INSOLVÊNCIA
RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS
AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ABUSO DE DIREITO
PRESCRIÇÃO DE CRÉDITO
Sumário

I - Apenas os factos essenciais justificam a ampliação da decisão de facto e não reveste tal natureza factos que não são suscetíveis de configurar um dos fundamentos da impugnação da reclamação de créditos.
II - Não atua em abuso de direito o credor que reclama o seu crédito em processo de insolvência instaurado contra o devedor e em simultâneo exige o seu pagamento do garante em processo de execução.
III - Recai sobre o credor impugnante que invocou a prescrição do crédito, com fundamento no art. 3º/1, 1ª parte do Regulamento (CE, EURATOM) nº 2988/95 do Conselho de 18 de dezembro de 1995 o ónus de alegação dos factos que configuram a exceção e a sua prova (art. 342º/2 CC).

Texto Integral

Insolv-ReclCred-IAPMEI-2219/16.3T8STS-C.P2

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SUMÁRIO[1] (art. 663º/7 CPC):
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Acordam neste Tribunal da Relação do Porto (5ª secção judicial – 3ª Secção Cível)

I. Relatório
Em 15 de julho de 2016 o Banco B…, S.A., veio em processo próprio requerer a declaração de insolvência de “C…, S.A.”, com sede na Rua …, n.º .., ….-… Maia.
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Em 28 de abril de 2017 foi proferida sentença que transitou em julgado em 22 de maio de 2017, que declarou em situação de insolvência a sociedade “C…, S.A.”, com sede na Rua …, n.º .., ….-… Maia.
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Na sentença declaratória da insolvência foi fixado o prazo de 20 dias para a reclamação de créditos.
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Decorrido o prazo da reclamação de créditos, veio o Sr. Administrador da Insolvência, ao abrigo do disposto no art. 129.º, n.º 1, do CIRE, apresentar a lista de todos os créditos por si reconhecidos – cfr. fls. 2 – e a lista de créditos não reconhecidos – cfr. fls. 4 e 5; mais juntou os documentos comprovativos do cumprimento do disposto no art. 129º, n.º 4 do CIRE, que constam a fls. 6 e seguintes.
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Da relação de créditos reconhecidos / não reconhecidos, a que alude o art. 129º, n.º 1 do CIRE, encontrava-se reconhecido ao Ministério Público, entre outros, um crédito de €259.742,68, sendo €228.824,13 de capital e €30.918,55 de juros de mora, relativo a subsídios e juros do IAPMEI – Agência para a Competitividade e Inovação, I.P..
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A lista dos credores reconhecidos / não reconhecidos foi alvo de impugnações, entre as quais, a fls. 216 e seguintes, pela insolvente C…, S.A., relativamente aos créditos de Banco B…, S.A., Banco D…, SA, E…, SA, Instituto da Segurança Social, IP, Ministério Público / Autoridade Tributária.
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Na impugnação apresentada a devedora insolvente C…, S.A. alegou que tal crédito não existe.
Para o efeito, alegou que o IAPMEI teve em seu poder garantia bancária emitida pelo F… para assegurar o crédito no valor de €551.308,50, caucionada por livrança com aval; entretanto, em tal relação contratual houve atribuição de prémio à sociedade C… e esta realizou amortização da dívida, para além dos reembolsos a que estava adstrita; deste modo, em 4.3.2015, a C… solicitou ao F… a devolução da livrança que caucionava a garantia bancária, que já expirara, tendo a mesma sido levantada pessoalmente, o que significa que todas as obrigações para com o IAPMEI estavam e estão regularizadas.
Mais alegou que se assim não se entender, o IAPMEI poderia ter reclamado o seu crédito no processo de insolvência n.º 2200/11.9TBNCT, o que não fez.
O processo de insolvência n.º 2200/11.9TBNCT, do extinto 3º Juízo do Tribunal Judicial de Viana do Castelo, por sentença proferida em 16.9.2011, foi declarado encerrado por homologação de plano de insolvência, nos termos do art. 230º, n.º 1, al. b) do CIRE, tendo por sentença de verificação e graduação de créditos proferida em 11.2.2013 sido homologada a lista dos credores reconhecidos apresentada pela então administradora da insolvência. O IAPMEI ou o Ministério Público em sua representação não reclamaram em tal processo qualquer crédito, o qual não lhe foi reconhecido, sendo certo ainda que estes também não impugnaram a relação de créditos apresentada nem apresentaram verificação ulterior de créditos.
Conclui que ao abrigo do n.º 1 do art. 91º do CIRE a declaração de insolvência determina o imediato vencimento de todas as obrigações do insolvente, pelo que cabia ao IAPMEI o ónus de reclamar o seu crédito em tal processo, o que não fez, pelo que não existindo qualquer crédito, nenhum crédito pode ser reconhecido a este instituto.
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Proferiu-se despacho que convidou a devedora impugnante a aperfeiçoar a impugnação e no uso de tal faculdade veio a devedora C…, S.A. alegar que o crédito reconhecido pelo Sr. Administrador da Insolvência diz respeito a parte do capital do incentivo recebido ao abrigo do contrato de financiamento n.º ../../…/........, mediante o qual o IAPMEI lhe atribuiu uma comparticipação financeira com natureza de subsídio reembolsável no valor de 1.102.617,00€, comparticipação esta atribuída no âmbito dos fundos comunitários do QREN, Programa SIME II – Sistema de Incentivos à Modernização Empresarial; tal incentivo deveria ser reembolsado pela insolvente em dez prestações semestrais com início em 31.7.2009 e termo em 31.9.2014.
A insolvente amortizou €87.359,46, em 21.4.2010 e €18.380,55 em 6.8.2020. Em 21.7.2010, o IAPMEI atribuiu um prémio no valor de €237.741,02, que se traduz no não reembolso deste montante, tendo o incentivo reembolsável ficado reduzido a €759.135,97. Em 23.3.2013, o IAPMEI atribuiu novo prémio à devedora insolvente, ora no valor de €530.311,83, com o que o incentivo reembolsável ficou reduzido ao montante €228.824,13.
Em 16.9.2011 foi proferida no processo de insolvência n.º 2200/11.9TBNCT sentença de insolvência da ora devedora /insolvente e o crédito do IAPMEI não foi em tal processo reclamado ou reconhecido, tendo a sentença de homologação do Plano de Insolvência aprovado transitado em julgado em 17.7.2012.
O prazo para ser pedida a devolução das quantias irregularmente recebidas no âmbito da atribuição de ajudas comunitárias é o previsto no art. 3º, n.º 1 do Regulamento (CE Euratom) n.º 2988/95, do Conselho, de 18.12, ou seja, de 4 anos, sob pena de prescrição do respetivo procedimento de regularização. Tal prazo conta-se a partir da data em que foi praticada a irregularidade ou, no caso de irregularidade continuada, a partir da data de cessação da mesma (cfr. art. 3º, n.º 1 do Regulamento).
Na data do último pagamento, 6.8.2010, a insolvente entrou em incumprimento do plano de reembolso do incentivo atribuído, nada mais tendo liquidado ao IAPMEI. Em 2.9.2015, data em que o IAPMEI instaurou o processo executivo para obter a devolução do incentivo atribuído à devedora / insolvente, já havia decorrido o prazo de prescrição, por força do citado art. 3º, n.º 1 do Regulamento, razão pela qual tal crédito está prescrito.
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Por decisão proferida em 15 de março de 2018 foi julgada procedente a impugnação deduzida por C…, S.A., no que ao crédito reconhecido ao IAPMEI concerne, excluindo-se tal crédito da lista de créditos reconhecidos.
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Por acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido em 30 de abril de 2020, proferiu-se a seguinte decisão:
“Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar procedente a apelação e nessa conformidade:
- determinar a notificação do IAPMEI, IP para responder, querendo, à impugnação inicial e à impugnação aperfeiçoada, nos termos e para os efeitos do art. 131º/2/3 CIRE, no prazo de 10 dias, sob pena de a impugnação ser julgada procedente;
- anular o despacho que se seguiu, proferido em 15 de março de 2018 ( data da conclusão 08 de março de 2018 – Ref. Citius 390484577) na parte que julgou procedente a impugnação e não reconheceu o crédito de IAPMEI, IP;
- anular o segmento da sentença de graduação, que não considerou a eventual graduação deste crédito, o qual deve ser incluído na graduação, caso venha a ser julgado verificado e reconhecido”.
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Após baixa dos autos ao tribunal de 1ª instância, notificou-se o credor IAPMEI da impugnação e para querendo responder.
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Em sede de resposta, o IAPMEI confirmou a celebração do contrato n.º ../../…/........, no âmbito do qual foi atribuído à ora insolvente uma comparticipação financeira com natureza de subsídio reembolsável no valor de €1.102.617,00, subsídio que deveria ser reembolsado em 10 prestações semestrais, com início em 31.7.2009 e termo em 31.1.2014.
Mais confirmou que a C… amortizou €87.359,46 em 21.4.2010 e em 6.8.2010 amortizou €18.380,55, montantes imputados ao pagamento do capital em dívida.
Confirmou igualmente que em 21.7.2010 foi decidido a atribuição de um prémio à C…, no valor de €237.741,02, que se traduz no não reembolso deste montante; e que em 23.2.2013 foi decidido a atribuição de um novo prémio à C…, ora no valor de €530.311,83, que também se traduz no não reembolso de tal montante; deste modo, o capital em dívida consolidou-se em €228.824,13.
O credor confirmou também a pendência do processo de insolvência n.º 2200/11.9TBNCT, onde os credores aprovaram um Plano de Insolvência, o qual previa que relativamente aos credores com garantia de terceiros o pagamento do capital se efetuasse em 16 prestações semestrais sucessivas e crescentes, vencendo-se a 1ª dois anos depois do trânsito em julgado da sentença homologatória do plano.
O crédito do IAPMEI, apesar de não reclamado em tal processo nem reconhecido, tem de observar o indicado plano, atento o disposto no art. 217º, n.º 1 do CIRE. A sentença de homologação do plano transitou em 17.7.2012, pelo que o pagamento das indicadas prestações semestrais iniciaram-se em 17.7.2014. Acresce que por carta datada de 12.1.2015, o IAPMEI interpelou a C… para o pagamento da 1ª prestação, o que esta não concretizou, pelo que se consideraram vencidas todas as prestações de capital (art. 781ºdo CC). Os juros de mora vencidos desde 17.7.2014 até 15.4.2015 ascendem a €5.692,06, tendo sido emitida a competente certidão de dívida que é título executivo nos termos do art. 14º, n.º 2 do D.L. n.º 266/2012, de 28/12.
Mais alegou que o seu crédito não se encontra prescrito, nos termos do Regulamento (CE EURATOM) n.º 2988/95 do Conselho de 18/12, já que este regulamento não se aplica ao caso presente, já que o crédito do IAPMEI provem de subsídio reembolsável em mora e não de incentivo não reembolsável e só nestes casos é que ocorre a irregularidade que tem como consequência a rescisão do contrato, que equivale à sanção administrativa de que fala o supra mencionado normativo.
No que concerne à alegação da inexistência do crédito por via da devolução da garantia bancária por parte da entidade bancária emitente não assiste razão à impugnante, pois a simples devolução da garantia não extingue o crédito, sendo ademais certo que até corre termos no processo n.º 1118/18.8BELRS, na Unidade Orgânica 2 do Tribunal Tributário de Lisboa, oposição deduzida pelo Banco G…, SA à execução fiscal instaurada pelo IAPMEI onde reclama o mesmo montante reclamado nestes autos, oposição que mereceu contestação deste, aguardando-se sentença.
Mais alega que o facto de o IAPMEI não ter reclamado o seu crédito no processo de insolvência n.º 2200/11.9TBNCT não extingue o ora reclamado e reconhecido crédito.
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Designou-se data para tentativa de conciliação e realizada a diligência, as partes mantiveram a posição assumida nos articulados o que tornou inviável qualquer acordo.
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Em sede de saneador proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve:
“Por tudo o exposto, julga-se improcedente a impugnação apresentada pela insolvente relativamente aos créditos reclamados pelo Ministério Publico em nome de IAPMEI, julgando-se verificados o crédito que consta da relação de créditos elaborada pelo Sr. Administrador da Insolvência e junta aos autos em 12.7.2017, a saber: um crédito de €259.742,68, sendo €228.824,13 de capital e €30.918,55 de juros de mora.
Custas a cargo da insolvente”.
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A devedora/insolvente C…, S.A. veio interpor recurso da sentença.
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Nas alegações que apresentou a apelante formulou as seguintes conclusões:
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Termina por pedir o provimento do recurso, com revogação da sentença.
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O credor IAPMEI veio apresentar resposta ao recurso, na qual considerou que a alteração da decisão de facto não se mostra relevante e por isso, deve ser indeferida e a sentença, na apreciação que faz do mérito não merece censura.
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O recurso foi admitido como recurso de apelação.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II. Fundamentação
1. Delimitação do objeto do recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso – art. 639º do CPC.
As questões a decidir:
- ampliação da matéria de facto;
- da consideração de novos fundamentos de sustentação da defesa;
- do abuso de direito;
- prescrição do crédito.
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2. Os factos
Com relevância para a apreciação das conclusões de recurso cumpre ter presente os seguintes factos provados no tribunal da primeira instância:
1.Entre o Instituto de Apoio a Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento e a C…, SA foi celebrado o contrato n.º ../../…/........, no âmbito do qual foi atribuído a esta sociedade um incentivo financeiro reembolsável no valor de €1.102.617,00, nos termos do documento de fls. 563 e seguintes e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos.
2. O incentivo financeiro reembolsável referido em 2 deveria ser reembolsado em 10 prestações semestrais, com início em 31.7.2009 e termo em 31.1.2014.
3. Em 21.4.2010, a C…, SA amortizou €87.359,46.
4. Em 6.8.2010, a C…, SA amortizou €18.380,55.
5. Em 21.7.2010 foi decidida a atribuição de um prémio à C…, SA, no valor de €237.741,02, que se traduziu no não reembolso deste montante.
6. Em 23.2.2013 foi decidida a atribuição de um novo prémio à C…, SA, no valor de €530.311,83, que se traduz no não reembolso de tal montante.
7. Considerando o referido em 3, 4, 5 e 6, o incentivo referido em 1 reduziu-se a €228.824,13.
8. O IAPMEI teve em seu poder uma garantia bancária emitida pelo F… para assegurar o crédito no valor de €551.308,50, caucionada por livrança com aval.
9. Em 4.3.2015 a C…, SA solicitou ao F… a devolução da livrança referida em 8, a qual foi por aquela levantada pessoalmente nas instalações deste.
10. No extinto 3º Juízo Cível do Tribunal de Viana do Castelo correu termos o processo de insolvência de C…, SA, sob o n.º 2200/11.9TBNCT.
11. No processo referido em 10 os credores aprovaram um Plano de Insolvência, o qual previa, relativamente aos credores com garantia de terceiros, o pagamento do capital em 16 prestações semestrais sucessivas e crescentes, vencendo-se a primeira dois anos depois do trânsito em julgado da sentença homologatória do plano.
12. A sentença de homologação do plano transitou em 17.7.2012.
13. O IAPMEI não reclamou o seu crédito no processo de insolvência referido em 10.
14. Por carta datada de 12.1.2015, o IAPMEI interpelou a C…, SA para o pagamento da 1ª prestação do seu crédito, vencida em 17.7.2014.
15. A C…, SA não efetuou o pagamento reclamado nos termos referidos em 14.
16. Os juros de mora vencidos desde 17.7.2014 até 15.4.2015 ascendem a €5.692,06.
17. Com data de 30.7.2015 foi emitida pelo IAPMEI certidão de dívida nos termos do art. 14º, n.º 2 do D.L. n.º 266/2012, de 28/12, de onde consta ser a empresa C…, SA devedora do montante de €228.824,13, respeitante a parte do capital do incentivo recebido por força da assinatura do contrato n.º ../../…/........ no âmbito do Sistema de Incentivos à Modernização Empresarial (SIME), e do montante de €5.692,06, respeitante a juros contratuais contados desde 17.7.2014 até 15.4.2015 sobre o capital referido antes.
18. Em 2.9.2015, o IAPMEI instaurou contra a C…, SA processo executivo para obter a devolução do incentivo atribuído à devedora / insolvente.
19. Em 12.7.2017 foi junta aos presentes autos a relação de créditos reconhecidos elaborada nos termos do art. 129º, n.º 1 do CIRE, de onde consta, ademais, o seguinte crédito, reconhecido ao Ministério Público: €259.742,68, sendo €228.824,13 de capital e €30.918,55 de juros de mora, relativo a subsídios e juros do IAPMEI – Agência para a Competitividade e Inovação, I.P.
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3. O direito
- Ampliação da Matéria de Facto -
Nas conclusões de recurso, sob o ponto 1 e 2, pretende a apelante que se proceda à alteração da decisão de facto, no sentido de se considerar provada a matéria alegada pelo credor sob o art. 21º, na resposta à impugnação.
A apelada considera que os factos em causa não merecem qualquer relevo para a apreciação da concreta questão de direito, mas não se opõe à inclusão de tal matéria nos factos provados, por corresponder à efetiva situação de facto.
Cumpre apreciar se se justifica a ampliação da decisão de facto.
Resulta da resposta à impugnação (22 de junho de 2020-ref. Citius 26076312), sob o art. 21º, a alegação dos seguintes factos:
-“É manifesto que o crédito do IAPMEI sobre a insolvente não se extinguiria jamais pelo facto de o garante desse crédito lhe devolver a garantia bancária, mas sempre se dirá que corre termos nos autos do processo nº 1118/18.9BELRS, pela Unidade Orgânica 2 do Tribunal Tributário de Lisboa oposição deduzida pelo G… à execução fiscal instaurada pelo respondente pela qual o IAPMEI lhe reclama o mesmo montante reclamado nos autos”.
Nos termos do art. 666º/2 c) CPC mostrando-se indispensável ampliar a matéria de facto, deve o tribunal da Relação alterar a decisão da matéria de facto, se a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Não sendo possível fazer uso de tal faculdade, deve o tribunal anular a decisão.
A ampliação da matéria de facto mostra-se indispensável, quando se tenham omitido dos temas da prova factos alegados pelas partes que se revelam essenciais para a resolução do litígio, na medida em que assegurem enquadramento jurídico diverso do suposto pelo juiz do tribunal “a quo”[2].
Os factos essenciais são aqueles que permitem individualizar a situação jurídica alegada na ação ou na exceção.
Os factos complementares são aqueles que são indispensáveis à procedência dessa ação ou exceção, mas não integram o núcleo essencial da situação jurídica alegada pela parte.
Ambos integram a categoria de factos principais porque são necessários à procedência da ação ou exceção, por contraposição aos factos instrumentais, probatórios ou acessórios que são aqueles que indiciam os factos essenciais e que podem ser utilizados para a prova indiciária destes últimos[3].
Em conformidade com o critério legal, a ampliação da matéria de facto tem de ser indispensável, o que significa que cumpre atender às várias soluções plausíveis de direito, o enquadramento jurídico em face do objeto do recurso e ainda, com a possível intervenção e interpretação do Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do art. 682º/3 CPC.
No caso concreto, ponderando os fundamentos da impugnação, a matéria que se pretende incluir nos factos provados não merece qualquer relevo, para além de não estar comprovada com a respetiva certidão do processo.
Com efeito, a apelante-impugnante circunscreveu a sua defesa às seguintes questões, delimitadas na sentença nos seguintes termos:
“- A C… solicitou ao F… a devolução da livrança que caucionava a garantia bancária referida na Cláusula Nona do acordo celebrado com o IAPMEI, que já expirara, tendo a mesma sido levantada pessoalmente, o que significa que todas as obrigações para com o IAPMEI estavam e estão regularizadas;
- O IAPMEI poderia e deveria ter reclamado o seu crédito no processo de insolvência n.º 2200/11.9TBNCT, o que não fez, tendo tal processo sido encerrado com a homologação do plano de insolvência, nos termos do art.230º, n.º 1, al. b) do CIRE, em sentença proferida em 16.9.2011 e transitada em julgado em 17.7.2012; assim, porque o n.º 1 do art. 91º do CIRE determina que a declaração de insolvência determina o imediato vencimento de todas as obrigações do insolvente, cabia ao IAPMEI o ónus de reclamar o seu crédito em tal processo, o que não fez, pelo que não existindo qualquer crédito, nenhum crédito pode ser reconhecido a este instituto;
- O prazo para ser pedida a devolução das quantias irregularmente recebidas no âmbito da atribuição de ajudas comunitárias é o previsto no art.3º, n.º 1 do Regulamento (CE EURATOM) n.º 2988/95, do Conselho, de 18.12, ou seja, de 4 anos, sob pena de prescrição do respetivo procedimento de regularização; tal prazo conta-se a partir da data em que foi praticada a irregularidade ou, no caso de irregularidade continuada, a partir da data de cessação da mesma (cfr. art. 3º, n.º 1 do Regulamento); na data do último pagamento, 6.8.2010, a insolvente entrou em incumprimento do plano de reembolso do incentivo atribuído, nada mais tendo liquidado ao IAPMEI; em 2.9.2015, data em que o IAPMEI instaurou o processo executivo para obter a devolução do incentivo atribuído à devedora / insolvente, já havia decorrido o prazo de prescrição, por força do citado art. 3º, n.º 1 do Regulamento, razão pela qual tal crédito está prescrito”.
Estava em causa apurar se pelo facto de ter sido devolvida a livrança que foi emitida com a garantia bancária, as obrigações para com o IAPMEI se extinguiram. Em momento algum o devedor/apelante suscitou a questão da pendência de processo instaurado pelo credor contra o garante e repercussão d etal processo na reclamação.
A alegação que surge sob o art. 21º da resposta vem rebater os fundamentos da impugnação do devedor, quanto a esta concreta questão, e por isso, se alega que:
-“É manifesto que o crédito do IAPMEI sobre a insolvente não se extinguiria jamais pelo facto de o garante desse crédito lhe devolver a garantia bancária, mas sempre se dirá que corre termos nos autos do processo nº 1118/18.9BELRS pela Unidade Orgânica 2 do Tribunal Tributário de Lisboa oposição deduzida pelo G… à execução fiscal instaurada pelo respondente pela qual o IAPMEI lhe reclama o mesmo montante reclamado nos autos”.
Pretende o credor demonstrar que a garantia não se extinguiu e até foi acionada. Não consta dos autos certidão do referido processo, que comprove a matéria alegada. Mas independentemente de tal aspeto formal, não merece qualquer relevo o facto em causa, por não constituir fundamento da impugnação, mesmo ponderando as diferentes soluções plausíveis de direito, pois na posição defendida pela apelante a extinção do crédito decorre da devolução da livrança e não da instauração de uma qualquer ação de cobrança do crédito junto do garante.
Conclui-se, que não se justifica proceder à ampliação da decisão de facto, por não estar em causa a apreciação de um facto essencial ou compelmentar, tendo presente os fundamentos da impugnação do crédito.
Improcedem as conclusões de recurso, sob o ponto 1 e 2.
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- Da extinção do crédito, por ter sido acionada a garantia -
No ponto 3 das conclusões de recurso, a apelante argumenta que o crédito reclamado nos autos pelo IAPMEI não existe, porque o instituto decidiu cobrá-lo acionando a garantia emitida pelo F….
Apenas em sede de alegações de recurso suscita a apelante tal questão, como facto extintivo do crédito reclamado pelo credor IAPMEI.
O recurso consiste no pedido de reponderação sobre certa decisão judicial, apresentada a um órgão judiciariamente superior ou por razões especiais que a lei permite fazer valer[4]. O recurso ordinário (que nos importa analisar para a situação presente) não é uma nova instância, mas uma mera fase (eventualmente) daquela em que a decisão foi proferida.
O recurso é uma mera fase do mesmo processo e reporta-se à mesma relação jurídica processual ou instância[5]. Dentro desta orientação tem a nossa jurisprudência[6] repetidamente afirmado que os recursos visam modificar decisões e não criar soluções sobre matéria nova.
O tribunal de recurso vai reponderar a decisão tal como foi proferida.
Podemos concluir que os recursos destinam-se em regra a reapreciar decisões proferidas e não a analisar questões novas, apenas se excetuando: o caso da verificação de nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia (artigo 615º, nº 1, alínea d), do CPC); a existência de questão de conhecimento oficioso; a alteração do pedido, em segunda instância, por acordo das partes (artigo 272º do CPC); e a mera qualificação jurídica diversa da factualidade articulada.
Verifica-se que os factos e novos argumentos que a apelante vem introduzir nas conclusões do recurso não podem ser considerados, pois constituem factos novos, já que em sede de impugnação não foram alegados.
Se os novos factos e os novos fundamentos de sustentação da defesa resultaram da discussão da causa, recaía sobre as partes ao abrigo do art. 5º/3 CPC, suscitar junto do tribunal “a quo“, a sua consideração em sede de decisão, o que também não ocorreu ou fazer uso do articulado superveniente.
Conclui-se, assim, nos termos do art. 627º CPC que nenhuma relevância merece, nesta sede, os factos novos que o apelante vem alegar e bem assim, os novos fundamentos de sustentação da impugnação do crédito, pois os mesmos não foram considerados na decisão objeto de recurso e não são de conhecimento oficioso, sendo certo que ao tribunal de recurso apenas cumpre reapreciar as matérias anteriormente sujeitas à apreciação do tribunal “a quo“ ficando por isso vedado a apreciação de novos fundamentos de sustentação do pedido (matéria não anteriormente alegada). Tal como o juiz da 1ª instância, em sede de recurso, o tribunal “ad quem“ está limitado pelo pedido e seus fundamentos e pela defesa tal como configurados na ação, motivo pelo qual está impedido de conhecer do objeto do recurso nesta parte.
Improcedem, assim, as conclusões de recurso sob os pontos 3.
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- Do abuso de direito -
Nos pontos 4 e 5 das conclusões de recurso defende o apelante que constitui abuso de direito a reclamação do mesmo crédito em diferentes processos e contra diferentes devedores.
A exceção de abuso de direito constitui matéria de conhecimento oficioso e ainda que não suscitada junto do tribunal de 1ª instância, pode e deve ser apreciada pelo tribunal de recurso perante os concretos elementos que resultam dos autos.
O apelado-credor reclamante reportou a pendência de um processo contra o garante da obrigação e resulta dos termos do contrato celebrado a constituição de garantia bancária (ponto 1 dos factos provados).
Defende a apelante que se revela abusiva a demanda do devedor e do garante.
Porém, em tese geral, tal situação tem plena cobertura legal, perante a declaração de insolvência do devedor, neste processo e num outro, anterior.
O abuso de direito, nos termos do art. 334º CC, consiste no exercício ilegítimo de um direito.
Considera-se ilegítimo o exercício de um direito “quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.
PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA referem que: “[a] nota típica do abuso do direito reside, por conseguinte, na utilização do poder contido na estrutura do direito para a prossecução de um interesse que exorbita do fim próprio do direito ou do contexto em que ele deve ser exercido“[7].
ALMEIDA COSTA refere a este respeito que: “exige-se, um abuso nítido: o titular do direito deve ter excedido manifestamente esses limites impostos ao seu exercício[8].
Para apurar se as partes envolvidas no negócio agiram segundo os ditames da boa-fé cumpre ao juiz considerar: “as exigências fundamentais da ética jurídica, que se exprimem na virtude de manter a palavra e a confiança, de cada uma das partes proceder honesta e lealmente, segundo uma consciência razoável, para com a outra parte, interessando as valorações do círculo social considerado, que determinam expectativas dos sujeitos jurídicos.” De igual modo, “não se pode esquecer o conteúdo do princípio da boa fé objetivado pela vivência social, a finalidade intentada com a sua consagração e utilização, assim como a estrutura da hipótese em apreço”[9].
Com base no abuso de direito, o lesado pode “requerer o exercício moderado, equilibrado, lógico, racional do direito que a lei confere a outrem; o que não pode é, com base no instituto, requerer que o direito não seja reconhecido ao titular, que este seja inteiramente despojado dele”[10].
Decorre dos termos do contrato referenciado sob o ponto 1 dos factos provados, que o crédito goza de garantia bancária autónoma (cláusula nona).
A garantia bancária autónoma constitui um negócio atípico, que assenta os seus fundamentos na liberdade contratual ( art. 405º CC ).
Esta figura distingue-se das demais garantias bancárias, como sejam a fiança bancária, o penhor bancário e a carta de conforto.
Na garantia bancária autónoma a instituição bancária vem garantir pessoalmente a satisfação de uma obrigação assumida por terceiro, independentemente da validade ou eficácia desta obrigação e dos meios de defesa que a ela possam ser opostos, assegurando que o credor obterá sempre o resultado do recebimento dessa prestação[11].
Na análise do regime do instituto a doutrina distingue três relações:
- relação de cobertura, entre o garantido, dador de ordem e o garante, no âmbito da qual este se compromete, normalmente mediante retribuição, a prestar a garantia;
- relação de atribuição, entre o dador de ordem e o beneficiário da garantia, que justifica a sua concessão;
- relação de execução, entre o garante e o beneficiário da garantia, que consiste precisamente na prestação da garantia[12].
Como observam ROMANO MARTINEZ e FUZETA DA PONTE: “[o] garante, perante o credor, responsabiliza-se pelo pagamento de uma obrigação própria e não pelo cumprimento de uma dívida alheia (do garantido); não se trata tanto de garantir o cumprimento da obrigação do devedor, mas antes de assegurar o interesse económico do credor beneficiário da garantia”[13].
Trata-se de um negócio causal, com uma função económico-social própria: a função de garantia.
Desde que se verifiquem os pressupostos para acionar a garantia, pode o credor demandar o garante, sem ter que aguardar pela excussão dos bens do devedor.
Analisada a questão, num outro prisma e considerando o regime especifico da insolvência, obtém-se a mesma conclusão.
Decorre do regime geral da solidariedade, nos termos do art. 518º CC, que “ ao devedor solidário demandado não é lícito opor o benefício da divisão; e, ainda que chame os outros devedores à demanda, nem por isso se libera da obrigação de efetuar a prestação por inteiro. “
Por outro lado, nos termos do art. 519º CC, assiste ao credor: “ o direito de exigir de qualquer dos devedores toda a prestação, ou parte dela, proporcional ou não à quota do interpelado; mas, se exigir judicialmente a um deles a totalidade ou parte da prestação, fica inibido de proceder judicialmente contra os outros pelo que ao primeiro tenha exigido, salvo se houver razão atendível, como a insolvência ou risco de insolvência do demandado, ou dificuldade, por outra causa, em obter dele a prestação. “
Resulta da conjugação dos preceitos que a declaração da situação de insolvência de um dos obrigados solidários, não impede que o credor exerça judicialmente os seus direitos contra os demais, pela totalidade da divida.
Acresce que o Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas apenas exceciona as situações em que vários devedores solidários estão declarados em situação de insolvência.
Com efeito, determina o art. 95º/1 do citado diploma: “O credor pode concorrer pela totalidade do seu crédito a cada uma das diferentes massas insolventes de devedores solidários e garantes, sem embargo de o somatório das quantias que receber de todas elas não poder exceder o montante do crédito. “
Em anotação ao preceito escrevem JOÃO LABARDA E CARVALHO FERNANDES: “[n]este caso, tendo em conta que o regime de solidariedade passiva atribui ao credor o poder de receber de qualquer dos obrigados a totalidade do seu crédito, a lei processual confere-lhe a faculdade de, em cada um dos respetivos processos de insolvência, reclamar tudo quanto lhe é devido. Mas, por outro lado, não lhe cabendo receber mais do que isso, o credor não pode, pela soma dos vários pagamentos que lhe sejam feitos em cada processo, alcançar montante superior ao do seu direito”[14].
Os mesmos AUTORES consideram, que o art. 95º/1 contém uma regra desnecessária “[…] na parte em que impede o credor de receber mais do que lhe é devido. Na verdade, independentemente da saúde económica dos obrigados solidários ou garantes, nunca o credor poderia receber deles mais do que a prestação a que, pela globalidade, tem direito.
O preceito consolida, porém, a exceção aberta na parte final do nº1 do art. 519º do CC, quanto à possibilidade de o credor reclamar autonomamente, em cada um dos processos de insolvência, a totalidade do seu crédito[15].
Por sua vez o art. 179º do mesmo diploma, prevê quanto ao pagamento no caso de devedores solidários: “ Quando, além do insolvente, outro devedor solidário com ele se encontre na mesma situação, o credor não recebe qualquer quantia sem que apresente certidão comprovativa dos montantes recebidos nos processos de insolvência dos restantes devedores; o administrador da insolvência dá conhecimento do pagamento nos demais processos.”
Daqui decorre que quando apenas um dos devedores solidários está declarado em situação de insolvência o credor não fica impedido de exigir o pagamento do seu crédito, pela totalidade, dos demais coobrigados ou garantes, devedores solidários, impondo-se apenas que dê conhecimento no processo de insolvência das quantias recebidas[16].
Perante tal quadro legal o credor não está impedido de reclamar o seu crédito no processo de insolvência, apesar de manter ou ter instaurado ação contra o garante não insolvente.
Acresce que no caso concreto, como decorre dos pontos 10 a 12 dos factos provados, havia já sido instaurado contra o devedor insolvente um processo de insolvência, no qual foi aprovado e homologado por sentença um plano de insolvência.
Como decorre do art. 217º/4 do CIRE: ”as providências previstas no plano de insolvência com incidência no passivo do devedor não afetam a existência nem o montante dos direitos dos credores da insolvência contra os codevedores ou os terceiros garantes da obrigação, mas estes sujeitos apenas podem agir contra o devedor em via de regresso nos termos em que o credor da insolvência pudesse exercer contra ele os seus direitos”.
Deste regime decorre que aprovado e homologado o plano de insolvência nada impede que se demande o terceiro garante da obrigação exigindo a totalidade do crédito.
O direito assim exercido sendo legitimo e dentro dos limites impostos pela boa fé, não justifica qualquer restrição ou limite e por isso não se revela abusivo o seu exercício.
Improcedem, também nesta parte, as conclusões de recurso, sob os pontos 4 e 5.
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- Prescrição do crédito -
Nos pontos 6 a 12 das conclusões de recurso, a apelante insurge-se contra o segmento da sentença que julgou improcedente a exceção de prescrição.
Considera o apelado que o Regulamento (CE Euratom) nº 2988/95 do Conselho de 18 de dezembro não se aplica ao caso e que os fundamentos da decisão não merecem censura.
Está em causa apurar se o crédito reclamado pelo IAPMEI se mostra prescrito por aplicação da regra contida no art. 3º/1 do Regulamento (CE Euratom) nº 2988/95 do Conselho de 18 de dezembro.
Na sentença julgou-se improcedente a exceção, com os fundamentos que se transcrevem:
“Por fim, quanto ao terceiro e último argumento apresentado pela insolvente, relacionado com a prescrição do crédito em apreço, entende a mesma que prazo para ser pedida a devolução das quantias irregularmente recebidas no âmbito da atribuição de ajudas comunitárias é o previsto no art. 3º, n.º 1 do Regulamento (CE EURATOM) n.º 2988/95, do Conselho, de 18.12, ou seja, de 4 anos, sob pena de prescrição do respetivo procedimento de regularização; tal prazo conta-se a partir da data em que foi praticada a irregularidade ou, no caso de irregularidade continuada, a partir da data de cessação da mesma (cfr. art. 3º, n.º 1 do Regulamento); na data do último pagamento, 6.8.2010, a insolvente entrou em incumprimento do plano de reembolso do incentivo atribuído, nada mais tendo liquidado ao IAPMEI; consequentemente, em 2.9.2015, data em que o IAPMEI instaurou o processo executivo para obter a devolução do incentivo atribuído à devedora / insolvente, já havia decorrido o prazo de prescrição, por força do citado art.3º, n.º 1 do Regulamento, razão pela qual tal crédito está prescrito.
Entende o IAPMEI, no entanto, que não assiste razão à insolvente, não estando o crédito reclamado e reconhecido extinto por prescrição, nos termos do Regulamento (CE EURATOM) n.º 2988/95 do Conselho de 18/12, já que este regulamento não se aplica ao caso presente, pois o seu crédito provem de subsídio reembolsável em mora e não de incentivo não reembolsável e só nestes casos é que ocorre a irregularidade que tem como consequência a rescisão do contrato, que equivale à sanção administrativa de que fala o supra mencionado normativo.
O Regulamento (CE EURATOM) n.º 2988/95 do Conselho de 18/12, relativo à proteção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, adotou uma regulamentação geral em matéria de controlos homogéneos e de medidas e sanções administrativas relativamente a irregularidades no domínio do direito comunitário (art. 1º, n.º 1).
De acordo com o art. 3º, n.º 1 de tal regulamento, o prazo de prescrição do procedimento é de quatro anos a contar da data em que foi praticada a irregularidade referida no nº 1 do artigo 1º, contando-se tal prazo, quanto às irregularidades continuadas ou repetidas, desde o dia em que cessou a irregularidade.
No entanto, a prescrição do procedimento é interrompida por qualquer ato, de que seja dado conhecimento à pessoa em causa, emanado da autoridade competente, tendo em vista instruir ou instaurar procedimento por irregularidade, começando a correr novo prazo de prescrição a contar de cada interrupção.
Tendo em consideração o exposto e se considerarmos, como a insolvente, que a mesma incumpriu com o contrato celebrado com o IAPMEI em 6.8.2010 (data em que pagou a última prestação semestral), o crédito em causa teria prescrito em 6.8.2014, pelo que, quanto em 2.9.2015 foi instaurada por este instituto a ação executiva com vista a recuperar o crédito devido, já estaria o mesmo prescrito.
Sucede que com a aprovação do plano de insolvência no processo de insolvência n.º 2200/11. 9TBNCT do extinto 3º Juízo Cível do Tribunal de Viana do Castelo, ainda que o crédito do IAPMEI não tenha aí sido reclamado, ficou o mesmo vinculado aos seus termos e alterações introduzidas a todos os créditos (cfr. art. 217º, n.º 1 do CIRE. Deste modo, o seu indicado crédito haveria de ser pago em 16 prestações semestrais, sucessivas e crescentes, vencendo-se a primeira dois anos após o trânsito em julgado da sentença homologatória do Plano de Insolvência, o qual ocorreu em 17.7.2012.
Assim, a primeira das 16 prestações do indicado crédito haveria de ser paga em 17.7.2014, o que não sucedeu, pelo que o IAPMEI interpelou a C… ao seu pagamento por carta datada de 12.1.2015.
Em face do exposto e por via das alterações introduzidas aos créditos sobre a insolvência, que vincularam o IAPMEI, não é possível afirmar-se que em 6.8.2014 ou mesmo em 2.9.2015 já haviam decorrido os 4 anos de prescrição previstos no art. 3º, n.º 1 do Regulamento (CE EURATOM) n.º 2298/95 do Conselho de 18/12; os indicados 4 anos apenas culminaram em 17.7.2018, sendo contudo certo que, por via da execução instaurada em 2.9.2015, tal prazo sempre se teria interrompido.
Esta conclusão retira valor à defesa do IAPMEI, no sentido de que o Regulamento (CE EURATOM) N.º 2298/95, do Conselho de 18.12 se aplica tão só a incentivos não reembolsáveis, estando na origem do crédito reclamado um incentivo reembolsável e juros contratuais.
Na verdade, sabendo-se que as normas regulamentares constantes dos Regulamentos Comunitários são de aplicação obrigatória e imediata na ordem jurídica nacional, passando a fazer parte da mesma com um valor na respetiva hierarquia, considerando ainda o primado das normas de direito comunitário, e tendo-se concluído que à luz do indicado art. 3º, n.º 1 do Regulamento citado o crédito aqui em causa não se encontra prescrito nem se encontrava prescrito à data em que foi reclamado / reconhecido pelo Sr. Administrador da Insolvência, torna-se menos importante apurar se tal Regulamento se aplica apenas a incentivo não reembolsável, sendo que só neste caso é que ocorre a irregularidade que tem como consequência a rescisão do contrato, que equivale à sanção administrativa de que fala o supra mencionado normativo.
Em face do exposto, falece igualmente este terceiro e último argumento apresentado pela insolvente”.
Entendemos que se deve julgar improcedente a exceção, ainda que não se acompanhe todos os fundamentos expostos na sentença.
Nos termos do art. 298º CC ficam sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição. Assim, como regra, todos os direitos estão sujeitos a prescrição.
A prescrição tem por fundamento específico a recusa de proteção a um comportamento contrário ao direito, a negligência do titular e ainda, a necessidade de obviar, em face do decurso do tempo, à dificuldade de prova por parte do sujeito passivo da relação jurídica.
O prazo de prescrição destina-se a servir a segurança e certeza da ordem jurídica, pondo-se assim termo a situações contrárias ao direito e à prejudicial ou perturbante dilação do seu exercício[17].
A prescrição pode definir-se como a extinção dos direitos em consequência do seu não exercício durante certo lapso de tempo e daqui decorre que completada a prescrição, o beneficiário tem a faculdade de recusar o cumprimento da obrigação ou de se opor ao exercício do direito prescrito (art. 304º CC )[18].
Contudo, a prescrição para ser eficaz necessita de ser invocada, por aquele a quem aproveita ou seu representante e tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público, não sendo pois de conhecimento oficioso – art. 303º CC. Se tiver decorrido o prazo de prescrição e não sendo suscitada, mantém-se o devedor adstrito ao cumprimento.
Constitui uma exceção de carácter pessoal devendo ser invocada por quem dela pretenda beneficiar.
Em regra, os efeitos da interrupção da prescrição limitam-se ao direito e às pessoas em relação às quais a prescrição é interrompida.
Constituindo a prescrição matéria de exceção recai sobre a parte que a invoca o ónus da prova da sua ocorrência ( art. 342º/2 CC).
Recaía sobre o apelante o ónus da prova dos factos que configuram a exceção, o que não logrou provar e os argumentos desenvolvidos nas conclusões de recurso não podem ser atendidos, por não terem sustentação no regime legal aplicado ao caso, pelos motivos que se passam a expor.
As normas regulamentares constantes dos Regulamentos Comunitários são de aplicação obrigatória e imediata na ordem jurídica nacional, passando a fazer parte da mesma com um valor na respetiva hierarquia, considerando ainda o primado das normas de direito comunitário (art. 4º do Tratado da União Europeia).
O Regulamento n.º 2988/95(CE, EURATOM) do Conselho de 18 de dezembro de 1995 introduz, de acordo com o seu artigo 1º, “uma regulamentação geral em matéria de controlos homogéneos e de medidas e sanções administrativas relativamente a irregularidades no domínio do direito da [União]”, para, conforme resulta do terceiro considerando do referido regulamento, “combater em todos os domínios os atos lesivos dos interesses financeiros da [União]” (Acórdãos de 11 de junho de 2015, Pfeifer & Langen, C-52/14, EU:C:2015:381, n.o 20 e jurisprudência referida, e de 2 de março de 2017, Glencore Céréales France, C-584/15, EU:C:2017:160, n.o 23).
O Regulamento prevê no art. 3º:
1. §1º O prazo de prescrição do procedimento é de quatro anos a contar da data em que foi praticada a irregularidade referida no nº1 do art. 1º.[…]
[…]
§3º A prescrição do procedimento é interrompida por qualquer ato, de que seja dado conhecimento à pessoa em causa, emanado da autoridade competente tendo em vista instruir ou instaurar procedimento por irregularidade. O prazo de prescrição corre de novo a contar de cada interrupção”.
O Tribunal de Justiça da União Europeia quando colocado perante questões prejudiciais relacionadas com a interpretação destas normas tem mantido a seguinte interpretação sintetizada nos considerandos 28 a 35 do acórdão 03 de outubro de 2019, processo C-378/18 (acessível em eur-lex.europa.eu; ECLI:EU:C:2019:832 6 ACÓRDÃO DE 3. 10. 2019 — PROCESSO C-378/18 WESTPHAL) e que se passam a transcrever:
“28. Além disso, com a adoção do Regulamento n.o 2988/95, em particular do seu artigo 3.o,n.o 1, primeiro parágrafo, o legislador da União decidiu instituir uma regra geral de prescrição aplicável na matéria, mediante a qual pretendia, por um lado, definir um prazo mínimo aplicado em todos os Estados-Membros e, por outro, renunciar à possibilidade de iniciar um procedimento devido a uma irregularidade lesiva dos interesses financeiros da União depois de decorrido um período de quatro anos posterior à prática dessa irregularidade (Acórdãos de 29 de janeiro de 2009, Josef Vosding Schlacht-, Kühl-und Zerlegebetrieb e o., C-278/07 a C-280/07, EU:C:2009:38, n.o 27, e de 22 de dezembro de 2010, Corman, C-131/10, EU:C:2010:825, n.o 39).
29. Daqui resulta que, a partir da data da entrada em vigor do Regulamento n.o 2988/95, qualquer irregularidade lesiva dos interesses financeiros da União pode, em princípio, com exceção dos sectores para os quais o legislador da União previu um prazo inferior, iniciar um procedimento pelas autoridades competentes dos Estados-Membros, no prazo de quatro anos (Acórdãos de 29 de janeiro de 2009, Josef Vosding Schlacht-, Kühl-und Zerlegebetrieb e o., C-278/07 a C-280/07, EU:C:2009:38, n.o 28, e de 22 de dezembro de 2010, Corman, C-131/10, EU:C:2010:825, n.o 40).
30. O artigo 3.o,n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 2988/95 fixa, em matéria de procedimentos, um prazo de prescrição que é contado a partir da data em que foi praticada a irregularidade, a qual, segundo o artigo 1.o,n.o 2, do mesmo regulamento, consiste em «[q]ualquer violação de uma disposição de direito [da União] que resulte de um ato ou omissão de um agente económico que tenha ou possa ter por efeito lesar o orçamento geral [da União]» (v., neste sentido, Acórdãos de 29 de janeiro de 2009, Josef Vosding Schlacht-, Kühl-und Zerlegebetrieb e o., C-278/07 a C-280/07, EU:C:2009:38, n.os 21 e 22, e de 22 de dezembro de 2010, Corman, C-131/10, EU:C:2010:825, n.o 38).
31. Esse prazo é, pois, aplicável tanto às irregularidades que são objeto de uma medida administrativa para retirar a vantagem indevidamente obtida, em conformidade com o artigo 4.o do referido regulamento, como às irregularidades que dão lugar à aplicação de uma sanção administrativa, na aceção do artigo 5.o deste (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de junho de 2015, Pfeifer & Langen, C-52/14, EU:C:2015:381, n.o 23 e jurisprudência referida, e de 2 de março de 2017, Glencore Céréales France, C-584/15, EU:C:2017:160, n.o 26).
32. Por força do artigo 3.o,n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 2988/95, o prazo de prescrição do procedimento é de quatro anos a contar da data em que foi praticada a irregularidade. De acordo com o artigo 3.o,n.o 1, segundo parágrafo, desse regulamento, relativamente às irregularidades continuadas ou repetidas, esse prazo de quatro anos corre desde o dia em que cessou a irregularidade.
33. Dado que a prática da irregularidade pressupõe a reunião de duas condições, a saber, um ato ou omissão que constitui uma violação do direito da União assim como uma lesão do orçamento da União, o prazo de prescrição começa a correr, por conseguinte, a partir do momento em que tenham ocorrido tanto o ato ou omissão que constitui uma violação do direito da União como a lesão do orçamento, situando-se o início do prazo de prescrição, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, sempre na data do facto ocorrido em último lugar (v., neste sentido, Acórdãos de 6 de outubro de 2015, Firma Ernst Kollmer Fleischimport und -export, C-59/14, EU:C:2015:660, n.os 24 a 26, e de 2 de março de 2017, Glencore Céréales France, C-584/15, EU:C:2017:160, n.o 47).
34. A regra que estabelece a prescrição de quatro anos, constante do artigo 3.o,n.o 1, primeiro parágrafo, primeiro período, do Regulamento n.o 2988/95, que é diretamente aplicável nos Estados-Membros, só pode ser afastada por uma regulamentação sectorial, na aceção do artigo 3.o,n.o 1, primeiro parágrafo, segundo período, desse regulamento, quando essa regulamentação sectorial preveja um prazo mais curto, mas não inferior a três anos (v., neste sentido, Acórdãos de 29 de janeiro de 2009, Josef Vosding Schlacht-, Kühl-und Zerlegebetrieb e o., C-278/07 a C-280/07, EU:C:2009:38, n.o 44, e de 22 de dezembro de 2010, Corman, C-131/10, EU:C:2010:825, n.o 42).
35. É à luz destas considerações e face à jurisprudência constante do Tribunal de Justiça segundo a qual, para determinar o alcance de uma disposição do direito da União, há que ter simultaneamente em conta os seus termos, o seu contexto e as suas finalidades (Acórdão de 6 de outubro de 2015, Firma Ernst Kollmer Fleischimport und -export, C-59/14, EU:C:2015:660, n.o 22), que há que responder à questão submetida”.
A sentença considerou aplicável o regulamento e na interpretação da norma contida no art. 3º entendeu que a interrupção da prescrição apenas ocorreu com a instauração do processo de execução contra o devedor e que nessa data ainda não tinha decorrido o prazo de 4 anos.
Nas conclusões de recurso a apelante não indica como se verifica o prazo de prescrição previsto no regulamento.
Recaía sobre o apelante o ónus de provar “a data em que foi praticada a irregularidade”, pois é a partir desta data que se inicia o prazo de quatro de anos de prescrição.
Como decorre da jurisprudência citada “a prática da irregularidade pressupõe a reunião de duas condições, a saber, um ato ou omissão que constitui uma violação do direito da União assim como uma lesão do orçamento da União, o prazo de prescrição começa a correr, por conseguinte, a partir do momento em que tenham ocorrido tanto o ato ou omissão que constitui uma violação do direito da União como a lesão do orçamento, situando-se o início do prazo de prescrição, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, sempre na data do facto ocorrido em último lugar (v., neste sentido, Acórdãos de 6 de outubro de 2015, Firma Ernst Kollmer Fleischimport und -export, C-59/14, EU:C:2015:660, n.os 24 a 26, e de 2 de março de 2017, Glencore Céréales France, C-584/15, EU:C:2017:160, n.o 47)”.
Os factos provados não permitem tal enquadramento legal.
Com efeito, provou-se:
1.Entre o Instituto de Apoio a Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento e a C…, SA foi celebrado o contrato n.º ../../…/........, no âmbito do qual foi atribuído a esta sociedade um incentivo financeiro reembolsável no valor de €1.102.617,00, nos termos do documento de fls. 563 e seguintes e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos.
2. O incentivo financeiro reembolsável referido em 2 deveria ser reembolsado em 10 prestações semestrais, com início em 31.7.2009 e termo em 31.1.2014.
3. Em 21.4.2010, a C…, SA amortizou €87.359,46.
4. Em 6.8.2010, a C…, SA amortizou €18.380,55.
5. Em 21.7.2010 foi decidida a atribuição de um prémio à C…, SA, no
valor de €237.741,02, que se traduziu no não reembolso deste montante.
6. Em 23.2.2013 foi decidida a atribuição de um novo prémio à C…, SA, no valor de €530.311,83, que se traduz no não reembolso de tal montante.
7. Considerando o referido em 3, 4, 5 e 6, o incentivo referido em 1 reduziu-se a €228.824,13.
O incentivo reduziu-se em 23 de fevereiro de 2013 para o valor € 228.824,13, valor este que é reclamado no presente processo, acrescido de juros.
Nada se apurou em concreto que revele a verificação de “um ato ou omissão que constitui uma violação do direito da União assim como uma lesão do orçamento da União”, pressupostos de que depende a invocação do prazo de prescrição, o que significa que os factos não permitem concluir que estavam reunidos os pressupostos para a apelante invocar o alegado prazo de prescrição.
Argumenta o apelante, sob os pontos 6, 7, 8 das conclusões de recurso, que “os prazos fixados para o pagamento de créditos reclamados no Processo de Insolvência nº 2200/11.9TBCNT do extinto 3º Juízo Cível do Tribunal de Viana do Castelo não beneficiam o IAPMEI que nesse processo não reclamou o seu crédito sobre a Insolvente; aqueles prazos de pagamento não interromperam o prazo de prescrição do crédito reclamado nos presentes autos, visto que o IAPMEI não foi parte no processo”.
Provou-se:
8. O IAPMEI teve em seu poder uma garantia bancária emitida pelo F… para assegurar o crédito no valor de €551.308,50, caucionada por livrança com aval.
9. Em 4.3.2015 a C…, SA solicitou ao F… a devolução da livrança referida em 8, a qual foi por aquela levantada pessoalmente nas instalações deste.
10. No extinto 3º Juízo Cível do Tribunal de Viana do Castelo correu termos o processo de insolvência de C…, SA, sob o n.º 2200/11.9TBNCT.
11. No processo referido em 10 os credores aprovaram um Plano de Insolvência, o qual previa, relativamente aos credores com garantia de terceiros, o pagamento do capital em 16 prestações semestrais sucessivas e crescentes, vencendo-se a primeira dois anos depois do trânsito em julgado da sentença homologatória do plano.
12. A sentença de homologação do plano transitou em 17.7.2012.
13. O IAPMEI não reclamou o seu crédito no processo de insolvência referido em 10.
De acordo com o disposto no art. 217º, n.º 1 do CIRE, com a sentença de homologação (do plano de insolvência) produzem-se as alterações dos créditos sobre a insolvência introduzidas pelo plano de insolvência, independentemente de tais créditos terem sido, ou não, reclamados ou verificados. Daqui se extrai que a reclamação de créditos nem sequer é necessária para que estes fiquem abrangidos pelo plano de insolvência aprovado e homologado.
Por outro lado, na sentença sob recurso, não se atribuiu à sentença proferida no Processo de Insolvência nº 2200/11.9TBCNT do extinto 3º Juízo Cível do Tribunal de Viana do Castelo que homologou o plano e transitou em 17 de julho de 2012, qualquer efeito interruptivo do prazo de prescrição.
Tal efeito é atribuído, tão só, à instauração da execução em 02 de setembro de 2015 (ponto 18 dos factos provados).
Porém, como se referiu, não estão reunidos os pressupostos para se aplicar o prazo de prescrição previsto no art. 3º º/1 do Regulamento, ficando assim prejudicadas as questões suscitadas sob os pontos 9 e 10 das conclusões de recurso.
De todo o modo, sempre se dirá, que estando em causa a aplicação do regime previsto no Regulamento, seria à luz de tal regime que se devia apreciar dos fundamentos para a interrupção do prazo de prescrição. O diploma em causa regula tal matéria – art. 3º/1,§3º - e por isso, não se aplicaria ao caso o regime previsto no art. 323º/1 CC, quando, além do mais, a apelante não faz referência a qualquer regime de exceção.
Atento o exposto improcedem as conclusões de recurso, sob os pontos 6 a 12.
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Nos termos do art. 527º CPC as custas são suportadas pelo apelante.
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III. Decisão:
Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e confirmar a decisão.
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Custas a cargo da apelante.
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Porto, 21 de junho de 2021
(processei e revi – art. 131º/6 CPC)
Assinado de forma digital por
Ana Paula Amorim
Manuel Domingos Fernandes
Miguel Baldaia de Morais
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[1] Texto escrito conforme o Novo Acordo Ortográfico de 1990.
[2] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos no Novo Código de Processo Civil, Coimbra, Almedina, 2013, pag. 240
[3] MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA Estudos sobre o Novo Processo Civil, 2ª edição, Lisboa, Lex, 1997, pag. 77.
MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA Estudos sobre o Novo Processo Civil, ob. cit., pag. 78.
JOSÉ LEBRE DE FREITAS, JOÃO REDINHA E RUI PINTO Código de Processo Civil Anotado, vol I, Coimbra, Coimbra Editora, 1999, pag. 467-468.
[4] CASTRO MENDES Direito Processual Civil – Recursos, ed. AAFDL, 1980, pag. 5.
[5] CASTRO MENDES, ob. cit., pag. 24-25 e ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil , vol V, pag. 382, 383.
[6] Cfr. os Ac. STJ 07.07.2009, Ac. STJ 20.05.2009, Ac. STJ 28.05.2009, Ac. STJ 11.11.2003 Ac. Rel. Porto 20.10.2005, Proc. 0534077 Ac. Rel. Lisboa de 14 de maio de 2009, Proc. 795/05.1TBALM.L1-6; Ac. STJ 15.09.2010, Proc. 322/05.4TAEVR.E1.S1 (http://www.dgsi.pt)
[7] PIRES DE LIMA E ANTUNES VARELA Código Civil Anotado, vol. I, 4ª Edição Revista e Actualizada, Reimpressão, Coimbra, Coimbra Editora- grupo Wolters Kluwer, 2011, pag. 298.
[8] MÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA COSTA Direito das Obrigações, 9ª edição, Coimbra, Almedina, 2001, pag. 75.
[9] MÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA COSTA Direito das Obrigações, ob. cit., pag. 104-105.
[10] PIRES DE LIMA E ANTUNES VARELA Código Civil Anotado, vol.I, ob. cit., pag. 300.
[11] Cfr. LUÍS MANUEL TELES DE MENEZES LEITÃO Garantia das Obrigações, 2ª edição, Coimbra, Almedina, 2008, pag. 140; PEDRO ROMANO MARTINEZ e PEDRO FUZETA DA PONTE Garantias de Cumprimento, 5ª edição, Coimbra, Almedina, 2006, pag. 125.
[12] Cfr. LUÍS MANUEL TELES DE MENEZES LEITÃO Garantia das Obrigações, ob. cit., pag. 145, PEDRO ROMANO MARTINEZ e PEDRO FUZETA DA PONTE Garantias de Cumprimento, ob. cit., pag.133.
[13] PEDRO ROMANO MARTINEZ e PEDRO FUZETA DA PONTE Garantias de Cumprimento, ob. cit., pag. 125.
[14] LUÍS A. CARVALHO FERNANDES - JOÃO LABAREDA Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas – Anotado, 2ª ed., Quid Juris Sociedade Editora, Lisboa, 2013, pag. 467
[15] LUÍS A. CARVALHO FERNANDES - JOÃO LABAREDA Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas – Anotado, ob. cit., pag. 467
[16] Cfr. LUÍS A. CARVALHO FERNANDES - JOÃO LABAREDA Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas – Anotado, ob. cit., pag. 467
[17] ANIBAL DE CASTRO A Caducidade- Na Doutrina, na lei e na jurisprudência, 3ª ed., Lisboa, Petrony, 1984, pag. 29, 30.
[18] J. DIAS MARQUES, Noções Elementares de Direito Civil, 3 edição, Lisboa, Petrony, pag.108.