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REPÚDIO DA HERANÇA
DIREITO DE REPRESENTAÇÃO
DIVISÃO POR ESTIRPE
Sumário
Os descendentes de irmãos são sempre chamados por direito de representação e nunca por direito próprio - o que sucede no caso dos autos em que os vários herdeiros eram todos eles sobrinhos da inventariada; caberá a cada estirpe aquilo em que sucederia o ascendente respectivo, subdividindo-se então pelos respectivos elementos.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Texto Integral
Acordam na Secção Cível (2ª Secção) do Tribunal da Relação de Lisboa:
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I–Procede-se a processo de inventário por óbito de Helena…, sendo cabeça de casal Aires… e figurando como interessados, para além deste, que é casado com Laurinda…, Amílcar…, casado com Etelina…, Maria Alice…, casada com Manuel…, Olinda…, Maria de Lourdes…, casada com Manuel G…, Luís F… casado com Maria Paula…, Carlos M…. casado com Maria Helena…, Firmino…, casado com Maria de Fátima…, Firmina M…., casada com Jorge M… e Maria Teresa … casada com José Ro ….
No decurso do processo os interessados Luís F… e Carlos M…, bem como o único descendente deste, David…, repudiaram a herança da falecida Helena….
Por outro lado, tendo falecido Maria Teresa…, foram habilitados como seus sucessores José Ro… e Ana José …
Em 2-7-2018 foi proferido despacho determinativo do modo como deve ser organizada a partilha, nele se consignando:
«(…) O presente inventário foi instaurado em 20-VII-09 para partilha da herança aberta por óbito de Helena…, ocorrido em 18 de Junho de 2009 (fls 6 e 148).
Faleceu viúva (desde 14-XII-08 – fls 76), sem ascendentes ou descendentes, não deixou testamento (fls 81) – e são seus herdeiros os sobrinhos:
- Amílcar… (primitivo cabeça-de-casal; casado na comunhão geral em 10-I-1970 com Etelina… – fls 143 a 145);
- Aires… (actual cabeça-de-casal; casado na comunhão geral em 27- VIII-67 com Laurinda… – fls 136 a 139);
- Maria Alice… (casada na comunhão de adquiridos com Manuel … – fls 124 a 129);
- Olinda… (divorciada – fls 130 a 135);
- Maria de Lourdes… (casada na comunhão geral em 15-IV-72 com Manuel G… – fls 140 a 142);
- Luís F… (casado na comunhão de adquiridos com Maria Paula… – fls 146-147);
- Carlos Manuel… (casado na separação de bens com Maria Helena… – fls 114 a 117);
- Firmino… (casado na comunhão geral em 23-VIII-75 com Maria de Fátima… – fls 118-119);
- Firmina M…(casada na comunhão de adquiridos com Jorge M…; e
- Maria Tereza… (casada na comunhão de adquiridos com José Ro… – fls 121 a 123).
Os interessados Luís F… (sem descendentes) e Carlos M… (e seu único descendente, David…) repudiaram a herança, por escrituras públicas de 28-VI-16 e 9-IV-15, respectivamente (fls 305-306 e 297-298).
Maria Teresa… faleceu em 7-III-17 – tendo sido julgados habilitados, como seus sucessores, José Ro… e Ana José … (fls 370).
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São bens da herança os relacionados a fls 227 a 231 (com as alterações determinadas pelos despachos de fls 320-321 e 381).
Deverá proceder-se à partilha da seguinte forma:
Subtrai-se ao valor total dos bens o valor do passivo, e divide-se o total em oito partes iguais – cabendo uma a cada herdeiro (CC 2133º, e 2148º), e cabendo o quinhão de Maria Teresa… e aos respectivos herdeiros».
Foi elaborado mapa informativo da partilha e notificado este aos interessados, vindo o cabeça de casal suscitar que, decerto por lapso manifesto, o Mº Juiz produziu o seu despacho determinativo da partilha, «sem entrar na devida conta com o disposto no citado artigo 2145º do C.C.», tendo em consideração que os «falecidos irmãos da Inventariada eram três, será em três partes que se divide o todo, sendo de dividir o terço de cada um dos pré-falecidos, em partes iguais por cada um dos filhos, que respectivamente a estes sucederam».
Sobre tal, em 4-12-2018 foi proferido despacho, especificando: «… Sendo todos os irmãos “pré-falecidos” à inventariada, não podiam ser chamados à sucessão – pelo que foram chamados, por vocação própria (CC 2133º/1d)), os sobrinhos (CC 2147º).
Considerou-se que o direito de representação não pode/deve ser aplicado quando não existe uma “posição a ocupar”: não podendo nenhum dos irmãos aceitar a herança, não é necessário chamar um, ou vários sobrinhos a ocupar as suas posições (abstractas) – só fazendo sentido chamar representantes de pré-falecido quando concorram com outros herdeiros, para que estes não beneficiem com o acréscimo do quinhão do pré-falecido».
Foi elaborado mapa informativo rectificado (fls. 423-436) de que foram notificados os interessados.
Foi designada data para a realização de conferência com todos os interessados «com vista ao saneamento e finalização do presente processo» e que veio a realizar-se em 2-12-2020.
Na sequência foi elaborado o mapa da partilha constante de fls. 443-450.
Após, foi proferida sentença homologatória da partilha.
Apelaram o cabeça de casal Aires… e os interessados Maria Alice…, Olinda…, Firmino…, Firmina M…, José Ro… e Ana José…, bem como os respectivos cônjuges, concluindo nos seguintes termos a sua alegação de recurso: 1ª-O despacho determinativo da forma à partilha, tanto o primeiro como o que se contem na parte final da Acta de Conferência de Interessados de 02/12/2020, bem como o primeiro Mapa Informativo da Partilha, o despacho referenciado pelo nº 116348887 de 04/12/2018, o novo Mapa da Partilha referenciado pelo nº 128086574, bem como a sentença homologatória da mesma materializam actos nulos; momentos processuais viciados e inquinados; 2ª -O presente recurso é admissível, atento o valor processual de €266.817,39, conforme resulta do Mapa da Partilha (em recurso) com a Refª: 128086574 de 02/12/2020, tratando-se de matéria de conhecimento oficioso, seguindo-se de perto o decidido no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 03/11/2015, cujo sumário se transcreve:
“I–O inventário tem vários valores, sendo de considerar tal processo como um processo em que a utilidade económica do pedido só se define na sequência da acção, aplicando-se, pois, o estatuído no artº 308º, nº 3 do CPC (ou 299º, nº 4 do nCPC). II–Nos inventários o valor inicialmente aceite (provisório) será corrigido logo que o processo forneça os elementos necessários, sem necessidade de ser proferido qualquer despacho para corrigir tal valor. III–O valor do inventário, estando apresentadas as relações de bens, será o expresso pelos documentos que as acompanharem e pela indicação que compete fazer ao cabeça de casal (…)”; 3ª- O presente recurso de Apelação tem por objecto a sentença de fls. dos autos que homologou o novo Mapa da Partilha referenciado pelo nº 128086574, de fls. e que, consequentemente, adjudicou a cada um dos interessados os bens que lhes ficaram a caber em preenchimento dos respectivos quinhões hereditários, de 1/8 a cada um, por cabeça, bem como do despacho referenciado pelo nº 128068306, incluindo o despacho interlocutório nº 11648887 de 04/12/2018 e o Mapa Informativo nº 117355851 de 24/01/2019 e despacho determinativo que o antecedeu. 4ª-A partilha objecto dos presentes autos e a sentença que a homologou estão viciadas e inquinadas porque o despacho determinativo da partilha não observou, entre outros, o disposto na lei – artigos 2133, nº 1 – al. c) e 2145º, ambos do Código Civil; 1373º e 1374º, entre outros, do Código de Processo Civil – lei aplicável, distribuindo a herança por cabeça, em vez de dar observância ao direito de representação dos sucessores da inventariada, nulidade que se invoca e que influiu decisivamente na justeza da partilha, ficando inclusive um dos recorrentes, a quem por lei e no caso cabe um terço do valor dos bens, apenas com 1/8 (o Firmino); 5ª-Na oportunidade o cabeça-de-casal deu, a fls. destes autos para onde se remete, a “Forma à Partilha” com respeito pelo direito de representação sucessória dos sobrinhos/herdeiros, observando escrupulosamente o que a lei a respeito prescreve, aplicando o disposto nos artigos 2133º, nº 1 – c) e 2145º do Código Civil; 6ª-Após notificado do despacho determinativo da partilha a que fora, erradamente aplicado o al. d) daquele artigo 2133º, nº1 e art. 2147º, do referido Código, reagiu invocando a nulidade do mesmo, o que foi objecto do despacho identificado pelo nº de Refª: 116348887, de 04/12/2018 – conforme fls. dos presentes autos, para onde, com a devida vénia, se remete, de que agora se recorre atento o disposto no artigo 1396º, nº 2, com a redacção do DL. 303/07, 24/08, impugnando tal decisão nos legais termos e efeitos, por violação manifesta da lei aplicável; 7ª- O Tribunal a quo errou quando, em vez de dar expressão no despacho determinativo da partilha à forma à partilha apresentada pelo C.C., assim não procedeu; 8ª-Em vez de determinar que à partilha se procedesse de acordo com o direito de representação, fê-lo por cabeça, tratando sobrinhos/ herdeiros como colaterais, o que manifestamente não tem tal enquadramento legal; 9ª-Erro que inquinou tanto o Mapa Informativo da Partilha que veio a ser elaborado, prejudicando de modo determinante o acerto desta partilha e os interesses dos Recorrentes, tendo tal erro sido mantido no novo Mapa da Partilha referenciado pelo nº 128086574 de 02/12/2020, bem como o despacho determinativo da Partilha que este antecede, repetindo os vícios/erros anteriores; 10ª-No dia 14/12/2008 faleceu Domingos …, no estado de casado, segundo o regime da comunhão de adquiridos, com Helena …, sem ter feito qualquer disposição de última vontade, sem filhos nem pais vivos, pelo que foi a sua viúva a sua herdeira universal, a qual viera a falecer, igualmente intestada e ainda no estado de viúva daquele, sem quaisquer filhos, nem pais vivos, correndo termos este Inventário por morte desta, sendo seus herdeiros seus sobrinhos, respectivos filhos dos seus pré-falecidos três únicos irmãos, A) – Manuel… e mulher; B) – Maria … e marido; e C) – Arminda … e marido, a saber:
Filhos dos pré-falecidos Manuel… e mulher, Emília …:
– Firmina …e marido, Jorge M…;
– Maria Teresa…, casada com José Ro…, a qual faleceu na pendência destes autos, tendo-lhe sucedido o seu viúvo e a filha única de ambos, Ana José …
Filhos dos pré-falecidos Maria… e marido Manuel…:
–Aires… e mulher, Laurinda…;
–Amílcar…, casado com Etelina…;
–Maria Alice…, casada com Manuel…;
–Olinda…, divorciada;
–Maria de Lurdes…, casada com Manuel…;
Filhos dos pré-falecidos Arminda… e marido Manuel Duarte…:
–Firmino …, casado com Maria de Fátima…;
–Carlos Manuel…, casado com Maria Helena…;
–Luís Filipe…, casado com Maria Paulo…, que estes, Carlos Manuel e Luís Filipe renunciaram oportunamente à herança ora em partilha; 11ª-No despacho determinativo da forma à partilha o Tribunal deveria ter dado observância ao apontamento/forma da partilha indicado pelo C.C. – dividir o todo por três e dentro de cada uma destas estirpes, dividir-se o resultado obtido por cabeça, devendo ser revogado e anulado quer o despacho determinativo da partilha, quer a sentença homologatória da partilha e substituído aquele por outro que dê observância à lei aplicável, o que tem de constar de um novo Mapa da Partilha que substitua o errado e a sentença final homologatória passe a tal reflectir; 12ª-Deve este Tribunal ad quem dar total observância ao enquadramento legal adequado do direito sucessório, sendo os herdeiros representantes de seus falecidos pais e nunca por cabeça, como a sentença recorrida erradamente decidiu. 13ª-O C.C. impugnou o despacho determinativo da partilha e também requereu, na oportunidade, a correcção do Mapa Informativo desta partilha, remetendo o fundamento para a forma à partilha que tinha apresentado, o que foi “contemplado” com o despacho nº 116348887, de 04/12/2018, em que confirmava a interpretação/aplicação da lei, enquadrando o caso na al. d) do nº 1 do artigo 2133º e 2147º do C.C. em vez da al. c) daquele artigo da lei adjectiva e 2145º da substantiva, despacho cuja anulação igualmente se requer, por manifesta violação destes preceitos legais, entre outros;
14ª- Na esteira do decidido no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 05/11/2018, in www.dgsi.pt/trp, destaca-se:
“(…) O acervo hereditário a partilhar subsume-se aos bens constantes na relação de bens como constam da conferência de interessados realizada … O inventariado/autor da herança tinha três irmãos germanos … os quais faleceram antes do inventariado … Por isso, são interessados directos na herança, os dez sobrinhos do inventariado, filhos dos seus três irmãos germanos … Assim o total do acervo … a partilhar é de … No preenchimento dos quinhões observar-se-ão as regras ínsitas nos arts.1374º e segs. Do CPC aplicável. E, de acordo com o art.2145º do C Civil aplicável “Na falta de cônjuge, descendentes ou ascendentes, são chamados à sucessão os irmãos e, representativamente os descendentes destes”. É o caso. De facto, nos termos do art. 2039º do C Civil aplicável, os descendentes dos irmãos sucedem a título de direito de representação. Por conseguinte, de acordo com o art. 2044º do mesmo C Civil “Havendo representação, cabe a cada estirpe aquilo em que sucederia o ascendente respectivo” (nº1) e “Do mesmo modo, se procederá para o efeito de subdivisão quando a estirpe compreenda vários ramos” (nº2). Deste modo, chegamos à conclusão que, dado não existirem irmãos do inventariado para serem chamados à sucessão, são os seus sobrinhos que em representação de seus pais lhes sucedem. Por isso, havendo, como há, representação, a partilha dos bens ter-se-á de fazer por estirpe, como determina o art. 2044º do C Civil aplicável … De facto, há igualdade de grau sucessório (são todos sobrinhos) mas existe desigualdade do número de membros dentro de cada estirpe. Sendo três os irmãos germanos, são três estirpes, cabendo a cada estirpe, um terço do acervo hereditário. E, consequentemente, a cada um dos filhos … Se não existisse o direito de representação como parecem querer entender a sentença recorrida e as apeladas e a partilha se fizesse por cabeça, a herança dividir-se-ia em partes iguais pelos dez sobrinhos (1/10) solução bem diferente daquela que defendemos e que está de acordo com a lei e a doutrina.
Conclui-se, assim, que atento o direito de representação existente, a divisão entre os dez sobrinhos do inventariado, não se faz por cabeça, como foi homologado por sentença, mas sim por estirpe, sendo tantas as quotas, quantas as estirpes, ou seja, neste caso, três, ocupando os sobrinhos a posição dos respectivos pais na posição sucessória. Depois cada uma das quotas, ou seja, 1/3 é que se divide por tantos quantos os filhos de cada irmão do inventariado (…)” 15ª- In casu tem o total a partilhar, no montante de €266. 817,39, de ser dividido, no Mapa da Partilha a elaborar em substituição do errado, conforme tudo supra identificado, em três partes iguais, o que corresponde a €88.939,13, sendo este valor adjudicado ao herdeiro da pré-falecida Arminda..., o filho Firmino…; aos filhos da pré-falecida Maria da Silva, que são cinco (Aires; Amílcar; Maria Alice; Olinda e Maria de Lourdes) cabe €17.787,82 a cada um e às duas filhas do pré-falecido Manuel dos Santos, Firmina e Maria Teresa cabe €44.469,56 a cada uma, sendo que cabe a cada um dos dois herdeiros da falecida Maria Teresa, na pendência deste Inventário, José Ro… e a Ana José …, o valor de €22.234,78, devendo ser todos, respectivamente, inteirados de acordo com o resultado das licitações e do acordado, atento o que o decidido, a respeito, em ambas as conferências de interessados (complementares), assim se fazendo os preenchimentos. 16ª-A sentença homologatória da partilha e o despacho determinativo da forma à partilha, bem como os despachos interlocutórios supra identificados, violaram o que vem disposto, entre outros para cuja aplicação se invoca o douto suprimento, nos artigos 1373º, 1374º, 1375º, 1382º, 1326º do CPC e 2133º- nº1 – c) e d) e 2147º e 2145º, sendo estes dois últimos preceitos do Código Civil; 17ª-As normas vindas de mencionar correctamente interpretadas e aplicadas deveriam ter compelido o Tribunal a elaborar um despacho determinativo da partilha correcto e o subsequente Mapa da Partilha elaborado em sua conformidade, reflectindo-se na sentença homologatória da partilha, devendo o sentido das normas a aplicar in casu, a subsunção dos factos à norma jurídica, ser aquele que vem consubstanciado nas presentes alegações, julgando o presente recurso procedente, com as demais consequências; 18ª-Deve, pois, ser revogado e anulado quer o despacho determinativo da partilha, quer o Mapa da Partilha, bem como o Mapa Informativo e os despachos interlocutórios referenciados, nulos, que assim concretizam e fundamentam a sentença homologatória da partilha, proferindo-se nova sentença final correcta, elaborada de acordo com a lei; 19ª-Ao assim ter decidido - o despacho determinativo da forma à partilha, o mapa da partilha e a sentença homologatória da partilha, foi violado ostensivamente o que vem disposto nos artigos 1373º, 1374º, 1 375º, 1382º, 1326º do CPC e 2133º- nº1 – c) e d) e 2147º e 2145º, estes preceitos do Código Civil; 20ª-As normas vindas de mencionar correctamente interpretadas e aplicadas deveriam ter compelido o Tribunal a elaborar um despacho determinativo da partilha correcto e o subsequente Mapa da Partilha elaborado em sua conformidade, reflectindo-se na sentença homologatória da partilha, devendo o sentido das normas a aplicar in casu, a subsunção dos factos à norma jurídica, ser aquele que vem consubstanciado nas presentes alegações, julgando o presente recurso procedente, com as demais consequências.
Dos autos não constam contra alegações.
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II–Sendo as conclusões da alegação de recurso que definem o âmbito da apelação, face às conclusões apresentadas pelos apelantes a questão que se coloca é a relativa aos termos em que deverá ser operada a partilha entre os sobrinhos/herdeiros da inventariada: se deverá proceder-se à divisão da totalidade do acervo hereditário pelos diversos herdeiros singularmente, “por cabeça”, ou seja, em oito partes iguais; ou se deverá ser aquele acervo dividido em três partes iguais, correspondente cada uma delas a um dos três irmãos da inventariada pré-falecidos, e depois cada uma dessas partes dividida pelos respectivos filhos.
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III–Embora a questão a decidir se apresente como sendo, essencialmente, uma questão de direito, com interesse para a decisão evidenciam-se as seguintes circunstâncias apresentadas como assentes no presente processo: 1–A inventariada Helena… faleceu em 18-6-2009 no estado de viúva de Domingos…, sem ascendentes ou descendentes e não deixando testamento. 2–A inventariada teve três irmãos, todos eles pré-falecidos, de quem os interessados são descendentes. 3–Assim, são sobrinhos da inventariada: a)-Amílcar…, Aires…, Maria Alice…, Olinda… e Maria de Lourdes…, todos eles filhos da irmã da inventariada, Maria Silva e de seu marido, Manuel… (fls. 124, 130, 136, 140, 143). b)-Firmina… e Maria Tereza…, filhas do irmão da inventariada, Manuel dos S… e de sua mulher Emília… (fls. 121, sendo que não logramos situar nos autos a certidão de nascimento da interessada Firmina). c)-Luís Filipe…, Carlos Manuel… e Firmino …, filhos da irmã da inventariada Arminda… e de seu marido Manuel D… (fls. 114, 118, 146). 4–Os interessados Luís Filipe… (sem descendentes) e Carlos Manuel… e o seu único descendente, David…, repudiaram a herança, respectivamente por escrituras públicas de 28-6-16 e 9-4-15 (fls. 305-306 e 297-298). 5–Maria Teresa… faleceu em 7-3-17, tendo sido julgados habilitados, como seus sucessores, José Ro… e Ana José…, conforme fls. 370.
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IV–1- Nos termos do nº 1 do art. 2133 do CC, a ordem pela qual são chamados os herdeiros, na sucessão legítimas, é a seguinte: cônjuge e descendentes; cônjuge e ascendentes; irmãos e seus descendentes; outros colaterais até ao quarto grau; Estado.
Como vimos, a inventariada faleceu no estado de viúva, sem descendentes nem ascendentes.
Ora, como decorre do art. 2145 do CC, na falta de cônjuge, descendentes e ascendentes, são chamados à sucessão os irmãos e, representativamente, os descendentes destes. Apenas na falta de herdeiros das classes anteriores, são chamados à sucessão os restantes colaterais até ao quarto grau, preferindo sempre os mais próximos – art. 2147 do mesmo Código.
Como elucidativamente refere Cristina Pimenta Coelho ([1]) os descendentes de irmãos são sempre chamados por direito de representação (art. 2042) e nunca por direito próprio. Exemplificando: «Significa isto que, se, por acaso, sucederem a A um irmão B e dois sobrinhos, Ce D,filhos de um irmão E pré-falecido, a partilha ente B, C e D não se fará por cabeça mas antes tendo em conta que C e D ocupam o lugar de E e terão direito àquilo que lhe pertenceria se tivesse sobrevivido a A». Acrescendo que resulta, igualmente, do mencionado art. 2145 que relativamente a descendentes de irmãos não há limitação do grau de parentesco - «um sobrinho bisneto pode ser chamado à sucessão apesar de ser parente no 5º grau da linha colateral».
Efectivamente, haverá aqui que ter em consideração o direito de representação.
Consoante dispõe o art. 2039 do CC, dá-se «a representação sucessória, quando a lei chama os descendentes de um herdeiro ou legatário a ocupar a posição daquele que não pôde ou não quis aceitar a herança ou o legado»
Importa, pois, que o sucessível prioritariamente designado não possa ou não queira aceitar a herança ou o legado qualquer que seja a causa da não aceitação – o direito de representação poderá ter origem, nomeadamente, em situações de pré-morte, incapacidade por indignidade, repúdio ([2]).
O participante na sucessão através do direito de representação não é directa ou imediatamente chamado, mas apenas por ser descendente do herdeiro que seria o imediatamente chamado, mas que não pôde ou não quis aceitar a herança ([3]).
Expressamente especificando o art. 2042 do CC:
«Na sucessão legal, a representação tem sempre lugar, na linha recta, em benefício dos descendentes de filho do autor da sucessão e, na linha colateral, em benefício dos descendentes de irmão do falecido, qualquer que seja, num caso ou noutro, o grau de parentesco».
Sendo, ainda, de ter em consideração, consoante o art. 2044 do CC, que havendo representação, «cabe a cada estirpe aquilo em que sucederia o ascendente respectivo», bem como que do mesmo modo se procederá «para o efeito da subdivisão, quando a estirpe compreenda vários ramos».
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IV–2-O Tribunal de 1ª instância entendeu, como vimos, dever proceder-se à partilha subtraindo ao valor total dos bens o valor do passivo, e dividindo-se «o total em oito partes iguais – cabendo uma a cada herdeiro (CC 2133º, e 2148º), e cabendo o quinhão de Maria Teresa… aos respectivos herdeiros». E que sendo «todos os irmãos “pré-falecidos” à inventariada, não podiam ser chamados à sucessão – pelo que foram chamados, por vocação própria (CC 2133º/1d)), os sobrinhos (CC 2147º)».
Face ao que expusemos supra evidencia-se não ser assim. Na realidade, o art. 2147 do CC regula a sucessão legítima dos outros colaterais que não os irmãos e seus descendentes ([4]).
Temos, pois, que, procedendo-se à partilha, após se subtrair ao valor total dos bens o valor do passivo, dividir-se-á o total em três partes, por tantos serem os irmãos pré-falecidos da inventariada (porque pré-falecidos não puderam aceitar a herança) - o irmão Manuel … e as irmãs Maria… e Arminda....
Os herdeiros Amílcar…, Aires…, Maria Alice…, Olinda… e Maria de Lourdes…, sendo todos eles filhos da irmã da inventariada Maria…, concorrem em representação desta, pelo que a terça parte que a ela caberia é dividida em cinco outras partes, cada uma delas correspondente a um destes herdeiros – ou seja, a cada um deles caberá 1/15 do valor total (1/5 de 1/3).
As herdeiras Firmina… e Maria Teresa… são filhas do irmão da inventariada Manuel…, concorrendo em representação daquele, pelo que a terça parte da herança que ao mesmo caberia é dividida em duas partes. Uma dessas partes cabe à interessada Firmina… (cabendo-lhe 1/6 do valor total, ou seja, ½ de 1/3). A outra (o outro 1/6 do valor total) é dividido em duas partes iguais entre José… e Ana José…, herdeiros habilitados (cônjuge e filha) de Maria Teresa… que faleceu em 7-3-17, no decurso do presente processo de inventário (art. 2139 do CC).
Luís Filipe…, Carlos M… e Firmino…, filhos da irmã da inventariada Arminda… concorriam em representação daquela, cabendo-lhes 1/3 da herança que à mesma corresponderia.
Todavia, Luís Filipe… (sem descendentes) e Carlos Manuel… e o seu único descendente, David…, repudiaram a herança, respectivamente por escrituras públicas de 28-6-16 e 9-4-15.
Consoante dispõe o art. 2062 do CC, os efeitos do repúdio da herança «retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão, considerando-se como não chamado o sucessível que a repudia, salvo para efeitos de representação».
Deste modo, face ao disposto no citado art. 2044 do CC, esta terça parte acima aludida cabe inteiramente ao interessado Firmino ….
Pelo que o despacho determinativo do modo como devia ser organizada a partilha, nos termos em que foi proferido pelo Tribunal de 1ª instância, não poderá subsistir, antes devendo ser organizada a partilha nos termos que acabámos de especificar.
Como resulta do nº 3 do art. 1373 do CPC aplicável, o despacho determinativo da forma da partilha só pode ser impugnado na apelação interposta da sentença da partilha – como o foi no caso que nos ocupa.
Decorrendo da procedência da impugnação daquele despacho que o processado posterior – incluindo o mapa da partilha e a sentença homologatória subsequente – resultam inquinados, havendo, designadamente, que organizar novo mapa da partilha e proceder às diligências subsequentes.
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V–Face ao exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar procedente a apelação e, em consequência, em revogar o decidido no despacho determinativo do modo como deve ser organizada a partilha, estabelecendo que esta seja antes organizada nos termos constantes de IV -2), com as necessárias consequências no que concerne ao processado posterior que deverá ser repetido em conformidade com o ora decidido.
Custas da apelação pelos herdeiros na proporção do que recebam.
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Lisboa, 17 de Junho de 2021
Maria José Mouro Sousa Pinto Vaz Gomes
[1]No «Código Civil Anotado», coordenação de Ana Prata, II vol., Almedina 2017, pags. 1041-1042. [2]Ver Rabindranath Capelo de Sousa, «Lições de Direito das Sucessões», vol. ,Coimbra Editora, 2ª edição, pags. 314-315. [3]Ver Pires de Lima e Antunes Varela, «Código Civil Anotado», vol. VI, Coimbra Editora 1998, pag. 47. [4]Ver Pires de Lima e Antunes Varela, obra citada, pag. 245.