APOIO JUDICIÁRIO
NOMEAÇÃO DE PATRONO
PRAZO EM CURSO
INTERRUPÇÃO
DOCUMENTO COMPROVATIVO
ÓNUS PROCESSUAL
Sumário

I - Mesmo que apresentado pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, na pendência de ação judicial, o prazo que, então, nela estiver em curso apenas se interrompe com a junção, a tal ação, de documento a comprovar a apresentação do requerimento a promover o procedimento administrativo, junto da segurança social, nos termos do nº4, do artigo 24º, da Lei nº 34/2004, de 29 de julho;
II - É sobre o Réu/Requerido, que pretenda a interrupção do prazo em curso, que impende o ónus da junção aos autos de tal documento comprovativo da apresentação do referido pedido junto dos serviços da segurança social;
III - Decorrido que se mostre, já, no momento da junção de documento comprovativo da apresentação do pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, na pendência de ação judicial, o prazo, precludido se encontra o direito que pretendia exercer, sendo o ato, a ser praticado, extemporâneo.
IV - Tal interpretação do preceito - lei geral e abstrata, igual para todos - não é inconstitucional, por não comprometer de modo desproporcional o direito de acesso ao direito e à justiça por parte das pessoas economicamente carenciadas, bem se justificando a solução legal por a garantia dos direitos, princípios e finalidades que enformam o regime de acesso ao direito e aos tribunais, consagrado na Lei 34/2004, de 29/7, designadamente o de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, não ser absoluta e ilimitada, antes tem de ser exercida, com responsabilidade, na observância da lei e dos ónus por ela estatuídos, que outros interesses visam acautelar (como o de evitar a prática de, proibidos, atos inúteis).

Texto Integral

Apelação n.º 823/21.7T8STS-A.P1
Processo do Juízo de Comércio de Santo Tirso - Juiz 3

Relatora: Eugénia Maria de Moura Marinho da Cunha
1º Adjunto: Maria Fernanda Fernandes de Almeida
2º Adjunto: António Eleutério

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto

Sumário (cfr nº 7, do art.º 663º, do CPC):
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I. RELATÓRIO

Recorrente: B…, CRL

B…, CRL, Requerida nos Autos de insolvência, notificada do despacho proferido em 01/06/2021, dele interpôs recurso para este Tribunal, pretendendo seja revogado e anulados os subsequentes termos do processo, apresentando alegações onde formula as seguintes
CONCLUSÕES:
1- A Recorrente apresentou, (antes de decorrido o prazo para Deduzir Oposição) em 26/05/2021, Rqto. de fls., através do qual informou que havia requerido apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, bem como a nomeação e pagamento da compensação de patrono pedindo a interrupção da contagem do prazo para tal até decisão do mesmo;
2- A Recorrente remeteu Reqto.de fls., com comprovativo do pedido de protecção jurídica apresentado e nas modalidades citadas, com pedido expresso que emerge do pedido de nomeação e pagamento da compensação de patrono, e ainda factura/recibo, emitida pelos CTT, correspondente ao pagamento do registo postal, com o n.º ………….;
3- O Tribunal “a quo”, (não obstante cota lavrada pela Secretaria referindo “ispsis verbis” que “me suscitam dúvidas a entrega do pedido de apoio judiciário formulado pela devedora, uma vez que apresenta uma fatura dos CTT, com envio de uma carta, não constando do mesmo o destinatário. Consultado o site dos CTT com a refª. da referida fatura, da qual se junta cópia, também não me foi possível esclarecer as mesmas”) em 01/06/2021, “decidiu” pela não suspensão (dizeres usados pelo Tribunal “a quo”, apesar de ali dever dizer interrupção, confusão que apenas se releva a quem não possui conhecimentos jurídicos como é o caso da Recorrente, à data a aguardar nomeação de patrono) do prazo que assiste à Recorrente para deduzir Oposição;
4-A Recorrente apresentou os Requerimentos de fls., em 04/06/2021 (referencia n.º 2911357, 29124183 e 29125527) - os dois primeiros remetidos por email em 04/06/2021, mas tendo sido o segundo deles registado no sistema em 07/06/2021, e o terceiro por correio registado), através dos quais facilmente se dissipavam todas as dúvidas eventualmente existentes, bastando comparar o n.º do registo constante da factura (………….) e o n.º do registo (………….), correspondente a carta enviada em 26/05/2021 com pedido de apoio judiciário para a ISS IP, no mesmo dia, 26/05/2021, em que se enviou o Reqto. para os autos com os elementos referidos na conclusão 1.;
5- Do Despacho em cotejo datado de 01/06/2021, não se vislumbra qual o iter percorrido pelo Tribunal “a quo” para, atentas as dúvidas suscitadas na cota de fls., sem mais, e sem qualquer fundamento – a fundamentação dos despachos, ao que se julga saber, ainda configura uma obrigação para quem os prolata -, menos ainda sem qualquer indagação para apuramento da verdade material, renegando em absoluto o que dispõe, nomeadamente o art.º 411.º do CPC, o Tribunal “a quo”, e de forma absolutamente discricionária despachou – um despacho verdadeiro e não no sentido técnico jurídico– a pretensão legitima da Recorrente, não podendo pois apreciar – de forma errada e sem fundamento- a prova remetida pela Recorrente no sentido que decidiu e colocado em crise;
6- O juiz tem o poder de realizar ou ordenar oficiosamente as diligências necessárias ao apuramento da verdade, na esteira do que resulta do Ac. TRP de 11.01.2021, disponível em www.dgsi.pt, convocando-se com assento para o presente que, «I- O uso de poderes instrutórios está sujeito aos seguintes requisitos: i) a admissibilidade do meio de prova;
ii) a sua manifestação em momento processualmente desadequado; iii) a necessidade da diligência ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio;
e iv) a prova a produzir incidir sobre factos que é lícito ao juiz conhecer», o que se impunha nos autos uma vez que, mesmo sendo sustentável não estar obrigado, a Recorrente não apenas remeteu o reqto. comprovativo do apoio judiciário, como inclusivamente a factura respectiva para prova do envio de tal Requerimento para a ISS IP, impondo-se ao Tribunal “a quo”, se dúvidas havia, indagar sobre a remessa ou existência do comprovativo do Registo, que coincidisse com o nº. do mesmo constante da factura enviada;
7-O Tribunal “a quo” interpretou erradamente o disposto no artigo 24.º, n.º 4, da Lei 34/2004, de 29 de Julho, assim como violou o princípio da igualdade das partes, o direito a um processo justo e equitativo, assim como o direito do acesso ao direito e aos Tribunais, Constitucionalmente consagrados, ut artigo 20.º, da C.R.P.;
8- Na esteira do Ac. TRC de 26/10/2020, P. 2511/19.5T8CBR-A-C1, Relator: Maria Teresa Albuquerque, in www.dgsi.pt, assim como o Ac. TRL, de 08/06/2017, P. 13177/10.8T2SNT-A.L1-2, Relator: Maria Teresa Albuquerque, in www.dgsi.pt, “a (única) razão de ser da imposição do ónus de comprovação do pedido de apoio judiciário – que se tem vindo a entender incindir sobre o requerente do apoio judiciário por ser, indiscutivelmente, ele, quem sofre a corresponde consequência desvantajosa - está no objetivo de se evitar dispêndio processual” e a interrupção do prazo em curso deve entender-se que se dá, em qualquer caso, apenas em função do pedido atempado da nomeação de patrono, o que ocorreu nos autos;
9- O Tribunal “a quo”, constatando nos autos a remessa de comprovativo do pedido de protecção jurídica apresentado e nas modalidades citadas, com pedido expresso que emerge do pedido de nomeação e pagamento da compensação de patrono, e ainda factura/recibo, emitida pelos CTT, correspondente ao pagamento do registo postal, com o n.º………….., ao decidir liminarmente pelo indeferimento da interrupção do prazo, violou o princípio da igualdade das partes a que alude genericamente o art. 4.º CPC, sem observar, tendo obrigação, que o “O tribunal deve assegurar, ao longo de todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso de meio de defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais”.
10- Igualmente, o Tribunal “a quo”, ao actuar no sentido cotejado, violou o princípio da cooperação constante do art. 7.º CPC, sendo que na cooperação «entre si» a que alude o nº 1 dessa norma resulta evidente que essa cooperação tem de se fazer sentir, até por imposição do dever de gestão processual, traduzido no dever de esclarecimento, no dever de prevenção, no dever de consultar as partes e no dever de as auxiliar na remoção das dificuldades ao exercício dos seus direitos ou faculdades, ou no cumprimento de ónus ou deveres processuais, ou seja, suscitadas dúvidas, que se hipnotiza por mero dever de oficio, impõe-se esclarecer, nomeadamente convidando a parte a juntar documento comprovativo, in casu, do registo, remetido para a ISS IP, apurando depois se o mesmo coincidia ou não com o número inserto na factura que a Recorrente remeteu comprovativa do pagamento do mesmo;
11- É cristalino, entre outros, e a propósito, da colaboração processual e prossecução da justiça, e conforme se afirma no Ac. TRP, de 07/06/2021, P. 1546/20.0T8MAI-B.P1, Relator: Ana Paula Amorim, in www.dgsi.pt “se dúvidas houvesse sobre o pedido formulado pela R. junto da ISS IP, dever-se-ia ter ordenado à R. que juntasse cópia de tal pedido ou solicitado a tal entidade a sua remessa”.
12- Atento o disposto no artigo 146.º, n.º 2, do C.P.C., “Deve ainda o juiz admitir, a requerimento da parte, o suprimento ou a correção de vícios ou omissões puramente formais de atos praticados, desde que a falta não deva imputar-se a dolo ou culpa grave e o suprimento ou a correção não implique prejuízo relevante para o regular andamento da causa.”, o que não sucedeu no caso sub-judice, desde logo por a parte não se mostrar representada por mandatário, aguardando a nomeação de patrono;
13- Compulsado o formulário do requerimento de protecção jurídica pode ler-se no ponto 5, designado por “Certificação”: “Tomei conhecimento de que devo entregar cópia do presente requerimento no tribunal onde decorre a ação, no prazo que me foi fixado na citação/notificação.”, sendo que, não consta qualquer obrigatoriedade de junção ao processo de comprovativo de entrega do requerimento, outrossim de entrega de cópia do requerimento, o que foi feito;
14- O envio da fatura/recibo dos CTT, no qual inclusive consta o n.º de registo, correspondente à missiva remetida ao ISS, IP, em lugar do registo, não se poderá imputar à parte a título de dolo ou culpa grave, tão pouco implicava qualquer prejuízo relevante para o regular andamento da causa, uma vez que a sentença só veio a ser proferida em momento posterior ao suprimento do envio do comprovativo do registo (este ocorreu em 04/06 e a sentença foi proferida em 30/06), ou seja, mesmo depois de junto o comprovativo do registo e mais, o comprovativo de ter a ISS IP recebido o pedido de apoio judiciário por parte da Recorrente, como ressalta do Reqtos. da mesma remetidos em 04/06/2021;
15- A natureza especial e célere do processo de insolvência não poderia ser guarida do Tribunal “a quo”, pois que atentas as consabidas consequências da declaração de insolvência – a Recorrente é apenas e só uma Cooperativa de Habitação Económica com todas as obrigações junto da SS, AT e trabalhadores integralmente cumpridas -, impunha-se, antes, um acrescido dever de colaboração e diligência, por parte do Tribunal, sendo certo que o próprio CIRE, ut artigo 17.º, manda aplicar subsidiariamente o C.P.C..

E notificada do, subsequente, despacho, proferido em 09/06/2021, dele interpos recurso com vista à sua revogação e à anulação dos subsequentes termos do processo, formulando, para tanto, as seguintes
CONCLUSÕES:
1- Em 26/05/2021, antes de decorrido o prazo para Deduzir Oposição, a aqui Recorrente apresentou, nos Autos, Rqto. de fls., através do qual:
a) informou que havia requerido apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, bem como a nomeação e pagamento da compensação de patrono;
b) Carreou o requerimento comprovativo do pedido de protecção jurídica apresentado e na modalidade citada;
c) Juntou factura/recibo, emitida pelos CTT, correspondente ao pagamento do registo postal do pedido de apoio judiciário, com o n.º ………….
2- Em 01/06/2021 (negrito, itálico e sublinhado nossos), foi proferido Despacho, sob a referência 425468895, no qual se “decidiu” pela não suspensão do prazo para ser deduzida Oposição por parte da Recorrente, ipsis verbis, Despacho aquele objecto de Recurso impetrado sob a referência 39618323.
3- O Tribunal “a quo” interpretou erradamente o disposto no artigo 24.º, n.º 4, da Lei 34/2004, de 29 de Julho, assim como violou o princípio da igualdade das partes, o direito a um processo justo e equitativo, assim como o direito do acesso ao direito e aos Tribunais, Constitucionalmente consagrados, ut artigo 20.º, da C.R.P.;
4- Na esteira do Ac. TRC de 26/10/2020, P. 2511/19.5T8CBR-A-C1, Relator: Maria Teresa Albuquerque, in www.dgsi.pt, assim como o Ac. TRL de 08/06/2017, P. 13177/10.8T2SNT-A.L1-2, Relator: Maria Teresa Albuquerque, in www.dgsi.pt,“a (única) razão de ser da imposição do ónus de comprovação do pedido de apoio judiciário – que se tem vindo a entender incindir sobre o requerente do apoio judiciário por ser, indiscutivelmente, ele, quem sofre a corresponde consequência desvantajosa - está no objetivo de se evitar dispêndio processual” e a interrupção do prazo em curso deve entender-se que se dá, em qualquer caso, apenas em função do pedido atempado da nomeação de patrono, o que ocorreu nos autos;
5-O Tribunal “a quo”, constatando nos autos a remessa de comprovativo do pedido de protecção jurídica apresentado e nas modalidades citadas, com pedido expresso que emerge do pedido de nomeação e pagamento da compensação de patrono, e ainda factura/recibo, emitida pelos CTT, correspondente ao pagamento do registo postal, com o n.º ............., ao decidir liminarmente pelo indeferimento da interrupção do prazo, violou o princípio da igualdade das partes a que alude genericamente o art. 4.º CPC, sem observar, tendo obrigação, que o “O tribunal deve assegurar, ao longo de todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso de meio de defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais”;
6- Igualmente, o Tribunal “ a quo”, ao actuar no sentido cotejado, violou o princípio da cooperação constante do art. 7.º CPC, sendo que na cooperação «entre si» a que alude o nº 1 dessa norma resulta evidente que essa cooperação tem de se fazer sentir, até por imposição do dever de gestão processual, traduzido no dever de esclarecimento, no dever de prevenção, no dever de consultar as partes e no dever de as auxiliar na remoção das dificuldades ao exercício dos seus direitos ou faculdades, ou no cumprimento de ónus ou deveres processuais, ou seja, suscitadas dúvidas, que se hipnotiza por mero dever de oficio, impõe-se esclarecer, nomeadamente convidando a parte a juntar documento comprovativo, in casu, do registo, remetido para a ISS IP, apurando depois se o mesmo coincidia ou não com o numero inserto na factura que a Recorrente remeteu comprovativa do pagamento do mesmo;
7- É cristalino, entre outros, e a propósito, da colaboração processual e prossecução da justiça, e conforme se afirma no Ac.TRP, de 07/06/2021, P. 1546/20.0T8MAI-B.P1, Relator: Ana Paula Amorim, in www.dgsi.pt “se dúvidas houvesse sobre o pedido formulado pela R. junto da ISS IP, dever-se-ia ter ordenado à R. que juntasse cópia de tal pedido ou solicitado a tal entidade a sua remessa”.
8- Atento o disposto no artigo 146.º, n.º 2, do C.P.C., “Deve ainda o juiz admitir, a requerimento da parte, o suprimento ou a correção de vícios ou omissões puramente formais de atos praticados, desde que a falta não deva imputar-se a dolo ou culpa grave e o suprimento ou a correção não implique prejuízo relevante para o regular andamento da causa.”, o que não sucedeu no caso sub-judice, desde logo por a parte não se mostrar representada por mandatário, aguardando a nomeação de patrono;
9- O que sucedeu nos autos, quando prontamente reportou ao processo um comprovativo de efectivo envio do pedido de apoio para a ISS IP, sendo o comprovativo do Registo referenciado com o mesmo número de registo mencionado na factura comprovativa do registo efectuado e enviado em 28/05/2021, o que sucedeu através dos Requerimentos de 04/06/2021, sob a referência 29113557, 29124183 e 29125527;
10- Devendo ser a interrupção do prazo que, a todo o custo, se deve preservar para coerente e eficazmente se assegurar o direito à defesa e por meio dela à Justiça, não faz sentido que se venha a excluí-la, apenas porque a parte, nuns casos por negligência ou displicência, noutros – que poderão ser muitos - por “menor instrução ou discernimento”, não fez juntar atempadamente aos autos o comprovativo do pedido de nomeação de patrono, menos ainda que o que esta em falta não é o comprovativo mas apenas o registo da carta enviada para o ISS IP a solicitar tal pedido;
11- Os Requerimentos de fls., presentes pela Recorrente em 04/06/2021 (referencia n.º 2911357, 29124183 e 29125527) - os dois primeiros remetidos por email em 04/06/2021, mas tendo sido o segundo deles registado no sistema em 07/06/2021, e o terceiro por correio registado), através dos quais facilmente se dissipavam todas as dúvidas eventualmente existentes, bastando comparar o n.º do registo constante da factura (………….) e o n.º do registo (………….) correspondente a carta enviada em 26/05/2021 com pedido de apoio judiciário para a ISS IP, no mesmo dia, 26/05/2021, em que se enviou o Reqto. para os autos com os elementos já identificados, não pode ser considerado como apresentado depois de esgotado o prazo para deduzir Oposição, mas sim como um complemento probatório do Requerimento apresentado em 26/05/2021, esclarecendo o que o Tribunal “a quo” não esclareceu em clara violação, nomeadamente do que dispõe o art.º 411.º do CPC;
12- Verifica-se por parte do Tribunal “ a quo”, uma errada apreciação não apenas da prova existente nos autos, mas também de julgamento, quando afirma que “não pode o Tribunal nestes casos relevar ou deixar de relevar, lapsos da parte que “sibi imputet”, não diligenciou de juntar atempadamente comprovatio idóneo”, pois bem sabe o Tribunal que a parte se encontrava desacompanhada de mandatário e, mais, apresentou em 26/05/2021 requerimento nos Autos, informando que apresentara pedido de apoio judiciário e juntou cópia do correspondente requerimento, o que só por si, já permitiu ao Tribunal ter conhecimento não só do respetivo teor, como do facto de a parte não se encontrar revel, sem esquecer que, expressamente no Reqto de fls., aludia a pedido de interrupção (o tal conceito que o Tribunal “a quo” preferiu apelidar de “suspensão”) do prazo;
13- O Tribunal “a quo”, lavra novamente em erro, ao declarar no Despacho em crise que não juntou em tempo documento idóneo que comprove o pedido de apoio judiciário e entrega nos competentes serviços do mesmo, pois não foi em 04/06/2021 que a Recorrente juntou os comprovativos de pedido de apoio, outrossim, em 04/06/2021, veio juntar o comprovativo do registo, e de novo o requerimento de pedido de apoio judiciário e factura comprovativa do pagamento do registo, existentes nos autos desde 26/05/2021, e que o Tribunal “ a quo”, confrontado com a cota lavrada pela secretaria não se deu ao trabalho de indagar, como lhe era imposto, para alcançar o apuramento das dúvidas que a Secretaria-cota anexa a Despacho de 01/06/2021-, alegou ter e assim obter o apuramento da verdade material e a justa composição do litigio;
14- Sem fundamento e assim errando ao julgar e decidir nesse sentido, não pode o Tribunal “a quo” decidir que a Recorrente não diligenciou de juntar atempadamente comprovativo idoeno de pedido de apoio judiciário, não consta qualquer obrigatoriedade de junção ao processo de comprovativo de entrega do requerimento, outrossim de entrega de cópia do requerimento, o que foi feito, como resulta da leitura do formulário do requerimento de protecção jurídica onde se pode ler, no ponto 5, designado por “Certificação”: “Tomei conhecimento de que devo entregar cópia do presente requerimento no tribunal onde decorre a ação, no prazo que me foi fixado na citação/notificação.”;
15- O envio da fatura/recibo dos CTT, no qual inclusive consta o n.º de registo, correspondente à missiva remetida ao ISS, IP, em lugar do registo, não se poderá imputar à parte a título de dolo ou culpa grave, tão pouco implicava qualquer prejuízo relevante para o regular andamento da causa, uma vez que a sentença só veio a ser proferida em momento posterior ao suprimento do envio do comprovativo do registo (este ocorreu em 04/06 e a sentença foi proferida em 30/06), ou seja, mesmo depois de junto o comprovativo do registo e mais, o comprovativo de ter a ISS IP recebido o pedido de apoio judiciário por parte da Recorrente, como ressalta do Reqtos. da mesma remetidos em 04/06/2021;
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Tem este último despacho o seguinte teor:
“Do teor da informação que antecede prestada pela secção de processos, conclui-se que o documento comprovativo da efectiva entrega junto dos competentes serviços administrativos do pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, só veio a ser junto aos presentes autos em momento em que havia já decorrido o prazo para a requerida, querendo, contestar.
Com efeito, e conforme decorre do despacho exarado em 01.06.2021, anteriormente havia sido junto documento que nada comprovava a esse respeito.
Assim, não pode o Tribunal nestes casos relevar ou deixar de relevar lapsos da parte que, “sibi imputet”, não diligenciou de juntar atempadamente comprovativo idóneo.
Conforme, aliás, se pode ler no recente Ac. do STJ de 02.11.2017, processo 6638/16.7T8PRT-A.P1.S2, in www.dgsi.pt, “Nos termos e para os efeitos previstos no art.º 24.º, n.º 4, da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, só se interrompe o prazo que estiver em curso se a comprovação do pedido de apoio judiciário (na modalidade de nomeação de patrono) se verificar antes do termo do respectivo prazo; Não ocorre o efeito interruptivo se a junção do documento comprovativo tiver lugar dentro dos três primeiros dias úteis posteriores ao termo do prazo”.-
“In casu”, a junção da documentação pertinente foi feita, inclusive, após, o decurso daqueles três primeiros dias úteis.
Em face do exposto, conclui-se que não houve lugar a qualquer suspensão do prazo para contestar, e que como tal, a presente demanda não foi contestada.
Notifique”.
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Não foram apresentadas contra alegações.
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Proferiu o Tribunal a quo despacho a determinar a apreciação conjunta das pretensões recursivas, atendendo a que os despachos pretendidos colocar em crise se concatenam entre si.
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Admitidos, e após os vistos, cumpre apreciar e decidir o mérito dos recursos interpostos.
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II. FUNDAMENTOS
- OBJETO DO RECURSO
Apontemos as questões objeto dos presentes recursos, tendo presente que os mesmos são balizados pelas conclusões das alegações da recorrente, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Assim, a questão a decidir é a seguinte:
- Do preenchimento dos pressupostos de interrupção do prazo em curso na ação (de oposição) face ao requerido apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono.
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II.A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos provados com relevância para a decisão (meras vicissitudes processuais), constam já do relatório que antecede.
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II.B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
- Dos pressupostos de interrupção do prazo em curso na ação (de oposição) e do preenchimento do ónus imposto à Requerida (requerente do benefício do apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono)
Insurge-se a apelante contra as decisões por ter informado aos autos ter pedido apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, para deduzir oposição à insolvência, e apresentado cópias do requerimento e da fatura/recibo dos CTT, tendo-se, por isso, o prazo, em curso, para deduzir oposição, interrompido.
Entendeu o Tribunal a quo, nas decisões recorridas, não haver a apelante dado cumprimento à imposição legal de junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que promoveu o procedimento administrativo, pelo que o prazo correu, normalmente, os seus termos, tendo decorrido.
A questão a que cumpre dar resposta é, tão só, a de saber se, efetivamente, se interrompeu o prazo em curso, para deduzir oposição, como pretende a apelante, ou se, ao invés, continuou a decorrer, esgotando-se, como decidiu o Tribunal a quo, sem que no decorrer do mesmo a apelante tivesse dado cumprimento ao ónus que lhe é imposto.
Ora, estatui o referido artigo 24º, da Lei nº 34/2004, de 29 de julho, no seu nº4 que “Quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de ação judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo”.
Assim, para que o prazo em curso se interrompesse necessária se mostrava a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que foi promovido o procedimento administrativo, ónus que a lei impõe à parte interessada na interrupção, no caso a apelante.
Com efeito, o referido preceito, que se refere ao pedido de apoio judiciário na modalidade de patrocínio judiciário, formulado pelo réu ou pelo requerido na pendência da ação, com vista à apresentação da contestação ou oposição, em Tribunal, “prescreve que o prazo em curso na ação pendente se interrompe com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento em que é promovido o procedimento administrativo atinente à concessão de apoio judiciário na modalidade de patrocínio”[1].
Estatui a interrupção de prazo que esteja em curso na causa judicial por mero efeito da comprovação no processo da ação da apresentação pelo réu/requerido de que requereu nos serviços da segurança social o apoio judiciário na modalidade de patrocínio judiciário e, deste modo, o requerente do apoio judiciário, para operar a interrupção do prazo em curso no processo pendente, tem o ónus de proceder à junção aos autos do comprovativo do seu pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, apresentado nos serviços da segurança social[2].
Como decorre da letra do referido preceito, que bem traduz o espírito do legislador, o que releva para efeito de interrupção do prazo em curso na ação, não é a mera formulação do pedido de apoio judiciário na modalidade de patrocínio judiciário nos serviços da segurança social, mas a junção ao processo em causa do comprovativo da formulação desse pedido e, natural e evidentemente, só tem aplicação se o pedido for formulado antes do termo do prazo em curso (no caso da oposição)[4], tendo ao Tribunal da causa de ser fornecida a prova da, efetiva, apresentação do requerimento nos serviços da segurança social (prova da pendência do procedimento administrativo em causa - de apoio judiciário, na modalidade de patrocínio judiciário), antes do termo do prazo [5].
Assim, para que o prazo processual de contestação ou oposição se interrompa é necessário que o Réu/Requerido se apresente na ação em juízo a comprovar a formulação de pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, apresentado nos serviços da segurança social, ónus que a lei lhe impôs no referido preceito. Deste modo, caso no prazo de contestação não estiver junto ao processo o comprovativo da, real e efetiva, formulação pelo Réu do pedido de apoio judiciário na modalidade de patrocínio, impõe-se a aplicação na espécie das normas processuais dos artigos 566º a 568º, do Código de Processo Civil[6].
Destarte, prevendo a Lei nº 34/2004, de 29/07, na redação da Lei nº 47/2007 de 28/08, no nº4, do art. 24º, a interrupção do prazo que estiver em curso, quando o pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, é formulado na pendência do processo, faz depender tal interrupção do prazo da verificação dos seguintes pressupostos:
i)- incluir o pedido de apoio judiciário formulado o pedido de nomeação de patrono;
ii)- efetuar o requerente a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação desse pedido nos serviços da segurança social;
iii)- ser tal comprovação efetuada enquanto o prazo estiver a correr [7].
Ora, na verdade, como resulta dos autos e bem fundamenta o Tribunal a quo, a requerente não comprova na ação ter, no prazo da oposição, apresentado nos serviços da segurança social requerimento a promover o procedimento administrativo, pelo que, não demonstrando o cumprimento do ónus que a lei lhe impõe, se não desencadeou, na ação, qualquer efeito sobre o prazo em curso.
Assim, e na falta desta prova, o prazo para deduzir oposição, iniciado, decorreu, como bem decidiu o Tribunal a quo, sem que a requerida, ora apelante, cumprisse o ónus que lhe era imposto.
Na verdade, o prazo, que em curso esteve, ultrapassado se encontra, tendo-se esgotado, por se não ter interrompido, dado não se ter desencadeado o mencionado efeito de interrupção do prazo em curso.
Tal entendimento da lei, geral e abstrata, igual para todos, a que o caso se subsume, em nada coloca em causa o direito constitucionalmente consagrado no artigo 20.º, da Constituição da República Portuguesa, do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva e os princípios e as finalidades que enformam o regime de acesso ao direito e aos tribunais, consagrados na Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, pois que, para que um direito nasça e possa ser exercido, necessário é o cumprimento das regras, pressupostos e requisitos que o regulam, e, designadamente das adjetivas, e nada justificava que o prazo para a oposição se interrompesse, na falta de observância do estatuído.
Com efeito, bem podia, até, dar-se o caso de nada ter sido, sequer, validamente, apresentado nos serviços da segurança social. A interpretação do preceito supra referido, no sentido que acabamos de expor não é inconstitucional, por não comprometer desproporcionalmente o direito de acesso ao direito e à justiça por parte das pessoas economicamente carenciadas[8] e não viola o princípio da igualdade das partes, já que nenhum tratamento discriminatório se verifica, antes se impõe às partes que comprovem os atos que praticam, com vista a evitar que o processo se desenvolva de modo inútil, sendo a pratica de atos inúteis absolutamente proibida.
Assim, decorrido o prazo para a dedução de oposição, sem que interrupção do mesmo tivesse havido, dada a inobservância, pela parte interessada, do ónus que lhe é expressamente imposto, precludido se mostra o direito.
E nenhuma obrigação tinha o Tribunal de suprir a falta da parte, nenhum dever de atuação oficiosa existindo.
Na verdade, o princípio do inquisitório, apontado pela apelante como violado, “no seu sentido restrito”, “que é o rigoroso”, “opera no domínio da instrução do processo” tendo o juiz aí “poderes mais amplos do que no domínio da investigação dos factos, na medida em que pode determinar quaisquer diligências probatórias que não hajam sido solicitadas pelas partes”[9].
Tal princípio, consagrado no art. 411º, do Código de Processo Civil, diploma a que pertencem todos os preceitos doravante citados sem outra referência, é um poder vinculado que impõe ao juiz, que determine, oficiosamente, diligências probatórias complementares, necessárias à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, independentemente de solicitação das partes.
No caso, o objeto do recurso centra-se na questão do incumprimento pelo Tribunal a quo de poder-dever que lhe é imposto, designadamente pelo artigo 411º, de, em completo de provas oferecidas pela parte, ordenar diligências.
É, pois objeto do recurso a questão de saber se, na sequência da junção de documentos efetuada pela parte, devia ter sido despoletada a inquisitoriedade e ordenada diligência tendente a apurar da efetiva dedução de pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono pela Requerida, ora apelante, junto dos serviços da segurança social.
Ora, cumpre referir que não estamos perante não uso dos poderes inquisitórios pelo juiz na instrução da causa, já que de instrução dos factos da causa, com vista à sua decisão, se não trata, mas, sim, de matéria adjetiva, referente a mera de tramitação processual e a contagem de prazo para a prática de ato.
E, com efeito, em matéria de instrução da causa, o ónus da prova dos factos relevantes para a decisão da causa encontra-se distribuído pelas partes segundo rigorosas regras, sendo que as normas substantivas, consagradas no art. 342º, do Código Civil, sobre a distribuição do ónus da prova constituem normas de decisão, pois se destinam em primeira linha a possibilitar a decisão no caso de falta de prova; mas não deixam de influenciar o comportamento das partes, consequentemente levadas a ter a iniciativa da prova para evitar o risco duma decisão desfavorável[10].
O referido preceito pretende dar resposta ao dever de julgar que resulta para o juiz do nº1, do artigo 8º, do CC, mesmo perante dúvida insanável acerca dos factos em litígio. O non liquit no plano de facto não pode nunca traduzir-se num non liquit jurídico. Ao invés de atribuir ao juiz a faculdade de distribuir o ónus da prova perante cada caso concreto, é por este meio criado um critério legal de decisão que lhe permite decidir contra a parte a quem o legislador atribui, em abstrato, o ónus da prova dos factos em litígio. Um non liquit sobre os factos é decidido contra a parte onerada[11].
Não obstante o artigo ter por epígrafe ónus da prova, em rigor, no nosso sistema processual as partes não têm um ónus de prova em sentido rigoroso. O princípio da aquisição processual (artigo 413º do CPC), bem como o princípio do inquisitório em matéria de prova (artigo 411º, do CPC), permitem concluir que, ainda que a parte onerada não logre a prova dos factos que lhe aproveitam, isso não significa que estes não resultem provados em virtude daqueles princípios. Daí que as regras sobre o ónus da prova sejam mais regras de decisão do que regras de distribuição de prova propriamente ditas.
Em suma, no nosso direito processual, ter o ónus da prova significa sobretudo determinar qual a parte que suporta a falta de prova de determinado facto, mais do que saber qual a parte que tem de efetuar a prova de determinado facto. Tendencialmente, todavia, será natural que a parte que suporta o ónus da prova venha a ser aquela que tenha a iniciativa da prova, procurando afastar o risco da falta de prova que sobre ela recai. E que, na perspectiva inversa, a contraparte se possa sentir legitimada a uma inacção probatória até à prova do facto pela parte onerada (Teixeira de Sousa, 1984:116).[12]
Por imposição do referido princípio do inquisitório, consagrado no art. 411º e materializado em inúmeros preceitos, ao juiz incumbe “realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer”.
Tal princípio, “porém, coexiste com os princípios do dispositivo, da preclusão e da autorresponsabilização das partes, de modo que não poderá ser invocado para, de forma automática, superar eventuais falhas de instrução que sejam de imputar a alguma das partes, designadamente quando esteja precludida a apresentação de meios de prova.
O princípio do dispositivo funciona de um modo geral no que concerne à alegação dos factos, mas concede-se ao juiz a faculdade e, simultaneamente, o dever de, tanto quanto possível, aferir a veracidade desses factos. Continua a impender sobre as partes o ónus de indicação dos meios de prova, a observar, em regra nos articulados (arts. 552º, nº2 e 572º, al. d)), mantendo-se o normativo do art. 139º, nº3, segundo a qual o decurso de um prazo perentório extingue o direito de praticar o ato. Mas, por outro lado, o preceito faz apelo à realização de diligências que importem à justa composição do litígio[13].
Do artigo 411º, resulta, na verdade, que o juiz deve exercitar os seus poderes inquisitórios, que são poderes vinculados (nunca discricionários), embora “preservando o necessário equilíbrio de interesses, critérios de objetividade e uma relação de equidistância e de imparcialidade”[14], quando concluir pela necessidade ou conveniência, ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, de realização de diligências de prova suplementares às promovidas pelas partes.
Deste modo, a “intervenção oficiosa do juiz deve assumir uma natureza complementar relativamente ao ónus da iniciativa da prova que impende sobre cada uma das partes, não podendo servir para superar, de forma automática, falhas processuais reveladas”[15].
Contudo, no caso, não nos movemos por estas regras, dado não estarmos perante a instrução da causa, não sendo, pois, de fazer atuar poderes-deveres decorrentes da inquisitoriedade (em que, ao abrigo do art. 411º, caiba ao juiz realizar ou ordenar as diligências dos procedimentos probatórios relativos aos meios de prova propostos pelas partes, na medida em que necessárias ao apuramento da verdade ou à justa composição do litígio).
Estamos, sim, perante uma situação em que à parte cabe um especial dever, que tem de observar, a pretender obter o benefício que pretende atuar – a interrupção do prazo -, sendo que, na verdade, de caso em que é imposta a iniciativa à própria parte se trata.
Existe, efetivamente, legalmente estatuído, como vimos, um ónus especialmente imposto à parte (à Requerida, ora Apelante) e, assim sendo, nenhum dever se impõe ao juiz de atuar no âmbito dos seus poderes oficiosos e, designadamente, de gestão processual (cfr. nº1, do art. 6º, a contrario).
E, para que se justificasse o atuar do princípio da cooperação e o dever do juiz providenciar pela remoção de obstáculos, necessário era que a parte alegasse, justificadamente, dificuldade séria em obter o documento a condicionar o cumprimento do ónus ou dever processual, nos termos do nº4, do art. 7º, o que se não verifica in casu.
Sempre devendo a parte comprovar, dentro do prazo, a apresentação do pedido por si apresentado nos serviços da segurança social, certo é, também, poder fazê-lo, sem dificuldade, já que o ato por si foi praticado.
Destarte, cabendo à requerida, ora apelante, a demonstração dos pressupostos da interrupção do prazo em curso, a ela competindo desenvolver as diligências necessárias para o efeito, nenhuma atuação, tendente a suprir incumprimento do ónus, se impunha ao Tribunal que levasse a cabo oficiosamente.
Improcedem, por conseguinte, as conclusões da apelação, não ocorrendo a violação de qualquer dos normativos invocados pela apelante, devendo, por isso, as decisões recorridas ser mantidas.
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III. DECISÃO
Pelos fundamentos expostos, os Juízes desta Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar as apelações improcedentes e, em consequência, confirmam, integralmente, as decisões recorridas.
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Custas pela apelante, pois que ficou vencida – art. 527º, nº1 e 2, do CPC -, sem prejuízo de apoio judiciário de que beneficie.

Porto, 28 de outubro de 2021
Assinado eletronicamente pelos Juízes Desembargadores
Eugénia Cunha
Fernanda Almeida
António Eleutério
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[1] Salvador da Costa, O apoio judiciário, 10ª Edição atualizada e ampliada, Almedina e Acs. do STJ, de 6/6/2019 (CJ, Ano XXVII, Tomo 2, página 223), da RC, de 25/6/2019 (156/18), e de 17/3/2020 (1160/19), da RG, de 21/3/2019 (3674/14), e da RP, de 24/10/2019 (7470/18), aí citados.
[2] Salvador da Costa, Idem, pág. 84 e Ac. da RE, de 12/5/2019, aí citado.
[3] Salvador da Costa, Idem, pág. 84 e Acs. da RE, de 26/6/2013 (CJ, Ano XXXVIII, Tomo 3, pág. 241) e da RP, de 14/1/2020 (5544/19), aí citados.
[4] Salvador da Costa, Idem, pág. 84 e Acs. da RC, de 22/6/1999 (CJ, Ano XXIV, Tomo 3, pág. 41) e da RP, de 6/3/2019 (1558/18), aí citados.
[5] V. neste sentido Ac. da RG, de 10/10/2019 (proc. 4995/18.0T8BRG-A.G1), in dgsi.pt “Nos termos e para os efeitos previstos no art.º. 24º, nº 4, da Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, só se interrompe o prazo que estiver em curso se a comprovação do pedido de apoio judiciário (na modalidade de nomeação de patrono) se verificar antes do termo do respectivo prazo.
A junção aos autos do documento comprovativo do referido pedido quando o prazo para contestar já tinha terminado e tinha já sido proferida decisão em que, face à revelia, se consideravam confessados os factos articulados pelo autor, não interrompe o prazo, nem faz correr de novo outro prazo”.
[6] Salvador da Costa, Idem, pág. 85 e Ac. do STJ, de 24/2/2011 (3959/09), aí citados.
[7] Ac. da RP de 7/6/2021, proc. 1546/20.0T8MAI-B.P1, in dgsi.pt
[8] Salvador da Costa, Idem, pág. 85 e Ac. do TC nº 98/2004, de 11 de fevereiro (DR, II Série, de 1 de abril, DR, II Série, de 2004), e nº 285/2005, de 25 de maio (DR, II Série, de 7 de julho de 2005), aí citados
[9] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 3ª Edição, Almedina, pág 207
[10] Ibidem, pág. 216
[11] Rita Lynce de Faria, Anotação ao artigo 342º, Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Editora, 2014, pág. 811 e segs
[12] Ibidem, pág 811 e seg
[13] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, O Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Almedina pág. 483 e seg.
[14] Ibidem, pág 484 e 577
[15] Ibidem, pág 577