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CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO
RESOLUÇÃO CRIMINOSA ÚNICA
INEXISTÊNCIA DE PROVA PERICIAL NOS AUTOS
VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DÚBIO PRO REO
Sumário
I– O recurso interposto pelo arguido terá que proceder, uma vez que a decisão recorrida, reportando-se ao início dos factos que decorreram do plano elaborado em 2013, usou para fundamentar a condenação, a prova pericial produzida num outro processo, em que foram investigados factos posteriores, e padece do vício que é de conhecimento oficioso, de erro notório na apreciação da prova nos termos do artº 410º nº 2 al c) do CPP;
II–A tal acresce que a restante prova produzida nestes autos assenta nas declarações dos que não reconhecem como sua a assinatura aposta no documento, nos que receberam o documento do arguido, coisa que não permite concluir naturalmente, só por si, que a autoria da falsificação foi feita pelo arguido, e também dos que sabiam que era o arguido que tratava desses assuntos;
III–Perante tal quadro e analisada a prova produzida “ in casu”, não é possível afastar a dúvida, e não sendo possível afastar a dúvida, não é possível manter a condenação do arguido com base na suposição de que muito provavelmente foi ele, pelo que terá que ser absolvido atento o principio “ in dúbio pro reo”.
Texto Integral
Acordam na 9ª Secção Criminal da Relação de Lisboa:
AA………veio interpor o presente recurso da decisão que o condenou na pena única de 2 anos e 6 meses de prisão pela prática de 4 crimes de falsificação de documento autêntico, p.p. pelo artº 255º, al. a), 256º, nºs 1 al a) e 3 do Código Penal (penas parcelares de 1 ano de prisão por cada um dos crimes) e de 2 crimes de falsificação de documento p.p. pelo artº 255ºal a) e 256ºnºs 1 al. a) e c) do Código Penal ( penas parcelares de 6 meses de prisão por cada um dos crimes).
A pena única ficou suspensa na sua execução por igual período na condição de o arguido comprovar nos autos o pagamento de pelo menos, 2 000 euros junto da demandante, com referência à indemnização de 4000 euros pelos danos não patrimoniais sofridos.
Em seu entender, a matéria de facto foi fixada com fundamento na anterior condenação do arguido recorrente e nos documentos já existentes nos autos, nenhuma prova se tendo feito de que a falsificação fosse da autoria do arguido, já que também não foi efectuada prova pericial.
A decisão recorrida enferma de erro notório na apreciação da prova e de insuficiência de fundamentação, e deveria ter concluído antes pela absolvição do arguido recorrente, quer no que concerne à acusação crime, quer no que concerne ao pedido cível deduzido pela assistente.
Pede que se julgue o recurso procedente, se revogue a decisão recorrida, e se substitua por outra que absolva o arguido recorrente, quer da acusação crime, quer do pedido cível contra si deduzido.
O MºPº respondeu a esta motivação dizendo que o recurso deverá ser rejeitado uma vez que o recorrente não deu cumprimento ao ónus previsto nas alíneas do artº 412º, nº 2 a), b) e c) e nº 3 do Código do Processo Penal.
Quando assim se não entender, deve manter-se a decisão recorrida.
A assistente …..Transportes SA pugna pela manutenção da decisão recorrida.
Nesta Relação, o MºPº emitiu Parecer pela improcedência do recurso, e o arguido recorrente veio responder ao Parecer, reiterando o que já havia pedido – a procedência do recurso com revogação da decisão recorrida e absolvição.
Vejamos, então:
As questões objecto do recurso, tal como ficaram delimitadas nas conclusões, são as de saber a)-Se o recurso deve ser rejeitado por falta de cumprimento do disposto nos nºs 2 e 3 do artº 412º do CPP; b)-Caso não seja rejeitado, cumpre decidir se a decisão recorrida enferma dos vícios de conhecimento oficioso que lhe são assacados, designadamente, de insuficiência de fundamentação de facto para a decisão e de erro notório na apreciação da prova. c)-Se a decisão recorrida enferma de erro na determinação da medida concreta das penas aplicadas. d)-Se a condenação do recorrente se deve manter, quer em sede penal quer em sede cível.
Apreciando:
Após vistos e conferência:
O texto da decisão recorrida é o seguinte:
…”
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* 1–RELATÓRIO
O Ministério Público deduziu acusação pública para julgamento, sob a forma de processo comum e com intervenção do tribunal singular, ao abrigo do disposto no art.° 16.°, nº 3 do Código do Processo Penal, contra: - AA, casado, nascido em …………, natural de …………, filho de ……………………., titular do documento de identificação civil …………., com morada na Rua ……………………………. Lisboa;
Imputando-lhe a prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso efectivo, de 4 (quatro) crimes de falsificação de documentos agravada (documentos autênticos), p. e p. pelo artigo 255°, aI. a), 256°, nºs 1, aI. a) e 3, do Código Penal e de 2 (dois) crimes de crimes de falsificação de documentos, p. e p. pelo artigo 256°, nºs 1, ais. a) e c) do Código Penal
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A ofendida e demandante, Laso Transportes S.A., deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido e demandado, peticionando a sua condenação no valor de € 25.000,00, a título de danos não patrimoniais (imagem e reputação), acrescidos de juros de mora à taxa legal em vigor desde notificação e até integral pagamento e demais despesas.
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O arguido não contestou e não arrolou testemunhas.
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Na sequência do solicitado pela defesa foi realizado exame pericial ao arguido, concluindo-se pela sua capacidade de distinguir o certo e errado (fls. 672 e ss. e 716 ss.).
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Procedeu-se ao julgamento com observância do formalismo legal, como resulta da respectiva acta e na presença do arguido.
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Após o despacho que recebeu a acusação, não ocorreram nulidades, excepções ou questões prévias de que cumpra conhecer, mantendo-se a validade e regularidade da instância.
II–FUNDAMENTACÃO:
Al Factos Provados
Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos com interesse para a decisão da mesma:
1.Em data não concretamente apurada, mas reportada aos idos de 2013, o arguido exerceu funções em empresas de transportes, designadamente na Transportes Ribatejo, ficando, por isso, conhecedor das dificuldades de obtenção de Autorizações Especiais de Trânsito, vulgo e doravante AET, por parte das empresas de transporte estrangeiras.
2.Destarte, o arguido concebeu um plano que consistia em oferecer os seus serviços a essas empresas, propondo-lhes diligenciar pela obtenção das AET mediante contrapartida económica.
3.Porém, o arguido não diligenciava pela obtenção junto da entidade competente das referidas autorizações - AET -, as quais são documentos emitidos pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes I.P., doravante IMT, ao abrigo da Portaria n.º 472/2007, de 22 de Junho, que autorizam o trânsito na via pública dos veículos que, pelas suas próprias caraterísticas ou em virtude do transporte de objectos indivisíveis, excedam as dimensões ou os pesos regulamentares, sendo que para a emissão das AET o IMT solicita, quando conveniente, parecer à entidade responsável, pelas vias a utilizar.
4.O arguido, ao invés de contactar o IMT, com recurso a um instrumento para cunhar selos brancos, moedas de escudo de colecção, um computador e uma impressora, que possuía na sua residência, sita Rua …………………, em Lisboa, procedia à elaboração das AET, com o intuito de fazer crer, quer aos interessados, quer às autoridades policiais, que estas eram verdadeiras e que tinham sido emitidas pela entidade a quem compete a sua emissão, o IMT.
5.Assim, o arguido elaborou, nos moldes acima descritos: AET nº CD00131/2015/DRMTLVT com data de emissão 12.03.2015 para a empresa CTS SCCPAROSSI VEZIO; - AET anual nº 01495/2015/DRMTLVT com data de emissão 14.07.2015 para a empresa AUTOTRANSPORTI; - AET CD n.º 00261/DRMTLVT com data de emissão 28.04.2016 para a empresa AUTOTRANSPORTI; - AET anual n.º 01878/2016/DRMTLVT com data de emissão 16.05.2016 para a empresa AUTOTRANSPORTI.
6.Após, o arguido diligenciou pela entrega das AET, como legítimas, aos condutores das referidas empresas, como se de um documento original se tratasse, emitidas pelo IMT, cobrando por cada uma delas a quantia de cerca de 350€ (trezentos e cinquenta euros).
7.A AET n.º CD 00131/2015/DRMTLVT, com data de emissão 12.03.2015, para circulação entre a fronteira de Vilar Formoso e Ílhavo, que autorizaria um transporte especial pela empresa CTS SCCPA-ROSSI VEZIO, foi forjada pelo arguido, pois a verdadeira AET emitida pelo IMT com tal número foi emitida a uma empresa distinta em 09.04.2015.
8.Também os pareceres técnicos da Ascendi - Autoestradas das Beiras Litoral e Alta SA, datado de 10.03.2015, e da Estradas de Portugal SA, datado de 12.03.2015, relativo ao transporte especial pela empresa CTS SCCPA-ROSSI VEZIO, subjacentes à emissão da AET nº CD 00131/2015/DRMTLVT, foram forjados pelo arguido, não tendo sido emitidos pela Ascendi nem pela Estradas de Portugal, tendo o arguido forjado pelo seu punho as assinaturas dos responsáveis dessas entidades pela emissão dos pareceres.
9.Assim, a AET n.º CD 00131/2015/DRMTLVT foi forjada pelo arguido e entregue a empresa espanhola, que visava o transporte de parte de um componente de uma prensa adquirida pela empresa portuguesa Grés Panaria, com sede em Ílhavo, a um fabricante italiano, transportada por via marítima até ao Porto de Valença e, por via terrestre, desde a Fronteira de Vilar Formoso até Ílhavo.
10. Devido às dimensões, o transporte teria que ser acompanhado por um carro piloto, tendo a empresa espanhola solicitado ao arguido a obtenção da AET, solicitando à empresa portuguesa MVI Europa que efectuasse esse acompanhamento.
11.A gerente da sociedade MVI Europa recebeu a AET do arguido e constatou que esta não seria autêntica, pelo que recusou efectuar o acompanhamento do transporte.
12.As AET anual n.º 01495/2015/DRMTLVT, CD nº? 00261/DRMTLVT e anual nº? 01878/2016/DRMTLVT para a empresa AUTOTRANSPORTI CORTI SLR, foram forjadas pelo arguido, que havia sido contratado por aquela para diligenciar pela emissão das licenças de transporte.
13.A empresa AUTOTRANSPORTI contratou também a sociedade RUFENA, de que é sócio gerente RN, para efectuar o acompanhamento do transporte, com carro piloto.
14. Assim, em 16 de Maio de 2016, o arguido remeteu, por correio, para a empresa RUFENA, as AET que forjou.
15.Em 19 de Maio de 2016, essas ATE estavam na posse do condutor RN, no Porto de Setúbal, onde seria realizado o transbordo de uma carga de dois veículos pesados italianos, propriedade da AUTOTRANSPORTI, para viaturas da LASO Transportes SA, devendo o RN entregar em mão as AET aos motoristas dos camiões da LASO, que iam efectuar o transporte de Setúbal para Águas de Moura.
16.A AET anual n.º 01495/2015/DRMTLVT, entregue efetivamente a um dos motoristas, foi forjada pelo arguido, incluindo um selo branco falso, tendo a original com esse número sido emitida pelo IMT em nome da sociedade Auto Transporte MACH RENT SA.
17.A AET CD nº 00261/DRMTLVT foi forjada pelo arguido, tendo a original sido emitida pelo IMT em nome da sociedade MEGACONTAINER. 18.A AET anual nº 01878/2016/DRMTLVT foi forjada pelo arguido não tendo à data sido emitida pelo IMT qualquer AET com tal numeração, sendo a última a de n.º 125112016.
19.Ao produzir e fabricar, por recurso a meio informático, e utilizando selos brancos, os documentos supra identificados, AET, e entregando-os às empresas de transporte, fazendo-as crer que os mesmos eram documentos oficiais, AET, emitido pelos serviços de um organismo oficial, o IMT, o arguido quis pôr em causa a fé pública de que aqueles documentos, como meio de certificação oficial do Estado, devem merecer, o que logrou conseguir.
20.Para tal, o arguido forjou dois pareceres, subjacentes à emissão de uma das AET, neles apondo a assinatura das pessoas responsáveis das entidades emitentes, como se da assinatura destas se tratasse, sabendo que a assinatura é um acto pessoal que não estava autorizado a praticar.
21.Tudo o que fez com o propósito concretizado de obter para si vantagem patrimonial ilegítima, resultante do pagamento das pretensas AET, que lhe foram feitos pelas empresas destinatárias das mesmas, convictas de que tinham sido legitimamente emitidas, resultado que logrou alcançar.
22.Agiu de forma livre, deliberada e consciente, sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal. Mais se provou,
23.A demandante ao tomar conhecimento das ocorrências acima descritas iniciou contactos junto das entidades oficiais e autoridades.
24.A demandante é a líder do mercado nacional de transportes especiais.
25.Em consequência da actuação acima descrita, a sua imagem foi afectada em termos de eficiência e competitividade.
26.Sofreu prejuizos decorrentes da sua preterição na obtenção das AET, em números e valores não concretamente apurados, uma vez que cumpria os prazos e as exigências legais. Provou-se ainda,
27.O arguido vive com a mulher há 51 anos.
28.Ambos apresentam problemas de saúde.
29.Tem uma filha maior de idade e independente, que lhe presta auxílio.
30.Aufere uma pensão de reforma no valor de €760 mensais.
31.A mulher do arguido aufere uma pensão idêntica à do arguido.
32.Habita em casa arrendada, pagando pela mesma €262,00 mensais.
33.Tem a 4a classe.
34.Do seu certificado do registo criminal junto aos autos consta que foi condenado no processo comum colectivo nº 3/16.3GTBJA do JC Criminal de Lisboa J18, pela prática em 2015 de 148 crimes de falsificação de documento autêntico, na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período e sujeita ao pagamento de dois mil euros a uma IPSS, por decisão datada de 09-11-2018 e transitada em 10-12-2018.
B)–Factos Não Provados
Não se provou que:
- A demandante sofreu prejuízos de €101.925,00 referente a propostas de negócio prejudicados e decorrentes da actuação do arguido.
Não deixaram de se provar quaisquer outros factos relevantes para a decisão da causa.
C)–Motivação da Matéria de Facto
O Tribunal gizou a sua convicção atendendo ao conjunto das diligências realizadas em audiência, analisando-as global e criticamente, segundo as regras da experiência comum e segundo a livre convicção do julgador, nos termos do art.° 127.° do Código de Processo Penal.
Em sede de audiência o arguido prestou declarações quanto aos factos, negando a sua prática, indicando que no outro processo em que foi condenado foi mal aconselhado, sendo que o facto de deter um selo branco é livremente acessível e as moedas são apenas uma pequena colecção que detinha por gosto. Refere a experiência e o conhecimento do ramo e que nunca falsificou nada, nem imagens, tanto que nem utilizava computador. A testemunha NP, militar da GNR. confirmou a intervenção policial verificada no Porto de Setúbal, onde ocorreu uma detenção e foram apreendidas três AET falsificada, evidenciando desconformidades ao nível da redacção e do selo, sendo a denunciante a aqui demandante Laso, confirmando o auto elaborado no apenso. Mencionou ainda que na ocasião foi referenciado o nome do aqui arguido como tendo remetido as AET em causa e pelas testemunhas no local.
A testemunha JF reportou ter sido responsável da Ascendi pelas AET e junto das Infraestruturas de Portugal, confirmando que a assinatura de fls. 8 e 9 dos autos não lhe pertence e nem aquela de fls. 31, esclarecendo que o "Iayout" apresenta desconformidades de configuração, sendo que apenas pode existir um número e que aquele aqui em causa respeita a outro processo. AB, funcionário da Ascendi, referiu existirem documentos com o mesmo número e por referência a um transporte especial, levantando dúvidas quanto à sua veracidade e que em contacto com outros colegas verificou que uma dessas AET era falsa e os pareceres que acompanhavam igualmente. Confrontado com fls. 8 e 9 e 31, conclui que o número é irrepetível, sequencial e daí verificar a existência de um documento falso, situação que reportou às Infraestruturas de Portugal. IG, funcionária das Infraestruturas de Portugal prestou depoimento, esclarecendo que o arguido era pessoa conhecida no meio por tratar e ser requerente de AET. Referiu ainda que circularam documentos falsos e que a sua assinatura e carimbo de fls. 61 a 63 e 69 a 71 são falsos, existindo lapso no seu nome, em vez de "G" colocaram "C", sendo que o conteúdo do parecer em causa é antigo, não correspondendo ao actual e à data dos factos ao texto então utilizado. Mais relatou que as informações que conduziram ao aludido parecer não são verdadeiras e não foram realizadas pelos colegas. JP, funcionário das Infraestruturas de Portugal,relatou que informou a sua chefia, IG e os colegas, de que estavam a circular AET falsas, obtidas em curto período temporal para o habitual e tendo presente os pareceres e informações necessários, existindo desconformidades de texto, assinaturas e configuração, referindo concretamente que o parecer da Ascendi junto aos autos não corresponde ao habitual, tal como o nome e assinatura da sua chefia, detendo dúvidas quanto validade documentos de fls. 61 a 63, 64, 69 a 71. LB, funcionário da BRISA, refere que o parecer e a assinatura de fls. 73 e 74 dos autos não lhe pertence, sendo que o texto e o tipo de letra não são os habituais. LT, até 2015 Diretor Regional IMT, declarou no seu depoimento que foi confrontado com AET falsas e pela polícia, na sequência do ocorrido no Porto de Setúbal, indicando que fls. 60 e 66 não é a sua assinatura e que o modelo IMT é desactualizado. Mais referiu que os desenhos anexos com os requerimentos são da responsabilidade do requerente, que assina e coloca o nome, sendo o aqui arguido conhecido por ser requerentes de tais autorizações especiais de trânsito. PF, administrador da demandante, confirmou a existência e circulação em 2015 de AET em nome da Laso, mas que foram falsificadas, constituindo um beneficio ilegítimo, causando prejuízos e má imagem da empresa, tendo colaborado com AV nesta matéria, confirmando as denúncias e as queixas juntas a estes autos, estando o arguido referenciado como concorrente e requerente de AET. AV, conhece a demandante por ser seu concorrente e líder mercado, sabendo que circularam AET falsificadas e detendo problemas com clientes por tal motivo. CP, colaborador da demandante e conhecendo pessoalmente o arguido com quem colaborou, relatou ter recebido um envelope com AET por parte do arguido, e estranhando, foi abordado posteriormente pela polícia como existindo desconformidades com tais documentos, e tentando contacto com o arguido, o mesmo não acedeu, verificando posteriormente que as mesmas AET eram falsas, confirmando a ocorrência do Porto de Setúbal e a detenção. RN, confirmou o ocorrido em Setúbal, sendo que o arguido pediu para o gerente da Rufena entregar a autorização, sendo a situação de Setúbal posterior ao evento ocorrido no Porto, ficando a demandante com problemas de imagem naquela data.
Tais depoimentos revelando-se credíveis e isentos, com conhecimento dos factos foram valorados.
Estes relatos confirmam ainda a documentação junta aos autos, a qual não foi posta em crise e se revelou crível, em especial documentos de fls. 2-10, 56 a 67 e até 77; certidão de fls. 316 ss., certidão de fls. 380 ss. e fls. 781 ss.: NUIPC 836/15.8T9MFR apenso; documentos de fls. 25-49; 91109; aditamento de fls. 111; auto de apreensão de fls. 117 e documentos de fls. 118-130; auto de apreensão de fls. 132 e documentos de fls. 133-135; auto de apreensão de fls. 140 e documento de fls. 141; auto de apreensão de fls. 142 e documentos de fls. 143-147; fls. 250 e ss ..
O relatório pericial junto aos autos foi valorado, revelando-se crível e não tendo sido questionado, tendo presente ainda o disposto no art.° 1630 nº 1 do Código do Processo Penal e de onde decorre que o arguido detinha e detém ainda capacidade de distinguir o bem e o mal.
Foi igualmente valorada a documentação apresentada com o pedido de indemnização civil a fls. 535 a 594, ainda que inconclusiva quanto às consequências.
Analisando criticamente a prova da acusação, esta revela-se concludente entre si e coerente com as regras da experiência, não se revelando crível a justificação adiantada pelo arguido, e que aliás, não foi confirmada em audiência por outra prova produzida.
Desde logo, não colhe a sua versão de que nos outros autos tomou tal posição sem estar ciente das consequências, onde confessou as falsificações, dado o elevado número de ilícitos que lhe estavam a ser imputados, sendo que tal matéria mostra-se transitada em julgado. Igualmente, a justificação e com base nas certidões acima referenciadas e referentes ao processo 3/16.3GTBJA do JC Criminal de Lisboa J18, onde lhe foram apreendidas moedas de escudo e um selo branco, de que detinha moedas antigas de escudo apenas por gosto e na sua secretária igualmente não colhe, quando conjugado com o facto de deter um mecanismo de selo branco, ambos usados na falsificação das aqui AET, correspondendo às mesmas moedas de escudo apostas em tal documento. Alegando até o arguido que tal instrumento é de fácil acesso, acabou por admitir ter tomado conhecimento que não o poderia utilizar. Desta forma, não justificou de forma credível e cabal porque manteve tais objectos e instrumentos, resultando até das regas da experiência e do senso comum que o selo branco está associado a documentos oficiais e públicos autênticos. Mais, não justificou de forma crível ou cabal como o seu nome foi referenciado no envelope e situação originada no Porto de Setúbal e nem como o seu nome e assinatura surge num modelo anexo a uma AET falsa, sendo que as testemunhas CR, RN e NP foram unânimes em indicarem que foi o arguido a remeter tais AET, enquanto que a testemunha LT foi concludente em afirmar que os anexos que acompanham os requerimentos de AET são apresentados pelo respectivo requerente.
Sendo certo que tais objectos foram apreendidos ao arguido no âmbito de outros autos, a verdade é que as certidões aqui apreciadas não foram postas em crise, fazendo fé do seu teor e aqui surgem referenciados.
A actividade profissional do arguido e os conhecimentos e experiência detida foram confirmados pelo próprio e pelas demais testemunhas, globalmente considerados os depoimentos recolhidos.
Apesar de não ter sido realizada qualquer prova pericial quanto à apreciação da falsidade dos pareceres e AET referenciados na acusação destes autos, o que muito se lamenta, a verdade é que os visados e aqui testemunhas negaram a originalidade dos documentos em causa, do texto, dos procedimentos e das assinaturas em questão, estando inclusivamente associados a outros documentos válidos e com numeração irrepetível, importando concluir pela sua falsidade.
Assim, e relativamente à AET nº CD 00131 e aos pareceres associados, quanto à sua inexactidão e falsidade, foi especialmente valorado o depoimento das testemunhas AB, JF, IG, JP, LT e PF, e os documentos de fls. 2 a 10, fls. 56 e ss., fls. 29 a 33 do apenso, bem como a certidão de fls. 316 ss. e 380 ss., o relatório pericial e fls. 250 e ss. dos autos.
No que tange às AET anual 01495, CD 00261 e anual 01878 e quanto à sua genuinidade" . ...foi especialmente ponderado o depoimento de NP, PF, AV, LT, RN e CP e os documentos de fls. 117 e ss., 138 ss., fls. 139 e ss. e 145 e ss. do apenso, por referência à situação verificada no Porto de Setúbal, conjugado com o teor das certidões de fls. 316 e 380 e ss., relatório pericial e fls. 250 ss.
o tribunal conclui que foi o arguido o autor e agente de tal adulteração e beneficiário da mesma, pelos especiais conhecimentos detidos do ramo, pelos objectos detidos na sua posse e que correspondem ao modo de adulteração em causa e pelo facto do seu nome surgir associado às aludidas AET falsas, quer subscrevendo anexos e quer remetendo documentação em causa.
Com tal conduta e conhecimentos especiais, não podia o arguido desconhecer a ilicitude e o desvalor inerente ao seu comportamento, que assumiu de forma intencional e voluntária, decorrendo tal consideração da globalidade da prova acima enunciada e da conduta então assumida pelo arguido, sendo que o arguido estava em condições de se orientar segundo o direito.
Assim sendo, conjugando a prova documental e testemunhal, e socorrendo-nos das regras da experiência e do critério do homem médio, provou-se a factualidade acusatória, não sendo crível a versão do arguido, inexistindo factos não provados neste segmento.
No que tange ao pedido de indemnização civil e sendo ponderada a documentação apresentada pela demandante a fls. 535 e ss., da mesma e só por si não decorre que todas as propostas seriam originárias de um futuro negócio, e nem tal foi confirmado pelas testemunhas, pelo que não se apurou o valor exacto dos prejuízos em causa.
Relativamente à afectação da imagem da demandante, a mesma decorreu da globalidade dos depoimentos e em especial de PF e AV..
A situação pessoal do arguido foi dada como provada, tendo presente as declarações do arguido, críveis nesta parte.
A existência de antecedentes criminais está devidamente certificada e não foi questionada. A factualidade negativa resulta da ausência de prova cabal, nos moldes acima expostos.
D)–Direito
Cumpre agora proceder ao enquadramento jurídico-penal da factualidade supra descrita.
Vem o arguido acusado prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso efectivo, de 4 (quatro) crimes de falsificação de documentos agravada (documentos autênticos), p. e p. pelo artigo 255°, aI. a), 256°, nºs 1, aI. a) e 3, do Código Penal e de 2 (dois) crimes de crimes de falsificação de documentos, p. e p. pelo artigo 256°, nºs 1, ais. a) e c) do Código Penal.
Preceitua o art.° 256.°, n.º 1, aI.) a) e c) e 3 do Código Penal que ( ... ) Quem, com intenção de causar prejuízo a outra pessoa ou ao Estado, ou de obter para si ou para outra pessoa benefício ilegítimo, ou de preparar, facilitar, executar ou encobrir outro crime: a) Fabricar ou elaborar documento falso, ou qualquer dos componentes destinados a corporiza-lo; ... c) Abusar de assinatura de outra pessoa para falsificar ou contrafazer documento, .... é punido, e se o fizer com um documento elencado no n" 3 desse mesmo artigo, o crime é agravado na sua moldura penal, neles se incluindo os documentos autênticos.
O bem jurídico protegido por este tipo de ilícito jurídico-penal é a ( ........................ ) segurança e a confiança do tráfico jurídico, especialmente do tráfico probatório ( ... ), ou seja, ( ...................... ) a verdade intrínseca do documento enquanto tal ( ... ), como esclarecem Figueiredo Dias/Costa Andrade, in O Legislador de 1982 optou pela Descriminalização do Crime Patrimonial de Simulação, Parecer, C.J. VIII, pp. 3.
O documento constitui, assim, o objecto da acção, sendo sobre ele que incidirá a conduta do agente e traduz-se numa declaração idónea a provar um facto juridicamente relevante, integrando-se neste conceito não só os documentos autênticos e autenticados, mas também quaisquer outros desde que a declaração se encontre corporizada num objecto que possa constituir meio de prova escrito, registo em disco, fita gravada -, incluindo ainda os títulos de crédito.
Desde logo importa atribuir uma conduta a um sujeito - o quem - sendo que este tipo legal de crime comporta diversas modalidades de conduta:
- fabricar documento falso;
- falsificar ou alterar documento;
- abusar de assinatura de outra pessoa para elaborar documento falso;
- fazer constar falsamente facto juridicamente relevante;
- usar documento falso;
- deter ou facultar documento falsificado.
De referir ainda que integram o tipo legal de crime a falsificação ideológica ou intelectual, na medida em que tal sucede sempre que o documento não reproduz com verdade o evento que refere (podendo ocorrer por acção, através da inserção de um declaração falsa ou, por omissão, quando não se faz a inclusão no documento de uma declaração de vontade que dele deveria constar) e, falsificação material, quando se forja total ou parcialmente o documento ou, quando se alteram os termos do documento já existente (como exemplo a alteração de documentos ou a falsificação da assinatura em nome de quem o documento se diz elaborado).
Importa também referir que o crime de falsificação de documento é um crime de perigo, uma vez que, após a falsificação, ainda não existe uma violação do bem jurídico em concreto, mas apenas um perigo de violação do mesmo. É assim um crime de perigo abstracto, bastando para que o tipo legal esteja preenchido, que se conclua, a nível abstracto, que a falsificação daquele documento é uma conduta passível de lesão do bem jurídico protegido.
Aliás, como refere expressamente Helena Moniz, in O Crime de Falsificação de Documentos, p. 36, citada por Leal- Henriques e Simas Santos, Código Penal Anotado, 3.a edição, pp. 1097 e ss. ( ... ) basta a consumação formal para que a actividade seja penalizada. Todavia, a consumação material verificar-se-á logo que o agente utiliza o documento falsificado e o coloca no tráfego jurídico ( ... ).
No que diz respeito ao tipo subjectivo, importa referir que, além do dolo genérico relativo aos elementos normativos do tipo, o crime de falsificação de documento exige ainda um dolo específico, uma vez que o agente necessita de actuar com ( ... ) intenção de causar prejuízo a outra pessoa ou ao Estado, ou de obter para si ou para outra pessoa benefício ilegítimo ( ... ).
Constitui benefício ilegítimo toda a vantagem patrimonial ou não patrimonial que se obtenha através do acto de falsificação ou do acto de utilização do documento falsificado.
Da prova produzida em audiência é possível desde já constatar que o arguido cometeu estes ilícitos, uma vez que se mostram verificados todos os elementos do seu tipo objectivo e subjectivo, mesmo na vertente agravada.
Na verdade, foi possível apurar que o arguido forjou documentos autênticos (AET), bem como outros documentos oficiais (pareceres), alterando os dados, abusando de assinaturas, bem como que utilizou e entregou tais documentos a clientes, que os utilizaram, tendo em vista obter um benefício económico, patente no valor do serviço prestado, visando obter vantagens patrimoniais, sem as limitações dos prazos e formalidades legais inerentes, sabendo que não tinha autorização para tal e que causava prejuízos a terceiro e ao Estado.
O que fez para quatro documentos autênticos- AET - e em dois pareceres, tendo presente o disposto nos artºs 3620 e 3630 do Código Civil.
Mais se provou que actuou intencionalmente, e deliberadamente com tal propósito, que concretizou e em benefício próprio, porquanto e não obstante a alegação da defesa, é manifesto que falsificou dados e documentos, entregando documentos falsos e não válidos. Provou-se ainda que o arguido tinha consciência que a sua conduta era proibida e punida por lei, e que não obstante quis praticá-Ia, o que conseguiu, situação que não podia ignorar até pela sua competência profissional na área.
Tratando-se de diversas ocasiões, com diferentes interlocutores, não se apurando um quadro de especial vulnerabilidade económica do arguido ou uma atenuação especial da sua culpa, consideramos que estamos perante uma situação de concurso efectivo, nos moldes plasmados no art.° 300 n01 do C. Penal.
Inexistem quaisquer causas de exclusão da ilicitude ou da culpa, verificando-se todas as condições de punibilidade. Nestes termos, tendo-se provado todos os elementos do tipo objectivo e subjectivo dos ilícitos em causa, mesmo na vertente agravada, deverá o mesmo arguido ser condenado pelo seu cometimento.
E)–Escolha e determinação da medida da pena
Assente que está que o arguido praticou os crimes de que vinha acusado, há que proceder à escolha e determinação da medida da pena que, em concreto, lhe deve ser aplicada. O crime de falsificação de documento agravado é punido com pena de prisão de 6 meses a 5 anos ou multa de 60 a 600 dias e o crime de falsificação simples é punido com pena de prisão de 1 mês a 3 anos ou multa de 10 a 360 dias - cfr.arts.ºs 41°, nº1, 47°, nº1, 256°, nºs 1 e 3 todos do Código Penal -, estando o tribunal limitado pelo recurso ao disposto no art.° 16° nº 3 do Código do Processo Penal, em cúmulo e ao máximo de 5 anos de prisão.
O art.° 40.° do Código Penal dispõe que a aplicação de uma pena visa a protecção de bens jurídicos, no sentido de tutela da crença e confiança da comunidade na sua ordem jurídico-penal e a reintegração do agente na sociedade, não podendo a pena ultrapassar a medida da culpa.
Segundo o disposto no artº 71.° do Código Penal, a determinação da medida concreta da pena deverá, por seu turno, ser feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo o tribunal, no caso concreto, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele.
Há assim que considerar no caso concreto:
o grau de ilicitude do facto, que se considera médio/alto, atento o modo como os factos foram cometidos, reiteração, o grau de confiança posto em crise, os valores em causa e os prejuízos ocasionados;
a intensidade do dolo que se considera elevada, já que o arguido actuou sempre com dolo directo em todas as situações;
a postura do arguido em audiência, não colaborando e não denotando ter interiorizado o desvalor da sua conduta;
o facto de o arguido estar integrado na comunidade, beneficiando de apoio familiar; a situação de doença de que padece;
o facto de não ser primário, detendo uma condenação anterior e por ilícitos similares, praticados concomitantemente.
No que diz respeito às necessidades de prevenção geral, considero que as mesmas são elevadas, atento o alarme social ocasionado e a respectiva danosidade social (estando as mesmas igualmente previstas na moldura penal abstracta)
Quanto às necessidades de prevenção especial, deve a pena levar o arguido a interiorizar a ilicitude da sua conduta, para no futuro alterar o seu comportamento, atingindo-se desse modo a desejada socialização, sendo as mesmas médias/altas.
Assim, a favor do arguido militam o facto de estar integrado, beneficiando de apoio familiar, a doença incapacitante de que padece e a idade avançada.
Contra o mesmo, constata-se a média/alta ilicitude dos factos e o forte dolo revelado, bem como as fortes exigências de prevenção geral e especial.
Dispõe o art.° 70.° do Código Penal que (. . .) se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribuna! dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição ( ... ).
Por tudo o que acima foi visto e considerado, atendendo às fortes necessidades de prevenção geral e especial que cabem ao caso e que acima ficaram expendidas, e bem assim, ponderando todos ao factores agravantes e atenuantes, bem como a postura do arguido, a reiteração de comportamentos e os prejuízos ocasionados, entendemos ser de aplicar ao arguido e para todas as situações, de uma pena de prisão, por ser a única adequada a realizar de forma adequada, cabal e suficiente as finalidades da punição, satisfazendo plenamente os fins de prevenção geral e especial que se pretendem alcançar com a aplicação de uma sanção penal, mantendo intactas as expectativas da comunidade na validade das normas jurídicas violadas, visando o arguido conformar o seu comportamento com as normas do direito e visando a sua ressocialização, bem como interiorizar a gravidade da sua conduta.
Por tudo o que acima foi visto e considerado, atendendo às necessidades de prevenção geral e especial que cabem ao caso e que acima ficaram expendidas, e bem assim, ponderando todos ao factores agravantes e atenuantes, entendemos ser de aplicar ao arguido pelos dois crimes de falsificação de documentos uma pena de 6 (seis) meses de prisão para cada um, e pelos quatro crimes de falsificação de documento agravado, uma pena de 1 (um) ano de prisão para cada um destes ilícitos, respectivamente, por as mesmas realizarem de forma adequada, cabal e suficiente as finalidades da punição, satisfazendo plenamente os fins de prevenção geral e especial que se pretendem alcançar com a aplicação de uma sanção penal, mantendo intactas as expectativas da comunidade na validade das normas jurídicas violadas.
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Dado que nos presentes autos ocorre uma situação de concurso real de infracções (cfr. art.° 30.°, n.º 1 do Código Penal), há deste modo que realizar o cúmulo entre as penas parcelares aplicadas.
Nos termos do art.° 77.° do Código Penal, a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, (não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e os 900 dias se for pena de multa) e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.
Assim sendo, e no que concerne às penas de prisão aplicadas, por revelarem idêntica natureza, fixa-se o limite máximo da pena em 5 (cinco) anos e o mínimo em 1 (um) ano de prisão, tendo presente ainda a limitação definida pelo recurso ao disposto no art.° 16° nº3 do Código do Processo Penal.
A pena do concurso é determinada, dentro da moldura referida, atendendo, em conjunto, aos factos e à personalidade do arguido.
Tudo ponderado, nos termos em que nos reportamos supra, designadamente todos os factores atenuantes e agravantes, decide-se aplicar em cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas, a pena única de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão para o arguido.
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Uma vez que no caso em apreço foi aplicada uma pena de 2 anos e 6 meses de prisão para o arguido AA, há que averiguar se se verificam os pressupostos da suspensão da execução da pena, cujos requisitos constam do art.° 50.° do Código Penal.
Tal dispositivo prescreve no seu n.º 1 que (. . .) O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às suas condições de vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição ( ... ), sendo que de acordo com o n.? 2 e 3 do mesmo preceito, o tribunal pode ainda subordinar tal suspensão ao cumprimento de deveres elou regras de conduta, cumulativamente.
A política criminal subjacente a tal normativo legal tem como propósito finalístico o afastamento do delinquente da prática futura de novos delitos (v. Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, 1993, p. 343), traduzindo uma ideia de ressocialização e prevenção da reincidência.
Leal-Henriques e Simas Santos, in Código Penal Anotado, 3a edição, 1° vol., Rei dos Livros, pp. 637 e ss., referem que ( ... ) na base da decisão de suspensão da execução da pena deverá estar uma prognose social favorável ao arguido, ou seja, uma esperança de que o réu sentirá a sua condenação como uma advertência e que não cometerá no futuro nenhum crime. ( ... ) Devem ser valoradas todas as circunstâncias que tornam possível uma conclusão sobre a conduta futura do arguido, atendendo somente às razões da prevenção especial ( ... ).
De harmonia com o preceituado no normativo legal acima aludido, atendendo ao modo como os factos foram praticados, a sua motivação e as suas consequências, bem como considerando as condições pessoais do arguido, beneficiando de apoio familiar e a sua avançada idade e estado de saúde, dando-se assim primazia à prevenção especial na sua vertente positiva, tendo em vista revitalizar a conduta do arguido de acordo com o direito, não se justificando por ora, a prisão para prevenir o cometimento de novos crimes, decido suspender a referida pena de prisão, pelo mesmo período de dois anos e seis meses, nos termos do art.° 50.°, n.ºs 1 e 5 do Código Penal.
Assim, dada a personalidade do arguido e as suas condições pessoais, visando conferir ao arguido a derradeira oportunidade de conformar o seu comportamento com o direito e interiorizar o desvalor da sua conduta, de acordo com o disposto nos Artsºs 51° a 52.° do Código Penal entendemos pertinente que a suspensão da execução da pena seja condicionada ao pagamento de parte da quantia em que infra será condenado e junto da demandante, no valor de €2.000,00 (dois mil euros).
Tendo em consideração a concreta pena aplicada ao arguido, o grau de ilicitude dos factos apurados e a culpa do arguido, bem como os seus antecedentes criminais, entende-se não ser de substituir a pena aplicada por outra prevista no Código Penal e nem tal foi requerido, por se considerar que tal não favorecerá a sua reinserção social.
Em especial e no caso concreto importa ponderar a alteração legislativa introduzida pela Lei nº 94/2017 de 23-8. E neste ponto, considerando os crimes concretamente praticados e a pena concretamente aplicada ao arguido, tendo em conta o regime vigente à data da prática dos factos, consideramos que in casu não se mostra concretamente mais favorável a aplicação do regime actual, atento o disposto no art.° 2°, nº4 do Código Penal
*
O criminalmente condenado deve ainda suportar o pagamento das custas do processo na parte respectiva, fixando-se -se a taxa de justiça em 4 U.C. (cfr. artºs 513.° e 514.°, todos do Código de Processo Penal e rt.° 8.°, nº 5 do Regulamento das Custas Processuais), sem prejuízo de eventuais isenções de que possa beneficiar.
F)–Da responsabilidade Civil
Por sua vez a demandante civil deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido e demandado, peticionando a sua condenação no valor de € 25.000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescidos de juros de mora à taxa legal em vigor desde notificação e até integral pagamento e demais despesas.
Cumpre referir desde logo que tal pedido é baseado na situação prevista pelo legislador nos termos constantes dos artsºs 71.° e 77.°, nºs 4 e ss. do Código de Processo Penal e 129.° do Código Penal, na modalidade da responsabilidade civil por facto ilícito, a que aludem os arts. 483.° e ss. do Código Civil.
Dispõe o art.° 483.°, n.º 1 do Código Civil que ( ... ) Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação (. .. ).
Da análise deste preceito decorre que a obrigação de indemnização pressupõe a verificação cumulativa, no caso concreto dos seguintes pressupostos: a)- Facto voluntário ilícito, isto é lesivo de bens jurídicos pessoais ou patrimoniais; b) - Nexo de imputação subjectiva, ou seja a imputação do facto ao lesante, a culpa; c)- A existência de um dano, prejuízo; d)- Nexo de causalidade adequado entre o facto e o dano, isto é, a imputação objectiva do dano ao facto de que emerge.
Da factualidade provada e do conteúdo da responsabilidade criminal imputada ao arguido e demandado verifica-se estarem preenchidos os referidos pressupostos, uma vez que o ilícito factual em matéria penal envolve necessariamente a ilicitude civil. Apurando-se que tal arguido actuou dolosamente, causando prejuízos à demandante, constituiu-se o mesmo na obrigação de indemnizar a demandante.
Apurada a responsabilidade do arguido/demandado, compete agora extrair a correspectiva consequência legal, isto é, apurar os danos resultantes da violação e determinar a medida da correspondente obrigação de indemnização.
Na obrigação de indemnização tanto são atendíveis os danos susceptíveis de expressão pecuniária (danos patrimoniais), como aqueles que não o sendo mereçam, pela sua gravidade, a tutela do direito (danos não patrimoniais), como estabelece o art.° 496.° do Código Civil.
Porém, a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão, nos termos do art.° 563.° do mesmo Código, que consagra, embora de forma implícita, a teoria da causalidade adequada. Neste sentido, só são de indemnizar os danos que constituem efeito natural, necessário e consequência normal da lesão, aferidos dentro das regras da experiência comum. ln casu, estão em causa danos não patrimoniais da demandante, assentes na sua reputação e prestígio, que merecem provimento, apresentando relevância a disposição ínsita no art.° 496.°, n.01 do Código Civil que determina ( ... ) Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (...).Estabelece, ainda, o n.? 3 do mesmo artigo que ( ... ) O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494. ° ( ... ).
Na fixação do quantum indemnizatório, haverá que levar-se em consideração o grau de culpabilidade do responsável, a sua situação económica e a da demandante, a gravidade do dano tendo em conta as consequências, bem como o sofrimento (cfr. art.° 494.° do Código Civil ex vi do Art.° 496.°, nº 3, do mesmo diploma legal) - factores estes que devem ser apreciados sob o critério objectivo da equidade, devendo ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, in Código Civil Anotado, vol. I, Coimbra Editora, 1987, 4a edição, p. 499 e ss.).
A reparação dos danos não patrimoniais justifica-se assim por uma ideia de compensação do lesado e por uma ideia sancionatória da conduta do lesante.
No entanto, nem todos os danos não patrimoniais são indemnizáveis, mas apenas aqueles que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito, gravidade esta que há-de medir-se por um padrão objectivo e não por factores meramente subjectivos, devendo ponderar-se a sua duração e intensidade. O dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado.
No caso em apreço, e no que diz respeito a tais danos, resultou provado nos autos, que em consequência da conduta do arguido, a imagem da demandante ficou prejudicada, afectando o seu bom nome e reputação, decorrente da actuação do arguido, tendo a demandante cumprido o seu ónus probatório nesta parte.
Ora, tais factos são danos causados de forma directa e imediata da prática dos factos e possuindo gravidade suficiente para serem merecedores da tutela do direito.
Aliás, tal vem sendo o entendimento da jurisprudência - v. Acs. TRL datados de 3-11-2009 e 16-3-2010 in www.dgsi.pt. ao consagrar-se no último que "A mera lesão do bom nome e reputação das sociedades comerciais é susceptível de fundamentar uma indemnização por danos não patrimoniais ... "
Assim, dado que os danos em causa possuem gravidade suficiente para serem merecedores da tutela do direito, e tendo em conta que o arguido/demandado agiu dolosamente, a sua situação económico-financeira, à luz dos parâmetros supra descritos e de um juízo de equidade e de razoabilidade que se impõe, afigura-se ser de atribuir à demandante a fixação de uma indemnização no montante de € 4.000,00 (quatro mil euros), a título de danos não patrimoniais, por se considerar que a mesma é suficiente e adequada para lhe proporcionar satisfação, contrabalançado, dessa forma, a parcela de qualidade que foi afectada à demandante (artsºs 496.°, n.º 1, e 566.°, n.º 2, do Código Civil), pecando o peticionado por excesso, atento o quadro factual apurado, os concretos danos apurados nesta parte e a disparidade de situação financeira entre demandante e demandado, estando o último com parcos recursos financeiros. Assim, a presente indemnização vencerá ainda juros moratórias, à taxa supletiva legal civil, contados a partir da data da notificação para contestar e os entretanto vencidos e vincendos e até integral pagamento.
E nesta parte, quanto ao pedido formulado pela demandante, ficando parcialmente vencidos demandante e demandado civil, são os mesmos responsáveis pelo pagamento das custas cíveis, na proporção do respectivo decaimento, que se fixa em 4/5 para a demandante e 1/5 para o demandado, tendo-se em consideração o valor do pedido e sem prejuízo de eventuais isenções de que possam beneficiar (cfr. art.° 527.°, n.os 1 e 2, do Código de Processo Civil ex vi do art.° 523.° do Código de Processo Penal).
III–DISPOSITIVO:
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições legais citadas, julgo procedente, por provada, a acusação pública deduzida nos presentes autos e, consequentemente decido:
I–Parte Criminal a)-CONDENAR o arguido, AA, pela prática em autoria material, na forma consumada e em concurso efectivo, de quatro (4) crimes de falsificação de documento autêntico, previstos e punidos pelos artºs 255° aI. a), 256°, nºs1 aI. a) e 3, do Código Penal, na pena respectiva e para cada um de 1 (um) ano de prisão: b)-CONDENAR o arguido, AA, pela prática em autoria material, na forma consumada e em concurso efectivo, de dois (2) crimes de falsificação de documento, previstos e punidos pelos artsº 255° aI. a), 256°, nº1 als. a) e c), do Código Penal, na pena respectiva e para cada um de 6 (seis) meses de prisão: c)-Em cúmulo jurídico das penas parcelares acima aludidas, nos termos do art.º 77° do Código Penal, condenar o arguido na pena global e única de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução e por igual período, de acordo com o art.° 50.°, n´ºs 1 e 5 do mesmo Código Penal, .na condição de durante esse período comprovar nos autos o pagamento da quantia de pelo menos €2.000,OO (dois mil euros) junto da demandante (com referência à indemnização em que infra será igualmente condenado)",nos termos dos art.sº 51° a 52° do Código Penal; d)-Condenar ainda o arguido no pagamento das custas do processo, com 4 U.C. de taxa de justiça, (cfr. artºs. 513.° e 514.°, todos do Código de Processo Penal e art.° 8 ° do Regulamento das Custas Processuais), sem prejuízo de eventuais isenções de que possa beneficiar.
" - Parte Civil, e)-Julgar parcialmente procedente, por provado, o pedido de indemnização civil formulado pela demandante civil contra o arguido e demandado,e consequentemente decido condenar o demandado a pagar à demandante os danos não patrimoniais sofridos, no montante de €4.000,00 (quatro mil euros) e absolvendo-o do demais peticionado; f)-As custas cíveis nesta parte são a cargo da demandante e do demandado, na proporção do decaimento 4/5 para a demandante e 1/5 para o demandado, tendo em consideração o valor do pedido, fixando-se o mesmo no montante peticionado, e sem prejuízo de eventuais isenções de que possam beneficiar - cfr. art.°527.0, n.o1 e n.o2, do Código de Processo Civil e art.°523º, do Código de Processo Penal.
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Notifique, comunique e d.n. Dê baixa.
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Após trânsito, remeta boletim para efeitos de registo criminal.
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Oportunamente, solicite CRC actualizado do arguido e abra vista e conclusão para ponderar a realização de eventual cumulo jurídico de penas.
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Deposite.
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* Lisboa, 07-07-2020.
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Vejamos, então:
Desde já cumpre deixar bem claro que a rejeição do recurso por não cumprimento do ónus previsto nos nºs 2 e 3 do artº 412º do CPP implica sempre que o Tribunal “ad quem” analise o texto da decisão recorrida a fim de concluir pela inexistência de vícios de conhecimento oficioso.
A existirem vícios de conhecimento oficioso, a rejeição do recurso não pode proceder, apesar do não cumprimento do referido ónus.
No caso vertente, não é, como se explicará, caso de rejeição do recurso.
Explicando:
No ponto nº 1 da matéria dada como assente diz-se
…” em data não concretamente apurada, mas reportada aos idos de 2013, o arguido ….
Ponto nº 2 …. Concebeu um plano que consistia em oferecer os seus serviços a essas empresas, propondo-lhes diligenciar pela obtenção de AET (autorizações especiais de transporte), mediante contrapartida económica.
Em E) - Escolha e determinação da medida concreta da pena
Pode ler-se que o Tribunal “a quo” considerou no último item que
…- o facto de não ser primário, detendo uma condenação anterior por ilícitos praticados concomitantemente.
Para concluir pela reiteração de comportamentos.
Analisada a decisão proferida no procº NUIPC 836/15.8T9MFR referido a fls 7 da decisão recorrida, conclui-se que nela o Tribunal deu como provado
- conhecedor das dificuldades de obtenção de Autorizações Especiais de Transporte por parte de empresas de transporte espanholas, o arguido AA concebeu um plano que consistia em oferecer os seus serviços a essas empresas, propondo-se diligenciar pela sua obtenção, mediante contrapartida económica.
As datas dadas como assentes nesta última decisão são 28.12.2015, 7.01.2016, 28.01.2016, 10.03.2016, .
Ou seja, o plano concebido foi um, sendo que os factos constantes da decisão ora sob recurso, e da decisão constante do processo consultado, conforme referido expressamente, estão numa relação de concurso conforme previsto no artº 78º do Código Penal.
Como pode ler-se na anotação 5 ao artº 78º do Código Penal da autoria Exmo Conselheiro Sá Pereira e Dr. Lafayette, … “tais casos não são raros, têm origem, com frequência, em intencionado abandono das regras próprias do concurso de crimes quando se trata de correlativa conexão (vg. por a ela se fazer ou ter feito vista grossa) o que leva a indevida pluralidade de processos contra o mesmo arguido…”
No caso vertente, pode até considerar-se que o Tribunal “a quo”, em ambos os casos, deveria ter ponderado se estava perante a situação prevista no artº 30º, nº 2 do Código Penal.
Como pode ler-se no ac STJ de 25 de Junho de 1986, BMJ 358º, pág 267
…”
I– a realização plúrima do mesmo tipo de crime pode constituir a) um só crime, se ao longo de toda a realização tiver persistido o dolo ou resolução inicial; b) um só crime na forma continuada, se toda a execução não obedecer ao mesmo dolo, mas este estiver interligado por factores externos que arrastam o agente para a reiteração de condutas e c) um concurso de infracções, se não se verificar qualquer dos casos anteriores.
E diz o ac STJ de 15 de Maio de 1991, CJ, XVI, tomo 3, 16
…” haverá unidade de resolução quando se puder concluir que os vários actos são o resultado de um só processo de deliberação, sem serem determinados por nova motivação.
Analisando os factos e as datas de ambas as decisões, conclui-se que o arguido recorrente, tal como ficou descrito em ambas, concebeu um plano e que as condutas que foi praticando estavam interligadas pelo factor externo de haver dificuldade na obtenção das AET por parte das empresas espanholas.
Independentemente da conclusão a que se chegue, certo é que a condenação anterior por factos posteriores deveria antes ter sido considerada ao abrigo do disposto no artº 78º do Código Penal, e não ao abrigo do disposto no artº 71º do mesmo diploma legal.- ponto 34 da decisão.
Como pode ler-se na anotação 9 ao artigo 78º do CP anotado da autoria Exmo Conselheiro Sá Pereira, Alexandre Lafayette,…o que interessa é que todos, definitivamente julgados, sejam anteriores à mencionada condenação posterior…” o que é expressamente referido na decisão recorrida.
Aqui chegados, cumpre extrair conclusões:
A decisão recorrida enferma de erro notório na apreciação da prova porquanto sendo este o processo em que deveria ter sido reunida a investigação a todos os ilícitos, por a data inicial ter sido fixada em 2013, o Tribunal “a quo” se socorreu de prova recolhida em outro processo, por factos praticados posteriormente, que integram o mesmo crime, para suprir a deficiência de prova existente nos autos.
Mas não só.
Efectuada a consulta, e usados os documentos produzidos naquele processo, que nem sequer podiam constituir princípio de prova, se se tiver em consideração que a resolução foi fixada como tendo ocorrido em 2013, concluiu pela imputação ao recorrente da prática do referido ilícito com violação do princípio do “in dúbio pro reo” na valoração da prova efectivamente produzida nestes autos, que enfermam de falta de prova pericial no que à letra e assinatura do arguido naqueles documentos concerne.
E embora decorra do cotejo das duas decisões que as mesmas tratam de uma situação de conhecimento superveniente de concurso (pelo menos), a decisão recorrida, ao invés, trata a condenação por factos posteriores como um antecedente criminal, a considerar na escolha e determinação da medida concreta da pena.
Do mesmo modo, o único “facto” (conclusão) concreto que fundamenta o pedido cível é o constante do ponto 25, mas não se sabe concretamente quais os prejuízos que a demandante sofreu – ponto 26.
Faltam os factos que serviram de suporte à conclusão, embora os mesmos estejam depois, enunciados, sumariamente, na fundamentação da convicção.
Logo, o demandante cível deveria ter visto o pedido cível julgado improcedente, por não provado.
O recurso interposto pelo arguido procederá, pois, uma vez que a decisão recorrida, reportando-se ao início dos factos que decorreram do plano elaborado em 2013, usou para fundamentar a condenação, a prova pericial produzida em outro processo, em que foram investigados factos posteriores, enferma de vício de conhecimento oficioso de erro notório na apreciação da prova.
E a restante prova produzida assenta nas declarações dos que não reconhecem como sua a assinatura aposta no documento, nos que receberam o documento do arguido (o que não permite concluir, só por si, que a autoria da falsificação é sua) e dos que sabiam que era o arguido que tratava desses assuntos.
Assim analisada a prova, não é possível afastar a dúvida, e não sendo possível afastar a dúvida, não é possível manter a condenação do mesmo arguido com base na suposição de que muito provavelmente foi ele.
Decisão:
Termos em que acordam, após vistos e conferência, em julgar procedente o recurso interposto por AA, em revogar a decisão recorrida e em ABSOLVER, por aplicação do princípio do “in dúbio pro reo” o arguido quer da acusação, quer do pedido cível formulado pela demandante, este por falta de factos provados.
É devida taxa de justiça que se fixa pelo mínimo, sendo as custas do pedido cível a cargo da demandante.
Registe e notifique, nos termos legais.
Lisboa, 26 de Junho 2021
Margarida Vieira de Almeida- (relatora) Maria da Luz Neto da Silva Baptista- (adjunta)