AMPLIAÇÃO DO PEDIDO
CUMULAÇÃO SUCESSIVA DE PEDIDOS E DE CAUSAS DE PEDIR
ÓNUS DE ALEGAÇÃO E PROVA
Sumário

I – Atento o disposto no artigo 5º, nº3 do CPC, este Tribunal não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, tal como não está sujeito às interpretações que o Autor fez do articulado petição inicial, no que respeita ao facto de ter formulado, ou não, determinado pedido.
II - A ampliação do pedido traduz-se numa modificação objectiva da instância e constitui uma excepção ao princípio da estabilidade da instância consagrado no art. 260º do CPC, sendo um acrescento, um aumento do pedido primitivo, admissível quando representa o desenvolvimento do pedido inicial.
III - De acordo com o disposto no nº 2 do art. 265º do CPC, o Autor pode ampliar o pedido, até ao encerramento da audiência, se essa ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo.
IV - A cumulação sucessiva de pedidos e de causas de pedir prevista no art. 28º do CPT não se confunde com a alteração e ampliação do pedido e da causa de pedir a que se reportam os art.s 264º e 265º do CPC;
V - Tendo em conta a repartição do ónus da prova é ao Autor que cabe alegar e provar ter ocorrido a transmissão de estabelecimento ou, então, a verificação dos pressupostos da responsabilidade solidária.
VI - A maior “dificuldade” de prova não isenta o Autor de alegar os factos que sustentam as situações, que invoca - transmissão de estabelecimento ou responsabilidade solidária – cabendo-lhe, igualmente, e ainda, o ónus de provar os factos alegados.

Texto Integral

Proc. Nº 3376/19.2T8VNG-C.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, V. N. de Gaia - Juízo do Trabalho - Juiz 1
Recorrente: B…
Recorridas: C…, S. A e outra.

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I – RELATÓRIO
Vem o presente recurso interposto de decisão proferida, em sede de despacho saneador, no Proc. nº 3376/19.2T8VNG, acção comum emergente de contrato de trabalho, intentada pelo A., B…, contra as RR., C…, S. A e D…, Ldª, a qual termina requerendo que se: “a) Declare a existência de um contrato individual trabalho, sem termo, entre o Autor e a 1.ª Ré.
ou subsidiariamente,
b) Declare a existência de um contrato individual trabalho, sem termo, entre o Autor e a 2.ª Ré ou um contrato com pluralidade de empregadores com ambas as Rés.
EM QUALQUER DOS CASOS:
c) Sejam as RR condenadas a reintegrar o Autor ao seu serviço, sem prejuízo da antiguidade e categoria, com todas as consequências legais.
d) Nos termos do art. 390.º do CT sejam as RR. condenadas a pagar as retribuições que o A. deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento, o que expressamente se requer.
e) O A. pretende a reintegração, sem prejuízo da faculdade permitida pelo art. 391.º do CT de, em substituição da reintegração, poder optar por uma indemnização, até ao termo da discussão em audiência final de julgamento, cabendo ao tribunal determinar o seu montante, entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no artigo 381º. Se for esse o caso, o A. atenta a gravidade da situação, pede a condenação no pagamento de uma indemnização de 45 dias de retribuição base a multiplicar por 4 anos, 2 meses e 27 dias de antiguidade, na importância de 8.876,70€ (oito mil, oitocentos e setenta e seis euros e setenta cêntimos).
E CONDENAR AS RÉ(S):
f) No pagamento, a título de indemnização por férias não gozadas no valor de 3.896,67€ (três mil oitocentos e noventa e seis euros e sessenta e sete cêntimos).
g) No pagamento de 1.298,89€ (mil duzentos e noventa e oito euros e oitenta e nove cêntimos), a título de subsídio de férias.
h) No pagamento de 1.298,89€ (mil duzentos e noventa e oito euros e oitenta e nove cêntimos), a título de subsídio de Natal.
i) No pagamento do valor de 1.131,20€ (mil cento e trinta e um euros e vinte cêntimos) referente à formação profissional não proporcionada;
j) No pagamento do prémio referente ao 1.º trimestre de 2019 em quantia ainda a liquidar;
k) No pagamento de despesas referentes aos meses de fevereiro e março de 2019, no valor de 230,20€ (duzentos e trinta euros e vinte cêntimos), conforme os mapas habituais que foram remetidos à 2.ª Ré.
l) No eventual pagamento dos 180 dias de diferença entre o tipo de desemprego de trabalhador por conta de outrem ou de trabalhador independente economicamente dependente, que importam um prejuízo para o A. que se contabiliza em 6.536,50€ (seis mil quinhentos e trinta e seis euros e cinquenta cêntimos)
m) No pagamento do valor das contribuições devidas e a regularizar toda a carreira contributiva do A. junto da Segurança Social, ou, em alternativa, consideramos que este Tribunal do Trabalho será competente para condenar as RR. a pagar solidariamente uma indemnização por danos patrimoniais relativos à repercussão pela falta de pagamento das contribuições e quotizações à Segurança Social, designadamente em termos de repercussão na pensão de reforma do A. e respetivo subsídio de desemprego, no caso do mesmo optar pela indemnização em substituição da reintegração, em quantia a liquidar em execução de sentença.
n) Por danos não patrimoniais a quantia de 5.000,00€ (cinco mil euros).
Todos os valores acrescidos de juros moratórios à taxa legal, desde a data em que eram devidos até efetivo e integral pagamento.”.
Para prova dos factos alegados, requereu e indicou entre outras, a seguinte:
Prova documental:
- Os 27 documentos juntos.
- Requer-se a notificação oficiosa das Rés para que demonstrem quantas horas anuais de formação profissional certificada proporcionaram à Autora, desde 5 de junho de 2015 até à presente data, para demonstração do supra-alegado incumprimento. Trata-se de documentos em poder de terceiro, imprescindíveis para a prova da violação do dever de formação.
- Requer-se que a 2.ª Ré seja oficiosamente notificada para juntar os cálculos do prémio do 1.º trimestre de 2019 devido ao aqui A. e que se encontra em dívida, para liquidação do respetivo pedido.
- Requer-se que a 2.ª Ré seja notificada oficiosamente para demonstrar o pagamento de descontos enquanto entidade contratante de prestação de serviços (contratos juntos como docs. 1 a 6, devendo nesse caso à Segurança Social uma taxa contributiva de 10% de todas as importâncias pagas ao A. nas situações em que a dependência económica é superior a 80%. No caso da 2.ª Ré não demonstrar tal pagamento, deverá efetuar-se denúncia oficiosa à Segurança Social desta ilegalidade. Tais descontos são igualmente relevantes para a liquidação do pedido de indemnização por falta de comparticipações para a Segurança Social.
- Requer-se que a 1.ª Ré seja oficiosamente notificada para juntar aos autos cópia dos recibos dos delegados de informação médica que tem ao seu serviço e que indique que benefícios lhe são atribuídos, para que o A. possa conhecer a média de salário que a 1.ª Ré paga aos seus delegados de informação médica e possa validamente efetuar os cálculos das importâncias que considera lhe são devidas.
Tais documentos são essenciais para a liquidação do pedido referente ao trabalho igual / salário igual.
- Requer-se que a 2.ª Ré seja notificada oficiosamente para juntar aos presentes autos cópia dos novos “contratos de prestação de serviços” celebrados após 31 de março de 2019. Conforme alegado em 257.º a 259.º, a 2.ª Ré tendo recebido a reclamação do A. e carta do seu mandatário, alterou a redação dos contratos, consignando que os contratados “delegados de aluguer” reconhecem não ter um contrato de trabalho, renunciando aos seus direitos a reclamar tal pretensão. Tal cláusula, manifestamente nula e abusiva, demonstra bem a atitude da 2.ª Ré, sendo os novos contratos pertinentes e relevantes para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa.
- Finalmente, como mencionado no art. 79.º da p.i. a 2.ª Ré pagava o subsídio de refeição por intermédio de faturas entregues pelos prestadores de serviço de valor superior ao pagamento que fazia, sendo que a empresa 2.ª Ré contabilizava na íntegra, como despesas o valor de tais faturas, sem que tivesse pago as mesmas, situação que deverá ser comunicada oficiosamente à Autoridade Tributária, para que a mesma averigue se estamos ou não perante situação anómala e ilegal.”.

*
Notificadas, contestou a Ré/D…, nos termos que constam a fls. 62 e ss. destes autos, por excepção e impugnação e conclui que deve:
“A) Deve a exceção da incompetência absoluta do Tribunal, por infração das regras de competência em razão da matéria, ser julgada procedente, e por via dela, deve a Ré ser absolvida da instância.
B) Quando assim se não entenda, deve a presente acção ser julgada, quanto à Ré, ora contestante, totalmente não provada e improcedente, com as legais consequências”.
*
E contestou a Ré/C…, nos termos que constam a fls. 106 e ss. destes autos, também, por excepção e impugnação e conclui que, “a petição inicial deverá ser declarada inepta e o presente processo nulo, absolvendo-se a 1.ª Ré da instância;
À cautela, caso assim não se entenda, deve a ação ser julgada totalmente improcedente, por não provada, devendo, em consequência, ser a 1ª Ré absolvida de todos os pedidos contra si formulados.”.
*
Após, nos termos que constam a fls. 117 vº e ss., destes autos, veio o A. deduzir articulado superveniente, onde alega, em síntese, que “1.º O A. teve conhecimento que na semana passada os seus colegas de trabalho na 2.ª Ré D… reuniram com a 1.ª Ré C… (doravante C1…).
2.º Em tal reunião, foi prometido aos colegas de trabalho do A. que a 1.ª Ré C1… assumiria os seus contratos de trabalho, igualando a retribuição mensal com os delegados de informação médica que desempenham as mesmas funções.
3.º Concretizando tal plano, 16 colegas de trabalho do A., alegados “prestadores de serviços” da 2.ª Ré receberam proposta de contrato de trabalho por tempo indeterminado a celebrar com a 1.ª Ré, tendo muitos enviado cartas de denúncia dos contratos de prestação de serviços com a 2.ª Ré.
4.º A 1.ª Ré assume relação laboral com tais trabalhadores desde 1 de julho de 2019, com um salário anual de 26.573,04€ e outras regalias, como sejam, seguro de vida, seguro de saúde, direito de opção na compra de ações (international stock option program) e descontos em produtos da companhia. 5.º Tais propostas de contrato de trabalho estão assinadas pela funcionária da 1.ª Ré E…, HR Manager Portugal.
6.º Tais propostas de contratos de trabalho e denúncias dos contratos de prestação de serviços trata-se de documentos em poder das RR. devendo as mesmas ser notificadas oficiosamente para juntar cópias de tais documentos aos presentes autos para prova do aqui alegado.
7.º Ademais, ao contrário do que a 1.ª Ré afirma na contestação apresentada, é falso que nada tenha a ver com a D… e com a situação descrita nos autos, tendo tal empresa após citação para a presente ação se apressado em regularizar a situação dos 16 trabalhadores que estavam na mesma situação do A.
8.º Na verdade, tal Ré C1… adquiriu parte do negócio da F… (cf. docs. 1 a 4 que se juntam e se dão aqui por integralmente reproduzidos para os devidos e legais efeitos).
(...)”.
Terminando “..., requer-se que seja admitido o presente articulado superveniente, seguindo-se os ulteriores termos.
Mais se requer a condenação da 1.ª Ré a reintegrar o A. com a mesma categoria profissional, retribuições e regalias dos delegados de informação médica que trabalham em tal empresa, designadamente, um salário anual de 26.573,04€ e outras regalias, como sejam, seguro de vida, seguro de saúde, direito de opção na compra de ações (international stock option program) e descontos em produtos da companhia, talqualmente os 16 Colegas do A. que trabalhavam na 2.ª Ré D… e que foram agora admitidos pela 1.ª Ré C1…”.
Além de juntar documentos, pede ainda:
“- Requer-se que a 1.ª Ré seja notificada oficiosamente para juntar aos presentes autos cópias das 16 cartas de proposta de contrato de trabalho e contratos celebrados com os Colegas de trabalho do A., que tinham contratos de prestação de serviços com a 1.ª Ré, para prova do alegado e liquidação do pedido referente ao princípio salário igual / salário igual, violação do princípio da igualdade e não discriminação.
- Requer-se que a 1.ª Ré seja oficiosamente notificada para confirmar que negócio celebrou com a F…, conforme noticiado e autorizado pela Comissão Europeia, designadamente a transmissão de estabelecimento supra alegada, para prova do alegado e para que o A. decida da pertinência de suscitar a intervenção principal provocada da F… que poderá ter responsabilidade solidária nos termos do art. 285.º ou 334.º do CT, consoante o tipo de negócio que se venha a apurar.
- Requer-se que a 2.ª Ré D… seja notificada para juntar aos presentes autos cópias das denúncias dos contratos de prestação de serviços dos 16 colegas do A. que faziam o mesmo tipo de funções, promovendo produtos da F…, para prova do supra alegado e de que a 1.ª Ré assumiu tais trabalhadores, reconhecendo a existência de falsos recibos verdes, tal como foi alegado pelo A. que estava na mesma situação de tais colegas, celebrando com estes contratos de trabalho por tempo indeterminado.”.
*
A este, respondeu a 1ª Ré, pugnando pela inadmissibilidade do articulado superveniente apresentado, quer porque os novos factos aí alegados pelo Autor nos artigos 1º a 5º não se afiguram essenciais para a decisão da causa; quer porque os demais não podem ser qualificados como factos supervenientes, uma vez que o Autor já tinha conhecimento dos mesmos aquando da propositura da acção.
*
A seguir, em 10.09.2019, foi proferido despacho ao abrigo do disposto no art. 61º do CPT, a convidar o A. a apresentar articulado complementar, o qual veio o mesmo apresentar, nos termos que constam a fls. 137 e ss. destes, requerendo “que seja admitido o presente articulado complementar, seguindo-se os ulteriores termos”, junta documentos e mais:
“- Requer-se que a 1.ª Ré seja notificada oficiosamente para juntar aos presentes autos cópias das 16 cartas de proposta de contrato de trabalho e contratos celebrados com os Colegas de trabalho do A., que tinham contratos de prestação de serviços com a 1.ª Ré, para prova do alegado e liquidação do pedido referente ao princípio salário igual / salário igual, violação do princípio da igualdade e não discriminação. Conforme alegado no articulado superveniente e dos contratos de trabalho dos colegas identificados no art. 21.º do presente articulado.
- Requer-se que a 1.ª Ré seja oficiosamente notificada para confirmar que negócio celebrou com a F…, conforme noticiado e autorizado pela Comissão Europeia, designadamente a transmissão de estabelecimento supra alegada, para prova do alegado.”.
*
Em 09.12.2019, foi proferido novo despacho concedendo ao A., “uma nova possibilidade de concretizar a matéria alegada nos art.s 188 e 189 da p.i., o que este fez, nos termos que constam do articulado junto a fls. 145 vº destes autos, o qual termina requerendo “que seja admitido o presente articulado complementar, seguindo-se os ulteriores termos”.
*
Novamente, em 07.07.2020, foi o A. notificado para esclarecer: “a razão pela qual não formulou qualquer pedido relativo à causa de pedir alegada nos art.s 206 a 227 da petição inicial” e, “se, face ao novo pedido formulado no articulado superveniente, mantém interesse naquele outro que na petição inicial fez menção de deduzir”, nos termos que constam, do douto despacho que dada a sua pertinência, para apreciação das questões suscitadas neste recurso, se transcreve: “Quando me preparava para proferir o despacho saneador, constatei a existência de uma questão (da qual não me apercebi anteriormente, pelo que desde já me penitencio) que urge ser esclarecida.
Com efeito, nos artigos 206º a 227º da petição inicial o Autor disserta sobre a violação do princípio “trabalho igual, salário igual” em relação aos trabalhadores que exerciam para a 1ª Ré as funções de delegado de informação médica, após o que menciona a sua intenção de requerer a notificação da Ré para juntar aos autos uma série de recibos de vencimentos desses mesmos trabalhadores, a fim de poder proceder à liquidação do respectivo pedido. Intenção essa que, aliás, reiterou quer na parte final desse mesmo articulado, quer ainda na parte final do articulado complementar que posteriormente juntou (fls. 180 e seguintes do processo em suporte físico), na sequência do convite que lhe foi formulado pelo Tribunal.
Sucede, contudo, que na mesma petição inicial o Autor não formulou qualquer pedido a esse título, isto é, não requereu a condenação das Rés a pagar as quantias que lhe considera serem devidas a esse título, mesmo que estas sejam apenas a liquidar em sede de incidente de liquidação posterior.
Acresce que no articulado superveniente apresentado em 13/06/2019 (fls. 127 e seguintes do processo em suporte físico), o Autor procedeu à formulação expressa de um novo pedido, já liquidado, relativo à condenação da 1ª Ré a atribuir-lhe as mesmas condições que, posteriormente à propositura da acção, foram por esta atribuídas aos seus 16 colegas de trabalho na 2ª Ré.
Ou seja, se bem que também com o mesmo fundamento jurídico do “trabalho igual, salário igual”, estamos aqui perante um novo pedido, que nada tem a ver com aquele que na petição inicial o Autor havia feito menção de pretender deduzir.
Assim sendo, impõe-se que o Autor esclareça cabalmente todo este circunstancialismo, designadamente:
- A razão pela qual não formulou qualquer pedido relativo à causa de pedir alegada nos artigos 206º a 227º da petição inicial;
- Se, face ao novo pedido formulado no articulado superveniente, mantém interesse naquele outro que na petição inicial fez menção de deduzir.”.
O que o A. satisfez, nos termos do articulado junto a fls. 148 vº e ss., que pelas mesmas razões, que se deixaram expostas quanto àquele despacho, se transcreve, em síntese: “1º Na petição inicial apresentada pelo A., bem como no articulado complementar junto posteriormente, entre outras considerações, peticiona-se uma violação do Princípio Trabalho Igual/Salário Igual, porquanto a 1ª Ré não estabelece as mesmas condições de trabalho e remuneração entre os trabalhadores, discriminando negativamente os “delegados de aluguer”, dos delegados de informação médica com contrato de trabalho.
2º O A. desempenha iguais funções quanto à sua natureza, qualidade e quantidade, mas tem dificuldade de prova, atento a que nenhum trabalhador da 1ª Ré quererá testemunhar contra a sua entidade patronal e os documentos requeridos para prova dos factos se encontram em poder de terceiro.
3º Porém, a 1ª Ré não tem qualquer motivo objectivo e válido para discriminar o A. em relação aos colegas que desempenham as mesmíssimas funções.
4º Alegando o A. uma situação de discriminação, nomeadamente, em termos salariais, cabe-lhe indicar os trabalhadores em relação a quem se considera discriminado, provando a discriminação concreta de que é vítima e os factos integrativos do factor de discriminação.
5º Incumbindo à 1ª Ré provar que a diferença de tratamento assenta em critérios objectivos e que não decorre de qualquer factor de discriminação, invertendo-se, assim, o ónus da prova estabelecido.
6º Para que o A. possa provar a discriminação concreta de que é vítima e os factos integrativos do factor de discriminação, requereu na petição inicial a notificação da Ré para juntar aos autos cópia dos recibos de vencimento desses mesmos trabalhadores e a indicação dos beneficiários que lhes são atribuídos, para que pudesse conhecer a média de salário que a 1ª Ré paga aos seus delegados de informação médica e, validamente efectuar os cálculos das importâncias que considera lhe serem devidas.
7º Requereu, ainda, em articulado complementar cópias das 16 cartas de proposta de contrato de trabalho e contratos celebrados com os colegas de trabalho, que tinham contratos de prestação de serviços com a 1ª Ré, de forma a esclarecer qual a discrepância a nível salarial e de benefícios.
8º Tudo isto a fim de proceder à liquidação do respectivo pedido aquando da junção aos autos dos documentos requeridos.
9º Acontece que a 1ª Ré sempre se tentou eximir das suas responsabilidades, negando a entrega ao Tribunal de tais documentos, invocando que os mesmos, seriam irrelevantes para a decisão e por incluírem dados pessoais.
10º A alegação dos factos característicos da discriminação já se encontra feita e é mais patente quando os 16 colegas de trabalho do A., que faziam o mesmo trabalho em termos de quantidade e qualidade, alegados “prestadores de serviços”, da 2ª Ré se encontram presentemente a trabalhar com contrato de trabalho por tempo indeterminado na 1ª Ré.
11º A acção proposta pelo A. teve a virtualidade de a 1ª Ré regularizar a situação com os colegas do A., mas recusa-se a tratar igual o que é igual, não reconhecendo o contrato de trabalho com o aqui A. da mesma forma que fez para com os seus colegas da 2ª Ré D….
12º A Ré assumiu com os colegas de trabalho do A. uma relação laboral desde 1 de Julho de 2019, com um salário anual de 26.573,04€ e outras regalias, como sejam...
13º Por conseguinte, o A. não formulou qualquer pedido na p.i. relativo à causa de pedir alegada, apenas e tão só, porque como explicou na parte final da referida p.i. não lhe era possível liquidar o mesmo, uma vez que não possuía os documentos comprovativos das retribuições dos colegas da 1ª Ré que desempenhavam as mesmas funções que o A., que foram pedidos que fossem juntos aos autos, o que a 1ª Ré se nega a fazer.
14º É que a 1ª Ré protela a entrega de documentos essenciais à causa e que não permitem ao A. liquidar e concretizar o pedido formulado, devendo inverter-se o ónus da prova, pois são documentos em poder de terceiro.
15º Os factos foram já alegados pelo A., carecendo apenas de elementos essenciais para quantificar o pedido relativo à causa de pedir formulada.
16º É a 1ª Ré que age enquanto litigante de má fé procurando entorpecer a descoberta da verdade e encobrindo ao Tribunal factos essenciais à descoberta da verdade.
17º Acresce que, no articulado superveniente apresentado, o A. formulou um novo pedido, já liquidado, requerendo a condenação da 1ª Ré a reintegrar o A. com a mesma categoria profissional, retribuições e regalias dos delegados de informação médica, como sejam, seguro de vida, seguro de saúde, direito de opção na compra de acções e descontos em produtos da companhia ao que pretende agora acrescentar um novo pedido, no sentido de ser o salário indicado pelo A. ou o que se venha a apurar em sede de discussão e julgamento.”.
E, continua concluindo que: “..., explicada a razão porque não formulou pedido na p.i. relativo à causa de pedir nos artigos 206º a 227º da p.i. por falta dos elementos que requereu no final de tal articulado, vem confirmar que relativamente aos factos de tais artigos e os novos factos alegados em articulado superveniente, o pedido que pretende efectuar em adição aos outros da p.i. é o seguinte:
Mais se requer a condenação da 1ª Ré a reintegrar o A. com a mesma categoria profissional, retribuições e regalias dos delegados de informação médica que trabalham em tal empresa, designadamente, um salário anual de 26.573,04€ e outras regalias, como sejam, seguro de vida, seguro de saúde, direito de opção na compra de acções (international stock option program) e descontos em produtos da companhia, talqualmente os 16 colegas do A. que trabalhavam na 2ª Ré D…, que prestavam iguais funções quanto à sua natureza, qualidade e quantidade e que foram contratados pela 1ª Ré C1… ou com o salário e condições que se venham a apurar em audiência de discussão e julgamento ou em incidente de liquidação posterior.”.
*
A R., C1…, veio exercer o contraditório quanto a este, concluindo que: “deve a ação ser julgada totalmente improcedente, por não provada, no que aos pedidos dirigidos contra a 1.ª Ré diz respeito, sem prejuízo de tudo quanto já se alegou, nomeadamente a respeito da ineptidão da petição inicial e desentranhamento do articulado superveniente e complementar.”.
*
No final, após outros requerimentos, quer do A. quer das Rés, em 23.10.2020, foi proferido despacho saneador, onde se fixou o valor da acção em 30.000,01€, por considerar “que a matéria de facto alegada pelas partes nos seus articulados não se reveste de particular complexidade”, absteve-se de convocar uma audiência prévia, bem como de proceder à fixação dos temas de prova e, com interesse para o presente recurso, decidiu o seguinte, que se transcreve:
«- Do articulado superveniente deduzido pelo Autor:
1. Através de requerimento datado de 13/06/2019 (fls. 127 verso e seguintes do processo em suporte físico), o Autor veio apresentar um articulado superveniente, no qual alegou que na semana anterior os seus antigos 16 colegas de trabalho na 2ª Ré reuniram com a 1ª Ré, na sequência do que remeteram à 2ª Ré cartas de denúncia dos contratos de prestação de serviços que com esta mantinham, após o que celebraram com a 1ª Ré contratos de trabalho por tempo indeterminado, com início em 01 de Julho de 2019, e com um salário anual de 26 573,04€ acrescido de outras regalias.
Além disso, alega ainda o Autor ter-se agora apercebido que a aquisição da “F…” pela 1ª Ré constituiu uma verdadeira transmissão de estabelecimento, nos termos e para os fins do artigo 285º do Código do Trabalho.
Em consequência, e porque o Autor entende ter direito a tratamento idêntico aos dos seus referidos colegas, formulou um novo pedido, no sentido de a Ré ser condenada a reintegrá-lo com a mesma categoria profissional, retribuições e regalias dos delegados de informação médica que trabalham em tal empresa, designadamente um salário anual de 26 573,04€ e outras regalias, talqualmente os seus 16 colegas que trabalhavam na 2ª Ré e que foram agora admitidos pela 1ª Ré.
2. A 1ª Ré respondeu (fls. 159 verso e seguintes do processo em suporte físico), pugnando pela inadmissibilidade do articulado superveniente apresentado, quer porque os novos factos aí alegados pelo Autor nos artigos 1º a 5º não se afiguram essenciais para a decisão da causa; quer porque os demais não podem ser qualificados como factos supervenientes, uma vez que o Autor já tinha conhecimento dos mesmos aquando da propositura da acção.
Cumpre decidir (não se afigurando necessária a produção de qualquer meio de prova complementar).
3. O Autor veio apresentar um articulado superveniente.
De acordo com o disposto no artigo 60º nº 3 do Código de Processo do Trabalho (na redacção vigente à data da apresentação do articulado complementar), no processo laboral só são admitidos articulados supervenientes nos termos do artigo 506º do Código de Processo Civil (actual artigo 588º) ou para os efeitos do artigo 28º do Código de Processo do Trabalho.
No caso presente, e embora o Autor nada tenha dito a esse respeito, é de concluir que estamos perante um articulado superveniente para os efeitos do artigo 28º nº 2 do Código de Processo do Trabalho, uma vez que através do mesmo aquele pretendeu expressamente aditar um novo pedido.
Aliás, foi também dessa forma que a 1ª Ré enquadrou o articulado em causa na resposta que apresentou ao mesmo.
Face a este enquadramento, e à posição assumida pela Ré na sua resposta, são duas as questões que se impõe decidir:
- Relevância dos factos alegados nos artigos 1º a 5º de tal articulado.
- Superveniência dos factos alegados nos demais artigos.
No que concerne toca à relevância dos factos alegados nos artigos 1º a 5º, importa ter em consideração que o Autor, com base nos mesmos, formulou expressamente um novo pedido (isto é, ampliou os primitivos pedidos).
Assim sendo, é manifesto que os factos em causa são relevantes, desde logo porque consubstanciam a causa de pedir para o novo pedido formulado.
Saliente-se que todas as considerações expandidas pela 1ª Ré sobre a pertinência deste novo pedido (e também, por maioria de razão, dos novos factos em que o mesmo se estriba) apenas assumem relevância a jusante desta questão, ou seja, já ao nível da apreciação do mérito da causa.
Acresce que em nenhum momento da sua resposta a 1ª Ré impugnou expressamente a superveniência destes factos (ao contrário do que fez com os demais que foram alegados), pelo que é de concluir que os mesmos ocorreram efectivamente na data alegada pelo Autor.
Daí que, independentemente de quaisquer considerações que se possam fazer relativamente à segunda questão invocada pela Ré, sempre seria de admitir o articulado superveniente em causa.
Quanto a esta, contudo, devo frisar que a matéria alegada pelo Autor nos artigos 8º e seguintes do articulado superveniente é irrelevante e inócua, uma vez que não estamos perante factos, no verdadeiro sentido do termo, mas sim perante ou conclusões/dissertações de índole jurídica, relativas à natureza do negócio que terá estado na origem da aquisição da “F…” pela 1ª Ré e às consequências que daí derivam; ou perante a repetição de factos já alegados na petição inicial.
4. Pelo exposto, admito o articulado superveniente apresentado pelo Autor; bem como a ampliação do pedido aí requerida.
Na sequência do despacho proferido em 07/07/2020 (fls. 263 do processo em suporte físico) - no sentido de vir esclarecer a razão pela qual não formulou na petição inicial nenhum pedido relativo à causa de pedir ali alegada nos artigos 206º a 227º; e se, face ao novo pedido formulado no articulado superveniente, mantém o interesse naquele outro que na petição inicial fez menção de deduzir - o Autor veio declarar que:
“Não formulou pedido na petição inicial relativo à causa de pedir ali alegada nos artigos 206º a 227º por falta dos elementos que requereu no final de tal articulado, vem confirmar que relativamente aos factos de tais artigos e os novos factos alegados em articulado superveniente, o pedido que pretende efetuar em adição aos outros da petição inicial é o seguinte:
Mais se requer a condenação da a reintegrar o Autor com a mesma categoria profissional, retribuições e regalias dos delegados de informação médica que trabalham em tal empresa, designadamente um salário anual de 26.573,04€ e outras regalias (…), talqualmente os 16 colegas do Autor que trabalhavam na Ré, que prestavam iguais funções quanto à sua natureza, qualidade e quantidade e que foram contratados pela ou com o salário e condições que se venham a apurar em audiência de discussão e julgamento ou em incidente de liquidação posterior”.
Esforçando-me por compreender devidamente o sentido e alcance desta declaração, duas conclusões se podem dela extrair.
A primeira é a de que o Autor não pretende formular qualquer pedido relativo à factualidade alegada nos artigos 206º a 227º da petição inicial. Ou seja, e para que fique claro, não pretende que a 1ª Ré seja condenada a pagar-lhe a quantia global correspondente à diferença entre a retribuição que auferiu da 2ª Ré durante a vigência do contrato que com esta mantinha e aquela que durante esse mesmo período era paga pela 1ª Ré aos seus trabalhadores que exerciam funções de delegados de informação médica.
Assim, a pretensão do Autor fundada na alegada violação do princípio “trabalho igual / salário igual” apenas se reporta ao período temporal posterior à data da cessação do contrato, que é aquela à qual retroagem os efeitos decorrentes de uma eventual procedência do pedido de reintegração que formula.
Daí que o tribunal não vá tecer quaisquer outras considerações relativas à matéria alegada nos artigos 206º a 227º da petição inicial.
A segunda conclusão a extrair da declaração do Autor, é que ele pretende, ainda que tacitamente, ampliar o novo pedido que formulou no articulado superveniente. Com efeito, e como já referi supra, em tal articulado o Autor apenas pediu a condenação da Ré a reintegrá-lo “com a mesma categoria profissional, retribuições e regalias dos delegados de informação médica que trabalham em tal empresa, designadamente um salário anual de 26.573,04€ e outras regalias, talqualmente os seus 16 colegas que trabalhavam na e que foram agora admitidos pela Ré”.
Porém, no requerimento agora em análise, ele vem agora acrescentar um novo pedido, de natureza alternativa, no sentido de que “a condenação possa ser com o salário e condições que se venham a apurar em audiência de discussão e julgamento ou em incidente de liquidação posterior”.
Ora, é meu entendimento que este aditamento não tem fundamento legal.
Com efeito, o artigo 28º do Código de Processo do Trabalho, relativo à cumulação sucessiva de pedidos e de causas de pedir, dispõe no seu nº 3 que o autor pode deduzir contra o réu novos pedidos, que se reportem a factos ocorridos antes da propositura da acção, desde que justifique a sua não inclusão na petição inicial.
Esta norma foi consagrada pelo Decreto-Lei nº 480/99, de 09/11 (que aprovou a anterior redacção do Código de Processo do Trabalho), tendo posto fim ao regime especial da obrigatoriedade da cumulação inicial de pedidos, que havia sido introduzida pelo Código de Processo do Trabalho de 1963 e mantida no Código de Processo do Trabalho de 1981.
Assim, o autor pode agora aditar novos pedidos, mesmo reportados a causas de pedir assentes em factos anteriores à proposição da acção, desde que, para além de estarem verificados os requisitos processuais previstos no nº 2, ele justifique a razão pela qual não incluiu os factos aditados na petição inicial.
Como escreveu Carlos Alegre, in “Código de Processo do Trabalho Anotado”, 2001, página 119, “(…) a cumulação sucessiva é possível se o autor provar a impossibilidade de haver incluído os pedidos ou causas de pedir a aditar na petição inicial. Se a não inclusão tiver outra justificação que não a aludida impossibilidade da inclusão, não é possível a cumulação sucessiva na acção intentada. Mas é sempre possível a proposição de nova acção”.
Já Abílio Neto, in “Código de Processo do Trabalho Anotado”, 5ª edição, Janeiro de 2011, página 72, refere que “se forem anteriores, a cumulação sucessiva é possível se o autor alegar e provar uma causa justificativa da sua não inclusão na petição inicial; mas se fracassar nessa prova e a pretensão for indeferida pode, em nova acção, fazer valer o pretendido direito”.
Ora, no caso presente é manifesto que, aquando da apresentação do articulado superveniente, nada obstava a que o Autor tivesse desde logo formulado o novo pedido aí deduzido nos termos em que agora o veio fazer. Daí que não se compreenda a razão pela qual só agora decidiu fazê-lo.
Tanto mais, quanto o convite que lhe foi endereçado pelo tribunal nada tinha a ver com a redacção de tal pedido, mas sim com o esclarecimento cabal relativo à pretensão por ele mencionada na petição inicial (e depois não cristalizada em nenhum pedido, mesmo que genérico) de pretender a condenação da 1ª Ré no pagamento de créditos salariais reportados ao período anterior ao da cessação do contrato que manteve com a 2ª Ré.
Assim sendo, apenas resta concluir pela improcedência da ampliação do pedido tacitamente requerida pelo Autor no articulado de fls. 301 e seguintes do processo em suporte físico, consignando aqui expressamente que o pedido que será apreciado pelo Tribunal é o que foi “formulado no articulado superveniente.
*
(...).
- Notifique a 1ª Ré para, em 60 dias, juntar aos autos os documentos pretendidos pelo Autor e identificados no primeiro parágrafo do seu requerimento de prova formulado no articulado superveniente (fls. 129 do processo em suporte físico) ou dizer o que se lhe aprouver sobre tal junção;
- Indefiro integralmente todos os demais pedidos formulados pelo Autor - quer na petição inicial, quer no articulado superveniente, quer no articulado complementar - com vista à notificação das Rés para juntarem aos autos uma série de documentos (fls. 20 verso e 21; fls. 129 verso e fls. 181 do processo em suporte físico), porquanto:
(...);
- Não compete à 2ª Ré “juntar os cálculos do prémio do trimestre de 2019”, sob pena de violação flagrante das regras do ónus de prova. Ao contrário, é ao Autor que, com base nos critérios constantes do contrato celebrado com a 2ª Ré (designadamente os constantes da Cláusula 9ª e do Anexo I ao contrato celebrado em Dezembro de 2018, tal como ele expressamente alega no artigo 31º da petição inicial) cumpre alegar quais as vendas que efectuou e qual o prémio que, em consequência, teria direito a receber. Uma vez demonstrada tal factualidade, cumpre então à 2ª Ré demonstrar que pagou o prémio em causa, assim cumprindo a obrigação que sobre a mesma impendia;
(...);
- Uma vez que o Autor optou por não formular qualquer pedido relativo à causa de pedir alegada nos artigos 206º a 230º, afigura-se inócuo proceder à notificação da 1ª Ré para juntar “a cópia dos recibos dos delegados de informação médica que tem ao seu serviço”;
- (...);
- Não cabe à 1ª Ré “confirmar que negócio celebrou com a F…, uma vez que tal consubstanciaria uma ilícita inversão do ónus de prova. Ao contrário, é o Autor que, com base em todos os documentos e informações que recolheu, cabe alegar e sustentar a existência ou não de alguma transmissão de estabelecimento e extrair daí as consequências processuais que entenda por convenientes e pertinentes;
- (...).»
*
Inconformado o A. interpôs recurso, cujas alegações juntas a fls. 169 e ss., deste apenso, terminou com as seguintes CONCLUSÕES:
………………………………
………………………………
………………………………
*
Respondeu a R., D…, apresentando contra-alegações, nos termos que constam a fls. 181 e ss., destes autos, terminando sem formular conclusões, “EM SÍNTESE,
Pelas razões invocadas supra, no que tange à ora respondente, deve o recurso improceder in tottum.
Assim Vexas decidindo, como de hábito,
Se fará boa e sã, Justiça”.
*
Nos termos que constam do despacho datado de 15.12.2020, o Mº Juiz “a quo” admitiu o recurso, como apelação, a subir em separado e com efeito meramente devolutivo.
Ordenou a instrução do apenso e, após, a sua subida a este Tribunal da Relação do Porto.
*
A Ex.ma Procuradora Geral-Adjunta teve vista nos autos, nos termos do art. 87º nº3, do CPT e emitiu parecer no sentido de o recurso não obter provimento, no essencial, por considerar nada haver a acrescentar ao despacho recorrido e aderir às contra-alegações da 2ª Ré.
*
Cumpridos os vistos legais, nos termos do nº 2, do art. 657º, do CPC, há que apreciar e decidir.
*
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente, cfr. art.s 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, aplicável “ex vi” do art. 87º, nº 1, do Código de Processo do Trabalho, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado.
Assim a questão a apreciar e decidir consiste em saber se, é de admitir a ampliação do pedido e os meios de prova requeridos, como defende o apelante, ou não como concluiu o Tribunal “a quo”.
*
II - FUNDAMENTAÇÃO
A factualidade a atender é a que decorre do relatório que antecede, devidamente documentada nos autos.
*
Vejamos.
No presente recurso, discorda-se da decisão recorrida, quanto ao que se considerou nos seguintes segmentos que, em síntese, se transcrevem:
«(...).
Na sequência do despacho proferido em 07/07/2020 (fls. 263 do processo em suporte físico) - no sentido de vir esclarecer a razão pela qual não formulou na petição inicial nenhum pedido relativo à causa de pedir ali alegada nos artigos 206º a 227º; e se, face ao novo pedido formulado no articulado superveniente, mantém o interesse naquele outro que na petição inicial fez menção de deduzir - o Autor veio declarar que:
“Não formulou pedido na petição inicial relativo à causa de pedir ali alegada nos artigos 206º a 227º por falta dos elementos que requereu no final de tal articulado, vem confirmar que relativamente aos factos de tais artigos e os novos factos alegados em articulado superveniente, o pedido que pretende efetuar em adição aos outros da petição inicial é o seguinte:
Mais se requer a condenação da 1ª Ré a reintegrar o Autor com a mesma categoria profissional, retribuições e regalias dos delegados de informação médica que trabalham em tal empresa, designadamente um salário anual de 26 573,04€ e outras regalias (…), talqualmente os 16 colegas do Autor que trabalhavam na 2ª Ré, que prestavam iguais funções quanto à sua natureza, qualidade e quantidade e que foram contratados pela 1ª Ré ou com o salário e condições que se venham a apurar em audiência de discussão e julgamento ou em incidente de liquidação posterior”.
Esforçando-me por compreender devidamente o sentido e alcance desta declaração, duas conclusões se podem dela extrair.
A primeira é a de que o Autor não pretende formular qualquer pedido relativo à factualidade alegada nos artigos 206º a 227º da petição inicial. Ou seja, e para que fique claro, não pretende que a 1ª Ré seja condenada a pagar-lhe a quantia global correspondente à diferença entre a retribuição que auferiu da 2ª Ré durante a vigência do contrato que com esta mantinha e aquela que durante esse mesmo período era paga pela 1ª Ré aos seus trabalhadores que exerciam funções de delegados de informação médica.
Assim, a pretensão do Autor fundada na alegada violação do princípio “trabalho igual/ salário igual” apenas se reporta ao período temporal posterior à data da cessação do contrato, que é aquela à qual retroagem os efeitos decorrentes de uma eventual procedência do pedido de reintegração que formula.
Daí que o tribunal não vá tecer quaisquer outras considerações relativas à matéria alegada nos artigos 206º a 227º da petição inicial.
A segunda conclusão a extrair da declaração do Autor, é que ele pretende, ainda que tacitamente, ampliar o novo pedido que formulou no articulado superveniente. Com efeito, e como já referi supra, em tal articulado o Autor apenas pediu a condenação da Ré a reintegrá-lo “com a mesma categoria profissional, retribuições e regalias dos delegados de informação médica que trabalham em tal empresa, designadamente um salário anual de 26 573,04€ e outras regalias, talqualmente os seus 16 colegas que trabalhavam na 2ª Ré e que foram agora admitidos pela 1ª Ré”.
Porém, no requerimento agora em análise, ele vem agora acrescentar um novo pedido, de natureza alternativa, no sentido de que “a condenação possa ser com o salário e condições que se venham a apurar em audiência de discussão e julgamento ou em incidente de liquidação posterior”.
Ora, é meu entendimento que este aditamento não tem fundamento legal.
Com efeito, o artigo 28º do Código de Processo do Trabalho, relativo à cumulação sucessiva de pedidos e de causas de pedir, dispõe no seu nº 3 que o autor pode deduzir contra o réu novos pedidos, que se reportem a factos ocorridos antes da propositura da acção, desde que justifique a sua não inclusão na petição inicial.
(...).
Ora, no caso presente é manifesto que, aquando da apresentação do articulado superveniente, nada obstava a que o Autor tivesse desde logo formulado o novo pedido aí deduzido nos termos em que agora o veio fazer. Daí que não se compreenda a razão pela qual só agora decidiu fazê-lo.
Tanto mais, quanto o convite que lhe foi endereçado pelo tribunal nada tinha a ver com a redacção de tal pedido, mas sim com o esclarecimento cabal relativo à pretensão por ele mencionada na petição inicial (e depois não cristalizada em nenhum pedido, mesmo que genérico) de pretender a condenação da 1ª Ré no pagamento de créditos salariais reportados ao período anterior ao da cessação do contrato que manteve com a 2ª Ré.
Assim sendo, apenas resta concluir pela improcedência da ampliação do pedido tacitamente requerida pelo Autor no articulado de fls. 301 e seguintes do processo em suporte físico, consignando aqui expressamente que o pedido que será apreciado pelo Tribunal é o que foi “formulado no articulado superveniente. (sublinhados nossos)
*
(...).
- Notifique a 1ª Ré para, em 60 dias, juntar aos autos os documentos pretendidos pelo Autor e identificados no primeiro parágrafo do seu requerimento de prova formulado no articulado superveniente (fls. 129 do processo em suporte físico) ou dizer o que se lhe aprouver sobre tal junção;
- Indefiro integralmente todos os demais pedidos formulados pelo Autor - quer na petição inicial, quer no articulado superveniente, quer no articulado complementar - com vista à notificação das Rés para juntarem aos autos uma série de documentos (fls. 20 verso e 21; fls. 129 verso e fls. 181 do processo em suporte físico), porquanto:
(...);
- Uma vez que o Autor optou por não formular qualquer pedido relativo à causa de pedir alegada nos artigos 206º a 230º, afigura-se inócuo proceder à notificação da 1ª Ré para juntar “a cópia dos recibos dos delegados de informação médica que tem ao seu serviço”;
- (...)
Como dissemos, deste trecho da decisão discorda o recorrente, defendendo e alegando, em síntese, que no: “despacho saneador é afirmado pelo Tribunal a quo que: “a pretensão do Autor fundada na alegada violação do princípio “trabalho igual/salário igual” apenas se reporta ao período temporal posterior aÌ data da cessação do contrato, que eì aquela aÌ qual retroagem os efeitos decorrentes de uma eventual procedência do pedido de reintegração que formula. Daí que o tribunal não vá tecer quaisquer outras considerações relativas aÌ matéria alegada nos artigos 206º a 227º da petição inicial.”.
Todavia, tal não corresponde à verdade, o A. pretende que a causa de pedir alegada nos artigos 206.º a 227.º da p.i. se reporte a toda a relação de trabalho, após o reconhecimento da existência de contrato de trabalho.
Com efeito, conforme alegado nos referidos artigos, o A. exercia as mesmas funções e tarefas a nível de natureza, duração, intensidade, dificuldade, quantidade e qualidade que qualquer delegado de informação médica da 1.ª Ré
A 1.ª Reì discriminava negativamente os “delegados de aluguer”, dos delegados de informação médica com contrato de trabalho,
A 1.ª Ré discrimina o A. que quer as mesmas condições de trabalho e remuneração dos Colegas delegados de informação médica que estão nos quadros de tal empresa, desde o momento em que é reconhecido o seu contrato de trabalho, como é óbvio e não apenas na data da cessação, como concluiu o Tribunal recorrido.
As entidades empregadoras têm o dever de não diferenciar e discriminar salarialmente os seus trabalhadores, se estes tiverem a mesma categoria profissional e se exercerem iguais funções e tarefas.
(...).
De acordo com aquela norma do n.º 5 do artigo 25.º do Código do Trabalho, quem invoca uma situação de discriminação, nomeadamente, em termos salariais tem apenas de provar a discriminação concreta de que é vítima e os factos integrativos do fator de discriminação referidos no n.º 1 do artigo 24.º, incumbindo depois ao empregador provar que a diferença de tratamento assenta em critérios objetivos e não decorre do fator de discriminação invocado.
(...).
A 1.ª Ré não tinha ou tem qualquer motivo objetivo e válido para discriminar o A. em relação aos Colegas que desempenham as mesmíssimas funções,
Quando o A. desempenha iguais funções quer quanto à sua natureza, qualidade e quantidade.
As prestações laborais em comparação são idênticas, com a existência de violação do princípio de “a trabalho igual salário igual”, o que se pede seja reconhecido por este douto Tribunal.
Face ao exposto, não se entendem as dúvidas do Tribunal expressadas no despacho recorrido, quando depois desta alegação o A. ainda reportou como facto superveniente a situação da 1.ª Ré ter contratado todos os seus Colegas de trabalho (em igual situação de contrato de prestação de serviços com a 2.ª Ré), equiparando-se a estes aos demais trabalhadores da 1.ª Ré que sempre fizeram o mesmo que o A. durante toda a sua relação de trabalho.
Para tal requereu na sua p.i. que a 1.ª Ré fosse oficiosamente notificada para juntar aos autos cópia dos recibos dos delegados de informação meìdica que tem ao seu serviço e que indique que benefícios lhe são atribuídos, para que o A. possa conhecer a meìdia de salário que a 1.ª Reì paga aos seus delegados de informação meìdica e possa validamente efetuar os cálculos das importâncias que considera lhe são devidas.
Tais documentos são essenciais para a liquidação do pedido referente ao trabalho igual /salário igual. Diga-se que o Recorrente identificou tanto quanto possível os documentos relevantes e especificando os factos que através dos mesmos pretendia provar.
E depois requereu que a 1.ª Ré fosse notificada oficiosamente para juntar aos presentes autos cópias das 16 cartas de proposta de contrato de trabalho e contratos celebrados com os Colegas de trabalho do A., que tinham contratos de prestação de serviços com a 2.ª Ré, para prova do alegado e liquidação do pedido referente ao princípio salário igual / salário igual, violação do princípio da igualdade e não discriminação. E ainda, requereu que a 2.ª Ré D… fosse notificada para juntar aos presentes autos cópias das denúncias dos contratos de prestação de serviços dos 16 colegas do A. que faziam o mesmo tipo de funções, promovendo produtos da F…, para prova do supra alegado e de que a 1.ª Ré assumiu tais trabalhadores, reconhecendo a existência de falsos recibos verdes, tal como foi alegado pelo A. que estava na mesma situação de tais colegas, celebrando com estes contratos de trabalho por tempo indeterminado.
(...).
Com todo o respeito, não se percebem as dúvidas do Tribunal recorrido, o direito à retribuição é irrenunciável, dada a situação de subordinação jurídica em que se encontra o trabalhador relativamente ao seu empregador e se o mesmo se compara aos restantes delegados de informação médica da 1.ª Ré, quer salário igual aos mesmos, devendo a mesma pagar a diferença do que o A. recebeu no falso contrato de prestação de serviços, na sequência do alegado princípio trabalho igual/salário igual.
Se um trabalhador tiver um crédito laboral, resultante da diferença entre a retribuição que lhe deveria ser paga pelo empregador e aquela que efetivamente lhe foi paga, a 1.º Ré deve ser condenada no pagamento desse crédito, desde a data em que seja reconhecido o contrato de trabalho com a 1.ª Ré.
Conforme afirma o despacho saneador, na sequência do despacho proferido em 07/07/2020 (fls. 263 do processo em suporte físico) - no sentido de vir esclarecer a razão pela qual não formulou na petição inicial nenhum pedido relativo aÌ causa de pedir ali alegada nos artigos 206º a 227; e se, face ao novo pedido formulado no articulado superveniente, manteìm o interesse naquele outro que na petição inicial fez menção de deduzir - o Autor veio declarar que:
NaÞo formulou pedido na petiçaÞo inicial relativo aÌ causa de pedir ali alegada nos artigos 206º a 227º por falta dos elementos que requereu no final de tal articulado”.
O A. peticionou várias vezes os documentos mencionados para poder concretizar o seu pedido relativamente à matéria alegada nos artigos 206.º a 227.º da p.i. e explicitou ao Tribunal que tinha dificuldade em saber o que os Colegas Delegados de Informação Médica da 1.ª Ré auferem, sendo que são documentos em poder de parte contrária que justificariam sempre o pedido probatório.
Os documentos são aqueles que, para além de estarem na posse da parte contrária, são relevantes para a prova dos factos, especificados pela parte e com interesse para a decisão da causa, e para a concretização do pedido que o Tribunal ordenou o A. a fazer, sem dispor dos concretos elementos requeridos.
Há uma relação direta e necessária entre os documentos requeridos e os factos cuja prova se pretende fazer através deles. Por outras palavras, a identificação dos documentos na posse da parte contrária cuja junção se pede está diretamente relacionada e dependente com a concretização do pedido da causa de pedir alegada nos artigos 206.º a 207.º, logo, só poderia ser efetuada com certeza após a junção dos documentos que sejam suscetíveis de contribuírem para esse efeito.
Ainda assim, o A. tentou cumprir o pedido do Tribunal tendo por base a retribuição e regalias dos 16 Colegas que trabalhavam consigo na 2.ª Ré que foram oferecidas pela 1.ª ré na sua contratação e tentou concretizar o pedido conforme foi ordenado, através da informação de um ex-Colega de trabalho. Todavia, os Delegados de Informação Médica da 1.º Ré podem estar a ganhar mais que os ex-colegas de trabalho que foram contratados pela 1.ª Ré.
Destarte, o A. mantém a dúvida de quanto ganhavam os Colegas Delegados de Informação Médica que já trabalhavam na 1.ª Ré antes desta contratação dos seus Colegas o que motivou a que deixasse em aberto um pedido alternativo de “ condenaçaÞo com o salaìrio e condiçoÞes que se venham a apurar em audiência de discussaÞo e julgamento ou em incidente de liquidaçaÞo posterior”.
Pelo que não pode concordar com a improcedência da ampliaçaÞo do pedido requerido pelo Autor no articulado de fls. 301 e seguintes do processo em suporte fiìsico, conforme foi decidido pelo Tribunal, nem que o mesmo considere que o pedido do A. não incluiu a condenação da 1.ª Ré no pagamento da quantia global correspondente à diferença entre a retribuiçaÞo que este auferiu na 2.ª Ré durante a vigência da “falsa prestaçaÞo de serviços” e aquela que durante esse mesmo periìodo era paga pela Ré aos seus trabalhadores que exerciam funções de delegados de informação médica. É este o pedido que o A. pretende efetuar.
Requer-se assim a mediação deste Venerando Tribunal da Relação do Porto para que revogue o despacho saneador, permitindo que o A. mantenha o pedido nos termos formulados:
“Mais se requer a condenação da 1.ª Reì a reintegrar o A. com a mesma categoria profissional, retribuições e regalias dos delegados de informação médica que trabalham em tal empresa, designadamente, um salário anual de 26.573,04€ e outras regalias, como sejam, seguro de vida, seguro de saúde, direito de opção na compra de ações (international stock option program) e descontos em produtos da companhia, talqualmente os 16 Colegas do A. que trabalhavam na 2.ª Reì D…, que prestavam iguais funções quanto à sua natureza, qualidade e quantidade e que foram contratados pela 1.ª Reì C1… ou com o salário e condições que se venham a apurar em audiência de discussão e julgamento ou em incidente de liquidação posterior”, permitindo que se acrescente para que não subsistam dúvidas que a condenação da 1.ª Ré no pagamento da quantia global correspondente à diferença entre a retribuição que o A. auferiu na 2.ª Reì durante a vigência da “falsa prestação de serviços” e aquela que durante esse mesmo período era paga pela Ré aos seus trabalhadores que exerciam funções de delegados de informação médica se reporta a toda a duração do contrato, como não poderia deixar de ser e não só ao período temporal posterior à data da cessação do contrato, isto não faz qualquer sentido.
O juiz deve condenar em quantidade superior ao pedido ou em objeto diverso dele quando isso resulte da aplicação das alegações efetuadas e da matéria provada, ou aos factos de que possa servir-se, pelo que deferindo os meios de prova requeridos pelo Recorrente terá de aceitar o pedido alternativo formulado pelo A.
A ampliação do pedido é processualmente admissível se for consequência ou desenvolvimento do pedido primitivo. Compreendendo-se a ampliação virtualmente na mesma causa de pedir invocada, aquela não pode deixar de ser admissível quando foi explicado (mais que uma vez) pelo A. que aguardava os elementos de prova requeridos para conseguir liquidar tal pedido. Estando em causa a compatibilização do princípio da estabilidade da instância com o princípio da economia processual, dá-se prevalência a este último quando se verificam reais vantagens na solução definitiva do conflito num único processo, desde que a relação material controvertida seja essencialmente a mesma, assente na mesma causa de pedir.
Não se concorda assim com a improcedência da ampliação do pedido requerida pelo Autor no articulado de fls. 301 e seguintes do processo em suporte físico.
Vejamos, então.
Comecemos pelo que o A. reitera, nesta sede e alegou na p.i., ou seja: “A 1.ª Ré não tinha ou tem qualquer motivo objetivo e válido para discriminar o A. em relação aos Colegas que desempenham as mesmíssimas funções, 226.º Quando o A. desempenha iguais funções quer quanto à sua natureza, qualidade e quantidade. 227.º As prestações laborais em comparação são idênticas, com a existência de violação do princípio de “a trabalho igual salário igual”, o que se pede seja reconhecido por este douto Tribunal. 228.º Condenando a Ré a pagar as diferenças retributivas entre o salário do A. e a última retribuição dos Colegas, requerendo-se que a Ré seja oficiosamente notificada para juntar aos autos cópia dos recibos de tais trabalhadores e que indique que benefícios lhe são atribuídos, para que o A. possa conhecer a média de salário que a 1.ª Ré paga aos seus delegados de informação médica e possa validamente efetuar os cálculos das importâncias que considera lhe são devidas. 229.º O A. fará a liquidação do seu pedido assim que a Ré junte aos presentes autos cópia de tais recibos. 230.º Sendo que tais trabalhadores beneficiam de outras regalias e benefícios que a 1.ª Ré deve ser condenada a conceder ao aqui A.,”.
Antes de mais, importa dizer que este Tribunal não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito – artigo 5º, nº3 do CPC – como não está sujeito às interpretações que o Autor fez do articulado petição inicial, no que respeita ao facto de ter formulado, ou não, determinado pedido.
Analisando.
Verifica-se que o Autor, relativamente à causa de pedir “trabalho igual/salário igual”, não concluiu, na parte final da petição inicial, por um pedido genérico, como o permite o art. 556º, do CPC, aplicável por força do disposto no art. 1º, nº2, al. a) do CPT. Contudo, como decorre do que deixamos acima sublinhado, o Autor não deixou de formular tal pedido no artigo 228º e no artigo 229º da sua petição, requerendo a sua posterior liquidação, o que é permitido pelo disposto no art. 358º do CPC. Ou seja, o Autor acaba por formular pedido genérico relativamente ao diferenciado tratamento entre ele e os seus colegas, vinculados à 1ª Ré por contrato de trabalho, reportando essa diferenciação ao período de vigência do seu contrato. É verdade que o pedido genérico formulado pelo Autor não obedeceu, formalmente, à prática seguinte: de que a petição inicial termina pela formulação de todos os pedidos assentes em causas de pedir expostos no corpo da petição inicial.
Mas, trata-se apenas de uma questão de ordem formal que, com o devido respeito, não conduz à conclusão a que chegou o Tribunal recorrido (de que o Autor não tinha pedido que o alegado tratamento desigual fosse tido em conta também durante a vigência do seu contrato). Assim, em homenagem ao princípio estabelecido no art. 3º do CPC, concluímos que tal pedido genérico foi formulado, ainda que no corpo da petição inicial e não na sua parte final, e como tal é admissível.
Por isso, não pode manter-se o despacho recorrido quando afirma “Assim, a pretensão do Autor fundada na alegada violação do princípio “trabalho igual/ salário igual” apenas se reporta ao período temporal posterior à data da cessação do contrato, que é aquela à qual retroagem os efeitos decorrentes de uma eventual procedência do pedido de reintegração que formula”.
Passemos, então, agora ao pedido “tácito” a que se refere o Tribunal “a quo” e que o Autor formulou no seu requerimento de folhas 301 e seguintes, quando aí refere, “Mais se requer a condenação da 1ª Ré a reintegrar o A. com a mesma categoria profissional, retribuições e regalias dos delegados de informação médica que trabalham em tal empresa, designadamente, um salário anual de 26.573,04€ e outras regalias, como sejam, seguro de vida, seguro de saúde, direito de opção na compra de acções (international stock option program) e descontos em produtos da companhia, talqualmente os 16 colegas do A. que trabalhavam na 2ª Ré D…, que prestavam iguais funções quanto à sua natureza, qualidade e quantidade e que foram contratados pela 1ª Ré C1… ou com o salário e condições que se venham a apurar em audiência de discussão e julgamento ou em incidente de liquidação posterior.”.
O Autor pediu – no articulado superveniente – a sua reintegração na 1ª Ré com as condições salariais e demais regalias dos seus colegas que entretanto foram admitidos pela 1ª Ré com contrato de trabalho e que anteriormente eram, como o Autor, “prestadores de serviços”. Tal pedido foi admitido pelo Tribunal a quo, não sendo aqui objecto de recurso tal segmento da decisão.
Ora, e sempre com base no princípio do “trabalho igual/salário igual”, o Autor pretende que a sua reintegração seja feita com observância no mesmo princípio, ou seja, deve ele, se for reintegrado, auferir das mesmas condições salariais que os seus colegas com quem a 1ª Ré celebrou, recentemente, contrato de trabalho. Pois bem, se acaso ficar provado que o Autor presta trabalho da mesma natureza, quantidade e qualidade que os seus colegas – sejam eles os que já mantinham um contrato de trabalho com a 1ª Ré, ou aqueles que anteriormente se encontravam nas condições do Autor – necessariamente que o Tribunal “a quo”, deve, oficiosamente, definir os termos em que essa “reintegração” será feita a nível salarial, quer seja segundo o que o Autor alegou ou aquilo que se apurar em sede de audiência de discussão e julgamento. Deste modo, defendemos que o aludido pedido “tácito” mais não é do que a ampliação do pedido formulado no articulado superveniente, ou melhor dizendo, a sua consequência, tendo em conta o poder/dever do Tribunal “a quo” na procura da verdade material.
E sendo uma consequência do primitivo pedido (formulado no articulado superveniente) – art. 265º, nº2 do CPC – é o mesmo admissível, pelos fundamentos ora referidos e atento o entendimento que deixámos expresso no (Acórdão deste mesmo colectivo, de 19 de Abril de 2021, Proc. n.º 169/20.8T8MAI-A.P1, para publicação in www.dgsi.pt), que se transcrevem: «Comecemos por referir que, como é sabido, o processo tem o seu início com a apresentação da petição inicial em juízo constituindo-se assim a instância como relação jurídica entre o autor, que é quem solicita a tutela jurisdicional e o tribunal, atenta uma situação de violação de um direito, uma ameaça de violação, a incerteza sobre a existência ou o conteúdo de um direito ou dever ou sobre a verificação de um facto jurídico ou a vontade de exercer um direito potestativo, que só judicialmente possa ser exercido e, assim, o autor requer a providência jurisdicional adequada e formula o pedido. Pedido que, conforma o objecto do processo e condiciona o conteúdo da decisão a proferir em juízo.
Mas, como é também sabido, ao autor não basta formular o pedido, tem também de o fundamentar, conforme decorre do art. 552º, nº 1 al. d) do CPC (Código de Processo Civil, diploma a que pertencerão os demais artigos a seguir referidos, sem outra indicação de origem - aqui, aplicável ex vi do art. 1º, nº 2, al. a), do CPT), indicando os factos constitutivos da situação jurídica que pretende fazer valer ou negar, ou integrantes do facto cuja existência ou inexistência afirma, os quais constituem a causa de pedir que corresponde “ao núcleo fáctico essencial tipicamente previsto por uma ou mais normas como causa do efeito material pretendido”, como refere, (José Lebre de Freitas, in A Acção Declarativa Comum, Coimbra Editora, 2000, pág. 37).
Causa de pedir que, como dizia (Vaz Serra, in RLJ, 109º, pág. 313), “é o facto jurídico concreto ou específico invocado pelo autor como fundamento da sua pretensão (…) que se destina, além do mais a impedir que seja o demandado compelido a defender-se de toda e qualquer possível causa de pedir, só tendo de se defender da concretamente invocada pelo autor…”. Tal, é decorrência da opção do legislador pela teoria da substanciação plasmada no art. 581º que, como diz, (Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, vol. I, 2ª ed., revista e ampliada, pág. 193) “implica para o autor a necessidade de articular os factos de onde deriva a sua pretensão, formando-se o objecto do processo e, por arrastamento, o caso julgado, apenas aos factos integradores da causa de pedir invocada”.
Em suma, à luz do nº 4 do art. 581º, aliás, conforme doutrina e jurisprudência, entre nós, largamente maioritárias, considera-se como causa de pedir a factualidade, afirmada pelo A., de que se faz derivar o efeito jurídico pretendido. E, como referido, de acordo com a teoria da substanciação subjacente àquele normativo, essa factualidade terá de traduzir o facto gerador do direito ou da pretensão invocada, de modo a individualizar o objecto do processo e a prevenir assim a repetição da mesma causa.
Quer a doutrina quer a jurisprudência têm entendido, uniformemente, que a petição inicial deve apresentar-se sob a forma de um silogismo, estabelecendo, assim, um nexo lógico entre as premissas e a conclusão.
Nesse silogismo a premissa maior é constituída pelas razões de direito invocadas e a premissa menor pelas razões de facto e o pedido corresponderá à conclusão daquele silogismo.
E apresentada, a petição inicial é dada a conhecer ao réu através da citação e a partir desse momento a instância torna-se estável quanto às pessoas e quanto ao objecto.
A este respeito, o art. 260º sob a epígrafe “Princípio da estabilidade da instância” dispõe que, “Citado o réu a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei”.
Excepções que, relativamente ao pedido e causa de pedir se encontram enunciadas nos art.s. 264º e 265º, sob a epígrafe de “Alteração do pedido e da causa de pedir...”, respectivamente, “...por acordo” e “...na falta de acordo”.
Com efeito, (cfr. art. 264º) quanto à alteração ou ampliação do pedido e da causa de pedir, a lei admite-as “por acordo das partes” em qualquer altura, em 1ª ou 2ª instância, “salvo se a alteração ou ampliação perturbar inconvenientemente a instrução, discussão ou julgamento do pleito”
“Na falta de acordo”, (cfr. art. 265º, nº1) a causa de pedir só pode ser alterada ou ampliada “em consequência de confissão feita pelo réu e aceita pelo autor,...”, ou se estiverem em causa factos supervenientes, isto é, factos que tenham ocorrido ou sido conhecidos depois da apresentação da petição inicial, (cfr. art. 588º, nº1).
Mas, o nº 2, daquele art. 265º, dispõe que, o autor pode ampliar o pedido “até ao encerramento da discussão em 1ª instância se a ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo”.
E, atento o estipulado no nº6, do mesmo artigo, o pedido e a causa de pedir podem ser modificados simultaneamente, por ampliação ou alteração, “...desde que tal não implique convolação para relação jurídica diversa da controvertida”.
Como referem (Rita Lobo Xavier, Inês Folhadela e Gonçalo Andrade e Castro, in Elementos de Direito Processual Civil. Teoria Geral, Princípios e Pressupostos, 2ª ed., pág. 160), “Preside aqui o princípio da economia processual que, ante a instrumentalidade do processo relativamente ao direito material, converge no sentido de que o resultado seja atingido com a maior economia de meios, dirimindo no processo o maior número de litígios”.
Em conclusão, nos termos do art. 265º, nº 2, na falta de acordo entre as partes, como sucede, no caso em apreciação, qualquer tipo de modificação do pedido é legalmente admissível desde que seja o desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo.
Dispositivos aplicáveis, no caso, (cfr. o, já referido, art. 1º, nº 2, al. a), do CPT), pese embora, a norma do processo laboral, art. 28º do CPT que, sob a epígrafe “Cumulação sucessiva de pedidos e de causas de pedir”, enuncia que:
“1 – É permitido ao autor aditar novos pedidos e causas de pedir, nos termos dos números seguintes:
2 – Se até à audiência de discussão e julgamento ocorrerem factos que permitam ao autor deduzir contra o réu novos pedidos, pode ser aditada a petição inicial, desde que a todos os pedidos corresponda a mesma espécie de processo.
3 – O autor pode ainda deduzir contra o réu novos pedidos, nos termos do número anterior, embora esses pedidos se reportem a factos ocorridos antes da propositura da acção, desde que justifique a sua não inclusão na petição inicial.
4 – (…)”.
No entanto, ao contrário do que na decisão recorrida se considerou, este preceito (apesar de ser norma específica do processo de trabalho), regula sobre a cumulação sucessiva de novos pedidos, quanto à ampliação do pedido (o que está em causa nos autos, como bem o nota o recorrente nas suas alegações) importa ter presente o disposto naqueles art.s 264º e 265º.
Porque, a cumulação sucessiva de pedidos e de causas de pedir prevista naquela norma do Código de Processo do Trabalho não se confunde com a alteração e ampliação do pedido e da causa de pedir a que se reportam aqueles artigos do Código de Processo Civil.
O Professor (Alberto dos Reis in Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. 3º, Coimbra Editora, 1946, pág. 94) faz a distinção entre a espécie “cumulação” da espécie “ ampliação”, referindo que para isso, “há que relacionar o pedido com a causa de pedir”.
E, continua, “a ampliação” pressupõe que, dentro da mesma causa de pedir, a pretensão primitiva se modifica para mais; a “cumulação” dá-se quando a um pedido, fundado em determinado facto, se junta outro, fundado em ato ou facto diverso.”.
Todavia, quando essa transformação importe a alegação de factos novos, esta só pode ter lugar se eles forem supervenientes, isto é, quando ocorram ou sejam conhecidos posteriormente aos articulados, nos termos e prazos previstos para o articulado superveniente (art. 588º).
Pois, como defende (Lebre de Freitas, in ‘Introdução ao Processo Civil’, pág. 29, nota 30), quando a ampliação importe a alegação de factos novos, só pode ter lugar se estes forem supervenientes segundo o conceito dado pelo nº 2 do art. 588º do CPCN, e forem alegados nos termos e prazos previstos no nº 3 do mesmo preceito.
Mas, sobre a ampliação do pedido, como é o caso, estabelece o nº 2 do art. 265º, decorrendo do mesmo que, no que àquela ampliação diz respeito, o Autor pode fazer essa ampliação, até ao encerramento da audiência e pode se essa ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo.
De qualquer modo, sempre a ampliação do pedido “há-de estar contida virtualmente no pedido inicial”, pois que, se “o autor não se mantém dentro do mesmo acto ou facto jurídico, não desenvolve ou aumenta o pedido anterior, formula um pedido com individualidade e autonomia perfeitamente diferenciada dos pedidos primitivos”, como diz (Alberto dos Reis, na obra citada, pág.s 93 e 95).
A ampliação pode, por conseguinte, envolver a formulação de um pedido diverso, neste sentido, vejam-se entre outros, os (Acórdãos do TRE de 10.11.2015 e de 10.10.2019 in www.dgsi.pt).
Ponto é que tal pedido e o pedido primitivo tenham essencialmente causas de pedir, senão totalmente idênticas, pelo menos integradas no mesmo complexo de factos.
(...).».
*
Transpondo o exposto para o caso, como já dissemos, só podemos concluir pela admissibilidade do aludido pedido “tácito”.
Em nosso entendimento, o mesmo tem fundamento legal, contrariamente, ao que considerou o Mº Juiz “a quo” e, em consequência, como defende o recorrente o despacho recorrido não pode manter-se no segmento em que julgou improcedente a ampliação do pedido requerido a fls. 301 e seguintes do processo físico.
E, consequentemente, sem necessidade de outras considerações, pronunciando-nos já, quanto à parte da decisão que se refere ao indeferimento de meios de prova requeridos pelo A. Recorrente, há que revogar o segmento daquela na medida em que não admitiu o requerimento do A. para notificar a 1.ª Ré para juntar “a cópia dos recibos de vencimento dos delegados de informaçaÞo médica ao seu serviço”, por se lhe afigurar “inócuo”.
Indeferimento do qual e bem discorda o recorrente defendendo e alegando que: “Reitera-se aqui o alegado quanto ao pedido relativo à causa de pedir alegada nos artigos 206.º a 230.º e nesse sentido recorre-se igualmente do despacho de não admissão do requerimento para notificar a 1.ª Reì para juntar “a cópia dos recibos de vencimento dos delegados de informação meìdica ao seu serviço”, para a determinação o pedido relativo a salário igual/trabalho igual e para o pedido alternativo que o A. efetuou e que foi na sua opinião indevidamente indeferido.
Como se explicou, o Tribunal a quo não fez um correto juízo e ao aperceber-se das deficiências não deveria ter decidido imediatamente tirando delas fatais consequências para a parte responsável, aqui Recorrente, sem antes o convidar a tirar as dúvidas de interpretação que manifesta no seu despacho saneador, no exercício do dever de cooperação que recai também sobre os tribunais como órgãos de administração da justiça.
Com todo o respeito, há que ter em conta que (há muito) a lei confere ao juiz laboral um papel mais ativo do que aquele que, em geral, era atribuído ao juiz comum. Trata-se de um verdadeiro poder-dever de convidar as partes a completar e corrigir os articulados quando, no decurso do processo reconheça que faltam alguns elementos. Existe esse poder-dever, e recorre-se quanto ao indeferimento do meio de prova requerido.”.
Razão porque, como já dissemos, para a determinação do pedido relativo a salário igual/trabalho igual e para o pedido alternativo que o A. efectuou e que nesta sede considerámos procedente, há que julgar, também, procedente este aspecto da apelação.
Pois, tendo em conta o já decidido neste acórdão há que admitir a notificação das Rés nos termos requeridos pelo Autor no que respeita à junção de documentos que o Autor pretende com vista a fundamentar a causa de pedir baseada no “trabalho igual/salário igual”.
Ou seja, quando diz: “- Requer-se que a 1.ª Ré seja oficiosamente notificada para juntar aos autos cópia dos recibos dos delegados de informação médica que tem ao seu serviço e que indique que benefícios lhe são atribuídos, para que o A. possa conhecer a média de salário que a 1.ª Ré paga aos seus delegados de informação médica e possa validamente efetuar os cálculos das importâncias que considera lhe são devidas.”.
*
Prossigamos, então, na análise do segmento do recurso na parte em que o A. recorrente se insurge, contra o indeferimento dos outros meios de prova, em concreto, “- Requer-se que a 2.ª Ré seja oficiosamente notificada para juntar os cálculos do prémio do 1.º trimestre de 2019 devido ao aqui A. e que se encontra em dívida, para liquidação do respetivo pedido.” e
“- Requer-se que a 2.ª Ré D… seja notificada para juntar aos presentes autos cópias das denúncias dos contratos de prestação de serviços dos 16 colegas do A. que faziam o mesmo tipo de funções, promovendo produtos da F…, para prova do supra alegado e de que a 1.ª Ré assumiu tais trabalhadores, reconhecendo a existência de falsos recibos verdes, tal como foi alegado pelo A. que estava na mesma situação de tais colegas, celebrando com estes contratos de trabalho por tempo indeterminado.”.
Defende e alega que: “Do mesmo modo, não se aceita que seja indeferido o requerimento para que a 1.ª Ré seja oficiosamente notificada para confirmar que negócio celebrou com a F…, conforme noticiado e autorizado pela Comissão Europeia, designadamente a transmissão de estabelecimento alegada, para prova do alegado e para que o A. decida da pertinência de suscitar a intervenção principal provocada da F… que poderá ter responsabilidade solidária nos termos do art. 285.º ou 334.º do CT, consoante o tipo de negócio que se venha a apurar.
Ora, entendemos que tal documento em poder de parte contrária (não é usual os trabalhadores terem acesso ao documento de transmissão da unidade de negócio e a 1.ª Ré em litigância de má-fé nunca confirmou a mesma) é essencial para a boa decisão da causa e por outro lado, o A. justificou que tal documento era também fundamental para que este decida acerca da pertinência de suscitar a intervenção principal provocada da F… que poderá ter responsabilidade solidária nos termos do art. 285.º ou 334.º do CT, consoante o tipo de negócio que se venha a apurar.
Não é possível que o Tribunal recorrido possa ignorar este fundamento do A. que poderia ter um reforço de garantia dos seus créditos e que por um despacho discricionário, deixa de o poder fazer e, uma vez mais. Só o consegue fazer com a certeza do negócio que foi efetivamente celebrado entre a 1.º Ré e a F….
Por fim, o A. também não aceita o indeferimento da notificação oficiosa da 2.ª Ré para juntar os cálculos do prémio do 1.º trimestre de 2019 devido ao aqui A. e que se encontra em dívida, para liquidação do respetivo pedido, porquanto, a A. não tem acesso às vendas que efetuou, tal documento está em poder da 2.ª Ré.
Com todo o respeito, o A. entende que o direito fundamental à prova implica que as partes tenham liberdade para demonstrar quaisquer factos, que possuam ou não o respetivo ónus da prova, desde que entendam que a sua comprovação diminuirá os seus riscos processuais, como acontece com o aqui A. e aceitando o douto despacho saneador quanto aos outros elementos de prova que foram requeridos, é obrigado a discordar destes três pontos que são para si indispensáveis e para a demonstração que pretende fazer dos factos que alegou.
Tais requerimentos probatórios são necessários ao esclarecimento da verdade, para a estratégia processual a ser seguida pelo A. (intervenção principal provocada da F…) e prende-se com a prova dos factos alegados pelo A.. Tratando-se de um meio de prova, a sua função é a demonstração da realidade dos factos (cf. art. 341.º do CC), ou seja, o objetivo é alcançar a verdade material subjacente à relação material controvertida configurada pelo quadro factual alegado pelas partes.

Reiteramos, que o mecanismo previsto no artigo 429.º, do CPC – de notificação da parte contrária para apresentação de documento que se encontre em poder desta –, poderá ser utilizado não só por aquele sobre o qual recai o ónus da prova, mas igualmente para efeitos de infirmar a prova de factos de que o detentor tenha o ónus.
O facto de tal mecanismo estar dependente da verificação de determinados requisitos, destinados a aferir da pertinência e utilidade da junção requerida, não constituiu uma limitação ao direito de defesa ou uma violação do direito à prova.
Concluindo-se, assim, que não havia razão para o indeferimento destas duas diligências probatórias requeridas e concedendo procedência à apelação, devem os Venerandos Desembargadores revogar as decisões do despacho saneador aqui impugnadas que devem ser substituídas por outras que ordene a notificação da 1.ª Ré para junção dos documentos requeridos pela A./Recorrente.”.
*
Entendimento que a 2ª Ré não perfilha, como decorre da resposta às alegações, onde defende: “Do objeto do recurso e da motivação que suporta as Alegações apresentadas pelo Apelante B…, no que tange à 2ª Ré, aqui recorrida, D…, Lda., pretende o recorrente que seja provida, e nessa parte revogado o douto despacho, a matéria constante da 18ª conclusão, ou seja, como nela se contém: “Por fim, o A. também não aceita o indeferimento da notificação oficiosa da 2.ª Ré para juntar os cálculos do prémio do 1.º trimestre de 2019 devido ao aqui A. e que se encontra em dívida, para liquidação do respetivo pedido, porquanto, a A. não tem acesso às vendas que efetuou, tal documento está em poder da 2.ª Ré e deverá ser junto pela mesma.” e que, em consequência, seja deferido o requerimento a que tal conclusão respeita.
Salvo o devido respeito, não assiste razão ao recorrente pelo que tal conclusão deverá ser julgada improcedente, bem como, improvido o recurso no que tange à ora respondente.
Sobre a matéria versada no objeto do recurso, pronunciou-se mui doutamente o douto Despacho impugnado, nos termos que, com a devida vénia, se transcrevem: “indefiro integralmente todos os demais pedidos formulados pelo Autor - quer na petição inicial,quer no articulado superveniente, quer no articulado complementar - com vista à notificação das Rés para juntarem aos autos uma série de documentos (fls. 20 verso e 21; fls. 12 verso e fls. 181 do processo em suporte físico), porquanto:
-(...);
- Não compete à 2ª Ré “juntar os cálculos do prémio do 1º trimestre de 2019”, sob pena de violação flagrante das regras do ónus de prova. Ao contrário, é ao Autor que, com base nos critérios constantes do contrato celebrado com a 2ª Ré (designadamente os constantes da Cláusula 9ª e do Anexo I ao contrato celebrado em Dezembro de 2018, tal como ele expressamente alega no artigo 31º da petição inicial) cumpre alegar quais as vendas que efectuou e qual o prémio que, em consequência, teria direito a receber. Uma vez demonstrada tal factualidade, cumpre então à 2ª Ré demonstrar que pagou o prémio em causa, assim cumprindo a obrigação que sobre a mesma impendia; (sublinhado nosso).
- (...)”
A recorrida, atento o bem fundado do douto despacho, relativamente ao segmento em apreço, àquele adere, sem reservas.
Aliás, a recorrida não possui, nem nunca possuiu, os invocados cálculos do alegado prémio do primeiro trimestre de 2019, pelo que sempre se lhe tornaria impossível proceder à sua junção aos autos, sendo certo que o Autor, como se refere naquele douto Despacho, não alegou quais as vendas que efetuou, nem qual o prémio que, em consequência, teria direito a receber.”.
Vejamos.
Diz-se no despacho recorrido, “- Não compete à 2ª Ré “juntar os cálculos do prémio do trimestre de 2019”, sob pena de violação flagrante das regras do ónus de prova. Ao contrário, é ao Autor que, com base nos critérios constantes do contrato celebrado com a 2ª Ré (designadamente os constantes da Cláusula 9ª e do Anexo I ao contrato celebrado em Dezembro de 2018, tal como ele expressamente alega no artigo 31º da petição inicial) cumpre alegar quais as vendas que efectuou e qual o prémio que, em consequência, teria direito a receber. Uma vez demonstrada tal factualidade, cumpre então à 2ª Ré demonstrar que pagou o prémio em causa, assim cumprindo a obrigação que sobre a mesma impendia;”.
A este propósito, o Autor alegou, o seguinte: “A 2.ª Ré não liquidou o prémio referente ao 1.º trimestre de 2019, que o A. não consegue calcular, necessitando de aguardar pelo final do corrente mês de Abril para perceber o que vai ser pago aos seus Colegas de trabalho. Como se explicou, o A. não percebe o método de cálculo do mesmo, mas tal prémio encontra-se em dívida. Devendo a 2.ª Ré ser oficiosamente notificada para juntar os cálculos do prémio do 1.º trimestre de 2019 devido ao aqui A.”.
E alegou, ainda, que: “A 2.ª Ré nos termos da cláusula 9.ª do doc. 6 e anexo I do mesmo contrato, liquidava igualmente prémios por objetivos de vendas, do qual o A. emitia os competentes recibos verdes a pedido da entidade contratante. Sendo tal prémio variável e discricionário, aliás, o aqui A. nunca entendeu os critérios de atribuição do mesmo.”.
Que dizer?
Ora, como decorre do que antecede, o Autor começa por dizer que a 2ª Ré não lhe pagou o prémio referente ao 1º trimestre de 2019. Tal alegação determina que é ónus da 2ª Ré fazer a prova desse pagamento.
Mas, o Autor diz ainda que nunca percebeu os cálculos para a atribuição desses prémios. Tal afirmação do Autor não determina, com o devido respeito, a obrigação da parte da 2ª Ré de juntar os referidos cálculos, quando o Autor nem sequer alega que vendas efectuou e qual deveria ser, no seu entendimento, o montante do prémio em função daquelas.
Por isso, nesta parte não merece o despacho recorrido reparo.
*
Por último, analisemos o segmento do despacho recorrido onde se diz: “Não cabe à 1ª Ré “confirmar que negócio celebrou com a F…”, uma vez que tal consubstanciaria uma ilícita inversão do ónus de prova. Ao contrário, é Autor que, com base em todos os documentos e informações que recolheu, cabe alegar e sustentar a existência ou não de alguma transmissão de estabelecimento e extrair daí as consequências processuais que entenda por convenientes e pertinentes;”.
Na petição o Autor, a este propósito, alegou: “Não obstante, em toda a sua relação laboral exerceu funções para a F…, empresa farmacêutica que foi comprada totalmente pela 1.ª Ré. Segundo foi noticiado em abril de 2018, a F… vendeu o negócio de medicamentos sem receita à 1.ª Ré C1… por 3.400 milhões de euros. 35.º A F…, adquirida pela 1.ª Ré sempre foi o beneficiário exclusivo da atividade desenvolvida pelo A.”.
No articulado superveniente diz-se: “Na verdade, tal Ré C1… adquiriu parte do negócio da F… (cf. docs. 1 a 4 que se juntam e se dão aqui por integralmente reproduzidos para os devidos e legais efeitos). 9.º O A. afirmou no art. 34.º da sua p.i.: segundo foi noticiado em abril de 2018, a F… vendeu o negócio de medicamentos sem receita à 1.ª Ré C1… por 3.400 milhões de euros. 10.º Desconhecendo que não tinha existido compra de participações sociais, mas sim uma transmissão de estabelecimento, no sentido de parte do negócio da referida F…. 11.º A União Europeia aprovou tal aquisição dizendo que tal não colocava em causa a concorrência (cf. doc. 3 e doc. 5 – decisão da Comissão Europeia que se junta e se dá aqui por integralmente reproduzida). 12.º A 1.ª Ré litiga de má-fé omitindo tal negócio que justifica a propositura da ação contra si, improcedendo a alegada ineptidão da p.i., o que será objeto de análise na resposta a contestação. 13.º Como se lê no doc. 4 e no doc. 6 que se junta e se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos, os funcionários da F… que trabalhavam no negócio “Consumer Health da F1…” foram transferidos para a 1.ª Ré C1…. 14.º Os produtos que eram promovidos pelo A. enquanto delegado de informação médica foram adquiridos pela 1.ª Ré, existindo uma transmissão de estabelecimento nos termos do art. 285.º do CT. 15.º Desconhecendo o A. se tal compra e venda do negócio e transmissão de estabelecimento foi efetuada pela 1.ª Ré com a F…, S.A. ou diretamente com empresa alemã F1…, devendo tal 1.ª Ré C1… ser notificada oficiosamente para explicar que negócio fez. 16.º Desde logo porque poderá existir responsabilidade solidária por parte da F… nos termos do art. 285.º, n.º 6 do CT e existir a necessidade de requere a sua intervenção principal provocada. 17.º Como se pode dar o caso de existir mesmo uma relação de domínio ou de grupo entre a 1.ª Ré e a F…, podendo requerer-se a responsabilidade solidária nos termos do art. 334.º do CT. 18.º O A. pesquisou na Conservatória do Registo Comercial (CRC) e, na verdade, não conseguiu localizar uma compra de participações sociais da F… por parte da 1.ª Ré, o que não quer dizer que esta não tenha celebrado contrato-promessa com esse fim ou não tenha adquirido parte de tal empresa ou do seu negócio, conforme foi alegado, a 1.ª Ré adquiriu um conjunto de meios organizados e com autonomia suficiente para poder funcionar no mercado com independência em relação aÌ empresa cedente ou transmitente, o que não é registável na CRC ou visível em certidão permanente do registo comercial. 19.º Assim, a transmissaìria 1.ª Ré sucede na posição do transmitente, inclusive nos respetivos direitos e obrigações laborais que venham a ser reconhecidos no presente processo judicial. Requer-se que a 1.ª Ré seja oficiosamente notificada para confirmar que negócio celebrou com a F…, conforme noticiado e autorizado pela Comissão Europeia, designadamente a transmissão de estabelecimento supra alegada, para prova do alegado e para que o A. decida da pertinência de suscitar a intervenção principal provocada da F… que poderá ter responsabilidade solidária nos termos do art. 285.º ou 334.º do CT, consoante o tipo de negócio que se venha a apurar.”.
Que dizer?
Desde já, que o recorrente, quanto a este segmento da decisão não tem razão.
Pois, quanto a este concreto meio de prova, atento o que antecede, acolhemos aqui o teor do despacho recorrido. Com efeito, e tendo em conta a repartição do ónus da prova é ao Autor que cabe alegar e provar ter ocorrido a transmissão de estabelecimento ou então a verificação dos pressupostos da responsabilidade solidária.
Na verdade, a maior “dificuldade” de prova não isenta o Autor de alegar os factos que sustentam qualquer das situações que invoca - transmissão de estabelecimento ou responsabilidade solidária – cabendo-lhe, igualmente, e ainda, o ónus de provar os factos alegados.
Assim, não merece censura, também, nesta parte a decisão recorrida e, em consequência, a apelação só procede parcialmente.
*
III – DECISÃO
Em conformidade, com o exposto, acordam os Juízes desta Secção em julgar, parcialmente, procedente a apelação e, em consequência, revoga-se, parcialmente, o despacho saneador que deverá ser substituído por outro que admita e defira os seguintes pedidos formulados pelo Autor:
- “Mais se requer a condenaçaÞo da 1.ª Ré a reintegrar o A. com a mesma categoria profissional, retribuições e regalias dos delegados de informação médica que trabalham em tal empresa, designadamente, um salaìrio anual de 26.573,04€ e outras regalias, como sejam, seguro de vida, seguro de saúde, direito de opção na compra de açoÞes (international stock option program) e descontos em produtos da companhia, talqualmente os 16 Colegas do A. que trabalhavam na 2.ª Ré D…, que prestavam iguais funções quanto à sua natureza, qualidade e quantidade e que foram contratados pela 1.ª Ré C1… ou com o salário e condições que se venham a apurar em audiência de discussão e julgamento ou em incidente de liquidação posterior”;
- “Requer-se que a 1.ª Ré seja oficiosamente notificada para juntar aos autos cópia dos recibos dos delegados de informação médica que tem ao seu serviço e que indique que benefícios lhe são atribuídos, para que o A. possa conhecer a média de salário que a 1.ª Ré paga aos seus delegados de informação médica e possa validamente efetuar os cálculos das importâncias que considera lhe são devidas, ou seja, para a determinação do pedido relativo a salário igual/trabalho igual e para o pedido alternativo que o A. efetuou.”.
*
Custas pelo A./recorrente e pela Ré/recorrida, D…, na proporção de metade para o primeiro e metade para a última.
*
Porto, 17 de Maio de 2021
*
O presente acórdão é assinado electronicamente pelos respectivos,
Rita Romeira
Teresa Sá Lopes
António Luís Carvalhão