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CONTRATO DE ARRENDAMENTO
RESOLUÇÃO POR FALTA DO PAGAMENTO DAS RENDAS
CADUCIDADE DO DIREITO À RESOLUÇÃO DO CONTRATO
Sumário
I.- O contrato de locação tem como essencial obrigação do locador a entrega da coisa locada e, para o locatário, o pagamento da renda – arts. 1031.º, a) e 1038.º, a), do CC. II.- Não sendo paga a renda na data acordada durante 3 meses forma-se na esfera jurídica do locador o direito de resolver o contrato – artigo 1083º/1 e 3, do CC – a resolução pode ser efetuada judicial ou extrajudicialmente – artigo 1047.º do CC. III.- Na modalidade extrajudicial, para que a resolução produza efeitos deve ser comunicada ao locatário, podendo sê-lo por escrito assinado pelo senhorio em carta registada com aviso de receção enviada ao inquilino – artigo 9.º/7, c) da Lei 6/2006, 27-02; se este não receber a carta ou não a levantar nos correios no prazo fixado não se considera notificado da resolução – artigo 10.º/2, c), da referida lei. IV.- Só o será se o senhorio enviar, no prazo de 30 a 60 dias sobre a data da primeira carta, uma nova carta registada com aviso de receção, o que implicará considerar-se a notificação recebida no 10º dia posterior ao envio – artigo 10.º/4, da mesma lei. V.- O direito de resolução pode ser feito caducar se o locatário, até ao termo do prazo da contestação (resolução judicial) ou no prazo de um mês (após comunicação extrajudicial) pagar todas as rendas em atraso e uma indemnização de 20% sobre o valor das rendas – artigos 1048.º/1 e 1084.º/3, do CC; não sendo pagas todas as rendas nem a indemnização, também na sua totalidade, a resolução torna-se eficaz e o locado deve ser entregue ao locador. (Sumário do Relator)
Texto Integral
Procº 624/20.0T8LLE.E1
Acordam os Juízes da 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora
Recorrentes: (…) e (…)
Recorridos: (…) e (…)
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No Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Local Cível de Loulé – Juiz 1, no âmbito da ação declarativa sob a forma comum proposta por (…) e (…), contra (…) e (…), pedindo:
- Que seja declarado resolvido do contrato de arrendamento celebrado entre as partes;
- A condenação dos Réus a proceder à devolução do arrendado, livre e devoluto, e a pagar a quantia de Euros 4.480,00 (quatro mil, quatrocentos e oitenta euros) a título de rendas vencidas e não pagas, bem como as que se vencerem até efetiva entrega do locado.
Para tanto alegaram os Autores, em síntese, terem celebrado com os Réus um contrato de arrendamento para habitação mediante o pagamento da renda mensal de Euros 320,00.
Os Réus, em janeiro de 2019, deixaram de pagar a renda.
Pelo que, por cartas registadas com aviso de receção, os Autores comunicaram aos Réus a resolução do contrato por falta de pagamento de rendas há mais de três meses.
Por tais cartas não terem sido levantadas junto dos serviços postais, renovaram aquela comunicação através de notificação judicial avulsa, cumprida em 22 de outubro de 2019.
Contudo, os Réus, apesar de notificados, não procederam à entrega do locado, permanecendo no mesmo sem pagar quaisquer rendas.
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A Ré apresentou contestação impugnando o valor atribuído pelos Autores à ação e a factualidade relativa às alegadas comunicações de resolução, quer as remetidas por carta quer a realizada através notificação judicial avulsa, e a respetiva eficácia para obter o efeito pretendido pelos Autores, por inobservância das respetivas formalidades legais, sustentando que a comunicação de resolução apenas teve lugar com a citação para a presente ação.
No mais, sustenta que pagou a renda do mês janeiro de 2019 e admite não ter procedido ao pagamento das demais, devido a dificuldades financeiras do agregado familiar.
Mais alega ter procedido, após a citação, ao pagamento das rendas em dívida e da respetiva indemnização legal, deixando de se verificar fundamento para a resolução.
Conclui, assim, pela improcedência da ação e absolvição do pedido.
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Os Autores responderam sustentando, em suma, que o pagamento efetuado pelos Réus, após a citação, não engloba todas as somas devidas a título de indemnização até àquela data e, como tal, não obsta à resolução do contrato.
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Após audiência, foi proferida decisão nos seguintes termos. Em face do exposto, decide-se: A) Declarar válida a resolução do contrato de arrendamento celebrado entre as partes operada pelos Autores através da comunicação referida em 11.º dos factos provados. B) Condenar os Réus a proceder à restituição aos Autores da fração autónoma, designada pela letra “BA” do 2.º andar, à habitação, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, situado na Avenida Dr. (…), Edifício (…), Bloco B, em Quarteira, freguesia de Quarteira, concelho de Loulé, descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o número (…) e com o artigo matricial (…), objeto daquele contrato de arrendamento, livre e devoluta; C) Condenar os Réus a pagar aos Autores a quantia de Euros 320,00 (trezentos e vinte euros) por mês, a título de indemnização, desde agosto de 2020, inclusive, até ao momento da restituição do arrendado; D) Absolver os Réus do demais peticionado. Custas a cargo da Autora (artigo 535.º, n.ºs 1 e 2, alínea c), do Código de Processo Civil). Registe e notifique.
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Não se conformando com o decidido, a Ré (…) recorreu da sentença, formulando as seguintes conclusões,que delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, artigos 608.º/2, 609.º, 635.º/4, 639.º e 663.º/2, do CPC:
I. Conforme consta da douta sentença proferida pelo Mmo. Juiz a quo, “para paralisar o direito dos Autores, os Réus, considerando a data em que foi apresentada a Contestação (10 de Julho de 2020), para além dos pagamentos que se mostram efetuados – rendas referentes aos meses compreendidos entre fevereiro de 2019 e abril de 2020, inclusive, e respetiva indemnização, no montante global de Euros 5.760,00 (Euros 4.800,00 + Euros 960,00) e rendas dos meses de maio, junho e julho de 2020 – teriam de ter efetuado o pagamento de indemnização devida pela mora no pagamento das rendas destes últimos três meses (maio, junho e julho, igual a 20% da soma das mesmas, bem como o pagamento da renda do mês de agosto de 2020, já vencida, o que não foi feito.”
II. Entendeu, ainda assim, o Mmo. Juiz a quo que os Réus teriam de ter pago uma indemnização de 20% sobre as rendas dos meses de maio, junho e julho de 2020 e pago a renda referente ao mês de agosto de 2020.
III. Com todo o respeito que nos merece opinião diversa, entende a Recorrente não ter sido feita uma análise correta dos factos, inclusivamente, de acordo com o alegado pelos Recorridos em sede de petição inicial.
IV. Ao contrário do constante do ponto 1º dos Factos Provados, a renda não era paga no 1º dia útil do mês anterior a que dissesse respeito.
V. Ainda que assim não fosse, sempre deveria o Mmo. Juiz a quo ter proferido despacho saneador, determinando a realização de audiência de julgamento, uma vez que, o estado dos autos e os elementos deles constantes, não permitiam que, por si só, fosse proferida decisão de mérito.
VI. Os Recorridos nos artigos 4º e 5º da p.i., alegaram que aquando do envio aos Réus de carta registada com aviso de receção datada de 10 de abril de 2019 se encontravam em dívida as rendas referentes aos meses de janeiro, fevereiro e março de 2019, num total de € 960,00.
VII. Aquando da instauração da presente ação, em 03 de março de 2020, os Recorridos referiram no artigo 6º da p.i. que, nessa data, se encontravam em dívida as rendas de janeiro de 2019 a fevereiro de 2020.
VIII. Caso a renda fosse paga no primeiro dia útil do mês anterior a que respeitasse, em 03 de março de 2020 também teria de estar vencida a renda referente a tal mês.
IX. A Recorrida pagou em 24 de fevereiro de 2019 a renda referente ao mês de janeiro de 2019 e, aquando da apresentação da Contestação, pagou as rendas de fevereiro de 2019 a abril de 2020, no montante de € 4.800,00, acrescido da respetiva indemnização de 20%, devida pela mora, na quantia de € 960,00.
X. Não sendo devida qualquer mora quanto ao pagamento das rendas dos meses de maio a julho de 2020 pois que, os mesmos foram pagos atempadamente em 11 de maio (o oitavo dia – 9 de maio de 2020 – foi um Sábado), 4 de junho e 5 de julho.
XI. Não se encontrando vencida, ao contrário do que foi considerado pelo Mmo. Juiz a quo, a renda referente ao mês de agosto de 2020.
XII. Pois que, como já vimos os próprios Recorridos, aquando da instauração da ação (03/03/2020) apenas consideram vencidas as rendas até ao mês de Fevereiro de 2020.
XIII. Tendo a Recorrida efetuado o pagamento das rendas que se encontravam em dívida, de acordo com o alegado pelos Recorridos em sede de petição inicial (artº 5º), e demonstrado que a renda de Janeiro de 2019 se encontrava paga, conforme recibo que juntou, bem como tendo pago atempadamente as rendas vencidas nos meses de Maio a Julho de 2020, que expressamente imputou a esses meses, não poderia deixar de funcionar a favor da Recorrida a disposição prevista no n.º 3 do artigo 1084.º do Código Civil, ficando sem efeito a resolução operada pelos Recorridos.
XIV. A douta sentença proferida pelo Mmo. Juiz a quo violou assim o disposto no n.º 3 do artigo 1084.º do Código Civil e, bem assim, na alínea g) do n.º 1 do artigo 591.º do C.P.C., devendo ser anulada e substituída por outra que considere sem efeito a resolução do contrato de arrendamento operado pelos Recorridos considerando que, nos termos do n.º 3 do artigo 1084.º do Código Civil a Recorrida efetuou o pagamento das rendas em dívida com pagamento.
Termos em que V. Exªs dando provimento ao presente recurso de Apelação, revogando a douta sentença proferida, substituindo-a por decisão que ordene o prosseguimento dos autos e a realização de audiência de discussão e julgamento farão como sempre boa justiça.
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Os autores contra-alegaram, concluindo:
I. O Recorrente conformou-se com a matéria de facto dada como provada, porquanto não a impugna nos termos previstos no artigo 640.º do Código de Processo Civil.
II. A Recorrente assenta toda a sua tese de recurso na teoria que a renda não era paga no 1º dia útil do mês anterior a que dissesse respeito.
III. A Recorrente ignora propositadamente o teor do contrato assinado pelas partes, no qual foi acordado que a renda deveria ser liquidada do primeiro dia útil do mês anterior a que disser respeito,
IV. Mesmo que o contrato de arrendamento ainda não estivesse resolvido, o que não se concede, o pagamento efetuado pelos Réus, aquando da contestação, não engloba todas as somas devidas a título de indemnização até àquela data, nem a renda referente ao mês de Agosto de 2020 e, como tal, não obsta à resolução do contrato.
V. Com o presente recurso a Recorrente pretende apenas protelar, ainda mais, a entrega do locado aos aqui Recorridos.
VI. No que concerne ao julgamento à matéria de facto pelo Tribunal aquo, consideram os aqui Recorridos que esta não merece qualquer censura, tendo também sido efetuada pelo douto tribunal aquo uma correta interpretação a aplicação do Direito aplicável.
VII. No caso dos autos, tendo-se tentado a notificação por solicitador e não se tendo conseguido localizar os destinatários da comunicação, os Autores remeteram a comunicação de resolução através de carta registada com aviso de receção para o local do arrendado, cumprindo, assim, a formalidade exigida pelo artigo 10.º, n.º 5, alínea b), da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro.
VIII. Tendo sido com esta comunicação que se operou validamente a resolução do contrato nos termos do artigo 1084.º, n.º 2, do Código Civil.
IX. A decisão de que na data de interposição da presente ação, o contrato de arrendamento celebrado entre as partes já se encontrava validamente resolvido, constituiu uma decisão ponderada, adequada e inapelavelmente proporcional aos factos em que se funda.
X. Mesmo que assim não se entendesse, o que não se concede, sempre se diga que o pagamento efetuado pela Recorrente na data em que foi apresentada a Contestação, não determinou a caducidade do direito de resolução do contrato pelos aqui Recorridos.
XI. Conforme é entendimento da jurisprudência, para fins de caducidade do direito de resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento das rendas, o locatário deverá proceder ao pagamento, até ao prazo da contestação, das somas devidas e da indemnização quanto à parte em que se encontre em mora.
XII. Atendendo a que a renda deveria ser liquidada 1º dia útil do mês anterior a que dissesse respeito, a Recorrente não pagou nem o valor da indemnização devida pela mora no pagamento das rendas vencidas em Maio, Junho e Julho de 2020, nem a renda referente ao mês de Agosto de 2020, já vencida aquando da apresentação da contestação (10 de Julho de 2020).
Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser negado provimento à presente Apelação, confirmando-se a sentença recorrida, nos seus precisos termos, fazendo-se assim a costumada justiça.
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Foram dispensados os vistos.
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A questão que importa decidir é a de saber se o contrato de arrendamento foi eficazmente resolvido antes da propositura da ação ou, caso esta resolução não tenha produzido efeitos, se o pagamento das rendas e da indemnização efetuada pela arrendatária, até à contestação, teve como efeito fazer caducar (extinguir) o direito de resolução.
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Não tendo sido impugnada a matéria de facto, considera-se como provada a que foi fixada na 1ª instância e que é a seguinte:
a. Factos Provados
Com relevo para a decisão, mostram-se provados, por acordo das partes e com base nos documentos juntos aos autos, os seguintes factos:
1.º Os Autores, na qualidade de proprietários da fração autónoma, designada pela letra “BA” do 2.º andar, apartamento C, destinado à habitação, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, situado na Avenida Dr. (…), Edifício (…), Bloco B, em Quarteira, freguesia de Quarteira, concelho de Loulé, descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o número (…) e com o artigo matricial (…), à qual está atribuída a licença de utilização n.º …/1992, por escrito particular datado de 1 de fevereiro de 2015, cederam o gozo da mesma aos Réus, para fins habitacionais, mediante o pagamento da renda mensal de € 320,00 a pagar no primeiro dia útil do mês anterior a que disser respeito.
2.º O acordo referido em 1.º foi celebrado pelo prazo de um ano, com início naquela data, sendo prorrogável por iguais períodos caso não fosse denunciado.
3.º Os Réus pagaram em 24 de fevereiro de 2019 a renda respeitante ao mês de janeiro de 2019.
4.º Os Réus não pagaram as rendas do mês de fevereiro de 2019 nem as rendas dos meses seguintes.
5.º Devido ao referido em 4.º, os Autores remeteram aos Réus, para a morada do arrendado, carta registada com aviso de receção, datada de 10 de abril de 2019, com o seguinte teor:
“Assunto: Comunicação de resolução do contrato por mora superior a 3 meses no pagamento da renda (artigo 1083.º, n.º 3, do Código Civil)
Exmºs Srs. (…) e (…)
(…) e (…), na qualidade de senhorios e primeiros outorgantes do contrato de arrendamento celebrado em 6 de fevereiro de 2015, em que V. Exas. (…) e (…) são inquilinos, vêm por esta forma denunciar expressamente o contrato de arrendamento que estabeleceram com V. Exas. relativamente à fracção autónoma designada pela letra “BA”, prédio urbano, situado na Avenida Dr. (…), Edifício (…), Bloco 2-C, em Quarteira.
O fundamento desta carta é a falta de pagamento de rendas por V. parte, por mais de três meses consecutivos; ou seja, estão em dívida os meses de janeiro, fevereiro e março de 2019, num total de € 960,00 (€ 320,00 x 3). Por falta de pagamento por esse período de tempo, é inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento.
A presente denúncia é feita nos termos dos artigos 9 e 10 do NRAU, devendo V. Exa. entregar, na sequência imediata do recebimento desta carta, o locado desembaraçado e desocupado, livre de pessoas e bens (salvo aqueles que fazem parte do arrendamento) e em boas condições, tal como o recebeu. (…)”.
6.º A carta referida em 5.º foi devolvida aos Autores, em 22 de abril de 2019, com a menção “objecto não reclamado”.
7.º Na sequência do referido em 7.º os Autores remeteram uma segunda carta, registada com aviso de receção, datada de 15 de maio de 2019, com o seguinte teor:
“Assunto: 2.ª comunicação de resolução do contrato por mora superior a 3 meses no pagamento da renda (artigo 1083.º, n.º 3, do Código Civil e n.º 3 do artigo 10.º do NRAU – Lei 6/2006, de 27 de fevereiro, com as respetivas atualizações).
Exmos. Srs. (…) e (…)
(…) e (…), na qualidade de senhorios e primeiros outorgantes do contrato de arrendamento celebrado em 6 de Fevereiro de 2015, em que V. Exas. (…) e (…) são inquilinos, vêm por esta forma, em que vez que não levantaram V. Exas. a carta anteriormente enviada, no prazo previsto pelos serviços postais, outra vez denunciar expressamente esse contrato de arrendamento que estabeleceram com V. Exas. relativamente à fracção autónoma designada pela letra “BA”, prédio urbano, situado na Avenida Dr. (…), Edifício (…), Bloco B, 2-C, em Quarteira.
O fundamento desta carta, tal como já constava na anterior, é a falta de pagamento de rendas por V. parte, por mais de três meses consecutivos; ou seja, estão em dívida os meses de janeiro, fevereiro e março de 2019, num total de € 960,00 (€ 320,00 x 3).
Por falta de pagamento por esse período de tempo, é inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento.
A presente denúncia é feita nos termos dos artigos 9.º e 10.º do NRAU, devendo V. Exa. entregar, na sequência imediata do recebimento desta segunda carta, o locado desembaraçado e desocupado, livre de pessoas e bens (salvo aqueles que fazem parte do arrendamento) e em boas condições, tal como o recebeu (…).”.
8.º A carta referida em 7.º foi devolvida aos Autores, em 27 de maio de 2019, com a menção “objecto não reclamado”.
9.º Os Autores requereram a notificação dos Réus através de solicitador, comunicando-lhes o montante em dívida, a resolução do contrato de arrendamento e para procederem à entrega imediata do locado.
10.º Na sequência do referido em 9.º, a Senhora Solicitadora lavrou certidão de notificação com o seguinte teor:
“Pelas 09:10 do dia 22.10.2019 na Avenida Dr. (…), Edifício (…), bloco B, 2.º-C, em Quarteira, comarca de Faro. (…) 7. Pelas 14:15 do dia 17-10-2019 deixei aviso com a indicação para a notificação com dia e hora e certa, tendo ficado consignado que a diligência será realizada entre as 09:00 e as 11:00 do dia 22-10.2019. 8. A notificação foi efetuada mediante a afixação na morada supra referida da nota de notificação com a indicação de que o duplicado e os documentos anexos ficam à disposição do notificando na secretaria judicial, tendo testemunhado este acto os Srs. (…) e (…). (…)”.
11.º Em 9 de dezembro de 2019, os Autores remeteram aos Réus, para a morada do arrendado, carta, registada com aviso de receção, com o seguinte teor:
“Terceira carta registada com aviso de receção nos termos do n.º 5, alínea b), do artigo 10.º do NRAU.
Assunto: 3.ª comunicação de resolução do contrato por mora superior a 3 meses no pagamento da renda (artigo 1083.º, n.º 3, do Código Civil e n.º 3 do artigo 10.º do NRAU – Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, com as respetivas atualizações).
Exmos. Srs. (…) e (…)
Uma vez que não foi possível localizar V. Exas. enquanto destinatários da comunicação que já vos foi feita por 2 cartas registadas anteriores e também porque nunca abriram a porta do locado onde residem à Solicitadora que vos tentou notificar; e tão pouco foram levantados os documentos que constavam na notificação que vos foi deixada; e porque entendemos assim que não conseguimos localizar-vos vimos em cumprimento do artigo 10.º, n.º 5, alínea b), do NRAU para a sua situação prevista na alínea b) do n.º 7 do artigo 9.º também do NRAU enviar-vos dentro do prazo de 30 a 60 dias sobre a data da não localização (data em que foi lavrada a certidão da Solicitadora que vos tentou notificar) novamente a carta que abaixo segue transcrita. Considera-se que esta comunicação é recebida por vós no 10.º dia posterior à data do envio.
Assim: (…) e (…), na qualidade de senhorios e primeiros outorgantes do contrato de arrendamento celebrado em 6 de Fevereiro de 2015, em que V. Exas. (…) e (…) são inquilinos, vêm por esta forma, e uma vez que não levantaram V. Exas. a carta anteriormente enviada, no prazo previsto pelos serviços postais, outra vez denunciar expressamente esse contrato de arrendamento que estabeleceram com V. Exas. relativamente à fracção autónoma designada pela letra “BA”, prédio urbano, situado na Avenida Dr. (…), Edifício (…), Bloco B, 2-C, em Quarteira.
O fundamento desta carta, tal como já constava na anterior, é a falta de pagamento de rendas por V. parte, por mais de três meses consecutivos; ou seja, estão em dívida os meses de janeiro, fevereiro e março de 2019, num total de € 960,00 (€ 320,00 x 3). Por falta de pagamento por esse período de tempo, é inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento.
A presente denúncia é feita nos termos dos artigos 9.º e 10.º do NRAU, devendo V. Exa. entregar, na sequência imediata do recebimento desta segunda carta, o locado desembaraçado e desocupado, livre de pessoas e bens (salvo aqueles que fazem parte do arrendamento) e em boas condições, tal como o recebeu. (…).”
12.º Os Réus mantêm-se no locado.
13.º À data de interposição da ação encontravam-se em dívida as rendas referentes aos meses compreendidos entre fevereiro de 2019, inclusive, e fevereiro de 2020.
14.º O Réu foi citado em 6 de março de 2020 e a Ré foi citada em 12 de junho de 2020.
15.º Em 10 de julho de 2020 a Ré realizou transferência bancária da quantia de Euros 4.800,00 a favor da Autora, com a indicação que se destinava ao pagamento das rendas dos meses de fevereiro de 2019 a abril de 2020.
16.º A Ré, em 10 de julho de 2020, efetuou a favor da Autora a transferência bancária da quantia de Euros 960,00, com a indicação que dizia respeito à indemnização de 20% das rendas.
17.º No dia 11 de maio de 2020 o Réu efetuou a transferência bancária de Euros 320,00 a favor da Autora, com a indicação que se destinava ao pagamento da renda do mês de maio de 2020.
18.º No dia 4 de junho de 2020 o Réu efetuou a transferência bancária de Euros 320,00 a favor da Autora, com a indicação que destinava ao pagamento da renda do mês de junho de 2020.
19.º No dia 5 de julho de 2020 a Ré efetuou a transferência de Euros 320,00 a favor da Autora, com a indicação que se destinava ao pagamento da renda do mês de julho de 2020.
20.º Os Autores intentaram a presente ação em 3 de março de 2020.
21.º A Ré apresentou a sua contestação em 10 de julho de 2020.
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Conhecendo.
O contrato de locação tem como essencial obrigação do locador a entrega da coisa locada e, para o locatário, o pagamento da renda – artigos 1031.º, a) e 1038.º, a), do CC.
Não sendo paga a renda na data acordada durante 3 meses forma-se na esfera jurídica do locador o direito de resolver o contrato – artigo 1083.º/1 e 3, do CC.
A resolução pode ser efetuada judicial ou extrajudicialmente – artigo 1047.º do CC.
Na modalidade extrajudicial, para que a resolução produza efeitos deve ser comunicada ao locatário, podendo sê-lo por escrito assinado pelo senhorio em carta registada com aviso de receção enviada ao inquilino – artigo 9.º/7, c), da Lei n.º 6/2006, 27-02.
Se este não receber a carta ou não a levantar nos correios no prazo fixado não se considera notificado da resolução – artigo 10.º/2, c), da referida lei.
Só o será se o senhorio enviar, no prazo de 30 a 60 dias sobre a data da primeira carta, uma nova carta registada com aviso de receção, o que implicará considerar-se a notificação recebida no 10º dia posterior ao envio – artigo 10.º/4, da mesma lei.
No caso dos autos, provou-se que a recorrente e …(réus na ação) celebraram com os recorridos um contrato de locação em 1-02-2015, pelo valor mensal de € 320,00, a pagar no primeiro dia útil do mês anterior a que disser respeito (ponto 1 da matéria de facto).
Em 24 de fevereiro de 2019, os Réus pagaram a renda respeitante ao mês de janeiro de 2019 (ponto 3).
Os Réus não pagaram as rendas do mês de fevereiro de 2019 nem as rendas dos meses seguintes (ponto 4).
Em face do não pagamento destas rendas, os Autores/recorridos, optaram inicialmente pelo direto de resolução do contrato de forma extrajudicial e remeteram aos Réus, para a morada do arrendado, carta registada com aviso de receção, datada de 10 de abril de 2019, com o seguinte teor:
“Assunto: Comunicação de resolução do contrato por mora superior a 3 meses no pagamento da renda (artigo 1083.º, n.º 3, do Código Civil) (…) (ponto 5).
Esta carta foi devolvida aos Autores/recorridos, em 22 de abril de 2019, com a menção “objecto não reclamado” (ponto 6).
Nessa sequência os Autores/recorridos remeteram uma segunda carta, registada com aviso de receção, datada de 15 de maio de 2019, com o seguinte teor:
“Assunto: 2.ª comunicação de resolução do contrato por mora superior a 3 meses no pagamento da renda (artigo 1083.º, n.º 3, do Código Civil e n.º 3 do artigo 10.º do NRAU – Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, com as respetivas atualizações). (…) (ponto 7.).
Também esta carta foi devolvida aos Autores/recorridos, em 27 de maio de 2019, com a menção “objecto não reclamado”.
Após infrutífera tentativa de notificação dos inquilinos através de solicitador, em 9 de dezembro de 2019, os Autores/recorridos remeteram aos Réus, para a morada do arrendado, carta registada com aviso de receção, com o seguinte teor:
“Terceira carta registada com aviso de receção nos termos do n.º 5, alínea b), do artigo 10.º do NRAU.
Assunto: 3.ª comunicação de resolução do contrato por mora superior a 3 meses no pagamento da renda (artigo 1083.º, n.º 3, do Código Civil e n.º 3 do artigo 10.º do NRAU – Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, com as respetivas atualizações). (…) (ponto 11).
Até hoje, os Réus mantêm-se no locado (ponto 12).
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Desta matéria de facto provada resulta à evidência que a decisão de resolução do contrato de arrendamento foi comunicada à recorrente e a … e produziu efeitos, uma vez que seguiu todos os trâmites que a lei obriga sejam seguidos para que a comunicação se tornasse eficaz.
Para além disso, não tendo os Réus pago mais de 3 meses de renda, o direito à resolução do contrato existia na esfera jurídica dos recorridos que exerceram esse direito.
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Mas os recorridos entenderam também utilizar a via judicial para conseguirem o mesmo feito, a resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento de mais de 3 meses de renda.
O direito de resolução pode ser feito caducar se o locatário, até ao termo do prazo da contestação (resolução judicial) ou no prazo de um mês (após comunicação extrajudicial) pagar todas as rendas em atraso e uma indemnização – artigos 1048.º/1 e 1084.º/3, do CC.
À data da propositura da ação (3-3-2020) encontravam-se em dívida as rendas referentes aos meses compreendidos entre fevereiro de 2019, inclusive, e fevereiro de 2020 (ponto 13).
O Réu foi citado em 6 de março de 2020 e a Ré foi citada em 12 de junho de 2020 (ponto 14).
Em 10 de julho de 2020 a Ré realizou transferência bancária da quantia de Euros 4.800,00 a favor da Autora, com a indicação que se destinava ao pagamento das rendas dos meses de fevereiro de 2019 a abril de 2020 (ponto 15).
A Ré, em 10 de julho de 2020, efetuou a favor da Autora a transferência bancária da quantia de Euros 960,00, com a indicação que dizia respeito à indemnização de 20% das rendas (ponto 16).
No dia 11 de maio de 2020 o Réu efetuou a transferência bancária de Euros 320,00 a favor da Autora, com a indicação que se destinava ao pagamento da renda do mês de maio de 2020 (ponto 17).
No dia 4 de junho de 2020 o Réu efetuou a transferência bancária de Euros 320,00 a favor da Autora, com a indicação que destinava ao pagamento da renda do mês de junho de 2020 (ponto 18).
No dia 5 de julho de 2020 a Ré efetuou a transferência de Euros 320,00 a favor da Autora, com a indicação que se destinava ao pagamento da renda do mês de julho de 2020 (ponto 19).
A Ré apresentou a sua contestação em 10 de julho de 2020 (ponto 20).
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Na sentença, quanto a esta questão da caducidade da resolução ponderou-se o seguinte:
“(…) conforme decorre do disposto no artigo 1084.º, n.º 3, do Código Civil:
“A resolução pelo senhorio, quando opere por comunicação à contraparte e se funde na falta de pagamento da renda, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário, nos termos do n.º 3 do artigo anterior, fica sem efeito se o arrendatário puser fim à mora no prazo de um mês.”
E, no caso de ser exercido judicialmente, dispõe o artigo 1048.º, n.º 1, do Código Civil: “O direito à resolução do contrato por falta de pagamento da renda ou aluguer, quando for exercido judicialmente, caduca logo que o locatário, até ao termo do prazo para a contestação da ação declarativa, pague, deposite ou consigne em depósito as somas devidas e a indemnização referida no n.º 1 do artigo 1041.º”.
No caso dos autos, os Réus não puseram fim à mora após a comunicação referida no facto provado 11.º. Pelo que, nada impede a eficácia daquela comunicação de resolução.
Contudo, salienta-se, ainda que se entendesse, como sustenta a Ré, que a comunicação da resolução apenas teve lugar com a citação, impunha-se igual conclusão, pois os Réus não procederam, no prazo da contestação, ao pagamento das somas devidas e respetiva indemnização igual a 20 % desse valor (cfr. artigo 1041.º, n.º 1, do Código Civil).
Com efeito, conforme é entendimento da jurisprudência, para fins de caducidade do direito de resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento das rendas, o locatário deverá proceder ao pagamento, até ao prazo da contestação, das somas devidas e da indemnização quanto à parte em que se encontre em mora.
Citando o douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10 de julho de 2013, processo número 99/09.4TBVLG, disponível em www.dgsi.pt.:
“(…) II. No caso de ser intentada acção judicial para resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento de rendas, o arrendatário pode fazer caducar o direito de resolução através do pagamento, depósito ou consignação em depósito das somas devidas e da indemnização prevista no artigo 1041.º (50% do valor da renda), até ao termo do prazo para contestação. III. Para paralisar o direito à resolução do contrato de arrendamento o arrendatário tem de pagar as rendas que se vencerem até à contestação, e não apenas as vencidas até à data da propositura da acção”.
Ora, para paralisar o direito dos Autores, os Réus, considerando a data em que foi apresentada a Contestação (10 de julho de 2020), para além dos pagamentos que se mostram efetuados – rendas referentes aos meses compreendidos entre fevereiro de 2019 e abril de 2020, inclusive, e respetiva indemnização, no montante global de Euros 5.760,00 (Euros 4.800,00 + Euros 960,00) e rendas dos meses de maio, junho e julho de 2020 – teriam que ter efetuado o pagamento de indemnização devida pela mora no pagamento das rendas destes últimos três meses (maio, junho e julho), igual a 20 % da soma das mesmas, bem como o pagamento da renda do mês de agosto de 2020 já vencida, o que não foi feito”.
Esta argumentação está em perfeita conformidade com a matéria de facto provada e a normas jurídicas aplicáveis, pelo que nenhuma censura nos merece.
Com efeito, no contrato de arrendamento, estipulou-se que o locado era arrendando “mediante o pagamento da renda mensal de Euros 320,00 a pagar no primeiro dia útil do mês anterior a que disser respeito” (ponto 1 da matéria de facto provada).
Na realidade, as rendas correspondentes aos meses de maio, junho e julho, foram pagas, respetivamente, em 11 de maio (um mês e 11 dias depois da data acordada), 04 de junho (um mês e 4 dias depois da data acordada) e 5 de julho (um mês e cinco dias depois da data acordada), pelo que não tendo siso pagas no primeiro dia útil do mês anterior, deveriam ter sido acompanhadas da indemnização correspondente a 20% do seu valor, o que não aconteceu.
Para além disso, no dia em que apresentou a sua contestação – 10 de julho – já era devida a renda do mês de agosto, não tendo sido paga esta renda nem a correspondente indemnização.
O pagamento da renda até ao dia 8 do mês anterior a que diz respeito (artigo 1041.º/2, do CC) é facultada pelo sistema apenas como terminus a quo para cessar o direito à resolução e correspondente indemnização, mas o devedor já se encontra em mora.
Ora, da matéria de facto não se conclui que tenha sido efetuado qualquer depósito ou pagamento de renda a durante este período de 8 dias, ao contrário do alegado pela recorrente.
O que vale por dizer que bem andou o tribunal a quo ao não considerar que havia caducado o direito de resolução dos autores.
Improcedem, em consequência, na totalidade as conclusões da recorrente.
De onde se conclui também que os autos continham todos os elementos necessários a uma decisão conscienciosa pelo que bem andou o tribunal a quo em não designar audiência de julgamento, decidindo as questões controvertidas com a matéria de facto admitida por acordo e com o teor dos documentos juntos aos autos.
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Sumário:
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DECISÃO.
Em face do exposto, a 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora julga a apelação improcedente e confirma a sentença recorrida.
Custas pela recorrente – Artigo 527.º do CPC.
Notifique.