I - A “dupla conforme” pressupõe a admissibilidade da revista nos termos gerais.
II - O acórdão da Relação que apreciou a arguição de nulidade de anterior acórdão que apreciou recurso de apelação é definitivo.
AA intentou acção declarativa de condenação contra BB pedindo a condenação desta a pagar-lhe 51.000 € e juros, a qual veio a ser julgada parcialmente procedente com a condenação da Ré a pagar 5.350 € acrescidos de juros.
Inconformada, apelou a Autora, impugnando a matéria de facto, tendo a Relação, unanimemente, confirmado a sentença recorrida, por acórdão de 14SET2020, que foi notificado pela refª ….
Veio, então, a Autora, por requerimento de 15SET2020 e indicando aquela referência, arguir a nulidade desse acórdão por omissão de pronúncia por não se ter pronunciado relativamente aos documentos a que fez referência na sua alegação de recurso.
A Relação, em conferência que teve lugar em 10NOV2020, proferiu acórdão indeferindo a arguição de nulidade, que lhe foi notificado através da refª ....
Ainda irresignada veio a Autora, por requerimento de 08DEZ2020, interpor recurso de revista deste último acórdão que lhe houvera sido notificado através da refª ..., invocando a nulidade do mesmo decorrente de omissão de pronúncia, por, no seu entender, continuar a não apreciar os documentos a que vem continuadamente fazendo referência, não tendo o recurso sido admitido “nos termos do art.º 671º, nº 3, do nCPC (dupla conforme)”.
Pelo que deduziu reclamação nos termos do art.º 643º do CPC, pugnando pela admissibilidade da revista e impetrando se ordene que o tribunal recorrido se pronuncie sobre a invocada nulidade.
A Ré pronunciou-se pela improcedência da reclamação.
Por despacho do Relator foi indeferida a reclamação.
Veio, então, a reclamante requerer que “sobre a matéria em discussão na reclamação apresentada recaia um acórdão”, invocando que a interpretação feita do art.º 615º, nº 4, do CPC é violadora do art.º 20º, nº 1, da Constituição, que arguiu as nulidades no próprio recurso pelo não se podia ver aí um acto incompatível com a vontade de recorrer, que o STJ já havia em idêntica situação decidido em conformidade com o entendimento da Reclamante e ser a revista admissível ao abrigo do art.º 674º, nº 1, al. c), do CPC.
Não foi apresentada resposta a tal requerimento.
Desde logo se mostra irrelevante para o efeito a invocação de ‘dupla conforme’ uma vez que esta, enquanto circunstância obstativa do recurso de revista nos termos gerais, pressupõe a admissibilidade de recurso de revista nos termos dos artigos 671º, nº 1, e 629º do CPC; não sendo admissível recurso de revista nos termos daquelas disposições não há que cuidar de saber se se verifica a ‘dupla conforme’; o recurso já não é admissível.
Ora a situação em apreço é, manifestamente, um caso de inadmissibilidade da revista nos termos gerais, porquanto, por força do disposto nos artigos 617º, nº 6, 666º e 685º do CPC, a decisão que aprecia a arguição de nulidade é definitiva.
O que é quanto basta para decidir da admissibilidade do recurso, sem necessidade de averiguar da eventualidade da aplicação da interpretação avançada para o disposto no art.º 615º, nº 4, do CPC (que no caso, reconhece-se, se mostraria, ainda assim, inaplicável, dado a arguição de nulidade ter necessariamente de ser feita para o tribunal que proferiu a decisão por se verificar ‘dupla conforme’ e não ter sido interposta revista excepcional).
Não pode, no entanto, deixar de se fazer notar a imprecisão da argumentação expendida pela Reclamante pois que, por um lado, como evidenciado no relatório do presente acórdão, a nulidade foi invocada autonomamente e não no próprio recurso e, por outro lado, a invocada anterior decisão deste Supremo Tribunal não apresenta qualquer similitude com a situação circunstancial do caso (aqui está em causa a revista do acórdão que apreciou a arguição de nulidade e naquele estava em causa a apreciação de nulidades invocadas em revista admissível nos termos do art.º 629º do CPC).
Desde logo porquanto o requerimento de interposição do recurso é expresso na identificação do acórdão recorrido como o que lhe foi notificado pela refª ....
Por outro lado, nessa possibilidade o recurso seria extemporâneo porquanto ultrapassado o prazo de 30 dias a contar da notificação do acórdão (e não da notificação da decisão sobre a invocação da sua nulidade).
E ainda porque a revista se mostrava, no caso, inviabilizada pela verificação de ‘dupla conforme’, não tendo sido interposta revista excepcional.
Termos em que, sem necessidade de mais considerações, se indefere a reclamação.
Custas pela reclamante, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC’s.
Lisboa, 25MAR2021
Rijo Ferreira (relator)
[Com voto de conformidade dos Exmos. Juízes Conselheiros Adjuntos,
conforme o disposto no art.º 15º-A do DL 10-A/2020, 13MAR, com
a redacção introduzida pelo DL 20/2020, 01MAI]
Cura Mariano
Fernando Baptista