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CONTRATO DE OPÇÃO
COMPRA DE IMÓVEL
CONTRATO PROMESSA
ESCRITURA PÚBLICA
NULIDADE
VÍCIO DE FORMA
DOCUMENTO PARTICULAR AUTENTICADO
Sumário
I - O contrato de opção relativo a compra de bem imóvel deve revestir a forma exigida para o contrato cuja formação se trate. Melhor explicitando, o contrato de opção em apreço teria que ser celebrado por escritura pública ou por documento particular autenticado conforme decorre do disposto nos artigos 875º do CC e 80º do Código do Notariado. II - Tendo o pacto de opção, celebrado por documento escrito, assumido os requisitos bastantes para consubstanciar um negócio sucedâneo de contrato-promessa de compra e venda, sendo a vontade hipotética e conjectural das partes no sentido de pretenderem celebrar uma escritura de compra e venda, é de admitir que se tivessem previsto a nulidade por vício de forma teriam celebrado um contrato-promessa de compra e venda, pois que o resultado final económico-jurídico, embora mais precário, aproxima-se do tido em vista pelas partes com a celebração do contrato inválido. Sendo essa vontade a de compra e venda do imóvel, deve-se concluir pela admissibilidade da conversão do contrato de opção, nulo por vício de forma, num contrato-promessa de compra e venda
Texto Integral
Proc. nº 15687/18.0T8PRT.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo Central Cível do Porto - Juiz 3
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I - Relatório
B… e C… intentaram acção declarativa, em processo comum, contra D…, SA, formulando os seguintes pedidos:
a) Ser reconhecido o direito dos autores à execução específica do contrato celebrado entre eles e a ré, proferindo-se sentença que produza os efeitos da declaração negocial da faltosa, ré, assim se declarando que a ré vende aos autores a fracção autónoma identificada pela letra “E”, correspondente a uma habitação no primeiro andar direito, tipo T dois, com entrada pelo nº 364 de polícia, integrada no prédio em regime de propriedade horizontal sito na Avenida… nºs …, …, …, na união de freguesias de …, …, …, …, … e …, concelho do Porto, descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o número 662 da freguesia … e inscrito na matriz sob o artigo nº 7333 da referida união de freguesias pelo preço de €170.000,00 e que os autores aceitam a referida venda;
b) Ser a ré condenada a pagar aos autores a quantia de €1.160,00, bem como o valor correspondente a todas as rendas que vierem a ser pagas posteriormente à instauração da presente acção até ao dia do trânsito em julgado da decisão que declare a venda da fracção autónoma aos Autores, transmitindo-a àqueles;
c) Ser a ré condenada a pagar os juros de mora à taxa legal, actualmente de 4%, sobre o valor que se mostrar devido aos autores nos termos dos pedidos anteriores, até ao seu efectivo e integral pagamento, tendo para o efeito alegado, em suma que, pretendem que lhes seja reconhecido o direito à execução específica do contrato celebrado entre eles e a ré, proferindo-se sentença que produza os efeitos da declaração negocial da ré, alegando como causa de pedir que apesar de ter sido convencionado um pacto de opção de compra no contrato de arrendamento celebrado com a ré, o que ficou acordado é que a ré ficaria obrigada à celebração do contrato definitivo visado, isto é, obrigada a celebrar com eles escritura pública de compra e venda do imóvel objecto do arrendamento, consubstanciando o contrato celebrado entre as partes, a partir do exercício da opção de compra pelos AA, um contrato-promessa de compra e venda, tendo por isso marcado a escritura para celebração desse contrato definitivo a que a ré se recusou comparecer.
Regularmente citada, a ré contestou, suscitando as excepções da ineficácia do contrato por falta de poderes de representação, da nulidade do contrato de opção por vício de forma, da ineptidão da petição inicial por contradição entre o pedido e a causa de pedir e, que os AA não exerceram o direito de opção dentro do prazo contratualmente acordado, tendo caducado tal direito.
Exercido o contraditório pelos autores, pugnaram pela improcedência das excepções, suscitando a conversão do negócio caso venha a ser declarado nulo, alegando o abuso de direito e, concluindo como na PI.
Realizada audiência prévia, foi proferido despacho saneador, no qual foi julgada improcedente a excepção da ineptidão da petição inicial, foi fixado o objecto do litígio, factos assentes e foram elaborados temas de prova, que não sofreram reclamação.
Procedeu-se a julgamento com observância do formalismo legal.
Foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
“Julgo parcialmente procedente, por provada, a presente acção e, consequentemente: a) Reconheço o direito dos Autores à execução específica do contrato-promessa de compra e venda, contrato resultante da conversão e, em substituição da aqui Ré, declaro vendida aos Autores, pelo valor de 170.000,00 (cento e setenta mil euros), a fracção autónoma identificada pela letra “E”, correspondente a uma habitação no primeiro andar direito, tipo T dois, com entrada pelo nº 364 de polícia, integrada no prédio em regime de propriedade horizontal sito na Avenida…, nºs …, …, …, na união de freguesias de …, …, …, …, …, concelho do Porto, descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o número 662 da freguesia … e inscrito na matriz sob o artigo nº 7333 da referida união de freguesias; b) Absolvo a Ré dos demais pedidos formulados sob as alíneas b) e c). Condeno a Ré como litigante de má-fé, na multa de 5 ucs.”
A ré, D… – Imobiliária, S.A, veio interpor recurso, concluindo: I – Sustenta a decisão recorrida que os Apelados lograram provar o exercício de forma válida e eficaz do direito de opção de compra e, convertendo o tribunal a quo o contrato de opção nulo por vício de forma em contrato- promessa, reconhecendo o direito daqueles à execução específica do promessa e declarando vendida aos Autores, pelo valor de 170.000,00 (cento e setenta mil euros), a fração em causa, declarou a ação parcialmente procedente, condenando, ainda, a Ré como litigante de má-fé, na multa de 5 ucs bem como no pagamento das custas (...) na proporção do respectivo decaimento. II – O Tribunal a quo julgou, incorretamente, a matéria de facto subjacente à decisão na parte da fundamentação que declarou como provados um conjunto de factos, os constantes dos n.ºs 13, 16, 17, 18 e 20 do segmento da decisão designado Factualismo dado como assente, entendendo a Apelante que os mesmos se encontram indemonstrados, ou, pelo menos, com um teor diverso daquele que resulta da decisão em crise bem como fez um errado enquadramento jurídico dos factos, sua subsunção à Lei e às normas da lex contractus, e interpretação dessas mesmas normas. III - No que a estes factos diz respeito, o Tribunal a quo, especificamente quanto ao facto provado em 13. formou a sua convicção pela confissão do legal representante da Ré e quanto aos restantes 16, 17, 18 e 20 teve em consideração o teor da prova documental junta a fls.14 a 20, fls. 40 a 48v, fls. 57a 60v e os depoimentos das testemunhas E…, F… e G…. IV - Ocorre que toda a correspondência trocada entre as partes, mormente a carta datada de 08/março/2018 e a carta datada de 15/junho/2018, não pode corroborar que os Recorridos exerceram de forma válida e eficaz o direito de opção de compra de que dispunham uma vez que, dentro do prazo que lhes havia sido concedido para o efeito, os Recorridos não optaram pela compra da fração, mas afirmaram que a compra/inquisição ia ser feita pela sua filha. V - Da mesma forma que ressalta dessa documentação que a Recorrente respondeu à remetente das duas primeiras missivas que lhe foram enviadas, datadas, respetivamente, de 09/março/2018 e de 29/maio/2018, apesar de a sua carta lhe ter sido devolvida conforme consta da informação prestada pelos CTT. VI - Se pelas razões apontadas a correspondência referida não poderá corroborar e nela se alicerçar os factos impugnados e acima identificados, 16, 17, 18 e 20, o mesmo sucederá com os depoimentos das testemunhas E…, F… e G… de cujos depoimentos ficou claro que os Recorridos nunca quiseram comprar o que quer que fosse e muito menos o imóvel em causa nestes autos. VII - Foi demonstrado pelos seus depoimentos que quem quis comprar foram as testemunhas E… e G…., os quais se abeiraram do comercial da Recorrente, F…, comunicando-lhe a intenção de serem eles próprios a adquirir/comprar o imóvel arrendado, pelo que não pode a aludida carta datada de 09/março/2018 configurar o exercício do direito de opção pelos Autores. VIII - Exemplo sublime de tal conclusão foi o depoimento de E…, filha dos Autores, ouvida em audiência de julgamento, em depoimento gravado no dia 16-12-2019 com início às 16h.55 e com duração de 20 minutos e 3 segundos, afirmou a instâncias da Magistrada Judicial por referência à carta de 09/março/2018: [00:17:12] - Magistrada Judicial: Pronto e qual foi o objetivo com aquela carta? [00:17:15] – E…: Portanto, seria os meus pais, como sendo as pessoas que figuravam no contrato, e nós como depois iriamos exercer opção de compra se não houvesse nada contra. [00:17:27] - Magistrada Judicial: E os seus pais o que é que pretendiam com aquela carta? [00:17:31] – E…: Na verdade, os meus pais, portanto, os meus pais são sempre instruídos por nós. Os meus pais nesta fase não têm capacidade para decidir… Eles basicamente querem é uma casa para viver, portanto, não têm capacidade nem percebem o que é que deve ser feito. IX - Só após a recusa da Recorrente em celebrar contrato com a filha dos Recorridos, esta e o marido, conscientes de que a opção tinha sido exercida por quem não devia, colocaram os aqui Recorridos a exercer o aludido direito de opção/compra, por carta por estes remetida, assinada e datada de 15/junho/2018 e recebida pela Ré a 20 de Junho de 2018 e, portanto, já depois do prazo que tinham para o efeito. X - De nenhuma parte do depoimento do representante legal da Apelante é evidente que a Apelante se obrigava a vender caso os Recorridos/Autores manifestassem, tão só, a opção de compra, mas sim que se obrigava a vender caso aqueles quisessem comprar a fração. XI - Os pontos 13., 16., 17., 18. e 20 da factualidade dada como provada da sentença recorrida deverão, por isso, ser alterados nos termos supra afiançados: 13. Autores e Ré pretenderam, sabendo ser essa a sua vontade mútua, que a Ré se obrigasse a vender a fracção autónoma identificada no contrato, pelo preço de €170.000,00 caso os Autores optassem pela compra da aludida fração até determinado prazo; 16. Previamente ao envio da carta datada de 9/3/2018, E… e G… haviam contactado F…, funcionário da Ré, que nessa qualidade manteve contactos com os Autores, antes e depois da assinatura do contrato, informando-o que pretendiam que o exercício da opção de compra fosse feito em nome deles e não em nome dos pais da E…, ao que aquele sugeriu que formalizassem tal intenção junto da sua administração. 17. Na sequência desses contactos, ainda no dia de 09 de Março de 2018 e antes do envio da carta junta como doc. 2 da PI, a filha dos Autores, E…, remeteu ao referido F… mensagem de correio eletrónico para a caixa de correio com o endereço F…@D1….pt pela qual pôs à consideração daquele o teor da carta que iriam fazer seguir para a Administração da D… nos termos que constam do doc. 4 junto com a PI; 18. Em anexo à referida mensagem de correio electrónico foi remetida cópia do contrato e da carta pretendida enviar à Ré; 20. A referida filha dos Autores, E…, remeteu no dia 06 de Junho de 2018 ao dito F… mensagem de correio electrónico para a caixa de correio daquele, nos seguintes termos: “Bom dia Sr. F…, Conforme falado telefonicamente com o meu marido, junto envio cópia da carta que remetemos ao cuidado da Administração da empresa D…, S.A.. Precisamos de falar com o Sr. F… pois precisamos de confirmar os detalhes e marcação da escritura. O meu marido tem ligado para o Sr. F…, mas sem sucesso. Ficamos aguardar o seu contacto urgente." Obrigada! Melhores cumprimentos, E… (… . …)” XII - E constar como facto não provado que Os Autores exerceram de forma válida e eficaz o seu direito de optar pela compra da fração; XIII - Mesmo que assim não se entendesse e permanecesse inalterada a matéria de facto dada como provada, o que não se concebe, mas se equaciona por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que considerando o Tribunal a quo que estamos perante um pacto de opção, ao qual se aplicará o regime do contrato de opção, o contrato em discussão sempre seria nulo. XIV - Nenhuma das partes requereu a conversão do contrato de opção, nulo por vício de forma, num contrato de promessa de compra e venda, pelo que, mesmo que todos os requisitos para o efeito estivessem preenchidos, nunca poderia o Tribunal a quo tê-lo feito oficiosamente, de nada valendo a invocação de que resulta da matéria de facto dada como provada que a vontade hipotética das partes era a celebração de uma escritura de compra e venda. XV - Da mesma forma que não é válido o argumento de que a invocação da nulidade formal do contrato de opção não é permitida porque houve atuação da Ré em abuso de direito já que a paralisação da invocação da nulidade por vício de forma só ocorrerá quando tal vício é imputável à parte que se quer prevalecer da nulidade ou quando a conduta das partes se traduziu no cumprimento do contrato, criando na contraparte a confiança de que assim se manteria, situações que, in casu, não ocorreram porquanto não houve da parte da Recorrente qualquer ação ou omissão, de forma, pensada, deliberada e intencional no sentido de celebrar um negócio nulo, para, posteriormente, invocar essa nulidade em seu proveito nem ambas as partes cumpriram o que quer que fosse no que ao contrato de opção concerne. XVI - É impossível aceitar que a carta de 9/Março/2018 possa ser entendida como uma cessão de créditos desde logo porque os Recorridos não detinham qualquer crédito sobre a Recorrente, mas antes um direito de opção, e, ainda, porque a cessão de créditos só seria possível se o crédito não estivesse, pela própria natureza da prestação, ligado à pessoa do credor, o que, in casu, ocorria pois a possibilidade de compra da aludida fração só havia sido concedida aos Recorridos devido à sua qualidade de arrendatários. XVII - A Apelante ao invocar, em sede de contestação, que a administradora não tinha poderes para subscrever o contrato, não alterou a verdade dos factos uma vez que de acordo com o pacto social, como vem vertido no ponto 24 dos factos dados como provados, a sociedade só se obriga perante a intervenção única do Presidente do Conselho de Administração (cujo cargo não é ocupado pela administradora em causa), com a intervenção de dois administradores (a administradora subscreveu o contrato sozinha) ou com a intervenção de qualquer administrador nos contratos de empreitada, fornecimento, notas de encomenda de materiais e autos de consignação de trabalhos (não incluindo, portanto, o contrato subscrito pela administradora). XVIII - O negócio em causa apenas foi ratificado por outro gerente em audiência de julgamento, pelo que o mesmo, até essa data, não estava completo. XIX - A Recorrente alegou que a forma de obrigar a sociedade, neste tipo de contratos, exigia a intervenção de dois administradores e tal sempre correspondeu à verdade, pelo que é falso que a Apelante tenha invocado falsamente tal ausência de poderes e, consequentemente, que tenha litigado com má-fé XX - A sentença recorrida viola, frontalmente, e faz, cremos, uma errada interpretação das disposições legais constantes dos artigos 293.º, 334.º, 577.º, n.º 1, 583.º todos do Código Civil (C.C.) e 542.º do C.P.C. XXI - Assim, mesmo com a matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo, sempre se imporia uma diferente decisão de direito, o que implicaria, a final, a improcedência da ação nos termos peticionados Termos em que, invocando-se o Douto suprimento do Venerando Tribunal, deverá o presente recurso ser declarado procedente e em consequência, revogar-se a decisão recorrida, com as consequências daí decorrentes. Porém, V. Ex.as decidirão como for de JUSTIÇA
C…, H… e E… vieram apresentar contra-alegações, com ampliação do âmbito do recurso, nos termos do disposto nos artigos 638º e 636º do Cód. Proc. Civil, bem como REQUERER A CONDENAÇÃO DA RÉ NO PAGAMENTO DE UMA INDEMNIZAÇÃO POR TER LITIGADO DE MÁ-FÉ, nos termos do disposto no art. 542º do Cód. Proc. Civil, e ainda INTERPOR RECURSO SUBORDINADO, concluindo: 1. Deve manter-se inalterada a matéria de facto julgada provada pela douta sentença recorrida. 2. Em ampliação do âmbito do recurso e face à matéria de facto provada, em específico sob os pontos 1º, 3º, 5º, 6º e 13º da sentença recorrida, deveria ter sido julgado que foi celebrado entre as partes um contrato promessa de compra e venda que se mostrou perfeito (exigível o cumprimento) com a manifestação da intenção de compra realizada pelos Autores a 09 de Março de 2018. 3. Tudo o que se impunha por força do disposto nos arts. 410º e 236º, 237º e 238º do Cód. Civil. 4. Já em sede de contraditório/resposta ao recurso apresentado pela Ré, a conversão do negócio jurídico operada pela sentença recorrida foi questão invocada pelos Autores como contra-execeção à nulidade invocada pela Ré na sua Contestação, pelo que não foi oficiosamente conhecida pelo Tribunal. 5. A invocação pela Ré da suposta nulidade do contrato celebrado com os Autores é, tal como decidiu a sentença recorrida, ato praticado em abuso de direito, nos termos do disposto no art. 334º do Cód. Civil, o que impõe a validade do contrato celebrado, como sanção do ato abusivo. 6. Também a invocação realizada pela Ré de caducidade do exercício do direito de manifestação da intenção de compra é ato praticado em abuso de direito, nos termos do disposto no art. 334º do código civil, o que impõe a paralisação de tal invocação. 7. A Ré litigou de má-fé ao invocar em sua defesa que não estava vinculada ao cumprimento do contrato outorgado pela sua administradora I… quando sabia que ocorria o seu contrário, por decisão do seu Conselho de Administração, em consonância com as dezenas de contratos por si celebrados através da intervenção exclusiva daquela administradora que foram juntos aos autos e tal como confessado, em sede de depoimento de parte, pelo presidente do seu conselho de administração. 8. Assim, deve manter-se a procedência do decidido na alínea a) da decisão da sentença recorrida, bem como manter-se a condenação da Ré como litigante de má-fé.
B. DO PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO À RÉ PELA SUA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
Nos termos do disposto no art. 542º do Cód. Proc. Civil, tendo litigado de má-fé, a parte é condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir. Ensina o Prof. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, em Cód. Proc. Civil anotado, vol. II, 3ª edição, Julho de 2017, Almedina, que o pedido de indemnização não carece de ser deduzido nos prazos em que é admissível a dedução de pedidos que constituem o objeto de acção, devendo ser deduzido antes da decisão final, em 1ª instância ou em recurso. Os Autores não deduziram pedido de indemnização civil por litigância de má-fé até à prolação da decisão de 1ª instância, mas certo é que a conduta processual da Ré, mantida pela instauração do presente recurso, cujos efeitos suspensivos obstam à concretização do direito dos Autores, tudo agravado pela conduta processual descrita na sentença recorrida e a que supra se faz referência, designadamente: i. A invocação da suposta nulidade formal do contrato contra a conduta pretérita da Ré; ii. A invocação da caducidade do direito de opção por ilegitimidade/ineficácia do seu exercício, quando a Ré deu o seu prévio acordo à carta de 9 de Março de 2018 e depois decidiu, pelo seu departamento jurídico, omitir resposta aos Autores, para ultrapassado o prazo previsto no contrato, passar a sustentar a caducidade do direito. iii. Sustentação da sua não vinculação ao contrato pela assinatura da sua gerente quando bem sabia que a mesma a obrigava nos termos decididos pelo seu conselho de Administração. Corresponde a litigância de má-fé que atribuiu às Autoras direito de indemnização, nos termos previstos nos arts. 542º e 543º. Os Autores já pagaram aos seus advogados a quantia de €2.000,00 acrescida de IVA (2.460,00) –doc. 1 – quantia a cujo ressarcimento têm direito, nos termos do disposto no art. 543º, nº 1, a) do Cód. Proc. Civil e que aqui peticionam.
C. ALEGAÇÕES DEVIDAS PELA INTERPOSIÇÃO DE RECURSO SUBORDINADO
Creem as Autoras que outra deve ser a decisão quanto ao pedido deduzido sob as alíneas b) e c) do petitório da petição inicial. Com efeito, peticionaram os Autores que a Ré fosse condenada a: b) “a pagar aos Autores a quantia de €1.160,00, bem como o valor correspondente a todas as rendas que vierem a ser pagas posteriormente à instauração da presente acção até ao dia do trânsito em julgado da decisão que declare a venda da fracção autónoma aos Autores, transmitindo-a àqueles”. c) “pagar os juros de mora à taxa legal, actualmente de 4%, sobre o valor que se mostrar devido aos Autores nos termos dos pedidos anteriores, até ao seu efectivo e integral pagamento.” Mostra-se provado pela douta sentença que: 14. Nos termos do contrato celebrado entre Autores e Ré junto como doc.1 da PI, os Autores acordaram em pagar à Ré uma renda mensal de €580.00,00 em contrapartida do gozo da fracção autónoma identificada nos autos; 15. Foi acordado entre as partes que as rendas devem ser liquidadas até ao primeiro dia útil do mês anterior àquele a que disser respeito; 31. A Ré, desde Agosto de 2017 recebe e faz suas todas as quantias previstas a título de rendas acordadas entre Autores e Ré no contrato junto aos autos; Sendo certo que a douta sentença recorrida considerou não provado que: “2. Os Autores pagaram à Ré as rendas relativas aos meses de Julho e Agosto de 2018, num total de €1.160,00.” Ora, quanto ao facto não provado – que até é desnecessário para a aplicação de direito que infra se sustentará – creem as Autoras que diferente deve ser o seu julgamento porquanto sobre tal matéria pronunciou-se o diretor comercial da Ré J…, aos 23 minutos do depoimento prestado no dia 15-01-2020 com início às 10:21:39 e termo às 10:46:49, no sentido de que os Autores pagaram sempre as rendas, sem que houvesse incumprimento até ao dia de hoje. Crendo, assim, que da conjugação desse depoimento, com a matéria de facto provada 14 a 16 da sentença, decorre, por mero raciocínio lógico, que as duas rendas vencidas relativamente aos meses de Julho e Agosto de 2018, já depois de Junho de 2018, importaram o cômputo total de €1.160,00. Ora, seja qual for a formulação jurídica erigida para qualificar os factos dados como provados na sentença (contrato de opção de venda, contrato promessa unilateral, ou contrato promessa bilateral constituído após o exercício da opção de venda), parece certo que, pelo menos após o mês de Junho de 2018, (ver factos provados sob os pontos 9 e 10 da sentença recorrida) a Ré colocou-se numa situação de mora, culposamente incumprindo a obrigação a que se havia comprometido: vender a fração aos Autores pelo preço de €170.000,00. Logo que se mostrasse celebrado o contrato de compra e venda a que os Autores tinham direito ter-se-ia extinguido, por confusão, o contrato de arrendamento identificado no ponto 1º da matéria de facto provada, pelo que deixariam os Autores de estar obrigados ao pagamento de qualquer valor a título de renda. Significando o exposto que o inadimplemento da Ré, que se mantém ainda agora e manter-se-á até decisão definitiva transitada em julgado que declare vendida a fração aos Autores, causa um dano àqueles correspondente ao pagamento mensal da renda acordada de €580,00. Nos termos do disposto no art. 804º do Cód. Civil: “A simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor.”. Nos termos do disposto no nº 2 do art. 566º do Cód. Civil: “Sem prejuízo do preceituado noutras disposições, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos.” Está-se, pois, perante pedido genérico nos termos do disposto nos art. 556º e 609º do Cód. Proc.Civil, que – salvo melhor opinião e com o respeito próprio da dialética da discussão forense – deveria ter sido julgado procedente, o que por esta via se requer.
CONCLUSÕES DO RECURSO SUBORDINADO
1. Deveria ter sido julgado provado o facto 2º dos factos considerados não provados pela douta decisão recorrida com a seguinte redação: “Os Autores pagaram à Ré as rendas relativas aos meses de Julho e Agosto de 2018, num total de €1.160,00.” – cfr. art. 34º da Petição Inicial. 2. Impõe-se diferente julgamento daquele facto por força do depoimento do diretor comercial da Ré, J…, prestado no dia 15-01-2020, com início às 10:21:39 e termo às 10:46:49, em especial aos 23 minutos da gravação, onde o mesmo confirmou que os Autores pagaram sempre as rendas devidas pelo contrato celebrado, sem que houvesse incumprimento até ao dia de hoje. 3. A prova do facto acima identificado impõe-se, assim, da conjugação desse depoimento da testemunha J… com a matéria de facto provada sob os pontos 14 a 16 da sentença recorrida de onde decorre, por mero raciocínio lógico, que as duas rendas vencidas relativamente aos meses de Julho e Agosto de 2018, já depois de Junho de 2018, importaram o cômputo total de €1.160,00. 4. A Ré encontra-se em mora na celebração do contrato de compra e venda devido por força do estipulado na cláusula 14ª do contrato celebrado, pelo menos, desde o mês de Junho de 2018 – cfr. factos 9 e 10 da sentença recorrida. 5. O contrato de arrendamento celebrado entre as partes, e identificado no ponto 1 da matéria de facto provada, extinguir-se-á automaticamente, por confusão, no momento em que se mostrar realizada a venda da fração autónoma que constitui seu objeto. 6. O incumprimento da Ré causa um dano aos Autores correspondente ao pagamento mensal da renda acordada no valor de €580,00. – cfr. factos provados sob os pontos 14º, 15º e 31º da sentença recorrida. 7. A sentença recorrida fez menos feliz interpretação do disposto nos arts. 804º e 566º do Cód. Civil e 556º e 609º do Cód. Proc. Civil. 8. Deve ser parcialmente revogada a douta sentença recorrida e julgados procedentes os pedidos efetuados sob as alíneas b) e c) da petição inicial destes autos. Como tal, deverá a douta sentença recorrida manter-se quanto ao decidido sob a alínea a) da sua decisão – reconhecimento à execução específica do contrato promessa de compra e venda – bem como quanto à condenação da Ré como litigante de má-fé e ser a mesma sentença parcialmente revogada quanto à alínea b) da sua decisão e, julgando procedente este recurso subordinado e o pedido de condenação da Ré ao pagamento de indemnização como litigante de má-fé, ser a Ré Condenada: A pagar às Autoras a quantia de €1.160,00, bem como o valor correspondente a todas as rendas que vierem a ser pagas posteriormente à instauração da presente ação até ao dia do trânsito em julgado da decisão que declarou a venda da fracção autónoma aos Autores, transmitindo-a àqueles. resposta alegações Ser a Ré condenada a pagar os juros de mora à taxa legal, atualmente de 4%, sobre o valor que se mostrar devido às Autoras nos termos dos pedidos anteriores, até ao seu efetivo e integral pagamento. Ser a Ré Condenada a pagar às Autoras a quantia de €2.460,00 a título de indemnização por litigância de má-fé. Valor do recurso subordinado: €17.582,00 (dezassete mil quinhentos e oitenta e dois euros)
Nos termos da lei processual civil são as conclusões do recurso que delimitam o objecto do mesmo e, consequentemente, os poderes de cognição deste tribunal.
Assim, as questões a resolver consistem em saber se:
Recurso da ré
- houve no erro de julgamento da matéria de facto;
- os autores não exerceram validamente o direito de opção de compra;
- ocorreu falta de poderes da ré para outorgar o contrato;
- a ré litigou de má-fé.
Recurso subordinado dos autores
- deve a ré pagar aos autores a quantia de €1.160,00, bem como o valor correspondente a todas as rendas que vierem a ser pagas posteriormente à instauração da presente acção até ao dia do trânsito em julgado da decisão que declare a venda da fracção autónoma aos autores, bem como os respectivos juros de mora à taxa legal
II - Fundamentação de facto
O tribunal recorrido considerou:
Factos provados
1. Por documento escrito datado de 07 de Agosto de 2017, foi celebrado pelos Autores, como segundos outorgantes e arrendatários, e pela Ré, como primeira outorgante e senhoria, um contrato denominado de “contrato de arrendamento habitacional com prazo certo”(doc nº 1 junto com a PI a fls. 9v a 12, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais); 2. No referido contrato tiveram ainda intervenção E… e marido, G…, como terceiros outorgantes e na qualidade de fiadores; 3. Nas negociações prévias à outorga do contrato, e para além das questões referentes ao arrendamento pretendido, Autores e Ré acordaram que a Ré se obrigaria a vender aos Autores a fracção autónoma abaixo identificada pelo preço de €170.000,00 caso os Autores manifestassem intenção de comprar a mesma até um prazo por ambas acordado; 4. Na cláusula primeira do contrato entre Autores e Rés celebrado foi estipulado que: “Entre os Outorgantes supra identificados é celebrado livremente o presente contrato de arrendamento habitacional relativo à fracção autónoma, tipo T2 , no 1° Drt, designada pela Letra “E”, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na Avenida…, nº …, ….-…, na união de freguesias de …, …, …, …, … e …, concelho do Porto, registado na 1ª Conservatória do Registo Predial do Porto sob o número 662 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo nº 7333, da competente Repartição de Finanças e com a licença de utilização nº 652/12, emitida pela Câmara Municipal do Porto”; 5. Na cláusula décima quarta do referido contrato foi estipulado que: “Pelo presente contrato a Primeira Outorgante concede aos Segundos o direito de optar, a partir do dia 01 de Outubro de 2017 e até ao dia 01 de Abril de 2018, pela compra da fracção, identificada na Cláusula Primeira supra, pelo preço de €170.000,00 (cento e setenta mil euros), devendo para o efeito comunicar essa intenção à Primeira Outorgante por carta registada com aviso de recepção, com a antecedência mínima de 15 dias antes daquele prazo”; 6. Por carta também subscrita pelos Autores e enviada sob registo com aviso recepção a 09 de Março de 2018 para a Rua…, Nº …, ….-… … – Braga e recebida pela Ré a 16 de Março de 2018, foi comunicado à Ré o seguinte: “De acordo com a cláusula décima-quarta do contrato de arrendamento habitacional celebrado com V. Exas. em 7 de agosto de 2017, referente ao arrendamento habitacional relativo à fracção autónoma, tipo T2, no 1° Drt., designada pela Letra “E”, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na Avenida… nº …., ….-…, na união de freguesias de …, …, …, …, …, concelho do Porto, registado na 1a Conservatória do Registo Predial do Porto sob o numero 662 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n° 7333, da competente Repartição de Finanças e com a licença de utilização n° 652/12, emitido pela Câmara Municipal do Porto, vimos desta forma exercer a opção de compra do referido imóvel pelo preço de €170.000,00. Por uma questão de organização familiar, a referida aquisição será realizada pela nossa filha E…, contribuinte n° ………., portadora do cartão de cidadão n° ………., emitido pela República Portuguesa, válido até 10/02/2020, residente na Travessa…, n° .., ….-…, freguesia de …, concelho de Vila do Conde e pelo seu marido, G…, contribuinte n° ………, portador do cartão de cidadão n° ……….., emitido pela República Portuguesa, válido até 17/07/2020, residente em …, …. - …, …… Madrid, os quais são os terceiros outorgantes no referido contrato de arrendamento habitacional, tendo intervindo no mesmo, como fiadores. O referido contrato de arrendamento habitacional manter-se-á em vigor, até à data da outorga da escritura de compra e venda, correspondente ao referido imóvel. A correspondente escritura de compra e venda, será realizada em data e local a combinar, até ao final do mês de Junho do corrente ano, sendo que até final do mês de maio do corrente ano, os terceiros outorgantes do contrato de arrendamento habitacional, enviarão uma proposta de data e local para a outorga da escritura de compra e venda.” (Docs. 2 e 3 juntos com a PI cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais); 7. No dia 29 de Maio de 2018 a filha dos Autores, E…, remeteu à Ré carta por si subscrita e enviada sob registo com aviso recepção, recebida pela Ré a 1 de Junho de 2018, pela qual comunicou data e local para a celebração da pretendida escritura(docs. 6 e 7 juntos com a PI cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais); 8. A 14 de Junho de 2018 os Autores remeteram à Ré carta por si subscrita, enviada sob registo com aviso recepção e recebida pela Ré a 20 de Junho de 2018, com o seguinte teor: “Tendo em conta a ausência de resposta à nossa carta de 09 de Março de 2018 e àquela que vos foi posteriormente dirigida pela nossa filha E…, bem como a recente indicação telefónica prestada pelo vosso funcionário F…, no sentido de não existir qualquer instrução da vossa administração para a prática dos actos necessários à celebração da compra e venda da fracção autónoma objecto do contrato de arrendamento com opção de compra entre nós celebrado, vimos por esta via repisar a nossa firme intenção de comprar a referida fracção autónoma, na decorrência do exercício do direito de opção de compra por nós efectuado através da carta que vos foi dirigida a 09 de Março de 2018. Tendo também em consideração a vossa ausência de resposta às nossas anteriores missivas, designadamente quanto à solicitação para que o contrato de compra e venda viesse a ser celebrado pela nossa filha E…, vimos esclarecer que nós próprios, signatários da presente e titulares do identificado direito, compraremos a fracção autónoma, interpelando também por esta via a vossa sociedade para comparecer no próximo dia 28 de Junho de 2018, pelas 11:30h, no 1º Cartório de Competência Especializada do Porto, sito na Rua …, …, …, ….-… Porto a fim de celebrar o referido contrato. Solicitamos a vossa total colaboração a fim de obstar a qualquer circunstância lesiva do nosso património, designadamente, fazendo chegar àquele Cartório todos os documentos legalmente necessários para a celebração daquele acto, sendo certo que o preço devido será pago com a outorga do contrato através de cheque bancário emitido à ordem da vossa sociedade. A delonga na celebração da compra e venda prometida será causa de prejuízos e danos que não abdicaremos de exigir.” (docs. 9 e 10 juntos com a PI cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais); 9. A Ré respondeu à referida carta, por carta enviada aos Autores datada de 26.06.2018 pela qual referiu que: “Exmos Senhores, Segue inclusa cópia da carta de resposta remetida à Senhora D. E… onde expusemos os motivos pelos quais considerámos a interpelação por ela remetida totalmente ineficaz para os efeitos pretendidos. No mais, informamos que, efetivamente, V. Exas., tinham direito de opção de compra, mas apenas o podiam exercer, de acordo com o postulado na cláusula décima-quarta do contrato de arrendamento entre nós celebrado, até 01 de Abril de 2018, o que não fizeram, já que o mesmo foi exercido por quem dele não beneficiava, in casu, pela D. E…. Assim, e pelo exposto consideramos sem qualquer efeito vinculativo para a nossa empresa a missiva por V. Exas. ora remetida. Com os nossos melhores cumprimentos,” (doc. 11 juntos com a PI cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais); 10. No dia 28 de Junho de 2018, pelas 11:30h, os Autores, através de procurador com poderes para a celebração daquele acto, compareceram no 1º Cartório de Competência Especializada do Porto visando celebrar o contrato/escritura de compra e venda da fracção autónoma acima identificada, não tendo, no entanto, comparecido qualquer representante da Ré a tal acto (doc. 13 junto com a PI cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais); 11. No registo predial a Ré é titular da inscrição de aquisição do direito de propriedade, da fracção autónoma supra mencionada e aludida no contrato acima junto como doc. 1, identificada pela letra “E”, correspondente a uma habitação no primeiro andar direito, tipo T- dois, com entrada pelo nº 364 de polícia, integrada no prédio em regime de propriedade horizontal sito na Avenida…, nºs …, …, …, na união de freguesias de …, …, …, …, …, concelho do Porto, descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o número 662 da freguesia da … e inscrito na matriz sob o artigo nº 7333 daquela união de freguesias. (doc. 13 juntos com a PI cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais); 12. I…, na qualidade de administradora da Ré, subscreveu o contrato em causa nestes autos, bem como as cartas juntas ao processo, em nome e em representação da sociedade Ré, vinculando-a; 13. Autores e Ré pretenderam, sabendo ser essa a sua vontade mútua, que a Ré se obrigasse a vender a fração autónoma identificada no contrato, pelo preço de €170.000,00 caso os Autores manifestassem essa opção de compra até determinado prazo; 14. Nos termos do contrato celebrado entre Autores e Ré junto como doc.1 da PI, os Autores acordaram em pagar à Ré uma renda mensal de € 580.00,00 em contrapartida do gozo da fracção autónoma identificada nos autos; 15. Foi acordado entre as partes que as rendas devem ser liquidadas até ao primeiro dia útil do mês anterior àquele a que disser respeito; 16. Previamente ao envio da carta datada de 9/3/2018, E… e G… haviam contactado F…, funcionário da Ré, que nessa qualidade manteve contactos com os Autores, antes e depois da assinatura do contrato, informando-o da intenção dos Autores exercerem o direito de opção de compra, bem como inquirindo-o quanto à possibilidade da escritura de compra e venda vir a ser celebrada pela filha E… e marido, possibilidade que o dito F… referiu que devia constar de forma expressa de comunicação a enviar à Ré; 17. Na sequência desses contactos, ainda no dia de 09 de Março de 2018 e antes do envio da carta junta como doc. 2 da PI, a filha dos Autores, E…, remeteu ao referido E… mensagem de correio electrónico para a caixa de correio com o endereço E…@D1….pt pela qual pôs à consideração daquele o teor da carta que os Autores pretendiam enviar à Ré para o exercício da opção de compra da fracção, nos termos que constam do doc. 4 junto com a PI; 18. Em anexo à referida mensagem de correio electrónico foi remetida cópia do contrato e da carta que os Autores pretendiam enviar à Ré; 19. O referido F… respondeu por mensagem de correio electrónico por si enviada no mesmo dia, nos seguintes termos: “Boa tarde D. E…, Após análise da carta a enviar, confirmo teor da mesma. Melhores Cumprimentos, F….”; 20. Porque a Ré, pela sua administração, não respondeu a nenhuma das missivas acima identificadas, a referida filha dos Autores, E…, remeteu no dia 06 de Junho de 2018 ao dito F… mensagem de correio electrónico para a caixa de correio daquele, nos seguintes termos: “Bom dia Sr. F…, Conforme falado telefonicamente com o meu marido, junto envio cópia da carta que remetemos ao cuidado da Administração da empresa D… – IMOBILIÁRIA, S.A.. Precisamos de falar com o Sr. F… pois precisamos de confirmar os detalhes e marcação da escritura. O meu marido tem ligado para o Sr. F…, mas sem sucesso. Ficamos aguardar o seu contacto urgente." Obrigada! Melhores cumprimentos, E… (… . …)”; 21. Porém, já depois do envio da mensagem de correio electrónio acima elencada de 06 de Junho de 2018, o referido F…, telefonicamente, transmitiu à filha dos Autores e seu marido, E… e G…, que não tinha qualquer instrução da administração da Ré para a prática dos actos necessários à celebração da escritura de compra e venda da fracção autónoma objecto do contrato acima identificado; 22. Em anexo à carta de 26/6/2018, foi junto outro documento, datado pela Ré de 08 de Junho de 2018, e dirigido à filha dos Autores, E…, mas que por ela não fora recebido, na qual a Ré referiu que: “Exma. Senhora, Acusamos a receção da sua carta em 04/Junho/2018 e em relação à qual cumpre informar o seguinte: - O direito de opção previsto no contrato de arrendamento por nós celebrado com B… e C… relativo à fração por V. Exa. Referida apenas podia exercido por aqueles, segundos outorgantes/arrendatários no aludido contrato, e não por V. Exa.; - Razão pela qual, inexistindo qualquer direito de opção por parte de V. Exa, a que estejamos vinculados, não se percebe o teor da interpelação a que ora se responde para a realização de escritura de compra e venda do imóvel em causa, a qual será por nós tida como totalmente ineficaz para os efeitos pretendidos. Com os nossos melhores cumprimentos,”; 23. Consta da Certidão Permanente da Ré com o Código de acesso ….-….-…., que o conselho de administração tem os seguintes membros: Nome: K… NIF/NIPC: ……… Cargo: Presidente Nome: I… NIF/NIPC: ……. Cargo: Administrador Nome: L… NIF/NIPC: ………. Cargo: Administrador Nome: L… NIF/NIPC: ……… 24. Mais se podendo ler no que à forma de obrigar concerne o seguinte: Forma de Obrigar: a) - com a intervenção única do Presidente do Conselho de Administração; b) - com a intervenção conjunta de dois administradores; c) - com a intervenção (CONT - insc 7) E ainda: Forma de obrigar: a) - com a intervenção única do presidente do Conselho de Administração; b) - com a intervenção conjunta de dois administradores; c) - com a intervenção de qualquer administrador nos contratos de empreitada, fornecimento, notas de encomenda de materiais e autos de consignação de trabalhos; 25. Nos termos da cláusula décima-quarta do contrato junto aos autos pode-se ler que [p]elo presente contrato a Primeira Outorgante concede aos Segundos o direito de optar, a partir do dia 01 de Outubro de 2017 a até ao dia 01 de Abril de 2018, pela compra da fração, identificada na Cláusula Primeira supra, pelo preço de €170.000,00 (cento e setenta mil euros), devendo para o efeito, comunicar essa intenção à primeira Outorgante por carta registada com aviso de receção, com antecedência de 15 dias antes daquele prazo; 26. O contrato identificado no art. 1º da petição inicial e junto como doc. 1 daquele articulado refere: “Primeira Outorgante: “D… – Imobiliária S.A”, pessoa colectiva nº ………, com sede na Rua…, nº …, ….-… … – Braga, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Braga sob o mesmo nº de pessoa colectiva, neste ato representada pela sua administradora I…, portadora do cartão de cidadão nº ……., emitido pela República Portuguesa, contribuinte nº …….., com poderes bastantes para tal, na qualidade de SENHORIA”; 27. A referida I… assinou todas as páginas desse contrato, designadamente, o último campo do mesmo por baixo da expressão “Primeira Outorgante”. 28. A referida I… ainda é administradora da Ré; 29. O contrato em questão foi elaborado e apresentado aos Autores pela Ré; 30. Por mensagem de correio electrónico de 28 de Julho de 2017 o funcionário da Ré, F…, que sempre se apresentou junto dos Autores e da sua filha e genro como funcionário da Ré, referiu à pergunta do genro dos Autores: “Pode pf enviar a minuta revista? Da nossa parte podemos assinar já este fim de semana” o seguinte: “Bom dia, Este fim de semana não vai ser possível, pois necessito que me envie a relação de documentação que solicitei de forma a efectuarem a analise do “perfil” do cliente. Depois processo transita para a minha Administração para ser validado. Mediante os timings depois “jogamos” com a data inicial do contrato de arrendamento, visto que 2ª feira é dia 31. (ex. podemos protelar o inicio para o dia 15/08, para não sair prejudicado)”; 31. A Ré, desde Agosto de 2017 recebe e faz suas todas as quantias previstas a título de rendas acordadas entre Autores e Ré no contrato junto aos autos; 32. Nos contactos realizados entre a filha e genro dos Autores e F…, foi aludida a necessidade de celebração de escritura de compra e venda.
Factos não provados 1. Durante os contactos ocorridos em Junho de 2018, o F… chegou a referir que a administração da Ré não teria naquela altura interesse em vender a fracção autónoma atendendo a que fracções autónomas similares à acima identificada estavam a ser vendidas, nesse momento temporal, por valores na ordem dos €220.000,00; 2. Os Autores pagaram à Ré as rendas relativas aos meses de Julho e Agosto de 2018, num total de €1.160,00.
III – Do mérito do recurso.
A. Recurso da ré D… - Imobiliária, SA
Sustenta a recorrente que o Tribunal a quo julgou, incorrectamente, a matéria de facto subjacente à decisão na parte da fundamentação que declarou como provados um conjunto de factos, os constantes dos n.ºs 13, 16, 17, 18 e 20 do segmento da decisão designado factualismo dado como assente. Que especificamente quanto ao facto provado em 13. formou a sua convicção pela confissão do legal representante da Ré e quanto aos restantes 16, 17, 18 e 20 teve em consideração o teor da prova documental junta a fls.14 a 20, fls. 40 a 48v, fls. 57a 60v e os depoimentos das testemunhas E…, F… e G…. Que toda a correspondência trocada entre as partes, mormente a carta datada de 08/março/2018 e a carta datada de 15/junho/2018, não pode corroborar que os recorridos exerceram de forma válida e eficaz o direito de opção de compra de que dispunham uma vez que, dentro do prazo que lhes havia sido concedido para o efeito, os recorridos não optaram pela compra da fracção, mas afirmaram que a compra/aquisição ia ser feita pela sua filha. Que ressalta dessa documentação que a recorrente respondeu à remetente das duas primeiras missivas que lhe foram enviadas, datadas, respectivamente, de 09/março/2018 e de 29/maio/2018, apesar de a sua carta lhe ter sido devolvida conforme consta da informação prestada pelos CTT.
Que também pelos depoimentos das testemunhas E…, F… e G… ficou claro que os recorridos nunca quiseram comprar o que quer que fosse e muito menos o imóvel em causa nestes autos.
Vejamos.
Factos impugnados.
13. Autores e ré pretenderam, sabendo ser essa a sua vontade mútua, que a ré se obrigasse a vender a fracção autónoma identificada no contrato, pelo preço de €170.000,00 caso os autores manifestassem essa opção de compra até determinado prazo;
16. Previamente ao envio da carta datada de 9/3/2018, E… e G… haviam contactado F…, funcionário da Ré, que nessa qualidade manteve contactos com os autores, antes e depois da assinatura do contrato, informando-o da intenção dos autores exercerem o direito de opção de compra, bem como inquirindo-o quanto à possibilidade da escritura de compra e venda vir a ser celebrada pela filha E… e marido, possibilidade que o dito F… referiu que devia constar de forma expressa de comunicação a enviar à ré;
17. Na sequência desses contactos, ainda no dia de 09 de Março de 2018 e antes do envio da carta junta como doc. 2 da PI, a filha dos autores, E…, remeteu ao referido F… mensagem de correio electrónico para a caixa de correio com o endereço F…@D1….pt pela qual pôs à consideração daquele o teor da carta que os autores pretendiam enviar à Ré para o exercício da opção de compra da fracção, nos termos que constam do doc. 4 junto com a PI;
18. Em anexo à referida mensagem de correio electrónico foi remetida cópia do contrato e da carta que os autores pretendiam enviar à ré;
20. Porque a ré, pela sua administração, não respondeu a nenhuma das missivas acima identificadas, a referida filha dos autores, E…, remeteu no dia 06 de Junho de 2018 ao dito F… mensagem de correio electrónico para a caixa de correio daquele, nos seguintes termos:
“Bom dia Sr. F…,
Conforme falado telefonicamente com o meu marido, junto envio cópia da carta que remetemos ao cuidado da Administração da empresa D… – IMOBILIÁRIA, S.A..
Precisamos de falar com o Sr. F… pois precisamos de confirmar os detalhes e marcação da escritura. O meu marido tem ligado para o Sr. F…, mas sem sucesso.
Ficamos aguardar o seu contacto urgente."
Obrigada!
Melhores cumprimentos,
E… (… . …)”;
Desde logo se impõe referir que o facto para o Direito é todo o acontecimento natural, embora juridicamente relevante. É a norma jurídica que, ao actuar sobre os factos, lhes atribui consequências específicas, chamadas de efeitos jurídicos.
A realidade fáctica é a essência do direito porque são os acontecimentos ou condutas que ocorrem no mundo que, no mínimo, pela operação subsuntiva da norma ao facto, serão qualificados de jurídicos. E o acto para ser jurídico tem de produzir efeitos. A incidência é o efeito da norma jurídica de transformar em facto jurídico a parte do suporte fáctico que o direito considerou relevante para ingressar no mundo jurídico. O facto é juridicamente relevante porque mais do que se repercutir na esfera jurídica das pessoas, constitui, modifica e extingue direitos.
Portanto é esta realidade fáctica juridicamente relevante que objectiva o julgamento a decisão de facto.
A prova é o meio essencial para o Tribunal chegar às suas conclusões ou convicções.
A convicção do Julgador forma-se na análise dos vários meios de prova com o auxílio de critérios da experiência comum e da lógica do homem médio, juntamente o auxílio das leis e do silogismo judiciário. Desta forma se vai reconstruindo racionalmente os acontecimentos históricos.
É nesta contextura que temos de entender a factualidade em questão.
Não há dúvida que os autores e a ré acordaram em que esta ficava obrigada a vender-lhes a fracção autónoma identificada no contrato, pelo preço de €170.000,00, caso os autores manifestassem essa opção de compra até determinado prazo. Isto está documentado no contrato escrito e foi unanimemente confirmado, em audiência, pelo legal representante da ré; pelas testemunhas E… e G…, filha e genro dos autores; pela testemunha F…, empregado da ré que trata da parte comercial e que foi quem teve contactos directos com a filha e o genro dos autores que, os quais, na prática, conduziram o negócio no interesse dos autores; e pelas testemunhas M… e J…, também empregados da ré.
Também foi confirmado, em audiência, pelos envolvidos, que antes do envio da carta de 9/3/2018 as testemunhas E… e G… contactaram a testemunha F…, dando-lhe conta que os autores pretendiam exercer o direito de opção de compra, e colocando a questão de saber se a escritura de compra e venda poderia vir a ser celebrada pela filha dos autores E… e marido, ao que aquele respondeu que deveriam colocar por escrito essa intenção, a enviar à ré.
Está provado, por documento confirmado pela testemunha F…, que no dia de 09 de Março de 2018 e antes do envio da carta junta como doc. 2 da PI, a filha dos autores, E…, remeteu ao referido F… mensagem de correio electrónico para o endereço F…@D1….pt pela qual pôs à consideração daquele o teor da carta que os autores pretendiam enviar à ré para o exercício da opção de compra da fracção, juntando em anexo a cópia do contrato.
Também está provado que, dado não ter recebido da ré qualquer resposta, a filha dos autores, E…, remeteu no dia 06 de Junho de 2018 ao dito F… mensagem de correio electrónico, para a caixa de correio deste, nos termos constantes do ponto 20 dos factos provados.
Quer dizer, esta factualidade foi a que resultou da actividade probatória, ou seja, de uma análise concertada das provas produzidas.
Não é possível não considerar demonstrados estes factos, estes acontecimentos reais.
O que nos parece é que, ao pretender uma solução jurídica diferente daquela que foi acolhida na sentença, a recorrente põe em causa, sem qualquer fundamento, realidade fáctica incontornável.
Mantém-se, pois, a solução fáctica decidida.
E, efectivamente, a recorrente vem debater todo o enquadramento jurídico considerado na sentença.
Assim, argumenta que, mesmo a permanecer inalterada a matéria de facto dada como provada, estamos perante um pacto de opção, ao qual se aplicará o regime do contrato de opção e o contrato em discussão sempre seria nulo. Que nenhuma das partes requereu a conversão do contrato de opção, nulo por vício de forma, num contrato de promessa de compra e venda, pelo que, mesmo que todos os requisitos para o efeito estivessem preenchidos, nunca poderia o Tribunal a quo tê-lo feito oficiosamente, de nada valendo a invocação de que resulta da matéria de facto dada como provada que a vontade hipotética das partes era a celebração de uma escritura de compra e venda. Que não é válido o argumento de que a invocação da nulidade formal do contrato de opção não é permitida porque houve actuação da ré em abuso de direito já que a paralisação da invocação da nulidade por vício de forma só ocorrerá quando tal vício é imputável à parte que se quer prevalecer da nulidade ou quando a conduta das partes se traduziu no cumprimento do contrato, criando na contraparte a confiança de que assim se manteria, situações que, in casu, não ocorreram. Que é impossível aceitar que a carta de 9/Março/2018 possa ser entendida como uma cessão de créditos desde logo porque os recorridos não detinham qualquer crédito sobre a recorrente, mas antes um direito de opção, e, ainda, porque a cessão de créditos só seria possível se o crédito não estivesse, pela própria natureza da prestação, ligado à pessoa do credor, o que, in casu, ocorria pois a possibilidade de compra da aludida fracção só havia sido concedida aos recorridos devido à sua qualidade de arrendatários.
Que de acordo com o pacto social, como vem vertido no ponto 24 dos factos dados como provados, a sociedade só se obriga perante a intervenção única do Presidente do Conselho de Administração (cujo cargo não é ocupado pela administradora em causa), com a intervenção de dois administradores (a administradora subscreveu o contrato sozinha) ou com a intervenção de qualquer administrador nos contratos de empreitada, fornecimento, notas de encomenda de materiais e autos de consignação de trabalhos (não incluindo, portanto, o contrato subscrito pela administradora). Que o negócio em causa apenas foi ratificado por outro gerente em audiência de julgamento, pelo que o mesmo, até essa data, não estava completo. Que é falso que a apelante tenha invocado falsamente tal ausência de poderes e, consequentemente, que tenha litigado com má-fé.
Ponderemos.
Temos no caso que foi celebrado pelos autores, como segundos outorgantes e arrendatários, e pela ré, como primeira outorgante e senhoria, um contrato escrito denominado de contrato de arrendamento habitacional com prazo certo, sendo que na cláusula décima quarta do referido contrato foi estipulado que:
“Pelo presente contrato a Primeira Outorgante concede aos Segundos o direito de optar, a partir do dia 01 de Outubro de 2017 e até ao dia 01 de Abril de 2018, pela compra da fracção, identificada na Cláusula Primeira supra, pelo preço de €170.000,00 (cento e setenta mil euros), devendo para o efeito comunicar essa intenção à Primeira Outorgante por carta registada com aviso de recepção, com a antecedência mínima de 15 dias antes daquele prazo.”
O princípio da autonomia ou da liberdade contratual, consagrado no artigo 405.º do Código Civil, é a matriz no domínio dos contratos, em que a vontade das partes é soberana para celebrar e modelar o conteúdo dos mesmos, havendo, no entanto, que respeitar as normas imperativas que acautelam a fraude à lei e o princípio da boa-fé em todas as fases contratuais. Nesta conformidade, as partes podem até reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei (nº 2 do artigo 405º).
Quando das cláusulas resultem dúvidas sobre o sentido da declaração, dúvidas que podem resultar da própria conjugação de cláusulas, vale, nos negócios onerosos, o sentido que corresponder ao maior equilíbrio das prestações, nos termos do disposto no artigo 237.º do Código Civil.
Como se viu, as partes celebraram um contrato de arrendamento, inserindo, numa cláusula deste, um pacto ou contrato de opção de compra.
O contrato de opção é considerado um instrumento, ou contrato instrumental, pelo qual uma pessoa, querendo, pode provocar o aparecimento de um contrato predeterminado (Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, vol. II, parte geral, pág. 299). Uma das partes emite logo a declaração correspondente ao contrato que pretende celebrar, enquanto a outra se reserva a faculdade de aceitar ou declinar o contrato, dentro de certo prazo: aceitando, o contrato aperfeiçoa-se sem necessidade de qualquer nova declaração da contraparte (Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 5ª edição, pág. 291).
Assim, o contrato de opção é uma convenção em que as partes acordam logo o conteúdo essencial de um outro contrato, a cuja celebração futura uma delas fica desde logo sujeita, permanecendo a contra-parte com o direito potestativo de desencadear a conclusão desse contrato mediante declaração de vontade unilateral. (Cfr. Tiago Soares da Fonseca, Do Contrato de Opção – Esboço de uma Teoria Geral, Lex, pág. 21 e Ana Prata, O Contrato-Promessa e o seu Regime Civil, 2ª reimpressão, pág. 395).
É consabido que a regra da consensualidade ou da imposição de formalismo, vigora, no geral, nos contratos típicos, ou seja, naqueles contratos expressamente previstos na lei. Quanto aos denominados contratos atípicos, como é o caso do pacto de opção, não se encontra na lei qualquer específica imposição sobre a forma a observar.
Impõe-se, deste modo, determinar se não obstante a sua atipicidade, ainda assim existem exigências de forma que deva observar.
Pedro Pais de Vasconcelos, Contratos Típicos, 2ª edição, 2009, pág. 463, afirma que: “Para além das exigências legais de forma estatuídas a propósito de tipos contratuais, existem também na lei exigências de forma estatuídas a propósito do conteúdo e efeitos dos contratos e que se aplicam para além dos tipos contratuais. É o caso, por exemplo, do nº 1 do artº 80º do Código do Notariado, que determina a obrigatoriedade de escritura pública para todos e quaisquer contratos que importem reconhecimento, constituição, aquisição, modificação, divisão ou extinção dos direitos de propriedade, usufruto, uso e habitação, superfície ou de servidão sobre coisas imóveis. … As exigências legais de forma, como estas, são aplicáveis a todos os contratos, sejam eles de que tipo forem e sejam eles típicos ou atípicos. Assim, devem ser celebrados por escritura pública todos os contratos atípicos com eficácia real que tenham por objecto imóveis.”
Logo, o contrato de opção relativo a compra de bem imóvel, como é o caso, deve revestir a forma exigida para o contrato cuja formação se trate. Melhor explicitando, o contrato de opção em apreço teria que ser celebrado por escritura pública ou por documento particular autenticado conforme decorre do disposto nos artigos 875º do CC e 80º do Código do Notariado.
Na sentença considerou-se que:” Tendo sido o pacto de opção celebrado por documento escrito, assumindo os requisitos bastantes para consubstanciar um negócio sucedâneo de contrato-promessa de compra e venda, sendo a vontade hipotética e conjectural das partes no sentido de pretenderem celebrar uma escritura de compra e venda, é de admitir que se tivessem previsto a nulidade por vício de forma teriam celebrado um contrato-promessa de compra e venda, pois que o resultado final económico-jurídico, embora mais precário, aproxima-se do tido em vista pelas partes com a celebração do contrato inválido, sendo essa vontade a de compra e venda do imóvel, deve-se concluir pela admissibilidade da conversão do contrato de opção, nulo por vício de forma, num contrato-promessa de compra e venda. … Ainda que se colocasse a hipótese de haver dúvidas quanto à vontade hipotética das partes, o que não acontece face às particularidades do caso em apreço e á matéria de facto provada a esse propósito, a conversão, ainda assim seria de admitir, conforme perfilha Prof. Mota Pinto, segundo o qual, “deve entender-se, também, com fundamento nos arts. 239º e 334º, que a conversão poderá ter lugar, independentemente da vontade hipotética das partes, se a boa fé assim o exigir.”( ob. cit, p. 642).”
A nosso ver é esta a construção jurídica que se impõe.
Dispõe o artigo 220º do Código Civil, “a declaração negocial que careça da forma legalmente prescrita é nula, quando outra não seja a sanção especialmente prevista na lei.”
Entrecruza-se aqui o artigo 293º do Código Civil que estabelece poder o negócio nulo converter-se num negócio de tipo ou conteúdo diferente, do qual contenha os requisitos essenciais de substância e de forma, quando o fim prosseguido pelas partes permita supor que elas o teriam querido se tivessem previsto a invalidade.
Como se consignou no acórdão do STJ de 22-11-2001, Proc. nº 04-06-2002, in www.dgsi.pt
“Na conversão estamos perante uma revaloração dada pela ordem jurídica a um comportamento negocial das partes que não tem efeitos jurídicos, mediante a atribuição de uma eficácia sucedânea realizadora do fim visado pelo tipo negocial em vista, respeitando-se os requisitos de validade e de eficácia do negócio que se procurou celebrar (14). O seu pressuposto assenta na constatação de negócio jurídico ferido de vícios, como é o caso da nulidade formal, que ponham em causa a sua eficácia. Os seus requisitos são objectivos e subjectivos. A causa jurídica do negócio sucedâneo vai mergulhar suas raízes nos elementos fácticos tradutores do comportamento negocial, assim se obtendo minimamente o fim prático que as partes procuravam realizar com o negócio nulo. O requisito subjectivo, por sua vez, repousa na vontade conjectural ou hipotética das partes. Esta vontade terá de ser o reflexo da ponderação dos interesses em presença, depois de passar pelo crivo da boa-fé: positiva ou negativamente, impondo ou impedindo a conversão.”
Neste posicionamento só podemos finalizar com o mesmo juízo formulado na da sentença:”…tendo-se convertido o pacto de opção nulo por vício de forma, num contrato-promessa de compra e venda, mantendo os AA (agora na qualidade de promitentes-compradores por força da conversão) interesse na aquisição do imóvel objecto do contrato e, recusando-se a Ré (agora na qualidade de promitente-vendedora) a outorgar escritura pública de compra e venda, deve-se admitir a execução específica, suprindo o tribunal a declaração de venda por parte da Ré, tendo esta direito, em contrapartida, a fazer sua a importância do preço acordado, entretanto já depositado nos autos.”
Quando a recorrente afirma que não é válido o argumento de que a invocação da nulidade formal do contrato de opção não é permitida porque houve actuação da ré em abuso de direito, cabe referir que esse foi um cenário colocado na sentença:- a paralisação da invocação dessa nulidade por actuação da ré em abuso de direito e que conduziria à validade do pacto de opção - mas cujo desenvolvimento foi postergado, tendo sido seguido outro campo de entendimento, ou seja, o da verificação da nulidade e conversão do negócio.
Argumenta a recorrente que é impossível aceitar que a carta de 9/Março/2018 possa ser entendida como uma cessão de créditos, desde logo, porque os recorridos não detinham qualquer crédito sobre a recorrente, mas antes um direito de opção, e, ainda, porque a cessão de créditos só seria possível se o crédito não estivesse, pela própria natureza da prestação, ligado à pessoa do credo.
Também esta alegação respeita a um posicionamento assumido na sentença, a título subsidiário, como ressalta do trecho:” Cumpre também salientar que, apesar de se considerar que foram efectivamente os AA quem exerceram o direito de opção, aquela carta também poderia ser apreciada como uma comunicação ao concedente de que o direito de opção havia sido cedido pelos optantes aos fiadores, por cessão de créditos, cessão essa admissível e a que não se podia opôr a Ré, nos termos dos arts. 577º e 583º do CCivil, afigurando-se, assim, irrelevante a questão suscitada pela Ré de que o direito de opção não havia sido exercido de forma eficaz porque o tinha sido por quem não beneficiava desse direito.” (sublinhado nosso).
Pois o que se entendeu, de todo o contexto fáctico, foi que os autores, por carta registada com A/R enviada à ré, datada de 9/3/2018, recebida por esta em 16 de Março de 2018, exerceram de forma válida e eficaz esse direito de opção de compra.
Convém atentar no teor da carta, designadamente no passo: “Por uma questão de organização familiar, a referida aquisição será realizada pela nossa filha E…, contribuinte n° ………, portadora do cartão de cidadão n° ……. . …, emitido pela República Portuguesa, válido até 10/02/2020, residente na Travessa…, n° .., ….-…, freguesia de …, concelho de Vila do Conde e pelo seu marido, G…, contribuinte n° ………, portador do cartão de cidadão n° …………., emitido pela República Portuguesa, válido até 17/07/2020, residente em …, … - …, …… Madrid, os quais são os terceiros outorgantes no referido contrato de arrendamento habitacional, tendo intervindo no mesmo, como fiadores.”
E interpretá-lo à luz de toda a circunstância negocial que ressaltou da análise da prova documental e testemunhal.
A casa destinava-se à habitação dos autores mas todos os termos do contrato foram decididos e tratados pela filha e genro deles no seu interesse e benefício.
O autor estava doente e a idade e fragilidade de ambos, notoriamente, conduz à compreensão de que a filha e o genro dos autores tenham assumido toda a condução do negócio para lhes assegurarem os seus interesses e bem-estar, numa fase delicada da vida que atravessavam.
É nesta ambiência que a carta tem de ser interpretada, sob pena de não se alcançar uma justiça que privilegie a verdade material.
Percebeu-se claramente que a ré, na altura da opção de compra, já não estava interessada no negócio acordado porque, entretanto, tinha ocorrido um grande incremento do preço do imobiliário. Por isso, a recorrente tudo fez para que o negócio se não concretizasse, designadamente não respondeu à referida carta, ainda no prazo para o exercício do direito de opção, a esclarecer que não considerava correctos os termos em foi formulada a pretensão do exercício do direito.
Por fim, vem a recorrente reiterar a falta de poderes da outorgante do contrato para, de acordo com o pacto social, obrigar a sociedade e que nesta sua posição não litigou com má-fé.
Ora sobre esta questão nada mais se pode acrescentar ao que se exarou na sentença.” Relativamente à questão da falta de vinculação da Ré naquele contrato, por a administradora que o subscreveu não ter poderes para tal desacompanhada de outro administrador, a mesma ficou definitivamente arredada com a confissão clara do legal representante da Ré em sede de julgamento, de que a Ré se vinculou de facto e de forma plenamente eficaz perante os AA, assumindo as obrigações nele acordadas, entre elas, a opção de compra, que só foi rejeitada porque entenderam (como vimos mal…) que quem exerceu o direito de opção foram os fiadores e não os arrendatários e, que aqueles não o podiam fazer. De todo o modo, sempre se dirá que, o negócio, apesar de apenas subscrito por um dos Administradores da Ré - I… - contrariamente ao que consta do registo comercial, vinculou de forma eficaz a Ré, conforme prescreve o art. 409º do CSC. Neste sentido, Ac RL de 7/10/2015: «O art. 409º do CSC estabelece um regime de vinculação da sociedade anónima pelos actos do seu órgão de administração cuja regra é a de que os actos praticados pelos administradores em nome da sociedade, e dentro dos poderes que a lei lhes confere, vinculam-na para com terceiros, não obstante as limitações constantes do contrato social ou resultantes de deliberações dos sócios.» (Proc. nº 550/14.1TTLSB.L1-4, www.dgsi.pt).”
Quanto à má-fé, denota-se no processo, como já se disse, que a recorrente tudo fez para obstar ao exercício do direito de opção contratado, e, no processo veio, com, pelo menos, negligência grave, deduzir pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar (artigo 542º, nº 2 do CPC), designadamente como se diz na sentença:” No caso dos autos é manifesto que a Ré alegou a ineficácia do contrato por si celebrado, por alegada representação sem poderes da administradora que subscreveu o contrato, quando sabia que era falsa tal invocação, tendo o legal representante da Ré, em depoimento de parte produzido em audiência de julgamento, confessado de forma clara e peremptória que a administradora que outorgou o contrato em nome da Ré tinha poderes para o efeito, vinculando-a, concluindo-se que, fez um uso manifestamente reprovável do processo, litigando de má-fé, com culpa grave.”
Soçobram, assim, todas as razões do recurso da ré.
B. Recurso subordinado dos autores
Previamente, cumpre referir que os autores requereram a ampliação do objecto do recurso, sendo que este mecanismo pretende acautelar que, se o Tribunal de recurso entender que uma específica fundamentação da sentença objecto de recurso não pode manter-se, ainda assim a decisão subsistirá favorável ao recorrido mas com outro fundamento. Ora, como se viu o recurso da ré improcedeu na totalidade pelo que perdeu utilidade a dita ampliação.
No recurso subordinado pretendem os autores a condenação da ré a: “b) a pagar aos Autores a quantia de €1.160,00, bem como o valor correspondente a todas as rendas que vierem a ser pagas posteriormente à instauração da presente acção até ao dia do trânsito em julgado da decisão que declare a venda da fracção autónoma aos Autores, transmitindo-a àqueles”. c) “pagar os juros de mora à taxa legal, actualmente de 4%, sobre o valor que se mostrar devido aos Autores nos termos dos pedidos anteriores, até ao seu efectivo e integral pagamento.”
Alegam que deveria ter sido julgado provado o facto 2º dos factos considerados não provados com a seguinte redacção: “Os Autores pagaram à Ré as rendas relativas aos meses de Julho e Agosto de 2018, num total de €1.160,00.” – cfr. art. 34º da Petição Inicial.
Atentemos
Neste particular consignou-se na sentença:” Sendo de proferir sentença de execução específica, assumindo natureza constitutiva do direito dos Autores, a propriedade do imóvel apenas se transferirá por força da sentença, pelo que, todas as eventuais rendas que os AA tenham pago até à data do trânsito da mesma, são devidas à Ré como contrapartida do gozo do imóvel na qualidade de arrendatários, sendo improcedente a pretensão de reembolso de qualquer importância a esse título.”
Efectivamente, tendo o pacto de opção de compra sido convertido em contrato de promessa de compra e venda, até à transferência do imóvel, que ocorrerá com o trânsito em julgado da sentença de execução específica, a qual assume natureza constitutiva do direito dos autores, estes estão a ocupar o imóvel a título de arrendatários pelo continuam obrigados à prestação da renda como contra-partida do gozo do imóvel. Tudo corolário lógico da orientação jurídica perfilhada na decisão: até a sentença produzir os efeitos translativos da propriedade do imóvel, os autores ocupam-no como arrendatários.
Não existe, pois, fundamento que sustente este pedido dos autores.
Mais referem os autores recorrentes que não deduziram pedido de indemnização civil por litigância de má-fé até à prolação da decisão de 1ª instância, mas que a conduta processual da Ré, mantida pela instauração do presente recurso, cujos efeitos suspensivos obstam à concretização do seu direito, leva a que façam agora tal pedido. Que já pagaram aos seus advogados a quantia de €2.000,00 acrescida de IVA (2.460,00) –doc. 1 – cujo ressarcimento têm direito, nos termos do disposto no artigo 543º, nº 1, a) do Cód. Proc. Civil e que aqui peticionam.
Consideremos.
Há unanimidade na doutrina e na jurisprudência em que a condenação em multa como litigante com má-fé não depende de pedido da parte, mas a indemnização, face do disposto no artigo 542º.nº1, do C.P.C., terá de ser pedida pela parte.
Também há consenso em que a indemnização não tem que ser formulada nos articulados, podendo, inclusive, ser pedida na pendência do recurso, isto porque a litigância de má-fé pode surgir em qualquer momento da marcha do processo.
Este crédito indemnizatório constitui-se na esfera jurídica do lesado mediante a verificação cumulativa de dois pressupostos:
- a demonstração de um ilícito perpetrado pelo lesante, traduzido na sua litigância censurável;
- que o lesado com essa conduta, formule o pedido indemnizatório.
O artigo 543º do CPC dispõe sobre o conteúdo da indemnização, a qual pode ser simples ou agravada.
A indemnização simples é a que está prevista na al. a) do nº 1 deste artigo 543º, englobando todas as despesas que a má-fé do litigante haja obrigado a parte contrária a suportar, incluindo os honorários ao seu mandatário ou aos técnicos.
A indemnização agravada encontra-se na al. b) do nº 1 do mesmo preceito, compreendendo todas aquelas despesas e ainda todos os demais prejuízos sofridos pela parte contrária como consequência directa ou indirecta da má-fé do litigante.
No caso, os recorrentes pedem uma indemnização simples correspondente à quantia despendida com os seus advogados no montante de €2.000,00, acrescida de IVA (2.460,00).
Não há dúvida que, com este recurso, a ré recorrente veio reiterar uma actuação já censurada, persistindo em negar um direito dos autores a que contratualmente se obrigou, causando-lhes, obviamente, mais despesas com o protelamento do desfecho do processo, designadamente uma acrescida actividade dos seus advogados que teve de suportar.
Deste modo, encontram-se reunidas as condições para atribuição aos autores da peticionada indemnização.
Pelo exposto, delibera-se julgar totalmente improcedente a apelação da ré assim como o recurso subordinado dos autores, condenando-se a ré no pagamento aos autores de uma indemnização, a título de litigância de má-fé, no montante de €2.460,00.
Custas pelos apelantes nos respectivos recursos.
Porto, 8 e Junho de 2021
Atesta-se que o presente acórdão tem voto de concordância do Exmº Desembargador Adjunto José Carvalho, nos termos do disposto no artigo 15º-A do DL 10-A/2020, de 13/3, na redacção introduzida pelo artigo 3º do DL 20/2020, de 1/5.
Ana Lucinda Cabral
Maria do Carmo Domingues
(A relatora escreve de acordo com a “antiga ortografia”, sendo que as partes em itálico são transcrições cuja opção pela “antiga ortografia” ou pelo “Acordo Ortográfico” depende da respectiva autoria.)