ADMINISTRADOR DA INSOLVÊNCIA
RESPONSABILIDADE
CONTAGEM
PRAZO DE PRESCRIÇÃO
Sumário

I - Não constitui título executivo a acta de assembleia de condóminos da qual conste a aprovação de penas pecuniárias relativamente a condóminos incumpridores.
II - A exequibilidade de uma acta de assembleia de condóminos, para os efeito do disposto no art.º 6.º do D.L. n.º 268/94, de 25/10, apenas exige a aprovação do montante de contribuições e/ou de despesas globais certas que, pela aplicação da permilagem relativa a cada fracção, permita a determinação do “quantum” devido a cada condómino”.
III - É de vinte anos o prazo prescricional quanto ao direito de crédito que esteja a ser exercido por via de acção executiva.
IV - Estando em discussão dívidas de diferentes espécies, designadamente de capital e de juros, impõe-se a aplicação da norma especial do artigo 785.º do Código Civil, valendo o regime dos artigos 783.º e 784.º do mesmo diploma apenas para as dívidas da mesma espécie – dívidas de capital.

Texto Integral

Processo n.º 627/14.3TBVNG-B .P1

Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo de Execução do Porto – Juiz 6

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
I. RELATÓRIO.
1. Embargantes: B…, C… e D…, menor, representado por sua mãe, E….
Embargado: Condomínio do Edifício F…, Representado G…, Lda.
Os embargos deduzidos têm por objecto a oposição à execução sumária para pagamento de quantia certa que o exequente intentou contra a embargante B… e o falecido H…, de quem os embargantes foram habilitados herdeiros.
A referida execução teve início quando, em 14 de Janeiro de 2014, o exequente peticionou dos executados o pagamento da quantia de 2.025,15 €, acrescida de juros vincendos, baseando tal pedido numa decisão homologatória de uma transacção, proferida pelo Julgado de Paz de Vila Nova de Gaia.
Relativamente a tal pedido não foi deduzida qualquer oposição.
Posteriormente, em 16 de Novembro de 2018, o exequente veio cumular com aquela nova execução, agora com base em actas de assembleia de condóminos, em que pede o pagamento da quantia de «9.348,35€, acrescido de juros de mora desde a cumulação até integral pagamento, despesas como processo executivo e contribuições de condomínio que entretanto se vençam na pendência do presente processo».
É quanto a esta execução cumulada que as três primeiras embargantes vieram deduzir embargos, em que pedem a extinção da execução, para tanto alegando, em suma, que pagaram parte dos montantes peticionados, que as penalidades e honorários de advogado peticionados não são devidos e que parte das obrigações peticionadas estão prescritas.
Recebidos os embargos, o embargado contestou, dizendo que os pagamentos recebidos foram todos considerados, que as despesas com advogado e as penalidades foram aprovados em assembleia e nunca impugnadas, pelo que são devidas e que reconheceu as dívidas, pelo que não lhe aproveita a invocada prescrição.
Após a contestação, foi requerida e admitida a intervenção, por mera adesão, de D…, como embargante, ao abrigo do artigo 313.º do Código de Processo Civil.
Saneados os autos, procedeu-se a julgamento, após o que foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Julgo os presentes embargos parcialmente procedentes e consequentemente determino a redução à quantia exequenda a que respeita o requerimento executivo datado de 16/11/2018 do montante de €1.643,41 (mil seiscentos e quarenta e três euros e quarenta e um cêntimos), prosseguindo quanto ao remanescente.
Condeno ambas as partes nas custas do processo, na proporção do decaimento que quanto ao embargado se fixa em €1.643,41”.
2. Por não se conformarem com a referida sentença, dela interpuseram os embargantes recurso de apelação para esta Relação, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:
1- Nos autos principais de execução, o condomínio exequente veio em cumulação requerer o pagamento de prestações de condomínio das frações AO e Q que não foram pagas, segundo o entendimento do exequente, desde abril de 2010 até novembro de 2018, no valor global de cumulação de 9.348,35€.
2- O Exequente não discrimina que quotas, que meses, que valores se encontram em dívida... apenas remete para uma Lista de Documentos, a maior parte dos quais, constituem meros orçamentos em Atas.
3- Verifica-se pelo exposto, uma deficiência insanável de exposição da causa de pedir.
4- Os embargantes vieram em oposição alegar a inexistência e a inexigibilidade da obrigação exequenda uma vez que muitos dos valores peticionados já se encontram pagos, a ilegalidade das penas pecuniárias, custas e honorários de mandatário peticionados bem como, a prescrição.
5- Os executados/embargantes, ora Recorrentes, demonstraram documentalmente, com os documentos que juntaram à PI de Embargos, que se encontram a pagar pontualmente (até ao dia 8 de cada mês) e desde Outubro de 2015, inclusive, as quotas de condomínio (e assim continuam a fazer à data do presente recurso).
6- Para além disto, os executados/embargantes ora Recorrentes demonstraram também documentalmente na PI de Embargos que se propuseram pagar o atrasado – as quotas vencidas desde Agosto de 2012 até Setembro de 2015 - em prestações mensais de 100€ cujo pagamento iniciaram em Junho de 2017, tendo pago assim, 1100€ dos 1945,20€ em dívida a esse título... e que apenas o deixaram de fazer porque o Condomínio começou a imputar esses pagamentos a meses não aceites pelos embargantes/recorrentes (cf. DOCS. 4 a 70 da PI de Embargos).
7- Para além disto, ainda, os executados/embargantes pagaram 3200€ dos autos principais de execução.
8- A douta sentença reproduz nos FACTOS PROVADOS (pontos 6 e seguintes) os mapas de quotizações que resultam dos orçamentos aprovados para as frações AO e Q em variadas assembleias gerais, mas isto constitui a informação do que estariam os condóminos obrigados a pagar... não o que devem, efectivamente os executados/embargantes.
9- Com essa discriminação efectuada na douta sentença, não ficam supridas as deficiências de exposição da causa de pedir do Requerimento Executivo.
10-No ponto 17 dos FACTOS PROVADOS constaria em princípio, o que devem os executados, no entendimento do Exequente.
11-Acontece que neste ponto 17 dos FACTOS PROVADOS ocorre, porém, uma nulidade insanável, pois reproduz-se aqui a Ata de 19-06-2018 na qual consta o «mapa de valores em débito relativos a quotas e penas pecuniárias até 28-02-2018 à data de hoje» e neste MAPA aparece como pretensa dívida ao Condomínio duas vezes a fração AO e duas vezes a fração Q, atribuindo a cada uma das frações e a cada um dos membros do casal, H… e B…, duas dívidas.
12-Ora, estando aqui em causa apenas duas frações e não quatro, e tendo sido aqueles casados em comunhão, não se percebe a distinção que conduz a uma duplicação de dívida e forçosamente a uma nulidade.
13-Cabia ao Condomínio expor a causa de pedir e apresentar um título executivo válido mas do que se acaba de expor resulta que não existe nem uma coisa nem outra: não há exposição clara da causa de pedir, não existe um título executivo válido, pois a ATA de 19-06-2018 reproduzida no ponto 17 dos FACTOS PROVADOS integra uma contradição, uma incongruência que abala a não permite considerar válido esse pretenso título executivo.
14-No ponto 18 dos FACTOS PROVADOS enunciam-se os pagamentos efectuados pelos executados até 14-06-2017 para os autos principais de execução que ascendem, na totalidade, a 3200€ (referindo-se que ainda se encontram em dívida 223,38€).
15-No ponto 40 dos FACTOS PROVADOS diz-se que por carta de 24-05-2017 a Embargante B… referiu que, para além do condomínio corrente, pagaria 1945,20€ em dezoito prestações mensais de 100€ a iniciar em Junho de 2017, para liquidar as quotas de Agosto de 2012 a Setembro de 2015 (inclusive).
16-E por conta disto pagou efectivamente, 1100€ - ponto 41 dos FACTOS PROVADOS, mas este valor, ao contrário do que se referiu no ponto 41, não está incluído nos pagamentos referidos no ponto 18.
17-Deverá por isso, retificar-se o n.º 41 dos Factos provados, retirando-se do mesmo a última parte "que se incluem nos pagamentos referidos em 18».
18-A primeira questão que os embargantes colocaram á apreciação do tribunal, na PI de Embargos, foi a de os pagamentos efetuados desde 2015 não estarem a ser devidamente considerados uma vez que o Condomínio exequente os estaria a imputar em meses e dívidas não aceites pelos embargantes, e à revelia da opção expressamente comunicada por estes, nos termos do artigo 783.º do Codigo Civil.
19-A douta sentença reconhece que existia o direito dos embargantes indicarem o capital que pretendiam pagar e reconhece que o condomínio exequente aceitou nuns casos e não aceitou noutros, sem se compreender o critério adotado... mas depois, a douta sentença não retira uma consequência das conclusões que alcançou.
20-Os casos de má imputação referidos na douta sentença são os dos pontos 20º, 21º, 33º, 34º, 37º, 39º, e 42º dos FACTOS PROVADOS (194,65+ 44.33+44,33+44,33+44,33+44,33€) no valor de 416,3€ mas NÃO são apenas estas as imputações mal feitas pelo Condomínio: são também os valores mencionados no ponto 38 dos FACTOS PROVADOS (+44,33€) e parte dos valores mencionados no ponto 42 (que deveriam ser imputados a meses de agosto de 2012 a setembro de 2015 e não o foram): 100€ +300€ + 100€ + 100€ + 100€ + 100€ + 100€, num total de 900€, o que tudo ascende 1360,63€.
21-Este valor global de 1360,63€ tem que ser deduzido ao valor que a sentença entende que subsiste em dívida, o que não foi feito a final.
22-Assim se não existissem outros erros de julgamento, na conclusão final da douta sentença haveria sempre que alterar o segmento decisório de maneira que dele passasse a constar que: «Pelo exposto, julgo os presentes embargos parcialmente procedentes e consequentemente determino a redução à quantia exequenda a que respeita o requerimento executivo datado de 16/11/2018 do montante de €1.643,41 (mil seiscentos e quarenta e três euros e quarenta e um cêntimos) E DO MONTANTE DE 1360,63€, prosseguindo quanto ao remanescente.»
23-Os embargantes ora recorrentes invocaram a ilegalidade das penas pecuniárias liquidadas no requerimento executivo no montante de 3776,02€.
24-O Condomínio exequente peticiona o pagamento deste enorme valor, fundamentando-se na Ata nº 23 de 31-03-2007, mas esta é apenas a Ata de aprovação do Regulamento do Condomínio, não é a Ata que delibera a aplicação das penas ao Condómino, traduzindo (esclarecendo) o cálculo efectuado: a aplicação de uma pena a um valor em dívida, de forma que seja reconhecível para o devedor e principalmente, que lhe permita verificar a sua correcção e justeza.
25-O Condomínio exequente peticiona o pagamento de um valor de 3776,02 €, a título de penas pecuniárias, fundamentando-se na Ata no 23 de 31-03- 2007 mas esta é apenas a Ata de aprovação do Regulamento do Condomínio, não é a Ata que delibera a aplicação das penas ao Condómino, traduzindo (esclarecendo) o cálculo efectuado: a aplicação de uma pena a um valor em dívida, de forma que seja reconhecível para o devedor e principalmente, que lhe permita verificar a sua correcção e justeza
26- Não existe efectivamente uma Ata a deliberar a aplicação das «penas» e a demonstrar o seu cálculo pelo que, mais uma vez, inexiste um título executivo para essas importâncias.
27-Ainda que houvesse uma Ata, esta, como se sabe, não é aceite como modo de imposição de uma pena, uma vez que não constitui um título executivo, nos termos da lei - artigo 6.º do Decreto-lei nº 268/94, de 25/10), conjugado com o referido artigo 46.º, n.º 1, do CPC, que refere que apenas constitui título executivo a acta que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, não estando aqui referidas quaisquer penalidades.
28-A isto tudo acresce que o art. 1434º, nº 2 do C.C. prescreve que «o montante das penas aplicáveis em cada ano nunca excederá a quarta parte do rendimento colectável anual da fracção do infractor mas como no caso presente se desconhece o cálculo efectuado, afigura-se impossível aferir se há ou não excesso.
29- Os embargante alegaram também a prescrição da dívida exequenda.
30-Sobre isto entendeu a douta sentença proferida que os 5 anos da prescrição do artigo 310º, alínea g) do CC só se aplicam às quotas de condomínio que se renovam e reiteram, não aos outros valores peticionados - quotas extra, anuidades de seguro, penas pecuniárias.
31-Esta interpretação não está correta, pois os valores que se estão a excluir da previsão da lei (quotas extra, anuidades e penas) enquadram-se na mesma "quaisquer outras prestações periodicamente renováveis", uma vez que todas essas importâncias se reiteram em atenção á causa que lhes deu origem, ou acompanham na sua repetição aquela onde têm origem (no caso das penas, por exemplo, se fossem válidas).
32-Os fundamentos da recorribilidade do presente recurso assentam na violação da lei substantiva e da lei processual.
Termos em que deve julgar-se o recurso procedente, revogando- se a douta sentença proferida e substituindo-se por outra que julgue os embargos procedentes por provados.assim se fazendo justiça!
Não foram apresentadas contra-alegações.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar.
II.OBJECTO DO RECURSO.
A. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito.
B. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pelo recorrente, no caso dos autos cumprirá apreciar:
- Exequibilidade dos títulos dados à execução;
- Sendo os mesmos exequíveis, prescrição da dívida exequenda.
- Imputação no pagamento.
III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
III.1. Foram os seguintes os factos julgados provados em primeira instância:
1.Correu termos pelo Julgado de Paz de Vila Nova de Gaia m 25 de Junho de 2008 uma acção declarativa de condenação em que foi autor o Condomínio do Edifício F… e réus H… e B…, sob o no 388/2008 JP, no âmbito do qual as partes celebraram a transacção junta a fls. 3 e 4 do processo principal, que foi homologada por sentença proferida em 25 de Junho de 2008, tudo conforme certidão junta com o primitivo requerimento executivo, e que aqui se dá por integralmente reproduzido.
2.Nessa acção o aqui embargado pedia a condenação dos réus a pagarem a quantia global de €3.230,39, referente a dívida à anterior administração (€1.727,21), a quotizações não pagas do exercício de 2007 (€642,08), a penas pecuniárias pelo pagamento intempestivo (€527,85) a despesas com o recurso à via judicial (€332,75), tudo acrescido de juros de mora à taxa legal, desde a citação até integral pagamento e ainda no pagamento das prestações de condomínio que se vençam na pendência da acção.
3.Na aludida transacção as partes acordaram, em suma que H… e B… se confessavam devedores da quantia de €3.230,39, que o Condomínio do Edifício F… aceitava ser o suficiente para liquidação da totalidade dos débitos até à data (25 de Junho de 2008), quantia essa que os aí réus mediados se comprometiam a pagar em 21 prestações mensais, sendo 20 no montante de €150 cada e a 21a e última no montante de €230,39, vencendo-se no dia 20 de cada mês sucessivo, entre 20 de Julho de 2008 e 20 de Março de 2010.
4.No âmbito do acordo homologado no Julgado de Paz de Vila Nova de Gaia, ficou por liquidar o montante de 1687,63 euros.
5.Em 31 de Março de 2007 reuniu-se a assembleia de Condóminos do edifício constituído em propriedade horizontal, sito na Rua …, nos …, …, Vila Nova de Gaia, do qual fazem parte as fracções autónomas designadas pelas letras AO e Q, propriedade dos embargados, tendo dessa sido lavrada a acta junta a fls. 52 v.º ss do processo principal, que aqui se dá por reproduzida, e da qual constam, com relevo, as seguintes deliberações:
(...)
(...)


(...)


6. Em 30 de Julho de 2010 reuniu-se a assembleia de Condóminos do edifício constituído em propriedade horizontal, sito na Rua …, nos .., .. e .., …, Vila Nova de Gaia, do qual fazem parte as fracções autónomas designadas pelas letras AO e Q, propriedade dos embargados, tendo dessa sido lavrada a acta junta a fls. 26 vo ss do processo principal, que aqui se dá por reproduzida, e da qual constam, com relevo, as seguintes deliberações: (...)

(...)



(...)

………………………..
………………………..
………………………..
7. Do mapa referido no ponto 5.º da acta consta, com relevo:


8. Do mapa referido no ponto 6º da acta consta, com relevo:

9. Em 20 de Abril de 2011 reuniu-se a assembleia de Condóminos do edifício constituído em propriedade horizontal, sito na Rua …, n.ºs … e .., …, Vila Nova de Gaia, do qual fazem parte as fracções autónomas designadas pelas letras AO e Q, propriedade dos embargados, tendo dessa sido lavrada a acta junta a fls. 20 v.º ss do processo principal, que aqui se dá por reproduzida, e da qual constam, com relevo, as seguintes deliberações:
(...)

(...)
(...)
(...=


(...)

(...)

10. Em 24 de Abril de 2012 reuniu-se a assembleia de Condóminos do edifício constituído em propriedade horizontal, sito na Rua …, nos .., .. e .., …, Vila Nova de Gaia, do qual fazem parte as fracções autónomas designadas pelas letras AO e Q, propriedade dos embargados, tendo dessa sido lavrada a acta junta a fls. 30 v.º ss do processo principal, que aqui se dá por reproduzida, e da qual constam, com relevo, as seguintes deliberações:

(...)


(...)

11. Em 12 de Junho de 2013 reuniu-se a assembleia de Condóminos do edifício constituído em propriedade horizontal, sito na Rua …, nos .., .. e .., …, Vila Nova de Gaia, do qual fazem parte as fracções autónomas designadas pelas letras AO e Q, propriedade dos embargados, tendo dessa sido lavrada a acta junta a fls. 34 v.º ss do processo principal, que aqui se dá por reproduzida, e da qual constam, com relevo, as seguintes deliberações:
(...)
(...)

12. Em 12 de Maio de 2014 reuniu-se a assembleia de Condóminos do edifício constituído em propriedade horizontal, sito na Rua …, nos .., .. e .., …, Vila Nova de Gaia, do qual fazem parte as fracções autónomas designadas pelas letras AO e Q, propriedade dos embargados, tendo dessa sido lavrada a acta junta a fls. 38 v.º ss do processo principal, que aqui se dá por reproduzida, e da qual constam, com relevo, as seguintes deliberações:

13. Em 8 de Julho de 2015 reuniu-se a assembleia de Condóminos do edifício constituído em propriedade horizontal, sito na Rua …, nos .., .. e .., …, Vila Nova de Gaia, do qual fazem parte as fracções autónomas designadas pelas letras AO e Q, propriedade dos embargados, tendo dessa sido lavrada a acta junta a fls. 41 v.º ss do processo principal, que aqui se dá por reproduzida, e da qual constam, com relevo, as seguintes deliberações:

14. Em 6 de Junho de 2016 reuniu-se a assembleia de Condóminos do edifício constituído em propriedade horizontal, sito na Rua …, nos .., .. e .., …, Vila Nova de Gaia, do qual fazem parte as fracções autónomas designadas pelas letras AO e Q, propriedade dos embargados, tendo dessa sido lavrada a acta junta a fls. 43 v.º ss do processo principal, que aqui se dá por reproduzida, e da qual constam, com relevo, as seguintes deliberações:
(...)

(...)

(...)
(...)
(…)
(...)

15.Do mapa referido no ponto 4.º da acta consta, com relevo:


16. Em 14 de Junho de 2017 reuniu-se a assembleia de Condóminos do edifício constituído em propriedade horizontal, sito na Rua …, nºs .., .. e .., …, Vila Nova de Gaia, do qual fazem parte as fracções autónomas designadas pelas letras AO e Q, propriedade dos embargados, tendo dessa sido lavrada a acta junta a fls. 43 v.º ss do processo
principal, que aqui se dá por reproduzida, e da qual constam, com relevo, as seguintes deliberações:

17. Em 19 de Junho de 2018 reuniu-se a assembleia de Condóminos do edifício constituído em propriedade horizontal, sito na Rua …, n.ºs .., .. e .., …, Vila Nova de Gaia, do qual fazem parte as fracções autónomas designadas pelas letras AO e Q, propriedade dos embargados, tendo dessa sido lavrada a acta junta a fls. 49 v.º ss do processo principal, que aqui se dá por reproduzida, e da qual constam, com relevo, as seguintes deliberações:

(...)

…………………………
…………………………
…………………………

18.Na pendência da execução, e até 14-06-2017 os executados procederam ao pagamento voluntário ao exequente da quantia de 1200,00 euros (100,00 euros mensais desde Novembro de 2015 até Outubro de 2016, inclusive) e a quantia de €2.000,00 foi paga à ordem do processo mediante prestações mensais de 100,00 euros e um pagamento de 800,00 euros efectuado em Fevereiro de 2017, encontrando-se em dívida, àquela data (14-06-2017), o montante de € 223,38.
19.A embargante B… enviou à administração do embargado uma carta registada, datada de 29-03-2016, em que na parte relevante, diz:
«Para além disto, estou a pagar desde OUTUBRO DE 2015 o CONDOMÍNIO CORRENTE, designadamente :
- seguro 52,79 € + 41,40 € + 2,93 € - transferência de 194,65 € em 02- 11-2015,
- CONDOMÍNIO MENSAL de 44,33 € - transferência 02-12-2015,
- CONDOMÍNIO MENSAL de 44,33 € - transferência 02-01-2016,
- CONDOMÍNIO MENSAL de 44,33 € - transferência 02-02-2016,
- CONDOMÍNIO MENSAL de 44,33 € - transferência 02-03-2016,Foi o que ficou combinado na correspondência de Outubro de 2015, na qual se aceitou que o CONDOMÍNIO começaria a ser pago no montante mensal que se fosse vencendo.Vejo que os RECIBOS EMITIDOS por V. Excias. não acataram o assim acordado, pelo que venho por este meio reiterar que os pagamentos anteriores foram para pagamento dos meses respectivos e que os futuros pagamentos serão para os meses vincendos, solicitando assim que emitam os recibos em conformidade.».
20. O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 194,65 € em 02-11-2015, que imputou a:

21.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 02-12-2015, que imputou a:
22. O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 02-01-2016, que imputou a:

23. O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 02-02-2016, que imputou a:

24.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 02-03-2016, que imputou a:

25. O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 07-04-2016, que imputou a:

26. O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 02-05-2016, que imputou a:

27. O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 02-06-2016, que imputou a:

28.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 56,99 € em 30-06-2016, que imputou a:

29.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 08-07-2016, que imputou a:

30.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 14,70 € em 03-08-2016, que imputou a:
31.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 59,03 € em 03-08-2016, que imputou a:

32.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 07-10-2016, que imputou a:

33.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 04-11-2016, que imputou a:

34. O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 05-12-2016, que imputou a:

35. O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33€ em 09-01-2017, que imputou a:

36.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 08-02-2017, que imputou a:

37.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 07-03-2017, que imputou a:

38.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33€ em 03-04-2017, que imputou a:

39.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 03-05-2017, que imputou a:

40. Por carta de 24-05-2017 a Embargante B… informou o Condomínio que «para além do mês corrente, pagarei o valor de 1945,20 € (mil novecentos e quarenta e cinco euros e vinte cêntimos) em dezoito prestações mensais de 100€ e uma última (19ª) de 145,20€, a iniciar em JUNHO de 2017 e a acabar em DEZEMBRO DE 2018.
Será um grande esforço da minha parte que farei para acabar de pagar o que ainda devo ao Condomínio – as quotas relativas ao período compreendido entre Agosto de 2012 e Setembro de 2015 (inclusive). Deixarei ficar na caixa do condomínio, como tenho feito até agora, o comprovativo do pagamento e solicito que periodicamente me remetam o recibo do valor pago.»
41. Na sequência dessa carta, entre Junho de 2017 a Abril de 2018 as embargantes pagaram ao embargado o valor global de 1.100€, à razão de 100€ por mês, que se incluem nos pagamentos referidos em 18o.
42. Esses pagamentos foram imputados pelo embargado nos seguintes termos:



43.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 07-06-2017, que imputou a:

44.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 06-07-2017, que imputou a:

45. O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 02-08-2017, que imputou a:

46. Em 10-08-2017 a embargante enviou ao embargado uma carta com o seguinte teor: «Exmos. Senhores : No dia 24-05-2017 enviei-vos uma carta, cuja cópia anexo, para melhor esclarecimento, na qual referi para além do mês corrente, pagarei o valor de 1945,20 € (mil novecentos e quarenta e cinco euros e vinte cêntimos) em dezoito prestações mensais de 100 € e uma última (19ª) de 145,20 €, a iniciar em JUNHO de 2017 e a acabar em DEZEMBRO DE 2018. Será um grande esforço da minha parte que farei para acabar de pagar o que ainda devo ao Condomínio – as quotas relativas ao período compreendido entre Agosto de 2012 e Setembro de 2015 (inclusive). Comecei efectivamente, a pagar em JUNHO DE 2017 os referidos 100 € e recebi da vossa parte um recibo reportado a AGOSTO, SETEMBRO E OUTUBRO (PARCIAL) DE 2012. Em JULHO DE 2017 paguei os referidos 100 € MAS recebi da v/ parte um RECIBO INCORRECTO, isto é, não referente aos meses que me propus pagar mas sim, a meses anteriores que já estão pagos – Junho de 2012, etc. Solicito assim a V. Excias. que rectifiquem o recibo emitido em JULHO DE 2017 (e presumivelmente, o de AGOSTO de 2017 que ainda não recebi mas que deverá estar nos mesmos termos incorrectos) de maneira a que se reportem aos meses cujo pagamento indiquei que pretendia fazer, pois é um direito que tenho, nos termos do art. 783o do Código Civil.».
47.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 07-09-2017, que imputou a:
48.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 02-10-2017, que imputou a:
49.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 06-11-2017, que imputou a:

50.A Embargante remeteu nova carta ao embargado em 16-11-2017, com o seguinte teor: «Exmos. Senhores: Em Agosto de 2017 enviei-vos uma carta na qual repeti uma anterior de 24-05-2017, na qual referi para além do mês corrente, pagarei o valor de 1945,20 € (mil novecentos e quarenta e cinco euros e vinte cêntimos) em dezoito prestações mensais de 100 € e uma última (19a) de 145,20 €, a iniciar em JUNHO de 2017 e a acabar em DEZEMBRO DE 2018. Será um grande esforço da minha parte que farei para acabar de pagar o que ainda devo ao Condomínio – as quotas relativas ao período compreendido entre Agosto de 2012 e Setembro de 2015 (inclusive). Porém, recebi uma carta vossa datada de 13-10-2017 na qual afirmam que eu devo o valor de 7.489,65 € de quotas de condomínio, seguro, fundo de reserva, despesas extraordinárias etc, etc. reportados a meses de MARÇO DE 2009 e até DEZEMBRO de 2017 ! Como decorre do primeiro parágrafo desta carta e como já o referi várias vezes anteriormente, isso não é verdade, não devo os valores que referem na vossa carta de Outubro de 2017».
51.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 06-12-2017, que imputou a:

52.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 08-01-2018, que imputou a:

53.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 06-02-2018, que imputou a:

54.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 06-03-2018, que imputou a:
55.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 05-04-2018, que imputou a:

56.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 03-05-2018, que imputou a:

57.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 06-06-2018, que imputou a:

58.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 02-07-2018, que imputou a:

59.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 03-08-2018, que imputou a:
60.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 11-09-2018, que imputou a:

61.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 02-10-2018, que imputou a:

62.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 05-11-2018, que imputou a:

63.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 03-12-2018, que imputou a:

64.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 07-01-2019, que imputou a:

65.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 04-02-2019, que imputou a:

66.Em Fevereiro de 2019 a embargante enviou ao embargado a carta junta como doc. 73 à petição de embargos, que aqui se dá por reproduzida, em que em suma reitera o teor das anteriores missivas.
67.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 01-03-2019, que imputou a:

68.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 03-04-2019, que imputou a:

69.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 03-05-2019, que imputou a:

70.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 07-06-2019, que imputou a:

71.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 08-07-2019, que imputou a:

72.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 12-08-2019, que imputou a:

73.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 06-09-2019, que imputou a:

74.O embargado recebeu da embargante e emitiu recibo do pagamento de 44,33 € em 09-10-2019, que imputou a:

75. Em 05/11/2019 a embargante pagou ao embargado o montante de €44,33, por transferência bancária.
76. As Embargantes pagaram, em 25-11-2019, a importância de 367,50€, a título de quotas extra para obras da assembleia de 06-06-2016 tendo informado o Condomínio desse facto, por carta registada.
77. Em 05/12/2019 a embargante pagou ao embargado o montante de €44,33, por transferência bancária.
78.Em 08/01/2020 a embargante pagou ao embargado o montante de €44,33, por transferência bancária.
79. O valor patrimonial das fracções das embargantes é de €3.217,55 (garagem) e €71.122,85 (habitação).
80. Quando a Sr.ª Agente de Execução foi a casa dos executados levar a cabo penhora de bens móveis, já o falecido executado estava doente, e a existência da dívida dos autos foi para a embargante uma surpresa.
III.2. Factos Não Provados:
A mesma instância considerou não existirem factos não provados.
IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
O exequente, aqui apelado, reclamou dos executados, ora apelantes, o pagamento das seguintes quantias que alega serem-lhe devidas:
- 3.209,65€ de despesas de condomínio mensais e Fundo de reserva desde Abril de 2010 até Novembro de 2018, cfr orçamentos aprovados nas actas n.ºs 27, 28, 29, 31, 32, 33, 34, 35 e 36 (docs. 2 a 10);
- 264,60€ de quotas extras para reparação de elevadores, de Agosto de 2010 até Janeiro de 2011, cfr. acta n.º 27 de 30/07/2010, ponto 5 (doc. 2);
- 220,50€ de quotas extras para obras de restauro do Edifício, de Fevereiro de 2011 até Julho de 2011, conforme aprovado na acta 27 de 30/07/2010, ponto 6 (doc. 2);
- 215,10€ de quotas extras para obras de reabilitação, de Agosto de 2011 até Dezembro de 2011, conforme aprovado na ata 28 de 20/04/2011, ponto 4 (doc. 3)
- 44,10€ de quotas extras para obras guardas cobertura de Outubro de 2016 até Dezembro de 2016, conforme acta 34 de 06/06/2016, ponto 4 (doc. 8);
- 735,00€ de quotas extras para obras, de Janeiro de 2017 a Agosto de 2017 e Dezembro de 2017 até Novembro de 2018, conforme acta n.º 34 de 06/06/2016, ponto 5 (doc.8);
- 452,88€ das anuidades de seguro desde 8/2008 até 8/2017 da responsabilidade dos executados por não fazerem prova de seguro particular da sua fração, conforme decorre da acta n.º 23 (ponto 3, art. 26.º) e ponto 4 (doc. 11);
Assim como os seguintes montantes:
- 3776,02€ de penas pecuniárias por falta de pagamento no prazo previsto no artigo 12.º n.º 1 do regulamento do condomínio, calculadas a 10% ao mês sobre o montante a liquidar, conforme decorre da ata n.º 23, ponto 3, artigo 13.º n.º 2 (doc. 11);
- 430,50€ de despesas e honorários de Advogado suportados pelo condomínio e cuja responsabilidade este imputa aos executados, conforme decorre do regulamento do condomínio aprovado na acta 23 de 31.03.2007, ponto 3, artigo 13.º, n.º 5 (doc. 11).
Prescreve o n.º 5 do artigo 10.º do Código de Processo Civil que “toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva”.
Como esclarece Lebre de Freitas[1]: “para que possa ter lugar a realização coactiva duma prestação devida (ou do seu equivalente), há que satisfazer dois tipos de condição, dos quais depende a exequibilidade do direito à prestação:
a) O dever de prestar deve constar dum título: o título executivo. Trata-se dum pressuposto de carácter formal, que extrinsecamente condiciona a exequibilidade do direito (…), na medida em que lhe confere o grau de certeza que o sistema reputa suficiente para a admissibilidade da acção executiva.
b) A prestação deve mostrar-se certa, exigível e líquida (…). Certeza, exigibilidade e liquidez são pressupostos de carácter material que intrinsecamente condicionam a exequibilidade do direito, na medida em que sem eles não é admissível a satisfação coactiva da pretensão”.
Como já ensinava Alberto dos Reis[2], o título executivo contém a afirmação de um direito em benefício de uma pessoa e a constituição de uma obrigação a cargo de outra, sendo pressuposto formal para o exercício do respectivo direito de acção[3].
O artigo 703.º, n.º 1 do Código de Processo Civil enumera, de forma taxativa, os vários títulos executivos, incluindo nessa enumeração “os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva”- alínea d).
A acta da assembleia de condóminos constitui documento com natureza executória, que lhe é reconhecida por norma especial. Dispõe, com efeito, o n.º 1 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de Outubro que “A acta de reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação, fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar no prazo estabelecido, a sua quota-parte”.
Foi esta a natureza do título executivo que serviu de base à execução proposta pelo aqui apelado contra os executados, proprietários de duas fracções autónomas, que deles reclama o pagamento de vários montantes em dívida, referentes a contribuições devidas ao condomínio, despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do prédio, bem como honorários de serviços de interesse comum, da responsabilidade dos condóminos.
E foi com base nele também que o exequente reclamou dos executados o pagamento de penas pecuniárias pela falta de pagamento atempado das demais prestações em dívida.
O entendimento a atribuir ao conceito de “contribuições devidas ao condomínio” constante do artigo 6º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de Outubro não é uniforme na jurisprudência dos tribunais portugueses.
Privilegiando uma interpretação mais rigorosamente literal do preceito em causa, negam que constitua título executivo a acta da assembleia de condóminos em que tenha sido deliberado aprovar e fixar uma penalização pelo atraso no pagamento das despesas do condomínio, entre outros, os acórdãos da Relação de Coimbra de 21.03.2013 – processo n.º 3513/12.8TBVIS.C1 -, de 05.06.2001 – processo n.º 455/2001 -, de 04.06.2013 – processo n.º 607/12.3TBFIG-A.C1 -; da Relação de Guimarães, de 08.01.2013 – processo n.º 8630/08.6TBBRG-A.G1 -; da Relação do Porto de 7.05.2018 – processo n.º 9990/17.3T8PRT-B.P1, de 9.03.2020 – processo n.º 2752/19.5T8VLG-A.P1 -, de 20.02.2020, processo n.º 3975/08.8YYPRT-A.P1 -, de 8.09.2020, processo n.º 25411/18.1T8PRT-A.P1 -; do Supremo Tribunal de Justiça de 26.01.2021 – processo n.º 956/14.6TBVRL-T.G1.S1 e de 11.03.2021 – processo n.º 5647/17.3T8OER-A.L1.S1, todos em www.dgsi.pt.
Em sentido divergente, sustentando um preenchimento mais amplo e abrangente daquela expressão legal, de forma a também abarcar as penalizações deliberadas em assembleia de condóminos para as situações de inadimplência e que a respectiva acta constitui título executivo pronunciaram-se, entre outros, os acórdãos da Relação do Porto de 24.09.2013 – processo nº 7378/11.9YYPRT-A.P1 -, de 24.02.2015 – processo n.º 6265/13.0YYPRT-A.P1; da Relação de Lisboa, de 27.02.2014 – processo n.º 4852/08.8YYLSB-A.L1-8, de 08.07.2007 – processo n.º 9276/2007-7 -; da Relação de Guimarães, de 22.10.2015 – processo n.º 1538/12.2TBBRG-A.G1 -; da Relação de Coimbra, de 14.12.2010 – processo n.º 78/10.9TBMGR.C1, todos em www.dgsi.pt.
Também na doutrina não é unânime a posição quanto à exequibilidade da acta de condóminos que aprove a aplicação de sanções a condóminos que não paguem as prestações a que se obrigam, para efeitos do disposto no artigo 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25/10.
Segundo Sandra Passinhas[4], “embora, rigorosamente, a pena pecuniária não seja uma “contribuição devida ao condomínio”, esta é a solução mais conforme à vontade do legislador. Não faria sentido que a acta da reunião da assembleia que tivesse deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio servisse de título executivo contra o condómino relapso, e a mesma acta não servisse de título executivo para as penas pecuniárias, aplicadas normalmente para punir os condóminos inadimplentes”, o que, a configurar-se essa hipótese, implicaria que o condómino tivesse de recorrer a uma acção declarativa para obter a condenação do condómino incumpridor no pagamento da penalidade deliberada para o atraso no pagamento das despesas comuns, solução que expressamente preconizam os acórdãos da Relação de Coimbra de 04.06.2013 e de 05.06.2001.
Em sentido de que não constitui título executivo a acta de que conste a aprovação de penas pecuniárias a condóminos incumpridores se pronunciaram, entre outros, Rui Pinto[5], Rui Pinto Duarte[6] e Marco Carvalho Gonçalves[7].
A solução passa, naturalmente, pela interpretação da norma do artigo 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25/10 de forma que, em resultado desse exercício, se possa concluir se as actas da assembleia de condóminos que contenham deliberações sobre penalidades pecuniárias a condóminos incumpridores ou retardatários nas prestações devidas ao condomínio têm ou não natureza executória.
O artigo 703.º, n.º 1 do Código de Processo Civil contém uma enumeração taxativa dos vários títulos executivos como tal considerados na lei.
Dada a sua natureza taxativa, a criação de novos títulos executivos tem natureza excepcional, não consentindo a norma em causa interpretação analógica, mas somente interpretação extensiva, não parecendo que deva o intérprete socorrer-se desta para apurar a existência/extensão dos títulos executivos quanto às actas da assembleia de condóminos em que tenha sido deliberada a aplicação de sanções pecuniárias aos condóminos faltosos no cumprimento das prestações devidas ao condomínio por verdadeiramente não ocorrer lacuna que deva ser preenchida com recurso à interpretação extensiva.
As razões para não integrar aquelas actas no conceito de título executivo acham-se amplamente elucidas no citado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26.01.2021.
Nele se refere: “Diz-se, com efeito, que, "tendo tal pena a sua génese na mora do condómino em satisfazer a quota-parte nas despesas comuns, justifica-se que o seu cumprimento coercivo observe o procedimento processual aplicável a essas despesas, pois que se trata também de conferir maior eficácia à administração do condomínio (…) dissuadindo comportamentos faltosos e prevenindo dificuldades de gestão do condomínio".
Seria incoerente entender-se ser exigível para a cobrança da penalização a instauração prévia de acção declarativa, diferentemente do que sucede com a cobrança das contribuições e despesas do condomínio. "Um tal entendimento seria contraditório com a proclamada intenção de tornar mais eficaz o regime da propriedade horizontal".
Deve, pois – acrescenta-se –, atribuir-se à expressão "contribuições devidas ao condomínio" um sentido amplo que, para além das despesas previstas no art. 1424º, nº 1, do CC, englobe também as penas pecuniárias fixadas nos termos do art. 1434º do mesmo diploma, evitando-se, assim, "uma injustificada atomização dos meios processuais para exigir do condómino relapso o cumprimento de obrigações nuclearmente interligadas"[...].
Sendo inegável a vantagem que adviria da exequibilidade da aludida pena pecuniária para a gestão do condomínio, por facilitar a sua cobrança e, assim, mais eficazmente dissuadir os incumprimentos dos condóminos, não nos parece, porém, que, perante o quadro legal aplicável, essa razão e as demais que acima se enunciaram sejam determinantes e sobrelevem os fundamentos que, a nosso ver e com o devido respeito, justificam a solução contrária.
A questão coloca, essencialmente, um problema de interpretação da norma aplicável, tarefa que, não devendo cingir-se à letra da lei – mas partindo dela e tendo-a como limite (tendo nela um mínimo de correspondência verbal) – deve reconstituir o pensamento legislativo (art. 9º, nº 1, do CC), com recurso aos demais elementos ou factores hermenêuticos, sobressaindo, no caso, o racional e o sistemático.
Discutindo-se a existência/extensão de um título executivo, importa começar por, no âmbito do último elemento de interpretação referido, enquadrar a norma interpretanda no complexo normativo aplicável.
Como se referiu, o art. 703º. Nº 1, do CPC contém uma enumeração categoricamente taxativa[...] dos títulos executivos: à execução apenas podem servir de base os títulos aí indicados, como é o caso dos documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva – al. d).
Assim, considerando esse carácter taxativo, a constituição pelo legislador de novos títulos executivos é verdadeiramente excepcional, não comportando a respectiva norma aplicação analógica; apenas admite interpretação extensiva (art. 11º do CC).
De todo o modo, como se verá de seguida, não parece que, no caso e tendo em atenção a interpretação que se preconiza, exista uma lacuna que devesse ser preenchida por analogia ou, sequer, que o texto da norma interpretanda fique aquém do que se pretendeu dizer (do seu espírito), por forma a justificar a extensão do seu âmbito.
Conforme dispõe o art. 6º, nº 1, do DL 268/94, acima reproduzido, sob a epígrafe Dívidas por encargos de condomínio, constitui título executivo a acta da assembleia de condóminos que tiver deliberado sobre:
- O montante das contribuições devidas ao condomínio;
- Quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns;
- O pagamento de serviços de interesse comum.
É notório que a norma não contempla expressamente as deliberações que apliquem penas pecuniárias a condóminos incumpridores[...].
Pode, é certo, considerar-se que, no seu significado comum, essas penas não deixam de ser "contribuições devidas ao condomínio", pois constituem receita deste. Mas não é esse, seguramente, o sentido da expressão utilizada na norma, como é revelado, desde logo, de forma clara, pela própria epígrafe do artigo – Dívidas por encargos de condomínio. Ora, a pena pecuniária não constitui uma dívida por encargos de condomínio.
A nosso ver, é estabelecida uma nítida correspondência entre essas dívidas e as que são previstas no art. 1424º, nº 1, do CC, que consagra a responsabilidade dos condóminos pelas despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e pelo pagamento de serviços de interesse comum.
O conceito de encargo de condomínio, utilizado no citado art. 6º, nº 1, tem, assim, um sentido preciso, que corresponde, literal e substancialmente, ao que consta da norma do art. 1424º, nº 1.
É o incumprimento destes encargos pelos condóminos que legitima a deliberação da assembleia que o reconheça, gerando, deste modo, o título executivo. Este não abrange, por isso, as penas pecuniárias que podem ser aplicadas, nos termos do art. 1434º, nº 1 (segunda parte), do CC.
Por outro lado, agora quanto à razão de ser da norma e ao fim visado por esta, como se referiu já, foi preocupação do legislador procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros[...].
Exemplo dessas soluções é a eficácia executiva reconhecida às deliberações da assembleia previstas no citado art. 6º, nº 1, evitando-se, assim, o recurso à acção declarativa e possibilitando uma mais rápida cobrança das prestações devidas pelos condóminos. Cobrança mais rápida que é imperiosa no caso das dívidas por encargos de condomínio, por estarem em causa prestações que são absolutamente indispensáveis ao normal funcionamento e gestão do condomínio.
O mesmo não se passa, porém, com as penas pecuniárias, destinadas a compelir e pressionar os condóminos a cumprir e que, por isso, não visam imediatamente a satisfação de despesas, constituindo antes uma receita eventual do condomínio.
Assim, não tendo directamente por objecto a satisfação de despesas ou encargos que são essenciais ao normal funcionamento do condomínio, não existem razões que justifiquem ou imponham uma particular celeridade na sua cobrança.
Importa ainda referir que, apesar do travão estabelecido com o limite quantitativo estabelecido no art. 1434º, nº 2, o certo é que, como se observa no acórdão recorrido, a discussão se coloca com frequência em torno da legalidade dos montantes das penas, muitas vezes fixados em valores desproporcionados (a que não será estranha uma certa "vontade punitiva de moralizar os incumprimentos"), a justificar um controlo acrescido, foram do âmbito do processo executivo.
Deve, por conseguinte, interpretar-se a norma do art. 6º, nº 1, do DL 268/94 no sentido de que as dívidas aí previstas e que podem integrar o título executivo são as que têm origem nos encargos com a conservação e fruição das partes comuns e com os serviços de interesse comum (art. 1424º, nº 1 do CC), estando excluídas as penas pecuniárias aplicadas nos termos do art. 1434º, nº 1, do CC.
É este, parece-nos, o sentido que a letra norma mais claramente comporta e que corresponde ao pensamento legislativo”.
De acordo com este entendimento, com o qual nos identificamos, a acta da assembleia de condóminos não constitui título executivo quanto à quantia de €3.776,02, relativa a penas pecuniárias por falta de pagamento das prestações devidas ao exequente no prazo previsto no artigo 12.º n.º 1 do regulamento do condomínio, calculadas a 10% ao mês sobre o montante a liquidar, cujo pagamento é reclamado dos executados.
Constata-se, assim, a falta de título executivo que confira exequibilidade ao peticionado pagamento da quantia de €3.776,02, reclamada a título de sanção pecuniária deliberada em assembleia de condóminos por falta de pagamento atempado de prestações devidas ao condomínio, procede, nesta parte, a oposição deduzida pelos embargantes, deduzindo-se aquela quantia ao valor da dívida exequenda.
Também se opuseram os executados à execução contra eles instaurada com fundamento na prescrição da dívida exequenda.
A prescrição visa salvaguardar a segurança e a estabilidade das relações jurídicas, garantindo ao beneficiário da mesma a possibilidade de, decorrido certo tempo fixado na lei, recusar o cumprimento que lhe venha a ser exigido, conforme assegurado pelo artigo 304.º do Código Civil quando determina que “uma vez completada a prescrição, tem o beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito.
Segundo Pedro Pais de Vasconcelos[8], “ a prescrição é um efeito jurídico da inércia prolongada do titular do direito no seu exercício, e traduz-se em o direito prescrito sofrer na sua eficácia um enfraquecimento consistente em a pessoa vinculada poder recusar o cumprimento ou a conduta a que esteja adstrita. Se o credor, ou o titular do direito, deixar de o exercer durante certo tempo, fixado na lei, o devedor, ou a pessoa vinculada, pode recusar o cumprimento, invocando a prescrição.
É de vinte anos o prazo ordinário de prescrição, como prevê o artigo 309.º do Código Civil. Tal significa que, não inexistindo disposição legal que sujeite especificamente o crédito a um prazo de prescricional distinto, a prescrição só ocorre com o decurso do aludido prazo de vinte anos.
Um dos casos em que a lê prevê um prazo de prescrição de menor duração é o previsto no artigo 310.º do Código Civil, que fixa em cinco o prazo prescricional para as situações nele contempladas: “não se trata, nestes casos, de prescrições presuntivas, sujeitas ao regime especial dos artigos 312º e seguintes, mas de prescrições de curto prazo, destinadas essencialmente a evitar que o credor retarde demasiado a exigência de créditos periodicamente renováveis, tornando excessivamente pesada a prestação a cargo do devedor. “[9]
De acordo com a alínea g) do citado artigo 310.º, prescrevem no prazo de 5 anos quaisquer prestações periodicamente renováveis.
Diz a sentença sob recurso: “É esta a situação atinente às quotas de condomínio destinadas às despesas ordinárias, que se renovam e reiteram, ou seja, a comparticipação das despesas comuns por parte de cada um dos condóminos que são prestações periodicamente renováveis, melhor dizendo, “...as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum...”, como é referido no art.º 1424.º, n.º 1, do Código Civil integram a situação prevista na já referida alínea g) do art.º 310.º, do Código Civil, estando, pois, sujeitas ao prazo de prescrição de 5 anos.
[...]
O mesmo não acontece quanto às contribuições extraordinárias.
As prestações para pagamento das despesas comuns do condomínio podem ou não ser prestações periodicamente renováveis. Se o forem, em princípio estão sujeitas ao prazo de prescrição de cinco anos. Caso contrário, o prazo de prescrição da dívida é o prazo ordinário de vinte anos, previsto no artigo 309.º do Código Civil”.
Explica Antunes Varela[10], que as prestações, quanto ao tempo da sua realização, distinguem-se em prestações instantâneas e prestações duradouras: “Dizem-se instantâneas as prestações em que o comportamento exigível do devedor se esgota num só momento ou um período de tempo de duração praticamente irrelevante (quae unico actu perficiuntur) – entrega da certa coisa; pagamento do preço numa só prestação, etc.
Não sucede assim com as obrigações fundamentais ou típicas do senhorio e do arrendatário, do depositário, do depositante bancário a prazo, do segurador, do sócio, da entidade patronal e do trabalhador, do fornecedor de água, gás ou electricidade e do respectivo consumidor. Nestas relações, a prestação protela-se no tempo, tendo a duração temporal da relação creditória influência decisiva na conformação global da prestação.
Chama-se-lhes, por isso, obrigações duradouras, distinguindo os autores duas modalidades dentro delas: umas, as prestações de execução continuada, são aquelas cujo cumprimento se prolonga ininterruptamente no tempo (…); outras, as prestações reiteradas, periódicas ou com trato sucessivo, são as que se renovam, em prestações singulares sucessivas, por via de regra ao fim de períodos consecutivos.
(…) Não se confundem com as obrigações duradouras as obrigações (instantâneas) fraccionadas ou repartidas. Dizem-se fraccionadas ou repartidas as obrigações cujo cumprimento se protela no tempo através de sucessivas prestações instantâneas, mas em que o objecto da prestação está previamente fixado, sem dependência da duração da relação contratual (preço pago a prestações; fornecimento de certa quantidade de mercadorias ou géneros a efectuar em várias partidas).
Nas obrigações duradouras, a prestação devida depende o factor tempo, que tem influência decisiva na fixação do seu objecto; nas prestações fraccionadas, o tempo não influi na determinação do seu objecto, apenas se relacionando com o modo da sua execução. “[11].
No caso aqui apreciado a sentença impugnada concluiu ter ocorrido prescrição “quanto aos valores relativos a contribuições ordinárias vencidas até Julho de 2012, inclusive, no valor total de €1.155,92...”.
Na perspectiva dos recorrentes todos os valores reclamados pelo exequente deveriam ter sido abrangidos pela prescrição, não apenas as contribuições ordinárias.
Alegam, com efeito, os mesmos:
“Sobre isto entendeu a douta sentença proferida que os 5 anos da prescrição do artigo 310º, alínea g) do CC só se aplicam às quotas de condomínio que se renovam e reiteram, não aos outros valores peticionados - quotas extra, anuidades de seguro, penas pecuniárias”- conclusão 30.ª.
E logo acrescentam: “Esta interpretação não está correta, pois os valores que se estão a excluir da previsão da lei (quotas extra, anuidades e penas) enquadram-se na mesma "quaisquer outras prestações periodicamente renováveis", uma vez que todas essas importâncias se reiteram em atenção á causa que lhes deu origem, ou acompanham na sua repetição aquela onde têm origem (no caso das penas, por exemplo, se fossem válidas)”- conclusão 31.ª.
Importa, todavia, lembrar o regime específico da prescrição estabelecido no n.º 1 do artigo 311.º do Código Civil para o direito em relação ao qual sobrevenha sentença transitada em julgado que o reconheça, ou outro título executivo.
Estabelece o referido normativo: “O direito para cuja prescrição, bem que só presuntiva, a lei estabelecer um prazo mais curto do que o prazo ordinário fica sujeito a este último, se sobrevier sentença passada em julgado que o reconheça, ou outro título executivo”.
Refere, a propósito, o acórdão desta Relação de 4.02.2016[12], relatado pelo aqui primeiro adjunto, desembargador Aristides de Almeida: “Resulta deste preceito que se após a constituição da dívida (e, julgamos dever acrescentar, dentro do prazo de prescrição de cinco anos já que se a prescrição se completar antes de o crédito passar a estar sujeito ao prazo ordinário o efeito da prescrição permanece intocado) esta for reconhecida por sentença transitada em julgado ou estiver titulada em documento com valor de título executivo, o direito de crédito passa a estar sujeito ao prazo ordinário de prescrição.
Ora, no caso, o direito de crédito está a ser exercido por via de acção executiva. E isso sucede porque nos termos do n.º 1 do artigo 5º do Decreto-lei nº 268/94, de 25 de Outubro: “A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo”.”.
É o que sucede no caso aqui escrutinado, em que o direito de crédito de que se arroga titular o exequente está a ser exercido por via de acção executiva, existindo título executivo bastante, ao abrigo do artigo 6.º, n.º 1 do citado diploma, à excepção da prestação exequenda reclamada a título de penalidades pecuniárias, como anteriormente se concluiu.
Assim, por via do mencionado artigo 311.º, n.º 1 do Código Civil, estando o direito de crédito do exequente sujeito ao prazo prescricional de vinte anos, que não se mostra esgotado, e exercido o mesmo direito por via de acção executiva, para a qual existe título bastante[13], não ocorre a prescrição invocada pelos recorrentes[14].
Alegam os recorrentes: “A primeira questão que os embargantes colocaram á apreciação do tribunal, na PI de Embargos, foi a de os pagamentos efetuados desde 2015 não estarem a ser devidamente considerados uma vez que o Condomínio exequente os estaria a imputar em meses e dívidas não aceites pelos embargantes, e à revelia da opção expressamente comunicada por estes, nos termos do artigo 783.º do Codigo Civil” – conclusão 18.ª.
Dispõe o n.º 1 do referido normativo: “Se o devedor, por diversas dívidas da mesma espécie ao mesmo credor, efectuar uma prestação que não chegue para as extinguir a todas, fica à sua escolha designar as dívidas a que o cumprimento se refere”.
Por seu turno, dispõe o artigo 785.º do mencionado diploma:
1. Quando, além do capital, o devedor estiver obrigado a pagar despesas ou juros, ou a indemnizar o credor em consequência da mora, a prestação que não chegue para cobrir tudo o que é devido presume-se feita por conta, sucessivamente, das despesas, da indemnização, dos juros e do capital.
2. A imputação no capital só pode fazer-se em último lugar, salvo se o credor concordar em que se faça antes.
Estando em causa nos autos dívidas de diferentes espécies, designadamente de capital e de juros, impõe-se a aplicação da norma especial do citado artigo 785.º, valendo o regime dos artigos 783.º e 784.º do Código Civil apenas para as dívidas da mesma espécie – dívidas de capital.
Segundo os apelantes, “A douta sentença reconhece que existia o direito dos embargantes indicarem o capital que pretendiam pagar e reconhece que o condomínio exequente aceitou nuns casos e não aceitou noutros, sem se compreender o critério adotado... mas depois, a douta sentença não retira uma consequência das conclusões que alcançou”- conclusão 19.ª.
Bastará uma leitura minimamente atenta da sentença recorrida para constatar a sem razão da afirmação dos recorrentes.
Refere, a este propósito, a referida sentença: “Não há dúvidas que as embargantes fizeram diversos pagamentos. Também não há dúvidas que relativamente a alguns deles – os referidos em 20º, 21º, 33º, 34º, 37º, 39º, e 42º - o embargado não respeitou a imputação levada a cabo pela embargante.
Os pagamentos referidos em 20º, 21º, 33º, 34º e 37º pretendia a embargante que fossem imputados às dívidas mais recentes e o embargado imputou-as às dívidas da “anterior administração”
Ora importa recordar o facto provado em 18º, que mais não é do que o conteúdo de uma notificação que a Sr.ª Agente de Execução fez ao exequente, no processo executivo em em 02-11-2015: Na pendência da execução, e até 14-06- 2017 os executados procederam ao pagamento voluntário ao exequente da quantia de 1200,00 euros (100,00 euros mensais desde Novembro de 2015 até Outubro de 2016, inclusive) e a quantia de €2.000,00 foi paga à ordem do processo mediante prestações mensais de 100,00 euros e um pagamento de 800,00 euros efectuado em Fevereiro de 2017, encontrando-se em dívida, àquela data (14-06-2017), o montante de €223,38.
Ora os pagamentos referidos em 20º, 21º, 33º, 34º, 37º não são os mesmos.
A verdade é que o embargado imputou pagamentos a dívida anterior a 2007 que não se destinavam a essa dívida e depois imputou a outras dívidas pagamentos que se destinavam precisamente a essa.
Mais, depois de 10-08-2017, ou seja, depois da carta a que alude o ponto n.º 46 dos factos provados, em que a embargante expressamente diz que quer pagar as dívidas posteriores a Agosto de 2012, nos recibos referidos no ponto 42.º começa por fazer bem a imputação mas depois passa a atribuir tais valores a dívidas de 2009 e 2010, já prescritas e nunca reconhecidas.
Ou seja, a imputação é feita de forma errática e pouco clara, não sendo fácil a qualquer pessoa saber exactamente o que estava a ser pago e quando, o que aliás será a principal justificação para a existência deste litígio.
Acresce ainda que no requerimento executivo o embargado pretende «contribuições de condomínio que entretanto se vençam na pendência do presente processo.». Terá eventualmente a elas direito, mas para o caso aqui não relevam, porque para que as possa exigir terá que apresentar novo requerimento executivo e as actas que suportarão tal hipotético pedido.
Nem em tudo tem a embargante razão, porém.
O embargado tinha direito, independentemente da escolha da devedora, a pagar-se primeiro dos juros, despesas e consequências da mora, nos termos do art. 785º do Código Civil.
Ou seja, em suma, a embargante apenas pode escolher a imputação do capital. Os acessórios - juros, despesas e consequências da mora – são sempre pagos primeiro, a não ser que o credor consinta no contrário.
Por outro lado, a embargante não pode impor ao embargado um acordo de pagamento em prestações. Pode pagar o que entender, mas isso não significa que o capital seja pago a final e que continue a vencer juros e indemnizações moratórias.
Ora a embargante foi muitas vezes beneficiada porque o embargado imputou pagamentos seus a capital antes de os imputar aos juros, despesas e penalidades.
Dito isto, importa concluir: em primeiro lugar, naturalmente devem ser deduzidos os pagamentos ocorridos já na pendência da execução – os referidos em 18º, embora tal questão exorbite o objecto dos presentes embargos, antes relevando apenas para a liquidação da execução, nos termos do art. 716º, nºs 2 e 3 do Código de Processo Civil (aprovado pela Lei no 41/2013 de 26 de Junho).
Às quantias peticionadas na execução a que estes autos respeitam – a execução cumulada – devem ser subtraídas as quantias de €1.155,92 e 430,50€ - relativas aos montantes prescritos e aos honorários aqui não devidos.
Mais deve ser subtraído o montante de €56,99, relativo ao seguro de 2016 que, ao contrário do que alega, está pago – cfr. facto provado em 28.
Os remanescentes €7.704,94 estão ainda em dívida pois apesar da forma pouco clara como está exposto o requerimento executivo, resulta da “conta corrente” anexa que não estão efectivamente a ser cobrados valores já pagos, ou seja, apesar de o embargado dizer que está em dívida, por exemplo, contribuições entre 2010 e 2018, não está a cobrar todos os meses de todos esses anos, mas apenas aqueles não abrangidos pelos pagamentos documentados
Por outro lado, de modo algum se demonstra que os erros de imputação havidos prejudiquem as embargantes, precisamente porque o embargado agiu muitas vezes em prejuízo próprio, ao imputar pagamentos a capital, antes de o fazer a juros e indemnizações moratórias, e as imputações que fez à revelia da embargante, fez a dívidas mais antigas, que venciam mais juros e mais penalizações, o que só a beneficia.
Acresce ainda que, nos presentes embargos as embargantes parecem esquecer uma parte do período que medeia entre 2008 (primitiva execução) e 2015 (quando a embargante começou a pagar as contribuições com regularidade), que não está pago e que o embargado pede e ainda que nesse ínterim foram aprovadas, e não pagas, diversas contribuições extraordinárias que, entretanto, também vencem juros e penalizações”.
Não há nos autos notícia de que as deliberações constantes das actas dadas à execução hajam sido impugnadas.
E como lembra o acórdão desta Relação de 4.12.2017[15], “para que a ata da reunião da assembleia de condóminos tenha a necessária força executiva, a lei basta-se que nela se fixe:
. o montante das contribuições devidas ao condomínio;
. o prazo de pagamento das mesmas; e
. a fixação da quota-parte de cada condómino”, precisando o acórdão desta mesma Relação de 4.06.2019[16] que “A exequibilidade de uma Acta de Assembleia de Condóminos, ao abrigo do disposto no art.º 6.º do D.L. n.º 268/94, de 25/10, apenas obriga a que haja sido aprovado um montante de contribuições e/ou de despesas globais certas que, pela aplicação da permilagem relativa a cada fracção, permita a determinação do “quantum” devido a cada condómino”.
O Regulamento do Condomínio, aprovado em assembleia de condóminos, prevê as regras relativas ao cumprimento das contribuições a cargo dos condóminos, sendo definido nas várias actas deliberativas as quotizações da responsabilidade de cada um dos proprietários das fracções, quer as relativas às despesas normais de manutenção do condomínio, quer as despesas extraordinárias orçamentadas.
Ao contrário do que sustentam os recorrentes, a causa de pedir acha-se suficientemente exposta no requerimento executivo e o título executivo – actas da assembleia de condóminos – é válido e bastante para fundamentar as quantias exequendas peticionadas, à excepção das relativas às penalidades pecuniárias, como já se adiantou.
Diga-se, por fim, que a acta de 19.06.2018, referida no ponto 17.º dos factos provados, não denuncia nenhuma contradição ou incongruência, de forma a abalar a sua validade enquanto título executivo: também ao contrário do que afirmam os apelantes, a referida acta não contém uma duplicação dos valores em débito no respectivo mapa, relativamente às fracções AO e Q, não existindo coincidência/sobreposição quanto aos valores indicados, representando duas dívidas distintas, cada uma delas atribuída a um dos elementos do casal, que à data eram proprietários das indicadas fracções.
Concluindo: existe título executivo válido e bastante para fundamentar, à excepção da quantia exequenda relativa a penas pecuniárias por falta de pagamento no prazo previsto no artigo 12.º, n.º 1 do regulamento do condomínio, no valor de € 3776,02, o pagamento das demais quantias peticionadas em acção executiva, não se achando prescrito o correspondente direito de crédito.
Haverá, por isso, de proceder parcialmente o recurso, na medida em que ao valor da dívida exequenda deve ser subtraída a referida quantia de € 3776,02, em relação à qual existe falta de título executivo.
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Síntese conclusiva:
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Nestes termos, acordam os juízes desta Relação, na parcial procedência do recurso, em alterar a sentença recorrida, determinando-se que, além da redução nela determinada - €1643,41 -, seja ainda a quantia exequenda indicada no requerimento executivo apresentado a 16.11.2018 reduzida no montante de €3776,02, (três mil setecentos e setenta e seis euros e dois cêntimos, reclamado a título de penalidade pecuniária.
Custas: por apelantes e apelados, na proporção do respectivo decaimento.

Porto, 17.06.2021
Acórdão processado informaticamente e revisto pela primeira signatária.
Nos termos do artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, para os efeitos do disposto n.º artigo 153.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, atesto que o presente acórdão foi aprovado com voto de conformidade do Ex.mo Juiz Desembargador Adjunto, Dr. Aristides Almeida, que compõe este colectivo, que não pode assinar.
Judite Pires (assina digitalmente)
Aristides Almeida
Francisca Mota Vieira (assina digitalmente)
____________________________________
[1] “A Acção Executiva Depois da Reforma da Reforma”, 5ª ed., pág. 29.
[2] “Processo de Execução”, Vol. I, 3ª ed., pág. 147.
[3] Rodrigues Bastos, “Notas ao Código de Processo Civil”, vol. I, pág. 147.
[4] “A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal”, 2ª ed., pág. 319.
[5] Novos Estudos de Processo Civil, pág. 192.
[6] Código Civil Anotado (coordenação de Ana Prata), Vol. II, pág. 261.
[7] Lições de Processo Civil Executivo, 3.ª ed., págs. 146 e 147.
[8] “Teoria Geral do Direito Civil ”, 7.ª edição, pág. 327.
[9] Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, I volume, 4.ª edição, revista e actualizada, pág. 280.
[10] “ Das Obrigações em Geral ”, I volume, 6ª edição, pág. 93-97
[11] Em idêntico sentido, cfr. Menezes Leitão, “Direito das Obrigações”, I volume, 7.ª edição, pág. 137-140 e Almeida Costa, “Direito das Obrigações ”, 11ª edição, Revista e Actualizada, pág. 699-700.
[12] Processo 2648/13.4TBLLE-A.P1, www.dgsi.pt.
[13] À excepção dos valores reclamados a título de penas pecuniárias, tendo já concluído que, nessa parte, haverão de proceder os embargos, deduzindo-se à quantia exequente os valores reclamados a esse título.
[14] Também em relação às contribuições ordinárias vencidas até Julho de 2012, no valor de €1.155,92, cuja prescrição é reconhecida pela sentença recorrida, não se mostra decorrido o prazo prescricional de vinte anos, mas tal questão não pode aqui ser objecto de discussão, por não ter sido objecto de impugnação recursiva.
[15] Processo n.º 26113/15.6T8PRT-A.P1, www.dgsi.pt.
[16] Processo n.º 22996/17.3T8PRT-A.P, www.dgsi.pt.