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ROUBO AGRAVADO
ARMA APARENTE
Sumário
1 - Se o agressor trouxer consigo um instrumento (arma de alarme tipo pistola em tudo idêntica à arma de fogo Glock 19 utilizada pelas forças e serviços de segurança e forças armadas) no momento do roubo ameaçando utilizá-lo como arma contra a vítima, conquanto esta se sinta impossibilitada de, perante a ameaça, reagir contra o ataque aos bens que se encontrem na sua disponibilidade, a qualificativa da alínea b), do n.º 2 do artigo 210.º estará preenchida. Sob este ponto de vista o instrumento utilizado pelo agressor não carece, assim, de tratar-se de uma arma suscetível de realizar disparos com projéteis.
2 - Para além deste argumento utilizado para interpretar o artigo 210.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e b) do CP, a essa conclusão também se chega se na análise do artigo 204.º, n.º 2 alínea f) do CP atentarmos ao verdadeiro significado das palavras “arma aparente e oculta”, vocábulos já utilizados no artigo 426.º, n.º 1 do CP de 1886 e no artigo 297.º, n.º 2, alínea g) do CP de 198217 A expressão “aparente” significa não só “evidente, manifesto, visível” como o que “parece real ou verdadeiro, mas não o é”, o que é “falso, fictício, fingido” o contrário de “real, verdadeiro”.
3 - O conceito de “arma” não se cinge apenas aos instrumentos expressamente elencados no artigo 2.º, n.º 1 do RJAM. O artigo 4.º do DL 48/95 de 15 de março (Decreto Preambular do Código Penal de 1995) prescreve, ainda, que “para efeito do disposto no Código Penal considera-se arma qualquer instrumento, ainda que de aplicação definida, que seja utilizado como meio de agressão ou possa ser utilizado para tal fim”. O conceito de “arma” previsto no artigo 204.º, n.º 2, alínea f) do CP engloba assim tanto a arma verdadeira ou real (arma de fogo municiada), como a arma classificada como tal pelo legislador (elencadas no artigo 2.º, n.º 1 do RJAM), bem como o objeto suscetível de ser utilizado como instrumento de agressão contra o corpo de alguém (artigo 4.º do DL 48/95 de 15 de março), seja uma arma visível, no sentido de ter sido exibida pelo agressor e visionada pela vítima, ou uma arma oculta (escondida).
4 - A razão da qualificação do crime de roubo (alínea b), n.º 2 do artigo 210.º do CP), com a consequente agravação da moldura penal abstrata, assenta que, em todas as situações descritas, a utilização da “arma” potencia uma menor defesa para a pessoa detentora do bem patrimonial de que o agente do crime se pretende apropriar.
Texto Integral
Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
I. RELATÓRIO
1. Da decisão
No Inquérito n.º 1323/20.8GBABF do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo de Instrução Criminal de Portimão - Juiz 1, submetido a primeiro interrogatório de arguido detido foi Ruben Filipe Sousa dos Santos, nos termos conjugados dos artigos 191.º, n.º 1, 192.º, n.º 1, 193.º, n.º 1, 195.º, 196.º, 198.º, n.º 1, 200.º, n.º 1, alíneas a) e b) e n.º 3 e 204.º, alíneas a) e c) todos do CPP, sujeito ao cumprimento das seguintes medidas de coação:
a) TIR já prestado;
b) Obrigação de se apresentar todas as segundas, quartas e sábados no posto da GNR de S. B. Messines;
c) Proibido de se ausentar do distrito de Faro e do território nacional.
2. Do recurso 2.1. Das conclusões do Ministério Público
Inconformado com a decisão o MP interpôs recurso extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões (transcrição): “I. Nos presentes autos considerou-se fortemente indiciados os factos elencados no requerimento de apresentação a primeiro interrogatório judicial de arguido detido. II. Além disso, deram-se por verificados o perigo de continuação da atividade criminosa e o perigo de fuga, nos termos do artigo 204.º, alíneas a) e c), do Código de Processo Penal. III. Não se concorda com a qualificação jurídica dada aos factos fortemente indiciados, no que aos crimes de roubo respeita, porquanto, entendemos que os mesmos são agravados nos termos das disposições conjugadas dos artigos 210.º nº 1 e n.º 2 alínea b), do Código Penal, por referência ao artigo 204.º n.º 2 al. f) do mesmo diploma legal. IV. O Meritíssimo Juiz de Instrução desqualificou os quatro crimes de roubo, considerando que a utilização de arma de alarme não se subsume à qualificativa da alínea f) do n.º 2, do artigo 204.º, do Código Penal. V. O crime de roubo é um crime complexo, de natureza mista, o qual contém um crime contra a liberdade e um crime contra o património, em que os valores jurídicos em apreço são de ordem patrimonial – direito de propriedade e de detenção de coisas móveis e, sobretudo, de ordem eminentemente pessoal – direito à liberdade individual e decisão e ação, à própria liberdade de movimentos, à segurança, à saúde, à integridade física e mesmo à própria vida alheia, tal como tratados na jurisprudência e doutrina na motivação indicados. VI. A este propósito a jurisprudência não tem sido unanime, tendo-se formado, essencialmente, duas correntes. VII. Uma das correntes, tida por objetiva, radica no perigo objetivo que a utilização da arma pode provocar, em conformidade com a jurisprudência indicada na motivação. VIII. Para outra corrente, tida como de ordem subjetiva, a verificação da agravante constante da alínea f) do n.º 2 do artigo 204.º do Código Penal, basta-se com a virtualidade de o homem médio pensar que o agente da infração está na posse de uma verdadeira arma, causando-lhe um justo receito de poder vir a ser atingido e lesado corporalmente. IX. É nosso entendimento que, considerando os bens jurídicos objeto de proteção com a incriminação do crime de roubo, concretamente, a liberdade individual e decisão e ação e a própria liberdade de movimentos, a utilização de uma arma, acentua em cêntuplo a ilicitude. X. É inegável que a liberdade de ação de uma vítima de roubo fica totalmente comprometida, perante um agente que lhe aponta uma arma, independentemente de a mesma se encontrar em estado de poder ser disparada, de ser uma arma de alarme ou até mesmo não estar municiada. XI. Os bens jurídicos pessoais e que são protegidos pelo tipo-ilícito do roubo sofrem um ataque de tal intensidade que claramente não encontram respaldo na moldura penal do crime de roubo simples, nos termos do artigo 210.º, n.º 1 do Código Penal. XII. Por conseguinte, é nosso entendimento que tal norma (artigo 204.º, n.º 2, alínea f), do Código penal) quando aplicada ao crime de roubo não poderá deixar de ter em conta os bens jurídicos protegidos com esta incriminação. XIII. Id est, quando na prática de um crime de roubo é utilizada uma arma, independentemente de a mesma se encontrar em estado de poder ser disparada, de ser uma arma de alarme ou até mesmo não estando municiada, os bens jurídicos pessoais e que são protegidos pelo tipo-ilícito sofrem de um ataque de tal intensidade que claramente têm que se subsumir numa moldura penal compatível com aquele crescente de ilicitude. XIV. O que é exigível é que a arma utilizada, in casu, a arma de alarme com munições de salva, tenha a clara aparência de uma arma de fogo. XV. No sentido por nós propugnado, vide o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 17.09.2013, no Processo n.º 264/12.7JAFAR.E1, relatado pelo Exmo. Desembargador Carlos Berguete Coelho, o qual refere: “Incorre na prática de um crime de roubo agravado, p. e p. pelo artigo 210.º, n. º1 e 2, al. b), com referência ao artigo 204.º, n. º2, al. f), do Código Penal, aquele que, faz uso de pistola de alarme para consumação da apropriação de bens alheios. No caso em apreço nos autos, verificam-se os elementos do crime de roubo agravado, nos termos do artigo 210.º n.º 2 al. b), do Código Penal, por referência à alínea f) do n.º 2 do art.º 204.º do CP já que o em todas as ocasiões o arguido usou uma pistola de alarme/salva”. XVI. Cabe ainda referir que, presentemente, não se coloca a questão de uma arma de alarme com munições de salva, ser ou não ser considerada arma. XVII. A Lei n.º 5/2006 de 23 de fevereiro, atualmente, qualifica expressamente como arma a que seja de alarme/salva integrando-a na classe A, quando possa ser convertida em arma de fogo e na classe G quando não possa ser convertida em arma de fogo, de harmonia com as disposições dos artigos 2.º, n.º 1, alínea e); 3.º, nº 2, alínea n) e n.º 8, alínea g), do mencionado diploma legal. XVIII. Salvo devido respeito, entendemos que a agravação não se prende exclusivamente com o perigo efetivo resultante de uma arma de fogo, enquanto objeto de agressão. XIX. Seguindo os critérios da jurisprudência e da doutrina expostos na motivação, concluímos que os factos fortemente indiciados a que se reportam os crimes de roubo se subsumem ao ilícito de roubo agravado, nos termos conjugados das previsões normativas dos artigos 210.º, n.º 1 e n.º 2 alínea b) com referência á alínea f) do n.º 2 do artigo 204.º, ambos do Código Penal. XX. As medidas de coação impõem uma limitação da liberdade pessoal e patrimonial do arguido estando, por isso, sujeitas ao princípio da legalidade, adequação, proporcionalidade, em conformidade com o disposto nos artigos 27.º e 28.º, da Constituição da República e 191.º n.º 1 e 193.º n.º 1, ambos do Código de Processo Penal. XXI. Por seu turno, nenhuma medida de coação (à exceção do termo de identidade e residência) pode ser aplicada se, em concreto, não se verificar os perigos previstos no artigo 204.º do Código de Processo Penal. XXII. No presente caso, concluiu o Mm.º Juiz de Instrução, existem fortes indícios da prática pelo arguido Rúben dos Santos, de três crimes de roubo nos termos do artigo 210.º, n.º 1, de um crime de roubo, na forma tentada nos termos do artigo 210.º, n.º 1 e ainda de dois crimes de coação nos termos do artigo 154.º, n.º 1, todos do mesmo diploma legal. XXIII. Ressumbra, igualmente, dos autos a existência de perigos de fuga, continuação da atividade criminosa e perturbação da ordem e tranquilidade públicas, tal qual resulta do texto do despacho proferido na sequência de primeiro interrogatório judicial de arguido detido. XXIV. As medidas de coação aplicadas pelo Mm.º Juiz de Instrução não são adequadas a impedir a concretização dos referidos perigos. XXV. A confissão dos factos por parte do arguido não tem a virtualidade de debelar os perigos existentes. XXVI. Ao invés, a gravidade dos factos e a capacidade de planeamento reveladas pelo arguido deixam transparecer traços da personalidade deste que impedem a de formulação de um juízo de prognose favorável à aplicação de medida de coação não privativa de liberdade. XXVII. A natureza e as circunstâncias em que os crimes foram praticados exigem que se aplique a medida de coação de prisão preventiva, a única suscetível de repor a paz social, sendo de salientar que, os factos foram praticados pelo arguido em coautoria. XXVIII. Por outro lado, atendendo à gravidade e circunstâncias dos crimes que lhe são imputados e respetivas molduras penais, existe a probabilidade séria de ao arguido ser aplicada a pena de prisão. XXIX. Face às considerações acima explanadas, apesar da natureza excecional e subsidiária da prisão privativa, os factos supra descritos, os fortes indícios da prática dos crimes, a gravidade dos mesmos, as condições pessoais do arguido e o preenchimento dos pressupostos previstos para a aplicação de uma medida de coação privativa da liberdade, entende-se que a medida de coação que se mostra mais adequada às apertadas exigências cautelares que o caso requer e proporcional à gravidade dos factos cometidos é a prisão preventiva. XXX. A medida de coação de obrigação de permanência na habitação também não se mostra adequada, considerando as concretas circunstâncias. XXXI. Nestes termos, salvo melhor opinião, ao aplicar a medida de coação de apresentações trissemanais conjugada com a proibição de se ausentar para fora do distrito de faro quer para o estrangeiro, o Mm.º Juiz violou o disposto nos artigos 191.º, 193.º, 195.º, 196.º, 200.º, 201.º, 202.º n.º 1 e 204.º alíneas a) e c), todos do Código de Processo Penal. XXXII. É por demais evidente a precaridade laboral do arguido. XXXIII. Ainda assim, tal circunstância, atendendo que previamente a praticar os crimes setembro de 2020, ter auferido 1200€ tal não o demoveu de continuar a praticar os ilícitos pelos quais vem indiciado. XXXIV. Face aos perigos dados como verificados as medidas de coação aplicadas ao arguido revelam-se inidóneas e não têm a capacidade de impedir a continuação da atividade criminosa nem de impedir que o arguido se furte à ação da justiça. XXXV. As medidas de proibição de se ausentar do distrito de Faro e para o estrangeiro são adequadas apenas a arguidos que ofereçam alguma garantia de que vão autolimitar a sua circulação. XXXVI. Ainda, a medida de coação de apresentações trissemanais no Posto Policial da área de residência do arguido, medida aplicada nos autos, é insuficiente para acautelar os perigos em apreço. XXXVII. O despacho recorrido violou os artigos 210.º, n.º 1 e n.º 2 alínea b) e 204.º, n.º 2, alínea f), ambos do Código Penal e ainda os artigos 193.º; 198.º; 202.º, n.º 1, alíneas a) e b) e 204.º, alíneas a) e c), todos do Código de Processo Penal. XXXVIII. Face ao exposto, deve ser revogado o despacho judicial proferido pelo Mm.º Juiz que desqualificou os crimes de roubo pelos quais o arguido se encontra fortemente indiciado e aplicou ao arguido Rúben Filipe a medida de obrigação de apresentações trissemanais conjugada com a proibição de se ausentar do distrito de Faro e para o estrangeiro e, em consequência, determinar a alteração da qualificação jurídica dos factos suscetíveis de consubstanciar os crimes de roubo, passando estes a serem qualificados nos termos dos artigos 210.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b), com referência à alínea f) do n.º 2 do artigo 204.º, do Código Penal e aplicar a medida de coação de prisão preventiva, nos termos dos artigos 191.º, 193.º, 202.º n.º 1 alíneas a) e b) e 204.º, alíneas a) e c) do Código de Processo Penal.”.
2.2. Do parecer do MP em 2.ª instância
O arguido não apresentou contra-alegações e na Relação o Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de ser julgada a procedência total do recurso interposto pelo Ministério Público.
2.3. Da tramitação subsequente
Foi observado o disposto no n.º 2 do artigo 417.º do CPP.
Efetuado o exame preliminar e colhidos os vistos teve lugar a conferência.
Cumpre apreciar e decidir.
II. FUNDAMENTAÇÃO 1. Objeto do recurso
De acordo com o disposto no artigo 412.º do CPP e atenta a Jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19/10/95, publicado no DR I-A de 28/12/95 o objeto do recurso define-se pelas conclusões apresentadas pelo recorrente na respetiva motivação, sem prejuízo de serem apreciadas as questões de conhecimento oficioso.
2. Questões a examinar
Analisadas as conclusões de recurso as questões a conhecer são as seguintes: 2.1. Se deve ser revogado o despacho judicial que desqualificou os crimes de roubo e aplicou a medida de obrigação de apresentações trissemanais conjugada com a proibição de o arguido se ausentar do distrito de Faro e para o estrangeiro; 2.2. Se deve ser determinada a alteração da qualificação jurídica dos factos suscetíveis de consubstanciarem os crimes de roubo, passando estes a serem qualificados nos termos dos artigos 210.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b), com referência à alínea f) do n.º 2 do artigo 204.º do CP e aplicar a medida de coação de prisão preventiva, nos termos dos artigos 191.º, 193.º, 202.º, n.º 1, alíneas a) e b) e 204.º, alíneas a) e c) do CPP. 3. Apreciação 3.1. Da decisão recorrida
Definidas as questões a tratar, importa considerar o decidido pela instância recorrida. 3.1.1. Factos fortemente indiciados na 1.ª Instância
O Meritíssimo Juiz de Instrução Criminal considerou fortemente indiciados os seguintes factos (transcrição): “Factos (…) concretamente imputados, incluindo, sempre que forem conhecidas, das circunstâncias de tempo, lugar e modo: (NUIPC 1323/20.8GBABF) 1.º No dia 9 de agosto de 2020, pelas 23 horas e 40 minutos, o arguido Rúben Filipe Sousa dos Santos, acompanhado por um outro indivíduo cuja identidade ainda não se logrou apurar, deslocaram-se apeados ao posto de abastecimento de combustíveis denominado “Abel Carrasquinho & Filhos”, explorado pela sociedade comercial denominada “Carrasquinho & Filhos, Lda.”, sito na Estrada Municipal 526, Vale de Parra, em Albufeira, tendo saltado o muro que delimita o estabelecimento para aceder ao mesmo, com o propósito de se apoderarem de quaisquer quantias em numerário ou bens que lhes interessassem e se encontrassem no interior do mencionado estabelecimento. 2.º Cientes de que o estabelecimento iria encerrar pelas 24 horas e que apenas se encontrava um funcionário no seu interior a trabalhar, logo que a funcionária Sandra Cavaco apagou as luzes da vitrina, o arguido Rúben dos Santos e um outro indivíduo cuja identidade ainda não se logrou apurar, entraram no mencionado estabelecimento. 3.º Para tanto, o arguido Rúben dos Santos havia-se previamente munido de uma arma que aparentava ser uma pistola Glock 19. 4.º O arguido Rúben dos Santos que usava luvas, máscara cirúrgica a cobrir-lhe a cara e uma camisola com um capuz que utilizou para lhe cobrir a cabeça, aproximou-se da funcionária Sandra Cavaco, e empunhando a mencionada arma encostou-a ao corpo desta, tendo em simultâneo dito: “põe as mãos na cabeça e vai para a caixa”. 5.º Quando a funcionária Sandra Cavaco abriu a caixa registadora, o outro indivíduo cuja identidade ainda não se logrou apurar, retirou a totalidade das notas e moedas que se encontravam no interior da caixa, bem como uma caixa de plástico contendo moedas que aí também se encontrava, tendo colocado tudo dentro de um saco com a inscrição “JD” do qual se encontrava munido, apropriando-se assim de um total de 288,98€ (duzentos e oitenta e oito euros e noventa e oito cêntimos) em numerário. 6.º Concomitantemente o arguido Rúben dos Santos apercebeu-se de que a bolsa da funcionária Sandra Cavaco encontrava-se pousada numa cadeira ali ao lado e, do interior da mesma, retirou uma carteira em pele de cor castanha contendo documentos pessoais, cheques em nome pessoal, cartões bancários e 20€ (vinte euros) em numerário, dos quais se apropriou. 7.º Na posse do conteúdo da caixa registadora e da carteira da ofendida Sandra Cavaco o arguido Rúben Santos e o indivíduo não identificado colocaram-se em fuga, fazendo seus os mencionados objetos e dinheiro. 8.º Com a sua atuação, o arguido Rúben Santos, perturbou de modo sério Sandra Cavaco no seu sentimento de segurança de tal forma que esta ficou intimidada, sendo certo que tal conduta era idónea a forçar a mesma a entregar-lhe o dinheiro que se encontrava na caixa do referido posto de abastecimento e os seus bens. (NUIPC 1324/20.6GBABF) 9.º Após, a ocorrência dos factos acima descritos, já no dia 10 de agosto de 2020, cerca das 00 horas e 30 minutos, o arguido Rúben dos Santos, acompanhado por um outro indivíduo cuja identidade ainda não se logrou apurar, deslocaram-se ao estabelecimento “Pastelaria Colibri II”, sita na Urbanização do Monte, n.º 1 Vale Rabelho, em Albufeira, com o propósito de se apoderarem de quaisquer quantias em numerário ou bens que lhes interessassem no interior do mencionado estabelecimento. 10º Para tanto, o arguido Rúben dos Santos havia-se previamente munido de uma arma que aparentava ser uma pistola Glock 19. 11.º Aí chegados, quando o funcionário Tiago Lourenço abriu a porta para ir à esplanada, e nesse momento o arguido Rúben dos Santos empunhou a arma que trazia consigo, com a mão direita, apontou-a àquele e disse-lhe várias vezes: “para trás…para trás”, enquanto simultaneamente, puxou a corrediça da arma à retaguarda, tendo nesse momento caído uma munição ao chão. 12.º De seguida, o indivíduo cuja identidade ainda não se logrou apurar e que seguia atrás do arguido Rúben dos Santos, disse: “dá de fuga…dá de fuga”, tendo levado este a procurar a munição que havia caído. 13.º Todavia, como não a encontrou, encetaram ambos a fuga apeados. 14.ºCom a sua atuação, o arguido Rúben Santos, perturbou de modo sério Tiago Lourenço no seu sentimento de segurança de tal forma que este ficou intimidado, sendo certo que tal conduta era idónea a forçar o mesmo a entregar-lhe o dinheiro e bens que se encontrassem no interior do estabelecimento, o que só não logrou concretizar por motivos alheios à sua vontade. (NUIPC 313/20.5JAFAR) 15.º No dia 18 de setembro de 2020, pelas 21 horas e 27 minutos, o arguido Rúben dos Santos acompanhado por um indivíduo cuja identidade ainda não se logrou apurar, deslocaram-se ao posto de abastecimento de combustível da BP, sito na Estrada Nacional 125, em Boliqueime, Loulé, com o propósito de se apoderarem de quaisquer quantias em numerário ou bens que se encontrassem no interior do referido posto de abastecimento. 16.º Para tanto, o arguido Rúben dos Santos havia-se previamente munido de uma arma que aparentava ser uma pistola de cor preta e de grandes dimensões. 17.º No interior do referido posto de abastecimento, o arguido Rúben dos Santos, empunhando a mencionada arma, apontou-a na direção de José Maria Reis, funcionário, José Machado e Lister Brazão, estes clientes, dizendo-lhes que era um assalto e ordenando a estes dois últimos que se deitassem no chão. 18.º Concomitantemente, o indivíduo cuja identidade ainda não se logrou apurar, dirigiu-se a José Maria Reis e questionou: “O dinheiro, onde está o dinheiro?”, tendo-lhe de seguida ordenado que abrisse a caixa registadora, o que fez, por temer pela sua integridade física e vida, tendo aquele daí retirando todo o dinheiro que aí se encontrava, no valor de 558,86€ (quinhentos e cinquenta e oitos euros e oitenta e seis cêntimos). 19.º De seguida, o arguido Rúben dos Santos dirigindo-se a José Maria dos Reis, questionou-o sobre onde se encontrava o cofre e se o mesmo continha dinheiro no seu interior. 20.º Em ato contínuo, enquanto o arguido Rúben dos Santos permanecia juntos dos dois clientes, o indivíduo cuja identidade ainda não se logrou apurar, impeliu o funcionário José Maria Reis a dirigirem-se ao interior do escritório a fim de que lhe mostrasse quer o cofre quer os cacifos aí existentes, tendo verificado que no seu interior não havia qualquer valor. 21.º Ainda no interior do aludido estabelecimento, o arguido Rúben dos Santos e o indivíduo, cuja identificação ainda não se logrou apurar, apoderaram-se de um garrafão de óleo de lubrificação de motores de 4litros, da marca BP Visco 7000 0W40, no valor 90,15€ (noventa euros e quinze cêntimos) e uma embalagem de doces de fruta da marca Skitteles, a qual continha 14 unidades com o valor de 0,75€ (setenta e cinco cêntimos) cada uma, fazendo-os seus. 22.º De seguida o arguido Rúben dos Santos e o indivíduo, cuja identidade não se logrou apurar, abandonaram o local apeados, fazendo seus, a quantia monetária e os bens acima mencionados. 23.º Com a sua atuação, o arguido Rúben Santos, perturbou de modo sério José Maria Reis, no seu sentimento de segurança de tal forma que este ficou intimidado, sendo certo que tal conduta era idónea a forçar o mesmo a entregar-lhe o dinheiro e bens que se encontrassem no interior do mencionado posto de abastecimento, assim como constrangeu os clientes presentes a não reagirem. (NUIPC 323/20.2JAFAR) 24.º No dia 23 de setembro de 2020, pelas 22 horas, o arguido Rúben dos Santos, acompanhado por um outro indivíduo, cuja identidade ainda não se logrou apurar, deslocaram-se num veículo automóvel de marca Peugeot, modelo 206, de cor verde, ao posto de abastecimento de combustíveis da Cepsa, sito na Estrada Nacional 125, ao Km 73, em Fontainhas, Albufeira, com o propósito de se apoderarem de quaisquer quantias em numerário ou bens que se encontrassem no interior do referido posto de abastecimento. 25.º Para tanto, o arguido Rúben dos Santos havia-se previamente munido de uma arma que aparentava ser uma pistola Glock 19. 26.º O arguido Rúben dos Santos trajava umas calças de cor cinzenta, um casaco preto com capuz, um gorro cinzento colocado na cabeça e calçava uns ténis vermelhos da marca “Adidas” e envergava luvas de trabalho de cor cinzenta. 27.º Aí chegados, saíram ambos do mencionado veículo automóvel, entraram no referido posto de abastecimento, tendo o arguido Rúben dos Santos apontado a arma que empunhava a Carla Ventura, funcionária do posto de abastecimento, forçando esta a baixar-se. 28.º Enquanto, o indivíduo cuja identidade ainda não se logrou apurar e que acompanhava o arguido Rúben dos Santos, retirou da caixa registadora todo o dinheiro que aí se encontrava, no valor total de 120€ (cento e vinte euros), e ainda quatro maços de tabaco da marca “Marlboro” e três da marca “JPS Black”, no valor total de 35,70€ (trinta e cinco euros e setenta cêntimos), que se encontravam numa prateleira. 29.º Concomitantemente o indivíduo cuja identidade ainda não se logrou apurar, apercebeu-se da bolsa da funcionária Carla Ventura e daí retirou a carteira, sintética de cor preta, a qual continha 25€ (vinte e cinco euros) e os seus documentos pessoais, cartão de cidadão, carta de condução, dois cartões bancários do Millenium, sendo um de débito e outro de crédito, um cartão de refeições “Euroticket” e os cartões de cidadão de ambas as filhas, Sara Sofia Ventura Amorim Ribeiro e Diana Marina Ventura Amorim Ribeiro. 30.º Na posse do dinheiro, do tabaco e da carteira da ofendida Carla Ventura, o arguido Rúben dos Santos e o indivíduo, cuja identidade ainda não se logrou apurar, abandonaram o local no mencionado veículo automóvel, fazendo seus os mencionados objetos e dinheiro. 31.º Com a sua atuação, o arguido Rúben Santos, perturbou de modo sério Carla Ventura no seu sentimento de segurança de tal forma que esta ficou intimidada, sendo certo que tal conduta era idónea a forçar a mesma a entregar-lhe o dinheiro que se encontrava na caixa do referido posto de abastecimento, assim como os bens aí existentes e ainda os bens pessoais desta. 32.º No dia 13 de outubro de 2020, o arguido Rúben dos Santos, detinha na sua posse, no interior da sua residência, sita em Casa Maia, Caixa Postal 953-A, Messines de Baixo, São Bartolomeu de Messines uma pistola de alarme, da marca “Gap”, de calibre 9mm – réplica da Glock, com carregador inserido contendo duas munições de alarme, calibre 9mm, uma munição de alarme, calibre 8mm. 33.º Bem sabia o arguido Rúben dos Santos que as quantias monetárias e bens que se encontravam nos referidos estabelecimentos, não lhe pertenciam e que atuava contra a vontade e em prejuízo dos respetivos proprietários. 34.º Agiu em comunhão de esforços, com o propósito concretizado de fazer seus todos os valores e objetos que se encontrassem nos estabelecimentos mencionados em 1.º; 15.º e 24.º, bem sabendo que agia contra a vontade dos ofendidos e dos respetivos proprietários, ciente que a utilização da arma era um meio idóneo para intimidar e constranger quem se encontrasse no seu interior. 35.º Agiu ainda em comunhão de esforços, com o propósito de fazer seus todos os valores e objetos que se encontrassem no estabelecimento mencionado em 9.º, bem sabendo que agia contra a vontade dos ofendidos e que a utilização da arma era um meio idóneo para intimidar e constranger quem se encontrasse no seu interior, o que só não logrou concretizar por motivos alheios à sua vontade. 36.º Agiu ainda em comunhão de esforços, com o propósito concretizado de constranger os clientes, José Machado e Lister Brazão, que se encontravam no interior do estabelecimento mencionado em 15.º, a não reagirem e a tolerarem a sua atuação, por forma a conseguir apoderar-se dos valores e bens pertencentes a este estabelecimento. 37.º O arguido Rúben agiu sempre, de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que todas as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal, e, ainda assim, não se coibiu de as praticar.”.
3.1.2. Dos elementos que fundamentaram a convicção pelo TIC
O Tribunal a quo fundamentou a convicção quanto à factualidade fortemente indiciada pela seguinte forma: “4 – Elementos do processo que indiciam os factos imputados: NUIPC 1323/20.8GBABF:
- Relatório de diligências iniciais, fls. 4 a 9;
- Print da BD do registo civil, fls. 10;
- Fotografia de fls. 12;
- Termo de juntada de 10.08.2020, fls. 13 e 14;
- Auto de reconhecimento fotográfico, fls. 24;
- Relatório de exame pericial de fls. 34 a 44;
- Auto de diligência de 12.08.2020, de fls. 25 e 26;
- Informação da SS de fls. 30;
- Cota de fls. 32;
- Relatório fotográfico de identificação da residência do suspeito Rúben dos Santos, fls. 33;
- Auto de análise e correlação, fls. 46 a 50;
- Relatório fotográfico, fls. 56;
- Auto de inquirição de Sandra Cavaco, fls. 18 a 21;
- Auto de inquirição de Pedro Carrasquinho, legal representante da ofendida “Carrasquinho e Filhos, Lda.”, fls. 27 frente e verso;
- Auto de diligência, fls. 85;
- Auto de busca e apreensão, fls. 92 e 93;
- Auto de busca e apreensão de fls. 104 e 105;
- Reportagem fotográfica de fls. 106 e 107 – referente ao NUIPC – 323/20.2JAFAR;
- Reportagem fotográfica, fls. 94 a 102 – referente todos os NUIPC
- Reportagem fotográfica de fls. 118 a 128 – referente a todos os NUIPC
- Auto de exame direto à arma de fls. 129. NUIPC 1324/20.6GBABF:
- Relatório de diligências iniciais, de fls. 22 a 26;
- Auto de apreensão de fls. 27;
- Auto de exame direto de fls. 28 e 29;
- Fotografia de fls. 32;
- Auto de inquirição de fls. 42 a 44;
- Auto de inquirição de fls. 48 e 49;
- Auto de inquirição de fls. 51 e 52;
- Relatório fotográfico de fls. 60;
- Termo de juntada de fls. 61;
- Relatório de exame de fls. 62 e 63; NUIPC 313/20.5JAFAR
- Relatório de inspeção judiciária de fls. 15 e 16 (frente e verso);
- Auto de inquirição de fls. 17 e 18 (frente e verso);
- Auto de inquirição de fls. 28 e 29 (frente e verso);
- Auto de inquirição de fls. 31 e 32 (frente e verso);
- Relatório de exame de fls. 34 a 48;
- Termo de entrega de fls. 49;
- Auto de inquirição de fls. 50 (frente e verso) e 51;
- Relatório de exame de fls. 55 a 57, 58 e 59; referente aos objetos apreendidos, constantes do auto de busca e apreensão realizadas no inquérito 1323/20.8GBABF;
- Cota/juntada de fls. 57;
- Print’s de fls. 59 e 60. NUIPC 323/20.2JAFAR
- Auto de inquirição de fls. 15 a 17;
- Auto de inquirição de fls. 25 e 26;
- Relatório de exame de fls. 31 a 42;
- Print de seguro de fls. 44;
- Relatório de exame pericial de fls. 46 a 59;
- Auto de diligência de fls. 60 e 61;
- Fotografia de fls. 63;
- Cota de fls. 69 e fotos de fls. 60 a 65, referente a objetos apreendidos no âmbito da busca autorizada no inquérito 1323/20.8GBABF;
- Reportagem fotográfica de fls. 106 e 107, constante no Inquérito 1323/20.8GBABF”.
3.1.3.Da fundamentação da decisão pelo Tribunal recorrido
O Tribunal a quo fundamentou a decisão pela seguinte forma: “O arguido foi tempestivamente presente a juízo pelo que se mostra respeitado o prazo previsto pelo art.º 141.º, n.º1 do C.P.P. Valido as apreensões realizadas na sequencia da busca domiciliária nos termos do art.º 178.º, n.ºs 4 e 6 do C.P.P. O arguido prestou declarações. Nestas declarações o arguido confessou integralmente e sem reservas os factos que lhe eram imputados e que, neste auto acima se discriminam. Essa posição do arguido foi, obviamente, tomada após a comunicação àquele também dos elementos do processo e respetivo conteúdo. Em relação aos efeitos da confissão cumpre fazer sobressair que a mesma, in casu, é elemento muito relevante para fixar o grau de indiciação pressuposto na concreta medida de coação requerida pelo Ministério Público. É certo que os elementos comunicados ao arguido o comprometiam com os factos imputados. Todavia não devemos deixar de considerar que tanto passaria pela concatenação dos mesmos, pelo uso de prova indiciaria, e sempre com algumas margens de possibilidade de erro atentos os elementos objetivos que iriam suportar essas asserções. Acresce, por exemplo, que até este momento não se tinha seguido a prova por reconhecimento presencial o que retira, queira-se ou não, valia ao reconhecimento fotográfico nos termos do art.º 147.º, n.º5 do C.P.P. Há alguma margem de erro emergente dos fotogramas seja por razões de qualidade dos mesmos seja pelas circunstancias de o arguido e o outro individuo se apresentarem com o rosto coberto. Fosse qual fosse o grau de comprometimento que poderia emergir dos elementos probatórios comunicados e, adiante-se, algum advinha, certo é que a confissão do arguido realizada de forma integral e sem reservas constitui meio de conhecimento dos factos alternativo e sem que haja possibilidade para porosidades ou duvidas. Só está em causa, por ora, a sua conduta pois foi apenas ele que veio presente a juízo. Assim, em função das razões expendidas considero que os factos estão fortemente indiciados por força da confissão do arguido. Entendendo que esta leva a uma convicção elevadíssima sobre a condenação do arguido, caso, fosse momento de a tanto proceder, cfr. o Acórdão da Relação de Évora 21.02.2017, Relator António Latas. Quanto ao enquadramento jurídico e, relativamente aos crimes de roubo, discordamos, salvo o devido respeito, da posição do Ministério Público quando sustenta tratar-se do crime de roubo agravado por referência ao art.º 210.º, n.ºs 1 e 2, al b) e art.º 204.º, n.º2, al f), ambos do C.P. A arma apreendida, arma de alarme com munição de salva, idêntica à arma de fogo Glock 19, cfr. auto de exame direto a fls. 129 não tem aptidão, por sua natureza, para consistir, como sucede com as normais armas de fogo, instrumento de agressão, por ser insuscetível de realizar disparos com projeteis. Vale por dizer dela e do seu uso não decorre o normal incremento de perigosidade na direção da outra pessoa, consequência típica das armas de fogo verdadeiras, e por isso dela também não decorre um incremento de confiança de superioridade por banda do agente. Assim, subescrevendo a jurisprudência do Juiz Conselheiro Armindo Monteiro no Acórdão de 27.10.2010 entendo que a réplica aqui em causa, a arma de alarme, não integra o conceito de arma para os efeitos agravativos decorrentes das normas invocadas pelo Ministério Público. Do exposto resulta a degradação das imputações quanto aos crimes de roubo que passam todos eles a integrar a sua forma simples. Donde, em relação ao enquadramento jurídico atribuído aos factos, considero que o arguido está fortemente indiciado com a prática de: - três crimes de roubo p. e p. pelo art.º 210.º, n.º1 do C.P., em coautoria e sob a forma consumada; - um crime de roubo simples p. e p. pelos art.ºs 22.º, n.ºs 1 e 2, al c), 23.º, e 210.º, n.º1 todos do C.P., em coautoria e sob a forma tentada; - dois crimes de coação p. e p. pelo art.º 154.º, n.º1 do C.P., sob a forma consumada. E não lhe foi imputado, não obstante também o ter confessado, o crime de condução não habilitada do automóvel de matricula 51-03-AO a que se alude no inquérito 323/20.2JAFAR, condução que o arguido referiu ter efetuado a partir de sua casa em Messines de Baixo para o posto de combustível assaltado e depois daí de regresso a sua casa. Em relação ao regime coativo e às exigências cautelares, o Ministério Público requereu a aplicação da medida de coação de prisão preventiva aduzindo que ocorre o perigo de continuação da atividade criminosa e, em grau menor, o receio de fuga. A Defesa opôs-se. Para o aludido efeito, ressalvado erro de compreensão nossa, aduziu o Ministério Público a linha temporal dos factos, a circunstancia de estes terem sido praticados quando o arguido estaria a trabalhar e, quanto ao receio de fuga a circunstancia de a mãe do arguido se encontrar no estrangeiro, tendo sob horizonte a gravidade dos factos e suas consequências penais que na sua ótica ocorreriam (os crimes de roubo). Em relação ao receio de fuga concordamos que ocorre e também que não possui elevada intensidade pois, neste momento, o arguido vive em união de facto com Joana Correia, situação que já ocorre há cerca de 10 meses, conforme declarou e é corroborado pelo teor do auto de diligência de fls. 85. A simples circunstancia de o arguido ter a sua mãe em Inglaterra não é aqui muito relevante quando não se sabe se com esta mantem grande relacionamento. É certo, todavia, que o arguido dispõe de outros familiares (a quase totalidade) “espalhados pela linha de Sintra” como referiu aqui se incluindo tios, tias, irmãos e avós. Por outro lado é também na área metropolitana de Lisboa que se encontram os seus três filhos (de 8, 6 e 3 anos de idade respetivamente), que vivem com a mãe tendo sido fixada ao arguido a pensão de alimentos no valor de 260€. Há assim, esta retaguarda de apoio. Mas há também a ponderar quanto ao decréscimo do receio de fuga a posição processual que o arguido hoje tomou. De facto, se pretendesse de antemão eximir-se à ação da justiça poderia não ter prestado declarações ou ter prestado outro tipo de declarações sendo certo que aquelas que prestou só contribuem deste ponto de vista, para a sua autoincriminação. Não dispomos de conhecimentos adivinhatórios para supor ou presumir, in mala partem, que o arguido só confessou com determinada intenção… Em relação ao perigo de continuação da atividade criminosa previsto no art.º 204.º al c) do C.P.P., reconhecemos que algumas asserções do Ministério Público são pertinentes. Os factos praticados ocorreram nos meses de Agosto e Setembro do corrente ano. Segundo declarações do arguido no mês de Agosto teria feito um reforço na empresa de transportes e essa sua ocupação apenas durou esse mês. Daí para a frente não teria trabalhado o que apenas se terá verificado, a ser verdade o que disse, há cerca de duas semanas a esta parte encontrando-se a prestar trabalho na construção civil por conta de um cidadão que denominou por Luís, mas sem que disponha de contrato de trabalho, sendo a remuneração acordada no valor de 1000 mensais. É notória a precariedade da situação laboral do arguido mesmo a ser verdade que esteja presentemente a trabalhar e não podemos dizer que não está porque elemento algum recolhido nos autos e oferecido pelo MP a esse respeito existe. E por certo não seria difícil verificar, após o conhecimento da sua residência, qual seria a atividade do arguido, ou seja, se afinal sempre estaria nas obras (por ultimo na remodelação do apartamento aqui em Portimão) ou se, pelo contrário, não estaria a fazer nada. Porém, nisto tem o Ministério Público razão, haverá que levar em linha de conta, que os crimes de roubo imputados ao arguido propiciam, a quem os leva a cabo, dinheiro e outros bens moveis de fácil conversão ou troca. Aliás, o próprio arguido referiu que gastou a parte dos proventos que lhe cabia precisamente em comida e na ajuda no pagamento dos gastos domésticos. O que significa, pelo menos enquanto se mantiver a situação de precariedade do arguido, sendo certo que se começou a trabalhar há duas semanas e ainda nem sequer recebeu o primeiro mês do vencimento possa ser expectável, a nada ser feito, que repita factos da mesma natureza o que concretiza a referida exigência cautelar. Se há despesas a satisfazer de vária ordem e se não há fontes de rendimentos certos e periódicos, fontes licitas, e se de outro lado o crime de roubo faculta, como referido, dinheiro e outros bens de fácil troca, então caso nada se faça é provável que o arguido possa praticar factos da mesma natureza. Ressalvado o devido respeito por posição contrária entendo que as exigências cautelares em causa e com a intensidade com que se manifestam não suportam, in casu, a medida de coação de prisão preventiva por existir quadro alternativo que julgamos bastante para valer à satisfação daquelas, cfr. art.º 193.º, n.ºs 1 a 3 do C.P.P. Não se desconhece que essa medida é apta a impedir seja a concretização da fuga seja a concretização da prática de novos factos da mesma natureza, isto atento o seu modo de execução. Todavia não cremos que seja intenso o receio de fuga ou muito elevado o perigo de continuação da atividade criminosa, pelo menos de modo a podermos concluir, neste preciso momento, que a tais exigências cautelares só possa valer a aplicação da referida medida de coação. É necessário manter o paradeiro do arguido sob controlo como será necessário impedi-lo de voltar aos mesmos trilhos. Para tanto não se afigura nem necessária nem proporcional a prisão preventiva. Desta feita, para valer às referidas exigências cautelares determina-se o seguinte regime coativo: Apresentações periódicas trissemanais que, de um passo, permitem o controlo do paradeiro do arguido e, de outro, por consistirem em contacto com a instancia formal de controlo acarretam também por constituir um mecanismo inibitório de repetição de comportamentos; Proibição de se ausentar para o estrangeiro, satisfaz a preocupação do ministério Público; Proibição de se ausentar do distrito de Faro compatibiliza as exigências cautelares com os direitos fundamentais aqui em causa. Pelo exposto e nos termos conjugados dos art.º 191.º, n.º1, 192.º, n.º1, 193.º, n.º1, 195.º, 196.º, 198.º, n.º1, 200.º, n.º1, als a) e b) e n.º3, e 204.º, als a) e c) todos do C.P.P. ficará o arguido sujeito ao cumprimento das seguintes medidas de coação: a) Ao cumprimento das obrigações decorrentes do TIR já prestado; b) Obrigação de se apresentar todas as segundas, quartas e sábados no posto da GNR de S. B. Messines; c) Proibido de se ausentar do distrito de Faro e do território nacional. Comunique para efeitos de fiscalização. Comunique aos serviços aeroportuários para os termos do n.º3 do art.º 200.º do C.P.P. Consigne que vou advertir o arguido para os termos do art.º 203.º do C.P.P. Restitua o arguido à liberdade.”.
3.2. Da apreciação do recurso interposto pelo Ministério Público
O MP interpôs recurso da decisão instrutória propugnando pela aplicação da medida de prisão preventiva, por entender não deverem ser desqualificados os crimes de roubo e ocorrer perigo de fuga e de continuação da atividade criminosa.
Apreciemos então as questões suscitadas e já assinaladas em II. 2. deste Acórdão.
3.2.1. (Des)qualificação do crime de roubo O Meritíssimo Juiz de Instrução entendeu deverem os crimes de roubo, pelos quais o arguido foi acusado, serem desqualificados. Para o efeito sustentou a tese de que a arma empossada pelo arguido não tinha aptidão para ser utilizada como instrumento de agressão por ser insuscetível de realizar disparos com projéteis. Para o Tribunal a quo o uso do instrumento apreendido não tinha a virtualidade de incrementar a perigosidade na direção de outra pessoa (consequência típica das armas de fogo verdadeiras). Por isso do uso daquele instrumento também não decorria um incremento na confiança de superioridade por parte do agente.
Para sustentar a sua posição referiu subscrever a jurisprudência preconizada pelo STJ num Acórdão relatado pelo Conselheiro Armindo Monteiro[1], defendendo não integrar a arma de alarme o conceito de arma para efeitos agravativos decorrentes das normas invocadas pelo MP.
A questão colocada tem dado lugar a divergências de opinião em vários acórdãos dos tribunais superiores.
Discute-se se o relevante é a arma, como instrumento do crime, revestir objetivamente perigosidade, ou seja, suscetibilidade de ser efetivamente utilizada como meio de agressão[2], ou se basta subjetivamente ser suscetível de intimidar a pessoa roubada[3].
Analisemos, então, os normativos que regem esta matéria no Código Penal, para compreendermos o alcance da discordância existente na jurisprudência.
O artigo 210.º do CP, sob a epígrafe “Roubo”, estabelece que: “1 - Quem, com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa, subtrair, ou constranger a que lhe seja entregue, coisa móvel ou animal alheios, por meio de violência contra uma pessoa, de ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física, ou pondo-a na impossibilidade de resistir, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos. 2 - A pena é a de prisão de 3 a 15 anos se: a) Qualquer dos agentes produzir perigo para a vida da vítima ou lhe infligir, pelo menos por negligência, ofensa à integridade física grave; ou b) Se verificarem, singular ou cumulativamente, quaisquer requisitos referidos nos n.os 1 e 2 do artigo 204.º, sendo correspondentemente aplicável o disposto no n.º 4 do mesmo artigo. (…)”.
Por outro lado, o artigo 204.º, n.º 2, alínea f) do CP, sob a epígrafe “Furto qualificado” dispõe que: “2 - Quem furtar coisa móvel ou animal alheios: f) Trazendo, no momento do crime, arma aparente ou oculta (…) é punido com pena de prisão de dois a oito anos.”.
Para o Tribunal a quo a utilização por parte do arguido, durante os roubos, de uma arma de alarme tipo pistola em tudo idêntica à arma de fogo Glock 19 utilizada pelas forças e serviços de segurança e forças armadas, não integraria o conceito de “arma” do artigo 201.º, n.º 2, alínea b) e 204.º, n.º 2, alínea f), encontrando-se o arguido tão só indiciado da prática de crimes de roubo simples (artigo 210.º, n.º 1 do CP), punível com uma pena de prisão de 1 a 8 anos.
Na perspetiva do MP, por seu turno, o referido instrumento integra o conceito da alínea f) do n.º 2 do artigo 204.º e consequentemente os roubos fortemente indiciados seriam puníveis pelo n.º 2 alínea b), com uma pena de 3 a 15 anos de prisão.
Parece-nos evidente, desde logo, não resultar diretamente do emprego de uma arma de alarme perigo para a vida ou integridade física da vítima.
Assim, a afirmação avançada pelo Meritíssimo Juiz de instrução criminal no sentido de que “o uso do instrumento apreendido não tem a virtualidade de incrementar a perigosidade na direção de outra pessoa” é correta.
Cumpre, contudo, assinalar que o artigo 210.º, n.º 2 prevê nas alíneas a) e b) hipóteses diferenciadas de agravamento do roubo.
Na alínea a) exige-se expressamente que o agente com a sua atuação produza efetivamente perigo para a vida da vítima ou lhe cause ofensa à integridade física grave (“Qualquer dos agentes produzir perigo para a vida da vítima ou lhe infligir, pelo menos por negligência, ofensa à integridade física grave”).
Já na alínea b) a qualificativa basta-se com “a ameaça de um perigo iminente para a vida ou para a integridade física” ou que a ameaça ponha “a vítima na impossibilidade de resistir” (cf. n.º 1 do artigo) por se “verificarem, singular ou cumulativamente, quaisquer requisitos referidos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 204.º” (cf. n.º 2, alínea b)).
Parece, assim, lógico que se o agressor trouxer consigo um instrumento no momento do roubo ameaçando utilizá-lo como arma contra a vítima, conquanto esta se sinta impossibilitada de, perante a ameaça, reagir contra o ataque aos bens que se encontrem na sua disponibilidade, a qualificativa da alínea b), do n.º 2 do artigo 210.º estará preenchida. Sob este ponto de vista o instrumento utilizado pelo agressor não carece, assim, de tratar-se de uma arma de fogo “verdadeira”, como defendido pelo Tribunal a quo.
Para além deste argumento utilizado para interpretar o artigo 210.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e b) do CP, a essa conclusão também se chega se na análise do artigo 204.º, n.º 2 alínea f) do CP atentarmos ao verdadeiro significado das palavras “arma aparente e oculta”, vocábulos já utilizados no artigo 426.º, n.º 1 do CP de 1886 e no artigo 297.º, n.º 2, alínea g) do CP de 1982.
A expressão “aparente” significa não só “evidente, manifesto, visível” como o que “parece real ou verdadeiro, mas não o é”, o que é “falso, fictício, fingido” o contrário de “real, verdadeiro”[4].
A arma “aparente” é aquela que é exibida perante a vista do ofendido, ou seja, é visível, por contraposição à arma “oculta” (escondida)[5]. Arma aparente, contudo, é também, de acordo com o seu significado etimológico, o que parece real, mas não é.
Acresce, ainda, existir um terceiro argumento que sustenta a tese defendida pelo recorrente.
É o próprio legislador que elenca a “arma de alarme, gás e sinalização”, utilizada pelo arguido, como arma no artigo 2.º, n.º 1 da Lei 5/2006 de 23.2 (Regime Jurídico das Armas e Munições).
Aliás, no conceito de arma o legislador, no artigo 2.º, n.º 1 do RJAM, inclui instrumentos tais como a “arma brinquedo” (alínea aan)), o “aerossol de defesa” (alínea a)), o “arco” (alínea b)), a “arma biológica” (alínea l)), a “arma branca” (alínea m)) a “arma elétrica” (alínea o)), o “marcador de paintball” (alínea ah)), o “bastão elétrico” (alínea am)), o “bastão extensível” (alínea an)), a “faca de arremesso” (alínea au)), a “reprodução de arma de fogo” (alínea aac)) e obviamente, entre inúmeras outras, a “arma de fogo” (alínea p)).
O conceito de “arma”, contudo não se cinge apenas aos instrumentos expressamente elencados no artigo 2.º, n.º 1 do RJAM.
O artigo 4.º do DL 48/95 de 15 de março (Decreto Preambular do Código Penal de 1995) prescreve, ainda, que “para efeito do disposto no Código Penal considera-se arma qualquer instrumento, ainda que de aplicação definida, que seja utilizado como meio de agressão ou possa ser utilizado para tal fim”.
Dentro deste conceito de arma estarão incluídas as situações em que o agente do roubo ameaça a vítima com um instrumento, que apesar de não ser classificado como arma pela legislação em vigor, possa ser utilizado como objeto de agressão, apesar de ter outra função de uso.
Assim, uma seringa usada para aplicar vacinas poderá constituir-se como um objeto de agressão se estiver infetada com HIV, tal como um martelo usualmente empregue para pregar, um taco para jogar basebol, um canivete para cortar fruta, etc.
O conceito de “arma” previsto no artigo 204.º, n.º 2, alínea f) do CP engloba assim tanto a arma verdadeira ou real (arma de fogo municiada), como a arma classificada como tal pelo legislador (elencadas no artigo 2.º, n.º 1 do RJAM), bem como o objeto suscetível de ser utilizado como instrumento de agressão contra o corpo de alguém (artigo 4.º do DL 48/95 de 15 de março), seja uma arma visível, no sentido de ter sido exibida pelo agressor e visionada pela vítima, ou uma arma oculta (escondida).
A razão da qualificação do crime de roubo (alínea b), n.º 2 do artigo 210.º do CP), com a consequente agravação da moldura penal abstrata, assenta que, em todas as situações descritas, a utilização da “arma” potencia uma menor defesa para a pessoa detentora do bem patrimonial de que o agente do crime se pretende apropriar.
Nas palavras de Pinto de Albuquerque[6] o agravamento do roubo tem a sua justificação “no impacto intimidativo (na “impressão”) causado pela arma na vítima (…)” o “porte da arma (… ) agrava o ilícito do crime quando sirva para diminuir ou ultrapassar a oposição da vítima”.
Quando o agressor “traz uma arma aparente ou oculta” procura criar, através dela, menor resistência por parte da vítima à apropriação do bem do qual se pretende apoderar, pois limita de forma mais agravada (em comparação com a prevista no n.º 1 do artigo 410.º do CP), com a sua atuação, a liberdade da pessoa detentora do bem, de resistir à apropriação ilícita.
Também Faria e Costa em anotação ao artigo 204.º, n.º 2, alínea f) do CP[7] refere como característica essencial da arma a capacidade de esta provocar na pessoa ameaçada medo ou justo receio de poder vir a ser lesada no corpo ou na vida através do seu uso.
Para o mesmo autor, se com o instrumento utilizado ocorre um “acréscimo de fragilidade na defesa” da vítima do roubo a qualificativa da alínea f) do n.º 2 do artigo 204.º encontra-se preenchida[8].
Ainda por outras palavras se a pessoa roubada perante a ameaça desencadeada “pela perceção de um objeto (…) tido, pelo comum e normal dos cidadãos, como um instrumento capaz de ferir ou de matar” este constitui uma arma para efeitos do citado artigo e passa a ser punível como roubo qualificado (n.º 2, alínea b) do artigo 210.º do CP) ao invés de roubo simples (n.º 1 do artigo 210.º do CP).
No caso em apreciação, para além de a arma de alarme ser classificada pelo próprio legislador como “arma”, o arguido serviu-se dela para intimidar os diretamente visados pelos roubos, através da sua exibição, chegando-a a apontá-la e a encostá-la ao corpo, das vítimas, causando-lhes medo.
A encenação montada pelo arguido (suspeito acompanhado de outro indivíduo, ambos encapuçados, envergando máscaras e luvas, empunhando uma arma) pareceu manifestamente credível àquelas vítimas, como sucederia com qualquer homem médio colocado nas mesmas condições em concreto, pois o efeito intimidatório consumou-se[9].
Daí os crimes de roubo fortemente indiciados, ao contrário do sustentado pelo despacho recorrido, deverem ser qualificados, dadas as disposições conjugadas dos artigos 210.º, n.ºs 1 e 2 do CP, por referência ao artigo 204.º, n.º 2, alínea f) do CP e do artigo 2.º, n.º 1, alínea aae) do RJAM.
3.2.2.Do perigo de fuga e de continuação da atividade criminosa por parte do arguido
O despacho recorrido, considerou fortes os indícios quanto ao arguido ter cometido os crimes de que vinha acusado. Julgou, depois, existir uma elevadíssima convicção sobre a possibilidade da sua condenação em julgamento. Deu, ainda, elevada relevância à confissão do arguido, perante todas as provas já colhidas, quando tal não seria admissível em geral, para a confissão realizada, face ao disposto no artigo 344.º, n.º 3, alínea do CPP e em especial, por haver outro coarguido que ainda não havia sido ouvido e a pena aplicável ao crime dever ser considerada superior a cinco anos de prisão.
Os crimes de que o arguido vem fortemente indiciado devem ser considerados graves, atenta a circunstância de se manterem como crimes qualificados, alguns deles nos termos atrás expostos. Por outro lado, a continuação da atividade criminosa apenas foi sustada com a sua detenção em 13.10.2020 depois de ter cometido crimes em 9 e 10 de agosto 18 e 23 de setembro, período durante o qual o arguido manteve sempre precariedade laboral, como é referido no despacho impugnado.
Os assaltos verificados a partir das 21:00 horas, com espaço de intervalo entre os dois primeiros em agosto e dois outros em setembro (embora um dos roubos na forma tentada) e a forma como se chegou à identificação do arguido e só a partir daí ter sido possível travar os vários roubos realizados em postos de venda de combustível e estabelecimentos comerciais abertos ao público e a capacidade de planeamento reveladas pelo arguido denotam uma especial perigosidade do arguido e do seu comparsa, o que de forma alguma lhe confere um prognóstico favorável no sentido de não voltar a cometer novos delitos criminais e de lhe ser aplicada uma medida de coação não privativa de liberdade.
A medida de coação de obrigação de permanência na habitação também não se mostra adequada, considerando as concretas circunstâncias.
As medidas de coação impostas ao arguido, atenta a gravidade dos crimes cometidos, a sua precariedade laboral, a forte probabilidade de vir a ser condenado pelos crimes, impõem dever ser aplicada a medida de prisão preventiva, dado o perigo de continuação da sua atividade criminosa, nos termos aplicáveis dos artigos 191.º, 193.º, 195.º, 196.º, 200.º, 201.º, 202.º, n.º 1 e 204º alíneas a) e c) do CPP.
Termos em que se revoga o despacho recorrido e se aplica a medida coativa de prisão preventiva por estarem em causa três crimes de roubo qualificados nos termos dos artigos 210.º, n.ºs 1 e 2 alínea b) com referência ao n.º 2 alínea f) artigo 204.º do CP e aos artigos 191.º, 193.º, 202.º, n.º 1 alíneas a) e c) do CPP, puníveis cada um com pena de prisão de 3 a 15 anos e ainda outro crime de roubo qualificado na forma tentada e dois crimes de coação.
III. DECISÃO
Nestes termos e com os fundamentos expostos:
1. Dá-se provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e em consequência, revogam-se as medidas cautelares impostas, que são substituídas pela medida coativa de prisão preventiva, nos termos atrás explicitados, à exceção do TIR que se mantém.
2. Sem custas.
Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 94.º, n.º 2 do CPP consigna-se que o presente Acórdão foi elaborado e revisto pela relatora; tem voto de conformidade por parte do Exmo. Desembargador Adjunto, Dr.º João Martinho de Sousa Cardoso, atento o atual estado de pandemia da Covid-19.
Évora, 23 de março de 2021.
[1] Acórdão STJ de 27.10.2010 relatado por Armindo Monteiro no processo referente a um roubo com utilização por parte do agressor de uma réplica de uma arma de fogo (revólver).
[2] No sentido apontado podem consultar-se por exemplo os seguintes Acórdãos: Ac. RE de 21.6.2011, proferido no P. 1161/10.6PCSTB.E1, relatado por Sénio Alves (relativo a roubo perpetrado com uma arma de plástico ou brinquedo a imitar uma arma de fogo); Ac. STJ de 27.10.2010, proferido no P. 1546/09.0PCSNT.L1.S1 e relatado por Armindo Monteiro (roubo perpetrado com réplica de uma arma de fogo);
[3] Defendendo esta tese podem citar-se entre outros: o Acórdão da RC de 26.9.2012, proferido no processo 244/11.0JALRA e relatado por Maria Pilar (relativo a arma de alarme); Ac. RE de 5.6.2012, proferido no P. 409/11.4PAENT.E1, relatado por João Amaro (revólver de fulminantes); Ac. RE de 17.9.2013, proferido no P. 264/12 e relatado por Carlos Berguette (pistola de alarme).
[4] Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea: A-F. Vol. I. Academia das Ciências. Verbo. P. 284. ISBN 972-22-2046-2.
[5] Assim, se o agressor, por exemplo, aponta uma pistola ao peito da vítima exigindo-lhe a entrega de dinheiro estaremos perante um caso de roubo com “arma aparente”. Já se o arguido encosta uma pistola envolvida num pano ao peito do ofendido estaremos perante uma situação de “arma oculta”.
[6] ALBUQUERQUE, Paulo Pinto – “Comentário do Código Penal: À Luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem”. 3.ª edição atualizada. Universidade Católica Editora. P. 806. ISBN 978-972-54-0489-8.
[7] DIAS, Jorge Figueiredo (direção) – “Comentário Conimbricense do Código Penal: Parte Especial: artigos 200.º a 307.º. Tomo II. Coimbra Editora. 1999. P. 81. ISBN 972-32-0853-5.
[8] Ob. cit. P. 81
[9] Na ob. cit a p. 806 Paulo Pinto de Albuquerque entende, tal como nós, que mesmo quando o agente usa uma pistola de plástico como se fosse verdadeira ou uma pistola descarregada, como se estivesse carregada aparentando a mesma ser real, verifica-se um crime qualificado.