CONFISSÃO
DOCUMENTO PARTICULAR
ASSUNÇÃO DE DÍVIDA
SEGURADORA
RESPONSABILIDADE POR ACIDENTE DE VIAÇÃO
CULPA DO SINISTRADO
ARBITRAMENTO DE REPARAÇÃO PROVISÓRIA
Sumário


1. Decorre do n.º 2 do art.º 358.º do C. Civil que a confissão extrajudicial, em documento autêntico ou particular, considera-se provada nos termos aplicáveis a estes documentos e, se for feita à parte contrária ou a quem a represente, tem força probatória plena.
2. Se a seguradora, na sequência da comunicação do acidente de viação efetuada pelo condutor do veículo, remeteu ao lesado, nos termos da alínea e) do n.º1 do art.º 36.º, Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, uma missiva na qual declara assumir a responsabilidade pela regularização dos danos decorrentes do presente sinistro, com posterior acompanhamento da sua situação clínica e pagamento de todas as despesas com a sua assistência médica, designadamente intervenções cirúrgicas, tratamentos, exames, medicamentos, transportes e consultas médicas, durante cerca de seis meses, tal declaração reúne todos os requisitos da confissão extrajudicial, em documento particular, dirigida à parte contrária, atribuindo-lhe a lei força probatória plena, o que impede que se discuta nova versão do acidente quanto à culpa.
3. Na providência cautelar de arbitramento reparação provisória basta um juízo sumário de que a Requerida será condenada, com um alto grau de probabilidade, a ressarcir os danos sofridos pelo Requerente, indiciando a obrigação de indemnizar, e que se verifique uma situação de necessidade em consequência desses danos, para que o tribunal arbitre uma quantia certa, sob a forma de renda, a título de reparação provisória do dano, cujo montante deverá ser suficiente para garantir a sua subsistência ( art.º 388/1, 2 e 3 do C. P. Civil). (sumário do relator)

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Évora

I- Relatório:
P…, residente na residente na Av. …, Abrantes, veio instaurar, em cumulação, procedimento cautelar especificado de arbitramento de reparação provisória e procedimento cautelar comum contra SEGURADORAS…, S.A., com sede na …, Lisboa, atualmente com a denominação de G…, S.A., pedindo que se condene a requerida:
1. A assumir e a pagar todos os custos necessários à recuperação do estado de saúde do requerente, designadamente tratamentos médicos, exames, consultas, cirurgias, internamentos hospitalares, próteses, medicamentos e transportes.
2. A assumir e a pagar todas as despesas inerentes à continuação dos tratamentos que o requerente iniciou, e que vai necessitar para o futuro, nas várias especialidades médicas do Hospital da Luz, em Lisboa.
3. A assumir e a pagar todos os tratamentos urgentes necessários à recuperação física e psicológica do requerente, nomeadamente reconstrução da face, colocação de próteses dentárias e colocação de prótese no braço amputado.
4. A pagar ao requerente a referida quantia de 35.000,00 € por forma a que possa realizar o tratamento cirúrgico descrito no artigo 90.º do requerimento inicial.
5. A pagar ao requerente a quantia mensal de 1 300,0 €, a título de reparação provisória do dano.
Alegou, em síntese, que no dia 6 de setembro de 2019, pelas 6:30 h, circulava, na Auto Estrada A23, no sentido Torres Novas – Abrantes, como passageiro transportado no veículo de passageiros de matrícula 37- 05-UP, seguro na Ré, conduzido por J… e pertencente a sua mãe A…, o qual perdeu o controlo do veículo, entrou em despiste, indo embater, sucessivamente, no separador central, na proteção metálica lateral direita e, novamente, no separador central, ficando imobilizado no eixo da faixa de rodagem. Após o acidente, o requerente foi encontrado caído na faixa de rodagem, à distância aproximada de 1,30m do lado direito do veículo acidentado.
Em consequência do acidente sofreu graves danos físicos e morais e necessita de retomar os tratamentos de forma urgente, os quais são necessários à sua recuperação física e psicológica, nomeadamente reconstrução da face, colocação de próteses dentárias e colocação de prótese no braço amputado e, porque ficou sem quaisquer rendimentos, necessita de uma quantia mensal para fazer face às suas despesas.
Por despacho de 16/10/2020 foi admitida a cumulação das requeridas providências e determinada a sua tramitação nos termos do procedimento cautelar comum e não como procedimento cautelar de arbitramento de reparação provisória.
Citada, a Ré deduziu oposição, aceitando a maioria dos alegados danos sofridos, mas impugnando os factos relativos ao condutor do veículo, aduzindo que quem conduzia o veículo de passageiros de matrícula 37… era, não J…, mas o requerente, e concluiu pela improcedência do procedimento cautelar.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
Face ao exposto, julgo parcialmente procedente, por parcialmente provado, o presente procedimento cautelar intentado pelo requerente P…, e, em consequência condeno a requerida G…, S.A.:
a) No pagamento de todos os custos urgentes e necessários à recuperação do estado de saúde física e psicológica do requerente, designadamente tratamentos médicos, exames, consultas, cirurgias, internamentos hospitalares, próteses, medicamentos e transportes e de todas as despesas inerentes à continuação dos tratamentos que o requerente iniciou, e que vai necessitar para o futuro, nas várias especialidades médicas do Hospital da Luz, em Lisboa e que sejam causa direta do acidente objeto destes autos.
b) A pagar ao requerente a renda mensal de 750,00 (setecentos e cinquenta euros) até à decisão final da ação principal, absolvendo a requerida do demais peticionado.
Inconformada com esta decisão, veio a requerida interpor o presente recurso, apresentando, após o corpo alegatório, as seguintes conclusões:
1. O presente recurso versa sobre a Sentença do Tribunal a quo que deferiu a pretensão do Requerente e em consequência determinou que o condutor do veículo no momento do acidente era J… e não o Requerente, conforme a Recorrente defende, e como tal condenou a Recorrente:
“a) No pagamento de todos os custos urgentes e necessários à recuperação do estado de saúde física e psicológica do requerente, designadamente tratamentos médicos, exames, consultas, cirurgias, internamentos hospitalares, próteses, medicamentos e transportes e de todas as despesas inerentes à continuação dos tratamentos que o requerente iniciou, e que vai necessitar para o futuro, nas várias especialidades médicas do Hospital da Luz, em Lisboa e que sejam causa direta do acidente objeto destes autos. b) A pagar ao requerente a renda mensal de 750,00 (setecentos e cinquenta euros) até à decisão final da ação principal, absolvendo a requerida do demais peticionado.”
2. A razão de ser do presente recurso prende-se com a discordância quanto à identificação do condutor no momento do acidente e caso se entenda que o Requerente não era o condutor, a ponderação das circunstâncias do acidente para a atribuição da culpa do lesado e consequente exclusão ou redução da percentagem de responsabilidade da Recorrente.
3. Face à questão a decidir supra exposta, e após produção de prova, deu o Tribunal como provados os factos 5 a 8 e 79 a 81 que importam para o objeto do presente recurso.
4. Por outro lado, o Tribunal deu como não provado os factos 2, 3 e 4, que importam para o objeto do presente recurso.
5. No entender do Tribunal o facto da testemunha H…, militar da GNR (cabo), ter afirmado que o J… se identificou como condutor e foi a ele que fez o teste de alcoolemia é revelador que seria este o condutor.
6. Com efeito, importa reanalisar as declarações prestadas pela testemunha H…, militar da GNR (cabo), na audiência do dia 14/01/2021, entre as 09:57:57 e as 10:45:44.
7. Resulta do depoimento desta testemunha, nomeadamente entre os minutos [00:07:29.12] e [00:09:22.26] entre os minutos [00:20:32.23] e [00:23:42.24], entre os minutos [00:39:11.29] e [00:46:00.07], que o J… se encontrava com um comportamento alterado, quer pela taxa de alcoolémia, quer pelo choque decorrente do acidente.
8. Resultou evidente das declarações do GNR que o J… teve de ser convencido a dar os seus dados e a fazer o teste de álcool o que só demonstra que não estaria tão certo de que era o condutor, conforme o Tribunal entendeu.
9. Também resulta claro do depoimento do GNR que este identificou o J… por se ter dirigido ao veículo e este se encontrar dentro do mesmo, tendo levado o GNR a questioná-lo se era o condutor.
10. Por todas estas razões, a Recorrente entende que o Tribunal fez uma incorreta valoração do depoimento do GNR e que deste testemunho não resulta claro e evidente que o condutor do veículo no momento do acidente seria o J….
11. Outro aspeto que o Tribunal também valorou para determinar a forma como o acidente ocorreu e daí retirar a conclusão que o condutor seria o J…, foi a descrição que o GNR fez do acidente.
12. A Recorrente está de acordo que a descrição está de acordo com o croqui, até porque foi elaborado pela testemunha, pelo que não seria de esperar contradições, também está de acordo que os danos no veículo são compatíveis com a dinâmica apresentada, mas importa igualmente referir que de acordo com o que foi explicado, quer pela Testemunha C… entre os minutos [00:14:41.27] e [00:19:40.19], quer pela testemunha R… entre os minutos [00:21:06.20] e [00:33:31.22], qualquer dinâmica com múltiplos embates apresentaria compatibilidade com os danos no veículo.
13. A testemunha H… esclareceu entre os minutos [00:09:55.07] e
[00:12:26.23], entre os minutos [00:20:32.23] e [00:21:47.18] e entre os minutos [00:24:35.19] e [00:34:01.15], que: (i) o primeiro embate foi fraco e que o segundo embate é que foi mais forte e violento (ii) o braço foi dissecado no segundo embate, no lado direito da estrada, apesar de ter aparecido no meio do separador central junto ao local do terceiro embate, no lado esquerdo da estrada; (iii) que a parte superior do corpo do Pedro andou arrastada no alcatrão enquanto as pernas e os pés estavam dentro do carro, entre o segundo e o terceiro embate.
14. Em primeiro lugar, nos autos, nomeadamente no croqui, não existe nenhum indício de travagem, pelo que, podemos excluir a hipótese, de o veículo estar em travagem no momento dos embates.
15. Por outro lado, o primeiro embate é sempre e por natureza aquele que tem mais violência, pois o veículo está animado de velocidade e só após um primeiro embate, que absorve parte dessa energia, é que o veículo passa a circular a uma velocidade mais reduzida. Para que, um segundo embate seja mais violento conforme o GNR referiu, - e o Tribunal acatou sem duvidar, - era necessário existir uma aceleração
do veículo, após o primeiro embate, o que no caso em concreto não temos elementos para presumir que tivesse acontecido.
16. Assim, sendo resulta evidente que para além do que a testemunha acha que aconteceu, não existe nenhum facto no processo, que permita concluir que o segundo embate foi o mais violento, antes pelo contrário, as leis da física, só evidenciam que o primeiro embate é que terá sido o mais violento.
17. A Recorrente também não pode concordar com o entendimento que o braço terá sido dissecado no segundo embate, pois o GNR não recolheu indícios nenhuns no local que permitam afirmar tal facto.
18. Acresce que, no entender da Recorrente a localização do braço junto do terceiro embate é suficientemente indiciador que terá sido neste local que o braço terá sido dissecado. No entender da Recorrente não é credível que o braço tenha sido dissecado junto ao segundo embate e que tivesse sido projetado para o local do terceiro embate, isto é, a 7,40m.
19. As leis da física não permitem explicar como é que o Requerente andou arrastado no pavimento conforme foi dito pelo GNR, pois, se o Requerente fosse no lugar do pendura e com o cinto nunca teria sido projetado do veículo, como foi, nem andaria a arrastar parcialmente com o corpo no pavimento. Para admitir a hipótese de o
Requerente circular no lugar do pendura sem o cinto, temos de ignorar o facto que o cinto de segurança do lado do pendura ser o único que foi acionado.
20. Face ao exposto, a Recorrente entende que o Tribunal andou mal, ao valorar
positivamente a descrição do acidente que o GNR, pois a mesma não tem sustento factual e não respeita as leis da física.
21. Para decidir que o condutor no momento do acidente era o J…, o Tribunal desvalorizou o depoimento do próprio e apreciou à contrário, os depoimentos dos peritos C….
22. No entender do Tribunal, o depoimento da testemunha J… foi inverosímil e reticente porque pensava quase sempre antes de responder.
23. A Recorrente entende que o Tribunal não pode admitir que a testemunha não se recorda dos factos e ao mesmo tempo desconsiderar o seu depoimento porque a testemunha teve de pensar antes de responder, isto é, teve de fazer um esforço para se recordar. Se a testemunha tinha uma taxa de alcoolémia de 1,95g/l e do relato do GNR resultou evidente que o seu comportamento estava alterado, é aceitável que não se lembre dos factos do acidente.
24. Na opinião da Recorrente o depoimento da testemunha J…, prestado no dia 14/01/2021, entre os minutos 14:21:29 e 15:25:07, deve ser valorado porquanto o mesmo referiu factos que o Tribunal não apreciou e que têm elevada importância para apurar quem era o condutor no momento do acidente, senão vejamos:
25. A testemunha entre os minutos [00:12:14.29] e [00:13:58.06] declarou sem
hesitações que perdeu a audição do ouvido direito e que ficou com a marca do cinto de seguro.
26. A testemunha entre os minutos [00:14:53.22] e [00:15:38.22] disse que o GNR pegou nele e o identificou como condutor, o que no entender da Recorrente confirma o que o próprio GNR disse sobre o facto de o Júlio ter de ser convencido a dar os seus dados para identificar-se como condutor.
27. A testemunha entre os minutos [00:24:18.09] e [00:24:50.29] quando foi confrontada com as declarações que prestou por escrito, no dia 14/01/2020 ao perito averiguador, esclareceu que tinha a convicção que o Requerente não tinha cinto de segurança porque sido projetado do veículo.
28. A testemunha entre os minutos [00:30:07.27] e [00:32:53.28] explicou que após o acidente o veículo foi rebocado do local para uma propriedade da sua família e que não voltou a andar.
29. A verdade é que o Tribunal decidiu valorar o historial de acidentes de viação que a testemunha teve e que foi explorado nas perguntas que o mandatário do Requerente fez a partir dos minutos [00:33:27.22].
30. A Recorrente entende que o facto de a testemunha já ter tido acidentes anteriores sob o efeito do álcool deveria ser analisado também por outro prisma. Se a testemunha já teve outros acidentes nestas circunstâncias o mais natural era afirmar de imediato que não era o condutor. No entanto recorde-se que a testemunha se encontrava desorientada, foi encontrada pelo GNR dentro do veículo, no lugar do pendura, e convencida a dar os seus dados para preencher os elementos do auto de acidente de viação.
31. Na opinião da Recorrente resulta do depoimento da testemunha Júlio Delaunay exatamente aquilo que foi mencionado no relatório do perito C… e que foi confirmado pelo próprio em audiência de julgamento.
32. Com efeito, todos os elementos mencionados no relatório de averiguação, que foram identificados na sentença, foram melhor explicados pelo próprio averiguado C…, em sede de julgamento, quando prestou depoimento no dia 14/01/2021, entre os minutos 15:45:34 e 16:48:03, nomeadamente a partir dos minutos [00:03:50.06] e até [00:23:06.09] e as mesmas considerações foram apresentadas de forma bastante elucidativas pela testemunha R… quando prestou depoimento no dia 14/01/2021, entre os minutos 16:48:50 e 17:49:34, nomeadamente a partir dos minutos [00:02:13.08] e até [00:34:04.22].
33. Depois de ouvir o depoimento dos dois peritos, mas principalmente do perito Ricardo Franco, o entendimento do Tribunal foi que o cinto de segurança do lado do pendura já tinha sido acionado em outro acidente. Ora a Recorrente questiona-se com base em que facto é que o tribunal chegou a tal conclusão?!?!
34. O Tribunal entendeu ainda que o mais provável era que quer o Júlio quer o Requerente circulassem sem o cinto.
35. A testemunha R… explicou que existem dois sistemas de segurança associados ao cinto de segurança, entre os minutos [00:14:10.22] e [00:21:03.24]. O primeiro e mais antigo, é o sistema de retenção, que funciona independentemente dos pré-tensores, e um segundo e mais recente, é o sistema de pré-tensores, que no caso em apreço, se verificou que apenas foi acionado no lugar do pendura.
36. No seguimento desta explicação, não é verdade o que o Tribunal referiu, isto é, que o Requerente levava o cinto posto, mas que o sistema de pré-tensores já tinha sido acionado e que foi essa a razão para ter sido projetado para fora do veículo.
37. Recorde-se que os pré-tensores depois de disparados já não voltam a disparar novamente, mas o sistema de retenção, esse funciona sempre, mesmo que já tivesse sido acionado em acidentes anteriores.
38. Ora, com base nesta explicação, e de acordo com o que tem vindo a ser dito pela Recorrente, era fisicamente impossível, o corpo do Requerente ser projetado para fora do veículo, mesmo que levasse o cinto de segurança, e o sistema de pré-tensores já tivesse disparado, porque o sistema de retenção impossibilitava a saída do corpo.
39. Pelo que, é forçoso concluir que a hipótese que o Tribunal criou é de todas a mais improvável de acontecer, mas ainda assim foi neste aspeto que o Tribunal se agarrou para justificar a sua decisão quanto à identificação do condutor.
40. Acresce que o Tribunal ignorou por completo, um facto que foi mencionado pelo GNR que valida e confirma a informação que a Recorrente tem vindo a dizer ao longo do processo.
41. O GNR, quando questionado pelo próprio Tribunal como é que o Requerente teria saído do veículo, referiu que existiu um comentário no local do acidente que o Requerente não trazia cinto.
42. Resulta do depoimento também do GNR que quem não trazia o cinto era o Requerente, mas este aspeto o Tribunal nem sequer o mencionou na sua fundamentação.
43. Acresce que, o Júlio, não foi projetado do veículo e decorrente do acidente ficou com um traumatismo craniano, perda de audição do ouvido direito, marcas do cinto de segurança e ainda dores no peito associadas às marcas do cinto de segurança.
44. No entender da Recorrente o Tribunal não considerou o que se torna mais evidente, de acordo com as regras da experiência comum e de acordo com as leis da física, se temos duas pessoas dentro de um veículo e decorrente de um acidente, uma delas é projetada para fora e a outra não e quando se vai analisar os pré-tensores constata-se que um deles foi acionado e outro não, a única conclusão lógica e plausível é que o pré-tensor do cinto que não disparou corresponda ao lugar onde a pessoa que foi projetada seguia.
45. Mas o Tribunal preferiu presumir que o traumatismo do J… e a perda de audição no ouvido direito dizia respeito ao embate da cabeça do J… na cabeça do Requerente e nunca equacionou a hipótese mais lógica, que as lesões decorrem do embate na lateral direita do veículo por seguir no lugar do passageiro.
46. A testemunha J… esclareceu o Tribunal que não foi ele que preencheu a participação de acidente de viação, apesar de ter assinado a mesma, logo pode ser por essa razão que não foi mencionada a lesão decorrente do cinto de segurança.
47. Por outro lado, a lesão que a testemunha referiu foi uma marca e alguma dor na zona do peito. Ora estas lesões comparadas com o traumatismo craniano e com a perda de audição do ouvido direito, são bastante mais reduzidas e claramente passageiras, pelo que se compreende que não tinham sido valorizadas para efeitos da participação ou até mesmo junto dos médicos na urgência.
48. O Tribunal também não teve em consideração que o braço apareceu no separador central correspondente ao lado esquerdo do veículo, que corresponde também ao lugar do condutor.
49. No entender da Recorrente este facto, conjugado com os demais, permite concluir com um elevado grau de certeza que o Requerente seguia como condutor e foi por essa razão que o braço que foi dissecado surge no lado esquerdo em relação ao veículo.
50. Outro aspeto que o Tribunal considerou para determinar que o Requerente seguia como passageiro e não como condutor é o facto de o veículo só ter sido analisado pelos peritos 4 meses após o acidente.
51. Estas considerações são contraditórias e tendenciosas porque o Tribunal já tinha referido anteriormente que os pré-tensores já podiam estar acionados antes do acidente, por isso mesmo que o veículo tivesse sido analisado no dia seguinte ao acidente ou até mesmo no local do acidente as conclusões quanto à utilização do cinto de segurança seriam as mesmas.
52. Por todos os motivos invocados, a Recorrente entende que o facto 5 e 6 devem passar a ter a seguinte redação:
5. No dia 6 de setembro de 2019, pelas 6:30 horas, circulava, na Auto Estrada A23, no sentido Torres Novas – Abrantes, o veículo ligeiro de passageiros de matrícula 37-05-UP, conduzido pelo Requerente e pertencente a A….
6. O J… seguia como passageiro transportado no referido veículo.
53. Devem ainda passar a constar como factos provados os seguintes factos:
7A. Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas em 5 e 7 dos factos indiciariamente provados, o J… levava o cinto de segurança colocado e Requerente não levava o cinto de segurança colocado.
7B. O Requerente foi projetado para fora do veículo de matrícula 37-05-UP.
7C. Nos dias seguintes ao acidente, J… sentiu bastantes dores no peito devido ao cinto de segurança.
54. Com a alteração à matéria de facto que se requer, a decisão final terá obrigatoriamente de ser diferente, concluindo pela absolvição da Recorrente.
55. Caso assim não se entenda, a Recorrente entende que não assiste razão ao Tribunal quando entende que na dúvida quanto à identificação do condutor deve ser decidido a favor do Requerente.
56. O Tribunal admite que existem dúvidas sobre a identificação correta do condutor.
57. Caso não seja entendido conforme foi requerido supra, com base na prova que foi produzida, deve ser entendido que não é possível determinar quem era o condutor do acidente no momento do acidente e por essa razão o Requerente não cumpriu com o seu ónus da prova.
58. Assim a Recorrente requer, caso não seja atendido o primeiro pedido de alteração de prova que os factos 5 e 6 devem passar a ter a seguinte redação:
5. No dia 6 de setembro de 2019, pelas 6:30 horas, circulava, na Auto Estrada A23, no sentido Torres Novas – Abrantes, o veículo ligeiro de passageiros de matrícula 37…, pertencente a A….
6. Não se apurou quem ia a conduzir o veículo de matrícula 37… e quem seguia como passageiro.
59. Devem ainda passar a constar como factos provados os seguintes factos:
7A. Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas em 5 e 7 dos factos indiciariamente provados, o J… levava o cinto de segurança colocado e Requerente não levava o cinto de segurança colocado.
7B. O Requerente foi projetado para fora do veículo de matrícula 37….
7C. Nos dias seguintes ao acidente, J… sentiu bastantes dores no peito devido ao cinto de segurança.
60. Com a alteração à matéria de facto que se requer, a decisão final terá obrigatoriamente de ser diferente, concluindo pela absolvição da Recorrente.
61. Relativamente aos pontos 79 e 80 da matéria assente, a Recorrente entende que da prova produzida resultou demonstrado, sem margem para dúvida, que tanto na festa onde o J… e o Requerente se encontraram, como na Discoteca “S…”, ambos ingeriram bebidas alcoólicas.
62. Tais factos resultam do depoimento do próprio J… entre os minutos [00:14:24.13] e [00:14:32.10] que o Tribunal considerou como válido para dar como provado tais factos. Também nas declarações que o J… foi prestando aos peritos resulta evidente que ambos tinham ingerido bebidas alcoólicas.
63. Face ao exposto, a Recorrente entende que a redação dos factos 79 e 80 deveriam passar a ter a seguinte redação:
79. Ao final da tarde do dia 5 de setembro de 2019, J… foi a uma festa de anos de um amigo, onde se encontrou com o requerente. Nesta feste ambos ingeriram bebidas alcoólicas.
80. Cerca das 03 horas do dia 6 de setembro de 2019 saíram ambos da dita festa de anos e foram para a Discoteca “S…”, situada em Torres Novas. Na discoteca ambos ingeriram bebidas alcoólicas.
64. O facto que deve ser acrescentado a estes dois pontos está diretamente ligado com a proporção de responsabilidade da Recorrente, elemento com o qual também se discorda e que desenvolverá infra.
65. Donde, alterando-se a matéria de facto por forma a dar-se como provado que o Requerente era o condutor no momento do acidente, nos moldes pugnados pela Recorrente, é forçoso concluir não existir matéria de facto que sustente a decisão de direito.
66. Uma vez alterada a decisão de facto conforme requerido e passando a constar o Requerente como condutor, o enquadramento ao contrato de seguro terá de obrigatoriamente ser outro.
67. Pelo que, a decisão de Direito da sentença deverá ser alterada por outra que entenda que a exclusão do n.º 1 da cláusula 5ª das Condições Gerais, se aplica ao caso em concreto e por essa razão, o contrato de seguro em análise nos autos não pode responder perante os danos do Requerente e como tal a Recorrente deve ser absolvida do pedido.
68. Na falta de elementos que auxiliem o Tribunal na aplicação do contrato de seguro, deve a decisão ser contra quem o facto aproveita, no caso em concreto, o Requerente, pelo que a decisão final do Tribunal deve ser de absolvição da Recorrente.
69. Por último, se o Tribunal ad quem mantiver a decisão de facto quanto à identificação do condutor do veículo, então a ponderação da responsabilidade da Recorrente deverá ser outra.
70. Transpondo o disposto no artigo 570.º do código civil, para o caso em apreço, podemos dizer que o Requerente se colocou em perigo quando concordou em deixar-se conduzir por uma pessoa que sabia que tinha estado a consumir uma quantia de álcool de tal forma elevada que o seu comportamento já se encontrava notoriamente alterado.
71. O Requerente não podia desconhecer o risco de ter um acidente com o Júlio
enquanto condutor.
72. Por outro lado, o Requerente não circulava com o cinto de segurança, como era sua obrigação, nos termos do disposto no artigo 82.º do Código da Estrada, facto que originou a sua projeção para fora do veículo e que provocou os danos no rosto e a
amputação do braço direito, entre outros.
73. O facto de os danos se terem verificados exclusivamente por falta do uso do cinto de segurança, é motivo para limitar ou até mesmo excluir a responsabilidade da Recorrente.
74. A maior extensão dos danos do Requerente, se não mesmo a sua totalidade,
ficaram a dever-se ao facto de ter sido projetado para fora do veículo, e este facto está diretamente relacionado com uma omissão do Requerente que não colocou o cinto de segurança.
75. Face a tudo o exposto, a Recorrente entende que a indemnização ao Requerente deve ser excluída ou reduzida para 10% pois o Requerente contribuiu com dois fatores relevantes para os danos que sofreu, já que aceitou ser conduzido por uma pessoa que estava alcoolizada e ainda por cima não colocou o cinto de segurança.
76. Face ao exposto, requer-se a alteração da parte de direito da sentença recorrida na sequência da alteração da resposta dada à matéria de facto, com a necessária absolvição da Recorrente do pedido.
Pelo exposto, requer-se que seja a sentença ora recorrida revogada nos termos acima expostos.
***
Contra-alegou o requerente, defendendo a bondade e manutenção da decisão recorrida e a consequente improcedência do recurso.
O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
***
II – Âmbito do recurso.
Perante o teor das conclusões formuladas pela recorrente – as quais (excetuando questões de conhecimento oficioso não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso - arts. 608.º, nº2, 609º, 620º, 635º, nº3, 639.º/1, todos do C. P. Civil em vigor, constata-se que as questões essenciais a decidir são as seguintes:
1. Alteração da matéria de facto.
2. Responsabilidade pela produção do acidente e reparação provisória dos danos.
III – Fundamentação fáctico-jurídica.
1. Matéria de facto.

1.1. A factualidade a considerar é a seguinte:

1. O requerente nasceu no dia 24 de maio de 1995.
2. Antes de setembro de 2019, o requerente era um jovem ativo, trabalhador e saudável e não tinha quaisquer deformidades, limitações ou sequelas no seu corpo.
3. Trabalhava como operador de supermercado (repositor de produtos), no “P…” de Abrantes, auferindo de remuneração base 610,00 €, a que acrescia sempre o valor do subsídio de refeição e com caráter regular montantes referentes a “prémio de presença”, “trabalho noturno”, “trabalho domingo” e “horas extra”, que permitiam o seu sustento.
4. Entre a requerida, na qualidade de seguradora, e A…, na qualidade de segurada, foi celebrado um contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel sobre o veículo com a matrícula 37…, titulado pela Apólice n.º 0004354982.
5. No dia 6 de setembro de 2019, pelas 6:30 horas, circulava, na Auto Estrada A23, no sentido Torres Novas – Abrantes, o veículo ligeiro de passageiros de matrícula 37…, conduzido por J… e pertencente a A….
6. O requerente seguia como passageiro transportado no referido veículo.
7. Próximo do Km 12,500, onde o traçado da estrada descrevia uma ligeira curva à direita (considerando o sentido de marcha Torres Novas – Abrantes), o condutor perdeu o controlo do referido veículo 37… e este entrou em despiste, indo embater, sucessivamente, no separador central, na proteção metálica lateral direita e, novamente, no separador central, ficando imobilizado no eixo da faixa de rodagem.
8. Após o acidente, o requerente foi encontrado caído na faixa de rodagem, à distância aproximada de 1,30 metros do lado direito do veículo 37….
8A. O Requerente foi projetado para fora do veículo de matrícula 37… (aditado).
9. O referido acidente foi participado à requerida que, por carta datada de 24 de setembro de 2019, remetida ao requerente, informou que ia “proceder à regularização do sinistro”.
10. Ao longo dos meses de setembro, outubro, novembro, dezembro de 2019 e janeiro, fevereiro e março de 2020, a requerida foi suportando todas as despesas com a assistência clínica prestada ao requerente, designadamente internamentos hospitalares, intervenções cirúrgicas, tratamentos, medicamentos, transportes e consultas médicas de diversas especialidades.
11. A partir de janeiro de 2020, o requerente passou a beneficiar de um plano de tratamentos integrados das várias especialidades médicas no Hospital da Luz, em Lisboa, que integra a rede de prestadores de serviços clínicos da requerida.
12. Em março de 2020, estando o requerente ainda a necessitar de vários tratamentos urgentes, a requerida resolveu interromper a referida assistência clínica, provocando cancelamento de todos os tratamentos planeados para o requerente no Hospital da Luz.
13. A requerida deixou também de suportar as despesas do requerente com medicamentos e transportes para consultas e tratamentos.
14. Como consequência do acidente, o requerente ficou politraumatizado e gravemente ferido, apresentando as seguintes lesões:
- Traumatismo craniofacial com focos de contusão frontal e HSD bilateral;
- Esfacelo da face;
- Múltiplas fraturas dos 3 andares da face e avulsão parcial do maxilar superior e palato, assim como da região alveolodentária sinfisiária;
- Amputação traumática (in loco) do membro superior direito;
- Choque hemorrágico;
- Pneumomediastino e pneumotórax direitos; e
- Pancreatite traumática.
15. Após o acidente, o requerente foi transportado para o Centro Hospitalar Médio Tejo- Abrantes, onde foi assistido no serviço de urgência.
16. Em face da gravidade dos seus ferimentos, o requerente foi transferido de helicóptero para o serviço de urgência do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central.
17. No Hospital de S. José, o requerente foi transferido para o bloco operatório e submetido a:
- Traqueotomia infra ístmica com colocação de cânula Shirley n.º 8 não fenestrada com cuff;
- Extração de peças dentárias inviáveis;
- Contenção por osteossíntese de fraturas múltiplas do terço médio, nomeadamente ao nível dos rebordos infraorbitários e região Naso frontal;
- Contenção por osteossínteses de fratura alvéolo-dentária da sínfise mandibular (2 placas e 8 parafusos de titânio sistema Jeill 2.0);
- Contenção por osteossínteses de fratura do ângulo direito da mandíbula (1 placa e 5 parafusos de titânio sistema Jeill 2.0);
- Encerramento de comunicação oro nasal através de retalhos locais do vestíbulo e retalho de Bola de Bichat bilateralmente;
- Plastia de esfacelo complexo da face;
- Tamponamento nasal com 2 gazes gordas em cada fossa nasal; e
- Contenção externa da pirâmide nasal com steristrips.
18. Após a referida intervenção cirúrgica, o requerente foi transferido para a Unidade de Urgência Médica (UUM), onde ficou internado e iniciou antibioterapia ev com Amoxicilina/Acido clavulanico 2,2 g + de gentamicina + piperacilina/tazobactam.
19. Durante o referido internamento na UUM destacam-se as seguintes intercorrências:
- Colocação de PEG (sonda de Gastrostomia Endoscópica Percutânea) para aporte nutricional adequado;
- Infeção da ferida do coto do membro superior direito com MRSA com necessidade de revisão cirúrgica-enxerto de pele, no dia 29 de setembro, e antibioterapia com Linezolide;
- Reavaliação dos focos de contusão intracranianos e de HSD com TC- CE e RM-CE, que não apresentaram indicação para intervenção cirúrgica;
- Delirium hipercinético/reação de ajustamento, tendo sido acompanhado por Psiquiatra de ligação, tendo iniciado medicação dirigida;
- Cânula de traqueotomia e posterior remoção ao 28º dia de internamento;
- Deiscência da sutura cutânea da região malar à esquerda, cerca de 1x1 cm, da sutura intraoral na região parafinizaria direita e da sutura palatina
- Iniciou fisioterapia e terapia da fala.
20. No 34.º dia do referido internamento na UUM, o requerente foi transferido para a enfermaria do serviço de cirurgia Maxilo-Facial (CMF), onde prosseguiu os seus tratamentos.
21. O requerente manteve-se Hemo dinamicamente estável e a tolerar dieta pastosa.
22. Na revisão do coto do braço direito, registou-se: “coto de amputação de membro superior direito em contexto traumático com área cruenta do coto de amputação do MSD ao nível da região medial: enxerto totalmente pegado e com pequena área cruenta residual em franco processo de cicatrização”.
23. No dia 25 de outubro de 2019, o requerente teve alta do referido internamento no Hospital de S. José.
24. À data da referida alta, o requerente apresentava as seguintes sequelas:
- Enoftalmia à direita, sem diplopia ou limitação dos movimentos oculares;
- Retração da pálpebra inferior à esquerda, com consequente ectrópio;
- Deformidade da pirâmide nasal;
- Comunicação oro nasal a evoluir favoravelmente com diminuição progressiva das dimensões;
- Exposição de osso alveolar de 43 e 44, sem mobilidade;
- Exposição de parte da placa de osteossínteses do corpo mandibular direito.
25. O requerente teve alta do internamento no Hospital S. José com indicação para manter dieta pastosa oral e hidratação pela PEG.
26. Após a referida alta, o requerente prosseguiu com os seus tratamentos em várias especialidades médicas, designadamente cirurgia maxilofacial, cirurgia plástica, Medicina Física e Reabilitação, Psiquiatria e Neuro trauma.
27. No dia 25 de outubro de 2019, o requerente teve alta do Hospital S. José, ficando no domicilio a tomar medicação e a aguardar vaga de internamento no Hospital Curry Cabral (H.C.C.).
28. Em outubro de 2019, o requerente encontrava-se – como ainda hoje – totalmente incapacitado para trabalhar.
29. Por correio eletrónico enviado no dia 25 de outubro de 2019, o requerente, através do seu mandatário, enviou para a requerida 5 fotografias (que revelavam a gravidade das lesões sofridas) e reclamou o pagamento da quantia mensal de 700,00 € por conta da indemnização final e a título de salários perdidos.
30. Através de correio eletrónico e carta datada de 30 de outubro de 2019, o requerente solicitou à requerida o reembolso de despesas com medicamentos.
31. Por correio eletrónico e carta enviados no dia 6 de novembro de 2019, o requerente solicitou à requerida o reembolso de despesas com transportes e medicamentos,
32. A requerida pagou ao requerente as referidas despesas reclamadas.
33. No dia 11 de novembro de 2019, o requerente foi internado na especialidade de MER do CHULC, no Hospital Curry Cabral.
34. À entrada no referido Hospital, o requerente apresentava-se com necessidade de ajuda mínima no vestuário (membros inferiores), marcha e alimentação.
35. O requerente era previamente Dextro e não conseguia escrever com a mão esquerda.
36. No Hospital Curry Cabral, o Requerente iniciou programa de reabilitação nos sectores de fisioterapia, terapia ocupacional e terapia da fala, com vista a promover a independência das atividades da vida diária (AVD), nomeadamente a capacidade de escrita com a mão esquerda.
37. Durante o referido internamento, o requerente progrediu até uma dieta sólida com manutenção da ingestão de líquidos e fármacos pela PEG.
38. Do ponto de vista funcional, o requerente adquiriu capacidade de escrita e melhorou a velocidade de execução das atividades da via diária com o braço esquerdo.
39. No dia 17 de dezembro de 2019, o requerente teve alta do internamento no Hospital Curry Cabral, com proposta de medicação diária para o domicilio e seguimento em consultas em contexto de ambulatório.
40. A partir do dia 4 de janeiro de 2020, o requerente passou a ser assistido pelos serviços clínicos contratados pela requerida.
41. No dia 4 de janeiro de 2020, o requerente continuava – como ainda hoje – numa situação de incapacidade absoluta e total para trabalhar.
42. Por correio eletrónico enviado no dia 10 de janeiro de 2020, o requerente voltou a reclamar o reembolso de despesas relativas a transportes e medicamentos e o pagamento da referida quantia mensal de 700,00 €.
43. Através de correio eletrónico de 14 de janeiro de 2020, a requerida respondeu que “relativamente ao adiantamento de salários, vamos nesta data liquidar o valor de 375,96 €, relativo ao período de 6.9.12019 a 5.11.2019, tendo por base um rendimento líquido de 645,50 €, e deduzindo o valor de 915,00 € relativo a subsídios de doença processados pela Segurança Social.
44. Para processar as perdas verificadas a partir de 6 de novembro de 2019, a requerida solicitou o envio de nova declaração da segurança social, o que o requerente fez por correio eletrónico enviado no dia 21 de janeiro de 2020.
45. A Requerida acusou a receção da referida declaração e informou que iria proceder ao inicio dos pagamentos relativos a perdas salariais.
46. Ao longo dos meses de janeiro, fevereiro e março, a requerida foi acompanhando a situação clínica do requerente e pagando todas as despesas com a sua assistência médica, designadamente intervenções cirúrgicas, tratamentos, exames, medicamentos, transportes e consultas médicas.
47. Durante os referidos meses, a expensas da requerida, o requerente integrou um plano de tratamentos coordenados das várias especialidades médicas no Hospital da Luz, em Lisboa.
48. No referido período, o requerente foi acompanhado em consultas das seguintes especialidades:
- Cirurgia plástica e reconstrutiva (Dr. …)
- Medicina Física e Reabilitação (Dr.ª …);
- Ortopedia (Dr. …).
49. No dia 11 de março de 2020, o requerente foi internado no serviço de cirurgia Plástica do Hospital da Luz, em Lisboa, para ser submetido a tratamento cirúrgico devido às sequelas de fraturas da face.
50. No dia 11 de março de 2020, o requerente foi submetido a cirurgia, sob anestesia geral, tendo realizado:
- Remoção de material de OTS da orbita direita e do corpo da mandíbula à direita;
- Reconstrução do pavimento orbitário direito com PSI em PEEK fixo com 1 parafuso de compressão no rebordo orbitário;
- Reinserção do tendão cantal interno com fio de aço barbado fixo com 1 parafuso à vertente nasal direita: e
- Osteotomia segmentar da mandíbula.
51. No dia 16 de março de 2020, o requerente teve alta do referido internamento hospitalar com as seguintes indicações:
- Cabeça elevada;
- Dieta mole;
- Higiene oral após cada refeição com clorohexidina sem bochechar;
- Paracetamol 1 gr oral 6/6 h. SOS;
- Consulta dia 20 março pelas 14:30 h;
- Qualquer dúvida ou intercorrência contactar o Hospital.
52. Através de carta datada de 16 de março de 2020, a requerida comunicou ao requerente que: “após análise aos elementos que integram o nosso processo, nomeadamente à averiguação efetuada, concluímos que o sinistro não ocorreu nos moldes em que nos foi participado “e “Em face ao exposto, declinamos qualquer responsabilidade pela via extra - judicial, pela liquidação dos danos decorrentes do mesmo”.
53. Apesar da referida carta, a requerida manteve a assistência clínica ao requerente até ao final do mês de março de 2020.
54. No dia 27 de março de 2020, o requerente foi à consulta de Cirurgia Plástica e Reconstrutiva, no Hospital da Luz, tendo retirado os pontos que lhe foram colocados na referida cirurgia.
55. O requerente tinha consulta marcada de Cirurgia Plástica Reconstrutiva e Estética para o dia 1 de abril de 2020, tendo nesta data se deslocado de táxi, pago pela requerida, ao Hospital da Luz, em Lisboa, para ter a referida consulta, mas aqui foi informado de que já não ia ter a consulta marcada e que a partir da referida data a requerida deixava de assegurar o pagamento das despesas com a sua assistência clínica.
56. A partir do dia 1 de abril de 2020, a requerida deixou de custear as despesas com a assistência clinica prestada ao requerente, provocando o cancelamento de várias consultas e tratamentos de que o requerente necessita com urgência.
57. A requerida cancelou todos os tratamentos e consultas já marcadas no Hospital da Luz, designadamente das especialidades de Cirurgia Plástica Reconstrutiva e Estética, Psiquiatria e Ortopedia.
58. O requerente encontra-se com lesões graves no seu corpo, a carecer de tratamentos e numa situação de sério risco de agravamento do seu estado de saúde, física e psicológica, não podendo aguardar, sem prejuízo irreparável para a sua saúde e qualidade de vida, pela indemnização a que tem direito para receber os tratamentos de que necessita com urgência.
59. Em relatório clínico datado de 18 de maio de 2020, a Dr.ª …, médica de clinica geral, concluiu que perante a situação clinica do requerente, que este não pode suspender consultas e tratamentos, concluindo, ainda, que se o requerente não retomar os tratamentos “corre o risco de agravar e não reabilitar”.
60. Consta também do mencionado relatório clínico que o requerente “necessita de apoio psicológico e psiquiátrico fundamentais perante o dano irreversível”.
61. É urgente que o requerente retome os tratamentos e assistência clinica interrompidos pela requerida, sob pena de agravamento do seu estado de saúde física e psicológica.
62. De acordo com o plano de tratamentos do Hospital da Luz, estava previsto que o requerente fosse submetido a uma cirurgia em junho ou julho de 2020, a qual tinha como objetivo fechar o “buraco” aberto do céu da boca do requerente e permitir retirar a P.E.G. colocada na barriga.
63. Em consequência do cancelamento dos tratamentos, a referida cirurgia não foi realizada e o requerente continua com um “buraco” aberto no céu da boca e com a P.E.G. colocada na barriga.
64. Como consequência do acidente, o requerente ficou parcialmente sem gengivas e dentes nos maxilares.
65. O requerente atualmente continua sem gengivas, sem dentes e sem a colocação da prótese no braço direito amputado e por causa do seu aspeto físico, o requerente tem sentido angústia, tristeza e quebra de autoestima.
66. A interrupção dos tratamentos decidida pela requerida está a causar sofrimento psicológico ao requerente, que tem tendência a agravar-se.
67. O requerente ainda foi acompanhado em consultas de psicologia, a título particular, nos dias 18 de maio de 2020, 1 de junho de 2020 e 22 de junho de 2020.
68. O requerente teve que interromper esse apoio psicológico por estar sem receber quaisquer rendimentos e não ter possibilidades de pagar as respetivas consultas, no valor de 50,00 € cada uma.
69. No dia 9 de junho de 2020, o requerente foi à consulta de cirurgia plástica e reconstrutiva e estética, a título particular, no Hospital da Luz em Lisboa, na qual, e nos exames realizados no mesmo dia, o requerente despendeu (com a ajuda dos pais) a quantia de 268,00 €.
70. Na mencionada consulta no Hospital de Luz, programou-se uma intervenção cirúrgica para o dia 29 de julho de 2020, para execução dos seguintes tratamentos:
- Retalho livre com mica anastomoses;
- Retalhos cutâneos, micro cutâneos ou musculares com pedículo vascular ou vásculo nervoso identificado;
- Alongamento ósseo com fixador externo;
- Correção do nariz em sela com enxerto ósseo ou cartilagens;
- Excisão de cicatrizes da face, pescoço ou mão e plastia dos retalhos locais.
71. O custo da referida intervenção cirúrgica foi estimado em 35 000,00 €, quantia que o requerente não tem possibilidades económicas para pagar.
72. Em consequência do acidente, o requerente ficou numa situação de dependência de terceiros para fazer face às suas despesas de subsistência e sem possibilidades de suportar as despesas com os transportes, medicamentos e tratamentos que continua a carecer.
73. O requerente não recebe qualquer quantia a título de subsidio de doença ou qualquer outro rendimento e depende da ajuda dos pais para fazer face às suas despesas mensais de subsistência e de saúde.
74. O requerente tem gastos mensais, designadamente de eletricidade, gás, água, telemóvel, medicamentos, transportes, alimentação e produtos de higiene pessoal.
75. O requerente não aufere qualquer rendimento e depende da ajuda dos pais para fazer face às suas despesas mensais de subsistência e de saúde
76. O requerente necessita de apoio psicológico com a frequência não inferior a uma vez por semana.
77. Após o acidente, o requerente passou a ter despesas periódicas com medicamentos, designadamente “Neurondontina” e “Parondontax”.
78. Depois de declinar a sua responsabilidade, a requerida procedeu a averiguações acerca do acidente, tendo os peritos averiguadores emitidos os relatórios juntos aos autos (requerimento com a referência 7362013), cujo teor se dá por reproduzido.
79. Ao final da tarde do dia 5 de setembro de 2019, J… foi a uma festa de anos de um amigo, onde se encontrou com o requerente.
80. Cerca das 03 horas do dia 6 de setembro de 2019 saíram ambos da dita festa de anos e foram para a Discoteca “S…”, situada em Torres Novas.
81. Após saírem da discoteca, pararam no MC Drive de Torres Novas, a fim de comerem alguma coisa, e de seguida seguiam para as suas residências, mas na A23 ocorreu o despiste do veículo de matrícula 37-05-UP.

***
2. Reapreciação da matéria de facto.
A recorrente impugnou os factos indiciariamente provados e descritos nos números 5 e 6, propondo que deles fique a constar a seguinte redação:
“5. No dia 6 de setembro de 2019, pelas 6:30 horas, circulava, na Auto Estrada A23, no sentido Torres Novas – Abrantes, o veículo ligeiro de passageiros de matrícula 37…, conduzido pelo Requerente e pertencente a A….
6. O J… seguia como passageiro transportado no referido veículo”.
E mais pretende que sejam aditados os seguintes factos provados:
“7A. Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas em 5 e 7 dos factos indiciariamente provados, o J… levava o cinto de segurança colocado e Requerente não levava o cinto de segurança colocado.
7B. O Requerente foi projetado para fora do veículo de matrícula 37….
7C. Nos dias seguintes ao acidente, J… sentiu bastantes dores no peito devido ao cinto de segurança”.
Sustenta a sua divergência no depoimento de J…, defendendo ser este que seguia como passageiro, não o condutor, sendo o veículo conduzido pelo requerente, bem como nos depoimentos dos peritos da Requerida C… e R…, acrescentando que o depoimento de H…, militar da GNR (cabo), que elaborou a participação do acidente junta nos autos, não pode ser valorada no sentido de se dar como provado ser o veículo conduzido por J…, dado que este, quando foi ouvido logo a seguir ao acidente encontrava-se com um comportamento alterado, quer pela taxa de alcoolémia, quer pelo choque decorrente do acidente, o que afasta a credibilidade do seu depoimento.
Está em causa, pois, segundo a recorrente, a versão do acidente dada como assente, nomeadamente que “o veículo era conduzido por J… e o requerente seguia como passageiro transportado no referido veículo”.
A recorrente veio sustentar que o veículo era efetivamente conduzido pelo requerente e, a ser assim, estaria excluída qualquer responsabilidade da sua parte quanto à obrigação de o indemnizar pelos danos sofridos.
Ora, está provado, factologia que não vem impugnada, que:
9. O referido acidente foi participado à requerida que, por carta datada de 24 de setembro de 2019, remetida ao requerente, informou que ia “proceder à regularização do sinistro”.
10. Ao longo dos meses de setembro, outubro, novembro, dezembro de 2019 e janeiro, fevereiro e março de 2020, a requerida foi suportando todas as despesas com a assistência clínica prestada ao requerente, designadamente internamentos hospitalares, intervenções cirúrgicas, tratamentos, medicamentos, transportes e consultas médicas de diversas especialidades.
30. Através de correio eletrónico e carta datada de 30 de outubro de 2019, o requerente solicitou à requerida o reembolso de despesas com medicamentos.
31. Por correio eletrónico e carta enviados no dia 6 de novembro de 2019, o requerente solicitou à requerida o reembolso de despesas com transportes e medicamentos,
32. A requerida pagou ao requerente as referidas despesas reclamadas.
40. A partir do dia 4 de janeiro de 2020, o requerente passou a ser assistido pelos serviços clínicos contratados pela requerida.
41. No dia 4 de janeiro de 2020, o requerente continuava – como ainda hoje – numa situação de incapacidade absoluta e total para trabalhar.
42. Por correio eletrónico enviado no dia 10 de janeiro de 2020, o requerente voltou a reclamar o reembolso de despesas relativas a transportes e medicamentos e o pagamento da referida quantia mensal de 700,00 €.
43. Através de correio eletrónico de 14 de janeiro de 2020, a requerida respondeu que “relativamente ao adiantamento de salários, vamos nesta data liquidar o valor de 375,96 €, relativo ao período de 6.9.12019 a 5.11.2019, tendo por base um rendimento líquido de 645,50 €, e deduzindo o valor de 915,00 € relativo a subsídios de doença processados pela Segurança Social.
44. Para processar as perdas verificadas a partir de 6 de novembro de 2019, a requerida solicitou o envio de nova declaração da segurança social, o que o requerente fez por correio eletrónico enviado no dia 21 de janeiro de 2020.
45. A Requerida acusou a receção da referida declaração e informou que iria proceder ao inicio dos pagamentos relativos a perdas salariais.
46. Ao longo dos meses de janeiro, fevereiro e março, a requerida foi acompanhando a situação clínica do requerente e pagando todas as despesas com a sua assistência médica, designadamente intervenções cirúrgicas, tratamentos, exames, medicamentos, transportes e consultas médicas.
47. Durante os referidos meses, a expensas da requerida, o requerente integrou um plano de tratamentos coordenados das várias especialidades médicas no Hospital da Luz, em Lisboa”.
E mais está assente que só em março de 2020, estando o requerente ainda a necessitar de vários tratamentos urgentes, a requerida resolveu interromper a referida assistência clínica, provocando cancelamento de todos os tratamentos planeados para o requerente no Hospital da Luz, deixando também de suportar as despesas do requerente com medicamentos e transportes para consultas e tratamentos. E, através de carta datada de 16 de março de 2020, comunicou ao requerente que: “após análise aos elementos que integram o nosso processo, nomeadamente à averiguação efetuada, concluímos que o sinistro não ocorreu nos moldes em que nos foi participado “e que “Em face ao exposto, declinamos qualquer responsabilidade pela via extra - judicial, pela liquidação dos danos decorrentes do mesmo”.
O recorrido, nas suas contra-alegações, invocou que por carta datada de 24.9.2019 a Recorrente assumiu a responsabilidade pela regularização do sinistro, comunicação que consubstancia uma confissão extrajudicial em documento particular dirigida à parte contrária, atribuindo-lhe a lei força probatória plena, conforme Jurisprudência que citou. E a regularização dos sinistros que envolvem danos corporais está sujeita a regras legais (v. artigo 37º do DL 291/2007 de 21/8), pelo que essa carta escrita a assumir a responsabilidade tem que produzir efeitos jurídicos.
Assim, importa previamente apreciar se a recorrente pode impugnar a mencionada factologia e relacionada com as circunstâncias em que se deu o acidente, em particular quem conduzia o veículo, se o recorrido ou o J….
Ora, os artigos 31.º a 46.º do Regime do Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel (doravante RSORCA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto, estabelecem as regras e os procedimentos a observar pelas empresas de seguros com vista a garantir, de forma pronta e diligente, a assunção da sua responsabilidade e o pagamento das indemnizações devidas em caso de sinistro no âmbito do seguro de responsabilidade civil automóvel.
Assim, prescreve o n. º1 do art.º 36.º deste diploma legal:
1 - Sempre que lhe seja comunicada pelo tomador do seguro, pelo segurado ou pelo terceiro lesado a ocorrência de um sinistro automóvel coberto por um contrato de seguro, a empresa de seguros deve:
a) Proceder ao primeiro contacto com o tomador do seguro, com o segurado ou com o terceiro lesado no prazo de dois dias úteis, marcando as peritagens que devam ter lugar;
b) Concluir as peritagens no prazo dos oito dias úteis seguintes ao fim do prazo mencionado na alínea anterior;
c) Em caso de necessidade de desmontagem, o tomador do seguro e o segurado ou o terceiro lesado devem ser notificados da data da conclusão das peritagens, as quais devem ser concluídas no prazo máximo dos 12 dias úteis seguintes ao fim do prazo mencionado na alínea a);
d) Disponibilizar os relatórios das peritagens no prazo dos quatro dias úteis após a conclusão destas, bem como dos relatórios de averiguação indispensáveis à sua compreensão;
e) Comunicar a assunção, ou a não assunção, da responsabilidade no prazo de 30 dias úteis, a contar do termo do prazo fixado na alínea a), informando desse facto o tomador do seguro ou o segurado e o terceiro lesado, por escrito ou por documento eletrónico;
f) Na comunicação referida na alínea anterior, a empresa de seguros deve mencionar, ainda, que o proprietário do veículo tem a possibilidade de dar ordem de reparação, caso esta deva ter lugar, assumindo este o custo da reparação até ao apuramento das responsabilidades pela empresa de seguros e na medida desse apuramento.”
E o seu 37.º estabelece:
‘’1 - Sempre que lhe seja comunicada pelo tomador do seguro, pelo segurado ou pelo terceiro lesado a ocorrência de um sinistro automóvel coberto por um contrato de seguro e que envolva danos corporais, a empresa de seguros deve, relativamente à regularização dos danos corporais:
a) Informar o lesado se entende necessário proceder a exame de avaliação do dano corporal por perito médico designado pela empresa de seguros, num prazo não superior a 20 dias a contar do pedido de indemnização por ele efetuado, ou no prazo de 60 dias a contar da data da comunicação do sinistro, caso o pedido indemnizatório não tenha ainda sido efetuado;
b) Disponibilizar ao lesado o exame de avaliação do dano corporal previsto na alínea anterior no prazo máximo de 10 dias a contar da data da sua receção, bem como dos relatórios de averiguação indispensáveis à sua compreensão;
c) Comunicar a assunção, ou a não assunção, da responsabilidade no prazo de 45 dias, a contar da data do pedido de indemnização, caso tenha, entretanto, sido emitido o relatório de alta clínica e o dano seja totalmente quantificável, informando daquele facto o tomador do seguro ou o segurado e o terceiro lesado, por escrito ou por documento eletrónico.
2 - Sempre que, no prazo previsto na alínea c) do número anterior, não seja emitido o relatório de alta clínica ou o dano não seja totalmente quantificável:
a) A assunção da responsabilidade aí prevista assume a forma de «proposta provisória», em que nomeia especificamente os montantes relativos a despesas já havidas e ao prejuízo resultante de períodos de incapacidade temporária já decorridos;
b) se a proposta prevista na alínea anterior tiver sido aceite, a empresa de seguros deve efetuar a assunção da responsabilidade consolidada no prazo de 15 dias a contar da data do conhecimento pela empresa de seguros do relatório de alta clínica, ou da data a partir da qual o dano deva considerar-se como totalmente quantificável, se posterior.
3 - À regularização dos danos corporais é aplicável o previsto no artigo anterior no que não se encontre fixado no presente artigo, contando-se os prazos aí previstos a partir da data da apresentação do pedido de indemnização pelo terceiro lesado, sem prejuízo da aplicação da alínea b) do n.º 6 desse artigo ter como limite máximo 90 dias.
4 - Relativamente à regularização dos danos materiais sofridos por lesado a quem o sinistro haja igualmente causado danos corporais, a aplicação do previsto no artigo anterior nos prazos aí previstos requer a sua autorização, que lhe deve ser devidamente enquadrada e solicitada pela empresa de seguros.
5 - Não ocorrendo a autorização prevista no número anterior, a empresa de seguros diligencia de novo no sentido aí previsto passados 30 dias de ter tomado conhecimento do sinistro sem que, entretanto, lhe tenha sido apresentado pedido de indemnização pelo lesado, podendo, todavia, este opor-se de novo à aplicação então dos prazos em causa”.
Ora, ficou provado que o acidente foi participado à requerida/recorrente, sendo que esta, por carta datada de 24 de setembro de 2019, remetida ao requerente/recorrido, informou-o que ia “proceder à regularização do sinistro”.
Pode ler-se nessa carta, junta como doc. n.º 5, sobre o assunto” Comunicação da responsabilidade”:
“Reportando-nos ao sinistro em título, de cuja regularização nos estamos a ocupar, cumpre-nos informar que, de acordo com os elementos probatórios de que dispomos, estamos a assumir a responsabilidade pela regularização dos danos decorrentes do presente sinistro.
Neste sentido, iremos proceder à regularização do sinistro, pelo que agradecemos que, para nossa análise, nos remeta eventuais despesas que tenha suportado com o sinistro em referência, devidamente justificadas e acompanhadas dos originais de faturas/recibos comprovativos dos respetivos pagamentos.
Mais informamos que os pagamentos do presente processo poderão ser efetuados através de transferência bancária, solicitando que, para o efeito, nos seja remetido comprovativo de IBAN da conta, com a correspondente identificação do seu titular” (nosso sublinhado).
Assim, perante esta comunicação, efetuada nos termos da alínea e) do n.º 1 do citado art.º 36.º, do RSORCA, urge concluir que a recorrente assumiu expressamente a responsabilidade pelos danos sofridos pelo recorrido em consequência do acidente, participado pelo condutor do veículo, o que consubstancia uma verdadeira confissão extrajudicial da assunção de responsabilidade por banda da recorrente, nos termos dos art.ºs 355.º, 355.º/4 e 358.º/2 do C. Civil.
Com efeito, prescreve o n.º 2 do art.º 358.º do C. Civil que “A confissão extrajudicial, em documento autêntico ou particular, considera-se provada nos termos aplicáveis a estes documentos e, se for feita à parte contrária ou a quem a represente, tem força probatória plena”.
Como foi sentenciado no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 9/9/2013, proc. n.º 1609/08.0TJPRT.P1, in www.dgsi.pt, “I. Tendo a seguradora, em carta dirigida ao representante do lesado, assumido a culpa do condutor do veículo segurado e a responsabilidade pela reparação dos danos decorrentes do acidente, tal declaração tem a natureza de confissão extrajudicial, revestindo força probatória plena, nos termos do n.º 2 do artigo 358.º do Código Civil. II - Na situação descrita torna-se irrelevante o facto de a confissão ter sido assumida numa fase negocial e de as partes não terem chegado a acordo quanto ao montante da indemnização, não podendo tal confissão ser ignorada ou esquecida pelo tribunal, que deverá recusar a (inútil) discussão da culpa, e passar diretamente à avaliação dos danos “(Nosso sublinhado).
No mesmo sentido se pronunciou o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 9/5/2019, proc. n.º 5995/18.5T8ALM-A.L1-2, disponível em www.dgsi.pt, afirmando:
“a circunstancia da Requerida Seguradora ter remetido, aos lesados, cartas nas quais assume a regularização dos prejuízos decorrentes do acidente, traduz efetiva assunção de responsabilidade por parte da mesma no ressarcimento dos danos decorrentes do evento lesivo;
- o facto da assunção de responsabilidade assumir a forma de “proposta provisória” – cf., a alínea a), do nº. 2, do artº. 37º ,do DL nº. 291/2007, de 21/08 - nada tem a ver com o assumir da responsabilidade indemnizatória ou ressarcitória, mas antes devido ao facto do dano, à data, ainda não poder ser totalmente quantificável, ou seja, a provisoriedade legalmente equacionada não se reporta ao assumir da responsabilidade, mas antes á definição do quantum indemnizatório a operar;
- no âmbito do enunciado quadro normativo, a seguradora pode assumir ou não assumir a responsabilidade pela regularização dos danos decorrentes do evento lesivo, fundamentando a não assunção da responsabilidade nos termos equacionados no artº. 40º do citado Decreto-Lei;
- a posição assumida pela Requerida seguradora é claramente de assunção da responsabilidade de regularização dos prejuízos decorrentes do acidente, o que considerou, e efetivou, tal como expressamente reconheceu, após averiguação que efetuou “com o fito de tomar uma decisão quanto à responsabilidade, tendo em conta os elementos recolhidos” – cf., artigos 3º, 4º e 6º da oposição/contestação;
- pelo que, considera-se existir confissão extrajudicial em documento particular, dirigida à parte contrária, atribuindo-lhe a lei força probatória plena;
- determinando que, in casu, fruto daquela força probatória plena, inexista lugar á discussão da culpa na produção ou eclosão do evento lesivo, sendo apenas discutível o âmbito e avaliação dos danos a ressarcir;” (nosso sublinhado).
Assim sendo, as declarações contidas na referida missiva, com consequente acompanhando da situação clínica do requerente e pagamento de todas as despesas com a sua assistência médica, designadamente intervenções cirúrgicas, tratamentos, exames, medicamentos, transportes e consultas médicas, até março de 2020, comprometendo-se a proceder ao inicio dos pagamentos relativos a perdas salariais, reúne todos os requisitos da confissão extrajudicial, em documento particular, dirigida à parte contrária, atribuindo-lhe a lei força probatória plena.
E em virtude desta força probatória plena fica excluída a discussão da culpa na produção do acidente causador dos danos reclamados, podendo apenas discutir-se o âmbito e avaliação dos danos a ressarcir, pois que tendo a recorrente assumido a responsabilidade pelo acidente e pagamento dos danos sofridos pelo recorrido, não pode questionar essa responsabilidade, nomeadamente imputando ao recorrido a culpa na produção desse acidente ou colocá-lo a conduzir o veículo automóvel, ou seja, não pode discutir a dinâmica do acidente com vista a “dar o dito por não dito” e imputar, agora, a responsabilidade pela respetiva produção ao recorrido, a menos que alegasse e demonstrasse “a superveniência de algum facto ou elemento probatório relativamente ao momento em que assumiu a responsabilidade, o que a recorrente não faz” – cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa citado.
Seguindo idêntica interpretação, em caso similar ao dos presentes autos, o recente Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 19/11/2020, proc. n.º 5748/18.0T8MAI.P1, disponível em www.dgsi.pt, considerou agir com manifesto abuso de direito no exercício da sua defesa, na modalidade de venire contra factum proprium, por revelar conduta contraditória, excedendo manifestamente os limites impostos pela boa fé (art.º 334.º do C. Civil), “ a R. seguradora que, tendo assumido inequivocamente a responsabilidade pelo acidente e a obrigação de reparar os danos dele emergentes em momento prévio à instauração da ação pelos lesados, recusa depois essa responsabilidade, sem explicação reconhecida e aceite, conduzindo os lesados à necessidade de instaurar aquela acção judicial, nela passando a discutir as circunstâncias em que o acidente ocorreu e os pressupostos da responsabilidade civil, designadamente a culpa do seu segurado, concluindo pela sua absolvição”.
Mas ainda que assim não fosse, sempre a impugnação da matéria facto referida deverá ser desatendida.
Na verdade, a propósito da fundamentação da impugnada factualidade, escreveu-se na sentença recorrida o seguinte:
“Passando, agora, à fundamentação dos factos que, sendo controvertidos, dizem respeito à dinâmica do acidente objeto dos autos, sobretudo no que respeita ao condutor do único veículo envolvido no acidente, o nó górdio da presente decisão de facto (factos vertidos nos incisos 5, 6, 7 e 8), cumpre antes de mais assinalar que sobre eles foi particularmente relevante o depoimento da testemunha H…, militar da GNR (cabo) que se dirigiu ao local logo após a ocorrência do sinistro e que foi responsável pela elaboração do auto de participação de fls. 25 verso a 27 e aditamento de fls. 27 verso a 28 verso, que confirmou na íntegra em sede de audiência final.
Afirmou que na participação de acidente de viação identificou como condutor do veículo com a matrícula 37…J… porque foi este quem confirmou tal facto no local e foi ele que se sujeitou ao exame de pesquisa da taxa de álcool no sangue, sendo certo que na altura não houve nenhuma dúvida que era aquele o condutor.
Mais explicou que na sua ótica, e em face dos danos, quer no veículo 37…, onde seguiam o requerente e J…, quer nas barras metálicas do separador central e das proteções metálicas da berma direita, da A23, atento o sentido de marcha do veículo, o acidente se deu da seguinte forma: por motivo desconhecido (mas que o participante aventou ser o sol de frente, a sonolência e o álcool), o condutor do UP foi embater no separador central com toda a sua lateral esquerda; que, em face disso, o condutor terá guinado repentinamente para a direita indo embater com a frente do veículo na proteção lateral direita, após o que, ainda foi embater novamente no separador central, aduzindo, ainda, que o passageiro terá sido “cuspido” do veículo naquele segundo embate, mas sendo ainda arrastado no solo, em virtude dos danos físicos que apresentava na face (quase desfeita) e à amputação total do braço que foi encontrado na zona de terra do separador central, imobilizando-se no local que consta assinalado no croqui a cerca de 1,30 metros do veículo UP.
De facto, esta descrição da dinâmica do acidente, feita pela testemunha H…, está em sintonia com o que decorre do croqui elaborado, que não foi impugnado ou objeto de qualquer reclamação, em total conexão com os danos nas chapas do separador central e nas chapas de proteção lateral metálicas, com os danos no veículo UP, assim como com a posição do corpo do requerente na via, após o acidente, e os danos físicos que sofreu, descrição que é reveladora, quer da velocidade elevada de que ia animada a viatura, quer da violência dos embates, consequência, também, dessa velocidade, quer da total desatenção, imprudência e imperícia do condutor do UP, em nosso entender, a testemunha J….
Acresce que, só aquela descrição está de acordo com as regras da experiência e com critérios de normalidade, mas, em especial, com as leis da física.
Ninguém assistiu ao acidente. As únicas pessoas que o poderiam explicar era a testemunha J… e o requerente, pelo menos quanto a saber quem conduzia, nas circunstâncias de tempo e lugar referidas na participação de acidente de viação, a viatura acidentada.
O requerente não prestou declarações (nem perante a autoridade policial, no momento, nem pelos peritos averiguadores, nem no tribunal) e a testemunha Júlio Delaunay depôs de uma forma inverosímil, com total ausência de convicção, de forma reticente, pensava quase sempre antes de responder, com uma postura de comprometimento, muito pouco à vontade a depor e, acima de tudo, com total interesse no desfecho do processo, pelos motivos que infra aludiremos.
E nem as posteriores averiguações dos peritos averiguadores – as testemunhas C… (perito averiguador, prestador de serviços da requerida) e R… (perito averiguador com funções de coordenador, prestador de serviços da requerida há cerca de 15 anos) – que emitiram os respetivos relatórios, “Relatório de Investigação Final” e “Relatório de Acompanhamento/Supervisão”, e que concluíram que o condutor do UP era J…, permitiram colocar em crise a convicção do tribunal relativamente à circunstância de quem era o condutor do UP quando ocorreu o acidente.
Desde logo, o depoimento de J… suscitou-nos profundas reservas não só pelos motivos que acima já deixamos expostos, mas também porque apresentou uma memória demasiado seletiva para merecer qualquer credibilidade, o que, aliás, também concluíram os senhores peritos averiguadores quanto à memória do mesmo acerca dos factos em causa.
Senão vejamos: logo após o acidente identificou-se como sendo o condutor do veículo com a matrícula 37-05-UP; no dia 10 de setembro de 2019 (quatro dias após o acidente) a testemunha J… assinou a declaração Amigável de Acidente de Viação (DAAA) – fls. 29 – onde está identificado como condutor ele próprio (abre-se aqui um parêntesis para relevar que a testemunha em causa confirmou que a assinatura ali aposta é a sua); na participação de sinistro enviada à requerida (fls. 29 verso) é a testemunha J… que é identificado como condutor e naquela é escrito o seguinte: “o condutor disse à GNR de Abrantes não se lembrar como tudo aconteceu” (o que vai de encontro ao afirmado pelo participante H…); decorridos quatro meses sobre a data do acidente (14 de janeiro de 2020), a testemunha J… foi ouvida pelos peritos averiguadores e não revelou quaisquer dúvidas que era ele o condutor do veículo, vertendo por escrito o seu depoimento sendo de relevar o seguinte: “Embora não me recorde com toda a clareza, quer pelo álcool, quer pelo trauma, tenho a certeza que eu levava o cinto de segurança. Quanto ao meu colega P… é minha forte convicção de que não levava o cinto de segurança posto. Esta convicção que tenho prende-se com o facto de eu não ir a muita velocidade e ao facto de o Pedro ter sido cuspido/projetado para fora do veículo durante a trajetória do despiste.” (fls. 155, confirmando a sua assinatura aqui aposta) – sublinhado nosso.
Igualmente aos peritos averiguadores não se suscitou dúvidas acerca de ser J… o condutor, como afirmou o primeiro perito a ser inquirido em sede de audiência final, C…, mas após aquele afirmar, convictamente, que levava colocado o cinto de segurança e que nos dois/três dias a seguir ao acidente apresentava umas dores no peito, provocadas por aquele dispositivo, e de ter batido com o lado direito da cabeça em qualquer parte do veículo, levou-os a procederem, no dia 20 de janeiro de 2020, à análise da viatura UP que se encontrava num quintal da casa da avó da testemunha J…, no estado em que mostram as fotografias de fls. 157 a 160 dos autos.
Uma vez mais, a testemunha J… escreveu o que consta de fls. 156 (confirmando a sua assinatura aqui aposta), em resumo que embora não se recordasse com toda a clareza, quer pelo álcool, quer pelo trauma, tinha a certeza que tinha o cinto de segurança colocado, tanto que nos dias seguintes após este despiste ter ocorrido, teve bastantes dores no peito devido ao cinto de segurança e que relativamente ao seu colega, P…, tinha uma forte convicção de que o mesmo não tinha o cinto de segurança colocado, acrescentando que esta sua convicção se prendia com o facto de o requerente ter sido cuspido/projetado para o exterior do veículo durante a trajetória do despiste e, por fim, informou que quer devido ao seu estado de embriaguez, quer devido ao forte trauma que tinha na altura do ocorrido, não consegue dizer qual dos dois era o condutor, se era ele próprio, ou se era o requerente – sublinhado nosso.
Nesta data, a testemunha J… já não se recordava de quem conduzia o UP.
Em face destes elementos, a testemunha C… conclui assim no seu relatório:
….
Não querendo naturalmente pôr em causa a valia técnica dos citados relatórios e as insuspeitas experiências e competências dos seus autores – aliás demonstradas em sede de audiência final – sempre outros meios de prova colocam em crise tais premissas.
Veja-se que a testemunha C… afirmou que até 14 de janeiro de 2020 o J… assumiu sempre que era o condutor e só depois, perante algumas dúvidas suscitadas (e suscitadas pelos peritos, leia-se), é que o mesmo começou a dizer que já não se recordava de quem era o condutor.
Ademais, importa sublinhar que a testemunha R… à questão que lhe foi colocada, respondeu perentoriamente que o pré - tensor do banco do passageiro já poderia ter sido acionado anteriormente, sendo possível a colocação do cinto de segurança normalmente, embora, pelas explicações que deu, o tribunal possa concluir que o cinto de segurança não teria o mesmo efeito e alcançar o objetivo que é impedir que a pessoa que o leva colocado fique retida no veículo e não seja projetada para o exterior.
Esta afirmação da testemunha R… é decisiva. É de importância extrema. Significa, repetimos, que os pré-tensores dos cintos de segurança (os que são visíveis nas fotos de fls. 160 a 163) podem ser acionados e permitir que os cintos de segurança possam ser colocados pelo condutor e passageiro.
Acrescentaríamos até, tendo sempre presente a preocupação de salvaguardar o devido respeito por melhor entendimento, que é mais plausível à luz da restante prova produzida, das regras da experiência comum, e das presunções judiciais que a testemunha J… é que não levava o cinto de segurança colocado, pois bateu com a cabeça em qualquer local do interior do veículo, quiçá, na de P…, e este igualmente não levaria tal dispositivo colocado, ou levá-lo-ia, mas pelo facto de o pré – tensor já não se encontrar a funcionar não desempenhou a sua função de proteção, como aliás, foi bem explicado pela testemunha R… e igualmente consta de fls. 163 dos autos. Tais lesões no peito da testemunha J… não foram descritas na participação do sinistro (fls. 29 verso), ao contrário de outras (traumatismo craniano e falta de audição do lado direito), e não se mostram juntos aos autos quaisquer elementos clínicos relativos àquele que também se dirigiu ao hospital.
Idêntica plausibilidade nos merece, à mesma luz, a seguinte circunstância: a viatura foi peritada mais de quatro meses depois do acidente, esteve à guarda da sua proprietária, num descampado, tinha a lateral a porta e janela do passageiro tapada com plásticos, seguros por fita cola, como foi confirmado pela testemunha R… e, por esse facto, não foi aberta, nem analisada.
Por outro lado, é fundamental ter em conta as denominadas presunções judiciais que são ilações que o julgador extrai a partir de factos conhecidos para dar como provados factos desconhecidos, nos termos definidos no art.º 349.º, do Código Civil.
Tais presunções judiciais são admitidas nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal, conforme o disposto no art.º 351.º, do mesmo Código.
Porque o facto sobre quem conduzia a viatura UP se mostra controvertido e não é passível de demonstração direta, é antes por via de circunstâncias e comportamentos exteriores que, à luz da experiência comum, indiciem tal facto.
No que, em concreto, à matéria de facto em causa respeita, a convicção do Tribunal acerca da sua verificação, para além dos elementos probatórios já mencionados, ficou a dever-se à conjugação de determinados fatores, à luz das regras da experiência comum e da normalidade do acontecer, a saber:
- A circunstância de a testemunha J… já ter pelo menos uma condenação por crime sob influência do álcool, pela qual cumpriu cinco meses de inibição de conduzir, no ano de 2018 ou 2019 (não soube esclarecer em concreto).
- A circunstância de a testemunha J… ter tido um acidente de viação em abril de 2019, utilizando um expediente parecido com o atual – a troca de condutores -, no qual foi identificada a mãe daquele como condutora, vindo a ser a esta instaurado um processo crime por falsas declarações no qual foi condenada;
- A circunstância de a testemunha J… ter a correr contra si um processo crime por crime sob influência do álcool devido a este acidente, por apresentar, no âmbito da condução que levava a efeito, 1,95 gramas de álcool no sangue, por litro.
- A circunstância de a testemunha J… poder ver a correr contra si, com elevada probabilidade, um processo instaurado pela ora requerida no âmbito do direito de regresso.
- A circunstância de a testemunha H… merecer credibilidade, ter sido espontânea e o seu depoimento se conjugar com outros elementos de prova, nomeadamente, em alguns pontos, com os depoimentos dos peritos averiguadores.
- O facto de os danos interiores no trinco da porta do condutor poderem ter sido provocados noutra circunstância (voltamos a sublinhar que a viatura UP foi analisada em 20 de janeiro de 2020) e neste contexto, e na ausência de quaisquer outros elementos probatórios relevantes a tal propósito, não se mostra suficientemente indiciada que o trinco interior da porta do condutor se danificou porque esta se abriu durante o despiste e por isso o requerente terá sido projetado para o exterior por aquela porta.
- A circunstância de a testemunha J… ter afirmado que se recorda de ter aberto a porta do UP e ter visto logo o corpo do requerente estendido no chão, nada indicia, não só pela falta de credibilidade daquele depoimento, e da sua memória seletiva, mas também porque a testemunha Júlio poderia perfeitamente ter saído do lugar do condutor para ir procurar o seu amigo, que não estava no interior da viatura, e tê-lo encontrado no local em que o mesmo ficou. E em muito mau estado.
Não podemos de forma alguma concordar com a afirmação produzida pela testemunha C… no seu relatório de investigação – “troca de condutores, esta, que altera completamente as condições de regularização do sinistro, e que nos parece ter o claro intuito de “potenciar” os valores de indemnização ao sinistrado mais grave, Sr. P….
A intenção por detrás desta firmação é um “pau de dois gumes”, mas seguramente que nos “pratos da balança” a condução do UP por J… pesa muito mais em termos de desvantagens para este do que a condução do requerente P….
De sorte que, perante estes meios probatórios e se alguma dúvida restasse, a dúvida sobre quem conduzia a viatura UP não pode senão ser resolvida – no quadro dum processo que tem a natureza dum procedimento cautelar e onde a prova dos factos que consubstanciam a obrigação de indemnizar do requerido se basta com a apresentação de simples indícios da sua existência, não se exigindo, de modo nenhum, uma quase certeza da sua existência – a favor do requerente e contra a seguradora ora requerida.
Eis como, em suma, se justifica simultaneamente, em nosso entendimento, o juízo probatório positivo inerente ao facto provado em 5 e 6 e o juízo probatório negativo relativo aos factos plasmados nos incisos 2 e 3 dos não provados” – Fim de citação.
Ora, perante a audição dos depoimentos identificados pela recorrente não podemos deixar de acompanhar a convicção formulada pela 1.ª instância e exaustivamente fundamentada.
Na verdade, a testemunha J… sempre se assumiu como o condutor do veículo, o que nunca foi posto em causa pela recorrente, nomeadamente quando assumiu a responsabilidade pelos danos sofridos pelo recorrido.
A testemunha H…, cabo da GNR, deslocou-se ao local do acidente, elaborou a respetiva participação, acompanhou a testemunha J… ao Hospital, confirmou - e nunca teve qualquer dúvida a esse respeito, disse-, ser ele o condutor da viatura e que sempre se apresentou como tal, identificou-se no local como sendo ele o condutor, tendo entregue e assinado, quatro dias depois, a Declaração Amigável, na qual é indicado como o condutor do veículo.
Mais afirmou a testemunha que “não tive dúvidas em tempo algum quem é o condutor e quem é o passageiro, porque o condutor assumiu desde o primeiro minuto que era ele o condutor”.
Acresce que a testemunha J…, poucos instantes antes do acidente, (cerca de 15 minutos), viu o J… a conduzir o veículo 37… , no M… de Torres Novas.
Com efeito, esta testemunha declarou conhecer de vista o J…, por morar em localidade próxima ( cerca de 10 Km) e que se encontraram na discoteca S…, por volta das 03:00 horas, e depois foram ao M… de Torres e o segundo carro que estava aí à sua frente era o veículo conduzido pelo J…, estando o recorrido sentado no banco do passageiro, relatando que o J… saiu do carro e foi pedir esclarecimentos ao condutor da viatura que estava atrás dele, e à frente do carro da testemunha, que lhe buzinou, e acabou por levar um murro. A testemunha reafirmou que ele saiu do lado do condutor e era ele que ia a conduzir. Depois o J… meteu-se dentro do carro, recolheu o comer e arrancaram. Ficou a comer no parque de estacionamento, seguindo depois o mesmo percurso que o J…, passados poucos instantes, vindo a deparar-se com o referido acidente a cerca de 6 Km desse parque de estacionamento (minutos 02:30 a 04:40).
Factualidade que foi dada como provada nos pontos 79 a 81 e não impugnada, nesta parte.
E não deixa de se estranhar a circunstância da testemunha J… confirmar ter estado, antes do acidente, numa festa de amigos e depois foram para a referida discoteca, onde estiveram, e quando saíram passaram pelo M… de Torres, mas declarando “não faz ideia de quem ia a conduzir o carro até ao M…, nem depois desse local”, quando, logo após o acidente, bem como nos dias seguintes, sempre assumiu ser ele o condutor.
É caso para dizer, como na sentença recorrida, a testemunha sofre de amnésia seletiva.
Na verdade, não podemos ignorar que a testemunha J…, em 14 de janeiro de 2020 (decorridos quatro meses sobre a data do acidente), data em que foi ouvido pelos peritos da Ré, não manifestou qualquer dúvida de ser ele o condutor do veículo, vertendo por escrito o seu depoimento, dizendo, no que releva: “Embora não me recorde com toda a clareza, quer pelo álcool, quer pelo trauma, tenho a certeza que eu levava o cinto de segurança. Quanto ao meu colega P… é minha forte convicção de que não levava o cinto de segurança posto. Esta convicção que tenho prende-se com o facto de eu não ir a muita velocidade e ao facto de o Pedro ter sido cuspido/projetado para fora do veículo durante a trajetória do despiste.” (doc. n.º 9 junto pela Requerida com a oposição) – nosso sublinhado nosso.
E só em 20 de janeiro de 2020 (seis dias depois), veio subscrever nova descrição do acidente, na qual refere que estavam alcoolizados e devido “ao forte trauma que estava não posso garantir qual dos dois era o condutor se eu se o P…” (doc. n.º 10 junto pela Requerida com a oposição). Assim, nem mesmo nesta altura a testemunha negou ser o condutor, antes afirmou não poder garantir qual dos dois conduzia o veículo (admitindo ser ele o condutor).
Ora, no que respeita à questão da alteração da matéria de facto face à incorreta avaliação da prova produzida, cabe a esta Relação, ao abrigo dos poderes conferidos pelo artigo 662º do CPC, e enquanto tribunal de 2ª instância, avaliar e valorar (de acordo com o princípio da livre convicção) toda a prova produzida nos autos em termos de formar a sua própria convicção relativamente aos concretos pontos da matéria de facto objeto de impugnação, modificando a decisão de facto se, relativamente aos mesmos, tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento da matéria de facto que imponha essa alteração.
Como é consabido, para que a decisão da 1ª instância seja alterada haverá que averiguar se algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “prudente convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente aferir da razoabilidade da convicção formulada pelo juiz da 1.ª instância, face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, sem prejuízo do poder conferido à Relação de formular, nesse julgamento, com inteira autonomia, uma nova convicção, com renovação do princípio da livre apreciação da prova [1].
Por outro lado, não podemos ignorar que o Juiz da 1.ª instância tem a seu favor o importante princípio da imediação da prova, cujo contato direto com a prova testemunhal possibilita uma melhor perceção da frontalidade, da lucidez, do rigor da informação transmitida, da firmeza e prontidão dos depoimentos prestados, levando-o ao convencimento quanto à veracidade ou elevada probabilidade dos factos terem ocorrido tal como são relatados.
Como ensina Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, pág. 347, “Algumas das provas que permitem o julgamento da matéria de facto controvertida e a generalidade daquelas que são produzidas na audiência final (…) estão sujeitas à livre apreciação do Tribunal (…) Esta apreciação baseia-se na prudente convicção do Tribunal sobre a prova produzida (art.º 655.º, n.º1), ou seja, as regras da ciência e do raciocínio e em máximas da experiência”.
E já lembrava Alberto dos Reis [2] que a prova livre não quer dizer prova arbitrária ou irracional. Quer dizer prova apreciada com inteira liberdade pelo julgador, sem obediência a uma tabela ditada externamente, mas em perfeita conformidade com as regras da experiência e as leis que regulam a atividade mental. Não estamos perante um sistema da prova livre pura, mas de livre apreciação motivada da prova, ou seja, o que conduz à prova de um facto em juízo é o efeito que as provas, em conjugação com as regras da lógica e as máximas da experiência, produzem na convicção do juiz – cf. Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in “Manual de Processo Civil”, pág. 471.
Citando Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, ob. cit., pág.435, a prova é “a atividade tendente a criar no espírito do juiz a convicção (certeza subjetiva) da realidade de um facto”. “Para que haja prova é essencial que esse grau especial de convicção, traduzido na certeza subjetiva”, esclarecem.
E estabelecem a distinção entre prova e verosimilhança, sendo que a prova “assenta na certeza subjetiva da realidade do facto, ou seja, no (alto) grau de probabilidade de verificação do facto; a verosimilhança, na simples probabilidade da sua verificação”.
Assim, no caso em presença, verificamos ter havido, por parte do tribunal a quo, uma criteriosa avaliação de todos os meios probatórios, em particular a testemunhal indicada, conjugada com os mencionados documentos, tendo em conta o princípio geral da livre convicção do julgador, assente nos princípios instrumentais da oralidade e imediação, aceitando-se plenamente a convicção da 1.ª instância, factologia que não foi infirmada, de forma convincente e credível, pelos demais depoimentos ou por qualquer outro meio probatório.
Importa acrescentar que tratando-se, como se trata, de uma providência cautelar nominada ou especificada na lei (art.º 388.º a 390.º do C. P. Civil), face à sua instrumentalidade ( visto que a decisão a proferir na providência cautelar é, em regra, transitória, ficando a aguardar a decisão definitiva a proferir na ação principal que terá obrigatoriamente que ser proposta e dela depende ( art.º 364.º e 373.º do C. P. Civil), não se exige para o seu decretamento a prova dos factos alegados ( a apreciar na ação principal), impondo tão só um conhecimento deles através de um exame e instrução indiciários (“summaria cognitio”), ou como sublinha Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, Lex, pág. 230, “(… implica necessariamente uma apreciação sumária da situação através de um procedimento simplificado e rápido”.
Resumindo, a prova produzida não permite dar indiciariamente como provados os factos citados pela recorrente, razão pela qual se decide indeferir a pretendida alteração, mantendo-se inalterados os pontos 5) e 6) da matéria de facto provada.
O mesmo se dirá quanto à pretensa inclusão na matéria de facto do ponto n.º 7A, pois resulta indiciariamente não provada essa factologia, e os depoimentos identificados não o confirma, nem outra prova documental foi produzida que o comprove, para além dessa factologia, diga-se, se revelar inútil para a decisão da causa e objeto do recurso.
E inútil se torna igualmente saber se J… sentiu bastantes dores no peito devido ao cinto de segurança.
Assim como é inútil apurar se J… e o Requerente, nos locais descritos em 79) e 80) dos factos provados, ingeriram bebidas alcoólicas, sendo certo que, relativamente ao J…, resulta do Aditamento à Participação do Acidente, elaborado em 22/11/2019, que o condutor do veículo acusava uma TAS de 1,95g/l, sendo-lhe elaborado um Auto de Notícia.
Daí ser totalmente inútil realizar o julgamento para dar como provada a referida “factologia”, sendo que no processo não é lícito realizar atos inúteis (art.º 130º, do CPC).
Aplicando o referido princípio à pretendida reapreciação da matéria de facto, deve entender-se que «o exercício dos poderes de controlo da Relação sobre a decisão da matéria de facto da 1ª instância só se justifica se recair sobre factos com interesse para a decisão da causa, o que não é manifestamente o caso.
Os poderes de controlo da Relação no tocante à decisão da matéria de facto da 1ª instância não devem ser atuados se os factos cujo julgamento é impugnado não forem relevantes para nenhum dos enquadramentos jurídicos possíveis do objeto do recurso» [3]..
Assim também se pronunciou o Supremo Tribunal de Justiça no seu Acórdão de 17/05/2017, afirmando: “O princípio da limitação dos atos, consagrado, no artigo 130.º do CPC, para os atos processuais em geral, proíbe, enquanto manifestação do princípio da economia processual, a prática de atos no processo – pelo juiz, pela secretaria e pelas partes – que não se revelem úteis para alcançar o seu termo. Nada impede que tal princípio seja igualmente observado no âmbito do conhecimento da impugnação da matéria de facto se a análise da situação concreta evidenciar, ponderadas as várias soluções plausíveis da questão de direito, que desse conhecimento não advirá qualquer elemento factual cuja relevância se projete na decisão de mérito a proferir” [4].
É precisamente o que acontece no caso dos autos, em que essa factologia é totalmente irrelevante para a decisão do objeto do presente recurso.
Improcede também a pretendida alteração.
Todavia, admite-se como indiciado o facto de “o Requerente ter sido projetado para fora do veículo de matrícula 37…”, pois estando assente no ponto n.º 8 que “Após o acidente, o requerente foi encontrado caído na faixa de rodagem, à distância aproximada de 1,30 metros do lado direito do veículo 37…”, pela própria natureza das coisas e dinâmica do acidente descrita no ponto 7) dos factos assentes, urge concluir que foi projetado para fora do veículo (não havendo outra razão válida que o justifique, nomeadamente dele ser retirado por outrem ou ter saído pelo seu próprio pé).
Concluindo, mantém-se inalterada a matéria de facto, salvo quanto ao ponto 8A que se acrescenta com a seguinte redação:
“O Requerente foi projetado para fora do veículo de matrícula 37…”.
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3. O Direito.
A impugnação judicial assentou no pressuposto de se terem provado factos distintos dos efetivamente elencados na decisão recorrida. A sustentação fáctica da recorrente não tem correspondência com a realidade.

A recorrente não colocou em causa a análise jurídica feita na decisão, assente nos factos fixados, ou seja, o recurso não versa sobre eventual erro no direito aplicável aos factos, mas apenas serem os mesmos distintos, assentando a sua divergência no facto de não ter qualquer responsabilidade pela reparação dos danos sofridos pelo Requerente, por entender ser este o condutor do veículo.

Improcedendo a pretendida alteração sobre a matéria de facto e visto que o apelante não põe em crise a análise jurídica que na sentença recorrida incidiu sobre os factos dados como provados, impõe-se a sua confirmação sem necessidade de mais aprofundadas considerações.

Dir-se-á, todavia, quanto ao montante de renda arbitrado provisoriamente, que a decisão recorrida respeitou os critérios legais, em particular está demonstrada a situação de necessidade (factos n.ºs 3, 72.º a 76.º), face aos gravíssimos danos sofridos em consequência do acidente de viação, espelhados nos factos assentes ( nomeadamente 56 a 70), sendo manifesta a obrigação da recorrente quanto à indemnização desses danos, a qual será, oportunamente, descontada na indemnização definitiva que vier a ser fixada na ação principal ( art.º 388/1, 2 e 3 do C. P. Civil).

Com efeito, o valor fixado, respeita os critérios da equidade, cuja situação de necessidade está sobejamente demonstrada, ponderados que foram em particular as condições normais de vida do lesado e os danos sofridos, condicionando definitivamente a sua vida – cf. Marco Carvalho Gonçalves, “Providências Cautelares”, Almedina, 2015, pág. 305 e segs., e Célia Sousa Pereira, “Arbitramento de Reparação Provisória”, Almedina, 2003, pág. 126.

Na realidade, como sublinha Marco Carvalho Gonçalves, ob. Cit. pág. 306/307, “(…) se o processo permitir concluir, num juízo sumário, que o requerido será condenado, com um alto grau de probabilidade, a ressarcir os danos sofridos pelo requerente -estando, assim, indiciada a obrigação de indemnizar – e que a situação de necessidade em que se encontra não é compatível com a delonga normal do processo judicial, tal será suficiente para que o tribunal arbitre uma reparação provisória a ser liquidada ao requerente, cujo montante deverá ser suficiente para garantir a sua subsistência até que seja proferida uma decisão com carácter definitivo na ação principal”.

Improcede, pois, a apelação.

Vencida no recurso, suportará a apelante, as custas respetivas – art.º 527.º do C. P. Civil.


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IV. Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e confirmar a decisão recorrida.
Custas pela apelante. Évora, 2021/04/29

Este Acórdão vai assinado digitalmente no Citius, pelos Juízes Desembargadores:
Tomé Ramião (Relator)
Francisco Xavier (1.º Adjunto)
Maria João Sousa e Faro (2.º Adjunto)
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[1] ) Como defende Remédio Marques, Ação Declarativa, à Luz do Código Revisto, 3.ª Edição, pág. 638 -641, criticando a conceção minimalista sobre os poderes da Relação quanto à reapreciação da matéria de facto.
[2] ) Código de Processo Civil, anotado, Vol. III, 247.
[3] ) Cf. Acórdão do TRL de 10-02-2011, proferido no processo n.º 334/10.6TVLSB-C.L1-2, disponível em www.dgsi.pt.
[4] ) Proferido no processo n.º 4111/13.4TBBRG.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt.