RECURSO PENAL
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DECISÃO SINGULAR
REJEIÇÃO
Sumário

Texto Integral



Acordam em Conferência na 3ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça,

I

Nestes Autos o Recorrente AA impugna os Despachos que indeferiram a Reclamação para a Conferência de Decisão Sumária proferida no Tribunal da Relação …… no âmbito de um recurso interposto pelo Ministério Público.

II

Da respetiva Motivação retirou as seguintes Conclusões:

1. O arguido notificado da douta decisão Sumária apresentou Reclamação para a Conferencia reclamando a prolação do douto Acórdão, nos termos do nº 8 do artº 417º do CPP.

2. Sendo-lhe desfavorável a douta decisão Sumária proferida o arguido tem legitimidade e interesse em agir nos termos dos artºs 401º nºs 1 e 2 do artº 417º do CPP e bem assim dos artºs 28º e 32º do CPP.

3. Embora não tendo contra-alegado na 1ª instancia, o que é facultativo e não pode sofrer qualquer sanção, mantém legitimidade e interesse em agir por força do disposto no artº 417º do CPP e 32º do CPP.

4. A douta decisão de ordenar a baixa imediata do processo nos termos do artº 670º do CPC, viola esta própria norma que confere tal competência à Conferência!

5. O Venerando Desembargador Relator não tem competência para decidir as Reclamações apresentadas, nem para ordenar a baixa dos autos nos termos do artº 670º do CPC porquanto tal competência cabe à Conferência.

6. As doutas decisões ora em recuso violam o disposto nos art°s 401°, 413° e 417° do CPP, no art° 670° do CPC e ainda o preceito Constitucional dos art°s 32° da CRP.

Nestes Termos, devem ser anulados ou revogados as doutas decisões em recurso ordenando-se a remessa dos autos à Conferência para douto Acórdão.

Assim é de Justiça!

III

Na sua resposta, o Digno Magistrado do Ministério Público, junto do Tribunal da Relação ….., pronunciou-se pela inadmissibilidade do presente recurso.

IV

Neste Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se, igualmente, pela rejeição do recurso por inadmissibilidade, nos termos do disposto nos artigos 414º, nº 2, e nº 3, 417º, nº 6, al. b), 420º, nº 1, al. b), e 432º, al, b), todos do CPP.

Foi cumprido o disposto no artigo 417º nº 2 do CPP.

O recorrente veio aos Autos expressar a sua oposição ao Parecer da Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta e reafirmando o anteriormente expendido, manifestar a sua discordância com a rejeição do recurso propugnada no referido Parecer.

V

Realizada a Conferência, cumpre apreciar e decidir:

Parece ser curial começar por consignar que, atenta a natureza da questão a dirimir no presente recurso, este Tribunal entendeu dever decidi-la em sede de Conferência, e não por Despacho prévio da Relatora, a fim de evitar a realização de atos inúteis, o que ocorreria se o recorrente entendesse dever reclamar desse Despacho para a Conferência.

E, por ser claro e conciso o resumo da tramitação destes Autos e o sentido da pretensão do recorrente, considerou-se ser adequado proceder à transcrição do excerto que segue das Contra-Alegações apresentadas, nestes Autos, pelo Digno Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal da Relação ….:

“1. No processo n.° 338/20….., do Tribunal Judicial da Comarca de …. -Juízo de Instrução Criminal (J….), no qual se investiga(va) a prática de crimes de abuso sexual de menor dependente, agravados, e de pornografia de menores, agravados, o Ministério Público interpôs para o Tribunal da Relação …. recurso do despacho nele proferido pelo senhor juiz de instrução criminal que, qualificando diversamente os factos indiciados, aplicou ao arguido as medidas de coação de proibição de contactos com a mulher e as duas filhas dela (menores), por qualquer meio, de proibição de se aproximar delas a menos de 2.000m e aceder à sua residência e/ou local de trabalho ou estudo das menores, com controlo por meios telemáticos, e obrigação de apresentação diária no OPC da área da sua residência.

Com o recurso pretendia-se a revogação de tal decisão e a sua consequente substituição por outra, que impusesse ao arguido a medida de coação de prisão preventiva.

2. O Tribunal da Relação ….., conforme decisão sumária de 3 de novembro de 2020, divergindo da subsunção jurídica levada a cabo pelo tribunal recorrido e acolhendo a operada pelo Ministério Público (144 crimes de abuso sexual de menor dependente, agravados, e 3 crimes de pornografia de menores, agravados), revogou o despacho recorrido o respeitante à medida de coação decretada e ordenou a sua substituição por outro, que aplicasse ao arguido a medida de coação de prisão preventiva.

Na sequência, o arguido reclamou para a conferência, pretendendo ver invertida a decisão sumária e a sua substituição por outra, que apreciasse, nessa sede, o que expendera na resposta que oferecera ao parecer do Ministério Público, produzido ao abrigo do disposto no art. 417°, n.° 2, do CPP, reclamação que não foi admitida, conforme despacho do senhor desembargador relator, de 20 de novembro de 2020, por carecer de legitimidade para tanto.

Do predito despacho reclamou o arguido para o senhor Presidente do Tribunal da Relação …., pretendendo a sujeição desta nova «reclamação» a decisão da conferência.

Por despacho do senhor desembargador relator, datado de 9 de dezembro de 2020, foi tal pretensão indeferida, em vista da impropriedade do meio utilizado pois, e quando muito, e a poder recorrer-se, o recurso teria que ser dirigido ao STJ e a reclamação, por seu turno, ao Presidente do STJ.

A decisão sumária que julgou o recurso interposto pelo Ministério Púbico do despacho proferido pelo senhor juiz de instrução, concedendo-lhe provimento, transitou em julgado em 19 de novembro de 2020.

3. É dos preditos despachos do senhor desembargador relator, datados de 20 de novembro e de 9 de dezembro de 2020, que vem interposto pelo arguido para o STJ o recurso em presença, peticionando o recorrente a respetiva revogação e que se remetam os autos à conferência para prolação de acórdão sobre a decisão sumária que concedeu provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público do despacho do senhor juiz de instrução criminal.”

Como é sabido os recursos ordinários perante o Supremo Tribunal de Justiça visam exclusivamente o reexame da matéria de Direito, sem prejuízo do conhecimento oficioso de qualquer dos vícios elencados no artigo 410º nº 2 do CPP, os quais, porém, não podem constituir fundamento do recurso.

Tal determina, sem mais, que a pretensão do recorrente careça do devido suporte legal.

Na verdade, nestes Autos o recorrente pretende que este Alto Tribunal se debruce e aprecie as duas Decisões Sumárias acima identificadas, as quais, como alegado pelo Digno Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal da Relação ….., não admitem recurso em virtude de “a decisão sumária que decidiu do recurso interposto do despacho proferido pela 1ª instância transitou em julgado antes da prolação de tais despachos pelo senhor desembargador relator e o acórdão que o recorrente pretende(ria) ver tirado sobre as decisões sumárias que não admitiram as reclamações (não conhecendo dos respetivos fundamentos) seria insuscetível de naquela se repercutir, sob pena de ofensa do caso julgado.”

Sendo ainda que, como alegado pela Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta neste Tribunal “(…) só se recorre para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdãos, proferidos pelos Tribunais das Relações, sempre que estes Tribunais decidem como instância de recurso – cfr. o art. 432º, nº 1, do Cod. Proc. Penal, sendo manifesto que as decisões recorridas não se enquadram na previsão desta norma legal. Com efeito, estamos perante uma decisão proferida pelo Sr. Juiz Desembargador Relator do Tribunal da Relação, em sede de recurso, e de uma decisão proferida pelo Sr. Presidente do Tribunal da Relação, em sede de reclamação, de uma decisão proferida por aquele Tribunal da Relação.

E, se atentarmos ao disposto na al. b), do nº 1, do citado art. 432º do Cod. Proc. Penal, em conjugação com o art. 400º, nº 1, do mesmo diploma legal, verificamos que apenas é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdãos proferidos, em recurso, pelo Tribunal da Relação.”


Nesta conformidade, e nos termos do disposto nos artigos 414º nº 2 e 3 e 420º nº1 do CPP, outra conclusão se não impõe que não seja a da inadmissibilidade legal do presente recurso e, consequentemente a sua rejeição, nos termos conjugados do disposto nos artigos 414º, nº 2, e nº 3, 417º, nº 6, al. b), 420º, nº 1, al. b), e 432º, al, b), todos do CPP.

VI

Tendo em consideração todo o exposto, e face ao disposto nos artigos 414º, nº 2, e nº 3, 417º, nº 6, al. b), 420º, nº 1, al. b), e 432º, al, b), do CPP., acorda-se em rejeitar o presente recurso por inadmissibilidade legal.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 Ucs.

Fixa-se em 5 UCs a importância a que se reporta o nº4 do artigo 420º do CPP.


Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 15º-A do Dec-Lei nº 20/2020 de 1 de maio, consigno que o presente Acórdão tem voto de conformidade do Ex.mo Adjunto, Juiz Conselheiro Sénio Reis Alves.

Feito em Lisboa, aos 9 de junho de 2021

Maria Teresa Féria de Almeida (relatora)