MANDADO DE DETENÇÃO EUROPEU
ACLARAÇÃO
Sumário

Texto Integral



Acordam em Conferência na 3ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça,


I

Nestes Autos de recurso veio o recorrente AA “reclamar” invocando o disposto nas “disposições conjugadas dos artigos 380.º, n.º 1, al. b) e 425.º, n.º 4 do C.P.P.”, solicitando que seja esclarecido o modo como o Acórdão proferido por este Alto Tribunal em 27.08.2021 “concluiu que não se verificou a dita omissão de pronúncia, e por inerência, a nulidade do acórdão recorrido, nos termos postos em evidência no recurso.”


II

Realizada a Conferência, cumpre apreciar e decidir:

Indica o artigo 380º nº 1 al. b), do CPP que “O Tribunal procede, oficiosamente ou a requerimento, à correcção da sentença, quando, a sentença contiver erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade cuja eliminação não importe modificação essencial”, dispondo o art. 425º, nº 4, do mesmo diploma ser “correspondentemente aplicável aos acórdãos proferidos em recurso o disposto nos arts. 379º e 380º”.

A Doutrina considera ser obscura uma Sentença quando esta for ininteligível, isto é, não compreensível quanto á sua explanação ou fundamentação, ou ambígua, ou seja, quando o seu sentido não for claro e certo.

Ensina o Prof. Alberto dos Reis, "(..) A sentença é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível: é ambígua quando nalguma passagem se preste a interpretações diferentes. Num caso não se sabe o que o juiz quis dizer; no outro hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos. É evidente que, em última análise, a ambiguidade é uma forma especial de obscuridade. Se determinado passo é susceptível de duas interpretações diversas, não se sabe, ao certo, qual o pensamento do juiz.

Já se tem feito uso do pedido de aclaração, não para esclarecer obscuridade ou ambiguidade realmente existente, mas para se obter, por via oblíqua, a modificação do julgado. A título ou a pretexto de esclarecimento o que, na verdade, se visa é a alteração da sentença. Os tribunais têm reagido, e bem, contra tais tentativas, votando-as ao malogro (..)."([1])

A propósito do artigo 380º do CPP, Maia Gonçalves escreveu: «prevê-se neste artigo um processo de correcção da sentença (...) e ainda quando a sentença contiver lapso, obscuridade ou ambiguidade cuja eliminação não importe modificação essencial. (...) São válidos nestes aspectos, os ensinamentos do processo civil, apesar da constatação de que este Código vai mais longe que o CPC e que o CPP de 1929 na sanação de nulidades e na possibilidade de correcção da sentença». ([2])

Analisando a pretensão do recorrente à luz do supra-exposto torna-se patente que esta não visa reparar qualquer eventual vício de obscuridade ou ambiguidade do Acórdão proferido nestes Autos de recurso, mas antes e tão só contestar, sob a forma de uma pergunta, a decisão dele constante.

  Com efeito, como se indica no Acórdão já proferido por este Alto Tribunal “O caso, ora em apreço, respeita a um pedido de ampliação a novos crimes de um MDE já anteriormente decidido, nos termos do disposto no artigo 7º da Lei nº 65/2003 de 23 de agosto.”

Sendo que aí foi decidido carecer de fundamento legal a questão suscitada pelo recorrente relativa à invocada “omissão de pronúncia”, atinente á circunstância, então alegada, de a decisão recorrida “não ter em consideração a circunstância de recusa facultativa prevista “nas alíneas h) e i) do n.º 1 do artigo 12º da LMDE”, explicitando-se os trâmites do pedido de ampliação de um anterior MDE nos casos, como o dos Autos, em que o requerido não tenha renunciado ao benefício da regra da especialidade, em virtude de, analisada a Decisão recorrida se ter constatado que o consentimento prestado pelo Tribunal da Relação assentava na observância de todos os procedimentos legais exigíveis, bem como  no respeito dos “princípios a que obedece a disciplina relativa à matéria em causa, tendo sido assegurado o exercício do contraditório e tendo-se verificado inexistir qualquer dos motivos de recusa, previstos nos artigos 11° e 12° da Lei n° 65/2003 de 23 de agosto, para a prestação do consentimento requerido.”

Assim, considera-se que o requerimento de aclaração ora formulado mais não visa que este Tribunal se pronuncie de novo sobre a matéria constante do Acórdão, o qual explicitou de forma clara e inteligível, os fundamentos de facto e de direito que determinaram a respectiva decisão.

Assim sendo, se conclui que o referido requerimento de aclaração extravasa a finalidade adjectiva atribuída às partes pelos artigos 380º nº 1, al. b) e 425º nº 4 do CPP, pelo que se impõe não dar provimento à pretensão do recorrente.


IV

Termos em que se acorda em indeferir a requerida aclaração do Acórdão deste Tribunal proferido a 27.08.2021.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal.

Feito em Lisboa, neste Tribunal da Relação aos 22 de setembro de 2021


Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 15º-A do Dec-Lei nº 20/2020 de 1 de maio, consigno que o presente Acórdão tem voto de conformidade do Ex.mo Adjunto, Juiz Conselheiro Paulo Ferreira Cunha.

Maria Teresa Féria de Almeida (relatora)

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[1] Código de Processo Civil Anotado, Vol-V, Coimbra­1984, pág. 151 em anotação ao art. 670º do Código de 1939:
[2] Código de Processo Penal Anotado, 199, 10ª Ed., pág. 678, em anotação ao artigo 380º, do CPP.