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OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
EMBARGOS SUPERVENIENTES
PRINCÍPIOS DA COOPERAÇÃO E ADEQUAÇÃO FORMAL
Sumário
I)– Deduzido que seja o requerimento executivo, o executado pode opor-se à execução (cfr. artigo 728.º e ss. do CPC) e à penhora (cfr. artigo 784.º e ss. do mesmo Código).
II)– A oposição à execução constitui o meio processual pelo qual o executado exerce o seu direito de defesa perante a pretensão do exequente.
III)– Os embargos, enquanto oposição à execução, são deduzidos no prazo de 20 dias a contar da citação (cfr. n.º 1 do artigo 728.º do CPC). Todavia, quando a matéria da oposição seja superveniente, o prazo – de 20 dias – conta-se a partir do dia em que ocorra o respetivo facto ou dele tenha conhecimento o executado (cfr. n.º 2 do artigo 728.º do CPC).
IV)– Tendo o executado já deduzido oposição à execução, em embargos cuja apreciação se encontra pendente, a junção de documentos com a contestação a esses embargos pela embargada, não legitima a dedução de novos embargos supervenientes, mas sim, a pronúncia sobre os mencionados documentos, no âmbito dos primitivos embargos, pronúncia essa que o executado, aliás, exercitou.
V)– Considerando o exercício de tal meio processual pelo executado nos primitivos embargos, em sede de apreciação de questões de conhecimento oficioso (apreciação essa a ter lugar em sede de prolação da correspondente decisão - cfr. artigo 608.º, n.º 2, do CPC, aplicável, ex vi, do artigo 732.º, n.º 2, do mesmo Código), não se justificava que o Tribunal recorrido, nos presentes autos, devesse determinar que a petição de embargos fosse tramitada como simples requerimento, por referência aos princípios da cooperação (cfr. artigo 7.º do CPC) e da adequação formal (cfr. artigo 547.º do CPC), cuja observância se mostrava assegurada, pelo conhecimento das questões suscitadas a ter lugar nos embargos primitivamente deduzidos.
Texto Integral
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:
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1.– Relatório:
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Em 10-05-2019, a exequente EAM – ÉVORA ASSET MANAGEMENT, S.A., deduziu contra o executado JS, execução, para pagamento de quantia certa, tendo invocado no respetivo requerimento inicial – cfr. processo n.º 7789/19.1T8SNT.L1 – nomeadamente o seguinte: “Por Contrato de venda de créditos, assinado em 02 de Novembro de 2017, a CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL vendeu o(s) crédito(s) identificados como: … que detinha sobre o(s) requerido(s) e todas as garantias acessórias a ele inerentes, à HEFESTO STC S.A., conforme Documento n.º 1 que ora se junta e se dá por reproduzido para todos os efeitos legais. A referida cessão incluiu a transmissão de todos os direitos, garantias e acessórios inerentes ao(s) crédito(s) cedido(s). Também por Contrato de Venda de Créditos, assinado em 02 de Novembro de 2017, a HEFESTO STC S.A. vendeu o(s) crédito(s) identificados , que detinha sobre o(s) requerido(s) e todas as garantias acessórias a ele(s) inerentes, à EAM – ÉVORA ASSET MANAGEMENT, S.A., conforme Documento n.º 2 que ora se junta e aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais. No âmbito do contrato supra mencionado, incluiu-se o crédito sobre os ora Executados, melhor identificados na relação de créditos cedidos constante do referido contrato e do respectivo DOCUMENTO COMPLEMENTAR, parte integrante do mesmo, conforme Contrato de Cessão de Créditos junto. Em virtude do elevado número de créditos cedidos, é opção da ora Exequente juntar aos presentes autos, no que ao DOCUMENTO COMPLEMENTAR se refere, apenas o crédito a que os mesmos autos respeitam, melhor identificado na respectiva Verba, uma vez que o documento completo consta um número de páginas que tornaria praticamente incomportável, e, cremos, sem qualquer mais valia para o julgamento da presente causa, a remessa aos autos da relação de todos os créditos cedidos. O que faz com que, presentemente, a ora Exequente seja a actual titular dos créditos sub judice.
II–Dos Factos No exercício da sua actividade creditícia a Caixa Económica Montepio Geral, celebrou com o Executado JS, um Contrato de Mútuo n.º …, formalizado por Escritura que serve de título à presente Execução, no montante de 72 538,04 € e respectivo Documento Complementar, conforme cópia que ora se junta e se dá por integralmente reproduzida para os devidos efeitos legais. Para garantia do integral pagamento das quantias mutuadas, bem como das obrigações assumidas no Contrato ora junto, foram constituídas duas hipotecas voluntárias, pela Executada a favor da ora Reclamante sobre o imóvel, a saber: Fracção autónoma "AR", sito na …, … … ALBUQUERQUE, … Cacém, inscrito na CRP de Agualva-Cacém sob o n.º … e inscrito sob a matriz predial n.º …. No Documento Complementar anexo à Escritura supra mencionada, ficou convencionado que o pagamento do referido mútuo seria efectuado em prestações mensais, sucessivas e constantes, de capital e juros, vencendo-se a cada mês. Ora, sucede que o Executado faltou ao pagamento das prestações contratadas e devidas ao mutuante, em 30/11/2014. E apesar de interpelada para o respectivo pagamento, não o efectuou. O pagamento não se presume e a falta de pagamento de qualquer das prestações implica o vencimento de toda a dívida, conforme artigos 781.º e 817.º do Código Civil. Assim, E tendo o Executado deixado de cumprir as obrigações emergentes do contrato supra referido, encontram-se em dívida, na presente data, as seguintes quantias: Contrato … - Capital em dívida: --- 72 538,04 € Juros: ---11 617,80 € Despesas: --- 2 299,99 € Total: ---- 86 455,83 € Pelo que, na presente data, o valor total em dívida relativamente ao supra mencionado contrato é de 86 455,83 €. Valor a que acrescerão os respectivos juros de mora vincendos, desde a presente data até efectivo e integral pagamento, calculados sobre o capital em dívida à taxa de 5.430% onde se inclui a sobretaxa de mora de 3%, bem como o respectivo Imposto de Selo, nos termos legais aplicáveis. O mencionado crédito encontra-se vencido é exigível. O crédito aqui peticionado, respectivos juros vencidos e vincendos estão consubstanciado em títulos executivos, de harmonia com o disposto no artigo 703.º do C.P.C e goza de garantia real sobre o bem imóvel, dado como garantia. Seguem em anexo: - Contratos de Cessão de Créditos; - Certidão Predial; - Título Executivo; - Comprovativo de Pagamento da Taxa de Justiça; e, - Procuração Forense (…)”.
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Em 20-09-2019, dando origem ao apenso A, o executado veio “(…) ao abrigo do disposto nos artigos 729.º, alíneas a), c) e), e g), 733.º, n.º 1, alínea c) ex vi artigo 551.º, n.º 3, 856.º, n.ºs 1 e 3, e 784.º, n.º 1, alínea a), todos do Código de Processo Civil, deduzir oposição à execução e à penhora, o que faz nos termos e com os seguintes fundamentos:
I–DA CESSÃO DE CRÉDITOS 1.º- No dia 22 de maio de 2003, o ora executado celebrou com a Caixa Económica Montepio Geral (CEMG) um contrato de mútuo com hipoteca, no montante de € 72.538,04. 2.º- O empréstimo foi destinado à aquisição da fracção autónoma designada pela pelas letras “…”, correspondente ao andar … do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na …, n…., descrito na Conservatória do Registo Predial de Agualva-Cacém sob o n.º …, e inscrito na respectiva matriz sob o artigo …. 3.º- O andar é habitação própria e permanente e única habitação do executado. 4.º- O imóvel está hipotecado para garantia do identificado empréstimo, e a hipoteca está registada na Conservatória do Registo Predial de Agualva-Cacém, pela apresentação … de …/…/…. 5.º- O prazo do empréstimo é de vinte e cinco anos, conforme a cláusula 8.ª do documento complementar. 6.º- E é amortizável em trezentas e sessenta prestações mensais e sucessivas, vencendo-se a primeira um mês após a data da escritura e as restantes em igual data dos meses seguintes. 7.º- Consta do Contrato de Cessão de Créditos de 2/11/2017, que a “ CEMG … é titular de uma carteira de créditos vencidos, concedidos a diferentes mutuários, nos termos em que cada crédito se encontra identificado, em cada uma das folhas do documento complementar e seus anexo que faz parte integrante da presente escritura, elaborado nos termos do número dois do artigo sessenta e quatro do Código do Notariado, mediante a identificação dos mutuários e eventuais fiadores ou intervenientes nos contratos, identificação dos imóveis correspondentes, respectiva descrição predial e matricial e inscrições hipotecárias existentes, adiante designadas por “Créditos”. (Negrito colocado agora). 8.º- Que pelo referido contrato cedeu à sociedade “HEFESTO” cada um dos identificados créditos, pelo preço global de cento e setenta e dois milhões quarenta e sete mil oitocentos e quarenta e sete euros e setenta e nove cêntimos, que declara que foi pago nos termos acordados pelas partes”. 9.º- Que, a referida cessão comporta, relativamente a cada um dos créditos, a transmissão para a “HEFESTO”, de todas os direitos, garantias e acessórios a eles inerentes, designadamente hipotecas constituídas para a sua garantia, bem como a posição processual da “CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL, CAIXA ECONÓMICA BANCÁRIA, SA”, nos processos judiciais identificados no documento complementar, relativamente a cada um dos Créditos cedidos.” 10.º- No mesmo dia, a “HEFESTO” celebrou com a “EAM – ÉVORA ASSET MANAGEMENTE, S.A.”, o contrato de cessão de créditos onde é referido que a primeira “…ficou titular de uma carteira de créditos vencidos, concedidos a diferentes mutuários, nos termos em que cada crédito se encontra identificado nessa escritura e documento complementar e seu anexo, e em cada uma das folhas do documento complementar a esta escritura, elaborado nos termos do número um, do artigo sessenta e quatro do Código do Notariado, que fica a fazer parte integrante da presente escritura, onde consta também os imóveis correspondentes, respectiva descrição predial e matricial e inscrições hipotecárias existentes, cujo teor declaram conhecer perfeitamente pelo que dispensam a sua leitura.” 11.º- Não decorre da simples leitura do alegado contrato de cessão de crédito, amputado do “documento complementar e seus anexos que faz parte integrante da presente escritura”, por si só, a existência do crédito invocado nos autos. 12.º- O alegado contrato de cessão de crédito, aparentemente legitimador da posição da exequente é um contrato genérico onde nem sequer está identificado o contrato de mútuo n.º …. 13.º- Assim sendo, não demonstra a legitimidade da exequente para efeitos de invocação do crédito em causa, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 54.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC).
DA FALTA DE NOTIFICAÇÃO DA CESSÃO DE CRÉDITO 14.º- O cedido, ora executado, não foi notificado da primitiva cessão de crédito, o que também a exequente não alega no requerimento executivo. 15.º- “I- Nos termos do art.º 583º, nº 1 do CC, a cessão produz efeitos em relação ao devedor desde que lhe seja comunicada ou desde que ele a aceite. II– A citação realizada em acção proposta para cobrança do crédito transmitido não substitui aquela comunicação que deve ser anterior à acção.” (Acórdão do TRE de 06-10-2016, processo n.º 251/13.8TBGLG.E1, relatado pela Desembargadora Conceição Ferreira. No Mesmo sentido, entre outros, os Acórdãos do S.T.J. de 9/11/2000 (in C.J., Acs. do S.T.J., ano VIII, Tomo III, pág. 121; e de 12-06-2003, processo n.º 03B1762, Conselheiro Salvador da Costa; o Ac. do TRP de 18-06-2007, processo n.º 0753072, Conselheiro Sousa Lameira; e o TRL de 17/12/2014, no processo 938/7YXL.SB.L1-8). 16.º- “4 – Na redação do Código de Processo Civil conferida pelo Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12.12, o então art. 804º, nº 3 prevenia expressamente a possibilidade de que a interpelação fosse substituída pela citação, operando-se então o vencimento da obrigação com a citação no processo executivo [“quando a inexigibilidade derive apenas da falta de interpelação (…), a obrigação considera-se vencida com a citação do executado”], mas tal hipótese desapareceu na redação introduzida ao artigo pelo Decreto-Lei nº 38/2003, de 08.03, situação que se manteve inalterada na redação decorrente do Decreto-Lei nº 226/2008, de 20.11, e assim permaneceu até ao actual Código de Processo Civil (na redacção decorrente da Lei nº 41/2013, de 26.06).” (Acórdão do T. Relação de Coimbra de 06-12-2016, processo n.º 195/13.3TBPCV-A.C1, Desembargador Luís Cravo).
DA FALTA DE INTERPELAÇÃO PRÉVIA 17.º-É absolutamente falso que «o mencionado crédito encontra-se vencido», tal como vem alegado no requerimento executivo. 18.º- A obrigação exequenda emerge de uma dívida liquidável em trezentos e sessenta prestações mensais, iguais e sucessivas. 19.º- E o devedor, ora executado, nunca foi interpelado para efeitos de vencimento antecipado da dívida, nos termos do artigo 781.º do Código Civil, o que também não foi alegado exequente. 20.º- Ademais, a CEMG, na prática do cumprimento dos créditos hipotecários, nunca considera o crédito vencido em face de determinados atrasos no pagamento das prestações, quer sejam três, quatro, cinco, seis, e até mais. 21.º- O que acontece tanto em face da sua vocação mutualista como do facto de os devedores serem seus associados, e mormente no contexto da crise económica. 22.º- A prova disso mesmo são as avultadas quantias pedidas nas execuções relativas a prestações vencidas e não pagas. 23.º- O que, certamente, é do conhecimento deste Tribunal por virtude do exercício das suas funções, e que se invoca nos termos e para efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 412.º CPC, ex vi artigo 551.º, n.º 1, do mesmo Código. 24.º- A inexistência de vencimento antecipado do crédito decorre também do seu cumprimento para além da data do incumprimento alegado no requerimento executivo (docs.1 a 7). 25.º- A execução foi instaurada em 06 de maio de 2019. 26.º- O ora executado foi citado em 26 de julho de 2019. 27.º- “I. Para o vencimento imediato de todas as prestações, nos termos do art. 781.º do Código Civil, o credor tem de interpelar o devedor. II.–A dispensa do prazo, nessas circunstâncias, está estabelecida em benefício do credor, tendo caráter supletivo.” (Ac. STJ de 25-05-2017, processo n.º 1244/15.6T8AGH-A.L1.S2, relatado pelo Conselheiro Onildo Geraldes, cfr., entre outros, o Acórdão do mesmo Tribunal, de 06-02-2007, proferido no processo 06A4524; o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28/05/2015, processo 1859/11.1TBVFX-A.L1.2; e o Acórdão do TRP de 26-01-2016, processo n.º 1453/12.0TBGDM-A.P2).
DA COLOCAÇÃO DO CEDIDO EM POSIÇÃO INFERIOR 28.º- Para pagamento da dívida, no âmbito da ação executiva, a exequente apenas admite a venda do imóvel e a satisfação coerciva da obrigação exequenda. 29.º- Ou seja, não aceita o pagamento da dívida exequenda em prestações, ao abrigo do disposto no artigo 806.º e seguintes do CPC. 30.º- O que, também poderá ser do conhecimento deste Tribunal por virtude do exercício das suas funções. 31.º- Os cenários que a exequente apresenta como possíveis para uma negociação extrajudicial são: «- Pagamento total do valor em divida, em singelo. - Promoção e venda pelos Mutuários, do Imóvel a terceiros, mais um pagamento adicional do remanescente, caso o valor da venda não chegue para liquidar a totalidade em divida, com o prévio consentimento da Whitestar. - Entrega do Imóvel, para pagamento na totalidade do valor dívida, caso o valor da Avaliação a ser promovida por nós, às nossas expensas, seja de igual ao valor em divida. - Entrega do Imóvel para pagamento do valor divida, mais um pagamento adicional do remanescente caso o valor da referida Avaliação seja inferior ao valor em divida. 32.º- Além disso, a concordância com os cenários supra referidos depende ainda da apresentação pelos mutuários da seguinte documentação: «Último IRS; Nota de Liquidação –último; 3 últimos recibos de vencimento; Declaração de não dívida às Finanças; Declaração de não divida ao condomínio ou último recibo de pagamento; Património Predial retirado do site das Finanças ou Declaração das Finanças com todo o Património.». 33.º- Excluída a hipótese (irrealista) de o executado pagar a dívida exequenda, as possibilidades que a exequente admite passam pela venda do imóvel, independentemente da situação do devedor e do valor da dívida. 34.º- A exequente justifica a sua posição por não ser uma “Instituição Financeira, e, por conseguinte, não dispomos de licença bancária, não nos é possível “retomar” as condições que haveria anteriormente junto da Caixa Económica Montepio Geral.” 35.º- Desta forma, a exequente nega também ao executado o direito de beneficiar do regime extraordinário de protecção de devedores de crédito à habitação em situação económica muito difícil, imperativo para as instituições de crédito, previsto e regulado pela Lei 58/2012 de 9 novembro. 36.º- A exequente confronta o devedor/executado com um direito absoluto à satisfação da dívida exequenda pelo pagamento coercivo, quaisquer que sejam as condições do devedor e o valor da dívida. 37.º- Nos termos do artigo 334.º do Código Civil, «É ilegítimo o exercício de um direito, quando, o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.» 38.º-A posição da exequente viola ainda os princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade e de proibição do excesso ínsitos no princípio do Estado de direito democrático consagrado no artigo 2.º da Constituição. 39.º- A cessão de créditos não pode colocar o devedor perante o cessionário numa posição inferior àquela em que se encontrava diante do cedente, conforme o Acórdão da Relação de Évora, de 02-10-2018, processo n.º 111675/17.5YIPRT-A.E1.
DA NULIDADE DA CESSÃO 40.º- Em 01 janeiro 2013, em momento anterior ao incumprimento do executado para com o CEMPG, entrou em vigor o Decreto Lei 227/2012 de 25 outubro, nele se cria e regula o PARI – Plano de Ação para o Risco de Incumprimento, e o, PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento. 41.º- Conforme se refere no art.º 2 do DL 227/2012, o contrato de crédito celebrado com o executado está englobado nos previstos pelo referido decreto, requer que os cessionários ou o cedente juntem aos autos a documentação a que se refere o art.º 20.º do DL 227/2012, no que ao executado diz respeito. 42.º- Uma das condicionantes para a CEMPG, ao incluir o cliente bancário no PERSI, tal como se refere o art.º 18, é a de que apenas pode ceder o crédito ou transmitir a sua posição contratual a outra instituição de crédito. 43.º- É bom de ver que a limitação do art.º 18, não permitia a titularização, nem a transmissão da posição contratual para a Hefesto, nem para a EAM – Évora Asset Management, S.A., nenhuma destas é reconhecida pelo Banco de Portugal, como Instituição de Crédito. 44.º- Como já se referiu, mas novamente se traz a colação, a Hefesto, STC., S.A., não é, nem está registada no Banco de Portugal, como sendo Instituição de Crédito, assim; 45.º- A cessão efetuada a favor da Hefesto, STC, S.A., pelo CEMPG, do crédito que detinha sobre os executados, terá que ser, por violação do DL 227/2012, de 25 outubro, considerada nula, com todos os efeitos legais. 46.º- Terá que ser apreciada a legitimidade da Hefesto e da EAM para a presente ação, sendo nula a cessão, terá que ser proferido despacho a reconhecer a ilegitimidade da exequente. 47.º- Não sendo nenhuma das cessionárias (Hesfesto – EAM) reconhecida pelo Banco de Portugal, verifica-se igualmente cometida a violação do segredo bancário.
DO CONTRATO COM O N.º 063271004382. 48.º- Num documento junto aos autos é ainda referido um “Contrato não garantido por hipoteca”, como o número 06..........000000000000, com o capital concedido no valor de € 9500,00.”. 49.º- Em primeiro lugar, esta alegação consta de um documento amputado, o que decorre da passagem da “VERBA” 1 para a “VERBA 325”, e onde é omitida a natureza do contrato e a respetiva data. 50.º- Por outro, os créditos referidos nos contratos de cessão são créditos hipotecários, o que decorre das referências a “eventuais fiadores ou intervenientes nos contratos, identificação nos imóveis correspondentes, respectiva descrição predial e matricial e inscrições hipotecárias existentes” e “hipotecas constituídas para a sua garantia”. 51.º- Deles não consta qualquer referência a “contratos não garantidos por hipoteca” e, muito menos, qualquer referência ao contrato com o número 63........82. 52.º- Também, do requerimento executivo não consta qualquer referência ao “contrato não garantido por hipoteca”, com o número 63........82, nem este consta dos autos. 53.º- Sendo certo que, "tendo havido sucessão no direito de crédito ou na obrigação, ... no próprio requerimento para a execução o exequente deduz os factos constitutivos da sucessão", nos termos do n.º 1 do artigo 54.º do CPC. 54.º- Assim, não tendo a exequente deduzido no requerimento executivo os factos constitutivos da cessão do crédito em causa, é manifesta a sua ilegitimidade ativa em face do disposto no artigo 54.º- n.º 1, e 729.º, alínea c) do Código de Processo Civil. 55.º- E ainda, o documento denominado «contrato não garantido por hipoteca», com o número 63........82, é datado de 13 de janeiro de 2014, e é um “documento particular”, conforme a previsão da alínea c) do artigo 46.º do Código de Processo Civil de 1961. 56.º- Com a Reforma de 2013 ao processo civil, operada pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, a categoria de “documentos particulares” foi suprimida no correlativo artigo 703.º, n.º1, alínea c) do Novo CPC. 57.º- Diga-se ainda, que, em face da sua natureza, não existe qualquer hipoteca respeitante ao contrato de crédito em causa, nomeadamente registada, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 687.º Código Civil. 58.º- Assim sendo, face aos factos alegados no requerimento executivo, estamos perante um título executivo complexo, do qual elementos essenciais não foram apresentados. 59.º- Por outro, está parcialmente baseado num documento particular, o “contrato não garantidos por hipoteca”, com o número 63271004382, que nem sequer consta dos autos. 60.º A inexequibilidade do título executivo e a ilegitimidade do exequente constituem fundamentos de oposição à execução, nos termos das alíneas a) e c) do artigo 729.º do CPC.
DA SOBRETAXA DE 3% 61.º- Além dos juros de mora vincendos, a exequente reivindica uma «sobretaxa de mora de 3%», não alegando nem provando prévia interpelação admonitória. 62.º- A “sobretaxa” corresponde a uma cláusula penal, estabelecida para o caso de incumprimento definitivo do contrato, tendo, por isso, natureza indemnizatória. 63.º- Por um lado, o exercício do direito fundado na cláusula penal em questão depende de prévia interpelação admonitória para o cumprimento em prazo razoável, nos termos do artigo 808.º do Código Civil. 64.º- Por outro, não é cumulável com o cumprimento coercivo da obrigação principal e os juros moratórios. 65.º- “I - A cláusula penal compensatória consiste na estipulação antecipada pelos contraentes de uma quantia pecuniária (determinada ou determinável) para reparação do prejuízo causado a um deles pelo incumprimento definitivo e culposo da obrigação do outro. II– Por assim ser, nos termos do art. 808.º do CC, o exercício do direito fundado nessa cláusula penal sempre dependeria da prévia interpelação admonitória para o cumprimento em prazo razoável ou da demonstração da perda do interesse do credor na prestação do devedor, apreciada objectivamente e daí que esse exercício não seja substancialmente cumulável com a pretensão ao cumprimento coercivo da obrigação principal, com reparação da simples mora.” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06-11-2018, processo n.º 2789/16.6T8GMR.G1.S1, relatado pelo Conselheiro Alexandre Reis).
DAS DESPESAS EXTRAJUDICIAIS PETICIONADAS 66.º- A exequente reclama também a título de «Despesas 2.299,99, €». 67.º- Não foi apresentado qualquer título executivo a elas respeitante. 68.º- Nem alegados quaisquer factos para as concretizar, justificar e legitimar, o que impossibilita o exercício do contraditório. 69.º- E as despesas prováveis com a execução estão incluídas no cálculo efetuado pelo Senhor Agente de Execução no auto de penhora (€8.645,58). 70.º-As despesas respeitantes ao crédito hipotecário, nomeadamente de contratação, registo e hipoteca foram pagas ab initio, como é prática habitual em qualquer contrato de crédito. 71.º-Por outro, as despesas periódicas e ocasionais são liquidadas no momento da sua constituição e assim que a conta bancária tenha provisão para o efeito, não sendo nenhum pagamento relegado para o fim do contrato. 72.º- As despesas que a exequente peticiona poderão estar relacionadas com os custos da cessão de crédito, onde pode ler-se: «o pagamento, se devido, de quaisquer impostos, taxas, emolumentos ou outros encargos exigíveis em virtude da presente cessão são assumidos pela sociedade representada pelo segundo outorgante». (Contrato de cessão de crédito celebrado entre a CEMG e a “HEFESTO STC, S.A). 73.º- Tais despesas, “se devidas” são assumidas pela cessionária, e não tendo o ora executado qualquer intervenção no contrato, não lhe são exigíveis. 74.º- Por outro lado, as despesas em causa não beneficiam da garantia hipotecária, nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 687.º e 693.º, n.º 1, do Código Civil. 75.º- Como se sentenciou no Acórdão do STJ de 01-04-2014, processo n.º 3204/12.0YYLSB-A.L1.S1, relatado pelo Conselheiro Alves Velho: “I – A eficácia da hipoteca depende do registo dos respectivos factos constitutivos, mesmo em relação às partes outorgantes no contrato. II– O seu registo, funcionando como condição verdadeira da eficácia absoluta do acto/negócio de constituição, acaba por assumir também verdadeiros efeitos constitutivos, como verdadeiro registo constitutivo.” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 01-04-2014, processo n.º 3204/12.0YYLSB-A.L1.S1). 76.º- “Salvo nos casos de litigância de má fé e de demanda quando a obrigação ainda não era exigível, as despesas realizadas com o processo, incluindo o pagamento dos honorários, apenas podem ser compensadas a título de custa de parte, nos termos previstos nas disposições correspondentes do Código de Processo Civil e no Regulamento das Custas Processuais”, cfr. o Acórdão do STJ de 15-01-2019, proferido no processo n.º 5792/15.0TBALM.L1.S2, revista excepcional).
DA INEXIGIBILIDADE DA OBRIGAÇÃO DE JUROS VENCIDOS 77.º- No seu douto requerimento executivo, a exequente líquida e peticiona juros no montante de € 13. 917,79, sem demonstrar a sua razão de ser. 78.º- Como já foi alegado, o ora executado não foi interpelado para efeitos de vencimento antecipado da dívida. 79.º- E a obrigação decorrente do vencimento antecipado da dívida liquidável em prestações não é uma obrigação de prazo certo, nos termos do artigo 805.º, n.º 2, alínea a) do Código Civil. 80.º- Por outro lado, o crédito só foi liquidado no requerimento executivo, mas de forma ilegal e que torna a obrigação inexigível por nela terem sido incluídas quantias avultadas que o executado não deve. 81.º- Nos termos do artigo 805.º, n.º 3, do CC, “se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor.”. 82.º- Sendo ainda de referir que, de acordo com a doutrina estabelecida pelo Acórdão de Fixação de Jurisprudência nº 7/2009, de 25/03/2009 (DR nº 86, Série I, de 05/05/2009) “No contrato de mútuo oneroso liquidável em prestações, o vencimento imediato destas ao abrigo de cláusula de redacção conforme ao artº 781º do CC não implica a obrigação de pagamento de juros remuneratórios nelas incorporados.”. 83.º-O artigo 693.º do Código Civil determina: “1.-A hipoteca assegura os acessórios do crédito que constem do registo. 2.- Tratando-se de juros, a hipoteca nunca abrange, não obstante convenção em contrário, mais do que os relativos a três anos. 3.- O disposto no número anterior não impede o registo de nova hipoteca em relação a juros ainda em dívida.” 84.º- «1 - Os juros de mora abrangidos pela hipoteca englobam os juros remuneratórios e moratórios vencidos à data da instauração da execução e os juros de mora vincendos na constância da execução, com o limite global temporal de três anos de juros. 2 - Sendo que a contagem do prazo de três anos se inicia com o incumprimento do devedor, uma vez que outra solução, nomeadamente a da data do registo da hipoteca, traria graves injustiças.» (Acórdão da Relação de Évora, de 12-03-2015, processo n.º 1226/10.4TBBNV-B.E1; cfr., entre outros, o Ac. do STJ de 30/11/2010, proferido no Proc. n.º 1254/07.7TBGDM-A.P1.S1).
DA LIQUIDAÇÃO DA DÍVIDA EXEQUENDA 85.º- Consta do requerimento executivo que «tendo o Executado deixado de cumprir as obrigações emergentes do contrato supra referido, encontram-se em dívida, na presente data, as seguintes quantias: Contrato … – Capital em dívida: --- 72 538,04 € Juros: ---11 617,80 € Despesas: --- 2 299,99 € Total: ---- 86 455,83.» 86.º- Em primeiro lugar, o capital em dívida na data do incumprimento do contrato está inflacionado. 87.º- Depois disso, no indicado capital foi incluído o valor de € 9500,00, relativo ao supra referido “contrato não garantido por hipoteca”, com o número 063271004382000000000000, e para o qual não existe qualquer título executivo. 88.º- E ainda, as quantias de € 13. 917,79, respeitante a juros vencidos que não são devidos, e € 2 299,99, concernente a despesas extrajudiciais que também não são devidas. 89.º- Subtraído o valor de € 9500,00, respeitante ao “contrato não garantido por hipoteca”, o capital alegadamente em dívida seria € 63. 038,04. 90.º- Até 12 de julho de 2016, o executado pagou ainda diversas quantias, no total de € 1521,00, pelo menos, pelo que, no máximo, o capital em dívida seria de € 61.517,04 (docs. 1 a 7). 91.º- De qualquer modo, a liquidação da obrigação pressupõe a legalidade da quantia liquidada, só assim podendo ser legítima e exigível, o que não é o caso por nesta terem sido incluídas quantias avultadas que o executado não deve. 92.º- “I - Obrigação exigível, na acção executiva, é aquela que está vencida – ou que se vence com a citação do executado e em relação à qual o credor não se encontra em mora na aceitação da prestação ou quanto à realização de uma contraprestação. III– A inexigibilidade da obrigação constitui fundamento de oposição a execução que, caso seja julgada procedente, determina a extinção da execução.” (Ac. RP, de 27-04-2017, processo n.º 2903/06.0TBGDM-A.P1).
II– DA OPOSIÇÃO À PENHORA 93.º- No âmbito da presente ação executiva, o imóvel hipotecado para garantia do crédito está penhorado para pagamento do total de € 95. 101,41, onde se inclui a dívida exequenda no valor de € 86.455,83, e € 8.645,58, a título de despesas prováveis. 94.º- Está incluído no valor penhorado a quantia de € 9.500,00, respeitante ao «contrato não garantido por hipoteca», e em relação ao qual não foi apresentado qualquer título executivo. 95.º- Estão também incluídas no valor penhorado as quantias de € 13. 917,79, respeitante a juros vencidos que não são devidos, e € 2 299,99, concernentes a despesas extrajudiciais que também não são devidas. 96.º- Subtraído o valor de € 9500,00, respeitante ao “contrato não garantido por hipoteca”, o capital alegadamente em dívida seria € 63. 038,04. 97.º- Após a data do incumprimento indicado e até 12 de julho de 2016, o executado pagou ainda diversas quantias, no total de € 1521,00, pelo menos, pelo que, no máximo, o capital em dívida seria de € 61.517,04 (docs. 1 a 7). 98.º- Sem prejuízo da sua ulterior liquidação, as despesas prováveis com a execução estão inflacionadas, porquanto deveriam ter sido presumidas em € 6.151, 70. 99.º- Assim, o valor indicado à penhora, nele incluídas as despesas prováveis da execução, deveria ter sido, no máximo de € 67.668,70. 100.º- Pelo exposto, estando na penhora realizada incluídas quantias que o executado não deve, contém uma extensão que a torna inadmissível, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 784.º do CPC.
Nestes termos, nos demais de Direito e com o douto suprimento de Vossa Excelência, requer: 1.º- Que os presentes embargos sejam julgados procedentes, por provados, com a consequentemente extinção da execução e levantamento da penhora. 2º- Ser reconhecido e declarado como nulo e sem produção de quaisquer efeitos em relação ao ora executado os contratos de Venda de Créditos, celebrados entre a Caixa Económica Montepio Geral, a Hefesto, STC, S.A., e a EAM. 3.º- Ser reconhecida e declarada a violação de segredo. 4.º- A suspensão da execução, ao abrigo do disposto no artigo 733.º, n.º 1, alínea c) do CPC. 5.º- Que a oposição à penhora seja julgada procedente, por provada, com a consequente extinção. 6.º- Requer ainda, ao abrigo do disposto no artigo 733.º, n.º 5, e 785.º, n.º 4, do CPC, que seja determinado que a venda do imóvel aguarde a decisão sobre os presentes embargos (…)”.
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Recebidos os embargos, no referido apenso A, foi notificada a embargada que, em 20-01-2020 ali apresentou contestação, juntando com tal articulado, entre outros documentos, um documento intitulado “ACORDO CONTRATO DE CRÉDITO À HABITAÇÃO N.º 065.21.100445-5”, datado de 10-01-2014, celebrado entre a CEMG-Caixa Económica Montepio Geral e o executado.
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O executado pronunciou-se, no referido apenso A, sobre os mencionados documentos, por requerimento aí apresentado em 27-11-2020.
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Por apenso à referida execução e dando origem aos presentes autos, o executado JS deduziu então, em 02-12-2020, “embargos supervenientes”, “face aos novos factos trazidos aos autos pela Exequente, vem, ao abrigo do disposto nos artigos 728.º, n.º 2, 729.º, alínea g) e 731.º, in fine” do CPC.
Concluiu pela procedência dos embargos, “com a consequentemente absolvição do executado da instância, sem prejuízo da fixação da dívida no valor correto, nos termos do artigo 278.º, n.º 3, in fine, do CPC”.
Alegou o executado como fundamento dos referidos embargos, em suma, que:
- A exequente na contestação juntou acordo celebrado em 10-01-2014, respeitante ao contrato de crédito n.º 065.21.100445-5, nunca tendo o executado sido confrontado com o eventual incumprimento do mesmo, tendo o mesmo sido cumprido, prosseguindo o pagamento do crédito hipotecário muito para além do período de vigência daquele;
- No acordo em causa não foi feita referência ao Procedimento de Regularização Extrajudicial de Situações de Incumprimento (PERSI), nem ao Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro, e às situações nele reguladas, sendo obrigatória a integração do cliente no PERSI entre o 31.º dia e 60.º dia subsequente à entrada em mora, e está prevista a integração automática dos clientes que à data da sua entrada em vigor já se encontravam em mora relativamente ao cumprimento dos contratos, por força do disposto no artigo 39.º, n.º 1;
- Uma coisa é um qualquer acordo de regularização de situações de incumprimento celebrado antes da entrada em vigor do PERSI, e que poderia dispensar a integração neste, outra bem diferente, é a celebração de um acordo 1 ano após o início de vigência do PERSI, com eventual objetivo de evitar a integração neste ou de frustrar os seus objetivos;
- O acordo celebrado em 10-01-2014, contém apenas uma parte aparentemente favorável ao devedor, na medida em que faz referência a um período de carência de capital e juros; porém, os juros são considerados «suspensos», mas “irão acrescer ao capital inicial” e permitir a capitalização de juros, e o prazo de liquidação da dívida, que terminaria em maio de 2028, foi relegado para maio de 2033;
- O período de carência terminou em 22-12-2014, 1 mês e 12 dias após a assinatura do acordo, sendo retomado o pagamento das “prestações mensais, constantes e sucessivas, compostas por capital e juros” em 22-01-2015, conforme o ponto 5 da cláusula primeira;
- O Banco credor agravou substancialmente a posição do devedor, o que era inadmissível se estivesse em causa o cumprimento dos deveres a que estava sujeito no âmbito do PERSI;
- A Exequente não alegou a extinção do PERSI e as suas causas, porque não se pode extinguir algo que nunca existiu;
- É incongruente fixar o incumprimento e mora do devedor em 30-11-2014, e, ao mesmo tempo, prevalecer do acordo de 10-01-2014, quando neste é referido que «Findo o período de carência concedido, o referido empréstimo será reembolsado em 221 prestações mensais, constantes e sucessivas, …, vencendo-se a primeira em 2015-01-22» (cláusula primeira, n.º 5);
- O acordo celebrado em 10-01-2014, que não indica os seus pressupostos ou razão de ser, o valor em dívida, o cumprimento de qualquer dever, nomeadamente de informação e negociação, enquanto alternativa à integração no PERSI é nulo e de nenhum efeito jurídico, por violação de normas imperativas e subtraídas à disponibilidade das partes, nos termos do artigo 294.º do Código Civil;
- A Exequente juntou aos autos as cartas de 14-11-2014 e 14-02-2015, as quais não foram recebidas pelo executado e mesmo que o tivessem sido, não reúnem os requisitos que a interpelação admonitória deve respeitar, nomeadamente, de forma expressa a indicação precisa dos montantes vencidos, a intimação para cumprimento, a fixação do termo peremptório para o cumprimento, e a cominação (declaração admonitória) de que a obrigação se terá por definitivamente não cumprida em caso de falta de pagamento, com o consequente vencimento antecipado da dívida fracionada;
- Quanto à carta de 16-02-2018, sendo a Exequente uma empresa de titularização de crédito deveria ter recebido um crédito vencido e não um crédito liquidável em prestações, mensais e sucessivas e sendo a irregularidade insanável, não lhe assiste o direito de proceder a qualquer interpelação para efeito de vencimento do crédito;
- A cessão de crédito constante do acordo de 10-01-2014 não prevê a cessão do crédito em causa a uma empresa de titularização de crédito, o que determinaria a nulidade da cláusula;
- Está provado nos autos de embargos, pelo menos, os seguintes depósitos na conta bancária: € 350,00, em 20-11-2014; € 105,00, em 27-11-2014; € 150,00, em 12-12-2014; € 150,00, em 31-12-2014; € 200,00, em 04-03-2015; € 116,00, em 11-03-2016; e € 450,00, em 12-07-2016;
- Numa situação em que tais quantias não tivessem sido pagas, não estaríamos perante um incumprimento que legitimasse a resolução do contrato de crédito hipotecário, com o consequente vencimento automático da dívida fracionada;
- A resolução de um contrato de mútuo com hipoteca, liquidável em trezentas prestações, mensais e sucessivas, com fundamento numa dívida de € 127,32 ou € 191,25, traduz-se num desequilíbrio manifesto entre os efeitos do direito e os efeitos dele derivados, na medida em que provoca uma desproporção inadmissível entre a vantagem da credor e o sacrifício imposto ao devedor, configurando uma atuação com abuso de direito, nos termos do artigo 334.º do Código Civil;
- O executado foi citado em 26 de julho de 2019;
- Face ao referido expediente, não existe, com a instauração do processo, a preocupação de imediata citação do executado, nomeadamente através do disposto no artigo 651.º do Código de Processo Civil ou da promoção de despacho liminar, nos termos da alínea a) do artigo 723.º do mesmo Código, pelo que, a prescrição deve ser considerada interrompida na data em que o executado foi notificado da contestação com documentos, ou seja, em 23-11-2020, nos termos do artigo 323.º, n.º 1, do Código Civil;
- Nesta data estavam prescritas todas as quantias relativas a prestações vencidas e não pagas;
- As prestações vencidas, destinadas à amortização do capital mutuado, prescrevem no prazo de cinco anos, nos termos da alínea e) do artigo 310.º do Código Civil;
- Através da carta de 16-02-2018, veio a Exequente confrontar o Executado com um novo valor da dívida, € 93.053,42 (noventa e três mil e cinquenta e seis euros e quarenta e dois cêntimos), não demonstrando como chegou ao indicado valor, o qual não indicou no requerimento executivo;
- Como foi referido nos embargos de executado, no capital líquido indicado está incluída a quantia de € 9500,00, respeitante ao “contrato não garantido por hipoteca”, datado de 13-01-2014;
- Em 2014, e após o indicado período de cumprimento do crédito, o capital vincendo esteve situado em € 64.325,07;
- Mediante a inclusão do valor de € 9500,00, o capital em dívida passou a ser de € 73.293,83, em 28-03-2015, e € 72.633,53, em 30-09-2015;
- Foi suscitada nos embargos de executado a questão relativa à falta de vencimento do crédito, sendo a obrigação exequenda emergente de uma dívida liquidável em prestações mensais, iguais e sucessivas.
- A questão aqui suscita é conexa com aquela e é de conhecimento oficioso;
- Não foi alegado nem demonstrada a interpelação admonitória, nem sequer após a notificação à Exequente para contestar os embargos, sob cominação; e
- Estabelece o artigo 734.º, n.º 1, do CPC, que “O juiz pode conhecer oficiosamente, até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726.º, o indeferimento liminar ou aperfeiçoamento do requerimento executivo” (…)”.
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Em 17-12-2020 foi proferido despacho do seguinte teor: “Veio o executado JS, “face aos novos factos trazidos aos autos pela Exequente, vem, ao abrigo do disposto nos artigos 728.º, n.º 2, 729.º, alínea g) e 731.º, in fine, do Código de Processo Civil, deduzir embargos supervenientes”. Apreciando. Analisada criticamente a petição inicial dos presentes embargos no confronto com a contestação apresentada pela exequente na oposição à execução mediante embargos de executado deduzida pelo executado, ora opoente, JS, que constitui o apenso A, constata-se que a esta se apresenta, tão-só, como uma forma de resposta àquela. Ou seja, a exequente intentou a execução de que dependem estes autos com fundamento no incumprimento de um concreto contrato de mútuo, cujos direitos, garantias e acessórios inerentes ao(s) crédito(s) lhe foram alegadamente cedidos pela anterior credora (também ela cessionária). Alegou, mais concretamente, que “No exercício da sua actividade creditícia a Caixa Económica Montepio Geral, celebrou com o Executado JS, um Contrato de Mútuo n.º …, formalizado por Escritura que serve de título à presente Execução, no montante de 72 538,04 € e respectivo Documento Complementar, conforme cópia que ora se junta e se dá por integralmente reproduzida para os devidos efeitos legais. Para garantia do integral pagamento das quantias mutuadas, bem como das obrigações assumidas no Contrato ora junto, foram constituídas duas hipotecas voluntárias, pela Executada a favor da ora Reclamante sobre o imóvel, a saber: Fracção autónoma "…", sito na …, … R. …, …, … Cacém, inscrito na CRP de Agualva-Cacém sob o n.º … e inscrito sob a matriz predial n.º …. No Documento Complementar anexo à Escritura supra mencionada, ficou convencionado que o pagamento do referido mútuo seria efectuado em prestações mensais, sucessivas e constantes, de capital e juros, vencendo-se a cada mês. Ora, sucede que o Executado faltou ao pagamento das prestações contratadas e devidas ao mutuante, em 30/11/2014. E apesar de interpelada para o respectivo pagamento, não o efectuou. O pagamento não se presume e a falta de pagamento de qualquer das prestações implica o vencimento de toda a dívida, conforme artigos 781.º e 817.º do Código Civil. Assim, E tendo o Executado deixado de cumprir as obrigações emergentes do contrato supra referido, encontram-se em dívida, na presente data, as seguintes quantias: Contrato … - Capital em dívida: --- 72 538,04 € Juros: ---11 617,80 € Despesas: --- 2 299,99 € Total: ---- 86 455,83 € Pelo que, na presente data, o valor total em dívida relativamente ao supra mencionado contrato é de 86 455,83 €. Valor a que acrescerão os respectivos juros de mora vincendos, desde a presente data até efectivo e integral pagamento, calculados sobre o capital em dívida à taxa de 5.430% onde se inclui a sobretaxa de mora de 3%, bem como o respectivo Imposto de Selo, nos termos legais aplicáveis. O mencionado crédito encontra-se vencido é exigível. O crédito aqui peticionado, respectivos juros vencidos e vincendos estão consubstanciado em títulos executivos, de harmonia com o disposto no artigo 703.º do C.P.C e goza de garantia real sobre o bem imóvel, dado como garantia.” Esta foi a forma como a exequente configurou a execução. O executado, por sua vez, deduziu oposição à execução mediante embargos de executado – que constituem o apenso A –, à qual veio o exequente apresentar contestação, impugnando motivadamente a oposição e juntando documentos, nomeadamente um acordo datado de 10.01.2014, no qual o executado é interveniente. Ora, é este último documento, bem como outros juntos com a contestação, que motiva a apresentação dos presentes embargos supervenientes, aproveitando, o executado/opoente, para invocar um conjunto de exceções como se estivéssemos perante um novo título executivo e uma nova execução, pronunciando-se sobre o PERSI, a “interpelação admonitória”, o “pagamento”, o “abuso de direito”, a “prescrição das prestações vencidas”, o “valor da dívida”, “a falta ou insuficiência do título executivo”. Ora, prescreve o disposto no art. 728º, n.º 1, do C. P. Civil, que: “O executado pode opor-se à execução por embargos no prazo de 20 dias a contar da citação.” Não obstante, logo em seguida, estipula o n.º 2 do mesmo preceito legal que: “Quando a matéria da oposição seja superveniente, o prazo conta-se a partir do dia em que ocorra o respetivo facto ou dele tenha conhecimento o executado.” Assim, José Lebre de Freitas (in A Ação Executiva, 6ª Edição, Coimbra Editora, pág. 223) escreve que: “A oposição à execução deve ser deduzida no prazo de 20 dias a contar da citação do executado … Há, no entanto, a possibilidade de “embargos supervenientes”: a) quando o facto que os fundamenta ocorrer depois da citação do executado; b) quando este tiver conhecimento do facto (ex: o pagamento efectuado por um seu antecessor) depois da sua citação.” No caso, o executado/opoente sustenta a presente oposição com base em factos e documentos alegados/juntos com o articulado de contestação aos embargos já deduzidos, sendo que estes mais não constituem do que impugnação motivada à matéria da oposição – concluindo pela respetiva improcedência –, sendo que na parte em que constituam, eventualmente, matéria nova que implique alteração da causa de pedir, não serão, naturalmente, considerados por inadmissibilidade da alteração da causa de pedir. Isto para dizer que a posição das partes nos autos – a forma como as partes configuraram as respetivas pretensões – mostra-se definida no requerimento executivo, oposição à execução e contestação, sendo que tudo aquilo que o extravase não pode ser atendido. Isto sem prejuízo de o executado, na oposição que constitui o apenso A, possa – como, aliás, fez – pronunciar-se sobre o articulado da contestação, maxime no que respeita aos documentos juntos. O que já não pode é apresentar oposição à execução mediante embargos de executado supervenientes para se pronunciar amplamente sobre a matéria da contestação. Entende, assim, o Tribunal que a forma como o executado configura a presente oposição não é suscetível de integrar oposição superveniente. Termos em que indefiro liminarmente a presente oposição. Custas pelo executado/opoente. Registe, notifique e comunique ao Sr. Agente de Execução (…)”.
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Não se conformando com esta decisão, dela apela o executado, pugnando pela revogação da mesma, formulando na alegação que apresentou, as seguintes conclusões: “(…) 1.ª- Pelo presente recurso pretende-se impugnar a sentença proferida nos autos de execução, apenso C, em 17-12-2020, notificada ao executado com a data de elaboração de 18-12-2020, e que indeferiu liminarmente a oposição à execução mediante embargos supervenientes. 2.ª- O executado apenas tomou conhecimento dos factos supervenientes ao ser notificado da contestação aos embargos de executado e respetivos documentos, sendo manifesta a superveniência subjectiva e que tais factos são legalmente admitidos como fundamentos de oposição à execução, nos termos do disposto nos artigos 729.º e 731.º do CPC. 3.ª- A nulidade do acordo de 10-01-2014, enquanto alternativa à integração do devedor no PERSI e como forma de cumprimento das adstrições impostas por este, é uma exceção perentória, que constitui fundamento de oposição à execução, ao abrigo do disposto nos artigos 294.º e 286.º do Código Civil, 729.º, alínea g) e 731.º do CPC. 4.ª-Resultando a obrigação exequenda da resolução extrajudicial de um contrato de crédito hipotecário liquidável em prestações, a falta de documentação da interpelação admonitória consubstancia a exceção perentória de inexistência ou insuficiência do título executivo, o que também constitui fundamento de oposição à execução, ao abrigo do disposto nos artigos 10.º, n.º 5, 703.º, al. b), 713.º, 729.º, alínea a) e 731.º do CPC. 5.ª- Sendo a exequente uma sociedade de titularização de créditos, não é reconhecida como instituição de crédito, devendo receber um crédito vencido, pelo que não lhe assiste o direito de proceder à resolução do crédito, através da sua carta de 16-02-2018, sendo a cessão nula, nos termos dos artigos 294.º e 286.º do Código Civil, o que também é uma exceção perentória, que constitui fundamento de oposição à execução, ao abrigo do disposto nos artigos 713.º, 729.º, alínea g) e 731.º do CPC. 6.ª- O pagamento da dívida que constituiu fundamento de resolução do contrato de crédito hipotecário, conforme os documentos 1 a 7 juntos aos autos com os embargos de executado, é também uma exceção peremptória de tipo extintivo, e é invocável por meio de embargos, por força do disposto nos artigos 729.º, alínea g) e 731.º do CPC. 7.ª- Tendo o crédito hipotecário sido resolvido com fundamento numa dívida no valor de € 127,32 ou € 191,25, existiu um exercício do direito em manifesto desequilíbrio, exceção peremptória de direito material, in casu, também invocável por meio de embargos, por força do disposto nos artigos 334.º do Código Civil, 729.º, alínea g) e 731.º do CPC. 8.ª- Na data em que o executado foi notificado da contestação e da carta da exequente de 16-02-2018 estavam prescritas as quantias relativas a prestações vencidas e não pagas, nos termos da alínea e) do artigo 310.º do Código Civil, assistindo ao executado o direito de invocar a sua prescrição, ao abrigo do disposto no artigo 304.º, n.º 1, do mesmo Código, nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 729.º, alínea g) e 731.º do CPC. 9.ª- Perante um novo valor da dívida exequenda, € 93.053,42, assiste ao executado o direito de tomar posição sobre o mesmo, ao abrigo do disposto no artigo 3.º, n.º 3, do CPC, sob pena de vir a ser confrontado com a preclusão do exercício do direito, nos termos dos artigos 573.º, 728.º e 731.º do CPC. 10.ª- Não podendo o executado defender-se através do meio processualmente adequado, poderá ser confrontado com uma decisão judicial cujos fundamentos de facto e de direito não teve possibilidade de contrariar, o que viola o princípio do contraditório, em que se integra a proibição de indefesa, e o direito de acesso aos tribunais, nos termos dos artigos 2.º e 20.º da Constituição da República Portuguesa. 11.ª- A nulidade do acordo de 10-01-2014, a inexistência ou insuficiência do título executivo, a nulidade da cessão de crédito e o abuso de direito configuram questões de conhecimento oficioso, podendo ser suscitadas perante o tribunal ad quem, mesmo que o não tenham sido perante o tribunal a quo, pelo que não se compreende que não possam ser suscitada perante este, ao abrigo do disposto nos artigos 5.º, n.º 3, e 608.º, n.º 2, do CPC. 12.º- Assim, não podendo os embargos supervenientes ser admitidos como tal porque formalmente se apresentam como uma forma de resposta à contestação, o Tribunal deve ordenar a sua tramitação como simples requerimento, mormente para apreciação das questões de conhecimento oficioso, ao abrigo dos princípios da cooperação e da adequação formal, nos termos dos artigos 7.º e 547.º do CPC. 13.ª- Pelo exposto, salvo o devido respeito, a decisão impugnada violou, por erro de interpretação e aplicação, os artigos 286.º, 294.º e 334.º do Código Civil, 3.º, n.º 3, 5.º, n.º 3, 713.º, 728.º, n.ºs 1 e 2, 729.º, alíneas a) e g), e 731.º do CPC, 20.º, n.º 1, e 202.º da Constituição da República Portuguesa (…)”.
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O exequente não contra-alegou.
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Em 16-04-2021 foi proferido despacho de admissão do recurso.
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Foram colhidos os vistos legais.
* 2.–Questões a decidir:
Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, nos termos preceituados pelos artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC - sem prejuízo das questões de que o tribunal deva conhecer oficiosamente e apenas estando adstrito a conhecer das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objeto do recurso - , as questões a decidir são as de saber: A)- Se a decisão recorrida violou, por erro de interpretação e aplicação, os artigos 286.º, 294.º e 334.º do Código Civil, 3.º, n.º 3, 5.º, n.º 3, 713.º, 728.º, n.ºs 1 e 2, 729.º, alíneas a) e g), e 731.º do CPC, 20.º, n.º 1, e 202.º da Constituição da República Portuguesa e deve ser revogada por os fundamentos de oposição à execução mediante embargos de executado serem subjetivamente supervenientes e constituírem fundamentos de oposição à execução, nos termos do disposto nos artigos 729.º e 731.º do CPC? B)- Se não podendo os embargos supervenientes ser admitidos, o Tribunal recorrido deveria ordenar a sua tramitação como simples requerimento, mormente para apreciação das questões de conhecimento oficioso, ao abrigo dos princípios da cooperação e da adequação formal, nos termos dos artigos 7.º e 547.º do CPC?
* 3.–Fundamentação de facto:
São elementos processuais relevantes para a apreciação do recurso os elencados no relatório.
* 4.–Fundamentação de Direito:
* A)-Se a decisão recorrida violou, por erro de interpretação e aplicação, os artigos 286.º, 294.º e 334.º do Código Civil, 3.º, n.º 3, 5.º, n.º 3, 713.º, 728.º, n.ºs 1 e 2, 729.º, alíneas a) e g), e 731.º do CPC, 20.º, n.º 1, e 202.º da Constituição da República Portuguesa e deve ser revogada por os fundamentos de oposição à execução mediante embargos de executado serem subjetivamente supervenientes e constituírem fundamentos de oposição à execução, nos termos do disposto nos artigos 729.º e 731.º do CPC?
A decisão recorrida indeferiu liminarmente os embargos que, invocando superveniência, foram deduzidos pelo executado.
Considera o Tribunal recorrido que os fundamentos expressos nos presentes embargos constituem, apenas, uma forma de resposta à contestação deduzida pela exequente no apenso A, resposta essa que, naqueles autos seria inadmissível.
Para tanto, passou em revista, quer o requerimento executivo, quer os embargos de executado deduzidos no apenso A, quer a contestação que ali foi apresentada pela embargada/exequente.
E, apreciando a pronúncia do executado sobre os documentos juntos pela embargada na referida contestação, designadamente, o acordo datado de 10-01-2014, no qual o executado foi interveniente, refere o Tribunal recorrido que o executado aproveita “para invocar um conjunto de exceções como se estivéssemos perante um novo título executivo e uma nova execução, pronunciando-se sobre o PERSI, a “interpelação admonitória”, o “pagamento”, o “abuso de direito”, a “prescrição das prestações vencidas”, o “valor da dívida”, “a falta ou insuficiência do título executivo””, concluindo que os factos invocados nos presentes embargos “mais não constituem do que impugnação motivada à matéria da oposição – concluindo pela respetiva improcedência –, sendo que na parte em que constituam, eventualmente, matéria nova que implique alteração da causa de pedir, não serão, naturalmente, considerados por inadmissibilidade da alteração da causa de pedir”, entende que a oposição em questão não constitui oposição superveniente.
Vejamos:
Deduzido que seja o requerimento executivo, o executado pode deduzir oposição à execução (cfr. artigo 728.º e ss. do CPC) e à penhora (cfr. artigo 784.º e ss. do mesmo Código).
Sendo penhorados bens pertencentes ao executado, pode este opor-se à penhora com algum dos seguintes fundamentos:
-Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que ela foi realizada;
-Imediata penhora de bens que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda;
-Penhora sobre bens que, não respondendo, nos termos do direito substantivo, pela dívida exequenda, não deviam ter sido atingidos pela diligência.
Por seu turno, a oposição à execução constitui o meio processual pelo qual o executado exerce o seu direito de defesa perante a pretensão do exequente. Foi deduzida uma concreta pretensão contra o executado e este defende-se desta, pelo que deve expor todos os fundamentos susceptíveis de conduzir à extinção da execução, atenta a ligação funcional existente entre a oposição e a execução. A oposição é uma contra-acção (cfr., Anselmo de Castro, A acção executiva singular, comum e especial, Coimbra Editora, págs. 44 e 274) do executado à acção executiva para impedir a execução, visando a sua extinção, no todo ou em parte (cfr. art. 732º, nº 4, do CPC). “A oposição do executado visa a extinção da execução mediante o reconhecimento da actual inexistência do direito exequendo ou da falta de um pressuposto, específico ou geral, da acção executiva, assumindo o carácter de uma contra-acção tendente a obstar à produção dos efeitos do título executivo e/ou da acção que nele se baseia. Quando veicula uma oposição de mérito à execução visa um acertamento negativo da situação substantiva (obrigação exequenda), de sentido contrário ao acertamento positivo consubstanciado no título executivo (judicial ou não), cujo escopo é obstar ao prosseguimento da acção executiva mediante a eliminação, por via indirecta, da eficácia do título executivo, enquanto tal” (assim, Lebre de Freitas; A Acção Executiva à luz do Código Revisto, 2ª ed., Coimbra ed., 1997, pp. 141 e 157).
Ou seja, “pelos embargos, o executado assume a autoria dum processo declarativo, destinado a contestar o direito do exequente, quer impugnando a própria exequibilidade do título, quer alegando factos que em processo declarativo constituiriam matéria de excepção” (assim, Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 25-02-2021, Pº 1623/20.7T8STB-A.E1, rel. TOMÉ DE CARVALHO).
Os embargos, enquanto oposição à execução, são deduzidos no prazo de 20 dias a contar da citação (cfr. n.º 1 do artigo 728.º do CPC).
Todavia, quando a matéria da oposição seja superveniente, o prazo – de 20 dias – conta-se a partir do dia em que ocorra o respetivo facto ou dele tenha conhecimento o executado (cfr. n.º 2 do artigo 728.º do CPC).
A superveniência factual que determina a dedução de embargos supervenientes pode ser objetiva ou subjetiva. Ou seja:“(…) a superveniência da oposição à execução tanto pode resultar da ocorrência de um facto depois do termo do prazo normal de 20 dias a que alude o n.º 1 do mesmo artigo (facto superveniente), como do conhecimento pelo oponente depois desse prazo de um facto que já existia mas que não conhecia (conhecimento superveniente)” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 19-05-2009 (Pº 29153/05.0YYPRT-A.P1, rel. ANTÓNIO GUERRA BANHA).
Conforme se escreveu no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 28-06-2018 (Pº 6952/10.5TBBRG-A.G1, rel. ANTÓNIO BARROCA PENHA): “I- Conforme decorre do disposto no art. 728º, n.º 2, do C. P. Civil, há a possibilidade de instauração de “embargos supervenientes” nos seguintes casos: a) quando o facto que os fundamenta ocorrer depois da citação do executado (superveniência objetiva); b) quando este tiver conhecimento do facto depois da sua citação (superveniência subjetiva). II- Cabe sempre ao embargante a prova dos factos que constituem a superveniência (objetiva ou subjetiva) da matéria da oposição (art. 588º, n.º 2, in fine, do C. P. Civil)”.
Assim, “os embargos supervenientes não devem ser recebidos se tiverem sido deduzidos fora do prazo de 20 dias a contar do dia em que ocorreu o facto que o executado invoca como fundamento da oposição ou do dia em que dele tenha conhecimento o executado (arts. 732/1-a e 728/2, ambos do CPC)” (cfr., o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-09-2019, Pº 3653/09.0TBVFX-A.L1, rel. PEDRO MARTINS).
A contagem do prazo de 20 dias, inicia-se a partir da data em que tiver ocorrido o facto objectivo superveniente fundamento da oposição e a partir da data em que o executado/opoente teve conhecimento (superveniente) desse mesmo facto fundamento da oposição (assim, Lebre de Freitas; A Acção Executiva depois da Reforma, Coimbra ed., 2004, pp. 197-198; Lopes Cardoso; Manual da Acção Executiva, Livraria Almedina, Coimbra, 3.ª ed., p. 294 e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 30-05-2019, Pº 847/15.3T8OER-A.L1-8, rel. CARLA MENDES).
De todo o modo, por regra, a defesa em sede de oposição à execução está sujeita a um princípio de concentração, segundo o qual a defesa ser congregada no meio processual utilizado para o efeito, salvo fundamentos supervenientes. “A própria natureza perentória do prazo para a oposição à execução (artigo 728º, n.º 1, do CPC/2013 e artigo 813º, n.º 1, do CPC/1961), permite retirar, a contrario, a necessidade de concentração da defesa na petição de embargos de executado, excecionada pelos fundamentos supervenientes, pelo que não pode o executado trazer ao processo factos, impugnações e exceções cuja alegação omitira” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 11-03-2021 (Pº 175/12.6TBVRM.G1, rel. JOAQUIM BOAVIDA). Deste modo,“(…) na medida em que a oposição à execução é o meio idóneo à alegação dos factos que em processo declarativo constituiriam matéria de exceção, o termo do prazo para a sua dedução faz precludir o direito de os invocar no processo executivo, a exemplo do que acontece no processo declarativo. A não observância do ónus de excecionar, diversamente da não observância do ónus de contestar ou do de impugnação especificada, não acarreta uma cominação, mas tão-só a preclusão dum direito processual cujo exercício se poderia revelar vantajoso. A preclusão do direito de invocar outras exceções opera no âmbito do processo executivo, sendo inadmissível a posterior dedução de nova oposição, salvo quando ocorra fundamento superveniente (art. 728º-2); mas não opera para além dele. A não utilização dos meios de defesa na execução não preclude a posterior invocação de excepções ao direito exequendo em outras ações (sendo que o efeito preclusivo só se verifica no processo executivo e relativamente aos meios de defesa específicos desse processo) e que, quando utilizados, as decisões de mérito nela proferidas formam caso julgado material apenas quanto às concretas excepções apreciadas, por inexistência na execução de ónus de concentração da defesa” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 16-10-2018 (Pº 158/14.1TBCBR.C1, rel. FALCÃO DE MAGALHÃES).
Assim, tratando-se de um meio de defesa dirigido a uma pretensão executiva expressa no requerimento inicial de execução, traduzindo uma oposição à pretensão executiva, não se compreenderia que fosse admissível ao executado apenas invocar alguns dos fundamentos de defesa e reservar para mais tarde a possibilidade de invocar os restantes fundamentos já existentes à data da apresentação da petição de embargos. A admitir-se tal possibilidade, nenhuma segurança jurídica resultaria da apreciação jurisdicional realizada na oposição à execução, cuja sentença não exerceria uma função estabilizadora, pelo que, a estabilidade só se alcança se toda a defesa contra a pretensão executiva dever ser deduzida no requerimento de embargos, apreciando a respetiva sentença da existência, validade e exigibilidade da obrigação exequenda.
Como refere Rui Pinto (A Ação Executiva, AAFDL, pág. 409), “a necessidade de segurança jurídica e a autorresponsabilidade do executado justificam que a petição inicial se reja pelo princípio da concentração da defesa, previsto no artigo 573º nº 1: toda a defesa do executado deve ser deduzida na oposição à execução. (…) A invocação do nº 1 do artigo 573º não é despicienda: além de evitar quaisquer dúvidas que a mera consideração dos nºs 1 e 2 do artigo 728º pudesse levantar – e, portanto, só há um momento de defesa do executado ao pedido executivo –, ela permite concluir que o executado pode sempre deduzir em defesa separada os incidentes que a lei autorize – por ex., o incidente de suspeição do juiz, dos artigos 120º ss. Já quanto à defesa diferida, a natureza incidental da oposição à execução permite concluir pela inaplicabilidade do nº 2 do artigo 573º; ou seja, esse preceito parece ser destinado à tramitação da acção declarativa, em que a defesa não tem autonomia procedimental e uma defesa posterior pode ser incorporada seja em articulados supervenientes, seja na audiência prévia. Pelo contrário, os dados legais que decorrem implicitamente do nº 2 do artigo 728º são de que, esgotada a oportunidade processual dada pelo nº 1, apenas se admite matéria superveniente, conquanto seja matéria dos artigos 729º a 731º e não outra; a contrario, não pode o oponente trazer factos, impugnações e exceções, perentórias e dilatórias, cuja alegação omitira. Não vale, pois, na oposição à execução, a ressalva final do nº 2 do artigo 573º que admite que na acção declarativa, mesmo depois da contestação, a parte passiva possa alegar exceções de conhecimento oficioso, ainda que não alegadas e não supervenientes”.
Também Lebre de Freitas (A Acção Executiva. À luz do Código revisto, 2ª edição, Coimbra Editora, pág. 158) salienta a existência da aludida preclusão relativamente aos factos não supervenientes: “Na medida em que os embargos de executado são o meio de oposição idóneo à alegação dos factos que em processo declarativo constituiriam matéria de excepção, o termo do prazo para a sua dedução faz precludir o direito de os invocar no processo executivo, a exemplo do que acontece no processo declarativo. A não observância do ónus de excepcionar, diversamente da não observância do ónus de contestar ou do de impugnação especificada, não acarreta uma cominação, mas tão-só a preclusão dum direito processual cujo exercício se poderia revelar vantajoso”.
Revertendo estas considerações para o caso concreto, vemos que, tal como o entendeu o Tribunal recorrido, a pretensão de embargos assenta o seu fundamento na dedução de contestação pela embargada no apenso A, aparecendo na decorrência da dedução desta e da apresentação dos documentos que com ela foram instruídos.
Sucede que, conforme se sublinha na decisão recorrida, face ao título executivo apresentado, o executado já tinha deduzido a competente oposição à execução (e à penhora) por embargos que estão a ser tramitados no apenso A e onde se apurará da existência – ou não – dos fundamentos de oposição invocados pelo executado.
O Tribunal recorrido apreciou a petição de embargos supervenientes no confronto com a causa de pedir configurada pelo requerimento executivo e com o apenso A de embargos, concluindo que, “no caso, o executado/opoente sustenta a presente oposição com base em factos e documentos alegados/juntos com o articulado de contestação aos embargos já deduzidos, sendo que estes mais não constituem do que impugnação motivada à matéria da oposição – concluindo pela respetiva improcedência –, sendo que na parte em que constituam, eventualmente, matéria nova que implique alteração da causa de pedir, não serão, naturalmente, considerados por inadmissibilidade da alteração da causa de pedir”.
Ora, neste ponto, não assiste qualquer reparo a efetuar à decisão recorrida, pois, de facto, a razão de junção do referido documento de 10-01-2014 – e, bem assim, dos demais documentos juntos com a contestação - assentou na invocação, efetuada nos embargos do apenso A, da falta de legitimidade da exequente (cfr. artigos 12.º e 13.º da petição de embargos do apenso A), da invocação da não notificação da cessão de créditos e da não interpelação nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 781.º do CC, bem como, dos demais fundamentos de oposição e nenhuma das questões ora suscitadas – nos presentes embargos - pelo executado era passível de dar lugar ao indeferimento liminar ou ao aperfeiçoamento do requerimento executivo, em termos de dever ser oficiosamente conhecida, nos termos do artigo 726.º do CPC.
Conforme o Tribunal recorrido evidenciou, “a posição das partes nos autos – a forma como as partes configuraram as respetivas pretensões – mostra-se definida no requerimento executivo, oposição à execução e contestação, sendo que tudo aquilo que o extravase não pode ser atendido. Isto sem prejuízo de o executado, na oposição que constitui o apenso A, possa – como, aliás, fez – pronunciar-se sobre o articulado da contestação, maxime no que respeita aos documentos juntos”.
Neste sentido, nenhuma das questões colocadas pelo executado, nos presentes autos, poderia ser objeto de apreciação –oficiosa - nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 734.º, n. 1, do CPC, por não poder ser equacionada, face ao requerimento executivo então apresentado.
E, enquanto possibilidade de exercício de defesa, ou contraditório, face aos documentos juntos pela embargada em sede de contestação, o Tribunal recorrido assinalou – e bem – que não foi excluída uma tal possibilidade, de que, aliás, o executado lançou mão, dizendo o que lhe aprouve, sobre os aludidos documentos.
A lei prevê, de facto, uma via processual para o exercício do contraditório sobre documentos juntos em sede de contestação aos embargos, que o executado utilizou.
Todavia, em face do exposto, não estava era possibilitada ao executado a dedução de embargos, com base numa tal apresentação documental, fora do âmbito da causa de pedir congregada nos aludidos termos, por forma a deduzir outra oposição à execução.
Repare-se, aliás, que, no âmbito da relação material controvertida em discussão no apenso A – em termos genéricos, sobre a exigibilidade e certeza da dívida exequenda – os documentos juntos pela embargada constituem contraprova face aos fundamentos de oposição expressos pelo executado no mencionado apenso A, mas não podem servir de sustentação, para a apresentação de uma nova defesa relativamente a questões que já poderiam ter sido integradas nos primitivos embargos.
Não se vislumbra, pois, ter sido colocado em causa o direito de acesso aos tribunais ou o direito de defesa do recorrente, nem, de algum modo, foi postergado o conteúdo do exercício da função jurisdicional, em face do decidido pelo Tribunal recorrido, não se vislumbrando, igualmente, contrariedade de interpretação e de aplicação relativamente aos demais normativos invocados pelo executado.
Aliás, cumpre sublinhar que o apenso A ainda se encontra pendente e nesse âmbito, com referência à causa de pedir e ao pedido delimitados nesses autos, não se mostra afastada a possibilidade de apreciação das questões suscitadas nos embargos e, bem assim, daquelas que devam ser oficiosamente conhecidas, apreciação essa a ter lugar em sede de prolação da correspondente decisão (cfr. artigo 608.º, n.º 2, do CPC, aplicável, ex vi, do artigo 732.º, n.º 2, do mesmo Código).
Em síntese: Tendo o executado já deduzido oposição à execução, em embargos cuja apreciação se encontra pendente (apenso A), a junção de documentos com a contestação a esses embargos pela embargada, não legitima a dedução de novos embargos supervenientes, mas sim, a pronúncia sobre os mencionados documentos, no âmbito dos primitivos embargos, pronúncia essa que o executado, aliás, exercitou.
Em consequência, improcedem as conclusões em contrário expendidas pelo recorrente.
* B)-Se não podendo os embargos supervenientes ser admitidos, o Tribunal recorrido deveria ordenar a sua tramitação como simples requerimento, mormente para apreciação das questões de conhecimento oficioso, ao abrigo dos princípios da cooperação e da adequação formal, nos termos dos artigos 7.º e 547.º do CPC?
Considera, ainda, o recorrente que, no caso de não admissão dos embargos supervenientes, o Tribunal recorrido deveria ter ordenado o seguimento da sua apreciação, como simples requerimento, com vista ao conhecimento das questões de conhecimento oficioso, ao abrigo dos princípios da cooperação e da adequação formal, nos termos dos artigos 7.º e 547.º do CPC.
Vejamos:
O artigo 8.º do CPC enuncia que “as partes devem agir de boa fé e observar os deveres de cooperação resultantes do preceituado” no artigo 7.º do mesmo Código. Estabelece o referido artigo 7.º do CPC que “1-Na condução e intervenção no processo, devem os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio. 2- O juiz pode, em qualquer altura do processo, ouvir as partes, seus representantes ou mandatários judiciais, convidando-os a fornecer os esclarecimentos sobre a matéria de facto ou de direito que se afigurem pertinentes e dando-se conhecimento à outra parte dos resultados da diligência. 3- As pessoas referidas no número anterior são obrigadas a comparecer sempre que para isso forem notificadas e a prestar os esclarecimentos que lhes forem pedidos, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 417.º. 4- Sempre que alguma das partes alegue justificadamente dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício de faculdade ou o cumprimento de ónus ou dever processual, deve o juiz, sempre que possível, providenciar pela remoção do obstáculo”.
Concretizando a função deste princípio fundamental do processo civil, refere Teixeira de Sousa (“Omissão do dever de cooperação do Tribunal: Que consequências?”, Fevereiro de 2016, disponível em https://www.academia.edu/10210886/TEIXEIRA_DE_SOUSA_M._Omiss%C3%A3o_do_dever_de_coopera%C3%A7%C3%A3o_do_tribunal_que_consequ%C3%AAncias_01.2015_) o seguinte: “a)- O dever de cooperação do tribunal (trata-se, na realidade, de um poder-dever ou de um dever funcional) destina-se a incrementar a eficiência do processo, a assegurar a igualdade de oportunidades das partes e a promover a descoberta da verdade. Este dever de colaboração do tribunal é uma “forma de expressão de um processo civil dialógico”, no qual o tribunal, não só dirige activamente o processo e providencia pelo seu andamento célere (cf. art. 6.º, n.º 1), como também dialoga com as partes e ainda participa da aquisição de matéria de facto e de direito para o proferimento da decisão. O dever de cooperação do tribunal prossegue uma finalidade estabelecida pela lei: esse dever destina-se, como se refere no art. 7.º, n.º 1, a alcançar a justa composição do litígio, o que demonstra que o dever de cooperação está ao serviço da obtenção de uma justa composição do litígio. Isto significa que, estando o processo na disponibilidade das partes e, por isso, não podendo o tribunal substituir-se às partes na definição do seu objecto e na prática de actos processuais, o dever de cooperação tem essencialmente uma função assistencial das partes. Neste enquadramento, o dever se cooperação não pode ser confundido com um poder discricionário do tribunal: não se trata de atribuir ao tribunal um poder para o mesmo utilizar quando entender e como entender, mas de impor ao tribunal um dever de auxílio das partes para que seja atingida a justa composição do litígio” (neste preciso sentido, vd. o Acórdão da Relação de Lisboa de 26-09-2019, relatado pelo ora relator, no processo n.º 312/08.5TBHRT-A.L1).
Por seu turno, nos termos do princípio da adequação formal, ínsito no artigo 547.º do CPC, viabiliza-se ao juiz adotar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos atos processuais ao fim que visam atingir, cabendo no seu exercício a aludida possibilidade de não realização de audiência prévia para os fins de conhecimento integral do mérito da causa, desde que, verificadas as condições, acima mencionadas, para tal efeito.
Não se desconhece, conforme se afirmou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07-04-2016 (Pº 842/10.9TBPNF.P2.S1, rel. LOPES DO REGO) que: “O que identifica a pretensão material do autor, o efeito jurídico que ele visa alcançar, enquanto elemento individualizador da acção, é o efeito prático-jurídico por ele pretendido e não a exacta caracterização jurídico-normativa da pretensão material, a sua qualificação ou subsunção no âmbito de certa figura ou instituto jurídico, sendo lícito ao tribunal, alterando ou corrigindo tal coloração jurídica, convolar para o decretamento do efeito jurídico adequado à situação litigiosa, sem que tal represente o julgamento de objecto diverso do peticionado. Assim, é lícito ao tribunal, através de uma requalificação ou reconfiguração normativa do pedido, atribuir ao A., por uma via jurídica não coincidente com a que estava subjacente à pretensão material deduzida, o bem jurídico que ele pretendia obter; mas já não será processualmente admissível atribuir-lhe, sob a capa de tal reconfiguração da materialidade do pedido, bens ou direitos substancialmente diversos do que o A. procurava obter através da pretensão que efectivamente, na sua estratégia processual, curou de formular”.
Ora, no caso, tendo o executado deduzido já pronúncia sobre os documentos juntos pela embargada, em sede dos embargos de executado que formam o apenso A, assumindo cabalmente a sua posição sobre a junção de tais documentos, não se verifica que, da circunstância de o Tribunal recorrido não ter considerado que a petição de embargos devesse ser apreciada, como requerimento, em tal apenso, decorra, sob qualquer perspectiva, uma omissão do dever de cooperação ou do princípio da adequação formal a que estivesse adstrito, o Tribunal a quo.
Com efeito, no contexto dos autos, deduzida que se encontrava pronúncia sobre os documentos juntos na contestação aos embargos, ali resultando uma configuração das questões a apreciar, de acordo com os fundamentos de embargos e de contestação deduzidos pelas partes, a justa composição do litígio, no âmbito da causa de pedir invocada e delimitada entre a pretensão executiva e o apenso A de embargos, não determinava que a petição de embargos dos presentes autos – com configuração diversa daquela causa de pedir e nessa medida extravasando dos termos do litígio e questões a dilucidar - devesse ter seguimento para apreciação como requerimento, encontrando-se assegurada a observância dos princípios da cooperação e da adequação formal, pelo conhecimento das questões suscitadas a ter lugar nos embargos primitivamente deduzidos.
O invocado pelo recorrente – a este título - deverá, em consequência, soçobrar.
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Em conformidade com o exposto, haverá que julgar improcedente a apelação do executado, ora apelante, mantendo-se, na íntegra, a decisão recorrida.
O apelante - atento o seu integral decaimento – suportará a responsabilidade tributária do recurso interposto – cfr. artigo 527.º do CPC.
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5.–Decisão:
Pelo exposto, acordam os Juízes que compõem o coletivo desta 2.ª Secção Cível, em julgar improcedente a apelação, mantendo-se, na integra, a decisão recorrida.
Custas da apelação pelo executado/apelante.
Notifique e registe.
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Lisboa, 27 de maio de 2021.
Carlos Castelo Branco–Relator (assinado eletronicamente). Lúcia Celeste da Fonseca Sousa–1.ªAdjunta-(assinado eletronicamente). Orlando Santos Nascimento –2.º Adjunto – Votando em conformidade com o decidido – cfr. artigo 153.º, n.º 1, do CPC e artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de maio (declaração do relator).