REVISÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA
ESCRITURA PÚBLICA
UNIÃO ESTÁVEL
ORDEM JURÍDICA PORTUGUESA
Sumário

- Uma escritura pública de declaração de união estável outorgada no Brasil pode ser objecto de um processo de revisão e confirmação de sentença estrangeira, nos termos regulados pelo artigo 978º e seguintes do Código de Processo Civil, sem que na aferição da verificação dos pressupostos da sua confirmação deva ser atendida a probabilidade de a finalidade última dos requerentes ser a aquisição da nacionalidade portuguesa por um deles, posto que venha apenas pedida a revisão e confirmação da escritura (não cabendo nesta sede aferir da validade de tal hipotética pretensão).

Texto Integral

Acordam as Juízas na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I – RELATÓRIO
A, português, portador do cartão de cidadão n.º 12284943 4ZY4 e B, brasileira, portadora do passaporte n.º FY495322, válido até 18-03-2029, ambos residentes à Rua Dr. José Thomas n.º .... Rio de Janeiro, Brasil vêm requerer a confirmação da escritura pública de união estável, outorgada em 18 de Dezembro de 2018, no Registo Civil de Pessoas naturais, Tabelionato da Comarca da Capital do Rio de Janeiro, a qual formalizou a união estável entre os requerentes, formulando a seguinte pretensão:
“[…] deve a presente ação ser julgada procedente, por provada, e ser afinal confirmada a escritura da união estável, in casu, para todos os devidos e legais efeitos, designadamente, para efeitos de aquisição da nacionalidade portuguesa da Requerente estrangeira, nos termos da Lei n.º 37/81 de 03-10.”
Alegam para tanto o seguinte:
Ø Por escritura pública declaratória, firmada no cartório notarial (Registro Civil de Pessoas naturais, Tabelionato da Comarca da Capital do Rio de Janeiro), em 18-12-2018, os requerentes declararam que “vivem maritalmente, como se casados fossem, em união estável, desde 28.10.2011, de forma duradoura, pública e contínua”;
- Dessa união estável resultou o nascimento de três filhos;
- Os requerentes vivem em união estável aproximadamente há 10 (dez) anos, partilham a mesma casa, relacionando-se afectiva e sexualmente, tomam as refeições em conjunto e contribuem ambos paras as despesas da casa;
- Na ordem jurídica brasileira, a união estável é reconhecida como entidade familiar, podendo ser constituída por escritura pública perante o chamado tabelião de notas, constituindo essa escritura, um verdadeiro contrato, designadamente, com disposições sobre as relações patrimoniais entre os companheiros (unidos de facto), que pode ser objecto de registo, criando então efeitos perante terceiros;
- A formalização da união estável no Brasil, através de uma escritura pública perante um tabelião, consubstancia a intervenção de uma entidade administrativa que cauciona o acto, ao qual são atribuídos efeitos pela ordem jurídica brasileira, tal como se tivesse sido objecto de sentença judicial;
- O procedimento para se concretizar uma escritura de união estável, no Brasil, reúne uma série de condições legais, da mesma forma que, uma acção de reconhecimento da união de facto em Portugal;
- Os documentos são autênticos e não há dúvidas sobre o conteúdo da escritura de união estável;
- Os requerentes pretendem o reconhecimento da escritura da união estável, equiparando-a, a uma sentença judicial de reconhecimento da união de facto;
- Torna-se necessária a revisão e confirmação por este Tribunal da Relação, de tal escritura, a fim de esta ter eficácia na ordem jurídica portuguesa, nomeadamente, para efeitos de aquisição de nacionalidade portuguesa, nos termos do art.º 3 da Lei da Nacionalidade (Lei n.º 37/81 de 03/10);
- A escritura declaratória da união estável outorgada pelos dois requerentes reúne as condições necessárias para ser revista e confirmada pelo Tribunal da Relação, pois é um documento autêntico, lavrado perante uma entidade administrativa pública (tabelião/notário), entidade que verifica se existe algum impedimento matrimonial (impedimento legal ao casamento), como condição para outorga daquela escritura e que atesta a vontade das partes e a sua intenção de viver em condições análogas às dos cônjuges;
Ø Não há incompatibilidade entre a união estável e os princípios da ordem pública portuguesa.
Cumprido o disposto no 982º, n.º 1 do Código de Processo Civil, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedida a revisão e confirmação da decisão estrangeira, considerando estarem reunidos os requisitos legais para o efeito, nada obstando a que se atenda à pretensão dos requerentes (cf. Ref. Elect. 530497).
Em face da pretensão deduzida pelos requerentes e da finalidade por eles apontada, como sendo a de obtenção do reconhecimento da escritura de declaração de união estável para efeitos de aquisição de nacionalidade, foi proferido despacho, em 7 de Julho de 2021, que os convidou, e, bem assim, ao Ministério Público, a se pronunciarem sobre a possibilidade de se vir a concluir pela verificação de excepção dilatória de falta de interesse em agir ou pela inadequação do meio processual utilizado (cf. Ref. Elect. 17121326).
Por requerimento de 13 de Julho de 2021, os requerentes pugnaram pelo acolhimento do pedido de revisão e confirmação da escritura pública em referência afirmando que o reconhecimento da escritura de união estável não é um simples meio de prova para se obter a nacionalidade, mas para se obterem os efeitos jurídicos dessa união como uma situação análoga à dos cônjuges, tais como a protecção da casa de morada de família e protecção social na eventualidade de morte, para o que se louvaram em jurisprudência portuguesa que citaram (cf. Ref. Elect. 534234).
O Ministério Público nada acrescentou em relação ao seu parecer.
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O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
Não existem vícios que anulem todo o processo.
As partes, dotadas de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade.
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QUESTÃO A DECIDIR
A única questão a decidir consiste em verificar se estão demonstrados os requisitos legais de que depende a revisão e confirmação da sentença estrangeira apresentada.
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II - FACTUALIDADE PROVADA
Encontra-se documentalmente provado nos autos que:
1. B nasceu a 14 de Dezembro de 1991, em Conceição do Castelo, Estado do Espírito Santo, República Federativa do Brasil, e é filha de José .....e de Theresa .............
2. No dia 18 de Dezembro de 2018, os requerentes A e B compareceram perante o Tabelião de Notas e Oficial de Registo do 8º Registro Civil de Pessoas Naturais e Tabelionato da Comarca da Capital, Rio de Janeiro, Brasil, onde foi lavrada Escritura Pública Declaratória de União Estável, nos termos da qual pelos requerentes, de comum acordo, foi dito: “a) - Que a fim de que se torne público, de viva voz, sem induzimento ou coação, para que se faça prova perante as Autoridades constituídas desse país, especialmente o Poder Judiciário nas Varas de Família e no Juízo Cível, Poder Executivo, Previdência Social, Instituto Nacional de Seguridade Social (I.N.S.S), Instituições Bancárias, Plano de Saúde, Companhias de Seguros; em quaisquer dos seus órgãos, departamentos, seções ou divisões, com base no que preceitua o artigo 1.723 e 1724 da Lei. 10.406/2002, declaram que vivem maritalmente, como se casados fossem, em UNIÃO ESTÁVEL desde 28/10/2011 (vinte e oito de Outubro de dois mil e onze) de forma duradoura, pública e contínua. Declaram ainda, que essa CONVIVÊNCIA, foi e será pautada no amor, compreensão, carinho, respeito, cumplicidade e assistência mútua, havendo, portanto, um grau de afinidade e companheirismo muito elevado entre os mesmos. Que haja vista o acima exposto convencionam os contratantes, que esta UNIÃO ESTÁVEL se regerá nos termos dos artigos 1.723, 1.724 e 1.725 da Lei.10.406/2002. Que, assim, rogam às autoridades constituídas onde esta for apresentada, que a faça valer em todos os seus termos, por ser esta a mais pura expressão da verdade, pelo que respondem civilmente e criminalmente pela veracidade da presente. Assim o disseram, do que dou fé, e me pediram que lhes lavrasse a presente que lhes li em voz alta, aceitam e assinam dispensando as testemunhas conforme faculta o artigo 240 do CNCGJ/RJ.”
3. A escritura referida em 2. foi lavrada pela escrevente notarial Luciana ........... e subscrita pelo tabelião substituto, Daniel ..............  .
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III - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
O sistema português de revisão de sentenças estrangeiras assenta no sistema de delibação, isto é, de revisão meramente formal, o que significa que o Tribunal, em princípio, se limita a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma, não conhecendo do fundo ou mérito da causa. Desde que o Tribunal nacional se certifique de que tem perante si uma verdadeira sentença estrangeira, deve reconhecer-lhe os efeitos típicos das decisões judiciais – cf. José Alberto dos Reis, Processos Especiais, volume II – Reimpressão, 1982, pág. 141; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-07-2011, relator Paulo Sá, processo n.º 987/10.5YRLSB.S1[1].
Trata-se de um processo especial de simples apreciação.
Nos termos do art. 980º do Código de Processo Civil[2], para que a sentença seja confirmada é necessário:
a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a sentença nem sobre a inteligência da decisão;
b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do país em que foi proferida;
c) Que provenha de tribunal estrangeiro cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais portugueses;
d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal português, excepto se foi o tribunal estrangeiro que preveniu a jurisdição;
e) Que o réu tenha sido regularmente citado para acção nos termos da lei do país do tribunal de origem e que no processo hajam sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
f) Que não contenha decisão cujo reconhecimento conduza a um resultado manifestamente incompatível com os princípios da ordem pública internacional do Estado português.
Dispõe o art. 983º, nº 1 do mesmo diploma legal que “O pedido só pode ser impugnado com fundamento na falta de qualquer dos requisitos mencionados no artigo 980º, ou por se verificar algum dos casos de revisão especificados nas alíneas a), c) e g), do artigo 696º.”
Por sua vez, o art.º 984º determina que “O tribunal verifica oficiosamente se concorrem as condições indicadas nas alíneas a) e f) do artigo 980º; e também nega oficiosamente a confirmação quando, pelo exame do processo ou por conhecimento derivado do exercício das suas funções, apure que falta algum dos requisitos exigidos nas alíneas b), c), d) e e) do mesmo preceito.”
O requerente está dispensado de fazer prova directa e positiva dos requisitos previstos nas alíneas b) a e) do art. 980º do CPC.
Se, pelo exame do processo, ou por conhecimento derivado do exercício das suas funções, o tribunal não apurar a sua falta, presume-se que existem, não podendo o tribunal negar a confirmação quando, por falta de elementos, lhe seja impossível concluir se os requisitos dessas alíneas se verificam ou não.
A prova de que não se verificam os requisitos das alíneas b) a e) do artigo 980º compete ao requerido, devendo, em caso de dúvida, considerar-se preenchidos – cf. acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 21-02-2006, relator Oliveira Barros, processo n.º 05B4168 e do Tribunal da Relação de Coimbra de 30-11-2010, relator Manuel Capelo, processo n.º 50/10.9YRCBR – “[…] como decorre da 2ª parte do art. 1101º, era sobre o requerido que recaía o ónus da prova da não verificação dos requisitos da confirmação estabelecidos nas alíneas b) a e) do art. 1096º, que a lei presume que existem, sendo ao requerido que incumbia provar a inexistência de trânsito em julgado segundo a lei do país em que a sentença revidenda foi proferida - al. b), a incompetência do tribunal sentenciador, nos termos indicados na al. c), a litispendência arguida - al. d), e a inobservância do princípio do contraditório e da igualdade das partes no processo que levou à decisão em causa - al. e), tendo-se esses requisitos por verificados em caso de dúvida a esse respeito.”
No que diz respeito à legitimidade passiva no contexto deste processo especial, tem sido entendido não ser imprescindível a existência de demandados.
Conforme se refere no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 4-10-2011, relator Rijo Ferreira, processo n.º 529/11.5YRLSB-1:
“Sendo uma sentença um acto pelo qual se definem direitos, a atribuição de eficácia a uma sentença estrangeira coloca aquele a quem ela atribui direitos numa posição de, no território nacional, a fazer impor a quem aquela sentença constitui na obrigação de reconhecer aqueles direitos. Daí que o pedido de revisão dessa sentença deva ser formulado no confronto com quem possa ser directamente atingido pelo deferimento de tal pedido (daí que o pedido deva ser formulado contra quem se pretenda fazer valer a acção – e não necessariamente o vencido na mesma – no tribunal da área da sua residência para a ela ser chamado por meio de citação).
Mas nem sempre a atribuição de eficácia à sentença estrangeira visa a possibilidade de a fazer impor a outrem; de a fazer valer contra outrem. Com efeito, situações há em que com atribuição de eficácia à sentença estrangeira apenas se pretende tornar efectivas no território nacional as situações definidas na sentença estrangeira em favor do próprio peticionante, sem que haja qualquer confronto com terceiro.
Ora nesses casos a acção de revisão não se estabelece numa relação processual antagónica, em termos de autor/réu, requerente/requerido, mas numa simples demanda ao Estado de atribuição de eficácia à sentença estrangeira; ao reconhecimento da situação por ela definida. Pelo que a mesma não terá qualquer sujeito a ocupar o lado passivo da relação processual (abstraindo aqui do papel do MP enquanto defensor da legalidade e dos princípios de ordem pública).
O caso paradigmático dessa situação é o pedido de revisão de sentença estrangeira de divórcio formulado por ambos os ex-cônjuges.”
Relativamente ao requisito da alínea f) - ordem pública internacional do Estado Português -, os princípios da ordem pública internacional do Estado Português são princípios enformadores e orientadores, fundantes da própria ordem jurídica portuguesa, que de tão decisivos que são, jamais podem ceder. Por outro lado, tem-se em vista o resultado concreto da decisão, ou seja, o dispositivo da sentença e não os seus fundamentos – cf. neste sentido, Ferrer Correia, Lições de Direito Internacional Privado, I, Almedina, 2000, pág. 483 apud acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26-05-2015, relator Gabriel Catarino, processo n.º 657/13.2YRLSB.S1 – “[…] não é, portanto, a decisão propriamente que conta, mas o resultado a que conduziria o seu reconhecimento. A decisão pode apoiar-se numa norma que considerada em abstracto, se diria contrária à ordem pública internacional do Estado português, mas cuja aplicação concreta o não seja. Ao invés, pode a lei em que se apoiou a decisão não ofender, considerada abstractamente, a ordem pública, mas a sua aplicação concreta assentar em motivos inaceitáveis.”
A ordem pública internacional do Estado Português não se confunde com a sua ordem pública interna: enquanto esta se reporta ao conjunto de normas imperativas do nosso sistema jurídico, constituindo um limite à autonomia privada e à liberdade contratual, a ordem pública internacional restringe-se aos valores essenciais do Estado português. Só quando os nossos interesses superiores são postos em causa pelo reconhecimento duma sentença estrangeira, considerando o seu resultado, é que não é possível tolerar a declaração do direito efectuada por um sistema jurídico estrangeiro. De modo que só quando o resultado dessa sentença choque flagrantemente os interesses de primeira linha protegidos pelo nosso sistema jurídico é que não se deverá reconhecer a sentença estrangeira – cf. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 18-11-2008, relatora Sílvia Pires, processo 03/08 em www.colectaneadejurisprudencia.com; acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 21-02-2006, relator Oliveira Barros, acima referido; de 26-06-2009, relator Paulo Sá e de 23-10-2014, processo n.º 1036/124YRLSB.S1, relator Granja da Fonseca.
Em reforço do assim explanado adita-se a seguinte passagem esclarecedora do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26-09-2017, relator Alexandre Reis, processo n.º 1008/14.4YRLSB.L1.S1:
A ordem pública internacional de qualquer Estado inclui: (i) os princípios fundamentais, relativos à justiça ou moral, que o Estado deseja proteger mesmo quando ele não está directamente em causa (ii) regras concebidas para servir os interesses políticos, sociais ou económicos essenciais do Estado, sendo estas conhecidas como “lois de police” ou “regras de ordem pública” […]
Em termos muito genéricos, o conceito da ordem pública internacional caracteriza-se pela sua […] imprecisão, pelo cariz nacional das suas exigências […] pela excepcionalidade […] pela flutuação e pela actualidade […] e pela relatividade – intervém em função das circunstâncias do caso concreto e, particularmente, da intensidade dos laços entre a relação jurídica em causa e o Estado português.
[…] é latamente consensual a ideia de que o conteúdo dessa cláusula é enformado pelos princípios estruturantes da ordem jurídica, como são, desde logo, os que pela sua relevância, integrem a constituição em sentido material, pois são as normas e princípios constitucionais, sobretudo, os que tutelam direitos fundamentais, que não só informam mas também conformam a ordem pública internacional: a Constituição reflecte os valores mais importantes que conformam o plano estrutural ou a ordem jurídica fundamental de uma comunidade nacional, pelo que é nas normas de hierarquia constitucional que repousa a ordem pública internacional do Estado […]
O mesmo sucede, entre nós, com os princípios fundamentais de Direito da União Europeia. E são, ainda, referenciados como integrando a ordem pública internacional de cada Estado, princípios fundamentais como os da boa-fé, dos bons costumes, da proibição do abuso de direito, da proporcionalidade, da proibição de medidas discriminatórias ou espoliadoras, da proibição de indemnizações punitivas em matéria cível e os princípios e regras basilares do direito da concorrência, tanto de fonte comunitária quanto de fonte nacional.”
No que respeita ao requisito da alínea a) do art. 980º do CPC, o Tribunal português tem de adquirir, documentalmente, a certeza do acto jurídico vertido na decisão revidenda, mesmo que não plasmada em sentença na acepção pátria do conceito, devendo aceitar a prova documental estrangeira que suporte aquela decisão, ainda que formalmente não seja um decalque daquilo que na lei interna nacional preenche o conceito de sentença – cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29-03-2011, relator Fonseca Ramos, processo n.º 214/09.8YRERVR.S1.
Uma das questões que se têm colocado em situações como a dos autos em que os requerentes pretendem o reconhecimento da situação de união de facto, tal como foi publicitada pelo notário, no Brasil, para que produza efeitos em Portugal, é a de saber se tal decisão está sujeita ou não ao processo especial de revisão e confirmação de sentença estrangeira previsto nos art.ºs 978º e seguintes do CPC, ou seja, se se estará apenas mediante um simples meio de prova, sujeito à apreciação de quem haja de julgar a causa e de decidir sobre os direitos atribuídos ou reconhecidos em Portugal, que não perante um documento que contenha uma qualquer decisão ou declaração da entidade administrativa que lavrou a escritura e que atesta os factos ali descritos.
Com efeito, no sentido de que tal escritura pública não reuniria os requisitos necessários para ser objecto do processo especial de revisão de sentença estrangeira, a jurisprudência, designadamente do Supremo Tribunal de Justiça, já se pronunciou argumentando que o teor do art. 978.º, n.º 2 do CPC deixa claro que a confirmação/revisão da escritura declaratória de união estável não é necessária para que tenha eficácia em Portugal, mas será um simples meio de prova, sujeito à apreciação de quem haja de decidir sobre o reconhecimento de direitos constituídos pela união de facto e que o alcance do termo decisão relevante para efeitos do art. 978.º abrange casos de “emissão formal da vontade da entidade administrativa responsável pelo acto, ainda que de carácter meramente homologatório”, sendo que no caso de escritura declaratória de união estável prevista pela lei brasileira, o acto composto pelas declarações dos requerentes não é “caucionado administrativamente pela ordem jurídica em que foi produzido” – cf. acórdãos de 28-02-2019, relator Pinto de Oliveira, processo n.º 106/18.0YRCBR.S1; de 9-05-2019, relator Pinto de Oliveira, processo n.º 828/18.5YRLSB.S1; de 21-03-2019, relator Ilídio Sacarrão Martins, processo n.º 559/18.6YRLSB.S1; em sentido idêntico ao dos acórdãos supra mencionados, pronunciaram-se ainda os acórdãos deste Tribunal da Relação de Lisboa de 17-10-2019, relatora Teresa Prazeres Pais, processo n.º 1268/19.4YRLSB-8; de 26-09-2019, relator Sousa Pinto, processo n.º 1777/19.5YRLSB-2; e de 24-10-2019, relator António Moreira, processo n.º 1531/19.4YRLSB-2.
Não obstante, o Supremo Tribunal de Justiça já apreciou esta mesma questão com decisão diametralmente oposta.
Assim, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29-01-2019, relator Alexandre Reis, processo n.º 896/18.0YRLSB.S1, foi afirmado o seguinte:
“O Código Civil do Brasil de 2002 legitimou «como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família» (art. 1723º).
Entretanto, em Maio de 2011, o Supremo Tribunal Federal reconheceu, por unanimidade, a união estável entre casais do mesmo sexo como entidade familiar, equiparando as chamadas «relações homoafetivas» às uniões estáveis entre homens e mulheres. E em 2013, na sequência dessa decisão, o Conselho Nacional de Justiça resolveu obrigar os cartórios de todo o país a celebrar o casamento civil e converter a «união estável homoafetiva» em casamento em função de divergências de interpretação sobre o tema.
Ademais, uma relação de convivência entre duas pessoas (de sexos diferentes ou do mesmo sexo), configurada na convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objectivo de constituir família, pode ser formalizada através da escritura pública declaratória de união estável e esta pode ser posteriormente convertida em casamento.
Uma vez emitida pela autoridade administrativa legalmente competente para o efeito, uma tal escritura pública tem, no ordenamento jurídico daquele país, força igual à de uma sentença que reconheça uma «união estável homoafetiva» e, assim, deve ser considerada como uma decisão sobre direitos privados abrangida pela previsão do art. 978º, nº 1, do CPC, carecendo de revisão para produzir efeitos em Portugal.
Na verdade, «[o] critério a ter em conta para a sujeição ao processo de revisão assenta na natureza da decisão – importando avaliar se a “decisão” estrangeira produz efeitos idênticos ou equivalentes a uma decisão judicial propriamente dita –, mostrando-se não relevante o órgão de que emana, dado que cada Estado é livre em definir as matérias que cabem na competência dos tribunais, não se mostrando o respectivo critério uniforme em todos os Estados».
Como imediatamente se constata pela leitura dos respectivos requisitos enunciados no art. 980º do CPC, a revisão do conteúdo da dita “decisão” (escritura) estrangeira, com vista a operar efeitos jurisdicionais na ordem jurídica nacional, envolve, tão só, a verificação da sua regularidade formal ou extrínseca, não pressupondo, por isso, a apreciação dos fundamentos de facto e de direito da mesma.
Ora, relativamente à escritura em apreço, verifica-se que concorrem as condições indicadas sob as alíneas a) e f) do citado artigo, porque não se suscitam dúvidas sobre a autenticidade do documento onde a mesma consta nem sobre a sua inteligência e, ainda, porque o seu conteúdo (união de facto de pessoas do mesmo sexo), em si, não é incompatível com os princípios de ordem pública internacional do Estado Português. E também se não apura, através dos meios previstos no art. 984º do mesmo código, a falta de observância de qualquer um dos requisitos indicados sob as demais alíneas daquela outra norma (980º), designadamente a d).
Realmente, o obstáculo que na decisão recorrida foi oposto à pretendida confirmação não se prende com o resultado desta, em si mesmo, mas com o que, eventualmente, poderia advir da aquisição da nacionalidade portuguesa, apenas com base na falada escritura, pelo requerente cidadão …, quando, diferentemente, um outro interessado na nacionalidade portuguesa que viva em Portugal apenas pode provar a união de facto para tal efeito por decisão judicial que directamente a reconheça, tal como é previsto nos acima citados normativos.
Porém, mesmo não desconsiderando a probabilidade de «a finalidade última dos requerentes» ser a aquisição da nacionalidade portuguesa por um deles, sendo, pois, previdente o argumentado pela Relação, por ora, apenas vem pedida a revisão e confirmação da escritura e o certo é que só a apreciação dos termos em que, porventura, possa vir a ser materializada uma tal hipotética pretensão permitiria aferir se, em concreto, a mesma violaria o invocado princípio da igualdade.”
Este entendimento – também sufragado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8-09-2020, relator Jorge Dias, processo n.º 1884/19.4YRLSB.S1 -, com adução de outros argumentos, obteve reflexo nos acórdãos desta Relação de 24 de Outubro e de 21 de Novembro de 2019, relator Pedro Martins, processos n.ºs 2403/19.8YRLSB.L1-2 e 1429/19.6YRLSB-2, onde, em síntese, se considera que a expressão “decisões” usada pelo art. 978º, n.º 1 do CPC vem sendo entendida como “acto caucionado administrativamente pela ordem jurídica em que foi produzido” e tem sido com esse entendimento amplo da expressão que vêm sendo sistematicamente admitidas em Portugal as escrituras notariais de divórcio consensual, realçando, quanto a estas, que não há qualquer intervenção do notário/tabelião, para além da elaboração da escritura, e que ele nada homologa, servindo a escritura de divórcio para o registo civil do acto como se fosse uma sentença, pelo que não vale o argumento de que ali haveria uma homologação – administrativa ou judicial – e na escritura de união de facto estável ela não existiria, não existindo, assim, nenhuma diferença, na natureza do acto, entre estas duas situações que imponha uma solução diferente para a escritura de reconhecimento da união estável.
Em idêntico sentido ainda, detectam-se os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 21-11-2019, relatora Ana Azeredo Coelho, processo n.º 1899/19.2YRLSB-6; de 11-12-2019, relator Luís Filipe Sousa, processo n.º 1535/19.7YRLSB YRLSB; de 17-12-2019, relator Luís Espírito Santo, processo n.º 2032/19.6YRLSB-7; de 23-01-2020, relatora Gabriela Cunha Rodrigues, processo n.º 2718/19.5YRLSB-2; de 20-05-2020, relator José Maria Sousa Pinto, processo n.º 190/20.6YRLSB-2; e de 11-02-2021, relatora Laurinda Gemas, processo n.º 221/21.2YRLSB-2.
Constitui entendimento, crê-se, uniforme nos tribunais portugueses que uma decisão de uma entidade administrativa estrangeira, competente no país onde foi proferida a decisão a rever, ainda que não assuma a natureza de entidade jurisdicional, mesmo não sendo qualificável como “sentença”, é, apesar disso, passível de revisão e confirmação pelo Tribunal da Relação no âmbito de um processo desta natureza.
Como se sustenta no acórdão proferido no processo n.º 2032/19.6YRLSB-7 acima mencionado, a escritura é a condição necessária para a legalização da união estável face à lei brasileira aplicável, tornando-a juridicamente relevante, produtora dos seus efeitos típicos e salvaguardando-a perante terceiros a quem é dada a conhecer, pelo que não pode deixar de ser entendida como um verdadeiro acto registal que cauciona o reconhecimento de direitos privados conferidos aos conviventes, aí se referindo: “Perante a solenidade formal do acto; o cuidadoso e especificado clausulado que contém em pormenor as regras jurídicas que regulam esta nova célula familiar em múltiplos e bem concretizados aspectos; as variadas assunções de responsabilidade dos declarantes, entre si e com reflexos junto de terceiros; o manifestado propósito de usarem este instrumento como forma de fazer valer perante entidades públicas e privadas a nova figura familiar que passam a constituir; a própria presença de testemunhas durante a prática a sua realização no Cartório de Notas, tutelando a autenticidade e fidedignidade do que foi dito e assumido pelos intervenientes, é por demais evidente que esta escritura pública declaratória da união estável corresponde indiscutivelmente à prática de um acto administrativo, presidido por oficial dotado de fé pública, onde se procede efectivamente ao caucionamento do reconhecimento de direitos privados conferidos aos conviventes.”
Na verdade, se se atentar no regime jurídico brasileiro atinente à união de facto verifica-se que é atribuído à união de facto um conjunto de efeitos jurídicos que vão muito além do que decorre a nível nacional da lei da união de facto (Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio).
No Código Civil Brasileiro[3] consta sob o Título III – Da União Estável o seguinte:
Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.
§ 1º - A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521 ; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.
§ 2º - As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união estável.
Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.
Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.
Art. 1.726. A união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil.
Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato.
Nos termos do art. 215º do Código Civil Brasileiro, a escritura pública, lavrada em notas de tabelião, é documento dotado de fé pública, fazendo prova plena.
Tal significa que a escritura pública de união estável serve de prova pré-constituída da existência da união estável, uma vez que confere fé pública sobre a declaração dos companheiros no tocante à convivência pública, contínua, duradoura e com o objectivo de constituir família. Ou seja, trata-se de instrumento apto a disciplinar as relações patrimoniais entre os conviventes como refere Ronan Cardoso Naves Neto, in A União Estável nas Serventias Extrajudiciais, 2017, pp. 73-74[4]:
“[…] a escritura pública declaratória de união estável, apesar de não possuir presunção absoluta de veracidade, serve de prova pré-constituída da existência da união estável, uma vez que incide fé pública sobre a declaração dos companheiros no tocante à convivência pública, contínua, duradoura e com o objetivo de constituir família. Assim, constitui instrumento apto a disciplinar as relações patrimoniais entre os conviventes. […]
Não obstante a força probante da escritura pública declaratória de união estável, certo é que apenas o registro de tal documento no registro público é que operará efeitos em relação a terceiros e cognoscibilidade das demais pessoas acerca de tal relacionamento familiar. Repise-se que, embora destituído dos atributos dos documentos públicos, é possível que os conviventes formalizem seu relacionamento afectivo através de documento particular devidamente assinado. Todavia, imprescindível é que tais documentos tenham ingresso no registro público para que operem efeitos contra terceiros de boa-fé.”
Quanto ao registo de tal escritura pública, rege o Provimento n.º 37 do Conselho Nacional de Justiça, de 7 de Julho de 2014[5] que dispõe sobre o registo da união estável nos seguintes termos:
Art. 1º. É facultativo o registro da união estável prevista nos artigos 1.723 a 1.727 do Código Civil, mantida entre o homem e a mulher, ou entre duas pessoas do mesmo sexo.
Art. 2º. O registro da sentença declaratória de reconhecimento e dissolução, ou extinção, bem como da escritura pública de contrato e distrato envolvendo união estável, será feito no Livro "E", pelo Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais da Sede, ou, onde houver, no 1º Subdistrito da Comarca em que os companheiros têm ou tiveram seu último domicílio, devendo constar:
a) a data do registro;
b) o prenome e o sobrenome, a data de nascimento, a profissão, a indicação da numeração da Cédula de Identidade, o domicílio e residência de cada companheiro, e o CPF se houver;
c) prenomes e sobrenomes dos pais;
d) a indicação das datas e dos Ofícios de Registro Civil das Pessoas Naturais em que foram registrados os nascimentos das partes, os seus casamentos ou uniões estáveis anteriores, assim como os óbitos de seus anteriores cônjuges ou companheiros, quando houver, ou os respectivos divórcios ou separações judiciais ou extrajudiciais se foram anteriormente casados;
e) data do trânsito em julgado da sentença ou do acórdão, número do processo, Juízo e nome do Juiz que a proferiu ou do Desembargador que o relatou, quando o caso;
f) data da escritura pública, mencionando-se no último caso, o livro, a página e o Tabelionato onde foi lavrado o ato;
g) regime de bens dos companheiros, ou consignação de que não especificado na respectiva escritura pública ou sentença declaratória.
Art. 3º. Serão arquivados pelo Oficial de Registro Civil, em meio físico ou mídia digital segura, os documentos apresentados para o registro da união estável e de sua dissolução, com referência do arquivamento à margem do respectivo assento, de forma a permitir sua localização.
Art. 4º. Quando o estado civil dos companheiros não constar da escritura pública, deverão ser exigidas e arquivadas as respectivas certidões de nascimento, ou de casamento com averbação do divórcio ou da separação judicial ou extrajudicial, ou de óbito do cônjuge se o companheiro for viúvo, exceto se mantidos esses assentos no Registro Civil das Pessoas Naturais em que registrada a união estável, hipótese em que bastará sua consulta direta pelo Oficial de Registro.
Art. 5º. O registro de união estável decorrente de escritura pública de reconhecimento ou extinção produzirá efeitos patrimoniais entre os companheiros, não prejudicando terceiros que não tiverem participado da escritura pública.
Parágrafo único. O registro da sentença declaratória da união estável, ou de sua dissolução, não altera os efeitos da coisa julgada previstos no art. 472 do Código de Processo Civil.
Art. 6º. O Oficial deverá anotar o registro da união estável nos atos anteriores, com remissões recíprocas, se lançados em seu Registro Civil das Pessoas Naturais, ou comunicá-lo ao Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais em que estiverem os registros primitivos dos companheiros.
§ 1º. O Oficial averbará, no registro da união estável, o óbito, o casamento, a constituição de nova união estável e a interdição dos companheiros, que lhe serão comunicados pelo Oficial de Registro que realizar esses registros, se distinto, fazendo constar o conteúdo dessas averbações em todas as certidões que forem expedidas.
§ 2º. As comunicações previstas neste artigo poderão ser efetuadas por meio eletrônico seguro, com arquivamento do comprovante de envio, ou por outro meio previsto em norma da Corregedoria Geral da Justiça para as comunicações de atos do Registro Civil das Pessoas Naturais.
Art. 7º. Não é exigível o prévio registro da união estável para que seja registrada a sua dissolução, devendo, nessa hipótese, constar do registro somente a data da escritura pública de dissolução.
§ 1º. Se existente o prévio registro da união estável, a sua dissolução será averbada à margem daquele ato.
§ 2º. Contendo a sentença em que declarada a dissolução da união estável a menção ao período em que foi mantida, deverá ser promovido o registro da referida união estável e, na sequência, a averbação de sua dissolução.
Art. 8º. Não poderá ser promovido o registro, no Livro E, de união estável de pessoas casadas, ainda que separadas de fato, exceto se separadas judicialmente ou extrajudicialmente, ou se a declaração da união estável decorrer de sentença judicial transitada em julgado.
Art. 9º. Em todas as certidões relativas ao registro de união estável no Livro "E" constará advertência expressa de que esse registro não produz os efeitos da conversão da união estável em casamento.
Art. 10. Este Provimento não revoga as normas editadas pelas Corregedorias Gerais da Justiça, no que forem compatíveis.
Art. 11. As Corregedorias Gerais da Justiça deverão dar ciência deste Provimento aos Juízes Corregedores, ou Juízes que na forma da organização local forem competentes para a fiscalização dos serviços extrajudiciais de notas e de registro, e aos responsáveis pelas unidades do serviço extrajudicial de notas e de registro.
Art. 12. Este Provimento entrará em vigor na data de sua publicação.
Nos termos do artigo 733º do Código de Processo Civil Brasileiro de 2015[6]:
“Art. 733. O divórcio consensual, a separação consensual e a extinção consensual da união estável, não havendo nascituro ou filhos incapazes e observados os requisitos legais, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão as disposições de que trata o art. 731º.
§ 1º A escritura não depende de homologação judicial e constitui título hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras.
§ 2º O tabelião somente lavrará a escritura se os interessados estiverem assistidos por advogado ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.”
Destes normativos extrai-se que à face do ordenamento jurídico brasileiro a união estável assume a qualidade de instituição familiar, podendo ser objecto de uma acção meramente declaratória a intentar em tribunal brasileiro (artigos 19.º e 20.º do Código de Processo Civil brasileiro), como pode a situação de facto ser «formalizada», por contrato de convivência ou contrato particular de convívio conjugal, que não tem eficácia erga omnes, mas pode ser levado a registo pelos contratantes para ter publicidade perante terceiros, ou por escritura pública de união estável, dotada de eficácia perante terceiros, também susceptível de ser publicitada por via do registo.
A escritura pública, com sucede no caso presente, integra um verdadeiro contrato onde as partes lavram os preceitos reguladores da sua convivência, nele se incluindo, nomeadamente, disposições sobre as relações patrimoniais entre os companheiros. Esse contrato pode ser objecto de registo, produzindo então efeitos perante terceiros.
A lei processual equipara a extinção consensual da união estável aos casos de divórcio consensual, podendo efectuar-se todos por escritura pública, a qual não depende de homologação judicial.
Além disso, exemplo prototípico de uma decisão de uma entidade administrativa estrangeira passível de ser equiparada a sentença é o caso das escrituras públicas de divórcio consensual, admitidas à luz do ordenamento jurídico brasileiro, e que são comummente revistas e confirmadas em Portugal, sem suscitar qualquer objecção, e em que não existe igualmente uma verdadeira e própria decisão (jurisdicional ou administrativa) decretando os efeitos de dissolução do vínculo matrimonial entre os outorgantes.
Neste sentido concluiu também este colectivo no âmbito do acórdão proferido, em 4 de Fevereiro de 2020, no processo de revisão de sentença estrangeira n.º 2490/19.9YRLSB, onde se sintetizaram os argumentos esgrimidos nos seguintes termos:
- «A escritura pública declaratória da união estável apresentada para revisão e confirmação não se reconduz a um simples meio de prova, para efeitos do estatuído no art. 978º, n.º 2 do CPC;
- A escritura pública declaratória da união estável lavrada segundo o ordenamento jurídico brasileiro contém o efeito jurídico de reconhecimento de direitos privados, sendo objecto de verdadeiro caucionamento pela entidade administrativa competente que preside ao acto;
- Na ponderação sobre a procedência ou improcedência da acção de revisão e confirmação de decisão estrangeira, não relevam os eventuais propósitos que os requerentes se proponham prosseguir com a utilização dessa escritura perante o ordenamento jurídico nacional;
- Não obstante os efeitos jurídicos sejam distintos pode encontrar-se semelhanças entre a união estável brasileira e a figura da união de facto consagrada pela legislação nacional no art.º 1º da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, cujo n.º 2 define como “a situação jurídica de duas pessoas que, independentemente, do sexo, vivam em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos”.
Assim, porque deve aceitar-se que a escritura pública em apreço integra ainda uma decisão sobre direitos privados para efeitos do art. 978º, n.º 1 do CPC está aquela sujeita a revisão.
Em reforço desta posição e perante o enquadramento jurídico exposto, transcreve-se o que se concluiu no acórdão desta secção proferido em 11-12-2019, relator Luís Filipe Sousa, processo n.º 1535/19.7YRLSB, já acima mencionado:
“Ou seja, a ordem jurídica brasileira atribui efeitos e reconhece a união estável, formalizada por escritura pública, sem necessidade de intervenção judicial. E, no que tange quer à extinção do casamento por divórcio consensual quer à extinção da união estável, não exige que as escrituras que os determinam sejam objecto de homologação judicial.
Nos termos do artigo 1º da Convenção da Haia sobre Reconhecimento de Divórcios e Separações de Pessoas (Resolução da Assembleia da República n.º 23/84), «A presente Convenção aplica-se ao reconhecimento num Estado contratante de divórcios e separações de pessoas obtidas noutro Estado contratante na sequência de um processo judicial ou outro oficialmente reconhecidos neste último Estado e que aí produzam efeitos legais» (negrito nosso). Ou seja, a aplicação da convenção não está condicionada à existência de um processo judicial mas de um procedimento que seja reconhecido no noutro Estado e que aí produza efeitos legais. Esta Convenção reforça o que acima foi dito no sentido de que a interpretação do conceito de sentença/decisão não deve ficar limitado ao quadro concetual do Estado onde se procede à sua revisão.
Ora, conforme se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25.6.2013, Granja da Fonseca, 623/12:
« (…) tal como se considerou no Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 22/05/2013, abordando um caso idêntico ao dos autos, “a interpretação do acórdão sob recurso do que seja uma decisão da autoridade administrativa estrangeira peca por demasiado restritiva”.
“O que interessa para a ordem jurídica portuguesa é mais o conteúdo do acto administrativo, ou seja, o modo como regula os ditos interesses privados”.
“Do ponto de vista formal apenas releva que o acto administrativo provenha efectivamente duma autoridade administrativa”.
“Se não ofende a ordem pública portuguesa, quanto à maneira como regulou esses interesses privados e provém duma autoridade administrativa, estão preenchidos os requisitos para a confirmação do seu conteúdo”.
“Não releva, portanto, o modo ou a via como se chegou à produção desse acto, ou seja, se através duma emissão formal da vontade da entidade administrativa responsável pelo acto, ainda que de carácter meramente homologatório, ou se de maneira mais «contratual» apenas através das declarações dos outorgantes. Por outras palavras, basta que se trate de um acto caucionado administrativamente pela ordem jurídica em que foi produzido (cfr. artigo 1º da Convenção de Haia Sobre o Reconhecimento dos Divórcios e Separação de Pessoas, de 1/06/1970)”.
Acresce que se, assim não fosse, “estava-se a denegar a força do dito acto, como idóneo para produzir os seus efeitos, como se de sentença fosse. Ou seja, estava-se a denegar a competência da entidade que o produziu, quando é certo que a competência para o acto, como é de jurisprudência, é definida pela lei nacional dessa entidade” (…)»
Daqui resulta que, sendo admissível a formalização da união estável no Brasil através de escritura pública perante tabelião, como foi o caso, a intervenção e controle feitos pelo tabelião consubstanciam a intervenção de uma entidade administrativa que caucionam o ato, ao qual são atribuídos efeitos precípuos pela ordem jurídica brasileira.
Com efeito, no Brasil, a atividade notarial está regida no art. 236º da Constituição nestes termos:
Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.
§1º Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.
Refere a este propósito Ronan Cardoso Naves Neto, A União Estável nas Serventias Extrajudiciais, que:
«As atividades notariais e de registro, portanto, são transferidas ao particular pelo Estado através de um ato de delegação administrativa» (p. 51).
 « (…) a prestação dos serviços notariais e de registro devem observar os princípios gerais que regem a Administração Pública, a saber, supremacia do interesse público, legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência» (p. 55).
«(…) pode-se afirmar que o entendimento mais coerente e consentâneo com o Supremo Tribunal Federal é que, de acordo com a Constituição da República de 1988, a natureza jurídica dos serviços notariais e de registro corresponde a uma função pública transferida ao particular, por meio de delegação administrativa sui generis, após aprovação em concurso público de provas e títulos, para ser exercido em caráter particular, sujeito à fiscalização por parte do Poder Judiciário, seja através das Corregedorias Gerais de Justiça dos estados, seja através dos juízes corregedores locais» (p. 58)
Em suma, a intervenção do notário/tabelião de notas, no âmbito da escritura da união estável, é ainda uma intervenção integrante de uma função pública transferida pelo Estado ao particular, por meio de delegação administrativa sui generis. Ou seja, a intervenção do notário assume a natureza de caucionamento do ato em causa, na sequência de delegação administrativa sui generis por parte do Estado brasileiro. A intervenção notarial permite que o ato despolete efeitos na ordem jurídica brasileira, tal como se tivesse sido objeto de declaração judicial em sentido estrito, estando mesmo a atividade notarial sujeito à fiscalização do Poder Judiciário.”
Parece não sobrarem dúvidas, ou pelo menos elas se dissipam se se atentar na valia dos argumentos aduzidos, que tal escritura constitui acto passível de revisão e confirmação.
Mas a questão que aqui se suscitou abrange ainda outro ponto, que também tem sido referido nos acórdãos supra mencionados, que é o de saber se a revisão é de afastar se se puder concluir que os requerentes pretendem apenas utilizar a escritura como um simples meio de prova.
A este propósito, no acórdão desta Relação de 21-11-2019, relator Pedro Martins, processo n.º 1429/19.6YRLSB-2 (onde se concluiu pela equiparação da escritura de declaração de união estável a decisão, para efeitos do disposto no art. 978º, n.º 1 do CPC), afirmou-se que não existia qualquer facto que permitisse concluir que a escritura estaria a ser usada pelos requerentes como um simples meio de prova, caso em que, a demonstrar-se ser essa a intenção, seria afastada a necessidade da sua revisão com base no art. 978º, n.º 2 do CPC.
Neste caso, na sua petição inicial, os requerentes referiram que pretendem o reconhecimento da escritura de declaração de união estável, a fim de que esta tenha eficácia na ordem jurídica portuguesa, “nomeadamente, para efeitos de aquisição de nacionalidade portuguesa, nos termos do art. 3º da Lei n.º 37/81”, de 3 de Outubro[7] (Lei da Nacionalidade) (cf. artigos 19º a 22º da petição inicial).
Ora, o processo de revisão de sentença estrangeira corresponde a uma acção de simples apreciação com processo especial, que tem por finalidade reconhecer efeitos jurídicos de decisões estrangeiras no nosso ordenamento nacional. Tal pressupõe que o nosso ordenamento atribua à mesma situação jurídica declarada por autoridade estrangeira efeitos jurídicos relevantes, por mera decorrência do reconhecimento da sua existência.
No entanto, se, como se concluiu, a escritura de declaração de união estável é um acto equiparado a sentença, que no âmbito do direito brasileiro concede aos conviventes a necessária segurança jurídica, evitando a propositura de acção judicial (meramente declaratória), numa situação em que inexiste qualquer litígio entre as partes, únicos interessados em ver declarada a união estável, incluindo a data do seu início, sendo de confirmar um tal acto de reconhecimento da união estável, para que passe a ter plena eficácia na ordem jurídica portuguesa, tal conclusão não deve ser afastada pela circunstância de os requerentes, de entre as finalidades visadas com a obtenção dessa confirmação, mencionarem uma possível aquisição da nacionalidade portuguesa.
É que essa menção não basta para afirmar que a única utilização pretendida pelos requerentes é que a escritura funcione, tão-somente, como um mero meio de prova, pois que, como não deixaram de referir, pretendem a produção na ordem jurídica nacional de todos os efeitos jurídicos que o reconhecimento da sua união estável lhes possa vir a conferir (sem prejuízo de os efeitos jurídicos, à luz do ordenamento jurídico português, do reconhecimento da existência da união de facto não emergirem, automaticamente, da escritura, que, para múltiplos efeitos, poderá, de facto, constituir simples meio de prova[8]).
Ademais, note-se que a necessidade da revisão também não pode ser afastada por inadequação do meio processual para o fim da aquisição da nacionalidade, pois que, como é evidente, nem os requerentes a pediram, nem tal fim poderia ser alcançado nesta sede processual.
Na verdade, o reconhecimento da união de facto para efeitos de aquisição da nacionalidade portuguesa só pode fazer-se através de acção judicial a interpor no tribunal cível (de primeira instância), contra o Estado Português (cf. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 25-10-2018, relator Adeodato Brotas, processo n.º 25835/17.1T8LSB.L1-6), acção que pressupõe a demonstração judicial dos factos em que se estriba o pedido, com amplo contraditório, razão pela qual a acção de revisão e confirmação de sentença estrangeira sempre seria meio processual inadequado para atingir esse fim.
De todo o modo, a pretensão dos requerentes, cingida ao pedido de revisão para que possam averbar no assento de nascimento a união de facto entre eles, não deixa de se traduzir numa situação vantajosa, nem que seja, como se refere no acórdão proferido no processo n.º 2032/19.6YRLSB, relator Luís Espírito Santo, acima mencionado, “como forma de dar publicidade à situação perante terceiros.”
E ainda que a escritura declaratória da união estável possa não ter utilidade mediata ou imediata para os requerentes (através da sua revisão e confirmação), não há razões para não admitir que vigore em Portugal, e que possa servir de título de registo/averbamento da união estável, correspondendo a uma vantagem efectiva para os requerentes ao nível da publicidade da situação e da sua invocação perante terceiros, como se refere no acórdão desta Relação e secção de 5-02-2021, relatora Isabel Salgado, processo n.º 2338/20.1YRLSB[9], onde se aduz que “não compete ao Estado Português, através dos tribunais, aquando da acção de revisão e confirmação de decisão estrangeira, cuidar de escrutinar quais os intentos futuros dos requerentes na utilização futura dessa escritura revidenda face ao ordenamento jurídico nacional. O único padrão de juro constituto na revisão e confirmação de decisões estrangeiras (incluindo a proferidas por entidades administrativas – e não jurisdicionais) encontra-se estabelecido, em termos de quadro legal, nos artigos 978º a 985º do Código de Processo Civil.”[10]
Finalmente, em face da utilidade identificada, não se vislumbra que ocorra falta do pressuposto processual de interesse em agir e tão-pouco se identifica o recurso a meio processual inadequado (sendo certo que sempre incumbirá ao tribunal onde a acção para reconhecimento da aquisição da nacionalidade venha a ser intentada aferir da valia probatória, para os fins que aí venham a ser deduzidos, da confirmação da escritura alcançada por esta via), quando a finalidade visada é, tal como se retira do petitório do articulado inicial, a confirmação da escritura de declaração da união estável.
Assim, porque deve aceitar-se que a escritura pública em apreço integra ainda uma decisão sobre direitos privados para efeitos do art. 978º, n.º 1 do CPC e não cabendo nesta sede aferir das intenções futuras dos requerentes, está aquela sujeita a revisão.
Não existem dúvidas sobre a autenticidade das declarações de vontade emitidas pelos requerentes e vertidas na escritura, nem sobre a respectiva inteligibilidade. Assim como não se identificam elementos que revelem que essas declarações tenham sido tomadas por órgão cuja competência tenha sido provocada em fraude à lei, ou que esteja pendente ou já tenha sido proferida outra decisão sobre a mesma questão em Portugal.
O resultado emergente da escritura não se configura como manifestamente incompatível com os princípios da ordem pública internacional do Estado Português.
Verificam-se, assim, todos os requisitos necessários para a confirmação da sentença, pelo que importa conceder procedência à pretensão dos requerentes.
*
IV - DECISÃO
Pelo exposto, acordam as juízas desta 7.ª Secção do Tribunal de Relação de Lisboa em julgar procedente a pretensão dos requerentes e, em consequência, conceder a revisão e confirmar a decisão, ou seja, a escritura pública declaratória de união estável, lavrada pelo Tabelião de Notas e Oficial de Registo do 8º Registro Civil de Pessoas Naturais e Tabelionato da Comarca da Capital, Rio de Janeiro, Brasil, com data de 18 de Dezembro de 2018, confirmando a união estável entre os intervenientes no acto, A e B, que passará a ter eficácia na ordem jurídica portuguesa.
Valor da causa - € 30 000,01.
Face ao estatuído no art. 14º-A, n.º 1, c) do Regulamento das Custas Processuais, não há, neste caso, lugar ao pagamento da segunda prestação da taxa de justiça.
Oportunamente, cumpra o disposto no art. 78º, n.º 1 do Código de Registo Civil.
*
Lisboa, 28 de Setembro de 2021[11]
Micaela Sousa
Cristina Silva Maximiano
Maria Amélia Ribeiro
_______________________________________________________
[1] Acessível na Base de Dados Jurídico-documentais do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, I. P. em www.dgsi.pt, onde se encontram disponíveis todos os arestos adiante mencionados sem indicação de origem.
[2] Adiante designado pela sigla CPC.
[3] Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm.
[4]Acessívelfile:///C:/Users/Admin/Documents/Relatora%20Ana%20Rodrigues%20Silva%20Ac%C3%B3rd%C3%A3os/Intermedia%C3%A7%C3%A3o%20Financeira/5497-15035-1-SM.pdf.
[5] Acessível em https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/2043.
[6] Acessível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm.
[7] Alterada pela Lei n.º 25/94 de 19/8; pelo DL n.º 322-A/2001, de 14/12; pela Lei Orgânica n.º 1/2004 de 15/1; pela Lei Orgânica n.º 2/2006 de 17/4; pela Lei n.º 43/2013 de 3/7; pela Lei Orgânica n.º 1/2013, de 29/7; pela Lei Orgânica n.º 8/2015 de 22/6; pela Lei Orgânica n.º 9/2015 de 29/7; e pela Lei Orgânica n.º 2/2018 de 5/7.
[8] Como para obstar à caducidade do direito ao arrendamento para habitação (art. 57.º n.º 1 al. b) do NRAU), ou originar a obrigação de alimentos (art. 2020.º do Código Civil) e os previstos no art. 3.º da Lei 7/2001 de 11 de Maio.
[9] Ao que se conhece, por ora, inédito.
[10] Afasta-se aqui o entendimento expresso num outro acórdão desta Relação e secção, de 13-04-2021, relator Carlos Oliveira, processo n.º 424/21.0YRLSB, também inédito, onde se refere: “acresce que se nos afigura de particular importância especificar qual o interesse em agir das partes neste tipo de ações, pois por regra, estando em causa o reconhecimento duma situação de “união de facto”, não vislumbramos que outra eficácia jurídica própria terão as declarações prestadas perante o notário, para além de servirem de mero meio de prova da existência duma mera situação de facto, à qual a nossa lei também pode reconhecer certos efeitos jurídicos, para certos e determinados casos aí concretizados”, pois que, conforme se viu, o interesse no reconhecimento poderá bastar-se com a mera publicidade da situação perante terceiros.
[11] Acórdão assinado digitalmente – cf. certificados apostos no canto superior esquerdo da primeira página.