I - Estipulam os artigos 437.º, n.ºs 1 a 3, e 438.º, n.º s 1 e 2, do CPP, que o recurso para fixação de jurisprudência é um recurso excepcional, com tramitação especial e autónoma, que tem como objectivo primordial a estabilização e a uniformização da jurisprudência, eliminando, desta forma, o conflito originado por duas decisões a propósito da mesma questão de direito e no domínio da mesma legislação. A lei processual faz depender a admissibilidade do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, da existência de determinados pressupostos, uns de natureza formal e outros (de natureza) substancial ou material. Entre os pressupostos de natureza formal, contam-se: a interposição de recurso no prazo de 30 dias posteriores ao trânsito em julgado do acórdão recorrido; a invocação de acórdão anterior ao recorrido que sirva de fundamento ao recurso; a identificação do acórdão fundamento, com o qual o recorrido se encontra em oposição; o trânsito em julgado de ambas as decisões; a legitimidade do recorrente, restrita ao MP, ao arguido, ao assistente e às partes civis. Constituem pressupostos de natureza substancial: a justificação da oposição entre os acórdãos que motiva o conflito de jurisprudência; e a verificação de identidade de legislação à luz da qual foram proferidas as decisões. A exigência de oposição de julgados deve considerar-se preenchida quando, nos acórdãos em confronto, manifestamente de modo expresso, sobre a mesma questão fundamental de direito, se acolhem soluções opostas, no domínio da mesma legislação. A estes requisitos legais, o STJ, de forma pacífica, aditou a incontornável necessidade de identidade de factos, não se restringindo à oposição entre as soluções de direito. É jurisprudência deste Supremo Tribunal que as soluções opostas relativas à mesma questão de direito exigem que a mesma integre o objecto concreto e directo das duas decisões, naturalmente fundado em circunstancialismo fáctico essencialmente idêntico do ponto de vista dos seus efeitos jurídicos. Em suma, segundo a jurisprudência seguida por este Supremo Tribunal, a oposição de julgados verifica-se quando: os dois acórdãos em conflito do Supremo Tribunal de Justiça e/ou do Tribunal da Relação se refiram à mesma questão de direito; os dois acórdãos em conflito do Supremo Tribunal de Justiça e/ou da Relação sejam proferidos no âmbito da mesma legislação; haja entre os dois acórdãos em conflito “soluções opostas “; a questão decidida em termos contraditórios tenha sido objecto de decisão expressa em ambos os acórdãos, não bastando que a oposição se deduza de posições implícitas; as situações de facto e o respectivo enquadramento jurídico sejam, em ambas as decisões, idênticos.
II - Na motivação de recurso e nas respectivas conclusões, o recorrente invoca quatro acórdãos (dois do TRL e dois do TC) os quais, no seu entender, estariam em contradição com o Acórdão Recorrido. Nos termos do disposto nos artigos 437.º, n.ºs 1, 2 e 4 e 438.º, n.º 2, do CPP, constituem pressupostos formais do recurso extraordinário, que devem necessariamente figurar do requerimento de interposição: aoposição referir-se a acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal de Justiça ou por um Tribunal da Relação; e, a indicação de um único acórdão fundamento, transitado em julgado. Ora, o recorrente não pode invocar como acórdão em oposição, um acórdão do Tribunal Constitucional. Com efeito, o presente recurso de fixação de jurisprudência é de natureza extraordinária e excepcional. E atenta tal natureza, não é de formular convite para uma eventual correcção da petição. Assim, a indicação de vários Acórdãos Fundamento é motivo de rejeição por inadmissibilidade do recurso, nos termos do disposto nos artigos 437.º, n.º 4, 438.º, n.º 2 e 441.º, n.º 1, primeira parte, todos do CPP.
III - A questão colocada pelo recorrente- saber se, em processo penal, quando não exista o efectivo depósito da sentença, a contagem de prazo para efeitos de recurso apenas se inicia com a notificação ao arguido da disponibilização da sentença, - não foi objecto de decisão expressa no Acórdão Recorrido. Aliás, na decisão sumária (objecto de reclamação para conferência) decidiu-se que a situação em apreço nos presentes autos, em que houve leitura integral da sentença na presença do arguido e do Advogado, bem como depósito no momento processual seguido, com possibilidade de acesso a cópia da sentença nos termos do artigo 372.º, n.º 5, do CPP, não tem similitude, nem analogia com qualquer um dos circunstancialismos processuais subjacentes aos acórdãos do TRL de 23.06.2005, proc. 4544/2005-9, e de 03.11.2010, proc. 211/01.1TASCRL1-3, acessíveis in wwiv.dgsi.pt, ambos citados pelo recorrente. No processo em que foi proferido o acórdão do TRL de 23.06.2005, proc. 4544/2005-9, como se afirma no seu sumário, a sentença foi lida por apontamento e o texto final, foi depositado vários meses depois; e, no acórdão de 03.11.2010, proc. 211/01.1TASCRX1-3, o depósito na secretaria ocorreu, mais de um ano depois da leitura da sentença. Como se vê, apesar de o recorrente ter invocado dois Acórdãos Fundamento, do TRL, e de tal circunstância poder levar à rejeição do presente recurso de fixação de jurisprudência, sempre se dirá que as situações de facto decididas nos mencionados acórdãos não apresentam similitude com a apreciada no Acórdão Recorrido. Ao contrário do que acontece nesses acórdãos, nos presentes autos, o Tribunal considerou que houve lugar à leitura da sentença e, seguidamente, foi a mesma depositada. Por outras palavras: na situação em apreço no presente recurso não decorreu nenhum lapso de tempo entre o depósito da sentença: o prazo de trinta dias de interposição do recurso deve contar-se a partir da data de depósito da sentença, ou seja, do dia 2.03.2020 (artigo 411.º, n.º 1, alínea b) do CPP) e a questão suscitada de inexistência da sentença é manifestamente improcedente. O que é manifestamente diverso das situações tratadas e decididas nos Acórdãos Fundamento que o recorrente pretende estarem em oposição com o presente. E, mais se recorde que como se diz no Acórdão Recorrido, acompanhando o critério do TC no acórdão n.º 545/2006, todos os elementos disponíveis coincidem no entendimento de que a partir do dia 2.03.2020, com a leitura pública da sentença e o subsequente depósito nesse mesmo dia, o Ilustre Mandatário do ora recorrente, actuando com a diligência devida, ficou em condições de solicitar e de obter uma cópia da sentença e assim ter acesso ao teor integral e inteligível da decisão, para a preparação dos meios de defesa que julgasse pertinentes e para o cabal exercício do direito ao recurso e ao contraditório constitucionalmente garantidos. Não houve, por isso, qualquer diminuição inadmissível das garantias de defesa do arguido, nem violação do direito ao recurso, consagrados no artigo 32. º, n. º 1, conjugado com o artigo 20.º, n.º 4, ambos da CRP, mediante um processo equitativo (due process of law, a fair process). Em conclusão: não se pode concluir pela verificação da necessária oposição de julgados entre o Acórdão Recorrido e o Acórdão Fundamento, o que redunda na rejeição do recurso de fixação de jurisprudência, nos termos do disposto no artigo 441.º, n.º 1 do CPP. Verifica-se, deste modo, que falecem os requisitos substanciais do recurso extraordinário.
IV - Nesta conformidade, não se verificando a existência dos respectivos requisitos indicados no artigo 437.º, do CPP, o presente recurso extraordinário vai rejeitado, nos termos do disposto nos artigos 440. º, n.ºs 3 e 4 e 441. °, n. º 1, ambos do CPP.
Recurso Extraordinário Fixação de Jurisprudência
Acordam, em conferência, na 5.ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça
I.
1. AA, arguido nos autos supra identificados vem, ao abrigo do disposto no n.º 2, do artigo 437.º, do Código de Processo Penal (CPP), interpor recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, sustentando a oposição entre o acórdão proferido em 30.12.2020, no processo n.º 701/16……....L1, da …. Secção do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL)[1]- Acórdão Recorrido, e os seguintes arestos – Acórdãos Fundamento:
1. Acórdão de 23.06.2005, TRL, proferido no proc. n.º 4544/2005-9;
2. Acórdão de 03.11.2010, TRL, proferido no proc. n.º 211/01.1 TASCR.L1-3;
3. Acórdão nº 545/2006, de 27.09.2006, do Tribunal Constitucional (TC); e,
4. Acórdão nº 186/2004, de 23.03.2004, do TC.
Para tal alega o seguinte que se transcreve:
(…) “O recurso é admissível em face da existência de diversos Acórdãos, dessa Relação e do próprio Tribunal Constitucional, em oposição com o ora recorrido, dele divergindo no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de Direito (conforme, a título ilustrativo, os que ora se juntam, os primeiros consultáveis em www.dgsi.pt e o último em www.tribunalconstitucional.pt).
Com efeito, entende o Recorrente, contrariamente ao que considerou essa Relação, mas em linha com o que havia sido determinado pelo tribunal de 1.ª instância, que, em processo penal, sempre que não exista efectivo depósito da sentença – seja porque este não chegou a ser lavrado e/ou ínsito no Citius, seja porque, tendo sido, ao depósito (pelo menos informático) não foi associado qualquer documento e, assim, não foi efectivamente disponibilizada a sentença ao Arguido – se impõe, no mínimo, que seja determinado, à semelhança do que ocorreu no Acórdão do TRL de 3/11/2010, que a contagem do prazo de recurso apenas se iniciou com a notificação da disponibilização da douta sentença no Citius.
Destarte e tal qual se afirma no Acórdão n.º 545/2006, de 27 de Setembro de 2006 do Tribunal Constitucional (in www.tribunalconstitucional.pt), citando no sobredito aresto, “o critério a atender é o de que “tal prazo só se pode iniciar quando o arguido (assistido pelo seu defensor), actuando com a diligência devida, ficou em condições de ter acesso ao teor, completo e inteligível, da decisão impugnanda,”. No mesmo sentido, ainda que num caso diverso, se pronunciou esse mais Alto Tribunal no Acórdão n.º 186/2004 (in www.tribunalconstitucional.pt), no qual se afima “há que reconhecer que “a mera leitura da sentença na presença do arguido e do seu defensor oficioso no mínimo pode não permitir uma completa apreensão do teor da sentença para efeito de motivação do recurso”, pois “a interposição de um recurso pressupõe uma análise minuciosa da decisão que se pretende impugnar, análise essa que não é de todo possível realizar por mero apelo à memória da leitura do texto da sentença” (destaques e sublinhados nosso). E é neste ponto, cremos, que reside a identidade de casos: é que, contrariamente ao que sustenta o douto Acórdão dessa Relação, a sentença, à semelhança do que se verificou nos casos a que se reportam os acórdãos-fundamento, não ficou DE FACTO disponível, nem o Arguido ficou em condições de aceder “ao teor, completo e inteligível, da decisão”, senão apenas no momento em que é elaborada a notificação da secretaria, porquanto, até então, a mesma não se encontrasse junta ao acto de depósito no sistema adicionado no Citius, o qual não tinha qualquer documento anexo. O que importa para a verificação da identidade de casos é a circunstância – que resulta evidente – de que, neste como nos casos-fundamento, o Arguido não teve acesso ao conteúdo da sentença.
Com efeito, resulta clarividente de todos os actos subsequentes à prolação da sentença, quer os da secretaria, quer os do douto Tribunal de 1.ª Instância, e mormente emerge do douto despacho de admissão do recurso (sendo que requerimento de interposição expressamente se aflorou a questão do prazo), que esse depósito material e disponibilização no CITIUS para acesso dos mandatários não foi, na realidade, efectuado, de pouco valendo os actos formais na protecção efectiva dos mais básicos direitos constitucionais do arguido, quando estes não reproduzam, como no caso, a verdade material e os acontecimentos.
Não vale, por isso, salvo o devido respeito por entendimento diverso, o argumento de que se acha lavrado o registo de depósito para que se assuma que a sentença se achava efectivamente depositada e disponível desde o dia 2/3/2020 e, assim, que inexiste identidade de situações entre o presente caso e os dos acórdãos-fundamento. E isto porque, interpretado, como o faz a decisão ora em crise, no sentido em que, a verificação da ocorrência do depósito se basta com a mera inscrição desse acto na plataforma CITIUS, sem que ao mesmo seja associado o documento que constitui a sentença e, assim, efectivamente disponibilizada a mesma ao arguido e ao seu mandatário (já que, actualmente e em particular nos conturbados tempos de pandemia é esta a forma de disponibilização preferencial), não poderá o n.º 5 do artigo 372.º deixar de considerar-se inconstitucional, por violação gritante do direito ao recurso, que é parte fundamental do direito à defesa penal assim acolhido no n.º 1 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa. Em suma porque, conforme e bem se decidiu no supracitado aresto: “(…) só na posse da sentença é possível aos sujeitos processuais ler a fundamentação da mesma, relê-la, repensar e reflectir sobre a oportunidade e conveniência da interposição de recurso e sobre os fundamentos da motivação”. (destaque e sublinhados nossos)
Por conseguinte, são diferentes as conclusões a que seja nos casos-fundamento e no caso vertente, para situações em que, similarmente, o que está em causa é a não disponibilização de facto da sentença, pelo que urge uniformizar jurisprudência no sentido de esclarecer se é ou não admissível que se inicie a contagem do prazo de recurso em processo penal quando ao Arguido não foi materialmente disponibilizada a sentença – quer dela tenha ou não existido acto formal de depósito – e, consequentemente, não tenha ficado em condições de aceder “ao teor, completo e inteligível, da decisão” para então “ler a fundamentação da mesma, relê-la, repensar e reflectir sobre a oportunidade e conveniência da interposição de recurso e sobre os fundamentos da motivação”.
De resto, crê o Recorrente, é premente a necessidade de clarificação dessa matéria, na medida em que a repetição da verificação de casos em que inexiste depósito ou ao mesmo não é associado qualquer documento conduziu já em 12 de Dezembro de 2001 à tomada de posição por parte do Conselho Superior da Magistratura, que então emitiu uma Circular, sensibilizando os Senhores Juízes no sentido de que tal prática é incorrecta e processualmente inadmissível, o que bem diz da lamentável frequência destes acontecimentos. Junta: 4 Acórdãos. (…).
2. O recurso foi certificado e admitido – despacho de 22.02.2021 (fls. 30, destes autos).
3. O Magistrado do Ministério Público, junto do TRL, respondeu ao presente recurso, no sentido de o mesmo não preencher os requisitos necessários para que seja decretada a sua admissibilidade, pelo que deve ser rejeitado.
Alega o seguinte que se transcreve:
(…) 1 - O Recorrente, AA, vem interpor o presente recurso extraordinário para fixação de Jurisprudência, indicando como acórdão recorrido o proferido no processo n.º 701/16……...L1 pela …. Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, como norma jurídica violada o art. 372° n.º 5 do C. de Processo Penal e como acórdão-fundamento "diversos Acórdãos, dessa Relação e do próprio Tribunal Constitucional, em oposição com o ora recorrido, dele divergindo no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de Direito (conforme, a título ilustrativo, os que ora se juntam, os primeiros consultáveis em www.dgsi.pt e o último em www.tribunalconstitucional.pt)", e junta efectivamente quatro acórdãos, sendo o primeiro o Acórdão n.º 545/2006 proferido pela 2a Secção do Tribunal Constitucional em 27 de Setembro de 2006 (cfr. fls. 5 a 10 v.°), o segundo o Acórdão proferido no processo n.º 211/01.1TASCR.L1 pela 3a Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em 3 de Novembro de 2010 (cfr. fls. l1 a 15), o terceiro o Acórdão n.º 186/2004 proferido pela 2a Secção do Tribunal Constitucional em 23 de Março de 2004 (cfr. fls. 16 a 27 v.°) e o quarto o Acórdão proferido no processo n.º 4544/2005 pela 9a Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em 23 de Junho de 2005 (cfr. fls. 28).
2 - A indicação de vários acórdãos-fundamento é motivo de rejeição por inadmissibilidade do recurso - cfr. o art. 437° n.º 4, o art. 438° n.º 2 e o art. 441° n.º 1, primeira parte, ambos do CPP.
- Sucede que não é possível notificar-se o Recorrente para corrigir o recurso de acordo com as exigências previstas na lei.
- Deve, assim, o presente recurso ser rejeitado por inadmissibilidade, dada a indicação pelo Recorrente de mais do que um acórdão-fundamento.
3 - Mas mesmo que assim se não entendesse - o que apenas se admite como mera hipótese de raciocínio e sempre sem conceder -, sempre se teria de atender a que o Recorrente não identifica no seu requerimento a concreta oposição de julgados que com o presente recurso extraordinário pretende ver dirimida.
- Com efeito, pelo texto da motivação não é possível saber-se em que consiste a oposição de julgados, mostrando-se impossível definir qual a questão que, na óptica do Recorrente, terá merecido solução diversa nos acórdãos recorrido e fundamento.
- A nosso ver, em todos os acórdãos indicados pelo Recorrente como acórdão-fundamento estão em causa situações diferentes da situação do acórdão recorrido e como tal os indicados acórdãos são insusceptíveis de fundar a admissibilidade de recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, por neles não se verificar identidade das situações de facto subjacentes, não sendo assim possível estabelecer uma comparação que permita concluir que relativamente à mesma questão de direito existem soluções opostas.
- A situação do Recorrente, em causa no acórdão recorrido, é diversa das dos acórdãos-fundamento que invocou, não se verificando a necessária identidade das situações de facto subjacentes.
- Porém, face ao requerimento do Recorrente, por o mesmo não se encontrar motivado de acordo com a lei, não é possível saber-se em que consiste a pretendida oposição de julgados, não é possível definir qual a questão que terá merecido solução diversa nos acórdãos recorrido e fundamento.
- Sucede que não é possível notificar-se o Recorrente para corrigir a motivação de acordo com as exigências previstas na lei.
- Em face do que, não se mostrando devidamente identificada e justificada a oposição de julgados que motiva o conflito de jurisprudência e não sendo possível o aperfeiçoamento da motivação do recurso, não é possível definir qual a questão que terá merecido solução diversificada nos acórdãos recorrido e fundamento.
- Pelo que o recurso deverá ser rejeitado, nos termos do art. 441° do C. de Processo Penal, por não se verificarem os necessários requisitos de admissibilidade, não se mostrando possível definir qual a questão que terá merecido solução diversificada nos acórdãos recorrido e fundamento.
4 - Para que se verifique oposição de acórdãos, é necessário que se esteja perante decisões opostas sobre questões concretas, sendo que a oposição tem de respeitar às decisões e não aos seus fundamentos - cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 89.10.13, AJ 2, citado por Manuel Simas Santos e Leal Henriques, a fls. 199, nota 195, de "Recursos Penais" e no mesmo sentido, cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de Outubro de 2014, proc. 268/03.0TBVPA.P2.S1-A, in www.dgsi.pt.
- Ora, a questão concreta sobre a qual se pronunciou o Acórdão recorrido não foi nenhuma das formuladas pelo Recorrente nestes autos de recurso para fixação de Jurisprudência.
- Assim, o Acórdão recorrido e os Acórdãos fundamento não se pronunciaram sobre a mesma questão, não se verificando a oposição pretendida pelo Recorrente.
- Acresce que, a nosso ver, as questões formuladas pelo Recorrente como consubstanciando oposição entre o Acórdão recorrido e os Acórdãos fundamento, são apenas interpretações que o mesmo faz, não se tratando, pois, manifestamente, de soluções expressas constantes dos acórdãos-fundamento que porventura fossem opostas às do acórdão recorrido.
- Termos em que se conclui pela não verificação dos requisitos legais previstos no art. 437° do C. de Processo Penal, por não estarmos perante dois acórdãos que, relativamente à mesma questão de direito, assentem em soluções opostas.
- O que determina a rejeição do recurso, por inadmissibilidade legal, nos termos dos arts. 414° n.º 2, 420° n.º 1 al. b), e 441° n.º 1, do C. de Processo Penal.
5 - O acórdão-recorrido e os acórdãos-fundamento não se pronunciam sobre as mesmas situações de facto; assim, não há manifestamente soluções expressas nos acórdãos-fundamento que porventura sejam opostas a soluções expressas constantes do acórdão recorrido.
- A nosso ver, nenhum dos acórdãos indicados pelo Recorrente como acórdão-fundamento se encontra em oposição de julgado com o acórdão recorrido, pois que a situação de facto não é a mesma, uma vez que no caso dos autos ao Recorrente foi materialmente disponibilizada a sentença, pois que houve leitura integral da sentença na presença do Arguido e depósito da sentença por acto formal em momento processual imediato, tendo o mesmo ficado em condições de aceder ao teor completo e inteligível da decisão, desde o dia 2 de Março de 2020, data a partir da qual se iniciou o prazo de trinta dias de que o Recorrente dispunha para interposição do recurso - art. 411° n.º 1 do CPP -, situação diversa da dos acórdãos-fundamento.
- Verifica-se assim que inexiste a invocada oposição de julgados.
- Com efeito, falta um pressuposto necessário à admissibilidade de recurso extraordinário de fixação de jurisprudência - que as situações de facto e o respectivo enquadramento jurídico sejam idênticos, mas obtenham soluções diferentes.
- O que determina a rejeição do presente recurso, nos termos do art. 441° do C. de Processo Penal, por não se verificarem os necessários requisitos de admissibilidade, não havendo oposição de julgados por inexistir questão que terá merecido solução diversificada nos acórdãos recorrido e fundamento.
6 - Deve, assim, o presente recurso ser rejeitado. (…).
4. Os autos foram remetidos a este Supremo Tribunal de Justiça.
5. Nos termos do disposto no n.º 1, do artigo 440.º, do CPP, o Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de não se verificarem quer os requisitos formais, quer substanciais, pelo que o presente recurso extraordinário, deve, em conferência, ser rejeitado, nos termos do disposto nos artigos 440.º, n.ºs 3 e 4 e 441. °, n ° 1, ambos do CPP.
6. Foi dado conhecimento deste Parecer ao recorrente, que veio dizer o seguinte (transcrição):
(…) a) Quanto à Tempestividade e Oportunidade do Recurso
É inequívoca, tal qual reconhece o Digníssimo Magistrado do Ministério Público, a tempestividade do presente recurso de Uniformização de Jurisprudência. E – diremos nós – mais do que tempestiva, é de manifesto interesse não só para o Arguido e não apenas nos presentes autos, mas sim para a boa administração dos processos e da Justiça, pois que, tal qual o Arguido aludiu já no seu requerimento de interposição de recurso, “é premente a necessidade de clarificação dessa matéria, na medida em que a repetição da verificação de casos em que inexiste depósito ou ao mesmo não é associado qualquer documento conduziu já em 12 de Dezembro de 2001 à tomada de posição por parte do Conselho Superior da Magistratura, que então emitiu uma Circular, sensibilizando os Senhores Juízes no sentido de que tal prática é incorrecta e processualmente inadmissível”.
Não obstante, volvidos vinte anos sobre essa Circular repetem-se ainda amiúde casos em que o depósito ou não ocorre de todo, ou não passa de um acto formal, sem qualquer conteúdo material associado. Tal prática, para lá de desvirtuar a aplicação da lei e o valor processual do acto de depósito – o que seria, por si, bastante grave – contende grandemente com os mais básicos direitos de defesa dos arguidos, o que é aludido no Acórdão Fundamento, mas também – razão pela qual foram juntos – nos demais arestos que juntámos, parte dos quais – inamissíveis como Acórdão Fundamento, mas relevantes pelo seu conteúdo na alusão às garantias constitucionais que estão em causa – do próprio Tribunal Constitucional. Por isso mesmo, dada a pluralidade de casos em que existe ausência de depósito (efectivo ou formal) de sentença e estando em causa os mais básicos direitos e garantias fundamentais de defesa penal, o Ministério Público não só deveria reconhecer a oportunidade do recurso, como, sobretudo, estava vinculado à obrigação legal de o ter interposto. Assim determina a parte final do n.º 5 do artigo 437.º do CPP e, supletivamente, o artigo 691.º do CPC.
b) Quanto à Indicação de um só Acórdão Fundamento
Consinta-se que no seu requerimento de interposição de recurso o Arguido junta e cita vários acórdãos, sendo dois da Relação de Lisboa e dois do Tribunal Constitucional. Quanto a estes últimos, é clarividente que a sua junção não pretende atingir tal desiderato, porquanto as normas legais relativas à interposição deste recurso extraordinário estabeleçam que a jurisprudência conflituante deva ser desse Supremo Tribunal de Justiça ou de uma das Relações. O que contudo e salvo melhor entendimento, não impede que se aluda ao teor dos arestos emitidos pelo Tribunal Constitucional, mormente quando, como no caso, estes sejam também citados no próprio Acórdão Fundamento, que neles sustenta a conclusão a que chega, o que diz bem da relevância para a boa apreciação da questão jurídica.
Por outro lado, e pese embora mencione também o Acórdão de 23.06.2005, Tribunal Relação Lisboa, proferido no proc. 4544/2005-9, crê o Arguido que resulta do seu requerimento de recurso, com toda a clareza necessária, que é o Acórdão de 03.11.2010, Tribunal Relação Lisboa, proferido no proc. 211/01.1TASCR.L1-3 que pretende indicar como Acórdão Fundamento. De facto, a este propósito lê-se no seu requerimento o seguinte:
“Com efeito, entende o Recorrente, contrariamente ao que considerou essa Relação, mas em linha com o que havia sido determinado pelo tribunal de 1.ª instância, que, em processo penal, sempre que não exista efectivo depósito da sentença (…) se impõe, no mínimo, que seja determinado, à semelhança do que ocorreu no Acórdão do TRL de 3/11/2010, que a contagem do prazo de recurso apenas se iniciou com a notificação da disponibilização da douta sentença no Citius.”
Daqui resulta, clarividentemente e salvo o devido respeito, a identificação do concreto aresto que se invoca como Acórdão Fundamento, pelo que improcede o alegado pelo Ministério Público. A referência aos demais, importa esclarecer, pretendia apenas dar ênfase à recorrência com que situações inaceitáveis e inadmissíveis no quadro das garantias penais constitucionalmente acolhidas se repetem nos nossos tribunais, sem que, contudo, tenha deixado de se indicar o Acórdão Fundamento que se elegera.
c)Quanto à oposição expressa de julgados e à concreta identidade das situações de facto
Afirma o Ministério Público, no seu Parecer ora contraditado, que inexiste identidade de casos entre o acórdão recorrido e o Acórdão Fundamento, pois que “Em face do exposto, resulta desde logo que a questão colocada pelo recorrente [saber se, em processo penal, quando não exista o efectivo depósito da sentença, a contagem de prazo para efeitos de recurso apenas se inicia com a notificação ao arguido da disponibilização da sentença (…) não foi objecto decisão no acórdão recorrido.”
É, porém, falaciosa a conclusão a que chega.
De facto, o Ministério Público sustenta esta conclusão na afirmação de que o acórdão recorrido se limitou a apreciar a tempestividade do recurso, o que é no mínimo impreciso.
Com efeito, a tempestividade apreciada no aresto recorrido funda-se precisamente na determinação do início da contagem do prazo de recurso, a qual, por sua vez, esteve na dependência da interpretação acolhida quanto à questão de saber se em processo penal, quando não exista o efectivo depósito da sentença, a contagem de prazo para efeitos de recurso apenas se inicia com a notificação ao arguido da disponibilização da sentença. E isto porque, contrariamente ao que se afirma, não é verdade que o tribunal tenha considerado que existiu depósito da sentença, na medida em que resulta de todos os actos subsequentes à prolação da sentença, quer os da secretaria, quer os do douto Tribunal de 1.ª Instância, e mormente emerge do douto despacho de admissão do recurso (sendo que requerimento de interposição expressamente se aflorou a questão do prazo), que o depósito material e disponibilização no CITIUS para acesso dos mandatários não foi, na realidade, efectuado (apenas lavrado formalmente).
Por conseguinte, são opostas as conclusões a que seja no caso-fundamento (e nos demais aludidos) e no caso vertente, para situações em que, similarmente, o que está em causa é a não disponibilização de facto da sentença. No caso do acórdão do TRL de 03.11.2010, trata-se de uma sentença cujo depósito foi feito mais de um ano depois e no caso dos presentes autos estamos diante de uma sentença apenas parcialmente lida e não junta ao registo de depósito no CITIUS, nem de qualquer outra forma disponibilizada ao Arguido durante mais de três meses, pelo que, salvo o devido respeito por entendimento diverso, num como noutro caso, o que está em causa é a questão de saber se deve iniciar-se o prazo de recurso quando o arguido não tenha tido acesso ao conteúdo completo e inteligível da sentença. No primeiro foi entendido que o prazo só deve iniciar-se quando o Arguido não tenha ficado em condições de aceder “ao teor, completo e inteligível da decisão”; pelo contrário, nos presentes autos, e já após o Tribunal de 1.º Instância ter entendido que era tempestivo o recurso (certamente reconhecendo e acolhendo essa mesma interpretação) foi decido que o prazo se iniciara na data em que foi lavrado o depósito, independentemente da inexistência de depósito efectivo e da consequente disponibilização ao Arguido.
Urge, pois, uniformizar jurisprudência no sentido de esclarecer se é ou não admissível que se inicie a contagem do prazo de recurso em processo penal quando ao Arguido não foi materialmente disponibilizada a sentença - quer dela tenha ou não existido acto formal de depósito.
Pelo que, cumpridos que estão os requisitos processuais (formais e substanciais) do presente recurso, deve o mesmo ser admitido e apreciado, uniformizando-se matéria certamente relevante para o arguido, mas sobretudo determinante para a boa e justa administração da Justiça! (…).
7. Cumprido o disposto nos n.ºs 3 e 4, do artigo 440.º, do CPP, foram os autos remetidos para conferência.
II.
8. Estipulam os artigos 437.º, n.ºs 1 a 3, e 438.º, n.º s 1 e 2, do CPP, que o recurso para fixação de jurisprudência é um recurso excepcional, com tramitação especial e autónoma, que tem como objectivo primordial a estabilização e a uniformização da jurisprudência, eliminando, desta forma, o conflito originado por duas decisões a propósito da mesma questão de direito e no domínio da mesma legislação.
A lei processual faz depender a admissibilidade do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, da existência de determinados pressupostos, uns de natureza formal e outros (de natureza) substancial ou material.
Entre os pressupostos de natureza formal, contam-se:
i. a interposição de recurso no prazo de 30 dias posteriores ao trânsito em julgado do acórdão recorrido;
ii. a invocação de acórdão anterior ao recorrido que sirva de fundamento ao recurso;
iii. a identificação do acórdão fundamento, com o qual o recorrido se encontra em oposição;
iv. o trânsito em julgado de ambas as decisões;
v. a legitimidade do recorrente, restrita ao MP, ao arguido, ao assistente e às partes civis.
Constituem pressupostos de natureza substancial:
i. a justificação da oposição entre os acórdãos que motiva o conflito de jurisprudência; e,
ii. a verificação de identidade de legislação à luz da qual foram proferidas as decisões.
A exigência de oposição de julgados deve considerar-se preenchida quando, nos acórdãos em confronto, manifestamente de modo expresso, sobre a mesma questão fundamental de direito, se acolhem soluções opostas, no domínio da mesma legislação.
A estes requisitos legais, o STJ, de forma pacífica, aditou a incontornável necessidade de identidade de factos, não se restringindo à oposição entre as soluções de direito. É jurisprudência deste Supremo Tribunal que as soluções opostas relativas à mesma questão de direito exigem que a mesma integre o objecto concreto e directo das duas decisões, naturalmente fundado em circunstancialismo fáctico essencialmente idêntico do ponto de vista dos seus efeitos jurídicos.[2]
E, na doutrina, como nota Germano Marques da Silva[3], a finalidade específica do recurso para uniformização de jurisprudência é “evitar as contradições entre acórdãos dos tribunais superiores, assegurando assim a uniformização da jurisprudência”, ressaltando Maria João Antunes[4], que o recurso tem a sua “justificação na unidade do direito”. Pretende-se acautelar a previsibilidade e segurança jurídica, sem com isso colidir com a independência dos tribunais, já que, apesar do valor persuasivo do AFJ, poderão continuar a existir no futuro decisões discrepantes, se apresentarem uma argumentação não sopesada na fixação de jurisprudência. Se quisermos, não constitui “jurisprudência obrigatória”, mas, “tendencialmente vinculativa” ou “quase obrigatória”. Uma jurisprudência que deve ser aplicada pelos tribunais, apenas podendo não o fazer, se for fundamentada a divergência (cf. artigo 445.º, n.º 3, do CPP). Divergência essa, como referimos, que deverá aduzir um discurso argumentativo novo, diverso daquele que foi abrangido na discussão que culminou com o acórdão de fixação de jurisprudência.
Em suma, segundo a jurisprudência seguida por este Supremo Tribunal, a oposição de julgados verifica-se quando:
1. Os dois acórdãos em conflito do Supremo Tribunal de Justiça e/ou do Tribunal da Relação se refiram à mesma questão de direito;
2. Os dois acórdãos em conflito do Supremo Tribunal de Justiça e/ou da Relação sejam proferidos no âmbito da mesma legislação;
3. Haja entre os dois acórdãos em conflito “soluções opostas “;
4. A questão decidida em termos contraditórios tenha sido objecto de decisão expressa em ambos os acórdãos, não bastando que a oposição se deduza de posições implícitas;
5. As situações de facto e o respectivo enquadramento jurídico sejam, em ambas as decisões, idênticos.
9.No caso concreto.
A questão em causa, tal como o recorrente a equaciona, é a de saber se, em processo penal, quando não exista efectivo depósito da sentença, a contagem de prazo para efeitos de recurso apenas se inicia com a notificação ao arguido da disponibilização daquela.
9.1. Entre os pressupostos de natureza formal, e como se disse em sede de exame preliminar, verifica-se que:
i. Da tempestividade do recurso.
O recurso tem de ser interposto no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão recorrido (acórdão proferido em último lugar), conforme impõe o n.º 1, do artigo 438.º, do CPP.
O Acórdão Recorrido foi proferido no dia 30.12.2020.
Nos termos da certidão junta aos autos, o Acórdão Recorrido foi notificado ao Ministério Público em 04.01. 2021 e considera-se notificado ao mandatário em 4.01. 2021.
Tendo em conta a Lei n. º 4-B/2021, de 01.02- artigo 2.º, n.º 1 (que aditou o artigo 6°-B) e artigo 4.º, que determinou a suspensão dos prazos judiciais desde o dia 22.01.2021; e a Lei n° 13-B/2021, de 05.04., artigo 1.º e 7.º (que fez cessar o regime de suspensão dos prazos processuais a partir do dia 06 de Abril), não admitindo recurso ordinário, o acórdão transitou após decorridos 10 dias daquela notificação. Ou seja, no dia 14 de Janeiro de 2021. Assim, o recurso interposto em 18.02.2021, mostra-se tempestivo.
ii. Da invocação de acórdão anterior ao recorrido que sirva de fundamento ao recurso. Da identificação do acórdão fundamento, com o qual o recorrido se encontra em oposição.
Na motivação de recurso e nas respectivas conclusões, o recorrente invoca quatro acórdãos (dois do TRL e dois do TC) os quais, no seu entender, estariam em contradição com o Acórdão Recorrido.
Nos termos do disposto nos artigos 437.º, n.ºs 1, 2 e 4 e 438.º, n.º 2, do CPP, constituem pressupostos formais do recurso extraordinário, que devem necessariamente figurar do requerimento de interposição:
- A oposição referir-se a acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal de Justiça ou por um Tribunal da Relação; e,
- A indicação de um único acórdão fundamento, transitado em julgado.
Ora, o recorrente não pode invocar como acórdão em oposição, um acórdão do Tribunal Constitucional.
A exigência da invocação de um só Acórdão Fundamento (do STJ ou do Tribunal da Relação) visa “delimitar com toda a minúcia, o âmbito da questão jurídica a dirimir, o que, em princípio, só se alcançará quando colocados defronte, apenas, de dois pontos de vista exactos, cada um deles expresso no respectivo aresto, sempre suposta uma mesma situação de facto e identidade de legislação”.
Apesar de em contraditório ao Parecer do Senhor Procurador-Geral Adjunto junto deste STJ, vir alegar que claramente é o Acórdão de 03.11.2010, Tribunal Relação Lisboa, proferido no proc. 211/01.1TASCR.L1-3 que pretende indicar como Acórdão Fundamento. (…) A referência aos demais, importa esclarecer, pretendia apenas dar ênfase à recorrência com que situações inaceitáveis e inadmissíveis no quadro das garantias penais constitucionalmente acolhidas se repetem nos nossos tribunais, sem que, contudo, tenha deixado de se indicar o Acórdão Fundamento que se elegera. (…), o que decorre da motivação e conclusões do recurso não permite afirmar tal clarividência.
O que se pretendeu foi dar conhecimento do Parecer lavrado ao abrigo do artigo 416.º, do CPP, e não convidar o recorrente a uma eventual correcção da sua petição.
Com efeito, o presente recurso de fixação de jurisprudência é de natureza extraordinária e excepcional. E atenta tal natureza, não é de formular convite para uma eventual correcção da petição[5].
Assim, a indicação de vários Acórdãos Fundamento é motivo de rejeição por inadmissibilidade do recurso, nos termos do disposto nos artigos 437.º, n.º 4, 438.º, n.º 2 e 441.º, n.º 1, primeira parte, todos do CPP.
Mas, mesmo que assim se não entendesse, o presente recurso será de rejeitar, pelos motivos a seguir enunciados.
9.2.
Da leitura do recurso e do que resulta do atrás dito quanto à observância dos pressupostos de natureza substancial - a oposição de julgados -, digamos, desde já, que falta o requisito substancial (ou material), como analisaremos em seguida.
Como se disse em supra 8., a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça considera que se verifica oposição de julgados quando:
i. As asserções antagónicas dos acórdãos invocados como opostos tenham tido como efeito fixar ou consagrar soluções diferentes para a mesma questão fundamental de direito;
ii. As decisões em oposição sejam expressas;
iii. As situações de facto e o respectivo enquadramento jurídico sejam, em ambas as decisões, idênticos.
Assim, um dos requisitos substanciais é a oposição expressa de julgados relativamente à mesma questão de direito.
Por outro lado, a existência de soluções de direito antagónicas pressupõe a identidade das situações de facto, base das decisões de direito antitéticas ou conflituantes.
Da leitura do Acórdão Recorrido, resulta o seguinte:
(…) II – FUNDAMENTAÇÃO
Afirma o Arguido que em bom rigor a verdade inegável e evidente é que a sentença destes autos não foi integralmente lida, nem imediatamente depositada, sem prejuízo no que tange à data do depósito ou à leitura integral da sentença se encontre lavrado no processo (sic).
Permitimo-nos discordar, com o devido respeito. Afigura-se-nos que a apreciação do Tribunal quanto à questão suscitada tem de se basear, não apenas pelo que é alegado pelo Arguido, por intermédio do ilustre Advogado sem apresentação de qualquer meio de prova, mas pelo que os próprios termos e actos processuais evidenciam, nos termos legais.
Por ter sido elaborada e assinada por uma funcionária judicial no exercício das suas funções, constituindo um documento autêntico, a acta da sessão da audiência de discussão e julgamento que se pode ler a fls. 575 prova que em 02-03-2020 a Srª juíza de direito procedeu à leitura pública da sentença, na presença do arguido e do ilustre mandatário aqui recorrente.
A acta tem o seguinte texto:
“ACTA DE AUDIÊNCIA DE DISCUSSÃO E JULGAMENTO
- CONTINUAÇÃO -
Data - 02-03-2020
Mmª Juiz de Direito - BB
Magistrado do Ministério Público - CC
Escrivã Auxiliar - DD
Sendo a hora marcada, publicamente e de viva-voz, identifiquei os presentes autos de Processo Comum (Tribunal Singular), em que são:
Autor: Ministério Público
Arguido: Utilcork - Produtos de Cortiça, Lda e outro(s)... e de imediato procedi à chamada de todas as pessoas que nele devem intervir, após o que comuniquei verbalmente à Mmª Juiz, o rol dos presentes e dos faltosos (art.º 329º, n.ºs 1 e 2 do C. P. Penal), a saber:
PRESENTES:
- A Il. Defensora Oficiosa da Arguida Utilcork - Produtos de Cortiça, Lda:
- Drª EE
- O Arguido - AA
- A Arguida - FF
- O Il. Mandatário de ambos os arguidos - GG
Quando eram 14 horas e 45 minutos, e não antes porquanto o tribunal esteve impedido na audiência de discussão e julgamentos dos autos de processo especial abreviado n.º 100/19……… , pela Mmª Juiz foi declarada aberta a presente audiência tendo de seguida procedido à leitura da sentença, o que o fez em voz alta.
Logo, todos os presentes foram devidamente notificados e, na falta de qualquer recurso, foi declarada encerrada a audiência quando eram 15 horas e 05 minutos.
A presente acta foi integralmente revista e por mim DD elaborada.”
Do teor da acta só se pode concluir que se procedeu à leitura integral e não apenas de uma súmula” ou de um “apontamento” da sentença.
A subsequente declaração da Sr.ª Secretária de Justiça de fls. 576, devidamente assinada, evidencia que nesse mesmo dia 02-03-2020 se procedeu ao depósito da sentença.
Recorde-se uma vez mais que o termo processual, tem o seguinte texto:
“Declaro que hoje, depositei na Secretaria deste Juízo, a presente sentença proferida nos presentes autos de Processo 701/16………., Processo Comum (Tribunal Singular), em que são:
Autor: Ministério Público
Arguido: Utilcork - Produtos de Cortiça, Lda e outro(s)... que para tal me foi entregue pela Mmª Juiz de Direito, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 372º, n.º 5 do C. P. Penal.
……….., 02-03-2020
A Secretária de Justiça, (segue uma assinatura)”
O acto processual de depósito da sentença é obrigatório e visa garantir que os intervenientes interessados na interposição de recurso tenham acesso atempado ao seu texto escrito, contendo a decisão e seus fundamentos.
Assim o depósito implica necessariamente um registo pelo funcionário judicial e só é possível se nesse momento tiver sido efectuada a entrega pelo juiz do suporte físico completo da sentença.
Note-se que não existe apenas o que o Reclamante considera como mero registo informático na plataforma Citius, mas a correspondente indicação do registo da sentença no processo físico, em declaração assinada em papel pela funcionária judicial.
O Arguido-recorrente não apresenta, nem vislumbramos que exista, qualquer elemento susceptível de suscitar a falsidade ou de infirmar o valor probatório pleno dos documentos autênticos em que se consubstanciam a acta de uma audiência de julgamento e a declaração de depósito da sentença.
Também os registos electrónicos na plataforma Citius são absolutamente consentâneos com os elementos constantes no processo “físico” e reveladores da inserção, electrónica da sentença, da acta da audiência de julgamento e do depósito da sentença, com as referências ……..62, ……..42 e ……52, respectivamente.
O registo electrónico no Citius diz-nos que a assinatura electrónica da sentença em PDF como versão final foi aposta pela juíza de direito em 02-03-2020. Assim se comprovando que nesse mesmo dia a sentença estava completamente elaborada e acessível para cópia por qualquer sujeito processual que o solicitasse, como prescreve o artigo 372º nº 5 do Código de Processo Penal.
Neste âmbito, é inequívoco que, o envio em 24-06-2020, pela secretaria, de uma Notificação apenas para disponibilização no Citius, sem despacho judicial que o determinasse, sem qualquer fundamento legal e onde nem consta qualquer menção sobre o prazo de recurso, não pode criar nenhuma expectativa atendível. Assim como não significa seguramente o “reconhecimento” (pela Sr.ª funcionária que enviou o ofício? pelo Tribunal, que nada decidiu?) de que não tinha havido o depósito na data da leitura em 02-03-2020, nem se tinha iniciado o prazo de recurso, como infundadamente pretende o Arguido.
Assim como consideramos que a admissão de recurso por despacho tabelar de 07-07-2020, sem que a questão da tempestividade tivesse sido apreciada expressamente, não permite indiciar a “aceitação” pela Exma. juíza que tinha procedido a uma leitura apenas “por apontamento” ou que o depósito da sentença na secretaria não teria sido efectuado na data constante do respectivo termo no processo físico e registo electrónico.
Ou seja, aproximando-nos do critério do Tribunal Constitucional enunciado no acórdão nº 545/2006, todos os elementos disponíveis coincidem no entendimento de que logo a partir do dia 02-03-2020, com a leitura pública da sentença e o subsequente depósito nesse mesmo dia, o ilustre mandatário do Arguido, actuando com a diligência devida, ficou em condições de solicitar e de obter uma cópia da sentença e assim ter acesso ao teor integral e inteligível da decisão, para a preparação dos meios de defesa que julgasse pertinentes e para o cabal exercício do direito ao recurso e ao contraditório constitucionalmente garantidos.
Não houve por isso encurtamento inadmissível das garantias de defesa do arguido, nem violação do direito ao recurso, consagrados no artigo 32º, n.º 1, conjugado com o artigo 20º, n.º 4, ambos da Constituição, mantendo-se o processo como um due processo of law, a fair process.
Já se escreveu na decisão singular que a situação em apreço nos presentes autos, em que houve leitura integral da sentença na presença do Arguido e do Advogado, bem como depósito em momento processual seguido, com possibilidade de acesso a cópia da sentença nos termos do artigo 372º nº 5 do CPP, não tem similitude nem analogia com qualquer um dos circunstancialismos processuais subjacentes aos acórdãos do TRL de 23-06-2005, proc. 4544/2005-9, Relator Almeida Cabral e de 03-11-2010, proc. 211/01.1TASCR.L1-3, Relatora Maria José Costa Pinto, acessíveis in www.dgsi.pt, que o Recorrente insiste em citar.
No processo em que foi proferido o acórdão indicado em primeiro lugar, segundo se afirma no sumário (não está disponível o texto integral) a sentença foi lida “...por apontamento...” e o texto final, foi depositado vários meses depois e no processo 211/01.1TASCRL1-3, o depósito na secretaria ocorreu, mais de um ano depois da leitura da sentença. Na situação concreta destes autos não houve demora do depósito da sentença, nem inferior, nem superior.
Reproduzindo uma vez mais a decisão singular:
O prazo de trinta dias de interposição do recurso deve contar-se a partir da data de depósito da sentença, ou seja, do dia 02-03-2020 (artigo 411º nº 1, alínea b) do Código de Processo Penal) e a questão suscitada de inexistência da sentença é manifestamente improcedente.
Em conformidade com o regime previsto no artigo 7º nº 1 e 10º da Lei nº 1-A/2020, de 19 de Março, no artigo 37º do Decreto-Lei 10-A/2020, de 13 de Março e nos artigos 8º e 10º da Lei nº 16/2020, de 29 de Maio, houve suspensão do decurso dos prazos judiciais entre os dias 09-03-2020 e 03-06-2020.
Assim, o prazo de interposição do recurso do Arguido teve o início em 03-03-2020, tendo decorrido até 08-03-2020. Após a suspensão, a contagem do prazo de recurso prosseguiu em 04-06-2020 e completou-se em 29-06-2020 (dias 27 e 28/6, sábado e domingo).
Trata-se de um prazo peremptório, cujo decurso faz extinguir o direito de praticar o acto.
Com o pagamento de multa processual, poderia ainda o recurso ter sido interposto até ao 3º dia posterior ao prazo normal (artigos 107º A do C.P.P. e 139º do C.P.C.), ou seja, na situação em apreço, até ao dia 02-07-2020.
Decorre do exposto que o recurso do Arguido, apresentado apenas no dia 03-07-2020, é intempestivo.
O recurso não é admitido quando a decisão não for recorrível, quando for interposto fora de tempo, quando o recorrente não tiver as condições necessárias para recorrer ou quando faltar a motivação - art. 414.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
A decisão que admita o recurso ou que determine o efeito que cabe ou o regime de subida não vincula o tribunal superior.
Sendo inquestionável que a anterior decisão neste âmbito não constitui caso julgado formal, nem vincula o tribunal superior (artigo 414º nº 3 e 417º nº 6, alínea b), ambos do C.P.P.), deve manter-se a decisão reclamada.
III - DISPOSITIVO
Pelos fundamentos expostos, acordam em conferência os juízes do Tribunal da Relação de Lisboa em indeferir a reclamação e em confirmar a decisão de rejeição por extemporaneidade do recurso do Arguido AA.
(…).
10. Enquadramento.
Elaborada a síntese que entendemos necessária para o julgamento deste Recurso de Fixação de Jurisprudência, cumpre realçar o seguinte:
Em face de tudo o exposto em supra 8. e 9., resulta desde logo que a questão colocada pelo recorrente- saber se, em processo penal, quando não exista o efectivo depósito da sentença, a contagem de prazo para efeitos de recurso apenas se inicia com a notificação ao arguido da disponibilização da sentença, - não foi objecto de decisão expressa no Acórdão Recorrido.
Com efeito, a questão que se colocou no Acórdão Recorrido foi a de saber se o recurso do arguido interposto da sentença, proferida em 2.03.2020, no Juízo Local Criminal do ………, Juiz …., havia ou não sido interposto dentro do prazo legal tendo o TRL concluído pela sua intempestividade e, consequentemente, rejeitado o mesmo.
Aliás, na decisão sumária (objecto de reclamação para conferência) decidiu-se que a situação em apreço nos presentes autos, em que houve leitura integral da sentença na presença do arguido e do Advogado, bem como depósito no momento processual seguido, com possibilidade de acesso a cópia da sentença nos termos do artigo 372.º, n.º 5, do CPP, não tem similitude, nem analogia com qualquer um dos circunstancialismos processuais subjacentes aos acórdãos do TRL de 23.06.2005, proc. 4544/2005-9, e de 03.11.2010, proc. 211/01.1TASCRL1-3, acessíveis in wwiv.dgsi.pt, ambos citados pelo recorrente (sendo, eventualmente, este último o Acórdão Fundamento).
No processo em que foi proferido o acórdão do TRL de 23.06.2005, proc. 4544/2005-9, como se afirma no seu sumário, a sentença foi lida por apontamento...e o texto final, foi depositado vários meses depois; e, no acórdão de 03.11.2010, proc. 211/01.1TASCRX1-3, o depósito na secretaria ocorreu, mais de um ano depois da leitura da sentença.
Como se vê, apesar de o recorrente ter invocado dois Acórdãos Fundamento, do TRL, e de tal circunstância poder levar à rejeição do presente recurso de fixação de jurisprudência, sempre se dirá que as situações de facto decididas nos mencionados acórdãos não apresentam similitude com a apreciada no Acórdão Recorrido. Ao contrário do que acontece nesses acórdãos, nos presentes autos, o Tribunal considerou que houve lugar à leitura da sentença e, seguidamente, foi a mesma depositada. Por outras palavras: na situação em apreço no presente recurso não decorreu nenhum lapso de tempo entre o depósito da sentença: o prazo de trinta dias de interposição do recurso deve contar-se a partir da data de depósito da sentença, ou seja, do dia 2.03.2020 (artigo 411.º, n.º 1, alínea b) do CPP) e a questão suscitada de inexistência da sentença é manifestamente improcedente.
O que é manifestamente diverso das situações tratadas e decididas nos Acórdãos Fundamento que o recorrente pretende estarem em oposição com o presente.
E, mais se recorde que como se diz no Acórdão Recorrido, acompanhando o critério do TC no acórdão n.º 545/2006, todos os elementos disponíveis coincidem no entendimento de que a partir do dia 2.03.2020, com a leitura pública da sentença e o subsequente depósito nesse mesmo dia, o Ilustre Mandatário do ora recorrente, actuando com a diligência devida, ficou em condições de solicitar e de obter uma cópia da sentença e assim ter acesso ao teor integral e inteligível da decisão, para a preparação dos meios de defesa que julgasse pertinentes e para o cabal exercício do direito ao recurso e ao contraditório constitucionalmente garantidos.
Não houve, por isso, qualquer diminuição inadmissível das garantias de defesa do arguido, nem violação do direito ao recurso, consagrados no artigo 32. º, n. º 1, conjugado com o artigo 20.º, n.º 4, ambos da CRP, mediante um processo equitativo (due process of law, a fair process).
Em conclusão: não se pode concluir pela verificação da necessária oposição de julgados entre o Acórdão Recorrido e o Acórdão Fundamento, o que redunda na rejeição do recurso de fixação de jurisprudência, nos termos do disposto no artigo 441.º, n.º 1 do CPP.
Verifica-se, deste modo, que falecem os requisitos substanciais do recurso extraordinário.
11. Nesta conformidade, não se verificando a existência dos respectivos requisitos indicados no artigo 437.º, do CPP, o presente recurso extraordinário vai rejeitado, nos termos do disposto nos artigos 440. º, n.ºs 3 e 4 e 441. °, n. º 1, ambos do CPP.
12.O decaimento total no recurso impõe a condenação do demandante em custas, nos termos e com os critérios fixados no artigo 521.º, do CPP, e no artigo 8.º e tabela III, estes do Regulamento das Custas Processuais.
III.
13. Pelo exposto,
a) rejeita-se o recurso extraordinário para fixação de jurisprudência interposto pelo arguido AA;
b) condena-se o arguido nas custas com a taxa de justiça em 3 (três) unidades de conta (UC).
17 de Junho de 2021
Processado e revisto pela relatora, nos termos do disposto no artigo 94.º, n.º 2 do CPP, e assinado eletronicamente pelos Senhores Juízes Conselheiros signatários.
Margarida Blasco (Relatora)
Eduardo Loureiro (Adjunto)
_______________________________________________________
[1] Acórdão que indeferiu a reclamação do recorrente e confirmou a decisão sumária de 24.11.2020, que rejeitou o recurso por extemporaneidade.
[2] Proc. n.º 1986/10.2TXCBR-M. P1-C. S1 - 3.ª Secção, de 27.02.2019; Proc. n.º 251/18.1T8VIS.C1-A. S1 - 3.ª Secção, de 13.02.2019; Proc. n.º 137/16.4YUSTR.L1-A. S1 – 5.ª Secção, de 28.09.2017; Proc. n.º 170/05.1PQLSB.L1-A. S1 - 5.ª Secção, de 23.02.2012.
[3] Direito Processual Penal Português, Do Procedimento (Marcha do Processo), Universidade Católica Editora, vol. 3, 2015, Lisboa, p. 361.
[4] Direito Processual Penal, Almedina, 2016, p. 214.
[5] Neste sentido, pode ler-se o acórdão do STJ de 23.01.2008: “I - A lei processual faz depender a admissibilidade do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência da existência de determinados pressupostos, quer de natureza formal, quer de natureza substancial - art.º 437º nºs 1, 2 e 3 e 438º nºs 1 e 2 do CPP; II - As exigências formais, relativas à génese fáctico-jurídica de tal recurso extraordinário, bem como à sua tramitação processual, constituem procedimentos específicos, excepcionais, de taxativa e rigorosa aplicação, vinculando todos os sujeitos processuais; III - A norma do art.º 438º nº 2 do CPP, é de âmbito mais restrito do que a norma do art.º 412º nº 1 do CPP: esta define de forma vulgar ou genérica, a estrutura da motivação dos recursos ordinários, em processo penal; aquela, é uma norma específica ou, excepcional que impõe, define e delimita os termos da motivação constante do requerimento de interposição do recurso extraordinário de fixação de jurisprudência; IV - A omissão na motivação, de requisitos legais necessários à admissibilidade do recurso de fixação de jurisprudência, implica a inadmissibilidade deste; V - Não há uma imposição constitucional de convite ao aperfeiçoamento da motivação que não cumpra as exigências legais, sendo que, a definição pelo legislador das exigências formais necessárias ao exercício do direito ao recurso, desde que processualmente proporcionais e adequadas à sua finalidade, não viola o direito ao recurso constitucionalmente consagrado; VI - O artigo 440º do CPP, - diferentemente do disposto no artigo 417º nºs 3 e 4 do mesmo diploma legal adjectivo -, não prevê, nem consente o convite ao aperfeiçoamento do requerimento de interposição do recurso - apenas prevê que o relator possa determinar que o recorrente junte certidão do acórdão com o qual o recorrido se encontra em oposição; VII - O recurso de fixação de jurisprudência, exige a indicação e referência de um único acórdão fundamento, aquele com o qual o acórdão recorrido se encontra em oposição e, que origina o conflito de jurisprudência; VIII - A indicação de vários acórdãos fundamento implica a rejeição do recurso”. No mesmo sentido, o Acórdão de 21.03.2013, Processo n.º 201/03.