ILÍCITO DE MERA ORDENAÇÃO SOCIAL
CONTRA-ORDENAÇÃO
PRESCRIÇÃO
SUSPENSÃO
COVID-19
Sumário

I.–A suspensão do curso dos prazos de prescrição em matéria de contra-ordenações, imposta pela resposta normativa nacional à crise sanitária SARS-Covid 19, corresponde a uma réplica legislativa a uma vera impossibilidade física, a saber, a de promover e materializar a tramitação dos processos em virtude do confinamento de emergência;

II.–Tal suspensão não surge, na realidade, da vontade e acção do legislador mas da força inelutável de fenómeno físico que a todos se impõe;

III.–A excepção garantística lançada no n.º 1 do art. 2.º da Lei n.º 44/86, de 30 de Setembro, «Regime do Estado de Sítio e do Estado de Emergência» (e no n.º 6 do art. 19.º da Constituição da República Portuguesa), corresponde, neste domínio, a restrição que protege a liberdade individual e não o património (afinal o único bem atingido pela sanção contra-ordenacional);

IV.–O mecanismo normativo é instrumental e faz corresponder a uma situação de ruptura e anormalidade uma solução orientada para a consecução da sua cessação;

V.–A baliza instrumental corresponde ao pronto restabelecimento da normalidade constitucional;

VI.–O n.º 1 do artigo 27.º-A do RGCO contém, a propósito da suspensão, enunciado não taxativo, ao ressalvar os casos previstos na lei;

VII.–A dispersão normativa assim admitida não agride os princípios da legalidade e sua derivada tipicidade que requerem enunciado, verbalização precisa, mas não exigem concentração das fórmulas ou carácter coevo do enunciado podendo, pois, a norma constar de um diploma autónomo e ser posterior;

VIII.–Não estamos perante retroactividade directa ou de primeiro grau, no sentido de aplicação de regra nova a contexto passado mas face a aplicação de preceito a quadro temporal futuro relativo a realidade contemporânea – a pendência processual;

IX.–Não há arbitrariedade, surpresa, desproporção ou um gorar de expectativas, logo não há inconstitucionalidade;

X.–O princípio da confiança não reclama que se materialize a possibilidade de serem conhecidas todas as causas de suspensão do prazo de prescrição no momento da consumação do ilícito;

XI.–Se assim não fosse, estaria retirado ao Estado a possibilidade de reagir em emergência perante situação física portadora de particular gravidade colectiva, imprevisível no contexto temporal da aludida consumação.

Texto Integral

Acordam na Secção de Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa:

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I.RELATÓRIO:


NOS COMUNICAÇÕES, S.A., com os sinais identificativos constantes dos autos, impugnou judicialmente decisão da AUTORIDADE NACIONAL DE COMUNICAÇÕES que lhe impôs sanção pela prática da infracção descrita nos autos.

O Tribunal «a quo» descreveu os contornos da acção e as suas principais ocorrências processuais até à sentença nos seguintes termos:
1.-NOS COMUNICAÇÕES, S.A. (doravante “NOS”, “Recorrente” ou “Arguida”), veio impugnar judicialmente a decisão proferida pela Autoridade Nacional de Comunicações (doravante “ANACOM”) no processo de contraordenação n.º SCO0006062016, que a condenou em uma coima no valor de 5 000 euros (cinco mil euros), pela prática dolosa de uma contraordenação prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 151-A/2000, de 20.07, por violação do n.º 1 do artigo 7.º do mesmo diploma.
2.- Em síntese, a Recorrente formula as seguintes pretensões: a sua absolvição e o consequente arquivamento dos autos pelo facto de o procedimento contraordenacional se encontrar prescrito, pelo menos, desde 19 de outubro de 2020; subsidiariamente, a sua absolvição motivada pelo facto de em momento algum ter praticado os factos pelos quais vem acusada, inexistindo quaisquer finalidades de prevenção especial a satisfazer; subsidiariamente, a sua condenação numa conduta negligente face ao sucedido, condenando-se a mesma numa sanção de simples admoestação ou na suspensão da execução da sanção; subsidiariamente, a fixação da coima pelo respetivo mínimo legal atendendo à reduzida ilicitude e culpa da Arguida, à diminuta gravidade da conduta em apreço e à inexistência de quaisquer benefícios económicos.
3.- Procedeu-se à realização da audiência de julgamento com observância das formalidades legais.
4.- Antes da leitura procedeu-se à comunicação de uma alteração não substancial de factos e da qualificação jurídica, imputando-se à Recorrente a contraordenação identificada pela ANACOM a título negligente, que está prevista no artigo 25.º, n.º 6, do Decreto-Lei n.º 151-A/2000, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 264/2009. A Recorrente veio pronunciar-se nos termos constantes no requerimento com a ref.ª 48532, alegando, em síntese, que “à semelhança do também peticionado na impugnação judicial, verificando-se uma alteração do elemento subjetivo da contraordenação pela qual a Arguida vem acusada, deverão ser tidos em consideração o disposto nos artigos 51.º, do RGCO e no artigo 31.º do RGCOC, pelos motivos já invocados”.

Foi proferida sentença que decretou:
Em face do exposto, julgo o presente recurso parcialmente procedente nos seguintes termos:
a.- Julgo improcedente a questão de prescrição do procedimento contraordenacional invocada pela Recorrente;
b.- Condeno a Recorrente pela prática, a título negligente, de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 7.º, n.º 1, e 25.º, n.º 1, alínea c), n.ºs 3 e 6, todos do Decreto-Lei n.º 151-A/2000, de 20.07, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 264/2009, de 28.09, em uma coima de três mil euros (€ 3.000,00).

É dessa sentença que vem o presente recurso interposto por NOS COMUNICAÇÕES, S.A., que alegou e apresentou as seguintes conclusões:
A)O tribunal a quo não efetuou uma correta interpretação e aplicação do quadro normativo legal vigente.
B)Isto porque, de acordo com a Sentença proferida pelo tribunal a quo, foi a aqui Arguida condenada na prática de uma contraordenação, a título negligente, em virtude da alegada violação do disposto no n.º 1 do art. 7.º do Decreto-Lei n.º 151-A/2000, de 20 de julho, tendo como consequência direta a aplicação da sanção prevista no disposto na alínea c) do n.º 1 do art. 25.º, conjugada com os n.º 3 e 6 do mesmo diploma.
C)Face a tal entendimento, a Arguida foi condenada no pagamento de uma coima fixada no montante de €3.000,00.
D)Porém, a Arguida foi condenada pela prática de uma contraordenação cujo procedimento contraordenacional já se encontrava prescrito, pelo menos, desde 19 de outubro de 2020.
E)E sonegando direitos, liberdades e garantias previstos na Constituição da República Portuguesa, veio a sentença proferida pelo tribunal a quo aplicar retroativamente uma lei penal de conteúdo claramente mais desfavorável à Arguida, em clara violação do disposto no n.º 4 do artigo 29.º e do disposto no n.º 6 do artigo 19.º ambos do mesmo diploma legal.
F)Isto porque entendeu o tribunal a quo restringir tais princípios constitucionais face ao facto de se tratar de um processo de natureza contraordenacional e não de um processo de natureza criminal.
G)Pelo que, não aplicando o n.º 4 do artigo 29.º e o n.º 6 do artigo 19.º ambos da Constituição da República Portuguesa, aplicou a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que consabidamente veio prever um conjunto de medidas excecionais e temporárias de resposta à situação provocada pelo vírus SARS-CoV-2 e pela doença COVID-19, mormente e para aquilo que aqui nos interessa, a suspensão de determinados prazos.
H)No entanto, não obstante a desconforme integração e interpretação normativa do quadro legal vigente efetuada pelo tribunal a quo, várias correntes têm defendido que nem todos os prazos foram suspensos ao abrigo da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março.
I)A este propósito importa chamar à colação os escritos do Senhor Professor PAULO PIMENTA quando o autor escreve que “Importa salientar que o sentido da lei e a suspensão opera somente quanto a esses prazos, é o de acautelar casos em que o exercício do direito implica a instauração de um processo ou um procedimento, isto é, implica uma concreta iniciativa processual. (…) Em contraposição, estão excluídos da Lei prazos cuja observância não careça de uma iniciativa processual, não havendo aí lugar a qualquer suspensão (sem prejuízo, bem entendido, de outros diplomas ou disposições que, em concreto, consagrem soluções passíveis de gerar a suspensão de certos prazos ou um efeito prático similar).” (sombreado nosso).
J)Bem como invocar o entendimento Senhor Bastonário da Ordem dos Advogados, Professor MENEZES LEITÃO, quando manifesta que: “A primeira dúvida que se coloca é se esse regime [de suspensão] se aplica apenas em relação aos prazos para instaurar acções ou procedimentos que evitem a prescrição e a caducidade ou se abrange também prazos para o exercício extrajudicial de direitos legais ou contratuais. Uma vez que o que está em causa é a dificuldade de recurso aos tribunais nesta fase, entendemos que se trata apenas da primeira situação.”.
K)No mesmo sentido escrevem ainda os autores TEIXEIRA DE SOUSA e DELGADO DE CARVALHO quando afirmam que “Quer isto dizer que é fundamental distinguir entre os prazos de prescrição e de caducidade que ficam abrangidos pelos n.ºs 3 e 4 do art. 7.º L 1-A/2020 e aqueles que não são cobertos por este regime. É precisamente neste contexto que se mostra toda a relevância do disposto no n.º 1 do art, 321.º CC. (…) Em suma e numa formulação geral: os prazos de prescrição e de caducidade que se suspendem, a partir de 9/3/2020, por força do disposto no art. 7.º, n.ºs 3 e 4, L 1-A/2020 são todos aqueles (mas apenas esses) que estejam nessa data [últimos três meses] ou que entrem durante a situação de excepção nos últimos três meses. (…) Nem sequer é difícil supor que, entretanto, se generalizou a ideia (que, como se viu, não é correcta) de que todos os prazos de prescrição e de caducidade em curso passaram a estar suspensos. Há que evitar o que, no jargão próprio da actividade forense, se chama habitualmente um «alçapão».” (sombreado nosso).
L)Na vertente juscriminal é possível encontrar decisões jurisprudenciais e entendimentos doutrinários que vão no sentido da não aplicabilidade da referida lei por violação do princípio da aplicação da lei mais favorável ao arguido maxime o disposto no n.º 4 do artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa.
M)Nomeadamente o entendimento do Tribunal da Relação de Lisboa no âmbito do processo n.º 128/16.5SXLSB.L1-5, relator Juiz Desembargador Jorge Gonçalves, datado de 24 de julho de 2020, quando refere que “Entender que a nova causa de suspensão do procedimento criminal e de suspensão da prescrição das penas e das medidas de segurança se aplica aos prazos que, à data da sua entrada em vigor, estavam já em curso, seria admitir a aplicação retroactiva da lei penal, em violação do disposto no artigo 29.º, n.º4, da C.R.P., já que tal suspensão, alargando os prazos de prescrição, agrava a situação do arguido/condenado“ (sombreado nosso).
N)Bem como o entendimento do Tribunal da Relação de Lisboa no âmbito do processo n.º 76/15.6SRLSB.L1-5, relator Juiz Desembargador Ana Sebastião, datado de 21 de julho de 2020 quando se lê no acórdão que: “Independentemente de se tratar de uma lei temporária, ou não, a entrada em vigor da Lei n°1-A/2020, ao prever no seu art.º 7º, a suspensão de todos os prazos para a prática de actos processuais e procedimentais, sempre configurará uma situação de sucessão de leis penais no tempo, pelo que a sua aplicação não pode afastar-se do princípio da não retroatividade da lei penal, corolário do princípio da legalidade, nem sobrepor-se à aplicação do regime penal mais favorável em bloco ao arguido. O regime em bloco mais favorável ao arguido é sem dúvida manter, como únicas causas de suspensão da prescrição da pena, as previstas no artigo 125° do Código Penal, afastando-se a aplicação ao caso concreto do artigo 7° da Lei n°1-A/2020, esta última sem dúvida mais gravosa para o arguido.” (sombreado nosso).
O)O momento crítico da determinação da lei aplicável é o tempus delicti, in casu o normativo previsto no art. 5.º do RGCO, ou seja 19 de abril de 2016, independentemente de o prazo prescricional da coima contar-se a partir do momento em que transita em julgado a sentença, sem prejuízo da sujeição ao princípio da lei mais favorável atenta a natureza da prescrição.
P)Nos termos do n.º 1 do art. 3.º do RGCO a punição da contraordenação é determinada pela lei vigente no momento da prática do facto ou do preenchimento dos pressupostos de que depende, pelo que é retroativa a aplicação da lei que for posterior a esse momento.
Q)Mas refere o n.º 2 do mesmo normativo que se a lei vigente ao tempo da prática do facto for posteriormente modificada, aplicar-se-á a lei mais favorável ao arguido, salvo se este já tiver sido condenado por decisão definitiva ou transitada em julgado e já executada.
R)Este enquadramento legal permite-nos desde logo concluir dois pontos.
S)O primeiro é que, no caso concreto, a lei vigente ao tempo da prática do facto era o RGCO que determina, da conjugação dos artigos 27.º, 27.º-A e 28.º do diploma, que a prescrição se verifica passados 4 anos e 6 meses contados desde 19 de abril de 2016.
T)E o segundo é que, atentos os princípios da legalidade e da aplicação da lei mais favorável, será mister concluir que a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, apenas poderá ser aplicada aos factos praticados na sua vigência.
U)Além da jurisprudência invocada, encontramos na doutrina autores a acompanhar de perto estes mesmos princípios, nomeadamente no ensaio escrito pelo Exmo. Senhor Procurador da República RUI CARDOSO, segundo o qual, no ponto 6 com a epígrafe “Prescrição”, do capítulo dedicado à “Jurisdição Penal e Processual Penal”, o autor refere o seguinte: “Do supra exposto, afigura-se-nos que a nova causa de suspensão da prescrição do procedimento criminal e das penas e medidas de segurança, sendo prejudicial ao arguido, pois alargará necessariamente tais prazos de prescrição, apenas poderá ser aplicada para os factos praticados na sua vigência. (…) Entender que a nova causa de suspensão do procedimento criminal se aplica aos prazos que, à data da sua entrada em vigor, estavam já em curso seria conferir-lhe um efeito retroativo proibido, em violação do disposto no artigo 29.º, n.º 4, da CRP, porque mais gravoso para a situação processual do arguido, alargando a possibilidade da sua punição.”.
V)Aplicando o entendimento da diversa doutrina e jurisprudência invocada ao processo sub judice, verificamos que o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional terminou no dia 19 de outubro de 2020, tendo cessado, nessa mesma data, a responsabilidade sancionatória da Arguida pela alegada prática da contraordenação pela qual vem acusada.
W)Pelo que, mal andou o tribunal a quo ao não ter interpretado e aplicado corretamente o artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, em conjugação com o princípio constitucional previsto no disposto no n.º 4 do artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa, que, por sua vez, determinaria que aplicados os artigos 27.º, 27.º-A e 28.º do RGCO, a prescrição do procedimento contraordenacional ter-se-ia verificado, pelo menos, desde 19 de outubro de 2020.
X)O tribunal a quo, no entanto, não colheu a linha de argumentação sufragada pela doutrina a jurisprudência invocadas pela Arguida, invocou o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa no processo n.º 124/18.8YUSTR.L2 e o acórdão proferido pelo Tribunal Constitucional com o n.º 297/2016.
Y)A interpretação do tribunal a quo efetuada ao disposto no n.º 4 do artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa foi efetuada de uma forma restrita.
Z)Não será despiciendo recordar que nos termos do referido artigo “Ninguém pode sofrer pena ou medida de segurança mais graves do que as previstas no momento da correspondente conduta ou da verificação dos respetivos pressupostos, aplicando-se retroativamente as leis penais de conteúdo mais favorável ao arguido.”.
AA)Pelo que a interpretação do sujeito da frase, “Ninguém”, não poderá ser efetuada distinguindo pessoas singulares de pessoas coletivas. Na verdade, essa distinção é efetuada pelo tribunal a quo no momento em que entende não aplicar, na sua plenitude, direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados a todos os sujeitos com personalidade jurídica, motivado pelo facto de as pessoas coletivas não poderem sofrer sanções privativas da liberdade.
BB)Ou seja, foi efetuada uma distinção entre sujeitos que podem ser privados da sua liberdade daqueloutros que não podem, num imperativo constitucional que tem como objetivo – e certamente outra não poderia ser a teleologia – abarcar todo e qualquer cidadão, seja pessoa singular ou pessoa coletiva.
CC)Por outro lado, resulta do entendimento de que aplicar retroativamente a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, a factos ocorridos em 2016, é aplicar uma lei de conteúdo mais desfavorável ao arguido.
DD)Isto porque facilmente se reconhece que através da aplicação deste diploma – que suspendeu os prazos pelo hiato temporal de 86 dias –, ao prazo de prescrição do procedimento contraordenacional acresceram 267 dias, ou seja 08 meses e 24 dias contados desde o dia 19 de outubro de 2020 até 13 de julho de 2021.
EE)Ou seja, contrariamente ao propugnado pelo tribunal a quo na fundamentação quanto ao facto de o instrumento normativo cumprir o desígnio do equilíbrio na restrição do direito fundamental, não se mostra que esta medida tenha sido adequada nem proporcional.
FF)E, portanto, a questão que desde logo se levanta é saber se terão sido consequências como esta que o legislador pretendeu determinar no momento da elaboração e publicação do referido diploma e se terá sido esta a teleologia da norma.
GG)A aplicação da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, particularmente a processos de natureza criminal ou sancionatória, deverá ser efetuada de forma bastante cautelosa, nunca perdendo de vista os imperativos constitucionais que consagram direitos, liberdades e garantias a todos os cidadãos, independentemente de assumirem características de pessoas singulares ou pessoas coletivas, e de harmonia com a integral sistematização hierárquico-normativa prevista no nosso ordenamento.
HH)Relativamente à aplicação integral e sem reservas do principio previsto no n.º 4 do artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa aos processos de natureza contraordenacional, por diversas vezes a jurisprudência se terá pronunciado.
II)Resulta do entendimento do Tribunal Constitucional proferido no acórdão n.º 260/93, proferido no processo n.º 365/93, Relator Exmo. Senhor Juiz Vítor Nunes de Almeida, a seguinte afirmação: “Com efeito, retomando a fundamentação do Acórdão nº 227/92, o princípio da aplicação retroactiva da lei penal de conteúdo mais favorável apenas se encontra formulado para o domínio penal. No entanto, há-de valer também no domínio do ilícito de mera ordenação social, pelo menos quanto a elementos tão caracterizadores do direito sancionatório como são os que dizem respeito à prescrição e consequente extinção do procedimento judicial, isto tendo em atenção a razão de ser daquele princípio.” (...).
JJ)Ainda do Tribunal Constitucional resulta o acórdão n.º 150/94, proferido no processo 603/93, Relator Juiz Alves Correia e datado de 08/02/1994 que: “Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral - por violação do artigo 29.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa - das normas constantes dos artigos 2.º e 5.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 20-A/90, de 15 de Janeiro, interpretadas no sentido de visarem impedir a aplicação da nova lei, ainda que mais favorável, às infracções fiscais que o Regime Jurídico das Infracções Fiscais não Aduaneiras, aprovado por aquele decreto-lei, desgraduou em contra-ordenações.” (...).
KK)Novamente do Tribunal Constitucional resulta o acórdão n.º 621/93, proferido no processo 365/93, Relator Juiz Vítor Nunes de Almeida e datado de 03/11/1993 que: “Nos termos que ficam expostos, o Tribunal decide julgar inconstitucionais, por violação do nº 4, do artigo 29º da Constituição, dos artigos 2º e 5º, nº 2, do Decreto-Lei nº 20-A/90, de 15 de Janeiro, enquanto interpretados no sentido de impedir a aplicação da nova lei, ainda que mais favorável, às infracções que o Regime Jurídico, aprovado por aquele diploma, desgraduou em contra-ordenações e, em consequência, nega-se provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.” (sombreado nosso).
LL)Por outro lado, no entendimento sufragado pelo Tribunal da Relação do Porto no acórdão proferido no processo n.º 9411072, Relator Juiz Desembargador Marques Salgueiro, datado de 30/10/1996 e votado por unanimidade, resulta o seguinte: “Por imperativo constitucional - artigos 18 n.3 e 29 n.4 da Constituição da República Portuguesa - as normas que regulam as condições de prescrição do procedimento criminal, nomeadamente o seu prazo, são de aplicação retroactiva, se forem de conteúdo mais favorável ao arguido. Por força do artigo 3.º n.º 2 do Decreto-Lei 433/82, de 27 de Outubro, esse princípio é aplicável às contra-ordenações. A lei que encurta o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional - o Decreto-Lei 244/95, de 14 de Setembro, na parte em que alterou o artigo 27 do Decreto-Lei 433/82 citado - é, assim, de aplicação retroactiva, isto é, deve aplicar-se às situações já existentes à data da sua entrada em vigor. Nesse caso, na contagem do prazo mais curto, « há que partir dos mesmos momentos temporais que na contagem do prazo antigo». (sombreado nosso).
MM)Ainda refere o Supremo Tribunal de Justiça que: “O artigo 120.º, n.º 3, do CP, que dispõe que a prescrição do procedimento criminal tem sempre lugar quando tiver decorrido o prazo normal da prescrição acrescido de metade, vigora também para as contraordenações.” – Acórdão do STJ datado de 07/05/1992, CJ, 1992, 3, 12 – (sombreado nosso).
NN)E o Supremo Tribunal Administrativo que: “O princípio da aplicação retroativa da lei sancionatória mais favorável, consagrado nos artigos 29.º, n.º 4, da Constituição e 4.º do Código Penal, é aplicável em matéria contraordenacional. Assim, o regime transitório instituído pelo Decreto-Lei n.º 20-A/90, de 15 de janeiro, que aprovou o RJIFNA, deve interpretar-se corretivamente, em termos restritivos, de modo a acolher o dito princípio constitucional – interpretação conforme a Constituição.” – acórdão do STA datado de 25/11/1992, Acs. do STA, 377, 544 – (sombreado nosso).
OO)Novamente o Supremo Tribunal Administrativo escreve que: “Dado que mais favorável ao arguido, é aplicável o regime prescricional previsto nos arts. 27.º e 28.º do D.L. 433/82, de 27/10 «ex vi» do art. 4.º, n.º 2, do DL 20-A/90, de 15/01, mercê do princípio da aplicação retroativa das leis sancionatórias mais favoráveis, consagrado no art. 29.º, n.º 4 da CRP, principio aplicável igualmente à sucessão de regimes de prescrição do procedimento judicial.” – Acórdão do STA datado de 09/12/1992, proferido no processo 014719 – (sombreado nosso).
PP)Reitera o Supremo Tribunal Administrativo o seu entendimento segundo o qual: “A 2.ª parte do n.º 4 do artigo 29.º da CR consagra o princípio da aplicação retroativa de leis sancionatórias mais favoráveis ao infrator. Tal principio abrange as leis sancionatórias de contraordenações fiscais não aduaneiras.” – Acórdão do STA datado de 13/10/1993, proferido no processo 014917 – (sombreado nosso).
QQ)Invocando agora o entendimento do Tribunal da Relação de Lisboa quando manifesta que: “O disposto no n.º 3 do artigo 121.º do Código Penal é aplicável à prescrição do procedimento contraordenacional, pelo que a mesma terá sempre lugar quando, desde o seu início, e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição, acrescido de metade.” – acórdão do TRL de 30/05/2000, CJ, 2000, 3, 143 – (sombreado nosso).
RR)Por fim, acolhemos de perto a doutrina se pronunciou a este propósito nas palavras da Senhora Professora INÊS FERREIRA LEITE quando escreve que: “Maiores dúvidas se aparentam colocar no que respeita à aplicação retroativa das leis sancionatórias públicas. Dúvidas que devem ser claramente afastadas. O “direito à aplicação retroativa da norma sancionatória mais favorável” constitui consequência natural do princípio da proporcionalidade (cfr. artigos 2º e 18º, n.º 2, da CRP), na medida em que qualquer restrição de direitos fundamentais pressupõe a verificação da necessidade da sanção a aplicar.” .
SS)Ou seja, das decisões jurisprudenciais que se juntam, de diferentes jurisdições e naturezas, às quais deverão ser acrescentadas as decisões do Tribunal da Relação de Lisboa citadas anteriormente – processos n.º 128/16.5SXLSB.L1-5 e 76/15.6SRLSB.L1-5 –, bem como no entendimento da doutrina invocada, não poderão restar dúvidas que unânime é o entendimento de que o disposto no n.º 4 do artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa é totalmente aplicável ao domínio contraordenacional.
TT)E se dúvidas existissem quanto à aplicabilidade direta deste direito fundamental consagrado no n.º 4 do artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa, a casos em que se verifica o aumento da duração do prazo de prescrição do procedimento sancionatório, recorde-se que destas nove decisões, três delas – acórdão do Tribunal Constitucional n.º 260/93, acórdão do Tribunal da Relação do Porto n.º 9411072 e acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 014719 – dizem precisamente respeito ao tratamento de tal questão.
UU)E portanto, mal andou o tribunal a quo ao não ter considerado o entendimento doutrinário e jurisprudencial maioritário, que a Arguida propugna nas presentes alegações e, ao invés disso, fundamentou a sua decisão num acórdão do Tribunal Constitucional que, s.m.o., não poderá ser trazido à colação.
VV)O tribunal a quo invocou o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 297/2016, proferido no processo n.º 1056/15, datado de 12 de maio de 2016.
WW)Porém, com respeito por opinião contrária, mal andou também o tribunal a quo na fundamentação da sua decisão que teve por base tal aresto.
XX)Isto porque, aquilo que estava em causa no acórdão n.º 297/2016, era a analise da conformidade constitucional efetuada ao abrigo do principio da proporcionalidade previsto no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição da Republica Portuguesa, da solução normativa prevista no artigo 52.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, que, em concreto, estabelece um único prazo prescricional de cinco anos para todos os procedimentos de contraordenação nas matérias laborais, independentemente da gravidade da infração, do grau de culpa do infrator, da sua capacidade económica ou da moldura aplicável, afastando-se quer do regime geral do ilícito de mera ordenação social, quer do regime penal.
YY)Ora, facilmente se denota que tal entendimento em cada acrescenta à análise do processo sub judice, na medida em que no processo trazido à colação não se discutia a violação da não retroatividade da lei penal nem a aplicação da lei penal de conteúdo mais favorável, factualidade essa que é discutida nos presentes autos.
ZZ)A questão dos presentes autos é saber se a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, poderá ser aplicável retroativamente ao ano de 2016, ou seja a factos que se verificaram 04 anos antes da sua entrada em vigor, na medida em que o enquadramento jurídico a efetuar terá obrigatoriamente que passar nesse primeiro crivo.
AAA)O acórdão invocado pelo tribunal a quo materializa um conjunto de questões pertinentes na articulação entre os princípios constitucionais e as garantias de defesa do arguido no processo contraordenacional.
BBB)Mas relativamente ao tema da não aplicação retroativa da lei penal, também o Tribunal Constitucional se pronunciou no aresto invocado pelo tribunal a quo referindo que: “Assim, os princípios com relevo em matéria penal, como os da legalidade, da culpa, non bis in idem, da não retroatividade, da proibição dos efeitos automáticos das penas, da proibição da transmissão da responsabilidade penal, podem estender-se ao domínio contraordenacional, até porque são derivados de princípios do Estado de Direito e da segurança jurídica, nomeadamente sob o seu aspeto de proteção da confiança, princípios constitucionais de validade fundamentante da ordem jurídica.” (sombreado nosso).
CCC)Isto é, o próprio Tribunal Constitucional afirma no acórdão invocado pelo tribunal a quo que o princípio da não retroatividade deverá ser observado no domínio contraordenacional, não se pronunciando quanto a eventuais restrições de tais princípios constitucionais.
DDD)Pelo que, novamente mal andou o tribunal a quo ao invocar uma decisão jurisprudencial que, em momento algum se pronuncia sobre a restrição da aplicabilidade do princípio da não retroatividade da lei penal a processos de domínio sancionatório onde o arguido seja uma pessoa coletiva – de notar que esse era o caso (o arguido era uma pessoa coletiva) no aresto invocado pelo tribunal a quo –.
EEE)Por outro lado, o tribunal a quo efetuou uma incorreta interpretação e aplicação do direito quando invocou uma decisão jurisprudencial que não se pronuncia sobre o tema em crise nos presentes autos, porquanto a vexata quaestio a tratar no aresto dizia respeito à putativa violação do princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa, face ao texto normativo verificado no artigo 52.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro.
FFF)Sendo inconstitucional a interpretação dos n.º 3 e 4 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, no sentido de poder ser aplicável o regime da suspensão e interrupção dos prazos, aos prazos que à data da sua entrada em vigor estavam já em curso em processos de natureza contraordenacional, por manifesta violação do principio da não retroatividade da lei penal de conteúdo mais desfavorável ao arguido, previsto no disposto no n.º 4 do artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa, porque mais gravoso para o Arguido, alargando a possibilidade da sua punição.
GGG)Quanto à aplicação do princípio plasmado no n.º 4 do artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa, em conjugação com o n.º 6 do artigo 19.º do mesmo diploma, resulta que em nenhum caso, a aplicação do disposto no n.º 4 do artigo 29.º da Constituição da República Portuguesa pode ser afastada.
HHH)O n.º 6 do artigo 19.º confere um grau de proteção especial ao princípio da não aplicação retroativa da lei penal face à ocorrência de determinados eventos que, independentemente da sua gravidade, das consequências ou das circunstâncias em que se verifiquem, não deixa de dever ser aplicada.
III)Foi um reforço conferido pelo legislador constituinte para garantir que, mesmo em situações extremas, os desígnios constitucionais de proteção dos arguidos relativamente aos seus direitos, liberdades e garantias, são observados, na sua plenitude.
JJJ)Pelo que, independentemente das circunstâncias em que emergiu a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, e as suas subsequentes alterações normativas, em nenhum caso poderá ser aplicada, com efeitos retroativos, uma lei sancionatória ou penal de conteúdo mais desfavorável ao Arguido.
KKK)E, como se referiu, a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, veio determinar, para aquilo que aqui nos traz à colação, um aumento de 267 dias relativamente ao prazo de prescrição do procedimento contraordenacional.
LLL)Assim, é também inconstitucional a interpretação dos n.º 3 e 4 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, no sentido de poder ser aplicável o regime da suspensão e interrupção dos prazos, aos prazos que à data da sua entrada em vigor estavam já em curso em processos de natureza contraordenacional, por manifesta violação do principio da não retroatividade da lei criminal previsto no disposto no n.º 6 do artigo 19.º da Constituição da República Portuguesa.
MMM)A restrição dos direitos, liberdades e garantias não respeita os princípios previstos nos termos do artigo 18.º da Constituição da República.
NNN)Nomeadamente, a restrição deste Direito Fundamental não garante o desígnio da proporcionalidade porque não era necessária, indispensável nem adequada, particularmente se tivermos em consideração a ratio normativa prevista com a publicação da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, cujo objetivo era mitigar a disseminação da propagação do vírus SARS-CoV-2 através da limitação dos contactos presenciais entre os cidadãos.
OOO)A entidade reguladora, durante a vigência da referida lei e mesmo após, não efetuou qualquer diligência probatória presencial.
PPP)Pelo que, aplicar esta lei ao caso concreto é legitimar uma realidade completamente desfasada daqueloutra que resulta dos próprios autos. É partir de uma factualidade abstrata que em momento algum se verificou no caso concreto.
QQQ)Estas questões assumem particular relevância quando analisamos o último sub-princípio, o da justiça na repartição dos custos.
RRR)Pelo que a condenação da Arguida, num processo que já se encontra prescrito, parece ser um custo demasiado elevado a ser suportado, porquanto a entidade reguladora não deu cumprimento aos pressupostos que norteiam o processo sancionatório, ou latu sensu, um processo que deveria “ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa.” – cf. art. 32.º, n.º 2, in fine da CRP –.
SSS)No que concerne ao princípio da proibição da retroatividade, não nos podemos esquecer qual o hiato temporal do tempus delicti previsto nos termos do n.º 1 do artigo 3.º do RGCO remonta à data da prática dos factos, leia-se 19 de abril de 2016.
TTT)Pelo que, inegavelmente que aplicar a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, lei que restringe direitos, liberdades e garantias da Arguida, a factos praticados quatro anos antes da sua entrada em vigor, viola, de forma grosseira, o princípio da proibição da retroatividade.
UUU)Aplicar o normativo ao caso concreto, será o equivalente a justificar essa aplicação tendo por base a violação do próprio artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa que, em tese, legitimaria essa mesma aplicação.
VVV)Finalmente, quanto ao respeito pelo conteúdo essencial do direito, não poderão restar dúvidas que a interpretação e aplicação da norma, efetuada de forma restrita conforme efetuou o tribunal a quo, belisca o core do preceito e não apenas e só restringe as suas camadas intermédias ou periféricas.
WWW)Isto porque, caso assim não fosse, a letra da lei não referiria “Ninguém pode sofrer pena (…) aplicando-se retroativamente as leis penais de conteúdo mais favorável ao arguido” e “A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência em nenhum caso pode afetar (…) a não retroatividade da lei criminal (…)”.
XXX)A Arguida tem ainda muitas reservas quanto aos desígnios constitucionais invocados pelo tribunal a quo quanto aos interesses constitucionalmente consagrados que legitimariam a restrição do princípio da não retroatividade da lei criminal.
YYY)Em momento algum a alegada conduta da Arguida colocou em causa o aumento do bem-estar social e económico e da qualidade de vida das pessoas.
ZZZ)Muito menos colocou em causa a defesa dos interesses e os direitos dos consumidores.
AAAA)Não conseguindo ainda conceber em que medida a criação de instrumentos jurídicos e técnicos necessários ao planeamento democrático do desenvolvimento económico e social poderiam ser invocados neste propósito.
BBBB)Quanto à interpretação efetuada à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março ao abrigo do RGCO, a decisão do tribunal a quo deveria ter considerado o disposto no n.º 3 do artigo 28.º quando refere que a prescrição tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade.
CCCC) Ou seja, o legislador criou uma válvula de escape para acautelar determinados atropelos que pudessem colocar em causa direitos dos arguidos – não esquecendo, claro está, que esta norma prevista no RGCO teve por base o seu homólogo no n.º 3 do artigo 121.º do Código Penal –.
DDDD)E em ambos os casos, criminal ou contraordenacional, o legislador foi perentório ao afirmar que “A prescrição do procedimento tem sempre lugar (…)”.
EEEE)A intenção do legislador não foi imortalizar pendências com a consequente responsabilização ad aeternum dos agentes criminais, nem tampouco garantir ao promotor do processo que indiscriminadamente pudesse posterizar a sua atuação nessa qualidade.
FFFF)Pelo contrário, foi criar uma forma de colocar um limite à instrução do processo levada a cabo pelo órgão promotor do mesmo, por forma a, acautelando os direitos dos arguidos, colocar um termo ao procedimento decorrido um determinado hiato temporal.
GGGG)Quer isto dizer que o limite máximo da interrupção da prescrição, nas palavras do legislador, verificar-se-á sempre que tenha decorrido o prazo de prescrição acrescido de metade.
HHHH)E face a este enquadramento jurídico, inegavelmente que no presente caso o prazo prescricional acrescido do prazo de interrupção da prescrição será o equivalente a quatro anos e seis meses.
IIII)Ora, facilmente se poderá então verificar que, pelo menos, desde 19 de outubro de 2020, o procedimento contraordenacional se encontra prescrito porquanto a ação de fiscalização levada a cabo pela ANACOM realizou-se no dia 19 de abril de 2016.
JJJJ)No entanto, mal andou o tribunal a quo ao determinar que a prescrição do procedimento – consideradas as causas de interrupção e de suspensão – apenas atingirá o seu termo no dia 13 de julho de 2021.
KKKK)Relevante para determinação da lei aplicável é o disposto no n.º 1 do artigo 3.º do RGCO, ou seja a lei em vigor no tempus delicti, e não a lei em vigor no momento da aplicação da coima.
LLLL)Quer portanto isto dizer que no ano de 2016 não se verificava qualquer causa de interrupção ou suspensão dos prazos pelo que a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, em momento algum deveria ter sido aplicada ao presente processo.
MMMM)O legislador foi categórico ao afirmar que “A prescrição do procedimento tem sempre lugar (…)”. Ou seja, sempre, a todo o momento, eternamente, indefinidamente, e independentemente da causa que lhe possa vir a suceder.
NNNN)Precisamente para salvaguardar os direitos, liberdades e garantias dos arguidos previstos da Constituição da República Portuguesa (a título de exemplo, a 2.ª parte do disposto no n.º 2 do artigo 32.º).
OOOO)Foi o próprio legislador, na elaboração do quadro legal normativo do RGCO, que não veio determinar qualquer causa de exceção à factie specie normativa prevista no n.º 3 do artigo 28.º.
PPPP)Pelo que, com respeito por entendimento contrário, não deve o intérprete-aplicador escolher à la carte e de forma mitigada qual o regime jurídico concreto a aplicar, mesmo dentro do quadro legal normativo ordinário.
QQQQ)Em conclusão, não deverá ser efetuada uma interpretação extensiva do n.º 3 do artigo 28.º do RGCO permitindo a aplicação da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, devendo, pelo contrário, ser dada a extensão e o alcance à norma tal como previsto pelos elementos hermenêuticos para o nosso ordenamento jurídico, designadamente o elemento gramatical, teleológico e sistemático.
RRRR)No que concerne à suspensão do procedimento contraordenacional, a integração da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, não poderá ser efetuada ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 27.º-A do RGCO.
SSSS)Porque o enquadramento jurídico da norma reporta a situações relacionadas com imperativos constitucionais que impossibilitam, face a determinadas circunstâncias relacionadas com órgãos de soberania, o início ou a continuidade do procedimento criminal ou contraordenacional.
TTTT)Não foi, salvo respeito por diferente entendimento, o caso dos presentes autos, na estrita medida em que a continuidade dos atos de instrução do processo administrativo, em momento algum estiveram condicionados a qualquer autorização legislativa.
UUUU)Exemplo disso mesmo é o facto de não ter sido efetuada qualquer diligência no procedimento contraordenacional desde a data da inquirição das duas testemunhas arroladas pela Arguida até à data da notificação da decisão final.
VVVV)De outra banda, os processos judiciais continuaram a poder ser tramitados, ficando posteriormente a realização dos julgamentos condicionada à possibilidade de estarem reunidas condições de segurança relacionadas com a saúde publica.
WWWW)Tem que ser efetuada a destrinça entre a ausência de autorização legal para início, ou continuidade, de um determinado procedimento, dos casos em que as partes não quiseram dar continuidade ao mesmo, ainda que podendo, porque os prazos se encontravam suspensos.
XXXX)Uma coisa é a ausência de autorização legal, ou seja o legislador proibir a realização de uma determinada diligência, outra completamente diferente é existir essa autorização mas os prazos encontrarem-se suspensos (e não proibida a sua prática).
YYYY)Da leitura da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, não resulta que as partes ficaram proibidas de praticar quaisquer atos processuais, mas apenas e tão somente que os prazos ficaram suspensos.
ZZZZ)Certamente que os exemplos previstos pelos autores que escreveram os seus comentários ao artigo 27.º-A do RGCO, não se circunscreviam a hipóteses em que o promotor do processo negligentemente não deu continuidade às diligências probatórias, comportamento particularmente grave quando verificamos que associada à aplicação da coima se encontram previstos imperativos relacionados com necessidades de prevenção geral e especial.
AAAAA)Não deveria o tribunal a quo ter tornado letra morta desígnios constitucionais previstos para defesa e proteção dos arguidos, mormente os previstos no n.º 4 do artigo 29.º e no n.º 6 do artigo 19.º, ambos da Constituição da República Portuguesa.
BBBBB)Pelo que, apenas V.ª Ex.ª poderão alterar a decisão do tribunal a quo dando provimento ao presente recurso e reconhecendo a prescrição do procedimento contraordenacional, pelo menos desde 19 de outubro de 2020, e determinando, em consequência, a absolvição da aqui Arguida e o consequente arquivamento dos autos.

Terminou sustentando:
Nestes termos e nos melhores de Direito, sempre com mui douto suprimento de V.ª Exª , deverá ser dado provimento ao presente recurso apresentado pela Recorrente, alterando-se a decisão recorrida e reconhecendo-se a prescrição do procedimento contraordenacional, e determinando-se em consequência a absolvição da aqui Arguida e o consequente arquivamento dos autos.

A AUTORIDADE NACIONAL DE COMUNICAÇÕES veio responder às alegações de recurso concluindo:
I.- O princípio da legalidade não requer que todas as causas de suspensão do prazo de prescrição do procedimento contra-ordenacional estejam previstas na mesma norma legal – apenas terão que estar previstas numa norma legal;
II.- Não há uma tipicidade de causas de suspensão no referido artigo, que contém uma remissão dinâmica que abrange as normas que vigorem enquanto este se mantiver em vigor;
III.- Nada obsta também a que o artigo 27.ºA, n.º 1 do RGCO remeta para normas ainda não existentes que determinem causas de suspensão do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional;
IV.- A alínea a) do n.º 1 do artigo 27.º-A do RGCO, que se encontrava já em vigor à data dos factos que constituem contraordenação, consagra que o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional se suspende, para além dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que o procedimento “não puder legalmente iniciar-se ou continuar por falta de autorização legal” – o que se verificou, no caso sub iudice, devido à suspensão dos prazos para a prática de todos os atos processuais e procedimentais operada pela mesma Lei n.º 1 A/2020.
V.- E estatuindo expressamente o artigo 7.º n.º 3 da Lei n.º 1-A/2020 de 19 de Março, que prevê expressamente uma nova causa de suspensão que, durante esse tempo, se verificaria uma suspensão dos prazos prescricionais para a qual ocorre uma remissão dinâmica do Art. 27ºA do RGCO, não fazendo qualquer sentido afastar o Art. 27.ºA do RGCO que vigorava já no momento da prática dos factos com a mesmíssima redação, pelo que se nem coloca qualquer questão de retroactividade.
VI.- Aquela causa de suspensão da prescrição, que decorre da suspensão dos prazos e se enquadra, por isso, , a que se aplica a alínea a) do n.º 1 do artigo 27.º-A do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, obstou a que o prazo de prescrição pudesse ter decorrido se verificasse enquanto se manteve a causa que a determinou, como aconteceu no caso concreto e até 2 de junho de 2020, data em que entrou em vigor a Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, que veio alterar as medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19, revogando integralmente o artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março.
VII.- Até porque, reitera-se, tal suspensão é uma mera concretização da norma já constante da alínea a) do n.º 1 do artigo 27.º-A do RGCO. - A disposição material vigente no momento da prática do facto punível não é diferente da que vigorava à data da alegada prescrição do procedimento contraordenacional nenhuma é mais favorável que a outra.– é precisamente a mesma –, pelo que não se coloca a questão da sucessão de leis criminais no tempo, nem da retroatividade ou da aplicação da lei mais favorável ao arguido.
VIII.- Acresce que a declaração de um estado de exceção como o Estado de Emergência, consiste na suspensão dos direitos, liberdades e garantias previstos na CRP, sendo que as medidas previstas na Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, foram determinadas no âmbito de um “estado de exceção constitucional, que pode ser definido como a alteração fundamental da ordem constitucional, de vigência transitória, que reforça o poder público, fundada na ocorrência de situações de anormalidade que lhe são lesivas, visando pôr-lhes cobro, figura essa que se prevê nos artigos artigos 19º, 134º, als. d) e e), 138º, 161º, al. l), 162º, al. b), 164º, al. e) e 289º da Constituição da República Portuguesa”.
IX.- Assim ao período de suspensão de 6 meses que findou em 28.10.2020 acrescem desde logo 86 dias por virtude do período de suspensão que perdurou entre 9 de março de 2020 e 02 de junho de 2020, como previsto no n.º 2 do Art. 27.º-A do RGCO, por força do disposto no n.º 1 e na alínea b) do n.º 9 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na redação dada pela Lei n.º 4-A/2020, de 06 de abril, do artigo 5.º deste diploma e dos artigos 8.º e 10.º ambos da Lei n.º 16/2020, de 29 de maio sendo que posteriormente, a Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, revogou integralmente o artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março – o que teve como consequência a revogação da suspensão dos prazos prevista nos n.os 1 e 3 do artigo 7.º, aplicável aos processos de contraordenação por força da alínea b) do n.º 9 do mesmo artigo 7.º;
X.- O prazo de prescrição apenas atingiria o seu termo no dia 13.07.2021 não fosse a incerteza gerada pelo agravamento da situação de saúde pública vivida que, para já, determinou a suspensão dos prazos em curso, por força do disposto nos números 3 e 4 do artigo 6.º -B da Lei nº 4-B/2021 de 1 de fevereiro, conjugado com a alínea a) do artigo 27.º-A do RGCO.
XI.- Acresce que o n.º 1 do artigo 29.º da CRP estatui o seguinte: “Ninguém pode ser sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare punível a ação ou a omissão, nem sofrer medida de segurança cujos pressupostos não estejam fixados em lei anterior”, ou seja, a proibição refere-se à retroatividade da lei criminalizadora, que qualifique uma determinada conduta como crime e o disposto no n.º 3 do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, na sua primeira redação e, bem assim, na redação conferida pela Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, não assume a natureza de lei que qualifique determinada conduta criminal, na medida em que não criminaliza condutas nem fixa penas, pelo que não lhe é sequer aplicável o princípio ínsito no citado n.º 1 do artigo 29.º da CRP;
XII.- Resulta à saciedade que a norma no n.º 3 do artigo 7.º da Lei n.º 1 A/2020, quer na sua primeira redação, quer na redação conferida pela Lei n.º 4-A/2020, de 6 de abril, não assume a natureza, como se disse, de norma criminalizadora, e, bem assim, não vem estabelecer uma pena mais grave - donde, tais princípios não são sequer aplicáveis ao caso sub judice.
XIII.- O mesmo se dirá em relação ao princípio da proibição da retroatividade da lei penal desfavorável ao arguido, contemplado no n.º 3 e na primeira parte do n.º 4 do artigo 29.º da CRP e, bem assim, o mais recente princípio da imposição da retroatividade da lei penal favorável, previsto na segunda parte do n.º 4 do mesmo artigo;
XIV.- Mas, ainda que assim se não entendesse, o Tribunal Constitucional tem vindo a esclarecer que, “a diferença entre [os] domínios sancionatórios e subjacentes ilícitos não permite que se apliquem ao domínio contraordenacional, com o mesmo rigor e extensão, os princípios constitucionais respeitantes ao domínio sancionatório penal, reconhecendo-se ao legislador democrático, naquele domínio contraordenacional uma maior margem de liberdade na determinação dos ilícitos e do respetivo regime substantivo e processual” (cit. acórdão n.º 297/2016).
Termos em que, e nos mais de Direito, deverão V. Exas., Venerandos Juízes Desembargadores, considerar o recurso apresentado pela NOS totalmente improcedente, pelos motivos melhor explicitados na MOTIVAÇÃO que antecede, assim se fazendo JUSTIÇA!

Também o Ministério Público respondeu ao recurso e, sem apresentar conclusões, defendeu a improcedência do mesmo.

Foi colhido o visto do Ministério Público junto deste Tribunal.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

É a seguinte a questão a avaliar:
A Arguida foi condenada pela prática de uma contraordenação cujo procedimento contra-ordenacional já se encontrava prescrito, pelo menos, desde 19 de outubro de 2020?

II.FUNDAMENTAÇÃO:

Fundamentação de facto

Vem provado que:
a.- No dia 27 de fevereiro de 2016, a área comercial da Arguida apresentou um pedido de adjudicação à área de Engenharia de Rede também da Arguida, de uma ligação Ponto-Ponto entre a estação de Pisco e o balcão do Banco BIC em Trancoso.
b.- Nessa senda, a Arguida, por um lado, pediu a um parceiro contratado para o efeito para proceder à instalação da referida ligação.
c.- E, por outro lado, no dia 10 de março de 2016, dirigiu à ANACOM um pedido inicial de reserva de frequência (pedido “MW_BIC_104_602N4_1”) para a referida ligação.
d.- Tal pedido foi efetuado à semelhança dos demais 190 pedidos que tinham sido apresentados no primeiro semestre de 2016.
e.- No momento em que foi efetuado o pedido de reserva em causa, a Arguida endereçou um conjunto de pedidos de reserva, num total de 12, para o mesmo cliente (Banco BIC), na medida em que este cliente corporate iria abrir 12 dependências cujos serviços de comunicações eletrónicas seriam assegurados pela NOS.
f.- A ANACOM veio a aceitar o pedido de reserva da Arguida a 15 de março de 2016.
g.- No entanto, por impossibilidade de utilização da frequência já reservada, esta última formulou, no dia 28 de março de 2016, um pedido de alteração de frequência, endereçando o mesmo à ANACOM.
h.-No dia 1 de abril de 2016, a ANACOM confirmou formalmente a reserva de atribuição de nova frequência.
i.- Sendo que já no dia 30 de março de 2016, e de modo informal, a mesma entidade havia confirmado o pedido em causa.
j.- Confirmada a reserva da frequência, a Arguida dispunha do prazo de 60 dias para apresentar um pedido de licenciamento, tendo em vista a utilização da rede de radiocomunicações em questão, o que fez dentro do prazo estipulado, tendo recebido uma resposta formal da ANACOM no dia 27 de maio de 2016.
k.- Só no dia 06 de junho de 2016 é que o cliente da Arguida (Banco BIC) começou a beneficiar da ligação Ponto-Ponto aqui em causa.
l.- Contudo, o parceiro contratado pela Recorrente procedeu à ligação da estação de rede radiocomunicações do Serviço Fixo – Ligações Ponto-Ponto em momento anterior e, em virtude, disso, pelo menos, no dia 19.04.2016, em Lugar do Pisco, Trancoso, encontrava-se a ser utilizada, nas coordenadas geográficas WGS84, 40º 46´20,38`` N / 07º 25´24,63 W, a referida estação sem licença de utilização.
m.- A referida estação utilizava a frequência 22,015 GHz.
n.- A referida estação não estava a ser utilizada, na data indicada, para a efetivação de testes necessários para garantir que os feixes hertzianos, essenciais para a prestação dos serviços da Arguida, se encontram devidamente alinhados no momento da prestação do serviço.
o.- A frequência utilizada estava incluída no segundo pedido de reserva de frequência efetuado pela Arguida.
p.- A referida estação não emitia de forma contínua.
q.- As estações da rede de radiocomunicações, conforme a supra descrita, apenas passam a ser controlas remotamente pela Arguida a partir do momento em que passam a “integrar a rede”, o que ainda não tinha sucedido no dia 19.04.2016.
r.- A partir do momento em que a Arguida foi notificada por parte da ANACOM que a estação de rede estaria a transmitir sinal, contactou o parceiro para ir ao local e terminar a “fase de instalação” supra referida.
s.- A Recorrente sabia que não tinha licença de utilização no dia 19.04.2016, mas não representou como possível que a referida estação se encontrava a funcionar, o que se deveu ao facto de não ter tido o cuidado de coordenar a instalação da ligação em causa por parte do parceiro contratado para o efeito com o pedido de licença, cuidado de que era capaz.
t.- À data da realização da ação de fiscalização, a Arguida tinha cerca de 2300 ligações semelhantes à descrita espalhadas por todo o território nacional.
u.- No ano de 2018, a Arguida apresentou um resultado líquido 280 856 498,24 euros, um volume de negócios de 1 408 073 576,63 euros e um balanço total de 2 534 878 636,53 euros e teve um número médio de 1 079 trabalhadores ao seu serviço.
v.- A Recorrente não revela sentido crítico da sua conduta.

w.- A Recorrente já sofreu as seguintes condenações:
i.- No processo n.º 100/12.4YUSTR, que correu termos neste Tribunal e cuja decisão final transitou em julgado no dia 06.02.2014, a Arguida foi condenada na coima única no valor de 37.500 Euros, pela prática de 22 contraordenações, por irregularidades em processos de portabilidade, p.p no art. 113.º, n.º 1, al ll), e n.ºs 2 e 6, da Lei 5/2004, de 10/2 (Lei das Comunicações Eletrónicas), nºs 1, 2 e 7, al. a) do art. 10º do Regulamento da Portabilidade, Regulamento n.º 58/2005, de 18/8, com as alterações do Regulamento 87/2009, de 18/2 (Regulamento da Portabilidade), e em face do disposto no art. 25.º de tal diploma, pelos fundamentos que constam na decisão junta aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
ii.- No processo n.º 98/13.1YUSTR, que correu termos neste Tribunal e cuja decisão final transitou em julgado no dia 17.01.2014, a Arguida foi condenada numa coima de € 36.000, pela prática na forma continuada da contraordenação prevista no art. 113.º, n.º 1, al II), e n.º 2 da Lei 5/2004, de 10/2 (Lei das Comunicações Eletrónicas), por violação do disposto no n.º 7 do art. 12.º do Regulamento da Portabilidade, Regulamento n.º 58/2005, de 18/8, com as alterações do Regulamento 87/2009, de 18/2 e do Regulamento 302/2009, de 16/7 (doravante designado “Regulamento da Portabilidade”), e em face do disposto no art. 25.º de tal diploma, em virtude de não ter respondido, no prazo de 24 horas, a 1916 pedidos eletrónicos de portabilidade que lhe foram submetidos por outros operadores, no período compreendido entre 1/8/2009 e 1/9/2010, pelos fundamentos que constam na decisão junta aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
iii.- No processo n.º 1/14.1YUSTR, que correu termos neste Tribunal e cuja decisão final transitou em julgado no dia 28.10.2014, a Recorrente, então Optimus – Comunicações S.A. foi condenada pela prática de cinco contraordenações previstas e punidas pelos 45.º, n.º 3 e 113.º, n.º 2, al. p), e n.º 7, al. e), da Lei n.º 5/2004, na redação introduzida pela Lei 51/2011, de 13/9, em três coimas de € 20.000 (vinte mil euros) e duas coimas de € 17.500 ((dezassete mil e quinhentos euros), e, em cúmulo jurídico, na coima única de € 65.000 (sessenta e cinco mil euros), pelos fundamentos que constam nas decisões juntas aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
iv.- No processo n.º 48/15.0YUSTR, que correu termos neste Tribunal e cuja decisão final transitou em julgado no dia 12.12.2016, a Arguida foi condena pela prática de setenta e duas contraordenações, na forma negligente, previstas e punidas pelo artigo 113.º, n.º 1, alínea l l) e n.º 6, da Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro (na redação resultante do Decreto-Lei n.º 176/2007, de 8 de Maio), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 5, da Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro (na redação originária) e com os artigos 10.º e 25.º, ambos do Regulamento n.º 58/2005, de 18 de Agosto (Regulamento da Portabilidade), na sanção de admoestação, por cada uma delas, pela prática de dezoito contraordenações, na forma negligente, previstas e punidas pelo artigo 113.º, n.º 1, alínea l l) e n.º 6, da Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro (na redação resultante do Decreto-Lei n.º 176/2007, de 8 de maio), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 5, da Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro (na redação originária) e com os artigos 10.º e 25.º, ambos do Regulamento n.º 58/2005, de 18 de agosto (Regulamento da Portabilidade), no pagamento de uma coima de 3.000,00 € (três mil euros), por cada uma delas, pela prática de uma contraordenação, na forma negligente, prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 1, alínea l l) e n.º 6, da Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro (na redação resultante do Decreto-Lei n.º 176/2007, de 8 de maio), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 5, da Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro (na redação originária) e com os artigos 10.º e 25.º, ambos do Regulamento n.º 58/2005, de 18 de agosto (Regulamento da Portabilidade), no pagamento de uma coima no valor de 17.500,00 € (dezassete mil e quinhentos euros) e na coima única de 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), pelos fundamentos que constam na decisão junta aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
v.- No processo n.º 103/16.0YUSTR, que correu termos neste Tribunal e cuja decisão final transitou em julgado no dia 11.01.2017, a Arguida foi condenada pela prática de uma contraordenação, prevista e punida pelo disposto no artigo 113.º, n.º 2, alínea mm), por violação do disposto nos artigos 108.º, n.º 1 e 5, ambos da Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro, no pagamento de uma coima no valor de 7.500,00 €, pelos fundamentos que constam nas decisões juntas aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
vi.- No processo n.º 142/16.0YUSTR, que correu termos neste Tribunal e cuja decisão final transitou em julgado no dia 06.02.2017, a Arguida foi condenada pela prática, sob a forma negligente, em concurso efetivo, de doze ilícitos previstos e puníveis pelos art.ºs 5º/1 e 9º/1/a)/2 da Lei 156/2005, em 6 (seis) coimas de € 1.750,00, cada uma, pela prática, sob a forma negligente, em concurso efetivo, de doze ilícitos previstos e puníveis pelos art.ºs 3º/1/b) e 9º/1/a)/2 da Lei 156/2005, em 6 (seis) coimas de € 3.500,00, cada uma e na coima única de €22.000,00 (vinte e dois mil euros), pelos fundamentos das decisões que constam nos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
vii.- No processo n.º 232/16.0YUSTR, que correu termos neste Tribunal e cuja decisão final transitou em julgado no dia 09.01.2017, a Arguida foi condenada na coima de €3.000,00, para a contraordenação relativa à prática desleal ocorrida com o consumidor PC (pontos 32. a 36. do elenco dos factos provados), na coima de € 3.000,00, para a contraordenação relativa à prática desleal ocorrida com o consumidor AT (pontos 37. a 43. do elenco dos factos provados), na coima de € 3.000,00, para a contraordenação relativa à prática desleal ocorrida com a consumidora MC (pontos 44. a 48. do elenco dos factos provados), na coima de € 3.000,00, para a contraordenação relativa à prática desleal ocorrida com a consumidora VR (pontos 49. a 53. do elenco dos factos provados), na coima de € 3.000,00, para a contraordenação relativa à prática desleal ocorrida com a consumidora DM (pontos 54. a 58. do elenco dos factos provados) na coima de € 3.000,00, para a contraordenação relativa à prática desleal ocorrida com a consumidora VQ (pontos 59. a 63. do elenco dos factos provados), na coima de € 5.000,00, para a contraordenação relativa à prática desleal ocorrida com a consumidora MS (pontos 1. a 3. do elenco dos factos provados), na coima de € 5.000,00, para a contraordenação relativa à prática desleal ocorrida com a consumidora ML (pontos 4. a 6. do elenco dos factos provados), na coima de € 5.000,00, para a contraordenação relativa à prática desleal ocorrida com a consumidora MR (pontos 7. a 15. do elenco dos factos provados), na coima de € 5.000,00, para a contraordenação relativa à prática desleal ocorrida com a consumidora MT (pontos 16. a 21. do elenco dos factos provados), a coima de € 5.000,00, para a contraordenação relativa à prática desleal ocorrida com a consumidora LG (pontos 22. a 25. do elenco dos factos provados), uma coima de € 5.000,00, para a contraordenação relativa à prática desleal ocorrida com a consumidora RP (pontos 26. a 31. do elenco dos factos provados), na coima única no montante de €21.000,00 (vinte e um mil euros) pela prática dos ilícitos de mera ordenação social supra referidos, pelos fundamentos da decisão que consta nos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
viii.- No processo n.º 81/17.8YUSTR, que correu termos neste Tribunal e cuja decisão final transitou em julgado no dia 16.03.2018, a Arguida foi condenada pela prática, a título de dolo eventual, de uma contraordenação prevista e punida na alínea mm) do n.º 2 e na alínea e) do n.º 7, ambos do artigo 113.º da Lei das Comunicações Eletrónicas (LCE), aprovada pela Lei n.º 5/2004, de 10.02 (na redação vigente à data dos factos) e na alínea d) do n.º 6 do artigo 7.º da Lei n.º 99/2009, de 04.09, numa coima no montante de treze mil, trezentos e trinta e três euros e trinta e três cêntimos (€ 13.333,33), suspensa na sua execução em metade do seu valor pelo período de três (3) anos, pelos fundamentos que constam na decisão junta aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
ix.- No processo n.º 119/17.9YUSTR, que correu termos neste Tribunal e cuja decisão final transitou em julgado no dia 09.05.2017, a Arguida foi condenada na coima de 8.000,00€ (oito mil euros) pela prática de 1 (uma) contraordenação, a título de negligência, prevista e sancionada pelas disposições conjugadas dos artigos 76.º, n.º 4 e 89.º, n.º 3 al. o), parte final, n.º 10 al. e) do Decreto-Lei n.º 123/2009, de acordo com a classificação do art.º 7.º, n.º 6 al. d) do R.Q.CO.S.C., pelos fundamentos que constam na decisão junta aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
x.- No processo n.º 135/17.0YUSTR, que correu termos neste Tribunal e cuja decisão final transitou em julgado no dia 13.04.2018, a Arguida foi condenada pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 13.º, n.º 2, al a), do Regulamento n.º 58/2005, de 18 de agosto, na redação que lhe foi conferida pelo Regulamento nº 114/2012, de 13 de março, e elos artigos 113.º, n.º 2, al aa), da LCE, na redação vigente à data dos factos, correspondente à atual alínea dd), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 7, a título negligente, numa coima no montante de seis mil, seiscentos e sessenta e seis euros e sessenta e sete cêntimos (€ 6.666,67) (quanto aos factos vertidos no ponto 3 dos factos provados, alínea a)), pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 13.º, n.º 2, al c), do Regulamento n.º 58/2005, de 18 de agosto, na redação que lhe foi conferida pelo Regulamento nº 114/2012, de 13 de março, e elos artigos 113.º, n.º 2, al aa), da LCE, na redação vigente à data dos factos, correspondente à atual alínea dd), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 7, a título negligente, numa coima no montante de oito mil euros (€ 8.000,00) (quanto aos factos vertidos no ponto 4 dos factos provados), pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 13.º, n.º 2, al a), do Regulamento n.º 58/2005, de 18 de agosto, na redação que lhe foi conferida pelo Regulamento nº 114/2012, de 13 de março, e elos artigos 113.º, n.º 2, al aa), da LCE, na redação vigente à data dos factos, correspondente à atual alínea dd), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 7, a título negligente, numa coima no montante de oito mil euros (€ 8.000,00) (quanto aos factos vertidos no ponto 5 dos factos provados), pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 10.º, n.ºs 1 e 2, do Regulamento n.º 58/2005, de 18 de agosto, na redação que lhe foi conferida pelo Regulamento nº 114/2012, de 13 de março, e elos artigos 113.º, n.º 2, al aa), da LCE, na redação vigente à data dos factos, correspondente à atual alínea dd), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 7, a título negligente, numa coima de oito mil euros (€ 8.000,00) (quanto aos factos vertidos no ponto 6 dos factos provados, alínea b)), pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 10.º, n.ºs 1 e 2, do Regulamento n.º 58/2005, de 18 de agosto, na redação que lhe foi conferida pelo Regulamento nº 114/2012, de 13 de março, e elos artigos 113.º, n.º 2, al aa), da LCE, na redação vigente à data dos factos, correspondente à atual alínea dd), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 7, a título doloso, numa coima de quarenta e sete mil euros (€ 47.000) (quanto aos factos vertidos nos pontos 7 e 8 dos factos provados), pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 26.º, n.º4, do Regulamento n.º 58/2005, de 18 de agosto, na redação que lhe foi conferida pelo Regulamento nº 114/2012, de 13 de março, e pelos artigos 113.º, n.º 2, al aa), da LCE, na redação vigente à data dos factos, correspondente à atual alínea dd), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 7, a título doloso, numa coima de sessenta e sete mil euros (€ 67.000) (quanto aos factos vertidos no ponto 9 dos factos provados), em cúmulo jurídico, numa coima única de noventa mil euros (€ 90.000,00), pela prática de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 10.º, n.ºs 1 e 2, do Regulamento n.º 58/2005, de 18 de agosto, na redação que lhe foi conferida pelo Regulamento nº 114/2012, de 13 de março, e elos artigos 113.º, n.º 2, al aa), da LCE, na redação vigente à data dos factos, correspondente à atual alínea dd), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 7, a título negligente, numa admoestação (quanto aos factos vertidos no ponto 6 dos factos provados, alínea a)), pelos fundamentos das decisões que constam nos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
xi.- No processo n.º 185/17.7YUSTR, que correu termos neste Tribunal e cuja decisão final transitou em julgado no dia 07.12.2018, a Arguida foi condenada pela prática de uma contraordenação, a título negligente, prevista e punida pelos artigos 7.º, n.º 1, e 21.º n.ºs 1 e 4, ambos do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26.03, em relação ao cliente JC por ter prestado informação falsa, numa coima no montante de cinco mil euros (€ 5.000), pela prática de uma contraordenação, a título negligente, prevista e punida pelos artigos 7.º, n.º 1, e 21.º, n.ºs 1 e 4, ambos do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26.03, em relação ao cliente RH por ter prestado informação falsa, numa coima no montante de cinco mil euros (€ 5.000), pela prática de uma contraordenação, a título negligente, prevista e punida pelos artigos 7.º, n.º 1, e 21.ºs, n.º 1 e 4, ambos do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26.03, em relação ao cliente AS por ter prestado informação falsa, numa coima no montante de oito mil euros (€ 8.000), pela prática de uma contraordenação, a título negligente, prevista e punida pelos artigos 7.º, n.º 1, e 21.º, n.ºs 1 e 4, ambos do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26.03, em relação à cliente CM por ter prestado informação falsa, numa coima no montante de oito mil euros (€ 8.000), pela prática de uma contraordenação, a título negligente, prevista e punida pelos artigos 7.º, n.º 1, e 21.º, n.ºs 1 e 4, ambos do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26.03, em relação à cliente CF por ter prestado informação falsa, numa coima no montante de dois mil euros (€ 2.000), pela prática de uma contraordenação, a título doloso, prevista e punida pelos artigos 11.º, n.º 1 e 2, e 21.º, n.º 1, ambos do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26.03, em relação à cliente MF por assédio comercial, numa coima no montante de dez mil euros (€ 10.000), pela prática de uma contraordenação, a título negligente, prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da Lei das Comunicações Eletrónicas, em conjugação com o ponto 2.3.1., alínea b), da Deliberação da Anacom de 09.03.2012, em relação à cliente MV, por não ter aceitado a denúncia em loja, numa coima de quinze mil euros (€ 15.000), pela prática de uma contraordenação, a título negligente, prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da Lei das Comunicações Eletrónicas, em conjugação com o ponto 2.4.2., da Deliberação da Anacom de 09.03.2012, em relação à cliente MV, por não ter solicitado no prazo de 3 dias úteis a documentação em falta na declaração de denúncia, numa coima de quinze mil euros (€ 15.000), pela prática de uma contraordenação, a título negligente, prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da Lei das Comunicações Eletrónicas, em conjugação com o ponto 2.4.5., da Deliberação da Anacom de 09.03.2012, em relação à cliente MV, por não ter informado a cliente o prazo de trinta dias para o envio da documentação em falta, numa coima de quinze mil euros (€ 15.000), pela prática de uma contraordenação, a título doloso, prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da Lei das Comunicações Eletrónicas, em conjugação com os pontos 1.2. e 2.3.1., alínea b), da Deliberação da Anacom de 09.03.2012, em relação ao cliente AS, por ter condicionado a declaração de denúncia à receção de chamada pela linha de retenção, numa coima de trinta mil euros (€ 30.000), pela prática de uma contraordenação, a título doloso, prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da Lei das Comunicações Eletrónicas, em conjugação com os pontos 1.2. e 2.3.1., alínea b), da Deliberação da Anacom de 09.03.2012, em relação à cliente CF, por ter condicionado a declaração de denúncia à receção de chamada pela linha de retenção, numa coima de trinta mil euros (€ 30.000), pela prática de uma contraordenação, a título doloso, prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da Lei das Comunicações Eletrónicas, em conjugação com os pontos 1.2. e 2.3.1., alínea b), da Deliberação da Anacom de 09.03.2012, em relação ao cliente DC, por ter condicionado a declaração de denúncia à receção de chamada pela linha de retenção, numa coima de trinta mil euros (€ 30.000), pela prática de uma contraordenação, a título doloso, prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb), da Lei das Comunicações Eletrónicas, em conjugação com os pontos 1.2. e 2.3.1., alínea b), da Deliberação da Anacom de 09.03.2012, em relação ao cliente MF, por ter condicionado a declaração de denúncia à receção de chamada pela linha de retenção, numa coima de trinta mil euros (€ 30.000), pela prática de uma contraordenação, a título doloso, prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 2, alínea u), da Lei das Comunicações Eletrónicas, em conjugação com o artigo 48.º, n.º 1, alínea g) e n.º 2, do mesmo diploma legal, na redação vigente à data dos factos, em relação à cliente CM, por não ter incluído no contrato de adesão a referência ao custo de instalação, numa coima de quinze mil euros (€ 15.000), pela prática de uma contraordenação, a título doloso, prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 2, alínea u), da Lei das Comunicações Eletrónicas, em conjugação com o artigo 48.º, n.º 1, alínea g) e n.º 2, do mesmo diploma legal, na redação vigente à data dos factos, em relação ao cliente AM, por não ter incluído no contrato de adesão a referência ao custo de instalação, numa coima de quinze mil euros (€ 15.000), pela prática de uma contraordenação, a título doloso, prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 2, alínea u), da Lei das Comunicações Eletrónicas, em conjugação com o artigo 48.º, n.º 1, alínea g) e n.º 2, do mesmo diploma legal, na redação vigente à data dos factos, em relação ao cliente JM, por não ter incluído no contrato de adesão a referência ao custo de instalação, numa coima de quinze mil euros (€ 15.000), pela prática de uma contraordenação, a título doloso, prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 2, alínea r), da Lei das Comunicações Eletrónicas, em conjugação com o artigo 47.º, n.º 1 e n,º 2, alínea f), do mesmo diploma, na redação vigente à data dos factos, por não ter publicado no seu sítio na internet informações a que estava legalmente obrigada, numa coima de quarenta mil euros (€ 40.000) e em cúmulo jurídico, na coima única de duzentos mil euros (€ 200.000,00), pelos fundamentos da decisão junta aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
xii.- No processo n.º 218/17.7YUSTR, que correu termos neste Tribunal e cuja decisão final transitou em julgado no dia 04.07.2017 que condenou a Arguida na coima de 10.000,00€ (dez mil euros) pela prática de 1 (uma) contraordenação, prevista e punida pelos artigos 37. º, n.º 1 al a) e 113.º, n.º 2 al. h), n.º 8 al. e) e n.º 12 da LCE e pelos artigos 4.º e 7.º, n.º 6 al. d) do R.Q.CO.S.C., concretizados nas regras previstas no n.º 3 e no n.º 6, al. b) do Regulamento n.º 169/2013 de 15-05-2013 - nos pontos 4) a 12), 21) a 23), 28) a 32) da matéria de facto provada, na coima de 25.000,00€ (vinte e cinco mil euros) pela prática de 1 (uma) contraordenação, prevista e punida pelos artigos 37. º, n.º 1 al a) e 113.º, n.º 2 al. h), n.º 8 al. e) e n.º 12 da LCE e pelos artigos 4.º e 7.º, n.º 6 al. d) do R.Q.CO.S.C., concretizados nas regras previstas no n.º 3 do Regulamento n.º 169/2013 de 15-05-2013 - pontos 15) a 20) e 27), 28) a 32) da matéria de facto provada, na coima única de 30.000,00€ (trinta mil euros) e na sanção de admoestação pela prática de 1(uma) contraordenação, prevista e punida pelos artigos37. º, n.º 1 al a) e 113.º, n.º 2 al. h), n.º 8 al. e) e n.º 12 da LCE e pelos artigos 4.º e 7.º, n.º 6 al. d) do R.Q.CO.S.C., concretizados nas regras previstas no n.º 6, al. b) do Regulamento n.º 169/2013 de 15-05- 2013 - pontos 13), 14), 24) a 26), 28) a 32) da matéria de facto provada, pelos fundamentos que constam na decisão junta aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
xiii.- No processo n.º 239/17.0YUSTR, que correu termos neste Tribunal e cuja decisão final transitou em julgado no dia 08.06.2018, a Arguida foi condenada numa coima no valor de 50.000,00 euros (cinquenta mil euros), pela prática, a título negligente, da contraordenação prevista e punida no artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, em conjugação com os pontos 2.3.1., alínea ), da DECISÃO DA ANACOM DE 09.03.2012 por não ter recebido pedidos de denúncia apresentados num endereço por si divulgado ao público, numa coima no valor de 50.000,00 euros (cinquenta mil euros), pela prática, a título doloso, de uma contraordenação prevista e punida pelo artigo 113.º, n.º 3, alínea bbb) da LCE, em conjugação com os pontos 2.4.1. e 2.4.6. da Decisão da Anacom de 09.03.2012, ao não ter aceitado e/ou determinado os seus efeitos nas datas em que as recebeu, denúncias contratuais legíveis, corretamente instruídas e remetidas nos termos da Decisão, em duas coimas no valor de 3.500,00 euros (três mil e quinhentos euros) cada pela prática, em concurso efetivo e a título negligente, de duas contraordenações previstas e punidas pelos artigos 7.º, n.º 1, e 21.º, n.º 1 e 4, ambos do Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26.03, por não ter informado dois clientes acerca dos períodos contratuais mínimos a que os mesmos, segundo ela, estariam vinculados, na coima única de 90.000,00 euros (noventa mil euros), pelos fundamentos as decisões juntas aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
xiv.- No processo n.º 11/18.0YUSTR, que correu termos neste Tribunal e cuja decisão final transitou em julgado no dia 28.06.2018, a Arguida foi condenada pela prática de uma contraordenação prevista e punida pela alínea b) do n.º 1 do artigo 9.º, por violação do disposto no n.º 3 do artigo 3.º, todos do Decreto-Lei n.º 156/2005, de 15 de setembro, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 74/2017, de 21 junho, na coima de 2 500 euros (dois e quinhentos euros), pelos fundamentos que constam nas decisões juntas aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
xv.- No processo n.º 153/18.1YUSTR, por sentença transitada em julgado no dia 25.01.2019, a Recorrente foi condenada pela prática de uma contraordenação, na forma dolosa, prevista e punida pelo artigo 10.º, n.º 1, com referência ao artigo 4.º, n.º 2, ambos do Decreto-Lei n.º 134/2009, de 2 de junho, na coima de 3.000,00€, pela prática de seis contraordenações, na forma dolosa, previstas e punidas pelo artigo 10.º, n.º 1, com referência ao artigo 6.º, n.º 5, ambos do Decreto-Lei n.º 134/2009, de 2 de junho, na coima de 5.000,00€, por cada uma delas, pela prática de uma contraordenação, na forma dolosa, prevista e punida pelo artigo 10.º, n.º 1, com referência ao artigo 6.º, n.º 6, ambos do Decreto-Lei n.º 134/2009, de 2 de junho, na coima de 3.000,00€, em cúmulo, na coima única de 20.000,00€;
xvi.- A Arguida foi condenada no processo n.º 160/18.4YUSTR, por sentença transitada em julgado no dia 21.12.2018, pela prática de um ilícito de mera ordenação social por violação grosseiramente negligente do disposto no n.º 7 do artigo 12.º do Regulamento, ao não ter respondido a 20 pedidos eletrónicos de portabilidade, numa coima no montante de nove mil euros (€ 9.000), pela prática de um ilícito de mera ordenação social por violação dolosa do disposto no n.º 10 do artigo 12.º do Regulamento, ao ter submetido pedidos eletrónicos de portabilidade relativos a 42 diferentes números já após o termo do prazo fixado para concretização daquela, numa coima no montante de trinta mil euros (€ 30.000), pela prática de um ilícito de mera ordenação social por violação negligente do disposto no n.º 10 do artigo 12.º do Regulamento, ao ter submetido pedidos eletrónicos de portabilidade relativos a 31 diferentes números indicando as três janelas de portabilidade para datas posteriores ao termo do prazo fixado para concretização daquela, numa coima no montante de doze mil euros (€ 12.000) euros, pela prática de três ilícitos de mera ordenação social por violações negligentes do disposto no n.º 10 do artigo 12.º do Regulamento, ao ter submetido 3 pedidos eletrónicos de portabilidade relativos a 3 diferentes números indicando pelo menos uma das janelas de portabilidade para datas posteriores ao termo do prazo fixado para concretização daquela, em três coimas parcelares de € 3.000 euros cada, pela prática de três ilícitos de mera ordenação social por violações negligentes do disposto no n.º 10 do artigo 12.º do Regulamento, ao ter concretizado a portabilidade de 3 diferentes números após o prazo fixado para a implementação daquela, na sequência de diferentes lapsos da sua inteira responsabilidade em três coimas parcelares uma de € 3.500 e outra de € 3.000 por cada, pela prática de quarenta e quatro ilícitos de mera ordenação social por violações dolosas do disposto no n.º 4 do artigo 26.º do Regulamento, ao não ter pago a 44 assinantes as compensações que lhes são devidas, em coimas parcelares, pela prática de cinquenta e quatro ilícitos de mera ordenação social por violações dolosas do disposto no n.º 4 e no n.º 8 do artigo 26.º do Regulamento, ao não ter pago, no prazo normativamente fixado, a 54 assinantes as compensações que lhes eram devidas, fazendo-o apenas extemporaneamente, e, em 3 casos, não lhes pagando a totalidade das quantias que lhes eram devidas a título de compensações, em coimas parcelares, e na coima única de duzentos mil euros (€ 200.000);
xvii.- No processo n.º 234/18.1YUSTR, a Arguida foi condenada, por sentença transitada em julgado no dia …, pela prática, a título doloso, de 4 (quatro) contraordenações, previstas e punidas pelo n.º 1 do artigo 7.º, por violação do n.º 1 do artigo 2.º, ambos do Decreto-Lei n.º 56/2010, em coimas parcelares, no montante de sete mil e quinhentos euros (€ 7.500) e na coima única de 20 000,00 euros (vinte mil euros), conforme sentença que se mostra junto aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
xviii.- No processo n.º 353/18.4YUSTR, a Arguida foi condenada, por sentença transitada em julgado no dia 11.10.2019, pela prática, a título doloso, de uma contraordenação pela violação do artigo 13.º, n.º 2, do Regulamento da Portabilidade n.º 58/2005, de 18 de agosto, na redação que lhe foi conferida pelo Regulamento nº 114/2012, de 13 de março, e pelos artigos 113.º, n.º 2, al aa), da LCE, na redação vigente à data dos factos, correspondente, à atual alínea dd), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 7, do mesmo diploma, numa coima no montante de vinte e quatro mil e seiscentos euros (€ 24.600), pela prática, a título negligente, de uma contraordenação pela violação do artigo 13.º, n.º 2, do Regulamento da Portabilidade n.º 58/2005, de 18 de agosto, na redação que lhe foi conferida pelo Regulamento nº 114/2012, de 13 de março, e pelos artigos 113.º, n.º 2, al aa), da LCE, na redação vigente à data dos factos, correspondente, à atual alínea dd), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 7, do mesmo diploma, na coima no montante de nove mil euros (€9000), pela prática, a título negligente, de uma contraordenação pela violação do artigo 12.º, n.º 10, do Regulamento da Portabilidade n.º 58/2005, de 18 de agosto, na redação que lhe foi conferida pelo Regulamento nº 114/2012, de 13 de março, e pelos artigos 113.º, n.º 2, al aa), da LCE, na redação vigente à data dos factos, correspondente, à atual alínea dd), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 7, do mesmo diploma, numa coima no montante de quarenta e seis mil e quinhentos euros (€46.500), pela prática, a título doloso, de uma contraordenação pela violação do artigo 26.º, n.º 4, do Regulamento da Portabilidade n.º 58/2005, de 18 de agosto, na redação que lhe foi conferida pelo Regulamento nº 114/2012, de 13 de março, e pelos artigos 113.º, n.º 2, al aa), da LCE, na redação vigente à data dos factos, correspondente, à atual alínea dd), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 7, do mesmo diploma, numa coima no montante de dezanove mil e setecentos euros (€ 19.700), pela prática, a título doloso, de uma contraordenação pela violação do artigo 26.º, n.º 4, do Regulamento da Portabilidade n.º 58/2005, de 18 de agosto, na redação que lhe foi conferida pelo Regulamento nº 114/2012, de 13 de março, e pelos artigos 113.º, n.º 2, al aa), da LCE, na redação vigente à data dos factos, correspondente, à atual alínea dd), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 7, do mesmo diploma, numa coima no montante de dez mil euros (€ 10.000), pela prática, a título doloso, de uma contraordenação pela violação do artigo 26.º, n.ºs 4 e 8, do Regulamento da Portabilidade n.º 58/2005, de 18 de agosto, na redação que lhe foi conferida pelo Regulamento nº 114/2012, de 13 de março, e pelos artigos 113.º, n.º 2, al aa), da LCE, na redação vigente à data dos factos, correspondente, à atual alínea dd), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 7, do mesmo diploma, numa coima no montante de oitenta e um mil e quinhentos euros (€ 81.500), pela prática, a título doloso, de uma contraordenação pela violação do artigo 26.º, n.ºs 4 e 8, do Regulamento da Portabilidade n.º 58/2005, de 18 de agosto, na redação que lhe foi conferida pelo Regulamento nº 114/2012, de 13 de março, e pelos artigos 113.º, n.º 2, al aa), da LCE, na redação vigente à data dos factos, correspondente, à atual alínea dd), em conjugação com o artigo 54.º, n.º 7, do mesmo diploma, numa coima no montante de vinte mil euros (€ 20.000) e na coima única de cem mil euros (€ 100.000)..

Fundamentação de Direito

A Arguida foi condenada pela prática de uma contraordenação cujo procedimento contra-ordenacional já se encontrava prescrito, pelo menos, desde 19 de outubro de 2020?
Consta do ponto «I» dos factos dados como assentes que:
l.- Contudo, o parceiro contratado pela Recorrente procedeu à ligação da estação de rede radiocomunicações do Serviço Fixo – Ligações Ponto-Ponto em momento anterior e, em virtude, disso, pelo menos, no dia 19.04.2016, em Lugar do Pisco, Trancoso, encontrava-se a ser utilizada, nas coordenadas geográficas WGS84, 40º 46´20,38`` N / 07º 25´24,63 W, a referida estação sem licença de utilização.

O facto ilícito contra-ordenacional consumou-se, face ao transcrito, no dia 19.04.2016. O prazo prescricional iniciou, assim, a sua contagem nessa data, nos termos definidos no n.º 1 do art. 119.º do Código Penal, aplicável neste recurso por força do estabelecido no art. 32.º do DL n.º 433/82, de 27 de Outubro que instituiu o ilícito de mera ordenação social e respectivo processo (RGCO).
Tal prazo é de três anos em virtude do estabelecido no art. 25.º, n.º 1, al. c), n.º 3 e n.º 6 do Decreto-Lei n.º 151-A/2000, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 264/2009, e nos artigos 17.º, n.º 4, e 27.º, al. b), ambos do RGCO.

É seguro que o prazo de prescrição sofreu interrupções. O Tribunal «a quo» indicou-as, em termos que não foram validamente questionados, da seguinte forma:
(…) em 04.10.2018, com a notificação da acusação (cf. fls. 38 a 43); em 09.05.22019, com a inquirição das testemunhas (cf. fls. 127 a 129); e em 15.10.2020, com a notificação da decisão impugnada (cf. fls. 136 a 151).

Teve razão o referido Tribunal quando apontou que, em «cada uma destas datas, reiniciou-se o prazo de três anos».
Em consequência da interrupção da prescrição que emergiu nos termos descritos, impõe-se adicionar um ano e meio ao lapso temporal referido, por força do estabelecido no n.º 3 do art. 28.º do RGCO, o que redimensionou tal prazo para os 4 anos e meio.
A prescrição atingir-se-ia, assim, no dia 20.10.2020.
Foi já depois desta data (em 15.12.2020) que se materializou a causa de suspensão prevista na al. c) do n.º 1 do art. 27.º-A do mesmo encadeado normativo que, por força do estabelecido no n.º 3 desse artigo, impõe a adição de seis meses ao lapso temporal em apreço, assim gerando um prazo global de prescrição 5 anos.
Importava, pois, avaliar se, no momento do exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplicou a coima estava já prescrito o procedimento contra-ordenacional.
É a este nível que ganham sentido as considerações feitas nos autos relativas ao efeito das normas de emergência produzidas no ano de 2020 no quadro da pandemia que assolou o planeta nesse ano e se mantém activa na presente data.

Mostram-se adequadas as referências contidas na sentença relativas ao percurso normativo de reacção nacional à crise sanitária SARS-COVID-19 em cujo quadro de emergência foi aprovada a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março que, nos n.ºs 3 e 4 do seu artigo 7.º, estatuiu que:
3- A situação excecional constitui igualmente causa de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos.
4- O disposto no número anterior prevalece sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, sendo os mesmos alargados pelo período de tempo em que vigorar a situação excecional.

Da conjugação do disposto nesses números com o estabelecido na norma interpretativa constante do art. 5.º da Lei n.º 4-A/2020, de 6 de Abril, extraímos que a referida suspensão especial de prazos se iniciou em 9 de Março de 2020.
E essa suspensão manteve-se até 2 de Junho de 2020 – cf. art.10.º da Lei 16/2020 de 29.05, que entrou em vigor no dia 3 desse mês e ano.
Foi neste contexto que o Tribunal «a quo» considerou que não ocorreu a prescrição.
Estamos perante uma resposta legislativa a uma vera impossibilidade física, a saber, a de promover e materializar a tramitação dos processos em virtude do confinamento de emergência. Encontramo-nos diante da pungente força da natureza sobe o homem, não diversa, por exemplo, de um fenómeno sísmico de dimensões limite que destruísse os tribunais do litoral marítimo luso e que os impossibilitasse de todo de funcionar durante o período da reconstrução ou de qualquer outro deste jaez e com estas consequências.
A suspensão decretada não surge, na realidade, da vontade e acção do legislador mas da força inelutável de fenómeno físico que a todos se impõe.
Julga-se adequado o juízo do Tribunal «a quo» atinente à aplicação no domínio contra-ordenacional da interdição da aplicação retroativa da lei que estabelece a punibilidade e a punição, face ao disposto no n.º 1 do art. 3.º da RGCO, bem como a consideração da existência de esteio constitucional aqui relevante, porém sem perder nunca de vista o alijamento de rigor e exigência na aplicação, nesta área técnica, dos princípios constitucionais.
A necessária distinção face à área estritamente penal acarreta, claramente e de imediato, na situação que nos ocupa, o afastamento da excepção garantística lançada no n.º 1 do art. 2.º da Lei n.º 44/86, de 30 de Setembro, «Regime do Estado de Sítio e do Estado de Emergência» (e no n.º 6 do art. 19.º da Constituição da República Portuguesa), ou seja, o alijamento da asseguração da não retroatividade da lei criminal no quadro do estado de emergência. É assim, porque nos encontramos, nesse âmbito normativo, no núcleo mais sensível do travejamento do sistema, ou seja, num quadro de esforço de protecção dos derradeiros e mais importantes valores humanos num contexto de excepção absoluta, guardando-os como quem, despojado de tudo, tenta salvar as suas derradeiras referências individuais, i.e, um pequeno cofre existencial comprimido pela emergência.
Trata-se de restrição que protege a liberdade individual e não o património (afinal o único bem atingido pela sanção contra-ordenacional).

A questão suscitada foi já avaliada por este Tribunal nos recursos de contra-ordenação nºs 164/19.0YUSTR.L1L1 e 124/18.8YUSTR.L2.
A fundamentação aí lançada sustentou-se em algumas noções que merecem reverberação porque ajustadas ao que cumpre avaliar.
São elas:
1.- O quadro motivador da norma questionada é de excepção constitucional, ou seja, de parentesis na tutela dos direitos, liberdades e garantias;
2.- A vigência do dispositivo é transitória;
3.- O mecanismo excepcional funciona por reforço do poder público;
4.- Tal mecanismo é instrumental fazendo corresponder a uma situação de ruptura e anormalidade uma solução orientada para a consecução da sua cessação;
5.- Tem expressão em diversas normas constitucionais e numa lei aglutinadora de soluções;
6.- A suspensão de direitos não é incondicional e irrestrita devendo, entre outros, respeitar, desde a declaração à execução, o princípio da proporcionalidade e da necessidade estrita, tudo nos termos do estabelecido no n.º 4 do já invocado art. 19.º da Lei Fundamental;
7.- A baliza instrumental corresponde ao «pronto restabelecimento da normalidade constitucional» – ibidem;
8.- A medida de suspensão dos prazos de prescrição tem relação umbilical com a crise sanitária sendo proporcionada à enormidade e carácter inusitado dos efeitos da pandemia;
9.- O n.º 1 do artigo 27.º-A do RGCO contém, a propósito da suspensão, enunciado não taxativo, ao ressalvar os casos previstos na lei;
10.- A dispersão normativa assim admitida não agride os princípios da legalidade e sua derivada tipicidade que requerem enunciado, verbalização precisa, mas não exigem concentração das fórmulas ou carácter coevo do enunciado podendo, pois, a norma constar de um diploma autónomo e ser posterior;
11.- O Decreto-Lei que aprovou o RGCO (n.º 433/82) não tem, sequer, superior grau hierárquico face à Lei n.º 1-A/2020 e poderia até, numa perspectiva de hierarquia de leis, ser por ele revogado;
12.- Não estamos perante retroactividade directa ou de primeiro grau, no sentido de aplicação de regra nova a contexto passado mas face a aplicação de preceito a quadro temporal futuro relativo a realidade contemporânea – a pendência processual;
13.- Não há arbitrariedade, surpresa, desproporção ou um gorar de expectactivas, logo não há inconstitucionalidade;
14.- O princípio da confiança não reclama que se materialize a possibilidade de serem conhecidas todas as causas de suspensão do prazo de prescrição no momento da consumação;
15.- Se assim não fosse, estaria retirado ao Estado a possibilidade de reagir em emergência perante situação física portadora de particular gravidade e, obviamente, imprevisível no momento dessa consumação;
16.- O carácter inusitado do facto genésico da medida que impossibilitou temporariamente o exercício da acção punitiva impõe uma reanálise dos quadros teóricos.
Assim é.
Particularmente, quanto a este último ponto, é crucial ter presente que tese oposta representaria a total artificialização, manietação e secundarização da acção legislativa e da possibilidade de exercer a actividade política e de governação. Pois se o legislador não pudesse responder de emergência a uma situação de grave risco colectivo que, sem paralelo, ponha em causa toda a sociedade e as suas estruturas básicas de sustentação, então teríamos que concluir que estaríamos a levar a tutela de direitos ao estertor, ao domínio da impossibilidade, por se preferir a extinção da sociedade que tutela o direito à sua suspensão temporal e constitucionalmente enquadrada.
Ficaríamos, por exemplo, sem poder responder à pandemia com potencial de extinção da espécie, ao sismo de dimensões bíblicas ou à imaginada deriva da «jangada de pedra».
Salvo o respeito devido, não parece ter sentido o maximalismo analítico que coloque a recusa da sujeição a uma coima acima da resposta colectiva a uma pandemia, que se aproveite da inoperabilidade ou do desmantelamento do sistema punitivo para evitar a punição do ilícito efectivamente cometido.
Não se divisam argumentos que abalem o ora dito e o já consignado anteriormente por este órgão jurisdicional.
A inexistência de uma verdadeira retroactividade e o carácter específico da jurisdição de mera ordenação social afastam limitarmente que se possa equacionar uma violação do disposto no n.º 4 do 29.º da CRP.
Não há desconformidade, antes coerência, ante o disposto no art. 18.º da Constituição da República Portuguesa, particularmente no seu n.º 2. Foram tutelados outros interesses juridico-constitucionais. Não se ultrapassou a necessidade estrita por estes gerada.
Não há excesso nem desproporção na definição do tempo da suspensão do prazo prescricional (oitenta e seis dias), antes clara colagem aos factos da crise e resposta directa aos mesmos.
Encontramo-nos face-a-face com calamidade pública, logo diante do preenchimento da previsão constante do n.º 2 do art. 19.º da Lei Fundamental.
Há eficácia pontual e focada. Não se afastam princípios, antes se assume uma medida muito concreta e muito orientada para objectivos e para a resposta a específicos condicionantes.
Antes do curso integral do prazo de prescrição correspondente à adição de 86 dias ao dia 20.10.2020 – momento de termo do prazo de prescrição ordinário – iniciou-se, como bem notou o Tribunal «a quo», o prazo de suspensão da prescrição de seis meses previsto na al. c) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 27.º-A do RGCO (em 18.12.2020, data da notificação do despacho de admissão do recurso em primeira instância).
Neste contexto, não merece qualquer censura a decisão do aludido Órgão Jurisdicional ao declarar não prescrito o procedimento contra-ordenacional.
Não ocorreu, pois, tal prescrição.
É negativa a resposta à questão proposta.

III.DECISÃO:

Pelo exposto, julgamos improcedente o recurso e, em consequência, confirmamos a sentença impugnada.
Custas pela Recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 2 UCS.
*


Lisboa, 16.03.2021


Carlos M. G. de Melo Marinho (Relator)

Ana Isabel de Matos Mascarenhas Pessoa (1.ª Adjunta)