COVID
PERDÃO DE PENA
RECLUSO
Sumário


O perdão previsto no artigo 2º da Lei nº 9/2020 não abrange aqueles cidadãos que hajam sido condenados por decisão já transitada em julgado aquando do início da vigência de tal lei (11-04-2020), mas que, nessa data (11-04-2020), ainda não haviam ingressado num estabelecimento prisional para iniciar a execução da pena de prisão que lhes foi aplicada.
Por outras palavras: os pressupostos de aplicação do perdão em análise, designadamente a qualidade de “recluso”, têm de estar preenchidos à data da entrada em vigor da Lei nº 9/2020, de 10/04.

Texto Integral



Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora

Relatório

No Tribunal de Execução de Penas de Évora, Juízo de Execução de Penas de Évora – Juiz 1, foi, em 28 de junho de 2021, proferido despacho com o seguinte teor (transcrição):

“O perdão de pena previsto na Lei nº9/2020 de 10/04 apenas tem aplicação a pessoas reclusas, já em cumprimento de pena de prisão aquando da entrada em vigor de tal legislação, isto é, em 11/4/2020.

Ora, resulta do mandado de detenção cumprido e junto aos autos que a detenção do recluso para cumprimento do remanescente de pena ocorreu apenas no passado dia 26/3/2021.

Donde, a inaplicabilidade legal de tal perdão.

Isso informe o recluso, mais solicitando que, em complemento do que requer, concretize e comprove o período de tempo em que esteve detido em Inglaterra ao abrigo de MDE emitido nos autos – muito se estranhando tal pois que a sua detenção e retorno à prisão resulta do cumprimento de mandado de detenção nacional.

(…)”.


*

Inconformado com a decisão, o arguido (…) interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões:

1. O presente recurso vem interposto na sequência do despacho proferido pela Mm.ª Juiz de Direito, no dia 28 de junho de 2021, do qual o arguido só foi notificado em 08 de julho de 2021.

2. No âmbito do processo 1533/04.5PBOER da 4.º Vara Criminal de Lisboa foi condenado o Recorrido, por cúmulo, em oito anos e nove meses de prisão efetiva, transitado em julgado a 24/11/2008.

3. Por execução de mandato de detenção nacional, o Recorrente iniciou o cumprimento do remanescente da pena no Estabelecimento Prisional de Pinheiro da Cruz;

4. Já em situação de reclusão, o Recorrente requereu o perdão de pena ao abrigo da Lei N.º 9/2020, de 10 de abril por se verificar o integral preenchimento dos seus pressupostos legais, a montante com o ainda crescente número de casos de infeções, especialmente nos estabelecimentos prisionais;

5. À data do pedido faltavam, para o cumprimento integral da pena de prisão efetiva, um ano e sete meses;

6. A Mm.ª Juiz de Direito indeferiu o pedido do Recorrente, alegando para o efeito que “o perdão de pena previsto na Lei N.º 9/2020, de 10/04 apenas tem aplicação a pessoas reclusas, já em cumprimento de pena de prisão aquando da entrada em vigor de tal legislação, isto é, em 11/4/2020. Ora, resulta do mandato de detenção cumprido e junto aos autos que a detenção do recluso para cumprimento do remanescente de pena ocorreu apenas no passado dia 26/3/2021. Donde, a inaplicabilidade legal de tal perdão”.

7. Sucede que tal entendimento não resulta da letra da lei e por isso, dele não concordar;

8. E não concorda, e recorre, por considerar que o entendimento sufragado no despacho desatende, de forma flagrante, às motivações subjacentes à Proposta de Lei n.º 23/XIV, reduzindo o seu sentido, e coloca em crise o Estado de Direito, ínsito no princípio da proteção da saúde (art.º 64.º/1 CRP), no princípio da igualdade (art.º 13.º CRP) e, em última ratio, ao princípio da aplicação do tratamento mais favorável.

9. Não resulta da Lei 9/2020, de 10 de abril, ipsis verbis, qualquer delimitação temporal quanto à exclusividade de aplicação da lei tão somente “a pessoas reclusas já em cumprimento de pena de prisão aquando da entrada em vigor de tal legislação”;

10. Um recluso é, e será sempre, um condenado em efetivo cumprimento de pena de prisão em estabelecimento prisional, independentemente do tempo em que se verifique a situação de reclusão.

11. Não se pode aceitar, num Estado de Direito, que se fantasie uma duplicação de sentidos para um mesmo vocábulo que representa a mesma realidade.

12. A simples aceitação dessa fantasia potencia diferenças de tratamento entre pessoas que se situam em posições materialmente idênticas, lesando drasticamente o principio constitucional da igualdade decorrente do artigo 13° da Constituição da República Portuguesa.

13. Por isso, o mero ingresso físico no estabelecimento prisional é condição humana bastante para se adquirir o estatuto de recluso;

14. Não existe no ordenamento jurídico português ou, na própria lei excecional que decreta o perdão de penas no âmbito da COVID-19, a distinção entre “reclusos antes da Lei 9/2020, de 10 de abril” e “reclusos depois da Lei 9/2020, de 10 de abril”;

15. Com a decisão recorrida quis o Tribunal a quo atribuir um caracter estático e redutor à letra da lei, dirigindo-a a um especifico grupo de reclusos condenados, excluindo todos os outros que, com o decurso do tempo, possam estar em condições de lhe ser aplicado o perdão de pena;

16. Assim sendo, a única leitura admissível à norma em causa - do ponto de vista constitucional, mas também pragmático - é a do perdão ser aplicável a todos os cidadãos punidos com penas e crimes abrangidos pelo âmbito da norma, aos que sejam reclusos à data da entrada em vigor do diploma, como os condenados que, no decurso da vigência da mesma Lei, venham a estar na situação de reclusão, verificados que sejam os demais requisitos legais, porque a Lei N.º 9/2020 não aponta ou baliza nada em sentido contrário a este entendimento.

17. O carácter estático que possam querer atribuir aquela lei é vencido pelo dinamismo que o legislador quis nela inculcar, ao prever no seu art.º 10.º que “a presente lei cessa a sua vigência na data fixada pelo decreto-lei previsto no n.º 2 do artigo 7.º da Lei N.º 1-A/2020, de 19 de março, o qual declara o termos da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19;”

18. Não se vislumbra ainda, no extenso acervo legislativo, aprovado no âmbito da COVID-19, lei que determine a cessação da vigência da Lei.

19. Como refere José Quaresma in e-book intitulado Estado de Emergência – Covid 19– Implicações na Justiça, 2ª ed., pág. 571, publicado pelo CEJ, “o perdão beneficiará o recluso que, na data em que a lei entrou em vigor ou em qualquer um dos dias em que vigorar, vier a preencher a totalidade dos pressupostos, substanciais e temporais, de concessão do perdão, desde que com base em condenação transitada em jugado anteriormente e nunca para além do fim da sua vigência, nesta data ainda indeterminado”.

20. Face à ausência de concretização legal que impeça a aplicação ao Recorrido da Lei N.º 9/2020, de 10 de abril requer-se que o mesmo seja revogado e substituído por outro que preveja a interpretação exata do normativo em questão;

Termos em que, assim decidindo,

SE CUMPRIRÁ O DIREITO E SERÁ FEITA A JUSTIÇA!


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O recurso foi admitido e fixado o respetivo regime de subida e efeito.

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O Ministério Público respondeu ao recurso interposto, pugnando pela respetiva improcedência e formulando as seguintes conclusões:

1 – (…) foi condenado no âmbito do processo n ° 1533/04.SPBOER, encontrando-se a cumprir a pena remanescente de um ano oito meses e treze dias de prisão.

2 - Tai pena encontra-se em execução em meio prisional desde 16-3- 2021, data em que foram cumpridos os mandados de detenção emitidos relativamente ao mesmo.

3 - Dispõe o artigo 2 ° n ° 1 da Lei n° 9/2020 de 10-4, que "são perdoadas as penas de prisão de reclusos condenados por decisão transitada em julgado, de dura ao igual ou inferior a dois anos".

4 -- Por seu turno, o n ° 7 do mesmo normativo preceitua que "o perdão a que se referem os n °s 1 e 2 é concedido a reclusos cujas decisões tenham transitado em julgado em data anterior a data da entrada em vigor da presente Lei.

5 - Ou seja, são apenas beneficiários desta medida de graça, os condenados que tinham a condição de reclusos, o mesmo e dizer que se encontravam a cumprir pena de prisão em meio prisional, a data da entrada em vigor do citado diploma legal.

6 - Esta é a única interpretação que a Lei consente, na medida em que as Leis de Amnistia ou de Perdão, são providências de excepção donde constam normas que devem ser interpretadas e aplicadas nos seus precisos termos, sem possibilidade de interpretação extensiva, restritiva ou analógica.

7 - Acresce que a aludida pena de prisão remanescente deve-se para além do mais à prática de um crime de coação na forma tentada, pelo que a aplicação do perdão em causa sempre estaria excluída por for a do disposto no artigo 2º n ° 6 al. c) do referido diploma legal.

8 - Assim, o Tribunal "a quo" efectuou uma correcta e adequada interpretação e ap!icacão do direito, ao indeferir o requerimento de aplicação do perdão formulado pelo recluso.

Nesta conformidade, deverão V.as Ex.as negar provimento ao recurso e confirmar o despacho recorrido, sendo feita justiça.


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No Tribunal da Relação, o Exmº Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu Parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Foi cumprido o disposto no art. 417º nº 2 do C.P.P., não tendo sido apresentada resposta.

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Colhidos os vistos, foram os autos à conferência.

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Fundamentação

Delimitação do objeto do recurso

Nos termos do disposto no art.412º, nº1, do C.P.P., e conforme jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça, o âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas pelos recorrentes das motivações apresentadas, só sendo lícito ao Tribunal ad quem apreciar as questões desse modo sintetizadas, sem prejuízo das que importe conhecer oficiosamente, como são os vícios da sentença previstos no art.410º, nº2, do C.P.P., mesmo que o recurso se encontre limitado a matéria de direito – cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, 2ª ed., III, págs.74; Ac.STJ de 28.04.99, CJ/STJ, ano de 1999, págs.96, e Ac. do STJ para fixação de jurisprudência de 19.10.1995, publicado no DR I-A Série de 28.12.1995.

São, pois, as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões da respetiva motivação que o Tribunal ad quem tem de apreciar.

No caso dos autos, face às conclusões da motivação do recurso impõe-se decidir se o Tribunal "a quo" efetuou uma correta e adequada interpretação e aplicação do direito ao indeferir o requerimento de aplicação do perdão formulado pelo recluso.


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Apreciando

Invocando o disposto na Lei n ° 9/2020 de 10-4, que estabeleceu e regulou o regime excecional de flexibilização das penas e medidas de graça, no âmbito da pandemia da doença covid-19, (…) requereu que lhe fosse perdoada a pena remanescente de um ano oito meses e treze dias de prisão, aplicada no processo n ° 1533/04.SPBOER, e que o mesmo cumpre desde o passado dia 16-3-2021.

Dispõe o artigo 2 ° n ° 1 da Lei n° 9/2020 de 10-4:

“1 - São perdoadas as penas de prisão de reclusos condenados por decisão transitada em julgado, de duração igual ou inferior a dois anos.

2 - São também perdoados os períodos remanescentes das penas de prisão de reclusos condenados por decisão transitada em julgado, de duração superior à referida no número anterior, se o tempo que faltar para o seu cumprimento integral for igual ou inferior a dois anos, e o recluso tiver cumprido, pelo menos, metade da pena.

(…)

6 - Ainda que também tenham sido condenados pela prática de outros crimes, não podem ser beneficiários do perdão referido nos n.os 1 e 2 os condenados pela prática:

(..)

c) De crimes contra a liberdade pessoal, previstos no capítulo IV do título I do livro II do Código Penal;

(…)

7 - O perdão a que se referem os n.os 1 e 2 é concedido a reclusos cujas condenações tenham transitado em julgado em data anterior à da entrada em vigor da presente lei e sob a condição resolutiva de o beneficiário não praticar infração dolosa no ano subsequente, caso em que à pena aplicada à infração superveniente acresce a pena perdoada.

(…)”.

Vejamos

Resulta dos autos que o arguido/recluso (…) foi condenado no âmbito do processo n ° 1533/04.SPBOER, encontrando-se a cumprir a pena remanescente de um ano oito meses e treze dias de prisão pela prática de, além de outros, um crime de coação na forma tentada.

Tal pena encontra-se em execução em meio prisional desde 16-3-2021, data em que foram cumpridos os mandados de detenção emitidos relativamente ao mesmo.

Decidiu-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 22/06/2021, acessível in www.dgsi.pt, em entendimento que sufragamos na íntegra, que: “ (…) o disposto no artigo 2º da Lei nº 9/2020 não é aplicável ao caso em apreço, uma vez que, em 11-04-2020, o ora recorrente estava em liberdade.

Na verdade, o artigo 2º, nº 1, da mencionada lei, estipula que são perdoadas as penas de prisão de “reclusos”, e o nº 7 do mesmo artigo refere, expressamente, que “o perdão a que se referem os nºs 1 e 2 é concedido a reclusos”.

O perdão previsto no artigo 2º da Lei nº 9/2020 não abrange, pois, aqueles cidadãos que hajam sido condenados por decisão já transitada em julgado aquando do início da vigência de tal lei (11-04-2020), mas que, nessa data (11-04-2020), ainda não haviam ingressado num estabelecimento prisional para iniciar a execução da pena de prisão que lhes foi aplicada.

Por outras palavras: os pressupostos de aplicação do perdão em análise, designadamente a qualidade de “recluso”, têm de estar preenchidos à data da entrada em vigor da Lei nº 9/2020, de 10/04.

Esta nossa interpretação não se baseia apenas na letra da lei (onde se escreve, sempre, que o perdão é aplicado a “reclusos”), mas também nas intenções do legislador, uma vez que, em nosso entender, o legislador visou, com a lei em causa, retirar, rapidamente, pessoas dos estabelecimentos prisionais, devido ao perigo de contágio dos “reclusos” com o vírus causador da doença COVID-19, e não evitar a entrada, no futuro, passados meses e até anos, de novos “reclusos”.

O legislador não pretendeu conceder um “perdão” geral de penas, mas, isso sim, retirar “reclusos”, urgentemente, das prisões portuguesas.

Nesta nossa interpretação da lei atendemos, pois, ao preceituado no artigo 9º do Código Civil (preceito legal que genericamente regula a matéria da interpretação da lei), onde se estabelece, como principal marca orientadora, que a interpretação da lei deve reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo como parâmetros a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.

Interpretar uma lei mais não é do que determinar o seu sentido e o alcance com que ela se deve impor na comunidade jurídica a que se destina.

Uma interpretação meramente literal do preceito em análise dá apoio à tese aqui sustentada (porquanto a letra da lei só prevê o perdão para “reclusos”).

Porém, como decorre dos princípios gerais de interpretação, a letra da lei, se bem que constitua um importante elemento de interpretação, não é o único, nem, porventura, o mais importante.

Só que o meio racional também não sustenta, segundo julgamos, interpretação diversa daquela que o elemento literal inequivocamente nos dá.

Na teleologia da norma em evidência, visando o legislador reduzir drasticamente (e imediatamente) a população prisional, existe uma razão para a excecionalidade do perdão concedido apenas àqueles que, nessa altura, possuíam a qualidade de “reclusos”, deixando de fora todos os outros condenados.

Com efeito, o perdão em causa teve como objetivo evitar uma situação de alastramento dramático, nos estabelecimentos prisionais, da pandemia causada pelo vírus COVID.19, naquele concreto momento temporal e naquela conjuntura sanitária específica (em que todo o país se encontrava em confinamento rigoroso, e em que se corria o sério risco de infeção generalizada da população prisional).

Dito de outro modo: as razões de política legislativa que estiveram na base da previsão legal da concessão do perdão em apreço esgotaram-se no momento dessa concessão, não subsistindo depois dela.

Face ao que vem de dizer-se, e em jeito de sínteses conclusiva, é de entender que o perdão concedido pela Lei nº 9/2020, de 10/04, não é aplicável a um arguido que, tendo sido condenado por sentença transitada em julgado antes da entrada em vigor dessa lei, não se encontre, à data da entrada em vigor de tal lei, na situação de recluso.

Por último, alega o recorrente que “a interpretação da referida Lei levada a cabo pela decisão do TEP de Évora é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade” (cfr. conclusão 19ª extraída da motivação do recurso).

Resta, assim, verificar se o perdão previsto na Lei nº 9/2020, de 10/04, padece de vício de constitucionalidade, por violação do princípio da igualdade.

A este propósito, sufragamos o que ficou escrito no Ac. do T.R.L. de 09-12-2020 (sendo relatora Margarida Ramos de Almeida - Ac. disponível in www.dgsi.pt): “a Lei nº 9/2020 teve por objetivo reduzir a população prisional, considerando o risco de disseminação do vírus nos estabelecimentos prisionais, no momento concreto em que foi publicada. Não teve por objeto proceder a uma redução mensal ou sistemática de tal população, nem sequer de se manter ao longo de um determinado período temporal específico (como constava da proposta acima mencionada, que não foi aprovada) - teve um propósito específico e temporalmente limitado, de diminuir o número de reclusos nas prisões nacionais, libertando-os (estamos em abril de 2020), para diminuir o que, à data, se considerava como um risco de disseminação viral, potencialmente incontrolável. Foi uma medida de cariz único e temporalmente circunscrita, que teve o único objetivo de reduzir, nesse momento, o número de reclusos nas prisões portuguesas, de modo a prevenir uma putativa situação de emergência sanitária. Se o propósito da lei era, naquele momento, diminuir o número de presos nas prisões portuguesas, através de medidas de clemência, afigura-se razoável e adequado ao objetivo proposto, que tais medidas se circunscrevessem a um universo restrito e determinado, desde logo a quem já se encontrava detido em tais estabelecimentos prisionais. Assim, situações da mesma categoria essencial foram tratadas da mesma maneira (presos em cumprimento de pena em 11 de abril de 2020) e situações pertencentes a categorias essencialmente diferentes tiveram tratamento diferente (condenados ainda em liberdade). Esta diferenciação de tratamento mostra-se fundada naquele objetivo racional. Entende-se pois que, neste respeito, a norma em questão se mostra de acordo com os princípios constitucionais vigentes”.

Em conclusão: a interpretação legal levada a cabo no despacho revidendo não enferma de inconstitucionalidade, ao contrário do que invoca o recorrente.”

A isto acresce a circunstância de a aludida pena de prisão remanescente se dever para além do mais à prática de um crime de coação na forma tentada, pelo que a aplicação do perdão em causa sempre estaria excluída por força do disposto no artigo 2º n ° 6 al. c) da invocada Lei nº 9/2020, de 10/04.

Termos em que improcede o recurso interposto.


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Decisão

Nos termos expostos, acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em negar provimento ao recurso.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UCs.


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Elaborado e revisto pela primeira signatária

Évora, 21 de setembro de 2021

Laura Goulart Maurício

Maria Filomena Soares