ACÇÃO DE RECONHECIMENTO DE CONTRATO DE TRABALHO
FIXAÇÃO DA DATA DO INÍCIO DO CONTRATO DE TRABALHO
Sumário


Com a ação de reconhecimento de existência de contrato de trabalho não se pretende apenas a regularização da situação para o futuro, mas antes o reconhecimento da natureza laboral da relação havida num determinado contexto temporal.
Não ocorre inutilidade ou impossibilidade da lide numa ação para reconhecimento de existência de contrato de trabalho, pelo facto de entretanto as partes terem celebrado um contrato de trabalho, mas não cobrindo o período temporal abrangido pela relação cuja natureza laboral se pretende fazer reconhecer. Como não implica tal inutilidade ou impossibilidade o facto de a relação entre as partes ter entretanto cessado, ainda que por iniciativa do trabalhador.
O Ministério Público não só tem legitimidade para a propositura da ação, que resulta do artigo 186º-L, nº 1 do CPT, como tem interesse em agir, ainda que desacompanhado do trabalhador, porquanto age na prossecução do interesse público, designadamente de combate à precaridade laboral e aos falsos recibos verdes.
No âmbito da docência, não obstante a natural autonomia técnico-pedagógica do trabalhador, é de reconhecer a existência de uma relação laboral, caso se verifiquem os indícios de laboralidade referidos no artigo 12º do CT, tais como a utilização de instrumentos fornecidos pela empregadora, cumprimento de um horário de trabalho por esta definido, obrigação de justificar as faltas e substituir colegas faltosos, sujeição a avaliações previstas no regulamento interno da empregadora, sujeição a poder sancionatório desta que no limite podia pôr termo à relação contratual, inserindo-se o trabalhador na organização produtiva da ré.

Texto Integral


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

O MºPº junto do tribunal do Trabalho, propôs ação declarativa de reconhecimento da existência de contrato de trabalho com processo especial regulada nos artigos 186.º-K e seguintes do Código do Processo do Trabalho, contra a Ré “Associação Empresarial de ..., ... e ...”, id. nos autos, alegando, relativamente a J. F., id. nos autos, que o(s) contrato(s) que os vinculou(aram), pelas suas caraterísticas e modo do exercício da atividade era um contrato de trabalho e não de prestação de serviços, devendo, portanto, ser assim reconhecido.

Para o efeito e em suma, alegou que, apesar de sucessivos contratos intitulados como de prestação de serviços formador externo, esta exerceu sempre as funções, subordinadamente, como docente na Escola Profissional de ..., desde aquela data e até ter comunicado a sua admissão à S. Social como trabalhadora por conta de outrem no dia 13 de Junho de 2019, com efeitos a partir de 1/01/2019, invocando factos reveladores da existência desse contrato de trabalho, que assentam, nomeadamente na circunstância dela prestar as suas funções nas instalações da R., utilizar os seus instrumentos de trabalho, ter um horário pré-definido, o controle das horas de início e termo da prestação de serviços, a obrigação de justificar as respetivas faltas, o poder disciplinar que a R. tem sobre ela e estar sujeita à avaliação de desempenho.
A ré veio contestar, invocando a nulidade do processo, inadequação do meio processual apresentado, “inutilidade originária da lide”, falta de interesse em agir e ilegitimidade/incompetência do Ministério Público e, por outro, a improcedência dos fundamentos invocados para a qualificação dos contratos celebrados com a citada trabalhadora como contrato de trabalho e reiterando a existência de um contrato de prestação de serviços.
O autor respondeu às exceções e nulidade invocadas pela R, pedindo que as mesmas sejam julgadas improcedentes, por carecerem de fundamento legal.
Proferido despacho saneador que julgou improcedentes a invocadas nulidades do processo e demais exceções invocadas, veio a requerida apresentar recurso com as seguintes conclusões (em síntese):
...
3. citada para, querendo, contestar nos termos do disposto no art.º 186.º-L, n.º 2 do Código de Processo do Trabalho, a Recorrente contestou a ação, alegando, em suma e entre outras, i) a existência de inutilidade originária da lide, ii) a falta de interesse em agir - também em virtude da existência prévio de contrato – iii) o uso de meio processual inadequado, iv) a falta de legitimidade do Ministério Público e, por fim, v) nulidade do processo, devido, mormente, à existência de contrato de trabalho aquando a propositura da ação.

6. é questão fulcral deste Recurso aferir da possibilidade do presente de processo se iniciar e desenvolver quando a qualificação do contrato que ligava a Recorrente ao referido trabalho, máxime de Contrato de Trabalho já se encontrava (mais do que) assente.
7. Ressalvado o devido e natural respeito, caricaturando, o bilhete de ingresso no recinto da sobredita Acão Especial, rectius, a discussão sobre a natureza do vínculo, está ferido de morte, porquanto, como infra se demonstrará, não está sequer em discussão nos autos…
8. Calcorreados os autos, verifica-se que após realização de intervenção inspetiva à Recorrente - por intermédio de Auto por Inadequação do Vínculo que Tutela a Prestação de Atividade, lavrado no dia 11 de junho de 2019 - foi remetida notificação para que esta procedesse à regularização da situação laboral do Trabalhador, nos termos do artigo 15.º-A da Lei 107/2009.
9. Na sequência da falta de resposta da Recorrente, que à data já tinha formalizado um contrato de trabalho …, sanando, com efeito, qualquer, alegado, vício, a ACT remeteu participação ao Ministério Público com o fito de que este intentasse a Acão Especial para o Reconhecimento da Existência de Contrato de Trabalho, nos termos do artigo 186.º K e seguintes de Código de Processo de Trabalho.

11. a relação laboral entre a Recorrente e J. F. perdura desde 01 de janeiro de 2019, tendo as partes, de forma consciente, esclarecida e por comum acordo, decidido reestruturar a sua relação jurídica então existente, transformando-a num contrato de trabalho (com inerente alteração ao nível de direitos, deveres e obrigações). Fechando esse parêntesis,
12. no articulado inicial, através do presente meio processual, veio o Ministério Público alegar a existência de uma relação de trabalho entre a Recorrente e a Trabalhadora desde 22 de setembro de 2006.
13. Ao invés do que é propalado pelo Ministério Público, entende a Recorrente que a relação existente entre esta e a Trabalhadora, anterior ao dia 1 de janeiro de 2019, era manifestamente uma relação de Prestação de Serviços, apresentando em sede de Contestação os seus argumentos.
14. Todavia, entende a Recorrente que essa discussão, centrada apenas e tão só na antiguidade, corresponde a uma questão a ser discutida em sede de processo comum e nunca no presente processo especial.

NESTE CONSPECTO,

16. o Tribunal a quo, ao decidir como decidiu, violou claramente os pressupostos processuais necessários e imperativos para a proposição da ação, bem como o direito da Recorrente a um processo equitativo e justo.

NESTES TERMOS,
17. o Tribunal a quo desconsiderou, para todos os efeitos legais, que à data da proposição da ação já existia um contrato de trabalho, situação que, pela natureza e objeto da ação para o Reconhecimento da Existência de Contrato de Trabalho, é idónea para impedir a sua propositura.
18. Acrescenta-se que ao fazer uso da Acão para Reconhecimento da Existência de Contrato de Trabalho, faz-se, in casu, uso de um meio processual inadequado para o fim que o Ministério Público visa obter.
19. Em consequência do explicitado supra, dá-se uma ingerência indevida e ilegítima do Ministério Público no seio de uma relação iminentemente privada, sem que haja um interesse público que justifique tal incursão.
20. Concomitantemente, tal ato constitui uma violação clara dos direitos disponíveis do trabalhador, sempre pautando a Recorrente por afirmar que em causa está a discussão da mera antiguidade do contrato e não a sua existência, o que aqui expressamente se invoca para todos os efeitos legais.

III. DA VALIDADE DA ACÇÃO E DA SUA IMPOSSIBILIDADE ORIGINÁRIA

Lido e relido o teor do despacho,
23. não consegue a Recorrente determinar o sentido e o alcance das afirmações do Tribunal a quo, na medida em que através dessa interpretação se ignora a vontade contratual do próprio trabalhador.
24. Uma faísca dubitativa se levanta: deve-se reconhecer um novo vínculo contratual, omitindo o já existente contrato de trabalho entre a Recorrente e J. F. … será essa a finalidade da ação? Perdoe-se-nos a alegação do óbvio: claramente que não.

VEJA-SE O SEGUINTE:
25. A Recorrente e J. F. celebraram um contrato de trabalho em 18 de abril de 2019, com efeitos retroativos a 1 de janeiro de 2019, acordando de comum, livre e consciente acordo, uma modificação na relação jurídica que então mantinham, com repercussões naturais nas suas recíprocas obrigações.

27. não se verifica, como é claro e líquido, a inexistência de contrato de trabalho e, por conseguinte, não se preenche o requisito, objeto e desiderato da presente ação: a declaração da existência do contrato de trabalho.

ATENTEMOS AGORA PARA A LETRA DA LEI,
29. no n.º 8 do artigo no 186.º - O do Código de Processo do Trabalho consta que “A sentença que reconheça a existência de um contrato de trabalho fixa a data do início da relação laboral.”
30. Como é jurisprudência assente e acima se aduziu, o objetivo claro e lícito da ação Especial para o Reconhecimento da Existência de Contrato de Trabalho é o reconhecimento de UMA relação laboral!

33. Resulta, portanto, óbvio, quer a letra da lei, quer a sua ratio, nos termos supra elencados, que o objetivo da ação é o reconhecimento da existência do contrato de trabalho, emergindo, apenas da discussão e prova da existência do contrato, aquando a sua determinação, a obrigação acessória da fixação do seu início.

34. jamais a estatuição de qualquer obrigação relativa ao contrato de trabalho (tal como a antiguidade…) poderá ser fundamento ÚNICO para a determinação e existência da referida ação especial, sob pena de uso ilegítimo e inapropriado do meio processual.
37. não é nestes termos de Direito lícita, por não se enquadrar no seu âmbito de aplicação, a ação em que, antes da qual já existe contrato de trabalho celebrado, se vise apenas determinar o seu início e a antiguidade do próprio trabalhador.

37. Entende a Recorrente que uma questão acessória como a “antiguidade” não permite o recuso ao presente processo especial, pena de nulidade insanável, o que aqui expressamente se invoca para todos os efeitos legais.

CUMPRE-NOS, PORTANTO, SALIENTAR QUE,
38. falta à ação um pressuposto essencial para que esta possa prosseguir, que que se traduz na (in)existência de um contrato de trabalho na relação jurídico-laboral em causa, sendo nestes termos a ação inútil.

III – MEIO PROCESSUAL INADEQUADO

40. No caso em apreço não está em causa a necessidade de reconhecer a existência de um contrato de trabalho, porque, na verdade, esse JÁ EXISTIA à data de interposição da ação, não estando, portanto, a ação, adequada a prosseguir o seu fim fundamental, ou seja, a declaração da existência do contrato de trabalho.
ADEMAIS,
41. A lei define concretamente, no artigo 186.º - O do CPT, que resulta da sentença quando esta reconheça a existência do contrato, a determinação da data de início da relação laboral, não sendo idóneo intentar uma ação para determinação da antiguidade do contrato nos termos desta que o Autor veio propor, surgindo a determinação do período de início da laboralidade apenas como obrigação derivada/acessória da existência do reconhecimento.
42. Não podemos olvidar a existência de limitações sérias quando à possibilidade de produção de prova que tal ação acarreta, bem como o seu carácter urgente, que, neste caso, de forma injustificada prejudicam o bom conhecimento e decisão da causa.

44. é desacertado o entendimento de que este seja o único meio processual capaz de determinar a antiguidade do trabalhador, isto porque sempre o trabalhador poderia e poderá recorrer ao Processo Comum que consta do Código de Processo do Trabalho.
45. Neste seguimento, o trabalhador é quem detém legitimidade para intentar a ação que vise a determinação da sua antiguidade, cujo efeito mais imediato se verá nos créditos laborais que lhe são devidos.

AINDA QUE ASSIM NÃO SE ENTENDA SEMPRE TEREMOS QUE ATENTAR NO SEGUINTE:

IV – DO INTERESSE PÚBLICO INSUFICIENTE AO “ATROPELO” DO INTERESSE PARTICULAR DO TRABALHADOR E À IGUALDADE ENTRE TRABALHADORES

52. o problema que se suscita não será, apenas e só, a ilegitimidade do Mistério Público, mas sim, que a interpretação que o Ministério Público faz (e acolhida pelo Tribunal) do articulado legal, permite uma ingerência injustificada e, consequentemente, ilícita do próprio numa matéria em relação à qual não tem competência,
53. Conforme desenvolvido supra, as questões relacionadas com a antiguidade do trabalhador, pela sua ratio privada, por si só, não são sindicáveis nesta sede, sendo-o, por iniciativa do trabalhador, em ação comum laboral autónoma.

NA VERDADE,
54. o Mistério Público ao tramitar a presente ação ilegitimamente usa de um meio processual inadequado para se substituir ao trabalhador que é o único sujeito com legitimidade para suscitar a apreciação da antiguidade e créditos laborais devidos em função dessa.
55. Mais estranho é que, tendo o trabalhador por acordo e nos termos legais, determinado a data de início da produção de efeitos do contrato de trabalho celebrado, usando e dispondo dos seus direitos disponíveis e privados estabelecendo a relação de trabalho os seus termos e início em conjunto com o empregador, o Ministério Público se arrogue titular da função de vir suscitar a determinação pelo tribunal da antiguidade de um contrato EXISTENTE.

57. Destarte, não pode o Ministério Público substituir o trabalhador nestes termos que, em contradição com a vontade declarada, corroborada e contratualizada do trabalhador, feita em momento anterior ao da propositura da ação.

60. não se poderá fundamentar, nesses termos, a favor de um interesse público menor, uma significativa alteração da vida do trabalhador que é tratado como terceiro numa questão essencial da sua vida, sendo, portanto, descabido um raciocínio, no seio de uma relação privada, que usa o fito de proteger o trabalhador, prejudicando-o, não lhe dando liberdade de conformação, e não o permitindo dispor dos seus direitos, ainda para mais, em contradição com a lei.

ATENTE-SE AINDA QUE,
67. para o caso de um trabalhador que no âmbito da sua relação laboral vem propor ação para que lhe seja reconhecida a sua antiguidade, tem como único meio para a propor a ação comum.
EM OPOSIÇÃO,
68. o Ministério Público vem usar desta ação especial para outro trabalhador que vê assim a sua antiguidade definida com base numa ação mais célere, com uma tramitação que o favorece e sem ter sequer de ser parte na mesma ação, dado que será o Ministério Público a propô-la.

SE ASSIM NÃO SE ENTENDER, O QUE NÃO SE CONCEDE,
73. se se subscrever o entendimento do Tribunal a quo, existirá uma clara desigualdade entre o pretenso trabalhador e o trabalhador dito comum que terá que recorrer a uma ação de processo comum para aferir da sua antiguidade.

75. A entender-se o contrário, está-se a violar o direito à igualdade previsto no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa e, como tal, fará incorrer o artigo 186.º- O do Código de Processo do Trabalho, à luz de tal interpretação, em inconstitucionalidade, a qual se deixa para todos os legais efeitos arguida.
76. Conclui-se, por isso, num percurso intelectual e cognoscitivo transparente e de facílima interpretação e seguimento, que a decisão proferida viola, entre outras disposições, o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, revelando-se desrazoável, arbitrária e destituída de fundamento.
77. Pelas razões aqui invocadas, e ainda pelo que dispõe o artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, o despacho proferido aqui em sindicância, deve ser revogado, porque as normas em que se fundou – concretamente o artigo 186.º - O do Código de Processo de Trabalho - foram interpretadas em desconformidade com aquela norma constitucional, pois impunham um tratamento claramente desigual entre Trabalhadores na mesma situação a de visarem verem estendida a antiguidade do seu Contrato de Trabalho, podendo, concretamente, uns gozar da intervenção da ACT e do Ministério Público e de uma ação que concretamente lhes acarreta maior celeridade e, até certo ponto, garantias, enquanto outros trabalhadores teriam de se munir de ação comum, tendencialmente mais lenta e onde por si e pelos seus meios teriam de fazer valer as suas pretensões, visando um fim, concretamente, idêntico.

79. Ao decidir como decidiu, o douto despacho recorrido fez uma errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 186.º - O bem ainda o disposto nos artigos 1.º, 2.º, 12.º, 13.º, 202.º da Constituição da República Portuguesa, o que aqui expressamente se invoca para todos os efeitos legais.

SE ASSIM NÃO SE ENTENDER, O QUE NÃO SE CONCEDE, ATENTE-SE AINDA NO SEGUINTE:

VII - DA ADVERTÊNCIA DA ACT
86. A ACT no âmbito da sua atividade e objetivos, realizou uma advertência no dia 23 de janeiro de 2019 à Recorrente para que esta regularizasse a situação até ao dia 25 de fevereiro de 2019 pugnando “no sentido de se reconhecer a existência de contrato de trabalho por tempo indeterminado, celebrado com os supra identificados trabalhadores, comprovando que foi prestada toda a informação escrita à trabalhadora sobre as condições do contrato…”,
ASSIM,
87. para que a situação laboral da trabalhadora e, consequentemente, a situação da Recorrente com a ACT ficasse sanada era necessário que esta reconhecesse a existência do contrato de trabalho (apenas e só).
ADEMAIS,
88. resulta do Regime Jurídico da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro bem como das disposições do Código do Trabalho, que na medida do cumprimento do disposto na advertência ficará sanado o vício, não resultando daí qualquer prosseguimento ou sanção adicional. Em boa verdade, a Recorrente cumpriu com disposto em tal advertência, consequentemente, a ACT não visando o reconhecimento ou uma resolução extrajudicial de uma situação que, em bom rigor, já se encontra resolvida há muito - age com base numa realidade sanada que não é suscetível de fundamentar a propositura de tal ação judicial.
Como corolário do exposto,
89. deveriam as exceções invocadas pela Recorrente em sede de Contestação ter sido julgadas procedentes, pelo que deve ser revogado o Despacho de 15 de outubro de 2019.
Princípios e disposições legais violadas ou incorretamente aplicadas:
Foram violados, entre outros, os artigos 186.º - O do Código de Processo do Trabalho, bem ainda o disposto nos artigos 1.º, 2.º, 12.º, 13.º, 202.º da Constituição da República Portuguesa.

*
Em contra-alegações sustenta-se o julgado.

Realizou-se a audiência de discussão e foi proferida decisão nos seguintes termos:
“ Pelo exposto, julga-se a ação procedente por provada e, em consequência, reconhece-se que a relação contratual que existe desde 22 de setembro de 2016 entre a R. e a trabalhadora J. F. consiste num contrato de trabalho enquadrável no conceito definido no artº 12º do C. do Trabalho.
…”
Inconformada a ré interpôs recurso apresentando em síntese as seguintes conclusões:

I. O presente recurso versa sobre matéria de facto e de Direito…

XI. São vários os concretos pontos dos factos provados que a Recorrente considera incorretamente julgados, sendo que no seu entender impunha-se que os mesmos constassem antes do elenco de factos não provados, designadamente os factos provados 5, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20 e 24.
XII. O Tribunal a quo decidiu não valorar o depoimento das testemunhas arroladas pela Recorrente, o que é inaceitável e incompreensível numa persecução da descoberta da verdade material e na justa composição de um litigio, por vários motivos.

XXII. O Ponto 5 dos factos considerados como provados pelo Tribunal a quo não poderia ter sido considerado enquanto tal na sua plenitude, designadamente, na parte em que refere que a prestadora J. F. foi admitida como docente ao serviço da Recorrente.
XXIII. Tal não corresponde à verdade, nem resulta de qualquer elemento probatório constante do processo, nem poderia, porque a trabalhadora (independente, àquela data) J. F. não reúne os requisitos legais para ser considerado como “Docente”.

XXVII. Também o ponto 13 do elenco dos factos dados como provados não poderia ter sido considerado enquanto tal pelo Tribunal a quo …

XXVIII. A legislação aplicável e que sistematiza as competências, procedimentos e metodologia a observar no processo de planeamento e concertação das redes de oferta profissionalizantes a isso obriga, não podendo os cursos de formação ser ministrados sem que a escola possua tais equipamentos. Se não os possuir, os cursos não são homologados e a escola não os poderá ministrar, sendo irrelevante este critério/indício para aferir a existência de uma relação subordinada.
XXIX. Os equipamentos/instrumentos referidos na sentença a quo não foram utilizados pelo prestador J. F., nem a Recorrente a obrigava o a utilizá-los, resultando da prova produzida que a prestadora J. F. utilizava primacialmente instrumentos/equipamentos próprios.

XXXV. Também o Ponto 15 considerado como provado pelo Tribunal a quo não poderia ter sido considerado enquanto tal na sua plenitude, designadamente na parte em que refere que a prestador J. F. entrava no e-schooling com um qualquer login próprio.

XXXVIII. Do mesmo jeito, jamais poderiam os pontos 14 e 19 ter sido dados como provados, por tal não corresponder à verdade, nem resultar de qualquer elemento probatório constante do processo.
XXXIX. As aulas não eram previamente estabelecidas pela Ré, a formadora J. F. não era convocada para comparecer a reuniões pela Ré onde participava como orientador, nem estava sujeito a qualquer avaliação de desempenho pela mesma, contrariamente ao erroneamente dado como provado pelo Tribunal.

XLV. Face ao antedito, impõe-se a alteração da matéria de facto, dando os referidos pontos 14 e 19 como não provados.
XLVI. O mesmo se diga quanto ao ponto 16 dado erroneamente como provado.
XLVII. A Recorrente não definia unilateralmente o horário da formadora J. F., uma vez que o mesmo era elaborado tendo por base as disponibilidades manifestadas pelo próprio formador.

LII. Ademais, por mais que se procure, não se descortina nos autos qualquer prova que possa corroborar o ponto 17 e o ponto 18, não devendo estes ser dado como provados.
LIII. A fundamentação desses pontos consiste apenas na letra do contrato de prestação de serviços.
LIV. Sendo esse o magnum argumento que norteou a apreciação do Tribunal a quo no que a estes factos dizem respeito, apenas se indaga como se pode, para certos efeitos, tratar o dito contrato como uma verdade indesmentível, mas, para outros feitos, ver nesse contrato uma formulação apócrifa e dissimulada…

LVI. Na ótica do legislador, e atendendo sobretudo ao preceituado nos arts. 360.º e 376.º, n.º 2, ambos do Código Civil, também o documento é um todo que não pode ser arbitrariamente dilacerado pelo julgador, valorando-se uma página e ignorando-se o disposto no verso…
LVII. Bem vistas as coisas, o contrato é o objeto da inquirição, o objeto em torno do qual gravita a dinâmica probatória, e não um meio probatório.
LVIII. Em face do acima exposto e na completa ausência de qualquer elemento probatório constante dos autos, pugnamos pela alteração, no sentido de ser considerada NÃO PROVADA, impondo-se, assim, a alteração da matéria de facto, dando o referido ponto 17 e ponto 18 como NÃO PROVADOS.
LIX. Nesta senda, também o ponto 20 não poderia ter sido considerado provado, atenta a escassez de matéria probatória dos mesmos, e até elementos probatórios dissonantes quanto à sua veracidade/prova.

LXIII. E a única consequência que adviria ao formador da sua falta seria simplesmente a prestação das horas que não prestou noutra altura, em cumprimento da prestação dos serviços contratualizados.
LXIV. A prestadora J. F. podia, pois, e a seu livre talante, ressalvada a diligência e a boa fé que qualquer um deve depositar no cumprimento das suas obrigações, faltar sem apresentar qualquer justificação, fazendo-se substituir por um outro docente, sem qualquer autorização da Recorrente…
LXVIII. … o ponto 24 nunca deveria ter sido dado como provado, desconhecendo-se, aliás, o que motivou o Tribunal a quo a dever esse ponto como provado.

LXXIII. pelo que o ponto 24, no que a este trecho se reporta, deve ser dado como não provado, devendo, por conseguinte e em conformidade com o exposto supra, passar-se a ler “o pagamento dessa quantia era por transferência bancária para conta do trabalhador que este fornecia à R.”.

LXXVII. Deve ser ainda realçado que a Recorrente colocou em causa a veracidade dos factos vertidos no auto da ACT, permitindo a conclusão de que o mesmo não pode merecer qualquer crédito.
LXXVIII. Nesta senda, jamais poderá o auto da ACT ser considerado inabalável, na medida em que da produção de prova realizada nos autos o seu conteúdo foi fundamentadamente colocado em causa.

XCII. Por outro lado, do elenco de factos não provados, e atenta a sua relevância para a justa apreciação do mérito da causa, deveriam forçosamente – atenta a prova testemunhal e documental produzida nos autos – ter sido considerados como provados os factos 2, 3 e 6.

CIV. Por último, também o ponto 6, que inexplicavelmente foi dado como não provado, não o deveria ter sido, devendo antes ter ingressado no elenco da matéria de facto dada como provada.
CV. Não se entende como pode o Tribunal Recorrido se demitiu de dar tal facto como provado, sabendo-se que as referidas quantias estão todas discriminadas nos recibos de quitação emitidas pela própria prestadora J. F., e que a Recorrente juntou aos autos no momento da apresentação da sua Contestação.

DO DIREITO
DA DISTINÇÃO ENTRE CONTRATO DE TRABALHO E CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS

CXVI. e ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, o contrato sub judice consubstancia um contrato de prestação de serviços.
CXVII. De facto, no que ao objeto contratual respeita, sobre o devedor recaía a obrigação de apresentar um resultado ao credor: ser lecionado um Módulo de formação constituído por um concreto e determinado número de horas.
CXVIII. E, no que tange ao relacionamento inter partes, o devedor agia com completa autonomia no modo como prestava a sua atividade a favor do credor.

DA AUTONOMIA PRIVADA E DA LIBERDADE CONTRATUAL
CXIX. A autonomia privada é frequentemente identificada com uma das suas mais significativas expressões: a liberdade contratual, prevista no artigo 405.º do Código Civil, abrangendo quer a possibilidade de celebrar ou não celebrar determinado contrato (liberdade de celebração), quer a possibilidade de fixação do conteúdo do contrato (liberdade de estipulação).

CXXII. No caso sub judice, perante a factualidade dada como provada, e tendo em consideração que o que se discute é a qualificação contratual do contrato celebrado entre a Ré e a interessada, impõe-se a conclusão de que estamos perante um contrato de prestação de serviços.

CXXVIII. O regime do art. 12.º do Código do Trabalho e a disciplina adjetiva que o acompanha visa, como bem se sabe, combater a chaga nacional dos falsos recibos verdes.
CXXIX. No entanto, honoráveis que sejam os objetivos que comandam o pensamento legislativo, no caso concreto nenhum deles pontifica.
CXXX. Não há o risco da concorrência desleal, nem a Recorrente poupa qualquer quantia ao ter trabalhadores dissimulados, nem tem qualquer benefício económico em se prevalecer de falsos recibos verdes.

CXXXIV. De facto, qualquer tentativa de coartar a liberdade de contratar da Recorrente e da prestadora J. F. que, a ocorrer como pretende impor o Tribunal a quo, redunda igualmente numa violação gritante do consagrado no artigo artigos 13.º, 26.º n. º1, 27.º n. º1, 47.º, 58.º n.º 2, alínea b), 61.º, n. º1 e 62.º, n. º1, 80.º al. c), e 86.º da C.R.P., padecendo de incurável inconstitucionalidade, a qual se deixa arguida para todos os efeitos tidos por convenientes.
….
DA PRESUNÇÃO DE LABORALIDADE

CXXXIX. Os indícios referidos nas várias alíneas do art. 12.º, n.º 1 do CT, são indícios em sentido próprio (embora a lei se lhes refira como «características»), i.e., elementos de facto que constituem pistas num determinado sentido.
CXL. É com base nesta presunção de laboralidade que o Tribunal a quo entende que entre a Recorrente e J. F. vigorou um contrato de trabalho entre 12 de setembro de 2016 e 31 de dezembro de 2018.
CXLI. Ao fazê-lo, o Tribunal a quo incorreu num erro de julgamento da matéria de direito, porquanto, estando perante uma presunção iuris tantum, e atenta toda a produção de prova e matéria carreada para os autos, a Recorrente logrou ilidi-la, demonstrando que, a despeito de se verificarem aquelas circunstâncias, as partes não celebraram qualquer contrato de trabalho, conforme advém do n.º 2 do artigo 350.º do CC.
CXLII. Analisando a prova produzida nos autos, a subordinação jurídica do formador à Ré demonstra ser inexistente para constituir qualquer relação laboral, só podendo ser reconhecida a existência de uma efetiva prestação de serviços, conclusão a que chegamos também com a ponderação e avaliação global dos indícios no caso concreto.

VEJAMOS:

A) O LOCAL DE TRABALHO COINCIDENTE COM INSTALAÇÕES DO BENEFICIÁRIO DA ACTIVIDADE OU POR ELE CONTROLADAS

CXLIII. Um formador ou professor exerce habitualmente a sua atividade em escolas ou centros de formação, porque são estas as instalações legalmente homologadas pelo Ministério da Educação para o efeito, não sendo possível a ministração de aulas noutros locais.

CXLV. Assim, no caso concreto, o facto de local de prestação dos serviços ser coincidente com as instalações do beneficiário da atividade ou por este controladas não constitui qualquer indício de que estamos perante uma relação jurídica de trabalho subordinado.

B) A PERTENÇA DOS EQUIPAMENTOS E INSTRUMENTOS DE TRABALHO A BENEFICIÁRIO DA ACTIVIDADE

CXLVI. A própria natureza da atividade de formação e lecionação exige que haja um mínimo de equipamentos e condições nas instalações para que a atividade em si possa ser realizada, não só para os formadores, mas também para os formandos. Se assim não fosse, o Ministério da Educação não poderia homologar as instalações para esse efeito.
CXLVII. Não obstante, o formador não utilizava exclusivamente equipamentos e instrumentos de trabalho pertencentes à Ré, mas também e primacialmente equipamentos e instrumentos de trabalho próprios, como, por exemplo, computador portátil, com o qual preparava as suas formações.

CXLVIII. Assim, também o facto de os equipamentos e instrumentos de trabalho serem propriedade do beneficiário da atividade prestada, in casu, a Ré, não constitui qualquer indício de que estamos perante uma relação jurídica de trabalho subordinado13.

C) A EXISTÊNCIA DE HORÁRIO DE TRABALHO

CXLIX. O formador nunca foi ajustado ou esteve obrigado a qualquer período de tempo de trabalho, pois apenas tinha que proceder à lecionação de concretos e determinados módulos formativos aos formandos, o que aceitava e se comprometia a fazer perante a Ré – era este o objeto contratual.
CL. Mais, o próprio horário de lecionação aos formandos, ou seja, o horário letivo não era unilateralmente fixado pela Ré, pois era o próprio formador que indicava a sua disponibilidade e preferência de horário, que eram tidas em conta na fixação do horário de lecionação de aulas.

CLII. Ademais, o formador não tinha qualquer controlo de assiduidade ou pontualidade, não existindo qualquer registo de tempos de entrada. O software e-schooling, servia o único propósito de registo dos sumários das aulas lecionadas e das eventuais faltas dadas pelos formandos.

CLIV. Assim, o facto de existir um horário definido para lecionação de aulas aos formandos, numa escola, não constitui qualquer indício de que estamos perante uma relação jurídica de trabalho subordinado.

D) O CARÁCTER PERIÓDICO DA RETRIBUIÇÃO PAGA COMO CONTRAPARTIDA DA ACTIVIDADE

CLV. Como ficou provado, o formador não recebia uma retribuição da Ré, mas, antes, pagamentos referentes aos serviços prestados, sem qualquer regularidade ou periodicidade.
CLVI. Ao longo da execução do contrato de prestação de serviços, até por uma questão de razoabilidade, a Ré ia liquidando ao formador os montantes referentes às horas já lecionadas. No entanto, estes pagamentos não tinham qualquer carácter regular ou periódico.

E) O DESEMPENHO DE FUNÇÕES DE DIRECÇÃO OU CHEFIA NA EMPRESA PELO PRESTADOR DA ACTIVIDADE

CLX. Como se torna evidente da prova produzida nos presentes autos, o formador nunca desempenhou funções de direção ou chefia na organização da Ré.


SEM PRESCINDIR, E AINDA QUE SE CONSIDERE A EXISTÊNCIA DE UMA RELAÇÃO DE TRABALHO SUBORDINADA ENTRE A RÉ E O FORMADOR, O QUE NÃO SE CONCEDE E APENAS POR MERO DEVER DE PATROCÍNIO SE EQUACIONA,

CLXXIII. sempre se diga que entre a Ré e a Formadora não vigorou uma relação laboral contínua, já que, na verdade, o contrato celebrado entre as partes era apenas referente a um concreto ano letivo.
CLXXIV. A Ré não sabia se, no ano subsequente, aquele concreto curso de formação seria aberto e, consequentemente, se iria precisar dos serviços da Formadora.
Nesta medida, a Formadora sempre teve consciência que o contrato que celebrava conhecia o seu termo com o encerrar daquele ano letivo.
CLXXV. Significa isto que, entre Ré e Formadora, ocorreram tantos contratos de trabalho quantos anos letivos. Com efeito, o contrato de trabalho cessava no termo do ano letivo e, de meados Julho a meados de setembro, não existia qualquer relação jurídica entre as partes.

CLXXVII. Perante esta factualidade, sempre se diga que, a considerar-se a relação existente entre a Ré e a Formador como de trabalho subordinado – o que, repete-se, não se concede e apenas por dever de patrocínio se equaciona – estamos na presença de vários contratos de trabalho, tantos quantos os anos letivos em que a Formador prestou serviços a favor da Ré, sendo liminar que cada um dos contratos se extinguiu em Julho do ano subsequente, deixando de produzir quaisquer efeitos jurídicos, razão pela qual, para efeitos de antiguidade, apenas poderá ser considerada a existência da última relação jurídica constituída, a saber a constituída em Setembro de 2018.

CLXXIX. é notório que o Tribunal a quo não fez a melhor interpretação do Direito aplicável, violando, entre outros, os artigos 219.º, 236.º, 405.º, 1152.º e 1154.º do Código Civil, os artigos 10.º e 12.º do Código do Trabalho, e ainda os artigos 13.º, 26.º/1, 27.º/1, 47.º, 58.º/2, 61.º/1, 62.º/1, 80.º al. c), 85.º/1, e 86.º da Constituição da República Portuguesa.
Em contra-alegações sustenta-se o julgado.
Colhidos os vistos dos Ex.mos Srs. Adjuntos há que conhecer do recurso.
***
Factualidade:

1 - A R. (Associação Empresarial de ..., ... e ...), MPC ………, NISS ………., com sede na Rua …, Fafe, exerce como atividade principal organizações económicas e patronais, à qual corresponde o CAE — 8420.
2 - No desenvolvimento dessa sua atividade é proprietária da Escola Profissional de ..., titular da autorização prévia de funcionamento no 140, emitida em 9 de maio de 2000, pelo Ministério da Educação/Direção Regional da Educação Norte.
3 - Os locais de trabalho onde se desenvolve esta atividade são geridos pela Ré e situam-se na Praça …, Fafe, na Rua ..., Fafe e no Pavilhão Gimnodesportivo, na Travessa ..., …, ….
4 - A Ré tem como Presidente da Direção, J. C., NIF ………, residente na Travessa de …, Fafe.
5- A trabalhadora J. F., foi admitida ao serviço da Ré, como docente da disciplina de Inglês, do grupo 330, nos CEF`s e no profissional e Diretora de Curso e de Turma do Curso de operador de distribuição, que é um CEF (turma …), para o ano letivo de 2016/2017, por contrato celebrado entre a Ré e a trabalhadora a 22 de setembro de 2016, e denominado como contrato de prestação de serviços formador externo.
6- A Ré e a trabalhadora assinaram para o ano letivo de 2017/2018, três novos contratos, denominados de prestação de serviços formador externo, um em que a trabalhadora se compromete a prestar os serviços de docente/ formador externo na disciplina de Inglês, e outro em que se compromete a prestar os serviços de docente/ formador externo na disciplina de Língua Estrangeira – Inglês e outro em que se compromete a prestar serviços de Diretora do Curso de Operador/a Distribuição, todos datados de 8 de Setembro de 2017.
7- Para o ano letivo de 2018/2019, a Ré e a trabalhadora assinaram, a 6 de setembro de 2018, três novos contratos denominados como prestação de serviços formador externo, um em que a trabalhadora se compromete a prestar os serviços de docente/formador externo na disciplina de Inglês, outro de Inglês e outro como Diretora do Curso de Operador/a Distribuição.
8 - Todos os Contratos estipulam como fim de vigência a data de 31 de julho dos respetivos anos letivos.
9- O mês de agosto de cada ano corresponde a um dos períodos de interrupção das atividades escolares e letivas.
10 - Está previsto no artº 128º, nº 1, inserido na Secção VI (Calendário Escolar), do Capítulo III (Direitos e Deveres da Comunidade Escolar) do Regulamento Interno da Escola Profissional de ... 2017 – 2020, aprovado pela R. que: “o ano escolar é o período compreendido entre o dia 1 de setembro de cada ano e o dia 31 de agosto seguinte“ e nos nºs 2, 3 e 5, do mesmo artº que o calendário escolar anual é definido por despacho do Ministério da Educação; que se organiza em 3 períodos letivos, ocorrendo a avaliação sumativa no final de cada um deles e que o mês de agosto é reservado para as férias de verão.
11 - No artº 129º do mesmo Regulamento, que tem como epígrafe “Períodos de interrupção letiva “, consta que o ano escolar é organizado de modo que sejam cumpridas, no mínimo, 3 interrupções das atividades escolares, coincidentes com o Natal, Carnaval e a Páscoa, e uma quarta, por um período nunca inferior a 22 dias úteis seguidos, a ocorrer, em cada ano escolar, entre 1 de agosto e 1 de setembro.
12 - A trabalhadora desenvolveu e desenvolve, ao longo destes anos letivos a sua atividade de docente/formador, na área tecnológica e na área cientifica nas instalações da R. e por si geridas, referidas no nº 3 supra, nomeadamente, nas instalações sitas na Praça … e na Rua ....
13 - Para o desempenho das suas funções a trabalhadora sempre utilizou instrumentos e equipamentos pertencentes à R., nomeadamente, mobiliário nos locais de trabalho, mesa, cadeira e quadro interativo e branco, computador, videoprojector, fotocópias, colunas canetas, softwares onde escreve os sumários e registo de ocorrências e plataforma (moodle) para interagir com os alunos, nomeadamente entrega de trabalhos e testes e fornecimento de material.
14 - A trabalhadora dava as aulas que estavam previamente estabelecidas pela R., comparecia às reuniões de trabalho e de organização para que era convocado pela R. e participava como orientadora.
15 - A trabalhadora registava as aulas dadas e os respetivos sumários e através de uma plataforma informática existente na R., na qual entra através de “login “no programa/plataforma “e-schooling”.
16 - Para cada um dos anos letivos era a R., quem no início dos respetivos anos, definia o horário de trabalho da trabalhadora e dos restantes colegas docentes, de acordo com as disciplinas que ministravam e que afixava nas instalações e entregava ao trabalhador.
17- A trabalhadora aprecia os desempenhos escolares dos alunos e nota-os.
18- Como diretora de turma a trabalhadora regista as faltas, elabora a reposição de aulas aos alunos, mapas das faltas, atende semanalmente os encarregados de educação dos alunos, reúne com os encarregados de educação, pelo menos, 2 vezes por período escolar, procede ao registo dos sumários pedagógicos, elabora um dossiê de direção de turma, segundo índice determinado pela Diretora pedagógica e elabora todo o processo de matrícula inerente ao processo individual de cada aluno em formato de papel e digital, ocupa-se da preparação e elaboração de toda a documentação inerente às reuniões de avaliação formativa e sumativa e transmite aos encarregados de educação as informações relativas aos seus educandos.
19 - A trabalhadora está sujeita a avaliação de desempenho, cujo resultado provém da avaliação dos alunos, direção pedagógica e direção executiva.
20- A trabalhadora está obrigada a comunicar em impresso próprio dirigido ao Diretor Executivo e justificar previamente todas as faltas referentes às aulas e reuniões.
21- Consta do artº 209 do Regulamento Interno, que tem como epigrafe “Não cumprimento de deveres por parte do docente/formador” - “No caso dos docentes/formadores não cumprirem os deveres que têm para com a escola enunciados em todo o presente regulamento, ser-lhes-ão aplicadas as seguintes sanções de acordo com a gravidade da infração:
a) Rescisão do contrato de prestação de serviços, nos termos enunciados no mesmo;
b) impossibilidade de o docente/ formador celebrar novo contrato de prestação de serviços com a escola nos anos letivos seguintes;
c) Pagamento de uma indemnização à Escola, que se traduzirá numa perda de honorários correspondentes às infrações cometidas.”
22- E, no art º 210º do mesmo Regulamento, que tem como epigrafe “Pressuposto de aplicação das sanções do docente” está previsto que:
“1 -As medidas previstas no artigo anterior, à exceção da rescisão do contrato referida na alínea a) para que sejam aplicadas, devem ser registadas no Processo Individual do Docente/Formador pela Direção da Escola e comunicadas por esta à DGE, entidade competente para as aplicar.
2 - Antes do registo a DGE deverá ouvir o docente e sua justificação para a infração praticada, e decidir em conformidade de forma proporcional à gravidade daquela e à culpa do docente.”
23 -Como contrapartida do trabalho que prestava para a R. e dos seus corpos diretivos, o trabalhador recebia o valor de € 12,50/hora, acrescido de IVA.
24 - O pagamento dessa quantia era, em regra, mensal e por transferência bancária para conta do trabalhador que este fornecia à R.
25 - Essa quantia era calculada com base no número de horas desempenhadas.
26 - A trabalhadora no ano letivo de 2016/2017 foi contratada pela R. para lecionar 733 horas/ano.
27 - No ano letivo de 2017/2018 foi contratada para lecionar 751horas/ano.
28 - No ano letivo de 2018/2019 foi contratada para lecionar 824 horas/ano.
29 -Após a instauração do presente processo pela Autoridade para as Condições no Trabalho a Ré celebrou com a trabalhadora J. F. um contrato de trabalho em 18 de abril de 2019 e comunicou a 13 de junho de 2019 à Segurança Social a sua admissão como trabalhador por conta de outrem, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2019.
30 - Os formadores têm autonomia na elaboração dos sumários.
31 - Os formadores podem trocar as aulas.
32 - Foram emitidos pela trabalhadora relativamente à R., pelo menos, as faturas-recibos juntos a fls. 184 a 192 v., cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
33 - No ano 2015/2016 o Sistema de Antecipação de Necessidades de Qualificações (Nut III- Ave) elaborou um relatório sobre a tendência de evolução da necessidade de Recursos Humanos nos termos referidos no documento junto a fls. 164 a 167 v, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
34 - O Conselho Intermunicipal de Educação da CIM do Ave reunido em 23/2/2016, aprovou a proposta intermunicipal de cursos profissionais, incluindo da Escola da R., nos termos e para os efeitos constantes de fls. 168 a 178, aqui dadas por reproduzidas.
35 - No ano de 2017/2018, a Comunidade Intermunicipal do Ave, deu parecer positivo para alteração da proposta inicial de oferta formativa de Cursos Profissionais, apresentada pela R., no sentido de alterar o Curso de Técnico de Apoio Familiar e Apoio À Comunidade para o Curso de Técnico de Coordenação e Produção de Moda nos termos documentados, na comunicação de fls. 179 v. a 181, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
36 - No ano 2019, a propósito das autorizações de funcionamento dos cursos na Escola da R. houve as comunicações de fls. 178v. e 179, cujo teor se dá por integralmente reproduzida
37 - A homologação dos cursos pelos órgãos de tutela depende da adequação das instalações e equipamentos disponibilizados pela ré para a ministração dos mesmos.
38- A oferta formativa da R. depende de prévio financiamento.
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III- FACTOS NÃO PROVADOS:

Com relevância para a decisão da causa não se provaram os restantes factos, nomeadamente factos que estejam em contradição com os factos provados, factos conclusivos e questões de direito e ainda que:

1- A trabalhadora registasse os tempos de entrada através da plataforma mencionada no nº 15 dos factos provados ou outro sistema;
2- A trabalhadora pudesse ausentar-se e não comparecer nas instalações da R. sem sancionamento disciplinar ou outra consequência;
3 - O horário da trabalhadora fosse elaborado pela R. em função das disponibilidades que ela concedia à R.;
4 - A trabalhadora nunca tenha faltado;
5 - O Regulamento interno mencionado nos factos provados não seja aplicável à trabalhadora;
6- A formadora J. F. tivesse recebido durante a pendência da relação jurídica celebrada com a R. as quantias e nas datas referidas no artº 213º da contestação, que aqui se dá por integralmente reproduzido;
7- Além da mencionada no nº 35 dos factos provados tenham ocorrido outras propostas para alteração da proposta inicial de oferta formativa de Cursos Profissionais, apresentados pela R..
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Conhecendo do recurso:

Nos termos dos artigos 635º, 4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso encontra-se balizado pelas conclusões do recorrente.
Questões colocadas:
- Alteração da decisão relativa à matéria de facto no que respeita aos Factos 5, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20 e 24 dados como provados e os 2, 3 e 6 dos não provados.
- No recurso interposto do despacho saneador e tendo em consideração as questões alegadas na contestação, está em causa:
inutilidade/impossibilidade originária da lide/meio processual inadequado; Falta de interesse em agir e ilegitimidade do MºPº; nulidade do processo.
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Invoca a recorrente como exceção a IMPOSSIBILIDADE ORIGINÁRIA DA LIDE.

Refere que constitui motivo legitimador da Acão Especial de Reconhecimento da Existência de Contrato de Trabalho a necessidade de se ver reconhecido um contrato de trabalho, combatendo a precariedade laboral e as suas consequências individuais e sociais. No caso concreto existia à data da propositura da ação um contrato celebrado entre a recorrente e a trabalhadora, não se verificando o pressuposto essencial da ação, ou seja, a existência contemporânea de uma relação precária análoga à de contrato de trabalho.
Como nota prévia importa referir que a impossibilidade da lide, seja originária seja superveniente, artigo 277º do CPC, ocorre quando por virtude de circunstância anterior/posterior à dedução da ação, a “pretensão” deixa de ter sentido, deixa de se justificar, como por exemplo no caso de desaparecimento dos sujeitos ou do objeto do processo. Distingue-se da inutilidade superveniente porque nesta por via do facto ou circunstância posterior a pretensão encontrou satisfação.

Vejamos:
A lei 63/2013 ao introduzir este mecanismo teve em vista “combater a utilização indevida dos contratos de prestação de serviços em contexto de trabalho subordinado”, conforme seu artigo 1º.
0 artigo 15-A da Lei n.º 107/2009, de 14/09, aditado pela l. 63/2013 de 27/8 refere:
Procedimento a adotar em caso de utilização indevida do contrato de prestação de serviços
1 - Caso o inspetor do trabalho verifique a existência de indícios de uma situação de prestação de atividade, aparentemente autónoma, em condições análogas ao contrato de trabalho, nos termos descritos no artigo 12.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, lavra um auto e notifica o empregador para, no prazo de 10 dias, regularizar a situação, ou se pronunciar dizendo o que tiver por conveniente.
2 - O procedimento é imediatamente arquivado no caso em que o empregador faça prova da regularização da situação do trabalhador, designadamente mediante a apresentação do contrato de trabalho ou de documento comprovativo da existência do mesmo, reportada à data do início da relação laboral.
3 - Findo o prazo referido no n.º 1 sem que a situação do trabalhador em causa se mostre devidamente regularizada, a ACT remete, em cinco dias, participação dos factos para os serviços do Ministério Público da área de residência do trabalhador, acompanhada de todos os elementos de prova recolhidos, para fins de instauração de ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho.
4 - A ação referida no número anterior suspende até ao trânsito em julgado da decisão o procedimento contraordenacional ou a execução com ela relacionada.»
O prosseguimento dos procedimentos ligados à intervenção da ACT no âmbito das suas atribuições, não dependem da manutenção da situação entendida como irregular que determinou a sua ação, antes se justificando tal prosseguimento, pois que, desde que não reconhecida a situação como laboral a concreta situação, circunstanciada no tempo, diversos aspetos relacionados e dependentes da existência de uma relação laboral continuam carecidos de uma solução.
É que está em causa uma concreta relação entre partes, num determinado tempo. A situação vai implicar que o tribunal dê conhecimento à segurança social, a fim de esta poder providenciar pela regularização das prestações devidas, conforme artigo 186-O do CPCT, introduzido por aquela mesma lei e que refere:
9 - A decisão proferida é comunicada oficiosamente pelo tribunal à ACT e ao Instituto da Segurança Social, I. P., com vista à regularização das contribuições desde a data de início da relação laboral fixada nos termos do número anterior.»
Com esta ação pretende-se não apenas o reconhecimento da existência do contrato de trabalho, que remete para um interesse essencialmente privado, mas também a prossecução do interesse público de combate a precariedade laboral, de combate à dissimulação de relações laborais propiamente ditas. Estão ainda em causa, reflexamente, interesses públicos relativos ao cumprimento para com o Estado de obrigações contributivas.
Assim, o facto de o vínculo ter cessado por qualquer razão, não implica qualquer impossibilidade da lide, como não implica tal consequência, o facto de entretanto as partes terem celebrado um contrato de trabalho, a menos que tal constitua regularização da situação constatada. A referência da ré no sentido de que a ação prossegue apenas para determinação da antiguidade não é correta. Não é verdade que esteja apenas em causa a antiguidade. É que a antiguidade tem que reportar-se a um vínculo contratual, o qual não pode ser o atualmente existente por força do contrato entretanto celebrado, já que este tem uma data de início fixada. Está em causa isso sim a determinação da natureza do vínculo num determinado período de relação entre as partes.
Não se visa apenas clarificar a situação contratual, numa perspetiva estática, mas sim clarificar este num determinado contexto temporal, só assim se podem prosseguir os objetivos tidos em vista pela lei, “combater a utilização indevida dos contratos de prestação de serviços em contexto de trabalho subordinado”. Na interpretação da recorrente, celebrado que fosse contrato de trabalho, deixar-se-ia sem proteção o uso indevido da contratação por prestação de serviços no pretérito. O meio processual é o adequado, o previsto na referida lei.
***
DA FALTA DE INTERESSE EM AGIR - INTERESSE PÚBLICO INSUFICIENTE

Refere o recorrente que o problema que nesta sede se suscita não será, apenas e só, a ilegitimidade do Ministério Público, mas sim, que a interpretação que o Ministério Público faz (acolhida pelo Tribunal) do articulado legal, permite uma ingerência injustificada e, consequentemente, ilícita do próprio numa matéria em relação à qual não tem competência. Não pode o Ministério Público substituir o trabalhador, muito menos em contradição com a vontade deste.
O interesse e legitimidade do MºPº resulta da própria lei, que lhe atribui a competência para deduzir e prosseguir nesta ação, mesmo sem intervenção do trabalhador, conforme artigo 186º-L, nº 1 do CPT.
Como defende o STJ, designadamente processos n.os 17082/17.9T8LSB.L1.S1 e 20416/17.2T8LSB.L1.S1, esta ação tem natureza “publicista que resulta da atividade da Autoridade para as Condições do Trabalho”, tem caráter oficioso, “iniciando-se sem a intervenção processual do trabalhador, que pode que pode, em fase posterior, aderir aos factos apresentados pelo Ministério Público, apresentando articulado próprio e constituir mandatário, como está previsto no n.º 4, do art.º 186.º-L, do Código de Processo do Trabalho”.
Refere a recorrente que a ação é intentada contra a própria vontade do trabalhador. Tal facto não está demonstrado, quer dizer, não resulta demonstrado que relativamente ao trato relacional em causa, o trabalhador, de forma livre pretendesse uma relação como prestador de serviços, e que assim se tenha desenvolvido a relação. A proteção legal visa precisamente a preservação da vontade real do trabalhador aquando da contratação, pois é sabido que fruto da necessidade do trabalho para a satisfação das suas necessidades, tal liberdade pode ficar limitada, logrando os empregadores impor formas contratuais menos protetoras. Persegue-se a liberdade contratual do trabalhador, uma liberdade real e não formal.
Quanto ao interesse da ação mesmo após a cessação do vínculo, ou a contemporânea existência de um vínculo laboral, remetemos para as considerações feitas a propósito da alegação de impossibilidade originária da lide.
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Refere-se ainda existir uma clara desigualdade entre o pretenso trabalhador e o trabalhador dito comum que terá que recorrer a uma ação de processo comum para aferir da sua antiguidade. Deste modo, a aceitar-se o recurso à ação especial apenas e tão só para discutir a existência de um alegado contrato, que cessou por iniciativa do trabalhador, entende-se que existe uma diferenciação injustificada e (porque não dizer) desproporcional entre os regimes destes dois tipos de ação, cuja finalidade é exatamente a mesma.
Não se verifica qualquer diferenciação injustificada. É que o trabalhador “com vínculo laboral” tem o seu contrato de trabalho reconhecido pela patronal, tendo acesso à proteção legal despendida a este tipo de contratos, enquanto o falso prestador de serviços se encontra numa posição bem mais débil, pois que se encontra como aquele sujeito à autoridade “empregadora”, necessitado dos rendimentos do seu trabalho, o que o coloca numa posição “tendencialmente paralisante” quanto ao recurso aos tribunais para defesa dos direitos devidos ao trabalhador, com medo de poder perder a sua fonte de rendimentos.
As situações não são comparáveis, e, repita-se, que o que se trata nesta ação é do reconhecimento do contrato e não da antiguidade. O facto de o contrato ter cessado não implica qualquer diferenciação, pois que estão então em causa essencialmente interesses públicos, reflexamente também o interesse do trabalhador no que respeita à sua carreira contributiva.
Não ocorre qualquer violação do direito à igualdade ou qualquer outro princípio constitucional.
***
Quanto à invocada nulidade do processo, referiu a recorrente na contestação que tendo a beneficiária da atividade regularizado a situação, reconhecendo a existência de contrato de trabalho, deveria a própria ACT ter promovido o seu arquivamento. não se mantendo o não reconhecimento da existência do contrato de trabalho, com a interposição da presente ação judicial, o MºPº está a praticar um ato que a lei não prevê e, por conseguinte, nulo. A argumentação, com outro nome, é a mesma invocada para fundamentar a impossibilidade originária da lide e a falta de interesse em agir, remetendo-se para as considerações aí expendidas.
***
- Relativamente à matéria de facto.
(…)
*
Quanto ao direito:

Importa saber se a relação contratual mantida entre a ré e a trabalhadora configura uma prestação de serviços como pretende a ré, ou ao invés um contrato de trabalho.
O ónus da prova da existência de um contrato de trabalho compete ao autor – artigo 342º do CC. Contudo no CT tal ónus encontra-se facilitado, digamos, “pela sua redução à prova dos factos índices “previsto no artigo 12º do CT, o qual estabelece uma presunção de laboralidade.
Demonstrados estes índices pelo autor, ocorre então uma inversão do ónus nos termos do artigo 350º do CC, passando a competir à ré demonstrar que apesar desses factos o contrato é outro, no caso uma prestação de serviços.
- O contrato de trabalho laboral:
Este contrato encontrava-se definido no art. 1º do Dec. Lei nº 49.408 de 24/11/1969 (LCT), depois no artigo 10º do CT de 2003 e atualmente no artigo 11º, e ainda no 1152º do CC. As características principais deste contrato são:
- A prestação por parte de um dos contraentes (o trabalhador) de uma atividade manual ou intelectual ao outro contraente (o empregador), não envolvendo qualquer obrigação de resultado, bastando para cumprimento da obrigação assumida a colocação á disposição do empregador da sua força de trabalho;
- A onerosidade (o contrato de trabalho é sempre oneroso);
- A subordinação jurídica, traduzida no facto de a prestação do trabalho ocorrer sempre sob as ordens, direção e fiscalização do empregador, sendo este que (dentro dos parâmetros legais), define o modo, o como, o quando e onde a prestação deve ocorrer. No Atual CT refere-se “no âmbito de uma organização e sob a autoridade destas”, em substituição da expressão “sob a autoridade e direção destas”.
Esta alteração vem salientar aquilo que era já entendido, no sentido de que no CT, o trabalhador se integra na organização da entidade patronal, passando a constituir um elemento desta e ao serviço dos seus fins, funcionando nesta como parte de um todo, de um corpo, com uma cabeça e órgãos executores, seja, com um comando e uma estrutura hierárquica; agindo/reagindo no âmbito da mesma, com interação a montante e a jusante. Esta característica decorre da natureza intuito personae do contrato de trabalho, onde assume particular relevo a confiança reciproca.
-O contrato de prestação de serviços:

O contrato de prestação de serviços vem previsto no artigo 1.154º do Código Civil. Os elementos caracterizadores deste contrato são:
- A obrigação por parte de um dos contraentes (o prestador), de proporcionar à outra parte um determinado resultado da sua atividade manual ou intelectual. Tal contrato envolve, pois, uma obrigação de resultado. Contudo, nos casos limites o critério mostra-se pouco útil, como adiante veremos.
- O caráter facultativo da retribuição (o contrato pode ser oneroso ou gratuito);
- A independência e autonomia do prestado no que respeita ao modo, à forma e momento da realização do trabalho. Estes dependem da vontade e saber do prestador. Não que não possam haver aqui ordens por parte do credor, apenas se quer dizer que tais ordens não podem referir-se ao modo e forma de alcançar o resultado, podendo, no entanto, haver ordens no que se refere ao objetivo do resultado.
*
- As dificuldades de delimitação decorrem do facto de quer um quer outro, na realidade não se aterem a estas definições tão claras, apresentando zonas cinzentas que se tocam e sobrepõem. Quer dizer, a vida não se atém estritamente a “conceitos tipo” tal como a lei os configura, criando zonas cinzentas.
O modelo clássico de contrato de trabalho sofreu alterações com o decurso do tempo, adaptando-se às novas realidades e necessidades dos empregadores, flexibilizando-se; e por outro existem áreas de atividade em que os seus profissionais pela natureza das coisas (tecnicidade da área/saber), e nalguns casos até por força da lei (códigos deontológicos), gozam de uma certa autonomia no seu exercício – (autonomia técnica e/ou deontológica).
Muitas atividades podem ser prestadas por qualquer daqueles modelos contratuais, e são-no na realidade, coexistindo as duas formas de prestação, como acontece com a docência.
*
- Quanto ao objeto contratual (atividade versus resultado), a característica, nos casos de fronteira, tem um relevo diminuto. No contrato de trabalho o prestador disponibiliza a “atividade”, como instrumento para a prossecução do processo produtivo da estrutura empresarial, como instrumento dos fins desta, sendo o prestador alheio ao resultado, cujo risco corre pelo credor da prestação. Contudo em certos casos de fronteira é difícil distinguir o que se promete, se a atividade se o resultado.
Não só no contrato de trabalho o resultado não é de todo indiferente ao credor, (veja-se que a remuneração pode em parte ser fixada pela produtividade, e outros mecanismos que as empresas vão introduzindo no sentido de aumentar a produtividade), como na prestação de serviços pode não ser indiferente a atividade, os meios utilizados para alcançar o resultado.
A acrescer a essa dificuldade, atividades há a que normalmente o contrato de prestação de serviços se adequa perfeitamente, em que nem se pode prometer o resultado (advocacia – artigo 101º, nº 1; 68º, 2, 3; 76º, 3 e 4 do EOA), e casos em que pode dizer-se que a disponibilidade do trabalho constitui o próprio resultado. Por exemplo imagine-se a obrigação (legal ou contratual) de manter aberto um determinado serviço, independentemente da solicitação por parte do público a que se destina em determinado momento.
-Mas as maiores dificuldades encontram-se no que tange à subordinação/autoridade, que é aliás o elemento essencial de distinção, até porque por regra, os casos em que se colocam dúvidas são aqueles em que a prestação, não implicando um resultado (entendido em termos restritos), pode ser efetuada nos moldes de um contrato de prestação de serviços.
Este elemento põe em evidência a desigualdade caraterística do vínculo laboral, onde para uma das partes, mais que colocar à disposição da outra a disponibilidade da sua força de trabalho, coloca a sua própria pessoa, uma disponibilidade pessoal (evidente na necessidade de cumprir horários, de comparecer no local de trabalho indicado etc.).
A subordinação não é económica (que pode ocorrer em ambas as formas contratuais, nem técnica, onde pode ocorrer autonomia em qualquer das formas), mas jurídica. Comporta vários graus, não sendo necessário uma manifestação concreta, mas apenas a sua possibilidade, o que se costuma referir-se como “potencial”, situação comum nos casos de atividades de elevado grau de tecnicidade e/ou conhecimento; e é sempre funcionalmente limitada. Implica designadamente a imposição ao trabalhador dos termos em que a prestação irá ocorrer, a conformação da prestação contratada.
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- Em face destas dificuldades, tem-se recorrido a indícios dos quais possa concluir-se pela existência de um contrato de trabalho. Os índices devem ser apreciados no seu todo, -Vd. STJ de 9/12/2000, processo nº 1155/07.9TTBRG.P1.S1, www.dgsi.pt, sopesando o peso relativo de cada um e o seu número, o modo como se articulam em concreto, surpreendendo o que é marcante na relação, independentemente de uma aparência artificialmente criada.
É que a utilização de falsos contratos de prestação de serviços tem em vista fugir à aplicação de determinadas leis laborais, de determinadas garantias e direitos dos trabalhadores. Os factos índices não devem ser apreciados apenas na sua aparência, devendo ponderar-se o tónus geral de forma a surpreender a realidade.
Os agentes determinam a sua conduta de forma a que a mesma venha a ter sucesso. Quem foge a uma norma fá-lo-á de modo a que tal se não perceba. O normal será criar a aparência de que as coisas são de determinado modo, embora a realidade seja outra. Há que ver além desta aparência.
A apreciação global dos vários factos/índices permitirá surpreender esta ilusão, designadamente se estiverem presentes muitos índices, que embora compagináveis individualmente com o contrato de prestação de serviços, dada a sua particular configuração, se torne estranho encontram-se todas na fronteira com o contrato de trabalho, e em tão grande número.
Por exemplo, o contrato não tem em vista um resultado, os instrumentos são do empregador, o trabalhador pratica um horário diário (aparentemente autónomo), a remuneração com pequenas oscilações e sensivelmente a mesmo mês a após mês, o local de trabalho pertence ao credor e é por este indicado, o trabalhador não corre risco pela não produção do resultado, etc… todos estes critérios podem estar presentes no contrato de prestação de serviços, dependendo da concreta configuração, existindo exemplos vários na jurisprudência. Será estranho encontra-los num mesmo contrato, o que deve levar a ter especiais cuidados.
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- Índices.
Têm sido apontados vários índices, tais como a titularidade dos instrumentos de trabalho, o horário, o modo de cálculo da remuneração, o local de prestação da atividade, A inserção numa organização criada pelo credor, a assunção do risco da não produção do resultado, a exclusividade da prestação ao credor, o controlo direto da prestação pelo credor e existência de ordens/instruções diretas, a dependência económica, o poder disciplinar, o não recebimento de subsídios, o regime fiscal e de segurança social, o objeto contratual, a possibilidade de o trabalhador poder fazer-se substituir, etc…
- A titularidade dos instrumentos de trabalho por parte do credor da prestação, podendo estar presente no contrato de PS, será mais normal no CT, sendo indício de um CT, se abarca todo o tipo de instrumentos e acessórios e não apenas aqueles de difícil aquisição no contexto individual. “Há que relacionar a natureza do bem com a natureza da atividade, e ponderar o seu custo, a sua mobilidade, o seu peso específico no conjunto dos fatores de produção, entre outras circunstâncias “ Cristina silva, Trabalho subordinado vs Trabalho Independente, http://repositorio.ucp.pt/bitstream/10400.14/9583/1/Disserta%C3%A7%C3%A3o%20de%20Mestrado_Direito%20Privado_Trabalho%20Subordinado%20vs%20Trabalho%20Independente_Cristina%20Silva_n.%C2%BA%2034010.pdf.
- A possibilidade de o prestador se fazer substituir por outrem no desempenho da função e a possibilidade de ter outrem ao seu serviço apontam no sentido de um contrato de PS. Refere Pedro R. Martinez, Direito do Trabalho, 2002, pág. 285, que “ ainda que a massificação tenha quebrado o laço fiduciário… não é aceitável que um trabalhador, se faça substituir por outrem; se a relação não se baseasse na fidúcia, a substituição seria admissível, pois que a atividade a desenvolver pelo trabalhador seria fungível, e para o credor (empregador) seria irrelevante a identidade daquele que efetuasse a prestação”.
Poder-se fazer substituir por pessoa da sua escolha, sem interferência do credor – não como no caso em que a substituição se opere no quadro nos trabalhadores contratados por PS e só. É que a substituição no quadro dos “prestadores”, apresenta flagrante semelhança com a substituição a que se procede no âmbito do CT em caso de falta de um trabalhador. Tal tipo de substituição por si não afasta o caráter fiduciário da relação;
Deve verificar-se se em concreto a possibilidade de se fazer substituir é real ou aparente.
A possibilidade de se fazer substituir por pessoa da sua escolha, sem interferência do credor, aponta no sentido do contrato de PS. Se a substituição apenas pode ocorrer no quadro dos “prestadores” contratados pelo credor, podemos estar face a uma aparência de autonomia. É que em caso de falta do “trabalhador “ele teria normalmente que ser substituído por um colega, como já referimos. É o que vemos ocorrer no caso presente.
- Quanto ao modo cálculo da retribuição, importa ter uma visão global, vendo o resultado mensal, anual etc… de forma a surpreender mecanismos fraudulentos destinados a criar aparência de que o cálculo é estranho á disponibilização da força de trabalho. Uma retribuição à hora, no desempenho de atividades em que essencialmente ocorre a disponibilidade e por período razoavelmente regular ao longo do tempo, (podendo não haver funções a desempenhar, decorrência das contingências do mercado e da vida) pode ser indício de uma aparência.
- Quanto ao local de prestação, como vem sendo referido, deve ser entendido em termos hábeis. O Conceito padece de uma certa relatividade, “podendo abranger um edifício, uma rua, uma freguesia, um distrito, uma região ou mesmo um país “, vd. Código do Trabalho anot. e Com, Paulo Quintas e Hélder Quintas, pág. 95 em nota ao artº 12º. Prende-se com circunstâncias específicas da execução do contrato variáveis de acordo com a natureza da prestação e a sua articulação na organização da empresa – M. Fernandes citado na obra referida. Será relevante saber por exemplo se o prestador pode escolher o local da prestação. Contudo este facto não é também em si determinante.
- A assunção ou não do risco de não produção de resultados é um índice de pouca utilidade nos casos em que a PS não implica um resultado (entendido em termos relativos).
- Assume particular relevo a “inserção na organização criada pelo credor com sujeição às regras dessa organização” por lhe estar associada a subordinação jurídica. Esta, tem a sua razão de ser e o seu fundamento na necessidade que existe em qualquer processo produtivo coletivo, de uma linha de orientação de uma unidade de comando. Todo o processo coletivo de produção exige organização, coordenação e comando. Assim e por exemplo, os trabalhadores não podem trabalhar todos ao mesmo tempo – há que distribuir horários, respeitar cadências de fases no trabalho, de acordo com o que cada um executa, etc…
O trabalho prestado autonomamente não se enquadra em qualquer processo de produção coletiva, embora possa ser prestado para uma empresa com a sua própria estrutura produtiva, mas escapa, pelas suas características, à necessidade de se inserir na estrutura de comando do processo produtivo da empresa, ou porque não é inerente aquele, ou porque sem prejuízo daquele processo produtivo, pode ser executado fora da estrutura de comando da empresa (por exemplo serviço que na sua prestação não está dependente do trabalho de outros trabalhadores…).
- A emissão de ordens diretas/controlo direto da prestação, apontam no sentido no contrato de trabalho. Basta a sua possibilidade. O índice não é de fácil aplicação aos casos em que normalmente as dúvidas se levantam, por corresponderem a atividade mais técnicas ou científicas, gozando o prestador de autonomia técnica no desempenho da atividade, sendo difícil surpreender ordens diretas, aparentando todas ter uma natureza genérica, de supervisão, também presente na PS.
- O desempenho da atividade de forma exclusiva ou quase exclusiva para uma entidade pode apontar no sentido da existência de um contrato de trabalho, contudo podem ocorrer prestações de serviço em exclusivo.
- Quanto à dependência económica, mostra-se pouco útil, dado que em inúmeras atividades (advocacia, arquitetura, medicina, enfermagem etc…), ainda que prestadas mediante contratos de prestação de serviços, ocorrerá muitas vezes uma dependência económica do prestador, porquanto é do exercício da sua profissão que retira os proventos para o seu dia a dia e da sua família.
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Importa atentar em que alguns dos índices que têm sido invocados, devem ser considerados de forma limitada, apontando apenas no sentido da existência de CT, mas não podendo ser valorados no sentido inverso:

- Falamos designadamente da verificação ou não do pagamento de subsídios, do regime fiscal e de segurança social.
É que a utilização de falsos contratos de prestação de serviços tem em vista fugir à aplicação de determinadas leis laborais, de determinadas garantias e direitos dos trabalhadores – como o pagamento de subsídios, seguros de acidentes, segurança social… entre outros. Referir estes (a sua inexistência) como critérios para se afastar a qualificação do contrato como de trabalho, é em nosso entender errado, pois que se foi isso que se quis evitar ao simular, considerando tais elementos favorece-se o infrator. Por outro é um paradoxo, é o mesmo que dizer que o empregador não tem que pagar subsídios, porque não os paga. Tais índices apenas relevam pela positiva, se estiverem presentes apontam no sentido da existência de um contrato (não podia ser de outro modo, porque são direitos associados a este), o contrário é que não. Na sua ausência nada significam, pois que a fuga ao cumprimento das normas que os preveem é exatamente o objetivo da “dissimulação”.
- O mesmo pode dizer-se do poder disciplinar. A sua ausência não deve ser valorada em sentido contrário à existência de um CT. É que em boa verdade a situação favorece o “empregador”, pois que sem ter os custos inerentes ao procedimento disciplinar pode desvincular-se do prestador, sem mais, e fazer sobre ele, as pressões que entenda. Não cumprindo o prestador, (sobretudo se existir dependência económica), sujeita-se a não ser mais solicitado pelo credor, a ser dispensado, a perder o seu ganha pão, ou, forçando o verbo, a ser despedido (prescindido).
- Também o “objeto contratual”, como já vimos, tem relevo diminuto nos casos de fronteira. Contudo, se estivermos em face de uma pura prestação de resultado, o critério já assumirá relevo para afastar a natureza laboral.
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Tudo o referido está condicionado pela livre vontade das partes. Tratando-se de negócios da natureza consensual, não pode deixar de se atender e relevar a vontade real das partes, traduzida não apenas na qualificação que lhe deram, mas sobretudo nos termos em que definiram as condições do exercício da atividade, nos termos acordados.
Isto, desde que se possa concluir com razoável segurança que a vontade do prestador, parte mais fraca da relação, se determinou de forma livre, e a configuração e desenvolvimento da relação não for de todo espúria ao contrato celebrado.
Sobre o relevo da vontade – STJ de 4/11/2009, processo nº 322/06.7TTGDM.S1; de 4/5/2011, processo nº 3304/06.5TTLSB.S1 8/10/2014, processo nº 168/10.8TTVNG.P3.S1, em www.dgsi.pt.
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O caso presente situa-se naquela zona cinzenta de que falamos. Temos vários indícios que apontam num e noutro sentido. Contudo uma visão geral aponta no sentido do contrato de trabalho.
Estamos face a uma atividade que podendo ser prestada sob qualquer das formas contratuais.
No caso presente apontam com clareza no sentido do CT as obrigações consagradas na cláusula primeira dos contratos celebrados bem como todas as obrigações constantes do regulamento interno que como vimos acima apontam e referem em vários dos seus normativos os trabalhadores contratados como prestadores de serviços, consagrando esta forma como a eleita para a consagração de formadores, dando-lhes inclusive uma preferência na contratação nos anos seguintes, no artigo 135º. As obrigações elencadas na clausula 1º dos contratos e as que resultam do regulamento, designadamente no que respeita ao cumprimento de um horário, que podendo embora ser ajustado de acordo com disponibilidades era em última instância da responsabilidade da ré, sendo os formadores obrigados a cumpri-lo por força do estipulado nos contratos; no que respeita à justificação de faltas e substituições, que se faziam de acordo com o estipulado pela ré, dentro do corpo de prestadores da ré – veja-se o teor da cláusula 1ª e o regulamento.
E se o local de prestação pode não assumir grande relevo, por força de obrigações legais, já a utilização de instrumentos da ré aponta no mesmo sentido. Aliás o regulamento refere essa disponibilidade, no que aqui importa, a todos os formadores, sem referência ao tipo de vinculo formal.
Não está no caso presente em causa um resultado, mas sim a disponibilização de uma atividade, enquanto instrumento para a prossecução do objeto da ré, dos fins desta. O exercício da atividade no caso presente insere-se no processo produtivo da ré. A remuneração é relativamente estável mês a mês, em função da carga horária, calculada embora à hora, podendo ocorrer variações em função das horas prestadas.
A empregadora detém poder sancionatório nos termos regulados no regulamento interno, onde se prevê quer a rescisão do contrato de prestação de serviços, quer a impossibilidade de celebração de novo contrato de prestação de serviços, quer a aplicação de uma pena pecuniária – artigo 209º do RI. Nenhum facto aponta no sentido de que o trabalhador tenha pretendido e lhe interessasse efetivamente um contrato de prestação de serviços.
Quanto à pretensão no sentido de que se estaria então em face de vários contratos de trabalho a termo, já que os contratos de prestação de serviços celebrados terminavam a cada ano, a pretensão carece de sentido. Os contratos terminavam – tinham um interregno – apenas no mês de agosto, mês destinado a férias, sendo precisamente um dos direitos laborais preteridos pela “fuga ao direito laboral “perpetrada com a celebração de contratos de prestação de serviço. Considerando o tempo escolar efetivo, o trabalhador labora em continuo para a ré, durante todo o período abrangido desde o inicio da primeira relação até ao termo desta. Por outro, nunca poderia considerar-se a existência de um contrato de trabalho a Termo, dadas as exigências formais desta, que não foram cumpridas – artigos (141º, 147ª CT)
Assim considera-se que a relação existente configura um contrato de trabalho, improcedendo o recurso.
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DECISÃO:

Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente a apelação confirmando a decisão.
Custas pela recorrente.
7/10/21

Antero Veiga
Alda Martins
Vera Sottomayor