PETIÇÃO INICIAL
APRESENTAÇÃO
FORMULÁRIO
ROL DE TESTEMUNHAS
PORTARIA 280/2013
Sumário

A norma constante do art. 7/4 da Portaria 280/2013 de 26/8 (indicação das testemunhas no formulário), revela-se excessiva e desproporcional, porquanto prejudica o direito de acção por parte do autor, uma vez que este, na p.i., elencou o rol de testemunhas.

Texto Integral

Acordam na 8ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa

A  [ ....,Lda.], demandou B [ Fábrica da Igreja Paroquial  ....]  e C [ ...., Lda].
No formulário apresentado não consta o rol de testemunhas, tendo este sido elencado no final da p.i., em que se refere que estas são a apresentar – fls. 11 e sgs.
A secretaria, em 19/11/20, notificou o autor para no prazo de 10 dias preencher o formulário - no formulário disponibilizado para a apresentação das peças processuais nada consta na parte relativa à identificação das testemunhas e demais informação respeitante às mesmas, constando tais elementos nos ficheiros anexos que acompanham a peça processual apresentada, sob pena de se considerar apenas o conteúdo do formulário inicial, ex vi art. 7/4 Portaria 280/2013 de 26/8 – fls. 24.
Não obstante, até hoje, o autor nada fez.
Posteriormente, em sede de despacho saneador, de 30/4/2021, e despacho rectificativo de 11/5/2021, foi admitido o rol de testemunhas do autor, o mesmo sucedendo no despacho rectificativo  – fls. fls. 25 e sgs.
Inconformadas as rés apelaram formulando as seguintes conclusões:
B:
1ª. A presente Apelação vem interposta do Despacho de 30 de Abril de 2021, reafirmado a 11 de Maio, que admitiu o rol de testemunhas da Autora, aqui Recorrida. Porquanto,
2ª. Os autos atestam que, no formulário da sua Petição Inicial, a Autora não indicou nenhuma prova por testemunhas, embora no final do ficheiro anexo denominado “Petição” tenha indicado um rol com quatro testemunhas, todas a apresentar.
3ª. Perante tais factos, a Autora foi oficiosamente – e muito bem - notificada, “nos termos do nº 4 do art. 7 da Portaria 280/2013 de 26 de agosto”, para, no prazo de 10 dias, preencher o referido formulário, sob pena de se considerar apenas o conteúdo do formulário inicial (nº 4 do art. 7 da Portaria 280/2013 de 26 de agosto).”.
4ª. Os autos atestam que, no prazo de 10 dias subsequente a tal notificação – que há muito se esgotou - a Autora não procedeu ao preenchimento do formulário com as testemunhas que pretendia arrolar.
5ª. Em consequência, por força do disposto no nº 4 do artigo 7.º da Portaria 280/2013, de 26 de Agosto, nestes autos apenas há que considerar o conteúdo do formulário inicial da Petição Inicial, do qual não consta nenhuma testemunha arrolada pela Autora, pelo que,cristalinamente, não poderá ser admitido o que, pura e simplesmente, legalmente não existe.
6ª. Ao ter decidido admitir o suposto rol de testemunhas da Autora, o Despacho de 30.04.2021, admitiu um meio de prova manifestamente inadmissível, em flagrante violação do disposto no nº 4 do artigo 7º da Portaria 280/2013, de 26 de Agosto, pelo que tem que ser revogado e substituído por outro que o julgue inexistente e inadmissível.
7ª. Porquanto, embora a aqui Recorrente seja uma intransigente defensora da busca pela verdade material, e seja com total desagrado que se vê obrigada a suscitar esta questão, o certo é que, como superiormente se afirma no Acórdão desse Venerando Tribunal da Relação de Lisboa de 11 de Janeiro de 2018, de que: “Não é tecnicamente defensável, a qualquer luz interpretativa, que o rol de testemunhas possa ser apresentado à margem das regras definidas na lei processual, ultrapassando todos os descuidos e inépcias, pelo simples facto de as partes terem inalienável direito ao pleno exercício do contraditório, nem este implica a possibilidade de criação de regras adjectivas privativas”.
8ª. Assim, deve ser dado provimento ao presente recurso de Apelação e revogado o Despacho de 30 de Abril de 2021, que admitiu o rol de testemunhas da Autora, com todas as demais consequências legais, designadamente, procedendo à invalidação e desconsideração de eventuais actos de produção da prova de testemunhas do Autor que, entretanto, tenham sido indevidamente praticados.
C:
1ª. No formulário da sua Petição Inicial, a Autora não indicou nenhuma prova testemunhal.
2ª. Perante tais factos, a Autora foi notificada, “nos termos do nº 4 do art. 7 da Portaria 280/2013 de 26 de agosto”, para, no prazo de 10 dias, preencher o referido formulário, sob pena de se considerar apenas o conteúdo do formulário inicial (nº 4 do art. 7 da Portaria 280/2013 de 26 de agosto).”.
3ª. Apesar de notificada para isso o autor não procedeu até hoje ao preenchimento do formulário.
4ª. Por força do disposto no nº 4 do artigo 7º da Portaria 280/2013, de 26 de Agosto, nestes autos apenas há que considerar o conteúdo do formulário inicial da Petição Inicial, do qual não consta nenhuma testemunha arrolada pelo Autor, pelo que não poderá ser admitido o rol de testemunhas por inexistente.
5ª. Admitindo o suposto rol de testemunhas da Autora, Despacho de 30.04.2021, admitiu um meio de prova manifestamente inadmissível, em flagrante violação do disposto no nº 4 do artigo 7 da Portaria 280/2013, de 26 de agosto, pelo que tem que ser revogado e substituído por outro que o julgue inexistente e inadmissível.
6ª. E, além disso, violou o princípio da igualdade processual das partes consagrado no artigo 4 do CPC.
7ª. Porquanto, embora a aqui Recorrente seja defensora da busca pela verdade material, e seja com total desagrado que se vê obrigada a suscitar esta questão, o certo é que, como superiormente se afirma no Acórdão desse Venerando Tribunal da Relação de Lisboa de 11 de Janeiro de 2018, cujo sumário supra se transcreveu.
8º. Assim, deve ser dado provimento ao presente recurso de Apelação e revogados os Despachos de 30 de abril de 2021 e de 11 de Maio de 2021, que admitiram o rol de testemunhas da Autora, com todas as demais consequências legais, designadamente, procedendo à invalidação e desconsideração de eventuais actos de produção da prova de testemunhas da Autora que, entretanto, tenham sido indevidamente praticados,
Não foram deduzidas contra-alegações.
Dispensados os vistos, cumpre decidir.
Os factos com interesse constam do relatado supra.
Atentas as conclusões da apelante que delimitam, como é regra, o objecto do recurso – arts. 639 e 640 CPC – a questão a decidir consiste em saber se há ou não lugar à admissão do rol de testemunhas da autora.
Vejamos, então.
In casu, impugnam as apelantes a admissão do rol de testemunhas apresentado em anexo (p.i.) ao formulário disponibilizado para a apresentação das peças processuais, já que neste o rol é, de todo, omisso.
Os requisitos da p.i. constam do art. 552 CPC (NCPC), constando do seu nº2 que no final da mesma o autor deve apresentar o rol de testemunhas e requerer outros meios de prova e caso o réu conteste, o requerimento probatório pode ser alterado na réplica, caso haja lugar à mesma, ou no prazo de 10 dias a contar da notificação da contestação.
Com a entrada em vigor do NCPC (Lei 41/2013 de 26/6) procedeu-se à revisão de um conjunto de matérias que procedem à sua regulamentação, mormente a tramitação electrónica de processos cuja regulamentação, até aqui, constava da Portaria 114/2008, de 6/2.
Destarte, esta Portaria foi revogada pela Portaria 280/2013 de 26/8 (cfr. art. 37) que introduziu alterações ao regime da tramitação electrónica de processos judiciais, citação edital e regime de regulamentação de comunicações electrónicas entre os tribunais e os agentes de execução (cfr. preâmbulo da Portaria).
No seu art. 1º, sob a epígrafe objecto e âmbito, são elencadas as formas de regulamentação da tramitação electrónica dos processos nos tribunais judiciais – processos, sistema informático, peças processuais, requerimentos, documentos, recursos, etc..
Por seu turno, o art. 6/1 dispõe que a apresentação das peças processuais é efectuada através de formulários disponibilizados no endereço electrónico referido no art. anterior (citius) aos quais se anexam: ficheiros com a restante informação legal exigida, conteúdo material da peça processual e demais informação que o mandatário considere relevante e que não se enquadre em nenhum campo dos formulários, de forma individualizada, os documentos que devem acompanhar a peça processual.
E o nº 2 que a informação inserida nos formulários é reflectida num documento que, juntamente com os ficheiros anexos referidos na alínea a) do nº anterior, faz parte, para todos os efeitos da peça processual.
O nº 3 reporta-se à assinatura digital.
Por seu turno, o art. 7/1, refere que quando existam campos no formulário para a inserção de informação específica, essa informação deve ser indicada no campo respectivo, não podendo ser apresentada unicamente nos ficheiros anexos.
2 – Em caso de desconformidade entre o conteúdo dos formulários e o conteúdo dos ficheiros anexos, prevalece a informação constante dos formulários, ainda que estes não se encontrem preenchidos.
3 – O disposto no número anterior não prejudica a possibilidade de a mesma ser corrigida, a requerimento da parte, sem prejuízo da questão poder ser suscitada oficiosamente.
4 – Nos casos em que o formulário não se encontre preenchido na parte relativa à identificação das testemunhas e demais informação referente a estas, constando tais elementos dos ficheiros anexos referidos na alínea a) do nº 1 do art. anterior, a secretaria procede à notificação da parte para preencher, no prazo de 10 dias, o respectivo formulário, sob pena de se considerar apenas o conteúdo do formulário inicial.
5 – Existindo um formulário específico para a finalidade ou peça processual que se pretende apresentar, deve o mesmo ser usado obrigatoriamente pelo mandatário.
Estipula o art. 195 CPC, regras gerais sobre a nulidade dos actos, que fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.
Tendo em atenção as normas citadas, afastada está qualquer nulidade pelo facto de não constar do formulário o rol de testemunhas, apresentado em anexo (p.i.).
O art. 20 CRP (acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva) garante a todos o direito de acesso aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesse legalmente protegidos impondo igualmente que esse direito se efective, na conformação normativa, pelo legislador e na concreta condução do processo, pelo juiz, através do processo equitativo (due process), contemplando o direito de acção, defesa e probatório.
In casu, tendo em atenção as normas citadas, o art. 7/4 da Portaria 280/2013, revela-se excessiva e desproporcional, porquanto prejudica o direito à acção por parte do autor/apelado.
Não se olvide que apesar de nada constar no formulário, o rol consta de p.i., em conformidade com o art. 552 CPC, p.i. esta do conhecimento dos réus/apelantes, aquando da citação, pelo que inexiste qualquer violação do estatuto da igualdade substancial das partes (art. 4 CPC).
Destarte, improcede a pretensão dos apelantes.

Concluindo:
- A norma constante do art. 7/4 da Portaria 280/2013 de 26/8 (indicação das testemunhas no formulário), revela-se excessiva e desproporcional, porquanto prejudica o direito de acção por parte do autor, uma vez que este, na p.i., elencou o rol de testemunhas.
Pelo exposto, acorda-se em julgar as apelações improcedentes e, consequentemente, confirma-se o despacho impugnado.
Custas pelos apelantes.

Lisboa, 23/9/2021
Carla Mendes
Rui da Ponte Gomes
Luís Correia de Mendonça