CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE CONTABILIDADE
CONTRATO CELEBRADO COM SOCIEDADE COMERCIAL
RESPONSABILIDADE INDIVIDUAL DO TOC
Sumário

Independentemente do contrato de prestação de serviços de contabilidade ter sido celebrado com uma sociedade comercial, o TOC, responsável técnico da sociedade e prestador efetivo dos serviços, é responsável, a título individual (e independentemente da sua qualidade de sócio-gerente), pessoal e diretamente, pela não execução ou pela execução defeituosa dos mesmos serviços.

Texto Integral

Processo nº1/19.5T8ESP.P2

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório
1.B… intentou a presente ação declarativa, que segue a forma de processo comum, contra C…, Lda, D… e Companhia de Seguro E…, SA pedindo a condenação das rés, pelos danos patrimoniais sofridos, no pagamento da quantia de € 18.431,80 Euros, acrescida dos juros de mora vincendos, à taxa legal, contados sobre o capital em dívida, desde a presente data e até integral e efetivo pagamento, bem como, nas custas e procuradoria condigna.
Alega, para tanto, em síntese, que é Médico-Especialista de Ortopedia e Traumatologia e Perito Médico-Legal, exercendo a sua atividade, quer como profissional liberal e/ou trabalhador independente, emitindo os denominados “recibos-verdes”, quer através da sociedade comercial por quotas “F…, LDA.”, matriculada na respetiva Conservatória do Registo Comercial sob o n.º ……… / NIPC., sociedade da qual é sócio e único gerente.
A 1.ª ré é uma sociedade por quotas que se dedica à prestação de serviços de contabilidade.
Por sua vez, a 2.ª ré é Contabilista Certificada, estando inscrita na Ordem dos Contabilistas Certificados com o número de membro ….., sendo ainda sócia, gerente e responsável técnica da 1.ª ré.
Em data reportada a Agosto de 1993, o autor contratou as 1.ª e 2.ª ré para a elaboração da contabilidade global inerente à sua atividade profissional, e que teria de abranger a sua actividade enquanto trabalhador liberal, quer enquanto sócio e gerente da identificada sociedade “F…, Lda.”.
As 1.ª e 2.ª rés obrigaram-se, pois, a executar a contabilidade global do autor de acordo com os princípios e normas contabilísticas e as exigências legais em vigor, assumindo a responsabilidade pela sua regularidade técnica, nas áreas contabilística e fiscal, nos termos definidos pelo artigo 10.º n.ºs 1 e 3 do Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados, aprovado pelo Decreto-lei 452/99, de 5 de novembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto Lei 310/09, de 26 de outubro, e pela Lei 139/2015, de 7 de setembro.
Os serviços que as 1.ª e 2.ª rés se obrigaram a prestar incluíam, entre outros, o lançamento e classificação contabilística de todos os documentos, o encerramento das contas do exercício, o preenchimento e envio das declarações fiscais e seus anexos e a organização do dossier fiscal, relativos à sociedade comercial por quotas “F…, Lda.”, bem como, ao preenchimento e envio anual das declarações Modelo 3 de IRS do autor em nome individual – dado que, por aconselhamento das Rés, o mesmo havia optado pelo regime simplificado de tributação dos seus rendimentos.
A 2.ª ré, na qualidade de sócia, gerente e responsável técnica, assumiu a responsabilidade pela regularidade técnica da contabilidade executada pela 1.ª ré.
Em contrapartida dos serviços prestados, o autor, através da sociedade “F…, Lda.”, pagava à 1.ª ré uma remuneração mensal de 220,00 Euros, em regime de avença.
Todos os serviços foram prestados de forma continuada e ininterrupta, desde agosto de 1993 até setembro de 2016.
Pelo que, neste contexto, foram as 1.ª e 2.ª rés que, no exercício das suas atividades profissionais e por incumbência do autor, cumpriram todas as obrigações deste em matéria de execução da contabilidade e nas suas relações com a Administração Fiscal.
Assim, as 1.ª e 2.ª rés procederam, nomeadamente, ao preenchimento e entrega à Autoridade Tributária e Aduaneira das declarações Modelo 3 de IRS do autor entre os anos de 2004 e 2015.
O autor divorciou-se de G… em 17/12/2004, tendo sido condenado por douta decisão, já transitada em julgado, proferida naquela data no âmbito do Processo de Divórcio por Mútuo Consentimento que sob o n.º .../2004 correu termos pela 2.ª Conservatória do Registo Civil de Vila Nova de Gaia, a cumprir um acordo relativo a alimentos, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 1419.º do Código de Processo Civil, que foi assim homologado, ficando deste modo obrigado no pagamento à sua ex-cônjuge, a título de alimentos, de uma pensão mensal no valor de 600,00 Euros, pensão que sempre pagou.
O pagamento desta pensão tem relevância para efeitos fiscais - pois consubstanciam valores dedutíveis ao rendimento coletável (até 31 de dezembro de 2008) e/ou diretamente à coleta (a partir de 01 de janeiro de 2009), consoante os períodos de tributação.
O autor solicitou à 1.ª e 2.ª rés que contemplassem o pagamento desta pensão nas suas declarações Modelo 3 de IRS a partir de 17/12/2004, tendo-lhes, inclusivamente, entregue os comprovativos das transferências bancárias que, em cumprimento do estipulado, fez mensalmente para a conta da ex-cônjuge, pagamentos que eram também evidenciados pelos extratos bancários que periodicamente enviava para a contabilidade.
No entanto, as 1.ª e 2.ª rés pura e simplesmente omitiram os pagamentos pelo autor das referidas pensões nas declarações que preencheram e entregaram à Autoridade Tributária e Aduaneira., facto que o autor só veio a descobrir em junho de 2016.
Se os montantes das pensões de alimentos tivessem (como deveriam ter) sido incluídos nas declarações Modelo 3 de IRS supra indicadas, com as correspondentes deduções ao rendimento coletável (até 31 de Dezembro de 2008) e/ou diretamente à coleta (a partir dessa data), os valores de imposto a liquidar seriam, na realidade, diferentes, sendo que em consequência da conduta das 1.ª e 2.ª rés, o autor sofreu prejuízos que, relativamente a cada uma das declarações erradamente preenchidas se calculam: ao ano de 2005, o montante de 2.448,01 Euros; ano de 2006, o montante de 2.448,01 Euros; ano de 2007, o montante de 2.448,00 Euros; ano de 2008, o montante de 2.448,01 Euros; ano de 2009, o montante de 1.440,00 Euros; ano de 2010, o montante de 1.440,00 Euros; ano de 2011, o montante de 1.439,77 Euros; ano de 2012, o montante de 1.440,00 Euros; ano de 2013, o montante de 1.440,00 Euros; ano de 2014, o montante de 1.440,00 Euros; cuja soma ascende a 18.431,80 Euros.
Constituíram-se, assim, as 1.ª e 2.ª rés na obrigação de indemnizar o autor pelos prejuízos sofridos em consequência da sua conduta omissiva.
É que, se a 1.ª ré cumpriu de forma defeituosa o contrato de prestação de serviços celebrado com o autor para os serviços de contabilidade supra discriminados, a 2.ª ré é também responsável a título individual, pessoal e diretamente, por todos os serviços prestados ao autor, enquanto prestadora efetiva dos mesmos e independentemente do contrato celebrado com a 1.ª Ré – da qual é também responsável técnica.
Por sua vez, a 3.ª ré assumiu a responsabilidade civil da atividade desenvolvida pelas rés através de apólice de seguro contratada com a Ordem dos Contabilistas Certificados.
2.Devidamente citada, a ré seguradora contestou, a fls. 74 e ss e que aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos, defendendo-se por exceção e impugnação.
3.As rés C…, Lda e D… igualmente contestaram, a fls. 131 e ss e que aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos, defendendo-se por exceção e impugnação.
Assim, além do mais, alegaram que o eventual direito à indemnização que o autor peticiona está já prescrito, na medida em que o prazo de prescrição do direito a indemnização por responsabilidade civil extracontratual é de 3 anos, sendo que, tendo-se divorciado em 2004, é forçoso concluirmos que desde essa data que tem conhecimento da possibilidade de apresentar essa despesa nas declarações de IRS.
Assim, tendo apresentado a presente ação apenas em 2019, já há muito prescreveu o seu direito a qualquer indemnização.
Por outro lado, impugnaram a factualidade constante da petição inicial, alegando, em síntese, que apesar de ser verdade a existência do contrato de prestação de serviços invocado, o certo é que o mesmo apenas abrangia a sociedade de que o autor era socio gerente, e não o autor enquanto pessoa singular, nem nunca foi paga qualquer remuneração às rés pelo autor.
Era o autor que recolhia, uma vez por ano, toda a documentação de despesas e rendimentos e foi sempre o próprio autor a conferir todos os dados e valores constantes da sua declaração e só após a sua confirmação é que a declaração de IRS era submetida no Portal das Finanças através da senha fiscal pessoal e intransmissível e numero de contribuinte.
As rés, por mera cortesia, ajudavam uma vez por ano o autor a preencher a sua declaração de IRS, mediante a documentação exibida ao tempo, pelo autor.
Mas nunca o autor lhe exibiu documentos respeitantes à aludida despesa de € 600,00, ou lhe exibiu/entregou o acordo homologado no divórcio.
As rés, não têm, assim, qualquer culpa ou responsabilidade no facto de o autor ter omitido como despesa na sua declaração a pensão de alimentos.
Mais, a obrigação de entrega da declaração de IRS não cabe a um contabilista certificado, mas sim ao contribuinte, no quadro das relações deste com o Estado.
No caso dos autos, não existe qualquer mandato, nem um contrato de prestação de serviços de contabilidade entre as rés e o autor, nem existe qualquer procuração outorgada entre autor e as rés, destinadas a estas procederem à recolha de documentos de despesas em nome do contribuinte, autor.
O autor age com manifesta má fé, devendo ser condenado como litigante em conformidade, no pagamento de multa e indemnização cuja quantificação não deve ser inferior a € 5000,00., devendo a indemnização ainda incluir as despesas com o processo, nomeadamente taxa de justiça e honorários à mandatária nomeada.
4.O autor respondeu à matéria de exceção invocada pelas duas rés nas suas respetivas contestações, pugnando pelo indeferimento das exceções, conforme resulta de fls. 138 e ss e que aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos. Mais acaba por igualmente peticionar a condenação das rés como litigantes de má fé.
5.A 11.04.2019, (cfr. fls. 144 e ss) foi proferido despacho saneador, que aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos, em que foi:
.dispensada a realização de audiência prévia;
. a ré seguradora absolvida do pedido, por ter sido julgada procedente a exceção perentória de facto impeditivo de quaisquer direitos sobre a mesma, decorrente do âmbito temporal de aplicação das apólices de seguro contratadas;
. relegada para afinal o conhecimento da eventual prescrição do direito do autor;
. fixado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova que não sofreram qualquer reclamação.
Após instrução procedeu-se a audiência final com observância do formalismo legal previsto no Código de Processo Civil na redação dada pela Lei n.º 41/2013, de 26.06, no âmbito do qual, o autor reduziu o pedido para a quantia de € 14.543,79, (cfr. fls. 184).

6.Foi proferida sentença, na qual, foram fixadas como questões a decidir as seguintes:
1. Se foi celebrado algum contrato, e, em caso afirmativo, qual a sua abrangência/características, período de vigência, e respetivos contraentes (se o autor a titulo pessoal e/ou a sua sociedade “F…, Lda de um lado; e as 1.ª e/ou 2.ª ré, do outro);
2. Se o autor solicitou às 1ª e 2.ª rés que contemplasse o pagamento da pensão de alimentos a que tinha ficado obrigado a pagar à sua ex-cônjuge, nas suas declarações modelo 3 de IRS a partir de 17.12.2004;
3. Se o autor forneceu às 1.ª e 2.ª rés toda a documentação necessária para que as rés dessem cumprimento ao referido em 2.;
4. Qual a data em que o autor tomou conhecimento de que as 1.ª e 2.ª rés omitiram tais pagamentos a título de pensão, nas referidas declarações de IRS;
5. Quais os prejuízos decorrentes de tal omissão na esfera jurídica do autor
6. Se o direito do autor está prescrito;
7. Se existe má fé do autor;
8. Se existe má fé das 1.ª e 2.ª rés.

7.Sendo que, no final o tribunal recorrido julgou a ação totalmente procedente por provada, e em consequência condenou as rés C…, Lda e D… a pagar ao autor B… a quantia de € 14.543,79 (catorze mil, quinhentos e quarenta e três euros e setenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento, mais declarando não se vislumbrar má fé das partes.
8.Inconformadas as Rés interpuseram recurso de apelação.
9.No dia 28.05.2020 foi proferido acórdão neste Tribunal da Relação do Porto no qual os juízes deste Tribunal acordaram em anular a sentença por ser indispensável a eliminação das deficiências verificadas na decisão da matéria de facto nos termos atrás referidos, - artigo 662º, nº2, al. c) e d) e nº2, alíneas b) e c) do CPC - sem prejuízo de uma eventual alteração da demais matéria factual, caso se revele necessário.
10.Remetidos os autos ao tribunal da comarca foi aí proferida nova sentença, a qual, foi antecedida dos seguintes dizeres:
«Vi o Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto.
Nos termos do mesmo, foi superiormente decidido “anular a decisão recorrida por forma a sanar tais deficiências, devendo o tribunal recorrido proceder à ampliação da decisão de facto por forma a ser discutida e ser proferida decisão de fato sobre a alegação de fatos vertida no artigo 41º da petição inicial e motivar com recurso a cálculos devidamente objetivados o facto julgado como provado no ponto 26º ou outro(s) que eventualmente venha(m) a ser julgado(s) provados em substituição desse item.”
Subsequentemente, tendo apenas sido determinado a anulação da sentença (e não do julgamento), com vista ao tribunal motivar o facto julgado como “provado no ponto 26º ou outros que eventualmente venham ser julgados provados em substituição desse item”, cumpre proferir a sentença, colmatando tal falha, ampliando a matéria de facto do facto dado como provado no ponto 26 e acrescentando a respetiva fundamentação, e que, de resto, estiveram já subjacentes à prolação da sentença, o que se fará de seguida.
(…)»
E foi proferida sentença cujo dispositivo se reproduz:
“Pelo exposto, julgo a ação totalmente procedente por provada, e em consequência condeno as rés C…, Lda e D… a pagar ao autor B… a quantia de € 14.543,79 (catorze mil, quinhentos e quarenta e três euros e setenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento.
Não se vislumbra má fé das partes. Custas a cargo das rés…..»

Inconformadas, de novo vieram as rés interpor recurso de apelação da sentença, com impugnação da decisão de facto formulando extensas Conclusões que aqui se reproduzem:
1)Entendem as Apelantes que a Douta Decisão de julgar a ação totalmente procedente, e em consequência condenar as rés a pagar ao autor, a quantia de € 14.543,79 (catorze mil, quinhentos e quarenta e três euros e setenta e nove cêntimos), acrescida de juros, não pode manter-se, pois não foi produzida prova alguma nesse sentido, enfermando a decisão de vícios de ordem fundamental e de mérito, pelo que a ação deveria ter sido totalmente improcedente por não provada, e, em consequência absolvidas as Rés.
2)Pois, da matéria de facto dada como provada na Douta Sentença, nos pontos 5 a 12 e 15 a 21 e 26, nada resulta provado, nem pelo depoimento gravado das testemunhas, nem pela diminuta prova documental existente nos autos, pelo que há insuficiência de provas para a fundamentação e sustentação de uma condenação das Rés, aqui recorrentes, e Erro de julgamento, verificando-se o vício constante da al. a) e b) e c) do nº 1 e nº 2, alínea a) do art. 640º do CPC.
3)Existe contradição insanável da fundamentação e entre a fundamentação e a decisão, Erro notório na apreciação da prova e violação expressa do princípio in dúbio pro reo.
4)Da prova produzida, nunca os factos dados como provados na fundamentação da Douta Sentença, resultariam provados, pelo que foram incorretamente julgados. Aliás, o facto de as Rés desconhecerem durante anos que o Autor pagava uma pensão de alimentos à sua ex-mulher, é um facto negativo, pelo que exige necessariamente a inversão do ónus da prova e a prova por parte do Autor do que alega, ou seja, que informou e entregou no Gabinete de Contabilidade das Rés os documentos comprovativos das despesas e relativos à Pensão de Alimentos.
5)Ora, essa prova não resulta minimamente dos autos, pelo que, ao longo do presente recurso se transcreveu parte dos depoimentos gravados das Declarações prestadas pelas partes e testemunhas ouvidas em Audiência de Julgamento, sendo certo que, nenhuma das testemunhas ouvidas em audiência presenciou os factos, pelo que não sabem como, em que circunstâncias de tempo e lugar, quando e para quê concretamente foram contratadas as Rés e nem sabem quem preencheu e entregou o IRS do Autor em 2005 e nos restantes anos, pois revelaram não ter conhecimento direto dos factos, apenas se tendo deslocado ao Gabinete de contabilidade das Rés, a testemunha G…, apenas 2 ou 3 vezes ao longo de vinte e tal anos e a testemunha H… uma única vez e em data anterior aos factos. Pelo que, que credibilidade pode ter o depoimento da ex-esposa e a filha do Autor que nada sabiam sobre os factos concretamente em causa??? Notoriamente NENHUMA!
6)Nunca as Rés, aqui recorrentes, contrataram com o Autor, aqui recorrido, qualquer contrato de prestação de serviços enquanto pessoa singular (facto negativo), nem o Autor por si pagou qualquer quantia remuneratória às Rés, nem tais factos resultam provados nos autos.
7)Mais, as Rés, aqui recorrentes, desconheciam completamente a existência de uma pensão de alimentos (facto negativo) e nunca, em tempo algum, o Autor exibiu ou entregou às Rés, aqui recorrentes, documentos respeitantes à aludida despesa de 600,00 €, referente à pensão de alimentos à sua ex-cônjuge, nem tão pouco exibiu ou entregou às Rés o Acordo homologado no âmbito do Divórcio por Mútuo Consentimento que sob o nº …/2004 correu termos pela 2ª Conservatória do Registo Civil de Vila Nova de Gaia.
8)E não foram as Rés, aqui Recorrentes, que preencheram e entregaram junto da Autoridade Tributária e Aduaneira todas as Declarações de IRS do Autor (pelo que não pode ser considerado um facto provado o Facto 11 da matéria de facto na Douta Sentença).
9)Ora, a verdade é que o não conhecimento da pensão de alimentos, a não entrega dos documentos às Rés, o não preenchimento e não entrega na Autoridade Tributária e Aduaneira das Declarações de IRS por parte das rés, constituem factos negativos.
10)Por isso, tem constituído entendimento corrente e pacifico da jurisprudência, que quando a prova não for possível ou se tornar muito difícil àquele que, segundo as regras do artigo 342º do Código Civil, teria de a fazer, o ónus da prova deixa de impender sobre ela, passando a recair sobre a outra parte.
11)Ora, é este, precisamente, o caso que ocorre, consideram as Rés, aqui recorrentes que, tratando-se de prova de factos negativos e sendo esta de realização impossível para as rés, o ónus probatório conhecerá uma inversão. Isto é, negando as Rés terem conhecimento ou terem praticado determinado acto ou omissão, inverter-se-á o ónus da prova, passando a caber ao Autor o dever de provar, sem margem para dúvidas, que as Rés tinham conhecimento que o Autor pagava uma Pensão de alimentos, que lhes exibiu e entregou todos os documentos (certidões, recibos, comprovativos de pagamento) e que no ano de 2005 e subsequentes anos até 2013 (anos em causa no caso sub judice), foram as Rés que preencheram e entregaram à Autoridade Tributária e Aduaneira todas as Declarações de IRS do Autor, prova esta que não foi feita, nem por documentos, nem pelos supra indicados depoimentos das testemunhas arroladas pelo Autor.
12)E essa prova teria de ser cabal e desprovida de incertezas, o que não aconteceu no caso sub judice, pois não foi feita prova alguma dos factos e em matéria tão delicada, não poderá bastar um mero juízo de probabilidade da verificação dos factos ou até uma presunção da ocorrência dos mesmos, como o faz a Juíza do Tribunal “a quo”.
13)Ora, dos depoimentos do Autor e das três únicas testemunhas arroladas pelo Autor, ou seja, a ex-cônjuge G…, a filha do Autor, H… e Dra. I… (atual Contabilista Certificada do Autor) resulta expresso que estas testemunhas nada sabiam relativamente aos factos concretos em causa, pois nenhuma presenciou os mesmos.
14)Mais disse a Testemunha ex-cônjuge G…, que nunca emitiu nenhum recibo de quitação de receber a quantia de 600 € a título de pensão de alimentos, sendo certo que nos próprios autos não consta nenhum documento, nomeadamente, nem recibos, nem extratos bancários que comprovem as alegadas transferências da quantia de 600,00 € alegadamente realizada pela conta pessoal do Autor para a conta pessoal da ex-cônjuge G….
15)E, não tendo sido junto aos presentes autos os documentos comprovativos do pagamento da pensão de alimentos, nomeadamente, recibos e extratos bancários, as recorrentes têm toda a legitimidade para questionar: Apesar de constar no Acordo de Divórcio uma pensão de alimentos no valor de 600,00 €, o Autor, aqui recorrido pagou todos os meses essa pensão à ex-cônjuge G…??? Essa despesa foi real ou foi virtual??!! E nem sequer foi feito esse pagamento mensal por parte do Autor??
16) Onde estão os documentos nos autos que comprovam esse pagamento da Pensão de Alimentos???!!!! É estranho o Autor ter acionado um seguro e as Rés, aqui recorrentes, e não faça prova desse pagamento mensal nos autos.
17)Ora, tal facto nunca poderia ter sido dado pela Juíz do Tribunal a quo como facto provado, pois não existe um único documento nos autos comprovativo do pagamento da referida pensão de alimentos. Não há recibos, nem qualquer outro documento de quitação, não há nenhum extrato bancário, enfim, porque o Autor não juntou aos autos todos os comprovativos do pagamento mensal da quantia de 600,00 €???
18)A resposta só pode ser uma, porque não pagou e não teve essa despesa. Ou seja, o Autor ao não demonstrar o pagamento mensal dos 600,00 € de pensão de alimentos, prova esta de fácil realização com documentos (Recibos e extratos bancários, declarações), é porque o autor “esconde a realidade dos factos” e esta ação é só uma via fácil de enriquecer à custa das Rés (enriquecimento sem causa), e à custa do seguro, pois a ex-cônjuge G… além de confessar que nunca emitiu nenhum documento comprovativo de que recebia tal quantia (Recibos de quitação), também não juntou aos autos a sua Declaração de IRS demonstrativa de que declarou tal rendimento aos Cofres do Estado.
19)Sendo certo que, se o contribuinte não demonstra através de documentos as despesas comprovadamente realizadas, a Autoridade Tributária e Aduaneira nunca aceitaria tais despesas no IRS, e por isso, nunca seria aceite pela Autoridade Tributária e Aduaneira o valor da Pensão de Alimentos, pois o Autor, aqui recorrido, não demonstra nestes autos que o valor foi comprovadamente pago.
20)O Autor terá pago alguma mensalidade da pensão??? Quantos meses pagou??? Não se sabe, porque não há nos autos um único documento comprovativo de tal pagamento. Ou seja, o Autor pede às Rés um valor monetário invocando um prejuízo, todavia não faz prova nos autos de que tenha efetivamente realizado essas despesas mensais com a dita Pensão de Alimentos.
21)Acresce que, pelo depoimento de parte, constituindo até confissão o que é dito pelo Autor é que antes quem lhe tratava do IRS era “Alguém em casa, com certeza, alguém…” e não concretiza absolutamente nada. E depois ainda diz “Eu enviava ou todos os meses ou de tempos a tempos, ou todos os anos, não tem grande relevo isto, eu enviava para os contabilistas a minha conta bancária pessoal, o extrato bancário. “
22)Ou seja, para o Autor, aqui recorrido, não tem grande relevo saber se enviava o extrato bancário, todos os meses, de tempos a tempos ou todos os anos para os contabilistas. Demonstrando, assim, neste seu depoimento gravado o seu desconhecimento total da periodicidade do envio aos contabilistas do seu extrato bancário pessoal, se é que alguma vez o enviou. Pois, os únicos extratos que o Autor enviava mensalmente às Rés, aqui recorrentes, eram da conta bancária da empresa F…, Lda. e nunca da sua conta pessoal.
23)Mais, nunca os Pontos 5 a 11 poderiam ser dados como provados, pois Autor, aqui recorrido, só enquanto gerente da Sociedade Comercial “F…, Lda.”, pessoa colectiva nº ………, e apenas nessa qualidade, contratou os serviços de contabilidade da Sociedade “C…, Lda.”. Até porque só a empresa “F…, Lda.”, é que pagava à Sociedade “C…, Lda.”, uma avença no valor de 180,00 euros mensais, acrescida de IVA à taxa legal (221,40 €) (Valor médio/padrão cobrado por um Gabinete de Contabilidade para a prestação de serviços de contabilidade a uma única empresa).
24)E, se o Autor, aqui recorrido, confessa que não sabe quem entregou nas Finanças a sua Declaração de IRS de 2005, como pode imputar esse facto às Rés na sua Petição Inicial e a Juíza do Tribunal a quo dar tal facto como facto provado??!!!
25)Aliás, as Rés, aqui recorrentes expressamente disseram que nunca celebraram nenhum contrato de prestação de serviços a título pessoal com o Autor, nem nunca foram mandatadas através de procuração outorgada pelo Autor para “tratarem de tudo do seu IRS”.
26)É matéria controvertida que foi expressamente impugnada pelas Rés, aqui recorrentes. E, dos depoimentos das partes e das testemunhas, os pontos 5 a 12 e 15 a 21 e 26 nunca podiam resultar provados.

27)Até porque, o Autor não sabe concretizar quem lhe fazia o IRS e até resulta do seu depoimento que nunca pediu às Rés que estas contemplassem, a partir de 17-12-2004, o pagamento da pensão de alimentos na sua Declaração de IRS. Nem tão pouco, o mesmo forneceu às Rés, aqui recorrentes, toda a documentação necessária para que assim procedessem. O Autor, aqui recorrido, limitou-se a responder em Tribunal sempre vagamente, sem nunca concretizar minimamente as circunstâncias de tempo e lugar em que teria ocorrido os factos que invoca no seu articulado da Petição Inicial, desculpando-se numa falta de memória dada a distância temporal dos factos.
28)E, quando questionado o Autor pelo seu Advogado no sentido de saber se as Rés, aqui recorrentes, lhe deram alguma explicação técnica para o facto de as pensões não constarem das Declarações de IRS, o mesmo respondeu que as Rés lhe responderam que desconheciam totalmente a existência da pensão de alimentos.
29)Ora, esta resposta é demonstrativa que as Rés desconheciam completamente a existência de uma Pensão de Alimentos. E, ainda demonstra que nunca, em tempo algum, o Autor exibiu ou entregou às Rés, aqui recorrentes documentos (recibos/ extractos bancários, declarações) respeitantes à aludida despesa de 600,00 €, referente à pensão de alimentos à sua ex-cônjuge, nem tão pouco exibiu ou entregou às Rés o alegado Acordo homologado no âmbito do Divórcio por Mútuo Consentimento que sob o nº …/2004 correu termos pela 2ª Conservatória do Registo Civil de Vila Nova de Gaia.
30)Aliás, as Rés aqui recorrentes até 2016, data em que o Autor pediu às Rés para estas enviarem uma declaração de substituição relativamente ao ano de 2015, não tinham conhecimento que o Autor era obrigado a pagar uma pensão de alimentos à sua ex-cônjuge.
31)E, nunca foram entregues documentos às Rés relativos à Pensão de Alimentos, pela simples razão de tais documentos nem existirem, pois nunca foram emitidos recibos ou entregues documentos comprovativos do pagamento da pensão de alimentos, e ainda emitida anualmente Certidão da Acta de Conferência de Divórcio, conforme se demonstrou na transcrição do depoimento do Autor nas Alegações deste recurso.
32)E, também o depoimento já transcrito supra da sua ex-cônjuge revela que nunca foram entregues documentos às Rés relativos à Pensão de Alimentos, pois esta nunca emitiu recibos ou entregou documentos comprovativos do pagamento da pensão de alimentos.
33)E, também pelo depoimento da ex-cônjuge, este é revelador que nunca foram entregues documentos às Rés relativos à Pensão de Alimentos, pois esta nunca emitiu recibos ou entregou documentos comprovativos do pagamento da pensão de alimentos. E, além de demonstrar o desconhecimento dos factos, a ex-cônjuge confessa que o Autor tinha uma prima que trabalhava nas Finanças com quem falavam quase diariamente. Ora, o Autor tem uma prima nas Finanças, com quem falava diariamente, e não sabe quem lhe entregou a Declaração de IRS de 2005 nas Finanças??!!! É muito pouco credível.
34)Pelo que, a Juíz do Tribunal “a quo” nunca poderia ter dado como factos provados os constantes dos pontos 5 a 12 e 15 a 21 e 26 da matéria dada como provada, pois tal não decorre dos depoimentos das testemunhas e transcritos em alegações, nem da prova documental inexistente nestes autos.
35)Em suma, é do conhecimento geral que se os contribuintes não entregam toda a documentação respeitante ao exercício económico ou não pagam ou não beneficiam dos impostos devidos por sua própria culpa ou negligência, não cabe a nenhum Contabilista certificado essa responsabilidade.
36)E não incumbe aos contabilistas, ainda, legalmente, praticar actos pelos seus clientes em sede, não do cumprimento de deveres e obrigações, mas do exercício de faculdades ou direitos dos contribuintes de optarem ou não por apresentar certa documentação de despesas perante a Autoridade Tributária e Aduaneira.
37)Os contribuintes são livres de optarem por carrear certas despesas ou não no seu IRS, se essa faculdade de opção lhes está legalmente concedida. E se os contribuintes são livres de optarem, em dado momento, por apresentar uma determinada despesa ou não (v.g. Despesa de saúde documentada por um recibo do Hospital, Despesa Escolar documentada com um recibo da Livraria, etc) em função, naturalmente, das suas vidas pessoais e profissionais concretas, das suas concretas perspectivas, pessoais e profissionais, dos seus projectos, de curto, médio e longo prazo, nenhuma anomalia ou incumprimento defeituoso pode constituir o exercício de uma faculdade do contribuinte optar ou não por apresentar perante a Autoridade Tributária e Aduaneira uma determinada despesa.
38)E se o contribuinte quiser até omitir determinada despesa? O contabilista é obrigado a declarar despesas contra a vontade do contribuinte, ou melhor, constitui uma obrigação do contabilista apresentar despesas em nome dos contribuintes?
39)É lógico que não. Por isso, não se trata de uma obrigação do contabilista certificado declarar a despesa x ou y, mas sim do contribuinte reunir toda a documentação de que dispõe e entregar o que entender por bem ao contabilista que mandatar para lhe fazer o IRS.
40)Os contabilistas certificados exercem a sua actividade para garantirem que os contribuintes cumprem as suas obrigações perante o Estado. Tão somente!
41)Claro que nada impede um contribuinte de mandatar alguém para exercer por ele as suas faculdades jurídico-fiscais, incumbindo o mandatário de escolher os documentos de despesas que quer incluir ou não na sua Declaração de IRS, mas esse mandato não está no âmbito das funções do contabilista certificado elencadas no Estatuto da Ordem dos contabilistas Certificados, nem no caso sub judice existiu.
42)Na verdade, insiste-se, aos contabilistas certificados não incumbe o exercício de direitos e faculdades dos contribuintes perante a Autoridade Tributária e Aduaneira, mas sim agirem de modo a que os contribuintes cumpram as suas obrigações perante o Estado.
43)Para que os Contabilistas Certificados pudessem substituir-se aos contribuintes e ter o dever de em nome e representação deles optar por determinados documentos em detrimento de outros - isto é, exercer as faculdades dos contribuintes -, seria necessário que os mesmos agissem como mandatários dos contribuintes, com poderes expressos para os substituírem na posição jurídico-pública de sujeitos passivos de imposto.
44)Mas, nesse caso, um tal mandato - carecendo, aliás, de instrumento público - sairia, manifestamente, fora do quadro funcional previsto no Estatuto dos Contabilistas Certificados, não seria sequer típico da actividade profissional de contabilista certificado.
45)Aliás, os contabilistas não podem ir aos Balcões das Conservatórias do Registo Civil requerer Certidões (Procuradoria Ilícita), nem peticionar documentos (recibos ou extratos bancários) em quaisquer Instituições Bancárias (Procuradoria Ilícita), porque todos os documentos necessariamente têm de ser entregues pelos contribuintes ao seu contabilista e se não são entregues documentos ao contabilista, este não tem de “adivinhar ” a sua existência.
46)Com efeito, toda a Douta Sentença de que se recorre é manifestamente infundada, não permitindo o preenchimento dos pressupostos da responsabilidade civil contra as Rés.
47)Assim, os factos, mormente 5. a 12, 15 a 21 e 26, que são, de resto, o cerne dos autos, o tribunal a quo nunca poderia ter dado como provado tais factos, pois das declarações de parte do autor, conjugada com a escassa ou nenhuma prova testemunhal, associada às regras da experiência comum e normalidade, nunca tais factos poderiam resultar provados.
48)Em completa oposição ao depoimento do autor, foram os depoimentos das Rés, aqui recorrentes, D… e J…, que em caso algum foram contraditórios, pois a ré D… nunca fez uma única Declaração de IRS do Autor, pois até referiu que nunca faz Declarações de IRS, e J… negou perentoriamente que alguma vez o tivessem feito.
49)Mais, a Juíza do Tribunal a quo não pode afirmar na Douta Sentença que: “já no tempo de casado, era sociedade ré que era a responsável, por força do contrato celebrado, pela elaboração da declaração de IRS do casal, tal como pelas testemunhas G… e H… foi referido. “ Pois, o próprio Autor no seu depoimento já transcrito supra revela não saber quem fez o seu IRS de 2005.
50)Por último, não pode a Juíza do Tribunal a quo presumir factos, ao referir o seguinte: “ não é crível que o autor não tivesse feito a comunicação (no sentido de que iria começar a pagar a pensão de alimentos à sua ex-esposa, e que, portanto, tal valor devia ser declarado em sede de IRS), ao gabinete de contabilidade, uma vez que um dos motivos que levou o autor a aceder a pagar tal pensão foi, precisamente, o de saber que iria ter benefícios fiscais com tal pagamento.”
51)E mais uma vez, não pode a Juíza do Tribunal a quo presumir factos, ao referir o seguinte: “Em oitavo lugar não é crível que não fosse a ré a fazer a declaração de IRS pois, se assim não fosse, então o autor não teria tido o cuidado de informar da interrupção de tal pensão em 2015. Dito de outra forma, se não fosse a ré a responsável pela elaboração da declaração de IRS do autor, mas sim outra pessoa, então o autor, quando se deparou com a interrupção de tal pagamento, teria de ir falar com tal pessoa que estava encarregue de fazer tal declaração, em relação ao ano de 2015. Se foi comunicar tal facto, precisamente, à ré, então é porque era esta a responsável por fazer tal declaração. “
52)E se o Autor fosse perguntar ao Contabilista K… ou L…? Também estes eram logo considerados responsáveis pelo IRS do Autor ao longo de 20 anos?!!
53) Tal raciocínio é errado e não tem lógica nenhuma, pois se foi pedir “ajuda” às Rés, é porque havia uma relação de amizade, nada mais.
54)E o comportamento posterior da ré D… evidencia que ela apenas na sua boa fé tentou ajudar o Autor porque este lhe pediu ajuda e não porque era a responsável por tal declaração. Agora, uma lição as Rés aprenderam com esta ação e todos os Contabilistas Certificados deste pais, que daqui para a frente, não ajudam ninguém! Porque se ajudarem num determinado ano fiscal, correm o risco de um Tribunal considerar e presumir que aquele contabilista é logo responsável por todas as declarações que o contribuinte apresentou ao longo dos anos perante a Autoridade Tributária e Aduaneira.
55)O documento de fls. 22, cuja autoria a ré D… admitiu, mas referiu que o seu conteúdo não corresponde à verdade, não pode o Tribunal a quo conjugar tal documento (impugnado pela própria) com o facto de no ano de 2005, ter sido contemplada na declaração de IRS do autor o valor da pensão de alimentos, (cfr. fls. 64), pois como já foi referido, as Rés não preencheram o IRS de 2005 do Autor e o próprio Autor confessou que não sabe quem entregou nas Finanças a sua Declaração de IRS de 2005.
56)E a Juíza do Tribunal a quo refere ainda na Douta Sentença o seguinte: “E nem se diga que nunca deram qualquer recibo/comprovativo de pagamento da pensão, nem mesmo cópia/certidão da decisão onde resultava o acordo de pensão de alimentos, pelo que a contabilista nada podia fazer. Ou que, não há prova de que o pagamento dos € 600,00 mensais foi efetivamente feito. Ou que era a tal prima Iracema que tratava de tal declaração de IRS do autor. Com efeito, assim não é. “
57)Mas é assim. Pois resulta da prática corrente que a Autoridade Tributária e Aduaneira exige os recibos/documentos comprovativos dos pagamentos feitos a título de pensão de alimentos para ser possível ao sujeito passivo proceder à apresentação dessas despesas perante a Autoridade Tributária e Aduaneira. E ainda, a própria Autoridade Tributária e Aduaneira exige a comprovação de que os mesmos foram efetivamente pagos. E disso, o autor não fez prova, uma vez que tais pagamentos se eram alegadamente feitos por transferência bancária, estranhamente nos autos nada consta.
58)Mais, é igualmente prática corrente da Autoridade Tributária e Aduaneira, exigir certidão, com periodicidade anual, comprovativa de que o acordo da pensão de alimentos se mantem em vigor em determinado ano. Pois, tal pensão manter-se-á em vigor até acordo ou decisão ou disposição legal em contrário e há que fazer prova todos os anos de que não houve alteração do valor da pensão de alimentos e essa prova só pode ser feita com a emissão de uma Certidão emitida anualmente. Pois, imagine-se que tinham Acordado baixar a prestação para 300 euros em 2010, mas o Autor continuava a declarar a pensão de 600 € para ter maior benefício fiscal utilizando a “Certidão velhinha” do ano de 2004 para o efeito. Como é evidente, não pode ser e assim não é perante a Autoridade Tributária e Aduaneira.
59)E, reitera a Juíza do Tribunal a quo em erro presumindo factos, a saber: “Se nada tinha sido comunicado à ré no sentido da cessação da pensão, então é porque a mesma estaria a ser paga nos moldes inicialmente comunicados.”
60)Por outro lado, não resulta de forma alguma da prova produzida (mormente declarações do próprio autor, conjugado com as declarações das testemunhas G… e H…, pessoas com interesse notório no desfecho da ação), que tal comunicação da existência da pensão de alimentos foi efetivamente feita (o Autor nem sabe com quem falou), e que a pensão foi efetivamente paga. Onde estão os recibos??? Onde estão os extratos bancários??? NADA. Nem um único documento comprovativo da despesa foi apresentado nestes autos.
61)E as rés não tinham que ter “dúvidas sobre se estava ou não a ser paga”, pois nem sabiam da existência de uma pensão de alimentos, ao tempo. Pois, na verdade, as Rés até 2016 nada sabiam. E o próprio autor admite esse desconhecimento das Rés no seu depoimento supra transcrito, a saber: “Dr. B…: Sr. Dr., recordo-me que o que me foi dito foi : “Nós pensávamos…”, agora não sei a base disto, não sei…: “nós pensávamos que não era pensão de alimentos”, foi o que me foi dito.
62)Assim, face à inexistência de prova produzida em audiência final, quer testemunhal, quer documental, de que o Autor tenha alguma vez comunicado às rés a existência de uma pensão de alimentos à sua ex-cônjuge, que por sinal até trabalhava num quadro superior e tinha um salário elevado, a ação devia ter sido julgada totalmente improcedente.
63)Por último, o Ponto 26 da matéria dada como provada pela Juíza do Tribunal a quo constitui uma autêntica “aberração jurídico-fiscal e contabilística”, pois nos termos da lei aplicável a cada ano, tais valores que constam da Douta Sentença recorrida não correspondem aos “prejuízos que, relativamente a cada uma das declarações erradamente preenchidas se calculam”. Contudo, o autor terá presumido esses valores e lançado um valor aleatório, sem qualquer fundamento, não demonstrando como procedeu ao cálculo dos valores que considera de prejuízos.
64)Assim, o alegado prejuízo no valor de 14.543,80 € (Catorze mil quinhentos e quarenta e três euros e oitenta cêntimos), além de não ter sido devidamente demonstrado, foi erradamente calculado (cálculos já realizados em Alegações supra), sendo certo que, o Autor, aqui recorrido, não fez prova do pagamento mensal de 600,00 €. Ora, numa declaração de rendimentos de pessoas singulares é obrigatório ter documentos fiscalmente aceites que comprovem as despesas declaradas, contudo, nestes autos tais documentos não existem.
65)Por último, é evidente que no caso sub judice não há qualquer ato ilícito a ser imputado às Rés. Pois, foi o próprio Autor que confessou que não pediu recibos à sua ex-conjuge, nem nenhuma certidão na Conservatória (Certidão da Conferência de Divórcio, Recibos e até extratos bancários) e, consequentemente, não estando na posse dos mesmos, nunca poderia ter exibido tais documentos às Rés, omitindo ele próprio por sua responsabilidade e negligência tais despesas das suas declarações de IRS pessoais, designadamente as despesas referentes ao alegado pagamento de uma pensão de alimentos à sua ex-cônjuge. Pelo que, não pode ser imputada às Rés de forma alguma, qualquer conduta ilícita ou culposa.
66)E o Ponto 26 da matéria dada como provada na Douta Sentença, nunca em tempo algum poderia ser considerada provada, pois como supra já se demonstrou, constitui uma autêntica “aberração jurídico-fiscal e contabilística”, o cálculo de tais prejuízos, pois nos termos da lei aplicável a cada ano, tais valores não correspondem aos “prejuízos que, relativamente a cada uma das declarações erradamente preenchidas se calculam”.
67)Pelo que, resulta dos autos que o alegado prejuízo no valor de 14.543,80 € (Catorze mil quinhentos e quarenta e três euros e oitenta cêntimos), além de não ter sido devidamente demonstrado pelo Autor, foi erradamente calculado conforme supra se demonstrou em alegações e para as quais se remete aqui na integra, sendo certo ainda que não resulta provado o nexo de causalidade entre o facto e o dano ou prejuízo.
68)Acresce que, a obrigação de indemnização é determinada nos termos do disposto no artº 562º C.C. Contudo, só serão indemnizáveis os danos adequadamente decorrentes da violação. Ora, é notório que as Rés não violaram rigorosamente nada.
69)Acresce que, no caso sub judice, apesar do Douto Acórdão da Relação do Porto proferido em 28 de Maio de 2020, anular a Sentença da primeira instância com vista à “indispensável eliminação das deficiências verificadas na decisão,” a verdade é que, a Juíza do Tribunal a quo não procedeu à devida “eliminação das deficiências verificadas na decisão” nem tão pouco alterou a “demais matéria factual.”
70)Pelo que, a Juíza do Tribunal a quo limitou-se nesta Sentença de que agora se recorre, a manter toda a matéria factual, não procedendo à eliminação das deficiências apontadas pela Relação do Porto, repetindo praticamente tudo o que já tinha dito na primeira Douta Sentença recorrida.
71)Foram violados os mais elementares princípios gerais de Direito, designadamente, o Princípio “In dúbio pro réu”, e os artigos 334º, 341º, 342º, 344º, 356º, 487º, 485º, nº 1, 562º, 563º, 564º, 566º, 570º, 572º, 787º, 798º, 799º do Código Civil.
72)Por último, reitera-se que todo o comportamento do Autor, aqui recorrido, corresponde a uma situação de má fé, pois bem sabe que as Rés nenhuma culpa têm, sendo a culpa e negligência exclusivamente do Autor, que apenas pretende, por esta via, enriquecer à custa do Seguro e à custa das Rés.
Termos em que, nos melhores de direito e com o sempre mui douto suprimento de Vossas Exas., deve a Decisão da 1ª Instância ser revogada, e em consequência, ser a acção julgada totalmente improcedente, e o Autor seja condenado como litigante de má fé, em multa e em indemnização não inferior a 5.000,00 €, nos termos referidos supra, com todas as consequências legais, com o que só assim se fará serena, sã e objectiva JUSTIÇA!
Foram apresentadas contra-alegações.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II-DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.
As questões do recurso estão expostas do seguinte modo:
.Alegam os recorrentes que a sentença recorrida enferma de insuficiência de provas para a fundamentação e sustentação de uma condenação das Rés, aqui recorrentes e Erro de julgamento, sustentando estar verificado” “vícios de ordem fundamental e de mérito”, convocando as alineas a), b) e c) do n.º 1 e n.º 2, alínea a) do art. 640º do CPC, e ainda alegam a verificação de contradição insanável entre a fundamentação e entre a fundamentação e a decisão, Erro notório na apreciação da prova e violação expressa do princípio in dúbio pro reo.
Assim, no essencial as questões colocadas podem reconduzir-se às seguintes:
1.Das nulidades da sentença.
2. Da impugnação da decisão de facto.
3. Do mérito da sentença.

III. FUNDAMENTAÇÃO.
3.1.Alegam os recorrentes que a sentença recorrida enferma de: “vícios de ordem fundamental e de mérito”, convocando as alíneas a), b) e c) do n.º 1 e n.º 2, alínea a) do art. 640º do CPC:
Todavia, nesta parte, porque este normativo versa sobre o ónus a cargo do recorrente que impugna a decisão relativa à matéria de facto, afigura-se-nos que tal alegação se refere à impugnação da decisão de fato e por isso adiante será analisada em sede de impugnação da decisão de facto.
Alegam ainda a verificação de “contradição insanável da fundamentação e entre a fundamentação e a decisão” , sem contudo concretizaram aquando dessa alegação genérica em que consiste essa alegada contradição, revelando o recurso que os recorrentes não alegam factualidade que revele a verificação na sentença recorrida de quaisquer das nulidades típicas a que alude o artigo 615º do CPC.
De resto, sempre se dirá, que da análise da sentença recorrida não resulta para nós a existência de qualquer contradição entre a fundamentação da sentença e a decisão, concretamente, não se verifica qualquer oposição entre os fundamentos e a decisão, para efeitos do disposto na al. c) do artigo 615º do CPC.
3.2 O tribunal recorrido julgou provados e não provados os seguintes fatos:
Matéria de facto provada
1. O autor é Médico-Especialista de Ortopedia e Traumatologia e Perito Médico-Legal, exercendo a sua atividade, quer como profissional liberal e/ou trabalhador independente, emitindo os denominados “recibos-verdes”, quer através da sociedade comercial por quotas “F…, LDA.”, matriculada na respetiva Conservatória do Registo Comercial sob o n.º ……… / NIPC., sociedade da qual é sócio e único a fls. 10 ver e ss e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos).
2. A ré C…, Lda é uma sociedade por quotas que se dedica à prestação de serviços de contabilidade.
3. A ré D… é Contabilista Certificada, estando inscrita na Ordem dos Contabilistas Certificados com o número de membro 45027, (cfr. doc. junto a fls. 13 e a que aqui se dá por reproduzido para todos os legais efetivo).
4. A ré D… é ainda sócia, gerente e responsável técnica da ré C… Lda, (cfr. doc. Junto a fls. 13 verso e que aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos).
5. Em Agosto de 1993, o autor contratou, verbalmente, a ré C…, Lda, da qual a ré D… é sócio-gerente e contabilista certificada, para a elaboração da contabilidade global inerente à sua atividade profissional, e que deveria abranger, a atividade do autor enquanto profissional liberal, e enquanto sócio e gerente da identificada sociedade “F…, Lda.”.
6. A ré sociedade C…, Lda, obrigou-se a executar a contabilidade global do autor de acordo com os princípios e normas contabilísticas e as exigências legais em vigor, assumindo a responsabilidade pela sua regularidade técnica, nas áreas contabilística e fiscal,
7. obrigando-se, além do mais, a fazer o lançamento e classificação contabilística de todos os documentos, o encerramento das contas do exercício, o preenchimento e envio das declarações fiscais e seus anexos e a organização do dossier fiscal, relativos à sociedade comercial por quotas “F…, Lda.”,
8. bem como, ao preenchimento e envio anual das declarações Modelo 3 de IRS do autor em nome individual.
9. Em contrapartida dos serviços prestados, o autor, através da sociedade “F…, Lda.”, pagava à ré C…, Lda uma remuneração mensal de 220,00 Euros, em regime de avença
10. Os serviços referidos em 6 a 8 foram prestados, de forma continuada e ininterrupta, desde Agosto de 1993 até Setembro de 2016.
11. No âmbito do contrato referido em 5. a ré C…, Lda, através da ré D… e/ou um funcionário/colaborador procedeu, ao preenchimento e entrega à Autoridade Tributária e Aduaneira das declarações Modelo 3 de IRS do autor respeitantes aos anos de 2005 a 2015.
12. Do preenchimento e entrega das referidas declarações Modelo 3 de IRS do autor, resultaram liquidados pela Autoridade Tributária e Aduaneira os seguintes tributos de IRS:
a) Relativamente ao ano de 2005, o montante a pagar de 71,40 Euros, (cfr. doc. De fls. 54, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos).
b) Relativamente ao ano de 2006, o montante a pagar de 919,13 Euros, (cfr. doc. De fls. 54 verso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos).
c) Relativamente ao ano de 2007, o montante a reembolsar de 1.360,36 Euros, (cfr. doc. de fls. 55, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos).
d) Relativamente ao ano de 2008, o montante a reembolsar de 1.485,45 Euros, (cfr. doc. de fls. 55 verso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos).
e) Relativamente ao ano de 2009, o montante a reembolsar de 1.560,17 Euros, (cfr. fls. 56, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos).
f) Relativamente ao ano de 2010, o montante a reembolsar de 287,51 Euros, (cfr. fls. 56 verso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos).
g) Relativamente ao ano de 2011, o montante a pagar 436,23 Euros, (cfr. fls. 57, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos).
h) Relativamente ao ano de 2012, o montante a reembolsar de 384,65 Euros, (cfr. doc. de fls. 57 verso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos).
i) Relativamente ao ano de 2013, o montante a reembolsar de 1.505,50 Euros, (cfr. doc. de fls. 58, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos).
j) Relativamente ao ano de 2014, o montante a reembolsar de 705,00 Euros, (cfr. doc. de fls. 58 verso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos).
13. O autor divorciou-se de G… em 17/12/2004,
14. tendo sido condenado por douta decisão, já transitada em julgado, proferida naquela data no âmbito do Processo de Divórcio por Mútuo Consentimento que sob o n.º .../2004 correu termos pela 2.ª Conservatória do Registo Civil de Vila Nova de Gaia, a cumprir um acordo relativo a alimentos relativo à sua ex-cônjuge, no montante de € 600,00, (cfr. doc. junto a fls. 174 e 175 e que aqui se sá por reproduzido para todos os legais efeitos).
15. O autor procedeu ao pagamento da pensão referida em 14., através de transferência bancária, desde a data do referido acordo e até julho de 2015, data em que suspendeu o pagamento de tal pensão, pois o valor da mesma seria canalizado para ajudar a filha do casal.
16. Sabendo que tal pensão de alimentos tinha relevância para efeitos fiscal, o autor solicitou à ré C…, Lda, na pessoa do seu representante à data, que contemplasse o pagamento desta pensão nas suas declarações Modelo 3 de IRS a partir de 17/12/2004.
17. Para tanto, o autor procedeu à entrega dos comprovativos das transferências bancárias que fez mensalmente para a conta da ex-cônjuge, à ré sociedade.
18. Os pagamentos da pensão eram também evidenciados pelos extratos bancários que periodicamente enviava para a contabilidade.
19. A C…, Lda, através do TOC e/ou qualquer um dos seus colaboradores/sócios, contemplou a referida pensão de alimentos na declaração de IRS do autor respeitante ao ano de 2005.
20. A C…, Lda, através do TOC e/ou qualquer um dos seus colaboradores/sócios, não comtemplou a referida pensão de alimentos na declaração de IRS do autor respeitante aos anos de 2006 a 2015.
21. O autor tomou conhecimento do referido em 20., em data não concretamente apurada do ano de 2016, tendo nessa data confrontado a ré C…, Lda, na pessoa da ré D…, que afirmou que iria analisar e averiguar a situação.
22. Na ausência de qualquer esclarecimento, em 17/06/2016 o autor remeteu ao Gabinete de contabilidade “M…”, cuidado da D. D…, uma missiva com o seguinte teor:
“Assuntos: 1 – não declaração para efeitos de IRS da pensão de alimentos que mensalmente paguei a D. G… desde divórcio em Dezembro de 2004 até julho de 2015, inclusive, valor de € 600,00/mês.
2- Declaração de substituição para IRS referente a 2015, introduzindo os 7 primeiros meses com a despesa/custos da pensão de € 600,00.
Cara amiga D…
Após diversos contatos por telefone com N…, e depois de ter enviado cópia da 1.º folha do Acordo/partilha de divórcio onde se menciona a pensão de alimentos a D. G… (pois que havia duvidas sobre o tipo de pensão, e se estaria condizente com o Código Civil, àquela data, porventura alterado mais tarde), aguardei resposta que não tive até ao momento, tenho tentado o contacto por telefone durante o dia e hoje e nada consegui.
Assim, apresento este problema desta forma:
1- Era obrigatória a declaração às Finanças daquela pensão e eu sempre estive convencido (até porque alguma vezes falamos nisto) de que tal era feito ou estava a ser feito. A mãe dos meus filhos sempre declarou e sempre pagou IRS sobre tal importância de recebia; pelos vistos eu nada recebi de IRS em retorno pelo que sempre paguei por transferência bancária; portanto houve falha e será preciso apurar responsabilidades. Não foi por certo por eu não ter falado, mas provavelmente porque alguém achou que não deveria ou poderia fazê-lo (desconhecendo a lei de então, apesar de ter sido posteriormente alterada).
2- D…, espero que pensem sobre isto, pois não posso arcar com todo o prejuízo, uma vez que o vosso gabinete “assumindo a falha ou o erro” poderão acionar o seguro de responsabilidade civil que creio, terão, e que é para resolver questões como esta e similares.
3- Poderá haver, porventura, outra solução da Vossa parte, e que aguardarei saber.
4- Entretanto, já me aconselhei com dois Advogados que ficaram incrédulos face ao sucedido.
5- Espero que a declaração de substituição em relação a 2015 tenha já sido entregue nas Finanças, ficando assim resolvida a questão do ano de 2015.
6- No que concerne ao primeiro assunto, em ultima instância é de reclamar os anos de 2011, 2012, 2013 e 2014, com a entrega de declaração de IRS pagando multa obviamente.
Por favor, após dia 26.06.2016 (regresso de férias), maque uma reunião pata diálogo e se procurar encontrar uma solução para o assunto 1, antes de eu avançar de outra forma.
Com amizade, F…”, (cfr. doc. junto a fls. 17 e que aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos).
23. Nesse seguimento, a ré C…, Lda., através da ré D…, apresentou, a 20.06.2016, em nome do autor, uma declaração de substituição relativamente ao ano de 2015, (cfr. doc. junto a fls. 17 verso e ss, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos), onde contemplava a pensão de alimentos paga desse ano (sete meses: € 600,00 x 70= € 4.200,00, cfr. fls. 20 verso).
24. A 18/06/2016, a ré D… remeteu ao departamento Jurídico / Deontológico da Ordem dos Contabilistas Certificados uma comunicação nos seguintes termos:
“Boa tarde, venho solicitar ajuda na seguinte situação:
- tenho um cliente que há mais de 20 anos preencho e entrego a declaração de IRS e que se divorciou há cerca de 10 anos.
Decorrente desse divórcio, passou a pagar uma pensão de alimentos à ex-mulher, da qual nunca me entregou documento, embora me tenha falado de tal mas sempre referindo que a pagava por se sentir moralmente na obrigação de o fazer, depreendendo eu que não se tratava de pensão de alimentos e não seria declarável em sede de IRS.
- após todos estes anos o cliente apercebeu-se que não estaria a ser declarada tal pensão e exige que eu o reembolse de pelo menos uma parte do prejuízo que teve uma vez que a A.T, não vai reembolsar tal beneficio.
Posto isto, agradecia que me informassem se posso participar ao seguro a ocorrência e se haverá possibilidade de o cliente ser reembolsado.”, (cfr. doc. junto a fls. 22 e que aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos).
25. A 29.08.2016, a ré D… obtém a seguinte resposta à sua exposição referida em 24.,
“Cara Colega (…)
Atendendo ao teor da sua comunicação, cumpre-me informá-la que a situação em concreto apenas está coberta pelo Seguro de Responsabilidade Civil se o contribuinte possuir contabilidade organizada.
(…)
Caso o contribuinte não esteja na contabilidade organizada e consequentemente não estará coberto pelo seguro de responsabilidade civil profissional, a colega poderá apresentar junto da AT, pedido de revisão de ato tributário mediante o consagrado no artigo 78.º da LGT.
(…)”, (cfr. doc. junto a fls. 22 verso, e que aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos).
26. Caso as declarações contributivas tivessem sido corretamente preenchidas pelas rés, o autor:
a.Relativamente ao ano de 2006, teria de receber de reembolso a quantia de € 1.528,88, tendo por isso sofrido um prejuízo no montante de 2.448,01 Euros;
b.Relativamente ao ano de 2007, teria de receber de reembolso a quantia de € 3.808,36, tendo por isso sofrido um prejuízo no montante de 2.448,00 Euros;
c. Relativamente ao ano de 2008, teria de receber de reembolso a quantia de € 3.933,46, tendo por isso sofrido um prejuízo no montante de 2.448,01 Euros;
d.Relativamente ao ano de 2009, teria de receber de reembolso a quantia de € 3.000,17, tendo por isso sofrido um prejuízo no montante de 1.440,00 Euros;
e.Relativamente ao ano de 2010, teria de receber de reembolso a quantia de € 1.727,51, tendo por isso sofrido um prejuízo no montante de 1.440,00 Euros;
f. Relativamente ao ano de 2011, teria de receber de reembolso a quantia de € 1.003,27, tendo por isso sofrido um prejuízo no montante de 1.439,77 Euros;
g.Relativamente ao ano de 2012, teria de receber de reembolso a quantia de € 1.824,65, tendo por isso sofrido um prejuízo no montante de 1.440,00 Euros;
h.Relativamente ao ano de 2013, teria de receber de reembolso a quantia de € 2.945,50, tendo por isso sofrido um prejuízo no montante de 1.440,00 Euros;
o que perfaz um total de € 14.543,80, (catorze mil, quinhentos e quarenta e três euros e oitenta cêntimos).
Matéria de facto não provada
Inexiste.
3.3 Da Impugnação da decisão de facto.
No que concerne ao segmento recursório que impugna a decisão de facto resulta da peça recursória que os recorrentes impugnam os Pontos 5 a 12, 15 a 21 e 26 dos factos dados como provados, com convocação da reapreciação dos depoimentos do autor e das três testemunhas, a ex-cônjuge G…, a filha do Autor, H… e Dra. I… (atual Contabilista Certificada do Autor), e ainda, depoimentos das rés, D… e J… (alegações) alegando as apelantes que da matéria de facto dada como provada na Douta Sentença, nos pontos 5 a 12 e 15 a 21 e 26, nada resulta provado, nem pelo depoimento gravado das testemunhas, nem pela diminuta prova documental existente nos autos, pelo que há insuficiência de provas para a fundamentação e sustentação de uma condenação das Rés, aqui recorrentes, e Erro de julgamento, verificando-se o vício constante da al. a) e b) e c) do nº 1 e nº 2, alínea a) do art. 640º do CPC.
A significar que se impunha que as recorrentes relativamente a estes meios de prova teriam de cumprir os requisitos legais previstos no citado artigo 640º do CPC.
Avançando.
Percorrendo as alegações e as conclusões, verificamos que no concerne aos depoimentos de parte dos réus, os recorrentes limitaram-se a alegar o seguinte:
«92- Em segundo lugar, é normal e usual a sociedade C…, Lda fazer a declaração de rendimentos de IRS dos sócios gerentes das sociedades suas clientes, mas só quando estes solicitam os seus serviços. E aqui as Rés foram explicitas no sentido de dizer que tal não foi solicitado pelo Autor, pelo que o contrato de prestação de serviços apenas abrangeu a Sociedade do Autor “F…, Lda.”. Sendo certo também, que o Autor não concretizou a quem pediu os serviços, quando, como e porquê. Não descreveu minimamente a ocorrência dos factos, ao tempo, desculpando-se com falta de memória, conforme depoimento já supra descrito neste Recurso.
93- Em completa oposição ao depoimento do autor, foram os depoimentos das Rés, aqui recorrentes, de D… e J…, que em caso algum foram contraditórios, pois a ré D… não admitiu que tivesse feito uma única Declaração de IRS do Autor, pois até referiu que nunca faz Declarações de IRS, e J… negou perentoriamente que alguma vez o tivessem feito.
94- Por outro lado, J…, admitiu que é normal e usual a sociedade C…, Lda fazer a Declaração de rendimentos dos sócios gerentes das sociedades suas clientes, mas acrescentou que no caso dos autos, nunca fez a do autor, uma vez que este nunca lhe pediu.
95- Mais, a Juíza do Tribunal a quo não pode afirmar na Douta Sentença que: “já no tempo de casado, era a sociedade ré que era a responsável, por força do contrato celebrado, pela elaboração da declaração de IRS do casal, tal como pelas testemunhas G… e H… foi referido. “Pois, o próprio Autor no seu depoimento já transcrito supra revela não saber quem fez o seu IRS de 2005 e as testemunhas G… e H… também não sabem quem era a pessoa que fazia o IRS. Não revelando conhecimento concreto relativamente aos factos, conforme depoimentos de ambas já transcritos supra neste Recurso.
96 – É verdade que o gabinete de contabilidade tinha as passwords pessoais do autor, pois o mesmo as transmitiu às Rés aquando da Declaração de Substituição do ano 2015, tal como admitido pela ré D… e referido pela testemunha I… (que confirmou que recebeu tais passwords da ré sociedade quando houve a transição de pastas). E também referiu esta testemunha I… que não recebeu nenhuma pasta referente ao IRS, só pastas referentes à contabilidade da empresa “F…, Lda.”.»
Assim, relativamente aos depoimentos dos réus resulta manifesto que os recorrentes não cumprem os requisitos legais atrás referidos, não delimitando os concretos segmentos desses depoimentos que este tribunal deve reapreciar, a implicar, nesta parte, que estes meios de prova não devem ser considerados.
E da análise das alegações resulta que relativamente ao autor os recorrentes limitaram-se a transcrever partes do depoimento respectivo, seguidas de comentários dos recorrentes, sem contudo delimitar o princípio e o fim de cada passagem, indicando todavia o início e o fim da totalidade do depoimento.
Da análise das alegações resulta também que relativamente à ex-cônjuge do autor, G…, as recorrentes transcreveram partes do depoimento respectivo, seguidas de comentários dos recorrentes, sem contudo delimitar o princípio e o fim de cada passagem, indicando todavia o início e o fim da totalidade do depoimento.
Da análise das alegações resulta também que as recorrentes transcrevem pequenas passagens do depoimento da filha do autor, H…, sem contudo delimitar o princípio e o fim de cada passagem, indicando todavia o início e o fim da totalidade do depoimento.
E relativamente à testemunha I…, que, de acordo com a motivação da sentença é a actual contabilista do autor, as recorrentes nem sequer fazem qualquer transcrição e/ou indicação de passagem(ns) do depoimento desta testemunha, limitando-se a reproduzir nas alegações um segmento da motivação da decisão de fato na parte em que aí se resume o conteúdo deste depoimento.
Pelo que, relativamente aos depoimentos de parte dos réus e ao depoimento da testemunha I…, é manifesto que as recorrentes não cumprem as exigências legais atras referidas cujo cumprimento é necessário para ser admitido a reapreciação desta parte do recurso da decisão de facto.
Em face do exposto, é nosso entendimento que no recurso interposto os concretos meios de prova gravados indicados nas conclusões relativamente aos quais os recorrentes cumprem minimamente os requisitos previstos no citado artigo 640º do CPC são os depoimentos do autor e das duas testemunhas: a ex-cônjuge G… e a filha do Autor, H…, impondo-se a sua reapreciação, sem prejuízo de serem reapreciados os documentos dos autos indicados no recurso interposto.
Em consequência do exposto, admitimos com as restrições atrás referidas a impugnação da decisão de fato relativamente aos pontos 5 a 12, 15 a 21 e 26 dos fatos provados.
Vejamos.
Conforme já assinalado, tanto nas conclusões do recurso como ainda da sua motivação, resulta que o ataque que as Recorrentes desferem à forma como o Tribunal recorrido decidiu a matéria de facto não assenta na existência de provas que impusessem decisão diversa da que foi proferida; ao invés, a discordância da recorrente centra-se na forma como foram valoradas as provas produzidas e fazendo uma superficial análise de passagens desgarradas e de pretensas incongruências que entendem conterem, acabam por defender que outra deveria ter sido a convicção formada.
Vejamos se assiste razão às recorrentes.
Por razões de rigor e isenção procedemos à reapreciação integral dos depoimentos do autor e das duas testemunhas: a ex-cônjuge G… e a filha do Autor, H…, bem como de todos os documentos dos autos indicados no recurso interposto, bem como aqueles que são referidos na sentença recorrida, na parte da motivação de fato, a saber, documentos de fls 22, 65 a 64-verso, 25 a 53-verso, (declarações contributivas relativas aos anos de 2006 a 2013), fls 54 a 58 (demonstrações de liquidação de IRS), fls 17 verso e ss (declaração de IRS de substituição relativamente ao ano de 2015).
E porque a motivação da sentença recorrida revela que foi afastada a tese das rés, por razões de rigor na reapreciação da matéria de facto impugnada, reapreciamos também os depoimentos de parte das rés e da testemunha I… (atual Contabilista Certificada do Autor).
E ouvido na integra o depoimento de parte do autor, resulta que na motivação da sentença recorrida a Mma Juiza resumiu no essencial aquilo releva deste depoimento.
Assim: O autor, em sede de declarações de parte, referiu que é médico ortopedista e que tinha, desde há longos anos, uma relação de amizade com a ré D… e o seu pai. Que em 1993 constituiu a sua empresa, pelo que nessa altura igualmente contratou, verbalmente, com a sociedade ré, na pessoa que agora não se recorda, mas que ou foi a ré D… ou o seu pai, Sr. J…, igualmente sócio-gerente da sociedade ré, os seus serviços para tratarem de toda a contabilidade e demais serviço inerente não só da sua atividade enquanto gerente da sociedade, mas também da sua atividade a titulo pessoal. Que o relacionamento era cordial e de confiança mútua, nunca tendo sido posto em causa. Que por força desse acordo pagava, através da sua sociedade, a avença mensal acordada. Que nunca tratou do seu próprio IRS até porque não tinha tempo nem apetência para tanto, confiando no seu contabilista.
Sucede, porém, que, por força do divórcio, ficou obrigado a pagar uma pensão de alimentos à sua ex-esposa, pensão essa no valor de € 600,00 que sempre pagou através de transferência bancária, o que transmitiu à ré, solicitando que fizesse a respetiva contemplação em sede de declaração de IRS. Que tal foi feito no ano de 2005, mas, por motivo que desconhece, não foi feito nos restantes anos, o que, só descobriu em 2016, quando, em virtude de deixar de pagar tal pensão, para canalizar tal quantia à sua filha que estava a passar por dificuldades, comunica tal facto ao contabilista, com intuito de o mesmo deixar de proceder a tal contemplação nas respetivas declarações de IRS, quando é informado pela ré que tal pensão não estava a ser declarada em sede de IRS. Que na sequência dessa comunicação ainda conseguiram retificar a declaração de IRS respeitante a 2015.
Mais afirmou que sempre enviou para o gabinete de contabilidade todos os extratos da conta bancária e de onde decorria o pagamento da pensão de alimentos, sendo que desconhece o motivo de tal omissão, mormente se por incompetência/desconhecimento de se seria declarável, se por esquecimento. Não tem dúvidas de que comunicou tal facto ao gabinete de contabilidade até porque tinha sido aconselhado pelo seu advogado, à data do divórcio, para o fazer uma vez que iria ter benefícios fiscais. Que nunca se preocupou com o seu IRS, tendo plena confiança na ré, sendo que apenas cuidava de saber se iria ter de pagar ou receber afinal. Confirma que nunca pediu recibos comprovativos do pagamento da pensão à sua ex- esposa, nem sabia que tinha de o fazer até porque a mesma era facilmente comprovada pelas transferências bancárias.

Quanto ao depoimento da ex-cônjuge do autor G…, ex-esposa do autor, no essencial, revelando conhecimento direto, relatou que no período em que esteve casada com o autor este delegou no gabinete de contabilidade o tratamento dos assuntos fiscais, descrevendo o modo como eram separadas as despesas que seriam relevantes, para depois serem entregues à contabilidade (C…, Lda). Mais relatou que após o divórcio passou a receber do autor uma pensão mensal de alimentos no valor de € 600,00, a qual, cessou em Julho de 2015 para ser canalizada para ajudar a filha do casal.
De relevante ainda referiu e convenceu que o autor aceitou pagar a pensão mensal de 600,00 à testemunha porque poderia ter benefícios fiscais, sendo que, na perspectiva desta testemunha, conhecendo o autor, sabe que este nunca deixaria de comunicar ao gabinete.
Afirmou e convenceu que nem a prima Iracema, que trabalha nas Finanças, nem a secretária pessoal do autor, O…, preenchiam as declarações de IRS do autor, convencendo também que nos 33 anos de casados, não fizeram a declaração de IRS em casa, tendo o autor sempre pedido ao gabinete de contabilidade para o fazer, assinalando que desde sempre foi esta sociedade quem fez a declaração de IRS do autor e do casal, convencendo também, que, pelo menos por uma vez, levou a respetiva documentação, respeitante a um ano em concreto que já não se recorda, ao gabinete de contabilidade.
Relativamente à testemunha H…, filha do autor e da anterior testemunha, após a audição integral deste depoimento, convencemo-nos que nunca fizeram a declaração para efeitos de IRS em casa, que tinham que guardar a documentação relevante para efeitos da elaboração da declaração de IRS, concretamente, propinas da universidade, material escolar, despesas pessoais, etc) numa caixa que seria levada para a contabilidade. Confirmou que após o divórcio o pai ficou obrigado a pagar à mãe uma pensão mensal de alimentos no valor de € 600,00, relatando que aquando do divórcio, apesar de ter sido discutido o valor a pagar, o pai acordou em pagar esse valor por saber que poderia ter benefícios fiscais, (nesta parte referiu que não faz parte da personalidade do autor deixar escapar,…, a possibilidade de obter benefício fiscal, resultando para a testemunha seguro que o pai comunicou essa obrigação ao gabinete de contabilidade) referindo que o pagamento da pensão de alimentos era feito por transferências bancárias até que no ano de 2015 o pai cessou essas transferências com vista a canalizar esse montante da pensão para a própria testemunha que necessitou de ajuda. Nesta parte relatou que os extratos das contas bancárias do autor, nas quais, estavam registadas as transferências bancárias para pagar a pensão de alimentos que o pai estava a pagar à mãe iam para o gabinete de contabilidade. Mais referiu recordar-se que o pai num telefonema lhe relatou que tomou conhecimento que afinal a pensão não estava a ser declarada no IRS do Autor e que a testemunha ficou surpreendida. Relatou que a prima Iracema e marido, cortaram relações com o pai após o divórcio, tal como muitos familiares, uma vez que imputavam ao seu pai a causa no divórcio, tomando o partido da sua mãe.
Isto posto, no que concerne a estes três depoimentos por nós reapreciados, resulta que os mesmos revelaram conhecerem o autor, revelaram fatos concretos e depuseram de forma credível, a permitir que estes meios de prova sejam considerados em conjunto com os demais meios de prova que a seguir iremos reapreciar.

Quanto aos depoimentos de parte das Rés diremos o seguinte:
A ré D…, contabilista certificada, no essencial, relatou ser contabilista há mais de 27 anos, que a ré sociedade e o autor acordaram verbalmente que aquela sociedade, da qual a ré D… é sócio-gerente, ficava incumbida de elaborar a contabilidade da sociedade de que o autor era sócio-gerente e já não a sua própria contabilidade pessoal a nível de IRS. Declarou nunca ter preenchido qualquer declaração de IRS do autor, sendo que a única coisa que fez, foi dar apoio, por mera cortesia, mas sem nunca cobrar nada.
Todavia, admitiu que fez a retificação de declaração de IRS do autor respeitante ao ano de 2015, de forma a contemplar a referida pensão de alimentos, uma vez que ainda era tempestiva, admitiu ainda, como possível, que o seu gabinete de contabilidade, (que tem três funcionárias: N…, P… e Q…), pudesse ter elaborado algumas declarações de IRS do autor, mas sempre por mera cortesia, e não recebia nada por isso, nem sabe quantas ao certo.
Mais referiu que o contrato de prestação de serviços entre as partes findou em setembro de 2016, tendo entregue toda a documentação que possuía.
E a propósito, cumpre referir que admitiu a autoria do documento de fls. 22, cujo conteúdo está descrito no item 24 dos factos provados [1].
Deste depoimento resulta que no essencial esta ré apresenta uma versão dos factos oposta à do autor sustentando que desconhecia que o autor estava obrigado a pagar à ex-mulher uma pensão de alimentos e que nunca as rés ficaram obrigadas perante o autor a tratar da contabilidade pessoal deste, elaborando as respectivas declarações de rendimentos para efeitos de IRS.

J…, reformado, pai da ré D…, gerente da ré-sociedade, a qual, se vincula mediante a assinatura de dois gerentes, relatou que foi ele, na qualidade de legal representante da sociedade ré, quem celebrou verbalmente com o autor, este enquanto representante da sociedade de que é sócio-gerente, acordo verbal, pelo qual, a sociedade –ré vinculou-se a elaborar a contabilidade da sociedade do autor “F…, Lda”, referindo também que não estava mais ninguém presente quando esse acordo foi celebrado. Referiu que tinha uma relação próxima com o autor, frequentando, até, por vezes, a casa do autor.
Neste depoimento de parte, no essencial, foi veiculada a tese de que nunca a ré-sociedade foi incumbida de tratar da contabilidade pessoal do autor.
Referiu que desconhecia que tivesse sido elaborado o doc. de fls. 22 e no entanto, também referiu que o seu teor não corresponde à verdade! Mais acrescentou que o fizeram, precisamente, dado o estatuto que o autor tinha, e ainda porque queriam ver a questão resolvida, sendo que foi a primeira e única vez que accionaram o seguro. E também admitiu que é normal e usual a sociedade C…, Lda fazer a contabilidade pessoal dos sócios gerentes das sociedades suas clientes, mas que no caso dos autos, nunca fez a do autor, uma vez que este nunca lhe pediu.
Ainda foram por nós reapreciados os seguintes documentos que pelo respectivo conteúdo assumem significado elevado.
Assim, reapreciamos o documento de fls 61 a 64, o qual consubstancia modelo 3 -declaração de rendimentos do Autor para efeitos de IRS respeitante ao ano de 2005, cujo Anexo H –fls 64- contempla nos abatimentos (rubrica 6) o valor de € 7 200,00 (que corresponde ao valor mensal da pensão de alimentos multiplicado por 12) de pensões e onde está identificado o nº de beneficiário
Reapreciamos o documento de fls 182, o qual, traduz simulação de IRS do autor enviada pelo gabinete de contabilidade da sociedade ré àquele em 2011 e relativa ao IRS de 2010;
Reapreciamos os documentos de fls 186 a 190, que consubstanciam vários outros emails trocados entre o gabinete de contabilidade da sociedade ré e o autor em que se evidencia o IRS do mesmo, a revelar, sem qualquer margem para duvidas, que era a sociedade que fazia tal declaração de IRS.
E, sobretudo, reapreciamos e damos especial relevo ao documento de fls. 22 cuja autoria a ré D… admitiu. Este documento consubstancia uma carta enviada a 18-06-2016 pela ré D… ao departamento Jurídico / Deontológico da Ordem dos Contabilistas Certificados, cujo conteúdo se reproduz:
“Boa tarde, venho solicitar ajuda na seguinte situação:
-tenho um cliente que há mais de 20 anos preencho e entrego a declaração de IRS e que se divorciou há cerca de 10 anos.
Decorrente desse divórcio, passou a pagar uma pensão de alimentos à ex-mulher, da qual nunca me entregou documento, embora me tenha falado de tal mas sempre referindo que a pagava por se sentir moralmente na obrigação de o fazer, depreendendo eu que não se tratava de pensão de alimentos e não seria declarável em sede de IRS.
-após todos estes anos o cliente apercebeu-se que não estaria a ser declarada tal pensão e exige que eu o reembolse de pelo menos uma parte do prejuízo que teve uma vez que a A.T, não vai reembolsar tal beneficio.
Posto isto, agradecia que me informassem se posso participar ao seguro a ocorrência e se haverá possibilidade de o cliente ser reembolsado”
E reapreciamos o documento junto a fls 22-verso, do qual resulta que em 29.08.2016, a ré D… obtém a seguinte resposta, cuja cópia consta de fls 22-verso, à exposição atrás referida:
“Cara Colega (…)
Atendendo ao teor da sua comunicação, cumpre-me informá-la que a situação em concreto apenas está coberta pelo Seguro de Responsabilidade Civil se o contribuinte possuir contabilidade organizada.
(…)
Caso o contribuinte não esteja na contabilidade organizada e consequentemente não estará coberto pelo seguro de responsabilidade civil profissional, a colega poderá apresentar junto da AT, pedido de revisão de ato tributário mediante o consagrado no artigo 78.º da LGT.”
Ora, o documento de fls 22 evidencia que o contrato de prestação de serviço em causa abrangia o autor a titulo pessoal (“tenho um cliente que há mais de 20 anos preencho e entrego a declaração de IRS”), e que este lhe deu conhecimento da pensão de alimentos que estava obrigado a pagar (“(…) e que se divorciou há cerca de 10 anos. Decorrente desse divórcio passou a pagar uma pensão de alimentos à ex-mulher da qual nunca me entregou nenhum documento embora me tenha falado de tal (…)”) .
Como também assinala o tribunal recorrido, nesse documento a ré refere-se ao autor como “cliente” e não como amigo, pessoa conhecida, etc, assim evidenciando que tinham uma relação contratual, relação essa que passa pelo preenchimento e entrega da declaração de IRS. Mas admite que o autor lhe comunicou tal pensão de alimentos.
Assim, conjugando tal documento com o facto de no ano de 2005, ter sido contemplada na declaração de IRS do autor o valor da pensão de alimentos, (cfr. fls. 64), (repare-se que é no ano logo subsequente ao inicio de tal obrigação que foi criada em dezembro de 2014, sendo que apenas nos anos seguinte é que tal pensão foi omitida, assim parecendo crer que se tratou de um mero esquecimento), também este colectivo de juízes não tem duvidas que sobre a sociedade ré impendia a obrigação, por força do contrato celebrado com o autor, de preencher e entregar as declarações de IRS do autor.
A circunstância de no ano de 2005, ter sido contemplada na declaração de IRS do autor o valor da pensão de alimentos, (cfr. fls. 64), aliada à omissão desse fato nos anos seguintes e ainda aliada ao teor da comunicação escrita feita pela Ré D… ao departamento Jurídico / Deontológico da Ordem dos Contabilistas Certificados, apenas revela que afinal a omissão dessa pensão nas declarações relativas aos de 2005 até 2014, se tratou de um esquecimento das rés, imputável a estas apenas., uma vez que haviam assumido perante o autor a obrigação de tratarem da contabilidade pessoal deste de acordo com as exigências legais (aqui incluindo os princípios e normas contabilísticos), assumindo a responsabilidade pela sua regularidade.
Assim, estamos convencidos que a sociedade –ré sabia que o autor pagava uma pensão de alimentos com relevância para efeitos fiscais e que assumiu perante o autor a obrigação de tratar da contabilidade pessoal deste de acordo com as exigências legais.
E no que se refere à alegação das recorrentes na parte em que invocam não terem na posse todos os documentos necessários para o fazer, nomeadamente, os extractos das contas bancárias do autor e documentos comprovativos da obrigação de pensão de alimentos que vinculava o autor, cabe referir que dessa alegação não foi feita prova pelas rés.
Acresce que o comportamento posteriormente assumido pela Ré-sociedade para tentar corrigir o erro relativamente ao ano de 2015, quando substitui a declaração de rendimentos para efeitos de IRS relativa ao ano de 2015 e declara a tal pensão, acaba por retirar qualquer credibilidade àquela alegação (no sentido do autor-recorrido não ter entregue os documentos necessários para declarar a despesa mensal do autor com a pensão de alimentos paga à ex –mulher).
A este propósito pode consultar-se o documento nº 27 junto à petição inicial (a fls 17vº a 20vº dos autos) onde no quadro 6ª, referente a “pensões de alimentos” (ver artigo 83º -A do CIRS), consta o valor de € 4.200,00, com referência ao NIF que consta na declaração de IRS junta a fls 61 a 64.
Concluímos assim que a sociedade ré assumiu o erro que havia cometido relativamente àquele ano, assumindo a responsabilidade pela substituição efectuada, não sendo crível que se não fosse obrigação da ré-sociedade preencher e entregar a declaração de IRS do autor, esta viesse a assumir o encargo de substituir a primitiva declaração, como acabou por fazer voluntariamente, não se acolhendo aqui, por não estar sequer provada, que tivesse ocorrido qualquer pressão por parte do autor nesse sentido.
Esta nossa convicção sai reforçada se atentarmos na já referida comunicação que em 18.06.2016, a 2ª Ré remeteu à Ordem dos Contabilistas Certificados por nós atras referida.
Não fosse a falha imputável às rés, não seria crível que a 2ª ré remetesse aquela comunicação ao departamento jurídico/ Deontológico da sua Ordem Profissional a pedir “ ajuda” e, inclusivamente, se poderia participar o seguro a ocorrência, desta forma reconhecendo o facto, o dano, o nexo de causalidade e a culpa de onde decorre a sua obrigação de indemnizar o autor- colocando até em pensamento transferir essa obrigação para a seguradora.
Tudo a reforçar o nossa convicção no sentido de que, após o divórcio, ocorrido em 2004, o autor solicitou à sociedade ré que passasse a contemplar nas suas declarações de IRS pessoais, a pensão de alimentos que passou a pagar à sua ex-mulher.
Mais. Repare-se que a ré-sociedade ao ser confrontada com a verificada falta de declaração da pensão de alimentos que o autor pagava à ex-esposa fez diligências no sentido de tentar solucionar a falta. Isso mesmo resulta da missiva de fls 27 que o autor lhe enviou e na qual pede à ré-sociedade uma solução para a situação verificada de falta de declaração da pensão de alimentos que pagava à ex-esposa.
Assim, da reapreciação feita dos meios de prova atras indicados convencemo-nos que o autor sempre pagou a pensão de alimentos por transferência bancária e que remetia todos os comprovativos à ré sociedade, incluindo, os extractos de contas bancárias nos quais estavam reflectidos esses pagamentos.
De resto, na hipótese da ré-sociedade não ter na sua posse todos e/ou algum desses documentos esta tinha a obrigação de solicitar ao autor, seu cliente, tais documentos e/ou para esclarecer o que fosse necessário.
Aqui chegados, e no tocante à pretendida alteração dos pontos 5 a 11 e 15 a 21 dos fatos provados, atrás transcritos, este tribunal não logrou alcançar distinta convicção daquela que foi alcançada pelo tribunal recorrido.
Ainda relativamente ao ponto 12, atrás reproduzido, resulta que aqui consta tão só que do preenchimento e entrega das referidas declarações Modelo 3 de IRS do autor, resultaram liquidados pela Autoridade Tributária e Aduaneira os tributos de IRS identificados nas alíneas a) a j) transcritas.
Ora, da análise dos documentos dos autos, concretamente daqueles que foram juntos sob os documentos nºs 15,16,17,18,19, 20,21, 22, 23 e 24 da petição inicial e a fls 54 a 58º verso, e porque consubstanciam demonstrações da liquidação de IRS emitidas pela própria ATA, cuja autenticidade e genuidade não foram postas em causa e que fazem prova dos fatos ali contempladas, concretamente do imposto pago, é manifesto que improcede a requerida alteração do item 12 dos fatos provados.
Finalmente, relativamente ao ponto 26 dos fatos provados as recorrentes impugnam essa factualidade e alegam que essa factualidade constitui uma “ autenticação aberração jurídica-fiscal e contabilística” uma vez que dessa factualidade não resultam os cálculos efectuados para o apuramento desse valor.[2]
De resto, nos artigos 119 a 127 das alegações de recurso as rés referem de modo sucinto que o tribunal recorrido errou no cálculo dos prejuízos.
Todavia, compulsada a motivação da decisão da questão de facto resulta que o tribunal recorrido motivou de modo pormenorizado o item 26 dos factos provados, o que, permite afirmar que a utilização nesse item do substantivo “ prejuízo”, seguida da verba numérica respectiva, não traduz uma conclusão, mas um facto concreto.
Acresce que o prejuízo sofrido pelo Autor, relativamente a cada um dos anos em causa, consistirá na diferença entre aquilo que teve de pagar e/ou foi reembolsado com a liquidação efectuada com base nas declarações preenchidas e entregues pela sociedade Ré e aquilo que teria de pagar e/ou ser reembolsado com a liquidação que deveria ter resultado das declarações em que tivessem sido contempladas as pensões de alimentos que o Autor estava obrigado a pagar.
É sabido que o pagamento da pensão de alimentos tem relevância para efeitos fiscais - pois consubstanciam valores dedutíveis ao rendimento colectável (até 31 de Dezembro de 2008) e/ou directamente à colecta (a partir de 01 de Janeiro de 2009), consoante os períodos de tributação.
Com efeito, nos termos do disposto no artigo 56.º do CIRS (na redacção dada pela Lei n.º 55-B/2004 de 30 de Dezembro), “Para apuramento do rendimento colectável dos sujeitos passivos residentes em território português, à totalidade dos rendimentos líquidos determinados nos termos das secções anteriores abatem-se as importâncias comprovadamente suportadas e não reembolsadas respeitantes aos encargos com pensões de alimentos a que o sujeito passivo esteja obrigado por sentença judicial ou por acordo homologado nos termos da lei civil, salvo nos casos em que o seu beneficiário faça parte do mesmo agregado familiar ou relativamente ao qual estejam previstas deduções noartigo78.º” –redacção em vigor até 31 de Dezembro de 2008.
A partir de 01 de Janeiro de 2009 e por força do preceituado no artigo 83.º-A do mesmo Código (desse então, na redacção dada pela Lei n.º 64-A/2008 de 31 de Dezembro), “À colecta devida pelos sujeitos passivos são deduzidas 20% das importâncias comprovadamente suportadas e não reembolsadas respeitantes a encargos com pensões de alimentos a que o sujeito esteja obrigado por sentença judicial ou por acordo homologado nos termos da lei civil, salvo nos casos em que o seu beneficiário faça parte do mesmo agregado familiar para efeitos fiscais ou relativamente ao qual estejam previstas outras deduções à colecta ao abrigo do artigo 78.º”.
Assim, uma vez dada resposta afirmativa à questão de saber se a Ré-sociedade se obrigou a tratar da contabilidade pessoal do autor, para que o apuramento do imposto de IRS a pagar pelo Autor fosse correcto, as Rés deveriam ter declarado nos respectivos campos das declarações de IRS que preencheram e entregaram, de 2006 a 2015, os valores dos encargos com pensões de alimentos a que o sujeito passivo estava obrigado por sentença judicial ou por acordo homologado nos termos da lei civil, o que, de acordo com a decisão recorrida, as rés não fizeram.
Ora, a consideração das referidas pensões faria com que os montantes de IRS a pagar à Autoridade Tributária e Aduaneira fossem inferiores e /ou os reembolsos de IRS a receber desta entidade fossem superiores.
Posto isto, resulta para nós que a descrição feita na motivação da decisão de facto dos cálculos feitos para apuramento do prejuízo concreto que o autor sofreu relativamente a cada um dos anos referidos no item 26 dos factos provados, não merece qualquer censura, nela não existindo os erros que as recorrentes imputam a essa parte da decisão de facto, reproduzindo-se aqui o segmento da motivação da decisão recorrida nessa parte.
“Por fim, especificamente quanto à factualidade dada como provada no ponto 26,mais concretamente, os prejuízos sofridos pelo autor devido ao incorreto preenchimento das declarações contributivas, para o apuramento dos mesmos foi tido em especial consideração, para além da demais prova acima elencada, os elementos documentais juntos aos autos a fls. 25 e ss, ou seja, as declarações contributivas relativas aos anos de 2006 a 2013 e as demonstrações de liquidação de IRS relativas às mesmas.
Assim:
- Quanto ao ano 2006, atento o documento de fls. 54 verso, o autor liquidou de imposto o montante de € 919,13; não obstante, caso tivesse sido declarada a pensão de alimentos (no valor anual de € 7.200,00), temos que tal valor seria considerado na parcela relativa a “abatimentos”, reduzindo em igual montante o rendimento coletável (cfr. 56.º do CIRS, na redação legal então em vigor), o que, considerando os demais elementos da declaração contributiva, redundaria numa coleta liquida de € 4.628,63 (em vez dos considerados € 7.076,63); considerando o montante nesse ano retido na fonte de € 6.157,50, temos que o autor teria de receber de imposto a quantia de € 1.528,88 (e não pagar € 919,13, como ocorreu), do que resulta um prejuízo efetivo de € 2.448,01;
- Quanto ao ano 2007, atento o documento de fls. 55, o autor recebeu de reembolso o montante de € 1.360,36; não obstante, caso tivesse sido declarada a pensão de alimentos (no valor anual de € 7.200,00), temos que tal valor seria considerado na parcela relativa a “abatimentos”, reduzindo em igual montante o rendimento coletável, o que, considerando os demais elementos da declaração contributiva, redundaria numa coleta liquida de € 1.533,31 (em vez dos considerados € 3.981,31); considerando o montante nesse ano retido na fonte de € 5.336,76, e tendo ainda ser considerada a parcela “juros de retenção-poupança” no montante de 4,91, temos que o autor teria de receber de reembolso a quantia de € 3.808,36 (e não receber apenas € 1.360,36, como ocorreu), do que resulta um prejuízo efetivo de € 2.448,00;
- Quanto ao ano 2008, atento o documento de fls. 55 verso, o autor recebeu de reembolso o montante de € 1.485,45; não obstante, caso tivesse sido declarada a pensão de alimentos (no valor anual de € 7.200,00), temos que tal valor seria considerado na parcela relativa a “abatimentos”, reduzindo em igual montante o rendimento coletável, o que, considerando os demais elementos da declaração contributiva, redundaria numa coleta liquida de € 1.360,42 (em vez dos considerados € 3.808,43); considerando o montante nesse ano retido na fonte de € 5.291,12, e tendo ainda ser considerada a parcela “juros de retenção-poupança” no montante de 2,76, temos que o autor teria de receber de reembolso a quantia de € 3.933,46 (e não receber apenas € 1.485,45, como ocorreu), do que resulta um prejuízo efetivo de € 2.448,01;
- Quanto ao ano 2009, atento o documento de fls. 56, temos que o autor recebeu de reembolso o montante de € 1.560,17; não obstante, caso tivesse sido declarada a pensão de alimentos (no valor anual de € 7.200,00), 20% de tal valor (ou seja, € 1.440,00) seria dedutível diretamente à coleta, dado que, conforme o art. 83.º-A do CIRS, na redação que lhe foi introduzida pela Lei n.º 64.º-A/2008, de 31 de dezembro, e que vigorou a partir de 1 de janeiro de 2009: “À coleta devida pelos sujeitos passivos são deduzidas 20 % das importâncias comprovadamente suportadas e não reembolsadas respeitantes a encargos com pensões de alimentos a que o sujeito esteja obrigado por sentença judicial ou por acordo homologado nos termos da lei civil, salvo nos casos em que o seu beneficiário faça parte do mesmo agregado familiar para efeitos fiscais ou relativamente ao qual estejam previstas outras deduções à coleta ao abrigo do artigo 78.º””; consequentemente, considerando os demais elementos da declaração contributiva, tal redundaria numa coleta liquida de € 2.418,30 (em vez dos considerados € 3.858,30); dado que o montante nesse ano retido na fonte foi de €5.415,32, e tendo ainda ser considerada a parcela “juros de retenção-poupança” no montante de 3,15, temos que o autor teria de receber de reembolso a quantia de € 3.000,17 (e não receber apenas € 1.560,17, como ocorreu), do que resulta um prejuízo efetivo de € 1.444,00;
- Quanto ao ano 2010, atento o documento de fls. 56 verso, temos que o autor recebeu de reembolso o montante de € 287,51; não obstante, caso tivesse sido declarada a pensão de alimentos (no valor anual de € 7.200,00), 20% de tal valor (ou seja, € 1.440,00) seria dedutível diretamente à coleta; consequentemente, considerando os demais elementos da declaração contributiva, tal redundaria numa coleta liquida de € 6.992,49 (em vez dos considerados € 8.432,49); dado que o montante nesse ano retido na fonte foi de € 8.720,00, temos que o autor teria de receber de reembolso a quantia de € 1.727,51 (e não receber apenas € 287,51, como ocorreu), do que resulta um prejuízo efetivo de € 1.444,00;
- Quanto ao ano 2011, atento o documento de fls. 57, temos que o autor pagou de imposto o montante de € 436,23; não obstante, caso tivesse sido declarada a pensão de alimentos (no valor anual de € 7.200,00), 20% de tal valor (ou seja, € 1.440,00) seria dedutível diretamente à coleta; consequentemente, considerando os demais elementos da declaração contributiva, tal redundaria numa coleta liquida de € 6.339,87 (em vez dos considerados € 7.779,87); dado que o montante nesse ano retido na fonte foi de € 8.272,36, e tendo ainda de ser considerada a parcela “sobretaxa-resultado” no montante de € 928,72, temos que o autor teria de receber de reembolso a quantia de € 1.003,27 (e não pagar o montante de 436,23, como ocorreu), do que resulta um prejuízo efetivo de € 1.439,77;
- Quanto ao ano 2012, atento o documento de fls. 57 verso, temos que o autor recebeu de reembolso o montante de € 384,65; não obstante, caso tivesse sido declarada a pensão de alimentos (no valor anual de € 7.200,00), 20% de tal valor (ou seja, € 1.440,00) seria dedutível diretamente à coleta; consequentemente, considerando os demais elementos da declaração contributiva, tal redundaria numa coleta liquida de € 5.462,15 (em vez dos considerados € 6.902,15); dado que o montante nesse ano retido na fonte foi de € 7.285,23, e tendo ainda ser considerada a parcela “juros de retenção-poupança” no montante de 1,57, temos que o autor teria de receber de reembolso a quantia de € 1.823,08 (e não receber apenas 384,65, como ocorreu), do que resulta um prejuízo efetivo de € 1.440,00;
- Quanto ao ano 2013, atento o documento de fls. 58, temos que o autor recebeu de reembolso o montante de € 1.505,50; não obstante, caso tivesse sido declarada a pensão de alimentos (no valor anual de €
7.200,00), 20% de tal valor (ou seja, € 1.440,00) seria dedutível diretamente à coleta; consequentemente, considerando os demais elementos da declaração contributiva, tal redundaria numa coleta liquida de € 6.199,76 (em vez dos considerados € 7.639,76); dado que o montante nesse ano retido na fonte foi de € 9.771,80, e tendo ainda de ser considerada a parcela “sobretaxa-resultado” no montante de € 631,73, e a parcela “juros de retenção-poupança” no montante de 5,19, temos que o autor teria de receber de reembolso a quantia de € 2.945,50 (e não receber apenas 1.505,50, como ocorreu), do que resulta um prejuízo efetivo de € 1.440,00.”
Assim, em face do teor dos documentos juntos aos autos, designadamente aqueles relativos às declarações de rendimentos do autor para efeitos de IRS e aqueles relativos às demonstrações de liquidação de IRS os cálculos dos prejuízos sofridos pelo autor relativamente a cada um dos anos referidos no item 26 dos factos provados não merecem censura, afigurando-se-nos que as deficiências por nós anteriormente apontadas à redacção deste item foram supridas pela nova sentença proferida e que é objecto deste recurso.
Pelo que, afigura-se-nos que não merecem censura esses cálculos, a significar que se nos afigura não merecer provimento a impugnação do item 26 dos factos provados, cuja redacção é por nós mantida.

3.4. Enquadramento Jurídico.
Como emerge do regime plasmado nos arts. 635º, nºs 3 e 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nº 1, da sua natureza lógica de finalização resumida de um discurso, as conclusões têm um papel decisivo, não só no levantamento das questões controversas apresentadas ao tribunal superior como, sobretudo, na fixação do objeto do recurso, logo se compreendendo quão importantes elas são para o tribunal ad quem na definição dos seus poderes de cognição. Em suma: as conclusões têm a importante função de definir e delimitar o objeto do recurso e, desta forma, circunscrever o campo de intervenção do tribunal superior encarregado do julgamento.
No caso, retira-se das conclusões do recurso, que a pretensão das Recorrentes encontrava-se totalmente dependente da procedência da impugnação da matéria de facto apresentada, o que, não veio a verificar-se.
Assim não está posta em causa pelos Recorrentes a apreciação jurídica da causa feita na sentença proferida, mas antes e apenas a decisão de facto, a qual foi mantida por este tribunal da Relação.
Efectivamente, os recorrentes continuam a defender que a acção deve ser julgada totalmente improcedente, e o Autor seja condenado como litigante de má fé, em multa e em indemnização não inferior a 5.000,00 €.
Todavia, do recurso interposto resulta que a pretensão recursória dos recorrentes está totalmente dependente da procedência da impugnação dos itens da matéria de facto.
Não há assim motivo para a alteração da sentença proferida.
Com efeito, no caso em apreço apurou-se que autor e a 1.º ré C..., Lda celebraram um acordo verbal nos termos do qual esta se obrigara a prestar ao primeiro, serviços de contabilidade mediante o pagamento de determinado montante mensal, o que sucedeu entre agosto de 1003 e setembro de 2016.
Este acordo configura um contrato de prestação de serviços, legalmente definido como «aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição» - art. 1154º do Cód. Civil.
Ao contrato de prestação de serviços que a lei não regule especialmente são aplicáveis as disposições relativas ao contrato de mandato, por força do disposto no art. 1157º do Cód. Civil.
Nos termos dessas disposições, o contrato de prestação de serviços tem como efeitos essenciais a obrigação de praticar os atos compreendidos no contrato, por parte de quem presta os serviços, e a obrigação de pagar a retribuição acordada, por parte de quem os recebe (arts. 1161º e 1167º Cód. Civil).
Concluindo. Entre autor e ré sociedade, da qual a ré D… é sócio- gerente, TOC certificada e responsável técnica, estabeleceu-se um vinculo contratual de prestação de serviços de contabilidade.
Importa agora apreciar o (in)cumprimento por parte das rés, das obrigações que para estas emergem da relação jurídica que assumiram para com o autor e suas responsabilidades.
Nesta parte, importa atentar que emerge do artigo 798º do C.Civil, aplicável no caso em apreço, que são pressupostos da responsabilidade civil contratual e, portanto, da obrigação de indemnizar com fonte contratual:
(i)a ilicitude, a provar pelo credor, que “resulta, no domínio da responsabilidade contratual, das relação de desconformidade entre a conduta devida (a prestação debitória) e o comportamento observado”,(cfr.. Professor ANTUNES VARELA, loc. cit. vol. II, pp. 93 e 100).
(ii)a culpa, exigindo-se que o devedor tenha actuado culposamente ao não cumprir a obrigação devida, o que significa que tal conduta de não cumprimento deve qualificar-se como conduta pessoalmente censurável ou reprovável do devedor, avaliando-se as concretas circunstâncias de actuação, de modo a averiguar se devia ter agido de outro modo e se o podia ter feito e, portanto, se a sua conduta é censurada e reprovada, (No mesmo sentido, Professor ANTUNES VARELA, loc. cit., pp. 95 a 100).
importando nesta parte atentar na presunção de culpa do devedor plasmada no n.º 2 do artº 799º do Código Civil. É ao devedor que incumbe provar que a falta de cumprimento ou a falta de cumprimento exacto da obrigação não procede de culpa sua, como se expressa no artº 799º, n.º 1 do Código Civil;
(iii)o prejuízo sofrido pelo devedor, que será o dano emergente, mas também o lucro cessante 12, pois, como se sabe, sem dano não há obrigação de indemnizar e, portanto, não há responsabilidade civil;
(iv)o nexo de causalidade entre o facto e o dano ou prejuízo;
No caso, da factualidade dada como provada resulta que:
-No âmbito do contrato referido em 5. a ré C… Lda, através de um funcionário/colaborador procedeu, ao preenchimento e entrega à Autoridade Tributária e Aduaneira das seguintes declarações Modelo 3 de IRS do autor dos anos de 2005 a 2015.
-O autor divorciou-se de G… em 17/12/2004,-tendo sido condenado por douta decisão, já transitada em julgado, proferida naquela data no âmbito do Processo de Divórcio por Mútuo Consentimento que sob o n.º …/2004 correu termos pela 2.ª Conservatória do Registo Civil de Vila Nova de Gaia, a cumprir um acordo relativo a alimentos relativo à sua ex-cônjuge, no montante de € 600,00;
-O autor procedeu ao pagamento da pensão referida em 14., através de transferência bancária, desde a data do referido acordo e até julho de 2015, data em que suspendeu o pagamento de tal pensão, pois o valor da mesma seria canalizado para ajudar a filha do casal;
-Sabendo que tal pensão de alimentos tinha relevância para efeitos fiscal, o autor solicitou à ré C…, Lda, na pessoa do seu representante à data, que contemplasse o pagamento desta pensão nas suas declarações Modelo 3 de IRS a partir de 17/12/2004;
-Para tanto, o autor procedeu à entrega dos comprovativos das transferências bancárias que fez mensalmente para a conta da ex-cônjuge, à ré sociedade;
-Os pagamentos da pensão eram também evidenciados pelos extratos bancários que periodicamente enviava para a contabilidade;
-A C…, Lda, através de qualquer dos seus colaboradores/sócios, contemplou a referida pensão de alimentos na declaração de IRS do autor respeitante ao ano de 2005;
-A C…, Lda, através de qualquer dos seus colaboradores/sócios, não comtemplou a referida pensão de alimentos na declaração de IRS do autor respeitante aos anos de 2006 a 2015.
Perante tal factualidade concluímos que a ré sociedade, através de qualquer um dos seus colaboradores/TOC incumpriu a sua função, na medida em que o ato ilícito imputado às Rés é precisamente o de não ter feito constar das declarações de IRS pessoais do autor o facto de estar a proceder ao pagamento de uma pensão de alimentos mensal à sua ex- cônjuge.
Evitar tais consequências seria muito simples: bastaria ter procedido à comunicação de tal pensão nas declarações de IRS do autor, uma vez que este lhe comunicou tal obrigação legal e as rés tinham todos os meios/documentos necessários para tanto, uma vez que tinham acesso às contas bancárias do autor por onde o mesmo concretizava o referido pagamento.
A conduta das Rés é, pois, ilícita. E agiram com culpa.
Por um lado, presume-se tal juízo de censura, pois que não está elidida, (Cf. artºs 799º, n.º 1, 344º e 350º do Código Civil).Por outro lado, crê-se mesmo ser legítimo afirmar demonstrado tal juízo de culpa, pois nada invocaram no sentido de justificar tal comportamento.
Na verdade devendo a culpa ser apreciada em abstracto pela diligencia de um bom pai de família, isto é pelo comportamento normal do homem comum, logo o o segmento final do nº 2 do artigo 487º do Código Civil acrescenta que isso deve ser feito em face das circunstancias de cada caso concreto o que significa que se deve ter em cada caso em atenção a profissão e outros elementos.
O que importa é verificar se um Técnico Oficial de Contas (qualidade em que a 2ª Ré foi contratada) normalmente diligente adoptaria a atitude e comportamento que se revela nos autos nas mesmas circunstancias concretas supra evidenciadas e provadas e a resposta a tal matéria é inequívoca e claramente negativa, uma vez que não é crível que um TOC não soubesse da relevância de tal pensão de alimentos que o autor estava legalmente obrigado a pagar.
Concluímos assim que as rés incumpriram o acordo celebrado com o autor.
E no tocante à responsabilidade de cada uma das rés nada nos oferece acrescentar à fundamentação vertida na sentença recorrida.
Efectivamente, quanto à ré-sociedade a sua responsabilidade é contratual por força do contrato de prestação de serviços celebrado com o autor.
Quanto à responsabilidade da TOC D…, como referido na sentença recorrida “A presente ação foi proposta com fundamento na execução defeituosa, pelo TOC e/ou seus colaboradores, dos serviços de contabilidade abrangidos pelo contrato de prestação de serviços, celebrado entre o autor e a ré sociedade C…, Lda.”
E foi dado como provado que os serviços contratados entre o autor e a ré sociedade eram prestados pelo TOC e/ou seus colaboradores e que a ré D… tem cédula profissional e está inscrita como Técnico Oficial de Contas, é sócia gerente da ré sociedade e sua responsável Técnica.
Tendo o contrato de prestação de serviços de contabilidade sido celebrado com a sociedade da qual a TOC D… é o sócio-gerente (ainda que simultaneamente seja, não apenas o responsável técnico da sociedade, mas também aquele que efetivamente executa os serviços), em tese geral, só aquela sociedade seria responsável diretamente perante o autor pelo cumprimento defeituoso do mesmo contrato.
Contudo, há que ter em conta o regime legal específico que regula a atividade dos Técnicos Oficiais de Contas (atualmente denominados como “Contabilistas Certificados”), regime que compreende diferentes períodos:
- Entre 1976 e 1995, vigorou a Portaria nº 420/76, de 14 de Julho, que, pela primeira vez, veio regular a função do “técnico de contas”;
- Entre 1995 e 1999, vigorou o Estatuto dos Técnicos Oficiais de Contas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 265/95, de 17 de Outubro;
- Entre 1999 e 2009, vigorou o Estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 452/99, de 5 Novembro. Neste período existia também um Código Deontológico dos Técnicos Oficias de Contas, aprovado apenas no âmbito associativo;
- Entre 2009 e 2015, vigorou o Estatuto da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 310/2009, de 26 Outubro (anexo I), acompanhado do regime do Código Deontológico dos Técnicos Oficiais de Contas, aprovado pelo mesmo diploma legal (anexo II);
- A partir de 2015, passou a regulamentar a função, agora denominada de “Contabilista Certificado”, o Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados, aprovado pelo Decreto-Lei nº 139/2015, de 7 Setembro (anexo I), acompanhado do regime do Código Deontológico dos Contabilistas Certificados, aprovado pelo mesmo diploma legal (anexo II).
Dos factos provados resulta que o contrato de prestação de serviços dos autos foi celebrado, por forma verbal, tendo em vista a realização da contabilidade do autor a partir de 1993 e que os serviços defeituosamente cumpridos correspondem a período situado entre 2006 a 2014 pelo que são aplicáveis ao caso: entre 2006 e 2009, o regime legal aprovado pelo Decreto-Lei nº 452/99, de 5 Novembro; entre 2009 e 2014, o regime legal do Decreto-Lei nº 310/2009, de 26 Outubro.
Relativamente aos serviços de contabilidade prestados entre 2006 e 2009, releva o disposto no art. 7º, do Estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 452/99, que aqui se reproduz:
Artigo 7.º”Modos de exercício da actividade”
1 - Os técnicos oficiais de contas podem exercer a sua atividade:
a) Por conta própria, como profissionais independentes ou empresários em nome individual;
b) Como sócios, administradores ou gerentes de uma sociedade de profissionais;
c) Como funcionários públicos, desde que exerçam a profissão de técnico oficial de contas na Administração Pública ou contratados pela administração central, regional ou local;
d) No âmbito da prestação de um contrato de trabalho individual celebrado com outro técnico oficial de contas, outros profissionais, uma pessoa coletiva ou um empresário em nome individual.
2 - Os técnicos oficiais de contas que exerçam as respetivas funções em empresas de prestação de serviços ou em sociedades de profissionais devem assumir, pessoal e diretamente, as correspondentes responsabilidades.
Como salienta a sentença recorrida :
“Trata-se de um regime próprio pelo qual todas as modalidades de exercício da atividade de TOC estão abrangidas pelo Estatuto e em todas elas – incluindo a modalidade dos autos em que a TOC D… é sócio-gerente da sociedade C…, Lda, e sua responsável técnica – o TOC é pessoal e diretamente responsável pelos serviços prestados (nº 2) perante aqueles que os recebem.
Este regime próprio de responsabilidade do TOC, que se compreende à luz da natureza da atividade de certificação da contabilidade das empresas, faz com que, independentemente do contrato de prestação de serviços ter sido celebrado entre o autor e a sociedade C…, Lda., e não entre aquele e o TOC D… a título individual, esta último seja responsável, pessoal e diretamente, perante o autor.
Este regime manteve-se no período subsequente – no qual se inserem os serviços prestados entre 2009 e 2014 – da evolução do regime legal que regula a atividade em causa, sendo que a nova redacção do nº 2 em nada altera o regime de responsabilidade pessoal e directa do TOC, que se mantém.
Assim, estabelece o art. 7º, do Estatuto da Ordem dos Técnicos Oficias de Contas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 310/2009, sob a epígrafe “Modos de exercício da actividade”
1 - Os técnicos oficiais de contas podem exercer a sua atividade:
a) Por conta própria, como profissionais independentes ou como empresários em nome individual;
b) Como sócios, administradores ou gerentes de uma sociedade profissional de técnicos oficiais de contas ou de uma sociedade de contabilidade;
c) Como funcionários públicos, desde que exerçam a profissão de técnico oficial de contas na Administração Pública ou contratados pela administração central, regional ou local;
d) No âmbito de um contrato individual de trabalho celebrado com outro técnico oficial de contas, com uma sociedade de profissionais, com outra pessoa coletiva ou com um empresário em nome individual.
2 - Com exceção das situações referidas no n.º 6 do artigo 8.º e da prestação de serviços no âmbito de sociedades de contabilidade, os técnicos oficiais de contas celebram, obrigatoriamente, por escrito, com as entidades referidas na alínea a) do n.º 1 do artigo 6.º, o contrato de prestação de serviços referido no n.º 5 do artigo 52.º, devendo assumir, nesse documento, pessoal e diretamente, a responsabilidade pela contabilidade a seu cargo.
A diferença de redacção do nº 2 respeita à exigência de forma escrita para a celebração do contrato de prestação de serviços, exigência que não é aplicável ao contrato de prestação de serviços dos autos, celebrado no ano1993.”
Aliás, esse regime de responsabilidade é reforçado pelo disposto nos arts. 5º e 19º do Código Deontológico dos TOC, aprovado pelo mesmo Decreto-Lei nº 310/2009 (Anexo II), no qual, o Artigo 5.º que sob a epígrafe “Responsabilidade” dispõe:
1 - O técnico oficial de contas é responsável por todos os actos que pratique no exercício das suas funções, incluindo os dos seus colaboradores.
2 - O recurso à colaboração de empregados ou de terceiros, mesmo no âmbito de sociedades profissionais de técnicos oficiais de contas ou de sociedades de contabilidade, não afasta a responsabilidade individual do técnico oficial de contas.
Acresce ainda que o Artigo 19.º sob a epígrafe “ Sociedades profissionais de técnicos oficiais de contas e sociedades de contabilidade “dispõe:
O disposto no presente Código Deontológico relativamente aos técnicos oficiais de contas é aplicável, com as necessárias adaptações, aos profissionais integrados em sociedades profissionais de técnicos oficiais de contas ou em sociedades de contabilidade.”
Concluímos assim, tal como a sentença recorrida, que independentemente da qualidade jurídica em que a TOC D… desempenhava os serviços de “responsável técnico” da contabilidade do autor, é ela pessoal e diretamente responsável perante aquele pela não execução ou pela execução defeituosa dos mesmos serviços. Isto é, “enquanto que à ré sociedade assiste responsabilidade contratual, à ré D… assiste responsabilidade legal”.[3] Pelo que, sobre a ré D…, recai, assim, igualmente a obrigação legal de indemnizar.
Aqui chegados, uma vez que no recurso interposto as recorrentes também não argumentam sequer contra a fundamentação da sentença quanto à afirmada verificação dos danos e ao correspondente nexo de causalidade entre aquela conduta omissiva e este dano, não existe ssim motivo para nos debruçarmos sobre a fundamentação da sentença nessa parte, a qual, também nessa parte também é por nós mantida.
Concluímos assim pela improcedência total do recurso interposto, confirmando a sentença recorrida.
Por último, no tocante à alegação das recorrentes no sentido de todo o comportamento do Autor, aqui recorrido, corresponder a uma situação de má fé, por “alegadamente saber que as Rés nenhuma culpa têm, sendo a culpa e negligência exclusivamente do Autor, que apenas pretende, por esta via, enriquecer à custa do Seguro e à custa das Rés”, diremos o seguinte.
Não resulta do substrato factual apurado que o autor-recorrido tenha actuado com má-fé, por alegadamente saber que as Rés nenhuma culpa têm ao omitirem os pagamentos pelo autor das referidas pensões de alimentos nas declarações que preencheram e entregaram à Autoridade Tributária e Aduaneira.
Efectivamente, como decorre de todas as considerações atras feitas a matéria de fato apurada revela que “(…) a ré sociedade, através de qualquer um dos seus colaboradores/TOC incumpriu a sua função, na medida em que o ato ilícito imputado às Rés é precisamente o de não ter feito constar das declarações de IRS pessoais do autor o facto de estar a proceder ao pagamento de uma pensão de alimentos mensal à sua ex- cônjuge. Evitar tais consequências seria muito simples: bastaria ter procedido à comunicação de tal pensão nas declarações de IRS do autor, uma vez que este lhe comunicou tal obrigação legal e as rés tinham todos os meios/documentos necessários para tanto, uma vez que tinham acesso às contas bancárias do autor por onde o mesmo concretizava o referido pagamento. A conduta das Rés é, pois, ilícita. E agiram com culpa.”.
Não está assim verificada factualidade que permita subsumir a conduta do autor –recorrido em qualquer das situações tipificadas na norma do n.º 2 do artigo 542.º do CPC em que a parte incorre em litigância de má-fé: (a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação; d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.”
Pelo exposto não vislumbramos a verificação por parte do autor-recorrido de uma situação de litigância com má-fé.
Sumário:
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IV-DISPOSITIVO:
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar totalmente improcedente o recurso de apelação interposto pelas apelantes, e, assim, confirmam a sentença recorrida.
As custas deste recurso serão pagas pelos recorrentes.

Porto, 13.05.2021
Francisca Mota Vieira
Paulo Dias da Silva
João Venade
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[1] Cujo conteúdo se reproduz: A 18/06/2016, a ré D… remeteu ao departamento Jurídico / Deontológico da Ordem dos Contabilistas Certificados uma comunicação nos seguintes termos:
“Boa tarde, venho solicitar ajuda na seguinte situação:
- tenho um cliente que há mais de 20 anos preencho e entrego a declaração de IRS e que se divorciou há cerca de 10 anos.
Decorrente desse divórcio, passou a pagar uma pensão de alimentos à ex-mulher, da qual nunca me entregou documento, embora me tenha falado de tal mas sempre referindo que a pagava por se sentir moralmente na obrigação de o fazer, depreendendo eu que não se tratava de pensão de alimentos e não seria declarável em sede de IRS.
- após todos estes anos o cliente apercebeu-se que não estaria a ser declarada tal pensão e exige que eu o reembolse de pelo menos uma parte do prejuízo que teve uma vez que a A.T, não vai reembolsar tal beneficio.
Posto isto, agradecia que me informassem se posso participar ao seguro a ocorrência e se haverá possibilidade de o cliente ser reembolsado.”, (cfr. doc. junto a fls. 22 e que aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos).
[2] Reproduz-se aqui a conclusão do recurso que se refere a esse facto :
“63)Por último, o Ponto 26 da matéria dada como provada pela Juíza do Tribunal a quo constitui uma autêntica “aberração jurídico-fiscal e contabilística”, pois nos termos da lei aplicável a cada ano, tais valores que constam da Douta Sentença recorrida não correspondem aos “prejuízos que, relativamente a cada uma das declarações erradamente preenchidas se calculam”. Contudo, o autor terá presumido esses valores e lançado um valor aleatório, sem qualquer fundamento, não demonstrando como procedeu ao cálculo dos valores que considera de prejuízos.”
[3] Neste sentido pode consultar-se o Ac. do STJ de 27.04.2017, acessível in www.dgsi.pt, assim sumariado, convocado pela sentença recorrida:
“A responsabilidade civil dos técnicos oficiais de contas (TOC) constitui um regime específico de responsabilidade pelo qual todas as modalidades de exercício da atividade de TOC estão abrangidas pelo Estatuto e em todas elas o TOC é pessoal e diretamente responsável pelos serviços prestados perante aqueles que os recebem.
II - Por conseguinte, independentemente do contrato de prestação de serviços de contabilidade ter sido celebrado com uma sociedade comercial, o TOC, responsável técnico da sociedade e prestador efetivo dos serviços, é responsável, a título individual (e independentemente da sua qualidade de sócio-gerente), pessoal e diretamente, pela não execução ou pela execução defeituosa dos mesmos serviços.
III - Ainda que estejam em causa os mesmos danos, cada um – sociedade e TOC – é responsável pela totalidade da obrigação, a diferente título, respetivamente, contratual e legal, não se colocando o problema da eventual natureza solidária das obrigações. (…)”.