sendo o art. 9º do Cód. Civil, a norma fundamental a proporcionar uma orientação legislativa para tal tarefa.
É certo que a apreensão literal do texto, ponto de partida de toda a interpretação, é já interpretação, embora incompleta, pois será sempre necessária uma tarefa de interligação e valoração, que excede o domínio literal[1].
Nesta tarefa de interligação e valoração que acompanha a apreensão do sentido literal, intervêm elementos lógicos, apontando a doutrina elementos de ordem histórica e racional ou teleológica e sistemática.[2] Ou seja, o sistema normativo não constitui uma realidade estanque, antes dinâmica, “não devendo a interpretação cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.” (art. 9º nº1). “Não pode , porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.” (nº2).
Devemos, assim, recorrer, entre outros, aos elementos teleológico e sistemático de interpretação.
O elemento sistemático de interpretação compreende a consideração de outras disposições que formam o complexo normativo do instituto em que se integra a norma interpretada, isto é, que regulam a mesma matéria (contexto da norma), assim, como a consideração de disposições legais que regulam problemas normativos paralelos ou institutos afins (lugares paralelos). Compreende ainda o lugar sistemático que compete à norma interpretanda no ordenamento global, assim como a sua consonância com o espírito ou unidade intrínseca de todo o ordenamento jurídico.
O elemento racional ou teleológico consiste na razão de ser da norma (ratio legis), no fim visado pelo legislador ao editar a norma, nas soluções que tem em vista e que pretende realizar.
Volvendo ao presente caso, e tendo presentes estes considerandos, cumpre atentar que
- não há dúvidas em como as Leis do Orçamento do Estado entre 2011 e 2016, estabeleceram normas destinadas à redução da despesa, entre elas a contribuição extraordinária de solidariedade, sobre as pensões, que atingiu a pensão do Autor, e visa ser suportada no momento do pagamento e pelo beneficiário pensionista;
- essas normas dos OE têm carácter excepcional e imperativo;
- a … é associada do Fundo a que se referem os autos;
- a  … é uma empresa pertencente ao sector empresarial do Estado, financiada e tutelada pelo próprio  - artigo 4º do Decreto-Lei 404/98 de 18-12, artigos 5º, 6º nº3, 11º, 13º, 14º, 18º nº2 e 4 , 25º e 26º do Estatuto da Nav.
Portanto, e apelando aos elementos sistemático e racional de interpretação, tal como afirma a primeira instância, e compaginando as normas excepcionais vertidas nos Orçamentos do Estado, com a natureza da  … e com o disposto no artigo 25º do Fundo de Pensões, não podemos admitir a hipótese de o Fundo do qual a  … é associada, suportar um complemento destinado a reduzir a despesa do Estado, quando a  …  pertence ao sector empresarial do estado. Seria deixar sair pela janela o que não se deixou sair pela porta.
E, portanto, improcede o recurso interposto pelo Autor.
*
V – Decisão
Face a todo o exposto, o Tribunal decide julgar improcedente o presente recurso de apelação interposto por AAA, e confirmar a sentença recorrida.
Custas a cargo da Apelante.
Registe.
Notifique.
*
Lisboa, 2021-11-10
Paula de Jesus Jorge dos Santos
Filomena Manso)
Duro Mateus Cardoso
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[1] Oliveira Ascensão, “O Direito, Introdução e Teoria Geral”, 11.ª edição, revista,Almedina, 2001, pág. 392.
[2] Karl Larenz, “Metodologia da Ciência do Direito”, 3.ª edição, tradução, págs. 439 a 489, Baptista Machado, “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, 12.ª reimpressão, Coimbra, 2000, págs. 175 a 192; Francesco Ferrara, “Interpretação e Aplicação das Leis”, tradução de Manuel Andrade, 3.ª edição, 1978, págs. 138 e seguintes.