1 - A exigência da ilicitude da deslocação ou retenção de crianças realizadas, na previsão do art. 3 da Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, de 25 de Outubro de 1980, e o art. 11 nº2 do Regulamento CE nº 2021/2003, impõe a certificação de que o direito de custódia atribuído pelo direito do estado onde a criança tem residência habitual estivesse atribuído e a ser exercido no momento da transferência ou da retenção, ou o devesse estar se tais acontecimentos não tivessem ocorrido.
a) Se a progenitora que tem a custódia/guarda das crianças decide conjuntamente com o progenitor a deslocação para Portugal para aí fixarem residência definitiva não pode considerar-se ilícita a deslocação realizada.
b) Se a progenitora que tem a custódia/guarda das crianças sai da casa onde morava com elas e com o progenitor deixando aquelas entregues a este e regressa á Alemanha, não pode considerar-se como retenção ilícita a permanência das crianças junto do progenitor requerido uma vez que quando a progenitora regressou à Alemanha ela já não tinha a efectiva guarda das filhas por as ter deixado ao cuidado daquele.
Relatório
O Ministério Público em representação do Estado Português/Direcção Geral de Reinserção Social, propôs contra AA, acção tutelar comum, com vista ao regresso à Alemanha das menores BB e CC, ambas nascidas no dia 29 de Janeiro de 2019, em …, República Federal da Alemanha, de nacionalidade alemã, filhas de AA e de DD, ao abrigo da Convenção de Haia de 25 Outubro de 1980 sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças e do Regulamento (CE) 2201/2003.
Fundamentou o seu pedido alegando que as menores são de nacionalidade alemã; a Alemanha é o estado da sua residência habitual; os progenitores não são casados entre si; as crianças residiam com a mãe na Alemanha; foram retiradas à mãe pelo pai em 13/02/20, à força e sob violência e trazidas para Portugal, contra a vontade da mãe, não mais regressando à Alemanha; o progenitor não permite contactos entre a mãe e as filhas; segundo a lei alemã a custódia das crianças cabe à mãe, sendo assim a sua deslocação e retenção em Portugal ilícitas.
Na oposição o requerido contestou que se deslocou com as menores e a mãe das crianças para Portugal, de mútuo acordo, com a finalidade de estabelecerem neste país a residência definitiva da família e que a mãe das menores regressou à Alemanha em 06/02/20, sem nada dizer, deixando as menores ao cuidado do requerido, nunca mais procurando estabelecer contacto com as mesmas; previamente ao seu regresso à Alemanha, a mãe subscreveu acordo no que respeita ao poder paternal das crianças, confiando-as à guarda e cuidados do pai.
Instruídos os autos, foi proferida sentença que julgou existir retenção ilícita das menores e ordenou “o regresso imediato à Alemanha das crianças BB e CC, para entrega à sua progenitora DD.”
Desta decisão interpôs o requerido recurso de apelação, impugnando a matéria de facto fixada e pedindo a revogação da decisão proferida, tendo o recurso sido julgado procedente revogando a decisão recorrida, recusando o regresso das menores CC e BB à Alemanha
… …
Inconformada com esta decisão dela interpôs a requerente recurso de revista concluindo que:
“1ª O Douto Acórdão aqui recorrido, não apreciou do melhor modo a matéria de facto, tendo incorrido na não melhor aplicação do Direito, com violação clara da Convenção internacional, sobre os Aspetos Civis do Rapto Internacional de Crianças.
2ª A Convenção sobre os Aspetos Civis do Rapto Internacional de Crianças concluída em Haia em 25.10.1980 estabelece no seu artigo 1º que “A presente Convenção tem por objeto: a) Assegurar o regresso imediato das crianças ilicitamente transferidas para qualquer Estado Contratante ou nele retidas indevidamente;
b) Fazer respeitar de maneira efetiva nos outros Estados Contratantes os direitos de custódia e de visita existentes num Estado Contratante.”.
O artigo 3º da mesma Convenção refere que:
“A deslocação ou a retenção de uma criança é considerada ilícita quando:
a) Tenha sido efetivada em violação de um direito de custódia atribuído a uma pessoa – no caso à mãe, (…) pela lei do Estado onde a criança tenha a sua residência habitual imediatamente antes da sua transferência ou da sua retenção; e b) (…) O direito de custódia referido na alínea a) pode designadamente resultar quer de uma atribuição de pleno direito……” O artigo 5º determina que: “Nos termos da presente Convenção a) O “direito de custódia” inclui (…) o direito de decidir sobre o lugar da sua residência”.
3ª Neste sentido, a Lei Portuguesa manda aplicar a lei ....... e nos termos desta, a progenitora tem a guarda exclusiva das filhas pelo que foi e muito bem pelo ordenado pela Sentença do Tribunal a quo o regresso das crianças à Alemanha, determinando desde logo que fossem efetivamente, colocadas na Alemanha
4ª Pois os factos provados e evidentes, são inequívocos;
a) - As crianças nasceram na Alemanha em 29.01.2019 onde viveram até 11.12.2019, data em que acompanhadas da mãe e do pai, e outros familiares paternos, vieram para Portugal.
b) - No dia 06 de fevereiro de 2020 a progenitora, que não vivia na mesma casa do progenitor, mas em casa de familiar deste, e obrigada a viver separada das filhas.
c) A progenitora aproveitou uma oportunidade e fugiu de casa dirigindo-se à Embaixada Alemã em Lisboa pedindo ajuda para voltar ao seu país.
d) A Embaixada providenciou documentos provisórios para que a mãe pudesse regressar à Alemanha, pagou-lhe o bilhete de avião e funcionários da embaixada providenciaram alimentação para a progenitora.
e) A progenitora não conseguiu levar consigo o seu cartão de identificação; o seu passaporte e o seu cartão multibanco, que ficaram em poder do progenitor e este entregou ao OPC em 06.02.2020, cerca das 16.28H – (vide folhas 127 dos autos).
f) A progenitora deixou indicação expressa na Embaixada que não queria que o progenitor soubesse o seu paradeiro.
g) A progenitora deixou para trás os seus haveres pessoais e bem assim as filhas – aproveitando uma saída do pai com familiar paterno levando as crianças ao médico.
h) A progenitora deixou o nosso País numa situação limite, sendo ela objeto de maus-tratos (cf. depoimento da progenitora na conferência de 24.09.2020) não conseguindo levar as filhas uma vez que estava altamente condicionada no contacto com as mesmas, pois foi separada das filhas, não vivendo com elas na mesma casa e os contactos físicos eram supervisionados.
5ª A progenitora deu entrada na Autoridade Central Alemã, do pedido de regresso das crianças à Alemanha em 06.03.2020 (folhas 12 dos autos) após se ter recomposto e reorganizado do regresso ao seu país, que ocorreram nos termos supra descritos.
6ª A progenitora nas informações que prestou à Autoridade Central Alemã referiu que as crianças estavam em Portugal contra a sua vontade.
7ª Inclusive ao progenitor foram instaurados pelo Dignos Magistrado do Ministério Publico, vários processos crime suscetíveis de preencher o crime previsto e punido no art. 256º nº 1 al. f) e nº 3 do Código Penal. Pois progenitor AA, juntou inclusivamente documentos ao processo (no apenso A), pessoais e pertença da progenitora, relativos à vida privada da progenitora – (cf. a folhas 49v. e 50 e folhas 103 e 104.) Tal factualidade é suscetível de preencher um crime p. e p no art. 192º nº 1 al. d) do CP.
8ª Estando ainda a ser averiguados em sede de processos crime, toda factualidade a que progenitora foi submetida em Portugal, o que integra no mínimo o crime de coação – nomeadamente, a assinatura do acordo de RRP no processo principal – p. e p. no art. 154º do CP., e ainda de maus-tratos a que foi sujeita, tudo com o intuito de cometer o crime de retenção aliás ilegítima das duas menores.
9º Violando o Douto Acórdão aqui recorrido, em primeira linha, a Lei Portuguesa, art. 57º nº 1 do Código Civil, já que no caso dos autos claramente, indica que deve ser aplicada a Lei Alemã,
10ª E a igual violação da Convenção sobre os Aspetos Civis do Rapto Internacional de Crianças concluída em Haia em 25.10.1980, artigo 1º, artigo 3º e 12º. 11ª Pois em momento algum se pode sequer conclui, que ambos os progenitores acordados na deslocação das menores para Portugal, com o fim de neste país estabelecerem a sua residência definitiva. O que sucedeu foi que a progenitora foi atraída e enganada, e depois de chegar a Portugal foi separada das suas duas filhas, e maltratada, basta ouvir o seu depoimento puro e amargurado. Vindo-se obrigada quando pôde ser, fugir e a refugiar-se na Embaixada da Alemanha em Portugal, sem quaisquer documentos pessoais, nem dinheiro.
12º A progenitora foi pura e simplesmente obrigada a pedir auxílio, depois ao seu Pais Alemanha, para que fossem resgatadas de Portugal as suas filhas.
13º Aliás a ilegal permanência das menores à guarda do pai, não é nem nunca foi por Acordo e sempre teve a oposição clara da progenitora, tendo-se verificado claramente a violação dos requisitos previstos no artº 3 da Convenção, o Douto Acórdão aqui recorrido, não respeitou com a sua interpretação a verdade dos factos e a melhor aplicação do Direito.
Devendo ser revogado o Acórdão do Tribunal da Relação e mantendo-se assim, a Douta Sentença então recorrida do Tribunal a quo, tudo com as legais consequências, sempre em pleno abono dos mais elementares e Supremos interesses das Menores.”
O Ministério Público respondeu às alegações sustentando a o acerto da decisão recorrida e a sua confirmação.
O recorrido contra-alegou defendendo a confirmação da decisão recorrida.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
… …
Fundamentação
Depois de decidida a impugnação da matéria de facto na apelação, está provada a seguinte matéria de facto:
1. As crianças BB e CC nasceram no dia 29 de Janeiro de 2019, em ......., República Federal da Alemanha, e são filhas de AA e de DD, actualmente a residir na Rua …...
2. As menores são de nacionalidade alemã e o assento de nascimento das crianças foi lavrado no Registo Civil ......., Alemanha, o da BB sob o registo n.º …. e do da CC sob o registo n.º …..
3. A progenitora, DD, é de nacionalidade ....... e reside na Alemanha.
4. O progenitor, AA, é de nacionalidade portuguesa e reside em Portugal.
5. Os progenitores das menores não foram e não são casados entre si, e as crianças encontram-se registadas em nome de ambos.
6. Desde o seu nascimento até 11 de Dezembro de 2019, as crianças residiam com a mãe em ........, Alemanha.
7. Na Alemanha., a principal cuidadora das crianças BB e CC era a progenitora, sendo esta quem assegurava a prestação de todos os cuidados às filhas, as quais conviviam regularmente com a família materna.
8. Na Alemanha., as crianças eram acompanhadas pela médica D. EE, desde 11 de março de 2019 até 05 de novembro de 2019.
9. Em 11 de Dezembro de 2019, as crianças acompanhadas da mãe e do pai, e outros familiares paternos, vieram para Portugal, para aqui estabelecerem residência definitiva, no âmbito de um projecto de família previamente acordado entre os progenitores.
10. Em 4 de Fevereiro de 2020, as menores foram inscritas na Creche “.....”, instituição de ensino que continuam a frequentar.
11. A inscrição e a frequência das menores na referida creche foi efectuada sem o consentimento da progenitora.
12. No dia 06 de fevereiro de 2020, a progenitora que, na sequência de desentendimentos com familiares do progenitor, não vivia na mesma casa do progenitor mas em casa de outro familiar deste, aproveitou a ida das menores ao médico com o progenitor, dirigindo-se à Embaixada Alemã em Lisboa, onde pediu ajuda para voltar ao seu país.
13. A embaixada providenciou documentos provisórios para que a mãe pudesse regressar à Alemanha, pagou-lhe o bilhete de avião e funcionários da embaixada providenciaram alimentação para a progenitora.
14. A progenitora não conseguiu levar consigo o seu cartão de identificação, o seu passaporte e o seu cartão multibanco, que ficaram em poder do progenitor, e este entregou ao OPC em 06.02.2020.
15. A progenitora deixou para trás os seus haveres pessoais e bem assim as filhas – aproveitando uma saída do pai com familiar paterno levando as crianças ao médico.
16. O progenitor apresentou uma queixa-crime contra a progenitora, alegando maus-tratos, a qual deu origem ao processo com o NUIPC 31/20……, que se encontra em fase de investigação.
17. Em 20 de Fevereiro de 2020, o progenitor apresentou um requerimento para homologação de acordo de regulação das responsabilidades parentais, das filhas menores BB e CC, o qual foi distribuído ao Juiz …. deste Tribunal sob o n.º 5403/20…...
18. Em 6 de março de 2020, a progenitora deu entrada na Autoridade Central Alemã, do pedido de regresso das crianças à ........
19. O Hospital Universitário “…” de ....... informou em 28 de setembro de 2020 que a progenitora “encontrou-se em regime ambulatório desde o ano 2011 até o ano 2016. Durante o atendimento, o diagnóstico de autismo foi excluído em caso da senhora DD. Não se podia identificar restrições ao seu estado de saúde”.
20. Entre 01 de julho de 2020 até 28 de fevereiro de 2021, a progenitora DD recebeu do Estado ....... a quantia mensal de 723,00€.
21. Os progenitores não apresentaram um pedido de custódia conjunta.
22. A progenitora DD não fala, nem compreende a língua portuguesa.
23. Desde 06/02/20, a progenitora não mais tentou ver ou contactar as menores, nem saber informações sobre as mesmas.
25. Em 24 de setembro de 2020, a progenitora reiterou o seu pedido de regresso à ....... das suas filhas menores BB e CC.
… …
Foi julgada como não provada a seguinte matéria de facto:
a) Em 11 de Janeiro de 2019, a progenitora foi viver para casa do progenitor e dos pais deste, avós paternos das menores para ......., na Alemanha
b) Na Alemanha, essa foi sempre a morada onde residiram as menores desde o seu nascimento até virem para Portugal com os Progenitores e com a avó paterna.
c) As menores sempre viveram com ambos os progenitores, desde o seu nascimento e até ao dia 6 de Fevereiro de 2020.
… …
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das Recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso, conforme prevenido nos arts. 635º n.º 4 e 639º n.º 1, ex vi, art.º 679º, todos do Código de Processo Civil.
O conhecimento das questões a resolver, delimitadas pelas conclusões, importa em apreciar se a decisão recorrida deve ser revogada e substituída por outra que reconheça o direito de as menores serem entregues à mãe, regressando à Alemanha
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Quanto à admissibilidade do recurso
Nos processos de jurisdição voluntária, cujas regras gerais se encontram estabelecidas nos arts. 986º a 988º do Código de Processo Civil, decorre a atribuição de poderes aos tribunais para investigarem livremente os factos que entendam necessários à decisão, para recolher as provas que julguem adequadas, declinando as demais, a par de poderem decidir segundo critérios de conveniência e de oportunidade, e, na grande maioria dos casos, ajustar a solução definida, à eventual evolução da situação de facto.
Outra particularidade inerente aos processos de jurisdição voluntária é a de o Supremo Tribunal de Justiça, por regra, estar impedido de conhecer das medidas tomadas de acordo com critérios de conveniência e oportunidade - art.º 988º n.º 2 do Código de Processo Civil. Uma vez que a escolha das soluções mais convenientes e oportunas, está ligada à apreciação da situação de facto em que os interessados se encontram, e não tendo o Supremo Tribunal de Justiça o poder de conhecer sobre a matéria de facto - arts. 674º e 982º do Código de Processo Civil - a lei limita a respectiva admissibilidade de recurso até à Relação - art.º 988º, n.º 2 do Código Processo Civil quando a decisão tenha sido proferida segundo critérios de conveniência ou oportunidade.
Na interpretação desta restrição e verificando se a impugnação por via recurso se circunscreve aos juízos de oportunidade ou de conveniência ou se questiona a própria interpretação e aplicação dos critérios normativos em que se baliza a decisão, concluímos que o caso em apreço envolve critérios de legalidade uma vez que remete para a verificação da ilicitude do comportamento do requerido que deve ser apreciada segundo os critérios estatuídos no artº 3 da Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, de 25 de Outubro de 1980, e o art. 11 nº 2 do Regulamento CE nº 2021/2003.
Nestes termos é admissível o recurso.
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Quanto à matéria de facto
A recorrente nas suas alegações começa por referir que “Ficou amplamente provado em sede de Tribunal de 1ª Instância, na audiência de partes, com os depoimentos diretos dos progenitores e de toda a prova produzida e dos documentos juntos aos autos que …” E a seguir enumera, por transcrição, toda a prova que em primeira instância foi julgada provada, acrescentando que o acórdão recorrido não apreciou devidamente os factos e, como consequência, não aplicou do melhor modo o Direito. Porém, a recorrente omite as alterações da matéria de facto decididas na Relação como se as mesmas não tivessem ocorrido e não fossem de tomar em consideração.
É deste modo que a recorrente, no teor das alegações, realiza a análise da prova que foi realizada em primeira instância indicando como a mesma deve prevalecer sobre a da Relação concluindo que “o Acórdão aqui recorrido, não apreciou globalmente e objetivamente estas questões, já que as provas e o Princípio do Imediatismo sempre dão a sensibilidade mais aproximada dos factos.
O Acórdão, violou o Princípio da Verdade material na sua fundamentação e inclusivamente subverte as questões acrescentando matéria de facto, dando como provadas matérias, que com o devido respeito vai ao arrepio da verdade material e de todos este Princípios basilares do Direito.”
Na análise destes argumentos, a primeira observação vai para a circunstância de a recorrente tomar em consideração nas suas alegações e conclusões exclusivamente a prova fixada em primeira instância, sem as alterações decididas pelo acórdão recorrido, e isto com a convocação da autoridade que um principio de imediatismo, eventualmente traduzido em só na primeira instância se estar de forma directa e imediata perante a prova, que determinaria ser a prova em primeira instância, e não a fixada na Relação, a valer para a decisão a proferir.
Por outro lado, com igual temeridade, conclui a recorrente que o acórdão violou o princípio da verdade material e todos os princípios basilares de direito. Ora, esta invocação avulsa não se projecta em nenhum significado útil, uma vez que a recorrente não aponta no recurso qualquer razão legalmente admissível para que este Supremo Tribunal pudesse pronunciar-se sequer sobre a matéria de facto fixada.
Dispõe o artigo o artigo 682.º, nº 1 do CPC que aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o Supremo Tribunal de Justiça aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado; acrescentando o n.º 2 do normativo que a decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada, salvo o caso excepcional previsto no n.º 3 do artigo 674. E este último preceitua que o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.
Resulta dos normativos citados que o Supremo Tribunal de Justiça, enquanto tribunal de revista, em regra, apenas conhece de matéria de direito, não lhe cabendo sindicar a matéria de facto apurada pelas instâncias, a não ser que se verifique algum dos casos excepcionais expressamente previstos na lei. A actividade do Supremo não se preocupa com as possíveis alternativas sobre o julgamento dos factos relevantes, mas exclusivamente com a determinação da solução jurídica adequada para os factos apurados pelas instâncias, já que na função atribuída ao Supremo prevalecem os interesses gerais de harmonização na aplicação do direito sobre a averiguação dos factos relativos ao caso concreto e a concentração dos seus esforços na determinação da norma aplicável e no controlo da sua interpretação e aplicação pelas instâncias - cfr. Teixeira de Sousa, in Estudos sobre o Processo Civil, 2.ª edição, p. 398 e também em sentido coincidente Amâncio Ferreira, in Manual dos Recursos em Processo Civil, 8.ª edição, p. 270.
Ainda que, face ao disposto no artigo 674º, n.º 3, do CPC, o Supremo não fique totalmente paralisado no que concerne ao controlo da decisão da matéria de facto, a verdade é que a sua intervenção se circunscreve a aspectos em que se tenha verificado a violação de normas de direito probatório material (por, nessa hipótese, estarem em causa verdadeiros erros de direito), já não abrangendo questões inerentes à decisão da matéria de facto quando esta foi precedida da formulação de um juízo assente na livre apreciação da prova formulado pela 1.ª instância ou até pela Relação – cfr. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 6.ª edição, p. 490. Trata-se, de resto, de orientação que é igualmente pacífica na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, podendo ver-se, a título exemplificativo os acs. de 22-01-2015 no proc. 24/09.2TBMDA.C2.S1, (rel. Maria dos Prazeres Pizarro Beleza) e o de 19-10-2016 no proc. 3285/05.2TVPRT.P1.S1, (rel. Olindo Geraldes) in dgsi.pt, sendo que, nem a circunstância de estarmos em processos de jurisdição voluntária altera os poderes residuais do STJ em termos de apreciação da matéria de facto – cfr. Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, “Jurisprudência Sobre Rapto Internacional de Crianças”, Revista Julgar, nº 24, 2014, pág.70 e 71. Acrescente-se que no caso em decisão não se suscita, nem o concreto das alegações de recurso o protestam, qualquer questão referente ao exercício por parte do Supremo Tribunal de Justiça da possibilidade ou necessidade de verificar o respeito pelas regras legais do procedimento probatório no campo das presunções judiciais.
Assim, a recorrente não argumenta que o tribunal recorrido tenha ofendido qualquer disposição legal que impusesse para qualquer facto julgado uma exigência de prova (v.g. documental) ou que fixasse a força probatória de determinado meio de prova. Tudo o que alega é que o tribunal da Relação formou uma deficiente convicção sobre a prova produzida, sendo que essa prova era toda ela de livre apreciação. No entanto, mais singularmente, mesmo que de forma incorrecta e juridicamente irrelevante se tenha pronunciado sobre a convicção do tribunal da Relação, a recorrente nem sequer apontou qualquer concreto facto fixado em segunda instância como deficientemente fundado, defendendo que a prova em primeira instância é que foi bem julgada e a decisão aí proferida é que é a correcta.
Deste modo sem necessidade de outras consideração julgam-se improcedentes, nesta parte e quanto à matéria de facto, as conclusões de recurso.
… …
Quanto à decisão de direito
A sentença, situando a temática descrita nos autos no âmbito de aplicação da Convenção sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, concluída em Haia em 25 de Outubro de 1980 e ratificada pelo Estado Português pelo DL n.º 33/83, de 11 de Maio e pela Alemanha, na análise dos seus pressupostos e exigências considerou que os mesmos configuram uma retenção ilícita (e não uma deslocação ilícita), por violação do direito de custódia, atribuído à mãe, de acordo com a lei alemã e, consequentemente, ordenou o regresso imediato das crianças à Alemanha, a casa da progenitora. Isto é, não se debruçando sobre as particularidades da permanência das crianças em Portugal, nomeadamente sobre o modo como estas foram trazidas da Alemanha, valorizou apenas a circunstância de a lei alemã conceder à recorrente a custódia e, expressando a progenitora a vontade de ter consigo as filhas nesse país, entendeu que tal imporia irremediavelmente, em face dos factos que havia fixado como provados, a procedência da providência solicitada.
Ainda que em primeira instância tivesse sido fixado como demonstrado que “Em 11 de Dezembro de 2019, as crianças acompanhadas da mãe e do pai, e outros familiares paternos, vieram para Portugal”; “No dia 06 de fevereiro de 2020, a progenitora, que não vivia na mesma casa do progenitor, mas em casa de familiar deste, e obrigada a viver separada das filhas, aproveitou uma oportunidade e fugiu de casa, dirigindo-se à Embaixada Alemã em Lisboa, onde pediu ajuda para voltar ao seu país”; e que “O progenitor não permite contactos entre a mãe e as filhas, desde 6 de fevereiro de 2020, tendo bloqueado a progenitora em todas as redes sociais” a sentença na avaliação normativa da decisão privilegiou a custódia das filhas, por parte da recorrente, justificando que ela podia reclamar o regresso à Alemanha sem que nada a isso pudesse ser oposto. Julgou-se que contra a vontade da requerente a custódia efectiva lhe tinha sido subtraída impossibilitando que fosse ela a exercê-la.
Acontece que, com a impugnação da matéria de facto o tribunal da Relação veio a alterar aqueles factos apontados, julgando demonstrado que a deslocação das crianças da Alemanha para Portugal foi realizada na companhia de ambos os progenitores para aqui estabelecerem residência definitiva, no âmbito de um projecto de família previamente acordado entre ambos. Por outro lado, ao contrário de fixar como provado que a recorrente tinha sido obrigada a ir viver noutra casa separada das filhas, deixou assente que ela vivia noutra casa em virtude de desentendimentos com familiares do progenitor e que, em 6 de Fevereiro de 2020 tomou a iniciativa de se dirigir à Embaixada Alemã em Lisboa, onde pediu ajuda para voltar ao seu país. Ainda com importância, ao contrário de se ter deixado provado que o recorrido não permitiu a partir de 6 de Fevereiro de 2020 contactos da recorrente com as filhas, a Relação fixou como assente que desde essa data a progenitora não mais tentou ver ou contactar as menores, nem saber informações sobre as mesmas.
A comparação entre a matéria que chegou à apelação como provada e aquela outra que aí foi julgada assente, resulta que para a decisão não basta apenas apurar quem tinha a custódia legal das crianças e qual a vontade do progenitor custódio para que esta seja julgada procedente.
Pode repetir-se por correcto que a Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, de 25 de Outubro de 1980, que entrou em vigor em Portugal a 1 de Dezembro de 1983, constitui um instrumento de cooperação judiciária internacional que vincula os Estados Contratantes, neles se incluindo Portugal e a Alemã em Lisboa e que actua em duas vertentes:
- a instituição de medidas que garantam o regresso imediato da criança ao Estado da sua residência habitual, quando ilicitamente transferidas para outro Estado contratante, ou nele retidas indevidamente;
- assegurar o respeito efectivo, nos outros Estados Contratantes, dos direitos de custódia e de visita existentes num Estado Contratante.
E o mesmo objectivo está presente no Regulamento CE nº 2021/2003 de 27 de Novembro Relativo à Competência, ao Reconhecimento e à Execução de Decisões em Matéria Matrimonial e em Matéria de Responsabilidade Parental, (Regulamento Bruxelas II bis), aplicável desde 1 de Março de 2005 em todos os Estados-Membros da União Europeia, com excepção da Dinamarca, o qual, em relação aos Estados-Membros vinculados por este regulamento, prevalece sobre a Convenção (cfr. art. 60.º, alínea e), mas não exclui a sua aplicação, nomeadamente no que reporta à deslocação e retenção ilícitas de menores, tendo em conta o disposto no art. 8 e 11 deste Regulamento.
Ambos os diplomas, partindo da prossecução do princípio da protecção dos superiores interesses das crianças, pretendem prevenir e advertir as situações de facto em que alguém, em violação da tutela que se encontre legalmente fixada, rompa essa estabilidade normativa e desloque ou retenha uma criança contra a vontade daquele que tem a custódia efectiva sobre ela. É à satisfação dessa necessidade de obviar rapidamente a essas deslocações ou retenções ilícitas, restituindo as crianças ao seu Estado de residência habitual, que responde o processo previsto no Regulamento (CE) n.º 2201/2003 e na Convenção de Haia de 1980.
Na análise da ilicitude da deslocação ou retenção realizadas, o artº 3 da Convenção de Haia e 11 nº 2 do Regulamento CE nº 2021/2003, estabelece a exigência de dois requisitos:
- a violação de um direito de custódia atribuído pelo Direito do Estado onde a criança tenha a sua residência habitual imediatamente antes da sua transferência ou da sua retenção, direito que pode resultar de um efeito ex lege (no caso em apreço da lei aplicável tendo em conta a nacionalidade das crianças e a residência habitual dos progenitores), de uma decisão judicial ou administrativa ou de acordo de custódia vigente segundo o Direito do Estado de residência habitual;
- que este direito esteja a ser exercido de maneira efectiva, individualmente ou em conjunto, no momento da transferência ou da retenção, ou o devesse estar se tais acontecimentos não tivessem ocorrido.
De acordo com o artº 5 a) da Convenção, o direito de custódia, inclui o direito de decidir sobre o lugar da sua residência. Porém, como se refere na decisão recorrida, a determinação de quem tem a custódia, nomeadamente para efeitos de saber quem tem o poder de decidir sobre o local de residência das crianças, não basta por si só para reconhecer a existência de retenção indevida da criança noutro Estado, uma vez que se exige que quem reclame o regresso tenha a efectiva guarda do menor, no momento que antecedeu a deslocação ou retenção, e que o menor tenha sido deslocado para Estado diferente da sua residência habitual ou nele retido, sem conhecimento e autorização do progenitor que detém a guarda. O conhecimento de quem tem a guarda da criança, por deferência legal ou por decisão judicial ou administrativa, no enquadramento dos superiores interesses da criança, impõe sempre a verificação do como, no concreto da realidade, se encontra a ser efectivada essa custódia nas suas múltiplas dimensões, entre elas, a da determinação e escolha da residência. Nesta projecção dinâmica, importa saber quem detém a custódia porque este processo especial não se destina à discussão de questões relativas à regulação ou exercício do poder parental. “Tem apenas como objectivo verificar aquela ilicitude e, em caso afirmativo, determinar o regresso imediato ao outro Estado, sem comportar a discussão ou alteração do regime do exercício das responsabilidades parentais e sem implicar a deslocação da competência para essa apreciação para os tribunais do Estado para onde a criança foi deslocada, como uniformemente tem sido observado nos tribunais portugueses. A definição desse processamento simplificado e urgente foi uma das vias encontradas para “contrariar o uso de meios de auto-tutela” para resolver divergências relacionadas com o exercício das responsabilidades parentais, especialmente quanto à guarda da criança, dissuadindo os protagonistas de tentar criar situações de facto que lhes sejam favoráveis, numa discussão posterior sobre a guarda da criança — quer tentando deslocar a competência dos tribunais para o Estado onde se encontram, quer criando ligações da criança ao novo ambiente, de modo a que lhe seja prejudicial uma decisão de regresso ao Estado de onde foi deslocada.” – cfr. Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, “Jurisprudência Sobre Rapto Internacional de Crianças”, Revista Julgar, nº 24, 2014, pág. 78.
A delimitação de objecto acabada de realizar, quanto à providência não constituir decisão sobre a regulação das responsabilidades parentais relativamente a crianças que sejam considerados vítimas de “deslocação ou retenção ilícita”, esclarece ainda que uma decisão proferida num determinado Estado, no âmbito do Regulamento (CE) n.º 2201/2003 e da Convenção de Haia de 25 de Outubro de 1980, relativamente a menores que foram considerados vítimas de “deslocação ou retenção ilícita” não possa ser invocada para fundamentar a alegação de caso julgado por uma decisão posterior sobre aquele.
Configurado o processo no âmbito do Regulamento (CE) n.º 2201/2003 e da Convenção de Haia como restrito à averiguação da ilicitude da deslocação ou retenção, a averiguação desta como fundamento do pedido de regresso, apresentado nos tribunais portugueses, reconduz-se a determinar se aquele que deslocou a criança para Portugal ou aí a reteve tinha o poder de, por si só, decidir sobre o respectivo local de residência, ou se a deslocação ou retenção foi ou não efectuada com o acordo ou com o consentimento do titular (ou co-titular) desse poder.
Sendo questão de particular importância para a vida da criança a determinação do local/Estado de residência e, em particular, a mudança de residência quando é feita para país diferente daquele em que vive, deve entender-se que existirá rapto se, tendo de ser decidido pelo um único progenitor que tem a guarda o local de residência da criança (como no caso dos autos), por assim resultar do regime de exercício das responsabilidades parentais aplicável, a deslocação ou retenção tiver sido da vontade do que não tem a tutela, sem consentimento daquele que a tem. Por seu turno, não constituirá deslocação ilícita, no sentido do artigo 2.º, n.º 11, do Regulamento (CE) n.º 2201/2003, a da criança para outro Estado pelo progenitor titular único do direito de guarda ou com seu consentimento.
Na apreciação dos factos obtidos nos autos, verificamos que a deslocação das menores para Portugal decorreu de opção conjunta dos seus progenitores que aqui pretendiam estabelecer residência definitiva e que efectivamente estabeleceram a residência habitual das menores neste país. E como a guarda cabia legalmente à recorrente concluímos que essa deslocação cumpriu a regularidade exigida para que se tenha por lícita uma vez que obedeceu à vontade de quem tinha a tutela e a exercia.
Uma vez em Portugal, desde 11 de Dezembro de 2019, para onde foi feita a deslocação nos termos sobreditos de forma consensual e sem vestígio de qualquer desconformidade legal, a recorrente, em 6 de Fevereiro de 2020, quando já não vivia na companhia do recorrido nem das filhas, tendo-as deixado com este na casa onde viviam, solicitou junto da embaixada da Alemanha o seu regresso a esse país, o que consumou.
Desta cronologia, extrai-se que, por referência à condição da ilicitude da deslocação ou retenção ter de ser aferida em função da guarda que esteja efectivamente a ser exercida pelo progenitor que pretende o regresso da criança deslocada ou retida, (ou devesse estar se a imputação do rapto não tivesse sucedido) é forçoso concluir que falta também esse requisito quando a recorrente deixou as filhas entregues à guarda e cuidados do pai e foi residir noutra casa e, mais ainda, quando as deixa com o progenitor recorrido e se ausenta para a Alemanha. Acresce que, segundo os factos que servem a decisão, e que são aqueles que a Apelação firmou por confirmação alteração, desde 06/02/20, a progenitora não mais tentou ver ou contactar as menores, nem saber informações sobre as mesmas, o que sublinha a situação efectiva e de facto da guarda e cuidado das crianças pelo recorrido.
O desrespeito censurável por quem, no momento imediatamente antecedente à retenção, tenha o exercício da custódia e peticiona o regresso das crianças à sua esfera de guarda, tem de garantir com segurança que, na altura dos factos que se dizem integradores do rapto, com a deslocação ou a retenção, a custódia pertença a quem a reclama e está a ser efectivamente exercida por ele. – vd. ac. STJ de STJ de 24/06/2010, no proc. nº 622/07 .9TMBRG.G1.S1, relatora Maria dos Prazeres Pizarro Beleza. E no caso em decisão, os factos tornam evidente que no momento em que a recorrente parte para a Alemanha não tinha a guarda efectiva sobre as filhas, não porque lha tivessem subtraído, mas sim porque foi ela quem as deixou a cargo do pai/recorrido.
Pelo deixado exposto, não pode considerar-se ilícita, nem a deslocação, nem a retenção das crianças por parte do recorrido, termos em que improcedem na totalidade em conclusões de recurso.
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Síntese conclusiva
- A exigência da ilicitude da deslocação ou retenção de crianças realizadas, na previsão do art. 3 da Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, de 25 de Outubro de 1980, e o art. 11 nº2 do Regulamento CE nº 2021/2003, impõe a certificação de que o direito de custódia atribuído pelo direito do estado onde a criança tem residência habitual estivesse atribuído e a ser exercido no momento da transferência ou da retenção, ou o devesse estar se tais acontecimentos não tivessem ocorrido.
- Se a progenitora que tem a custódia/guarda das crianças decide conjuntamente com o progenitor a deslocação para Portugal para aí fixarem residência definitiva não pode considerar-se ilícita a deslocação realizada.
- Se a progenitora que tem a custódia/guarda das crianças sai da casa onde morava com elas e com o progenitor deixando aquelas entregues a este e regressa á Alemanha, não pode considerar-se como retenção ilícita a permanência das crianças junto do progenitor requerido uma vez que quando a progenitora regressou à Alemanha ela já não tinha a efectiva guarda das filhas por as ter deixado ao cuidado daquele.
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Decisão
Nesta conformidade, acorda-se em julgar improcedente a revista e, em consequência, confirmar a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 8 de Abril de 2021
Nos termos e para os efeitos do art.º 15º-A do Decreto-Lei n.º 20/2020, verificada a falta da assinatura dos Senhores Juízes Conselheiros adjuntos no acórdão proferido, atesto o respectivo voto de conformidade da Srª. Juíza Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza e do Sr. Juiz Conselheiro Tibério Silva.
Manuel Capelo (relator)